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Le Corbusier Riscos Brasileiros Coordenação editorial: Carla Milano Benclowicz Equipe de produção: Eunice Tamashiro, José Antonino de Andrade, José Gonçalves de Arruda Filho e Renan Morais Figueiredo. Projeto Gráfico: Dulce Maria de Guimarães Horta Tradução: Antonio de Pádua Danesi e Gilson César Cardoso de Sousa Desenho da capa: Plano piloto de Le Corbusier para o Rio de Janeiro, 1936. Dados dc Catalogação na Publicação (CIP) Internacional (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Harris, Elizabeth Davis, 1950- H26L Le "CoïBusier : Riscos Brasileiros / Elizabeth D, Harris ; tra- dução de Gilson César Cardoso de Sousa e Antonio de Pádua Danesi. — São Paulo : Nobel, 1987. Bibliografia. ISBN 85-213-0469-2 I. Arquitetura — Brasil 2. Edifícios históricos — Brasil 3. Le Corbusier, 1887-1965 I. Título. CDD-720.981 87-0334 -927.2 índices para catálogo sistemático: Arquitetos : Biografia e obra 927.2 Brasil : Arquitetura 720 981 Brasil : Edifícios históricos : Arquitetura 720.981 Elizabeth D. Harris Le Corbusier Riscos Brasileiros 1987 Nobel Livraria Nobel S.A. Rua da Balsa, 559 02910 São Paulo SP Sumário Agradecimentos 7 Introdução 9 ORIGENS 15 O primeiro contato de Le Corbusier com os países em desen- volvimento 16 Le Corbusier é "apresentado" ao Brasil pelo amigo Blaise Cendrars 19 Viagem de Le Corbusier à América do Sul (1929) 24 Précisions 27 Le Corbusier: uma visão geral (1929-1936) 38 CONTEXTO 45 Arquitetura brasileira moderna antes de 1936 45 A ditadura de Vargas e as artes 54 O concurso para a sede do Ministério da Educação e Saúde .. 56 PROCESSO 79 A viagem de Le Corbusier ao Rio de Janeiro em 1936 79 O projeto para a praia de Santa Luzia 84 O projeto do Castelo 92 O projeto para a Cidade Universitária da Universidade Federal do Brasil 99 Um manuscrito inédito: as seis conferências do Rio de Janeiro 105 Evolução do projeto do Ministério 117 RESULTADOS 141 Construção 141 A política e o projeto do Ministério 167 Realização do sonho 173 LEGADO 178 Pós-escrito à viagem de Le Corbusier ao Rio de Janeiro em 1936 178 A constante interação de Le Corbusier com o Brasil 183 A aplicação das idéias de Le Corbusier no Brasil após 1936 . .. 194 Influência do edifício do Ministério fora do Brasil 202 EPÍLOGO 205 BIBLIOGRAFIA 209 Agradecimentos Pessoas de três continentes tornaram possível este trabalho. Gostaria de externar-lhes minha gratidão. Em primeiro lugar, no Brasil, devo agradecer aos artistas, arquitetos e engenhei- ros envolvidos diretamente na construção da sede do Ministé- rio da Educação e Saúde, que empenharam generosamente seu tempo e facilitaram muito a pesquisa, sobretudo o falecido Carlos Leão. Outros profissionais que também não pouparam seu tempo comigo foram: Pedro Alcântara e Lygia Martins Costa, da Fundação Pró-Memória, bem como Carmen Port inho e Maurício Roberto, do Rio de Janeiro; em São Paulo, Pietro Maria Bardi, diretor do MASP. Em Paris, devo muito à Fondation Le Corbusier e à sua diretora, Evelyn Trehin, bem como ao antigo sócio de Le Cor- busier, André Wogensky. Nos Estados Unidos, quero agradecer à University of Chica- go, que apoiou minha pesquisa com uma bolsa Kress and Woods. Gratidão particular vai para meu orientador, Joseph Connors, agora na Columbia University, por suas recomenda- ções e auxílio na elaboração do trabalho. Finalmente, um agradecimento especial a meu marido por seu constante encorajamento ao longo do projeto. Introdução Em 1943, quando o Museu de Arte Moderna — Museum of Modem Art — promoveu a mostra sobre arqui tetura brasilei- ra Brazil Builds, o Brasil se projetou como uma potência no universo da arqui te tura moderna. A imprensa internacional saudou o acontecimento com forte admiração e aplauso pelo talento que emergia: "Algumas das inovações mais expressivas e bem-sucedidas em arquitetura tomam corpo, numa escala impressionante, num país subtropical de língua portuguesa que os norte-americanos costu- mam ignorar". 1 Em especial, um edifício deixou perplexos arquitetos do mundo inteiro: o da sede do Ministério da Educação e Saúde, tido como força inspiradora da nova arqui te tura brasileira. 2 Encomendado pelo governo, o edifício patenteava o potencial industrial da nação e sua visão artística em franco desenvolvi- mento: "Uma sede de Ministério que nenhum outro projeto governa- mental no hemisfério pode igualar. Talvez mais importante que o edifício em si seja a vitalidade que o apoio ofici al ajudou a infun r dir na arquitetura brasileira." 3 1. MOCK, E. B. "Building for Tomorrow", Travei , 81:26, jun. 1943. 2. O edifício é conhecido hoje como Palácio da Cultura. 3. "Brazilian Architecture: Living and Building below the Equator", Pencil Points, 24:54, Jan. 1943. "Enquanto o Federal Classic, em Washington, o Royal Acade- mic Xrchêõlogy,^em_Londres, e o Nazi Classic, em Munique, são ainda predominantes, o Brasil ousou desviar-se do caminho fácil e seguro, resultando disso que a cidade do Rio de Janeiro pode ostentar o mais belo edifício oficial do_ocidente". 4 ! - A estrutura partiu de um esboço de Le Corbusier, 5 modifi- cado por um grupo de jovens arquitetos brasileiros, incorpo- rando pela primeira vez pilotis, brise soleil* e toit jardin* num monumental arranha-céu de vidro e concreto armado: "Essa estrutura, ainda incompleta ( . . . ) , realizou com tanto êxito o sonho de Le Corbusier, de um grande bloco retangular de vidro, que passou a constituir-se em protótipoi .largamente imi- \ Egjj^jflesmo edifício seria o modelo da idé ia jn ic | a l fle Lg Corbusier e Oscar Jflemeyer^pgyf^o qnE~Trítroduziu o arranha-céu monolítico e revestido de vidro nos Estados Unidos. O edifício, além do mais, apresentava-se como uma alternativa para a tradicional construção em recuo e explorava a praça urbana em termos de uma estética nova para os arranha-céus. A sede do Ministério da Educação e Saúde também introduziu o quebra-sol de Le Corbusier, recur- so que, depois de 1936, o levou a explorar a plasticidade poten- cial do concreto a rmado nas fachadas externas de seus edi- fícios, Como poderia um país em desenvolvimento, recém-entrado na era da industrialização, tornar-se tão rapidamente um líder 4. GOODWIN, Philip. Brazil Builds, Nova Iorque, Museum of Modem Art, 1943, p. 90. 5. Le Corbusier é o pseudônimo de Chartes-Edouard Jeanneret (1887-1965). Charles-Edouard Jeanneret mudou seu nome oficialmente para Le Corbusier srmrr- 6. SMITH. Robert. "Brazil Builds on Tradition and Today", Art News, 41:14, fev. 1943. * Doravante traduziremos essas expressões por quebra-sol e terraço-jardini, respectivamente. no universo da arquitetura moderna? O estímulo principal vinha de Le Corbusier, que três vezes visitou o Brasil — em 1929, I936~éJ96Z)—, imprimindo, a cada passagem sua, u m a marca duradoura na evolução da arqui te tura moderna do país. Le Corbusier viajou pelo mundo inteiro ao longo de sua car- reira, mas em poucos lugares causou impressão tão profunda como no Brasil — e nenhum país, em contrapart ida, o impres- sionou tanto. Seu entusiasmo pelas nações em desenvolvimen- to surgiu quando das viagens que fez ao Oriente Médio, em 1911, mas foi o vigoroso encora jamento de um amigo íntimo, Biaise Cendrars, que motivou a primeira visita ao Brasil. Em 1929, Le Corbusier fez palestras na Argentina, Uruguai e Brasil, elaborando, entrementes, vários projetos para as grandes cida- des desses países. O plano em curva para o Rio de Janeiro que- brava todas as idéias precedentes de Le Corbusier sobre urba- nismo. Após o primeiro encontro, enamorou-se do Brasil e de seu povo: a alegria de viver, a percepção^ sensual) do mjinHn. a beleza natural, o sol sempre bri lhante e a convidativa imensi- dão do oceano. Em especial, foi no Brasil que deparou com um estilo de vida apropriado a seu vigor atlético e liberdade de pensamento artístico (era a época do fascismo na Europa). Em 1936, voltou à América Latina para pres tar seu apoio aos arquitetos brasileiros empenhados no projeto do Ministério da Educação e Saúde. Em 1962, data de sua derradeira viagem, realizou estudos para a embaixada francesa em Brasília e des- pediu-se dos muitos amigos que fizera ao longo dos anos. Con- tudo, o melhor da viagem foi a oportunidade de constatar até que ponto sua filosofia da arqui te tura estava sendo posta em prática nas cidades brasileiras, principalmente Brasília, onde suas idéias urbaníst icas ganharam vida graças à interpretação de Lúcio Costa. A viagem de 1929 não deixou marca visível; por outro lado, a de 1936 fez explodir a arqui te tura moderna. O que restava dessa viagem, aparentemente, eram os esboços dados a público na Oeuvre Complète 1934-1938,1 o que, por certo, não explicava 7. LE CORBUSIER. Oeuvre Complète 1934-1938. 9.* éd., Zurique, Edition Girs- berger, 1975, pp. 40-5, 78-81. a razão de um país como o Brasil decidir subitamente romper com o neoclassicismo, dominante à época, para produzir uma estrutura de vanguarda, sancionada pelo governo, como a sede do Ministério. Livros e artigos de jornal sobre a história da arqui te tura brasileira ocasionalmente sumarizaratn os aconte- cimentos relativos a este projeto. Mencionaram desde o con- curso de 1935 até a inauguração do prédio em 1945; entretanto, ninguém_empreendeu uma exposição acurada de como, preci- samente, pôde o Brasil produzir já em 1936 um edifício de de- senho tâu arro jado.8 Tratando-se de projeto oficial, seria lógico presumir a existência de abundante documentação sobre o con- curso, a encomenda e a construção do edifício; mas, com a mudança da capital para Brasília nos anos 60, muita coisa se perdeu. Afortunadamente, após fatigante pesquisa, os documen- tos originais do prédio f oram localizados num arquivo morto do Rio de Janeiro. 9 De dez volumes de registros oficiais, que incluíam plantas, relatórios financeiros e cartas pessoais, emer- giu uma série de fatos que i lustram vivamente como o Brasil logrou elaborar um desenho de caráter tão avançado. Afora isso, todos os arquitetos envolvidosí no projeto, exceto um, con- tinuavam vivos (na época da-pesquisa) e podiam apresentar sua interpretação das circunstâncias da visita de Le Corbusier e da subseqüente construção do edifício. Entretanto, aqueles documentos não revelavam a história toda. Os arquivos de Le Corbusier contr ibuíram com sua versão, que incluía um manuscri to inédito das seis conferên- cias pronunciadas no Rio em 1936, com os desenhos que as 8. As principais fontes de referência à arquitetura brasileira que discutem a comissão da sede do Ministério de Educação e Saúde são: COSTA, Lúcio. Sobre Arquitetura, Porto Alegre, Centro dos Estudantes Universitários de Arquitetura, 1962, pp. 56-62; FERRAZ, Geraldo. Warchavchik e a Introdução da Nova Arquitetura no Brasil: 1925 a 1940. Prefácio de P. M. Bardi. São Pau- lo, Museu de Arte de São Paulo, 1965, pp. 261-2; GOODWIN, Philip. Brazil Builds, pp. 82-92; SANTOS, Paulo. Quatro Séculos de Arquitetura. Rio de Ja- neiro, Editora Valença, 1977, pp. 124-30. 9. Brasil. Ministério da Educação (arquivo morto). Rio de Janeiro. "Projeto da Construção do Edifício-Sede do MEC", 10 v. ilustravam. O governo brasileiro voltou atrás em sua promessa de publicar o trabalho, de modo que o manuscri to permane- ceu por mais de quarenta anos no arquivo particular do arqui- teto. As conferências e a viagem mostram a maneira informal de Le Corbusier ensinar arquitetura, revelando, por outro lado, mudanças em sua filosofia na época de transição que foram os anos 30. Le Corbusier começava, então, a substi tuir o concreto armado liso dos puristas p o y r a g r a f c mais consistentes e de- " " ^ ^ ^ a s M i n ,o cío' 'presente livro, como se vê, é a sede do Mi- nistério da Educação e Saúde e a influência recíproca entre Le Corbusier e o Brasil, que lança novas luzes sobre o seu pro- jeto de 1929 para o Rio de Janeiro, a sua viagem de 1936, o edifício em si e o intercâmbio do arquiteto com o país, de 1929 a 1962. Origens Des hommes sont venus de la mer, des blancs, pour découvrir par hasard un conti- nent dont personne n'avait la moindre no- tion en Europe, mais dont l'idée était dans l'air. Cette terre nouvelle les a éblouis. Des hommes sont venus portés par l'Océan, fuyant à la cape dans la tempête, après des jours et des jours d'une misérable, d'une épuisante traversée. Des hommes on débarqué pour se tnuer en conquistadores, d'où les plages, les rivages déserts aujourd'hui. Les Indiens n'y sont plus, les Indiens qui allaient nus. Le bateau passe ... Les côtes dépeuplées défilent et le chapelet des îles abandonnées. Les plus beaux paysages de ta terre en- tière ... Les plus belles photos,.. Un documentaire. Le Paradis ... Biaise Cendrars, Le Brésil des hommes sont venus. O primeiro contato de Le Corbusier com os países em desenvolvimento Cita-se Le Corbusier como um dos pais do moderno movi- mento arquitetônico do século XX, ao lado de Walter Gropius e Mies van der Rohe. Tradicionalmente, costuma-se opô-lo aos outros por preferir a es t ru tura de concreto a rmado à de aço, por seu interesse no planejamento u rbano e sua persona- lidade iconoclasta. Entretanto, distinguiu-se também pela ampla -enn uniênrla-M H-itrh que o fazia voltar-se para os países em desenvolvimento, inclusive o Brasil. Foi graças ao trabalho executado no Terceiro Mundo que suas Idéias mais avançadas, referentes à adaptação da arqui te tura ao clima e à necessidade de casas populares, puderam frutificar e ser mais prontamente absorvidas. Na base desse interesse está seu primeiro contato com o mundo subdesenvolvido, quando, aspirante a arquiteto, viajou pela Grécia e Turquia aos vinte anos de idade. Em 1911, Le Corbusier part iu de Budapeste para o Oriente Médio, esteve algum tempo na Grécia e regressou pela Itália. Essa peregrinação lhe abriu novos horizontes, conscientizan- do-o subitamente de um mundo adormecido, alheio à moderni- zação que tinha lugar na Europa Ocidental. O acaso lhe propi- ciava estudar a arte e a arqui tetura do passado. Maravilhou-se diante da Acropole e das mesquitas turcas, mas, surpreenden- temente, foi a simplicidade das construções nativas que o tocou mais fundo. "A casa turca de madeira, o konak, é uma obra- pr ima da arqui tetura." 1 0 Essa arqui te tura vernacular abria uma perspectiva inédita graças ao uso sensato de materiais locais e às cores vivas que adotava: "Sob a luz branca, quero u m a cidade toda branca , mas ponti- lhada de c ipres tes verdes . . . Enquan to as casas de madei ra , de vastos tetos e spa r ramados , aquecem suas cores violáceas na fres- 10, LE CORBUSIER. Le Voyage d'Orient, Genebra, Éditions Forces Vives, 1966, p. 120. cura do verde generoso, incrustadas em sítios cujo mistério me fascina: como podem elas se.agruparem tão harmoniosamente em volta desses picos que são graúaes mesquitas esbranquiçaaas r ' . 1 1 As notas de Le Corbusier sobre a viagem, tal como apare- cem em Voyage d'Orient (1912), dão ênfase igual à sociologia, à arqui tetura nativa e às obras-primas de outras épocas, de permeio com descrições poéticas dos campos. Essas observa- ções revelam as idéias do jovem arquiteto que iriam dominar sua imaginação em anos futuros. Quando visitava países de passado sem vigor e futuro incerto, deparava com necessidades arquitetônicas básicas ainda não satisfeitas. A carência de mo- radias populares adequadas à vida do homem comum lhe ins- pirou a missão do arquiteto. Pouco depois, em 1914, criava a casa DOM-INO, que se tor- naria seu padrão estrutural para projetos de moradia popular . Logo após a eclosão da Primeira Grande Guerra, Le Corbusier desenha este projeto simples de habitação em concreto armado, antecipando a paz e o esforço de reconstrução em prol dos de- sabrigados. 1 2 Deu-lhe o nome de DOM-INO pela semelhança óbvia com as peças do dominó. A casa consistia numa estrutura simples de concreto armado, com três lajes horizontais susten- tadas por seis colunas verticais. De fácil construção, era ideal para a rápida substituição das moradias danificadas durante a guerra. Entretanto, só foi utilizada depois de 1924, como tipo estrutural básico para seu projeto em Pessac. Ironicamente, antes de 1924 Le Corbusier utilizara essa concepção para villas de milionários, que foram seus primeiros clientes.13 A planta da DOM-INO foi uma realização importante para Le Corbusier devido à aplicabilidade prática e lógica do con- creto a rmado na construção popular. Esse material era o mais econômico e mais facilmente encontrável nos países em de- senvolvimento; daí a adequação do formato DOM-INO a pro- jetos para o Terceiro Mundo (Figura 1). t i . Ibid., pp. 67-9. 12. VON MOOS, Stanislav. Le Corbusier: Elements of a Synthesis, Cambrid- ge, MIT Press, 1970, p. 18. 13. Ibid., p. 19, Le Corbusier começava assim a determinar seu campo de atuação: um mundo receptivo ás suas idéias, que recebia bem as cõlsas novas e a tecnologia, i s to^Tpaíses ávidos por ent rar na corrida do desenvolvimento e absorver a revolução indus- trial do século XX, ou, então, a Europa devastada pela guerra e carente de moradia. Seja criando es t ruturas para a Rússia pós-revolucionária, p lanejando a sede do Ministério da Educa- ção e Saúde do Brasil, construindo Chandigarh ou a Unité d'Habitation em Marselha, os países em desenvolvimento cons- t i tuíram um fator fundamental na concepção de sua filosofia arquitetônica. Mas foi o Brasil que provocou nele o impacto mais duradouro e constituiu o terreno mais fértil para a im : plantação de suas idéias. Le Corbusier é "apresentado" ao Brasil pelo amigo Blaise Cendrars m i Blaise Cendrars, amigo de Le Corbusier desde foi a força oculta por trás dessa conexão. Ele atuou como mediador entre o arquiteto e a elite intelectual brasileira que_o_gonvidou para a visita d ê 1929; inspirou-lhe o tamoso pro je to em curva pa ia u Ríõ deTanei ro (1929) e advogou sua contratação como encarregado do plano urbanístico da nova capi tal^ Brasília, gmfl93Q. ) ~ P ~ Radicado em Paris, poeta da vanguarda ativista dos anos 20, Blaise Cendrars, assim como Le Corbusier, nascera em La Chaux-de-Fonds, Cantão de Neuchâtel, onde moravam a 100 m um do outro. Entretanto, só t r avaram relações em 1922.14 No Salon d'Automne, em Paris, onde Le Corbusier exibia sua Ci- dade Contemporânea para Três Milhões de Habitantes, Blaise Cendrars se aproximou dele expressando elogios às suas idéias de^reorganização urbana. Daí por diante se tornaram íntimos e descobriram que t inham muitos aimgefcipni comum. Criados no Jura (Suíça) e i m j r i ^ ^ p e l o a m b k n i o n t e l e c t u a l de Paris no final dos anos IÒ e começo aos Zü, alwifoos haviam adotado jaseudâmmos para caracterizar uma reviravolta em suas carrei- ras .1 5 FréeJprfc-Lo uis Sauser tornara-se Biaise Cendrars em 1912 ao optar pelo ofício de poeta, e Charles-Edouard Jeanneret oficialmente tornou-se Le Corbusier depois de se estabelecer como arquiteto em 1920. Na década de 20, Paris atraía artistas e mecenas de todas as partes do mundo com sua efervescência cultural, geradora de arte e prazer. Muitos art istas brasileiros fizeram peregrina- 14. LE CORBUSIER. "Toi, au moins, tu crois à ce que tu fais", La Gazette Littéraire, Paris. 34:1, sept. 1960; ver também PETIT, Jean, org. Le Corbusier Lui-Même, Genebra, Éditions Forces Vives, 1970, p. 22. 15. PARROT, Louis. Biaise Cendrars: Une Étude Paris, Éditions Pierre Seg- hers, 1948, pp. 24, 47. Embora a data em que Biaise mudou o seu nome não seja declarada diretamente, o livro contém dois desenhos, um de julho de 1912 com a assinatura Freddy e outro, dedicado a Apollinaire, assinado Blaise Cendrars e datado de novembro de 1912. Assim, o autor concluiu que a mu- dança de seu nome ocorreu em 1912. ção a Paris, conheceram Cendrars e engrossaram o número de seus amigos. Mário de Andrade, escritor e defensor da arte moderna no Brasil, o escritor Oswald de Andrade e a artista Tarsila do Amaral se tornaram íntimos de Cendrars, graças à apresentação de Fernand Léger. '6 Enquanto Le Corbusier se ocupava da publicação de L'Esprît7Jouveau, u Çendrars empreendia três viagens ao Brasil, a convite de seus inúmeros amigos. Por ocasião dessas viagens, escreveu um livro de poesias inti tulado Feuilles de Route, i lustrado por Tars i la j ; dedicado às amizades que fizera ali, entre as quais se incluíam poetas de vanguarda, pintores e patronos das artes. Essas amizades, conservou-as a vida toda, principalmente a de Paulo Prado 1 Filho de um dos mais_prós- geros barões do café de São Paulo, Prado era escritor respei- tado, his toriador è~unTdos líderes da s e m a n a de Arte Moderna f j j j o m i ^ em | depois de apresentado ao arqui te to por endrars. A poesia de Cendrars, nesse período, traía uma sensibili- dade especial em relação à arquitetura e descrevia o país que Le Corbusier iria encontrar: J'adore cette ville. Saint-Paul est selon mon coeur. Ai^une^pré^jugî. Ni ancien ni moderne. Seuls comptent cet appétit furieux cette confiance absolue cet optimisme cette audace ce travail ce labeur cette spéculation qui font construire dix maisons par heure de tous styles ridicules gro- tesques beaux grands petits nord sud égyptien yankee cubiste. Sans autre préoccupation que de suivre les statistiques prévoir l'avenir le confort l'utilité la plus-value jet d'attirer une grosse immigration. 16. AMARAL, Aracy A. £ilaiie_ Cendr ars no Brasil e os Moderni stas, São Pau- lo, Livraria Martins Editora, 1970, p. 8! 17. O nome da revista L'Esprit Nouveau veio de Apollinaire, que era amigo íntimo e mentor de Biaise Cendrars. Paul Dcrmce, outro amigo de Blaise Cendrars, foi a principal força que patrocinou a publicação. Tous les pays. Tous les peuples. J'aime ça. Les deux trois vieilles maisons portugaises que restent sont des faïences bleues. Biaise Cendrars , "Saint-Paul" Tout le monde est sur le pont. Nous sommes au milieu des montagnes. Un phare s'éteint. do/K ûoCe On cherche le Pain_de_Sucrç. partout et dix personnes le décou- vrent à la fois dans cent directions différentes tant ces montagnes se ressemblent dans leur piriformité. PÍR-f/í.** NO cçu M. Lopart me montre une montagne que se profile sur le ciel comme un cadavre étendu et dont la silhouette, ressemble beau- coup à celle de Napoléon sur son lit de mort. Je trouve qu'elle ressemble plutôt à Wagner un Richard Wagner bouffid'orgueil ou envahi par la graisse. Rio est maintenant tout près et t'on distingue les maisons sur la plage. Les officiers comparent ce panorama à celui de la Corne d'Or. D'autres racontent la révolt des forts. D'autres regrettent unanimement la construction d'un grand hôtel moderne haut et carré qui défigure la baie (il est très beau). D'autres encore protestent véhémentement contre l'abrasage d'une montagne. Penché sur le bastigage tribord je contemple. La végétation tropicale d'un îlot abandonné. Le grand soleil qui creuse la grande végétation. Une petite barque montée par trois pêcheurs ces hommes aux mouvements lents et méthodiques. Qui travaillent. Qui pèchent. Qui attrapent du poisson. Qui ne nous regardent même pas. Tout à leur métier. Biaise Cendrars, "Rio de Janeiro" Em 1927, o poeta idealizara um esquema arquitetônico para o Rio de Janeiro que inspiraria o plano urbaníst ico de Le Corbusier de 1929. Em resposta a uma afirmação do tea- trólogo italiano Pirandello, que então dirigia uma série de apresentações no Rio de Janeiro, Cendrars comentara: "Se não me engano, ele (Pirandello) fala da necessidade de criar para o Rio uma arquitetura conforme à linha da paisagem. Seria, pois, o caso de erguer edifícios da altura do Pão de Açúcar ou do Corcovado? Acho que mesmo se construíssemos aqui arra- nha-céus duas ou três vezes mais altos que os de Nova Iorque não com pro meteríamos essa linha. A própria natureza nos dá o exem- plo. A l é m , m a i s , toda cid^île em crise de expansão tem no arra- nha-céu seu...tabu saJ.vadorv_Por que hesitar? Isso funciona tanto nos Estados Unidos como em, -outra parte qualquer, sem exceção de P a r i s " ^ - . — — Durante sua primeira viagem ao Brasil, Le Corbusier rompeu com o academicismo de seus antigos planos — que incluíam hierarquização de zonas, eixo central e um volume tradicionaT^ê escala — para criar um edifício de apartamen- tos com seis^quilômetros de comprimento p o i ^ g j ^ r a y j j g g f l e altura, acompanhando a curvatura do terreno montanhoso do Río7 Essa idéia foi sugerida a Le Corbusier por Cenjirars , mas aquele deu-lhe proporções tão fantásticas que Cendrars se di- vertiu à larga. 1 9 As muitas visitas de Cendrars ao Brasil fizeram dele uma figura artística impor tante nos círculos locais. "A importância 18. ALEXANDRE EULALIO. A Aventura Brasileira de Biaise Cendrars, São Paulo, Edições Quíron Ltda., 1978, p. 175. 19. PETIT, Jean. Le Corbusier Parle, Genebra, Éditions Forces-Vives, 1967, p. 17. capital de Cendrars consistia em . . . seu desejo sincero de em- pare lhar nossa l i teratura e artes plásticas com a vanguarda francesa. '^ 20 Foi por intermédio do poeta que Le Corbusier entrou em contato com o Brasil pela primeira vez e pôde assim ampliar os horizontes da arqui te tura moderna do país, como Cendrars o fez no campo das artes literárias. Em Précisions sur un Ëtat Présent de l'Architecture et de l'Urbanisme, obra de Le Corbusier baseada em sua viagem de 1929\ América Latina, o autor se referia à sua apresentação ao Brasil por Cendrars, enriquecendo-a com fotografias e mapas . 2 1 Obviamente, a curiosidade do arquiteto fora estimulada pelo fascínio de Cendrars por esse país gigantesco e no auge do de- senvolvimento, rude em sua beleza tropical e candura humana, maduro para as teorias de Le Corbusier e a civilização da máquina. A amizade prosseguiu, documentada por cartas e inúmeras publicações de Cendrars encontradas na biblioteca part icular de Le Corbusier, com dedicatórias afetuosas e pági- nas preferidas assinaladas. Em 1930, Biaise Cendrars voltava a envolver Le Corbusier com o Brasil. Amigos lhe escreveram a respeito da nova capital do país. A idéia de Brasília remontava a 1789, como recurso para o povoamento do interior , mas só foi seriamente conside- rada após a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, em 193ÍT - mãrscTSSara^Hrêspondeu às cartas dos amigos sugerindo que Le Corbusier fosse solicitado a desenhar a planta da nova capi- tal .2 2 Apesar de decorrerem mais vinte e sete anos para a idéia de Brasília se materializar, Le Corbusier não foi esquecido, pelo contrário, sua participação foi requisitada. Mas em 1930 ele estava envolvido com outras encomendas, e, em 1956, nega- ram-lhe a posição de consultor do proje to porque jamais se filiara à Ordem dos Arquitetos Franceses.2 3 20. AMARAL, Araùy A. Biaise Cendrars no Brasil, p. 2. 21. LE CORBUSIER. Précisions sur un Etat Présent de l'Architecture et de l'Urbanisme, Paris, Les Éditions G. Grès et Cie., 1930, p. 19. 22. ALEXANDRE EULÁLI0. Op. cit., p. 24. 23. Le Corbusier a Vincent Auriol, 20 de janeiro de 1956, Arquivos de Le Cor- busier, Paris. Foi ainda graças a Cendrars que Le Corbusier se pôs em contata com a elite sul-americana em Paris, inclusive Paulo Prado e Victoria Q'Campo.2 4 Esta era uma intelectual argentina de posses, companheira de Jorge Luis Borges na publicação da -revista literáriaf. SfT? ti muito festejada pelo apoio ativo que" emprestava ao movimento modernista nas artes. Com freqüên- cia fazia a rota Paris—Buenos Aires e era bem-conhecida nas rodas sociais da vanguarda parisiense, onde não faltavam Léger e Picasso. Paulo Prado e Victoria O'Campo encora ja ram Le Corbusier a visitar a América Latina. Insistentemente cha- mado pela elite latino-americana, com convites formais do Clube dos Amigos da Arte da Argentina, Faculdade de Ciências da Universidade de Buenos Aires, Clube Politécnico de São Paulo e Prefeitura do Rio de Janeiro, o arquiteto já tinha um itinerário previamente estabelecido. Os desenhos realizados para as cidades sul-americanas consti tuíram uma resposta di- reta ao desafio do planejamento e administração urbana que lhe foi proposto na capital francesa antes da organização dessa v iagem. 2 5 Viagem de Le Corbusier à América do Sul (1929) Le Corbusier deixou Paris a 18 de setembro de 1929, a bor- do do transatlântico Giulio Cesare, e chegou a Buenos Aires a tempo de realizar sua primeira palestra a 3 de outubro. Du- rante a estada a bordo, deu-se um acontecimento memorável: o encontro com a cantora americana Josephine Baker, a quem desenhou nua e achou encantadora; de fato, ela era o centro das atenções no navio e comparti lhava com Le Corbusier o mesmo senso de humor picante. Le Corbusier ficou dois meses na América do Sul, dando conferências em Buenos Aires, Mon- tevidéu, São Paulo e Rio de Janeiro, e fazendo uma pequena viagem a Assunção. O tempo todo era recebido entusiastica- mente como um dignitário francês e os jornalistas não o dei- xavam, 24. LE CORBUSIER. Précisions, pp. 19-20. 25. Fernand Léger a Le Corbusier, 1926, Arquivos de Le Corbusier, Paris. Na década de 30, as classes superiores da América Latina falavam francês na sua quase totalidade e costumavam via jar bastante para Paris. Esses países ignoravam suas raízes cultu- rais luso-hispânicas e preferiam voltar-se para a França. Há inúmeros precedentes históricos nesse sentido: a primeira es- cola de ar te brasileira, a Academia Imperial de Belas-Artes, foi criada por um grupo de artistas franceses convidados por D. João VI. Essa missão artística chegou ao Brasil em 1816 e trazia, entre outros, o pintor Jean-Baptiste Debret, discípulo de David, e o arquiteto Auguste-Henri-Victor Grandjean de Mon- tigny. Montigny elaborou o primeiro currículo da Escola de Belas-Artes e desenhou as primeiras es t ruturas notáveis do Rio de Janeiro. Os brasileiros recorriam à orientação dos franceses não apenas no setor das belas-artes, mas também no da lite- ratura — como o revela a popularidade de Biaise Cendrars. Le Corbusier se mostrou bastante impressionado pela re- cepção em São Paulo, onde foi oficialmente saudado pela Câmara Municipal e pelo prefeito, u presidente eleito Júlio Prestes, assentando-se na t r ibuna presidencial, reservada ape- nas a visitantes~flustres7 6 Leitor a t e n u ^ d ^ L ^ E s ^ r i t ^ o u v e a u , Júlio Prestes passou horas discutindo urbanismo côm Le C o r j2USÍer?3_Este conheceu ainda a pequena vanguarda brasileira, que contava entre outros com Gregori Warchavchik. Arquiteto nascido na Rússia e chegado ao Brasil em 1923, Warchavchik aderira ao estilo funcionalista e fora o responsável pelas pri- meiras residências modernas do país. A casa construída na Vila Mariana, com es t rutura retilínea em concreto e desenho inspi- rado na estética do cubismo, foi erigida em São Paulo em 1928. Essa casa impressionou vivamente Le Corbusier, que su- geri u -fcj^g y/arcfyavchik o r e p r e s e n t a n t e b r a g i ^ j ^ ^ ^ ^ ^ f r PIAM " Dos muitos proje tos apresentados na ocasião e que não foram adiante — sendo o mais famoso o da residência de Erra- zuris, no Chile, mais tarde copiado pelo arqui te to Raymond e 26. EVENSON, Norma. Two Brazilian Capitals, New Haven, Yale University Press, 1973, p. 53. 27. LE CORBUSIER. Précisions, pp. 2-3. 28. CIAM é a sigla de Congrès Internationaux d'Architecture Moderne. realizado nas imediações de Tóquio —, Le Corbusier desenhou uma casa j^ ra jHfamíHa Prado, com Warchavchik na qualidade de supervisor local. Vários esboços e cartas foram trocados, mas o pro je to não avançou e jamais foi concretizado. Le Corbusier quase recusou o convite para visitar o Rio de Janeiro — para duas palestras sobre urbanismo —, em defe- rência ao urbanis ta francês Alfred Agache, que se empenhava então no planejamento de um novo traçado para a cidade. Mas acabou sucumbindo ao convite cordial dos brasileiros, e o re- sultado foi que o esplendor físico do Rio de Janeiro marcou-o profundamente. A cidade, com efeito, é uma das mais notáveis do mundo: extensas praias naturais vigiadas po r u m a cadeia suave de montanhas com uns poucos picos — entre eles o Pão de Açúcar e o Corcovado — projetando-se da paisagem, quais marcos físicos ao longo da costa. Pequenos vales se insinuam entre as montanhas e abrigam pequenos bairros residenciais, alinhados com a praia e acessíveis por túneis. Afirmando que "urbanizar isto aqui é como tentar encher o tonei das Danai- des", 2 9 ele definia a dificuldade inerente a todo e qualquer pla- nejamento urbano para o Rio de Janeiro. Em comparação com os paulistas, os arquitetos cariocas estavam ainda mais atrás dos inovadores europeus. Lúcio Costa — o futuro urbanis ta de Brasília — desenhava villas neocoUt -mais, Üma revivescência do estilo Luís XVI fora o traço pre- dominante da década de 20 no Rio de Janeiro, como se vê pelo Jóquei Clube de 1925, cujos reforços de ferro supor tam um exterior elaborado, imitando a magnificência de um passado perdido. O ecletismo europeu ainda estava em evidência no Rio quando Le Corbusier chegou em 1929. AJboa publicidade em torno das conferências reuniu um pequeno grupo de intelec- t u a i s cariocas na Associação dos Arquitetos, entre eles o cngc- n h e i r o A l b ^ ^ M ú ú í e Ú ^ J l J i ^ l i a l b ^ q u c , aliás, foi quem con- venceu L^TOrmisier a voltar ao Rio em 1936.3 0 29. LE CORBUSIER. Précisions, p. 238. 30. A apresentação de Le Corbusier a Alberto Monteiro de Carvalho está do- cumentada por um cartão de visita de Monteiro de Carvalho quando da via- Précisions Le Corbusier part iu para a Europa no Lutetia, em 10 de de- zembro. Recebera uma cabina especial para dependurar os desenhos de suas palestras — esboços animados, a giz colorido, em grandes folhas de embrulho. Foi também no navio que ela- borou um texto a part ir das notas daquelas palestras. Préci- sions sur un État Présent de l'Architecture et de l'Urbanisme, publicado em 1930, era seu segundo livro or iundo de conferên- cias (o primeiro foi Une Maison — Un Palais, de 1928)._Le Cor- busier abrira um precedente ao transformar palestras im- provisadas em textos impressos, seguindo-se posteriormente: Croisade ou le Crépuscule des Académies (1933); La Ville Ra- dieuse (1933); Aircraft (1935); Quand les Cathédrales Étaient Blanches (1937). Depois de sua primeira palestra em Genebra, em 1924, ele resolvera falar de improviso. Com esse método, achava mais fácil atiçar a platéia e prender-lhe a atenção. Daí por diante improvisou sempre: em Barcelona, na Sorbonne, no Rio, em toda parte. Précisions resumia suas dez conferências em Buenos Aires e descrevia a experiência brasileira em duas partes, "Prologue Américain" e "Corollaire Brésilien", mais um apêndice que revisava o estágio da arqui te tura em Paris e Moscou em 1929. Desde Vers une Architecture (1923) e Urbanisme (1925) que Le Corbusier não produzia uma tese tão abrangente sobre sua filosofia arquitetônica e urbanística. Mais minucioso e menos abstrato, exemplificava suas idéias com proje tos atuais, ilus- trados por esboços sumários que apoiavam o texto. As confe- rências pronunciadas em Buenos Aires consti tuíam o estofo didático do livro, mas as partes referentes ao Brasil e ram verdadeiras descrições líricas da viagem e de sua at i tude em relação ao novo mundo. No final do prólogo, Le Corbusier gem do arquiteto francês ao Rio cm 1929, encontrado nos Arquivos de Le Corbusier em Paris. Onde quer que viajasse. Le Corbusier, terrivelmente pro- penso a esquecer nomes, guardava cartões comerciais e de visita. assim expressou poeticamente sua reação diante desse novo mundo descoberto: "Tentei a conquista da América movido por uma razão impla- cável e pela grande ternura que voto às coisas e às pessoas. Com- preendi, entre esses irmãos apartados de nós pelo silêncio de um oceano, os escrúpulos, as dúvidas, as hesitações e os motivos que explicam a condição atual de suas manifestações. Confiei no ama- nhã, Sob uma luz como esta, a arquitetura há de nascer". O próprio Le Corbusier fez tal visão materializar-se quan- do regressou ao Brasil e traçou o esboço original para o Minis- tério da Educação e Saúde, em 1936. Ao prólogo, seguiam-se as dez conferências de Buenos Aires, à feição de um manual do arquiteto: seis t ra tavam de arquitetura, quat ro de urbanismo. As primeiras abordavam a vocação do arquiteto, salientando a importância de uma edu- cação abrangente que incluísse, além da engenharia e da arqui- tetura, a sociologia, a economia e a política. Na primeira palestra, Le Corbusier atacava a Academia Francesa de Belas- Artes, cuja tradição educacional confinava os arquitetos ao âmbito artístico, com um mínimo de consideração pela enge- nharia e menos ainda pelas outras ciências. A metade das pa- lestras pronunciadas na Argentina era elaborada a par t i r dos aspectos essenciais de sua abordagem da arquitetura. As outras tratavam do urbanismo e do papel do arquiteto no planejamen- to urbano. "Quand tout est une fête." 32 A frase que introduz a seção sobre o Brasil revela uma mudança dramática, em termos de atitude e contexto, relativamente às palestras na Argentina. O "Corollaire Brésilien" revelava o lado poético do arquiteto, tal como se manifestara na Voyage d'Orient, mas se retraíra du- rante o período do purismo. O Rio rejuvenesceu-lhe o espírito e a fascinação pela arquitetura nativa. Pouco depois de sua chegada, visitou as favelas e observou o engenho com que os moradores aproveitavam a vista e os materiais: 31. LE CORBUSIER. Précisions, p. 19. 32. Ibid., p. 233. "Achei os negros fundamentalmente bons, de bom coração . . . Mas que o à-vontade de suas atitudes, o limite que sabem impor às necessidades pessoais, a capacidade íntima de sonhar e sua candura fazem com que suas casas estejam sempre admira- velmente plantadas no chão, janelas abertas de par em par à exu- berância do panorama, o espaço reduzido muito bem-aproveitado . . . o negro ergue sua casa quase sempre no alto, sobre pilotis na frente . . . lá de cima o mar é sempre visível".33 Essa uti l ização compacta e eficaz do espaço já chamara a a tenção de Le Corbusier em Péra, Turquia , no Monastér io Car- tusiano de Ema, e agora no Brasil . Ele se maravi lhou sobre tudo com a visão do mar . S e g u n d o A n d r é Wogen_sky, arquiteto-chefe do estúdio de L e _ C o r b u s i e r j e 1945 j a a A ^ ^ ^ ^ g g p i r a r a j j i ^ r e g ^ ê n c i a de v e r ã ^ e n ^ ^ ^ ^ j j ^ m * * ^ecRnatT3','66 m por" J ^ i h r T — t a m a n h o médio de u m a casa de favela no Rio —, a residência recebeu a inda u m a ampla jane la para o mar . Esse re t i ro em Cap Mart in revivia a visita ao Rio de Janeiro, t inha uma única casinhola per to da praia e oferecia a possibil idade de um bom mergulho mat inal ; mas, sobre tudo, documentava a a t ração de Le Corbusier pelo estilo de vida carioca e a duradoura impressão que a cidade lhe causou. Os planos de Montevidéu_e São Paulo p r e c e d e r a m o do Rio de Janei ro e careciam de fluidez orgânica. Como o de Bue- nos Aires, adotavam rigorosos ângulos retos. Q de .São Paulo, por exemplo, dividia a c idade em qua t ro par tes iguais e j g n o ; raya a ex is tênc ia^e_morTQS_ej jnon tanhas . O de Montevidéu invadia a área do por to com uma enorme es t ru tu ra em T, ocul tando a vista da baía ao resto da cidade. Le Corbusier cunhou, em Précisions, os termo&^gmtíe^err e e gratte-mer 35 para definir os respectivos planos. (Figuras 2, 3, 475] 33. Ibid., p. 10. 34. Entrevista com André Wogensky, Paris, 4 de março de 1981. 35. EE CORBUSIER. Précisions, p. 242. Estes são dois dos muitos termos que Le Corbusier cunhou para definir os aspectos técnicos de sua arquitetura. Uma l is tg j^gwprpnt iLjpssf-s termos, embora incompleta, pode ser encontra- 'S SL e i f f i i f lCKSj Charles. Í J> corbusier ãnd the Tragic View ofÁrchitecture, Cambridgtv-Hlírvard University Press, 1973, p. 190. A mudança radical do rígido traçado geométrico de Buenos Aires, Montevidéu e São Paulo para a fluidez orgânica do pro- jeto do Rio inspirou-se na vista aérea e nos comentários que Cendrars teeia sobre as potencialidades arquitetônicas da cida-" de. Em Buenos Aires, Le Corbusier fora convidado para q ^ o ç ^ j ^ ^ y j j g ^ ^ C o m p a n h i a Sul-Americana de Navegação Aérga, que começava em Assunção, no Paraguai, parando em outras dez localidades. Do aeroplano, ele pôde admirar livremente la loi meandre 36 na beleza tropical do Brasil, comentanda_uo. " P r n / n g » p AYnp.rir.njp"- "O curso dos rios nessas planuras sem fim ilustra serenamen- te a implacável conseqüência da física: a lei da linha de maior jjicl i nação é a vez do comovente t eo rem ado m e a n d r o " ? " ^ ' Le Corbusier asseverou que o projeto do Rio de Janeiro (Figura 2) lhe veio à cabeça durante esse vôo. 3 ^ u b j j a n j g g t g ^ o caminho do menor esforço e estrada para lugar nenhum. 3 9 0 meandro tornou-se para ele uma inspiração: "Uma resposta, um eco, uma réplica. O local falava arquite- tura: a água, a terra, o ar. Esse discurso era um poema de geome- Tria humana e de imensa fantasia natural. O olho via alguma coisa*, duas coisas: a natureza e o produto do trabalho humano .^^j idade Le Corbusier traçou um edifício de apar tamentos encurva- do ao qual se sobrepunha uma auto-estrada que corria, seme- 36. LE CORBUSIER. The City of Tomorrow, Cambridge, MIT Press, 1971, pp. 11-8. O primeiro capítulo do livro é uma discussão do caminho do burro de carga, que segue uma linha sinuosa, em oposição ao homem, que segue uma linha rela porque sabe aonde vai. 37. LE CORBUSIER. Précisions, p. 5. 38. ibid., p. 242. 39. LE CORBUSIER. The City of Tomorrow, pp. 11-2. 40. LE CORBUSIER. Précisions, p. 245. lhante a um verme enorme, do centro da cidade para a praia, acompanhando o terreno acidentado, e ao norte ladeava a baía, rumando para a área industrial. Assim se exprimiu ele a res- peito do projeto: "De longe, vi em espírito o perímetro amplo e magnífico das edificações, com o coroamento horizontal da auto-cstrada^ ligando monte a monte, baía a baía" .4 1 ^ vOflft, T ( 5 D 0 Dlfl O plano urbanístico do Rio de Janeiro foi um dos primei- ros projetos de a lojamento para as classes populares no século XX. Sua j n t e n ç â o declarada era subst i tui r agi|ftve1as r a ^ j ^ j g ^ estas, previa a construção dos apar tamento^cermmetros acima dãs~casas J õ s r i c ó s , propiciando a me lhorHra io possível do mar. O plano possibilitava ainda a Le Corbusier preservar os aspectos positivos das favelas. Entrevistado por ocasião da viagem de 1936 ao Rio, ele resumiu as razões que o levaram a conceber o plano de 1929 e enfatizou a importância do bem- estar psicológico para o homem (perspectiva que o absorveria durante toda a década de 30): "A cidade cresceu de forma descomunal, e possui extraordiná- rios recursos paisagísticos. Meu sonho é permitir habi tant | | jdãs tã lc^5ãr i jsufry^ ^ j p p l e n d m v . s nuLurais: o mar. asmontanhas . . . Essa felicidade penetrará suas casas e corações"?^ O harmonioso prédjo de apar tamentos começava a 40 m do solo e prosseguia por 60 m, em quinze andares, sem pertur- bar as es t ru turas iá implantadas na cidade. Com 6 km de com- primento, podia alojar ^OMjj^j j jessoas^reservando para cada uma 20_m2^de área. Esse espaço, na verdade, era menor que o da célula ^primária de Pessac, que foi o protótipo, porém maior que o das casas de favela em 1929. Os arquitetos brasileiros se espantaram com o sistema de elevadores para o acesso dos automóveis à avenida situada a 100 m do chão, porquanto o 41. Ibid., p. 244. 42. "A Cooperação da Arquitetura e do Urbanismo na Solução do Problema da Favela". O lornat, Rio de Janeiro, 18 Jul. 1936, p. 8. edifício mais alto do Rio, na época, era o do jornal A Noite, completado em 1928 e com 22 andares. O centro comercial desenhado por Le Corbusier previa três edifícios na orla da área central da cidade e avançava pela baía (única semelhança com os outros planos para a América do Sul). O lado humano da arqui te tura socialmente consciente de Le Corbusier costuma ser superestimado; entretanto, é mais que óbvia sua defesa de casas populares para todos. Em 1929, o Rio t inha cerca de 40 mil pobres, com ura crescimento poten- cial de 90 mil a cada geração. 4 3 Le Corbusier predissera o pro- blema "arqui te tura ou revolução" em Vers une Architecture.™ Percebia que a tecnologia do século XX precisava ser compar- tilhada com todos, ricos e pobres, do contrário estes reagiriam como na Rússia de 1917. Não raro lhe aplicaram a pecha de bolchevista, porque t rabalhara na Rússia depois da revolução, muito embora fosse mais um igualitarista social em oposição à atividade política. Le Corbusier observava e reagia aos pro- blemas do século XX com uma visão utópica freqüentemente fora do alcance da compreensão dos ouvintes. A sinuosa fluidez do plano e o emprego de uma avenida suspensa, que chamara a atenção de Le Corbusier na fábrica da Fiat em Turim, em 1920,45 dão ao projeto do Rio de Janei- ro lugar de destaque no repertório urbanístico de Le Corbusier e consolidaram a tendência orgânica de seu trabalho. Entretan- to, uma análise mais acurada revela que, além de criar uma paisagem inspirada, Le Corbusier desenvolveu um formato urbano e arquitetônico bastante lógico, apropriado ao caráter dramático do ambiente e não especificamente orgânico. Desde a época de estudante em La Chaux-de-Fonds, sob a Orientação de Charles L'Eplattenier, Le Corbusier manifestava deliberada concordância com Own Jones em seu respeito pelos elementos 43. LEVINE, Robert. The Vargas Regime, Nova Iorque, Columbia University Press, 1970, p. 193. 44. LE CORBUSIER. Towards a New Architecture, Nova Iorque, Praeger Pu- blishers, 1972, p. 249. 45. Ibid., p. 267. inerentes ao traçado natural, sem entretanto reproduzi-los ou copiá-los literalmente. Em Vers une Architecture, estabelecia que: "Nos conjuntos arquitetônicos, os elementos do meio desem- penham um papel graças a seu volume cúbico, a sua densidade e qualidade do material de que se compõem . . . Os elementos do meio se erguem quais muralhas armadas com o poder de seu coe- ficiente cúbico, estratificação, material etc., como as paredes de um quarto".46 Assim, o plano realizava a concepção de Le Corbusier de uma integração arquitetônica com o meio, conforme ele pró- prio estatuíra em Vers une Architecture, mas em termos antes composicionais que orgânicos. A mesma idéia reapareceria no plano Obus A para a Argélia, em 1930. Le Corbusier desenhou uma rede de es t ruturas abstra tamente encurvada que não leva- va em conta o terreno em prol da composição; não se notava o menor empenho de organicidade relativamente à paisagem, bem ao contrário do que Mary McLeod asseverou na tentativa de provar, com os planos para a Argélia, o organicismo emer- gente na carreira do arquiteto. O argumento de Mary McLeod se fundamentava no interesse político de Le Corbusier pelo sindicalismo radical . 4 7 Outro ponto que contradiz sua análise é que os planos para o Rio de Janeiro e a Argélia foram os únicos dos primórdios da década de 30 a adotar uma integração com a paisagem. Todos os outros projetos de Le Corbusier a part ir desse período — como a reurbanização de Genebra, Estocolmo e Antuérpia (1933), e, em especial, o vale do Zlin na Tchecos- lováquia (1935) — eram rígidos e inorgânicos como os de São Paulo e Buenos Aires, ainda que esses sítios pudessem, qualquer deles, ensejar um traçado orgânico, se tal fosse a in- tenção precípua do arquiteto. Os estudiosos têm dividido a carreira de Le Corbusier em períodos distintos, apontando o plano do Rio de Janeiro, de 1929, como marco principal: antes de 1929 sua obra era racio- 46. Ibid., pp. 177-8. 47. MCLEOD, Mary. "Le Corbusier: Algiers", Oppositions 19/20:55-85. nal e geométrica, depois de 1929, orgânica e poética.4 8 Isso pode, academicamente, simplificar a gradua! emergência de uma manipulação da forma e do material, mas a verdade é que desde o início de sua carreira a obra de Le Corbusier revelou formas poéticas e sensuais encaixadas num esquema racional. O vocabulário do período purista jogava com "violões", "ca- chimbos" e "garrafas", objetos dos mais comezinhos, porém sua interpretação estruturada pode revelar, não raro, um toque sensual. Em Natureza-morta com Pilhas de Pratos (1920), uma série de silhuetas superpostas e dominadas por bordas encur- vadas de violões e garrafas produzia uma composição fluida, tão sensual quanto o pro je to do Rio de Janeiro, dentro de um formato estruturado. A curva purista do violão silhuetado — lembrando de imediato as curvas macias de uma mulher recli- nada —, que começou a aparecer desde 1929 nos desenhos e pinturas de Le Corbusier, foi posteriormente adotada no sofá embutido do banheiro da Villa Savoye. A obra de Le Corbusier era racional na concepção, mas sensual na expressão, isso desde o começo do período purista e ao longo do desenvolvimento de sua própria arqui te tura: de dentro para fora. Na Villa La Roche (1923-24), ele adicionou um toque plástico ao interior com a base da escada arredondada e a rampa interna em curva, a qual se dobrava também para fora. A manipulação plástica da forma se limitava inicialmente a pequenos detalhes, mas, depois, impôs-se, como no caso de Notre Dame du Haut, em Ronchamp (1950), sua afirmação mais dramática de arquitetura esculpida. Em que pese a tudo isso, as raízes desse avanço rumo à plasticidade já estavam firmemente estabelecidas du- rante o período purista. Nesse contexto, o projeto do Rio de modo algum assinala um abandono do racional, e sim uma ma- nifestação mais pronunciada de detalhes sensuais, já presentes na arqui tetura e na pintura do arquiteto. Tais detalhes se tornar iam ainda mais significativos para ele no correr dos anos 30. 48. MCLEOD, Mary, "Le Corbusier: Algiers", Oppositions, 19/20:55; ver tam- bém: JENCKS, Charles. The Tragic View of Architecture, pp. 99-133. Charles Jencks divide a carreira de Le Corbusier de maneira semelhante, classificando o período 1928 a 1945 como de transição. Le Corbusier: uma visão geral (1929-1936) Durante a década de 30, Le Corbusier lutou para harmonizar a arqui tetura e o urbanismo num todo político e social con- sistente, buscando, ao mesmo tempo, uma autoridade que o apoiasse. Expôs suas idéias sobre reestruturação do ambien- te urbano já nos anos 20, mas então ainda não extrapolava o domínio da arquitetura. Nos anos 30, porém, sua concepção invadiu a esfera da arqui tetura enquanto utopia social. Por essa época, quer emprestando apoio a publicações sindicalis- tas, quer tentando resolver os problemas sociais com seus próprios escritos, tornou-se um idealista em demanda de um mundo mais harmônico. Os utopistas do século XIX, como Saint-Simon, Charles Fourier, Victor Considèrent e Pierre Joseph Proudhon, conceberam uma sociedade harmonica em que todas as necessidades humanas fossem satisfeitas; Le Cor- busier, tendo estabelecido uma arqui tetura tecnicamente fun- damentada e capaz de atender aos reclamos físicos do homem, começou a ocupar-se da dimensão social e psicológica do ser humano. Os primeiros cinco anos da década de 30 foram de inten- sa atividade. Com a Villa Savoye já em obras, Le Corbusier part iu para a planificação do Pavilhão Suíço, dos prédios de apar tamentos Immeubles em Paris e de duas residências de fim-de-semana. A esse tempo, começava a integrar materiais texturizados à sua arqui te tura , contrastando superfícies poli- das e brilhantes. Mais: a cada dia seus desenhos se tornavam mais inerentemente plásticos, exibindo as linhas fluidas subja- centes à pintura purista que praticava. A parede de pedra sob a abóbada polida, em seu apar tamento de Nungesser-et-Coli (1933) — um dos Immeubles em Paris —, era só o começo. A casa de fim-de-semana nos arredores de Paris, de 1935, criava contrastes ainda mais dramáticos entre os materiais t irados do local, jus tapondo madeira, concreto, pedra, vidro e telhas, além da pintura e da escultura. No desenho da sede do Minis- tério tia Educação e Saúde, L e ^ ^ j ^ ^ j ^ ^ j g y ^ ^ j g s p o n s á v e l nela iSüflg^SÉif^" empjE6®û^^J3aaiermi.s contras tantes, ..como g i a m t a ç az^leio. Também encorajou a adição de esculturas e pinturas, o qite fez do edifício uma afirmação cabal das reali- zações artísticas brasileiras na década de 30.49 Nos anos 20, Le Corbusier introduziu a policromia na arquitetura; nos anos 30, além da textura, as artes plásticas se tornaram par te integrante do desenho básico, demonstrando uma faceta de sua tentativa de criar um ambiente harmônico: "Arquitetura e artes plásticas não são meramente duas coisas justapostas: são um todo sólido e coerente. Na própria substância do fato plástico impera a unidade: escultura, pintura, arquitetura, volume . .. e policromia. 0 corpo do edifício acabado é a expres- são solidária das três artes maiores".50 Com a integração das artes plásticas à arqui te tura . Le Cor- busier reafirmava seu interesse no grupo De Stijl, art istas e arquitetos holandeses que, nos anos 20, t inham sido responsá- veis pela reintegração das artes à arqui tetura, objet ivando criar harmonia para o homem enquanto indivíduo e enquanto par te da sociedade, tudo isso por meio de um equilíbrio de con- trastes. Depois de 1933, o urbanismo ganhou precedência, embo- ra planos e mais planos fossem rejeitados. Os projetos da Argé- lia ocuparam Le Corbusier de 1931 a 1942, e seus outros planos de renovação urbana tiveram o ponto de part ida na reunião do CIAM,51 em 1933, que produziu a "Carta de Atenas". Essa "Carta" sumarizava o estudo de 33 grandes cidades, e Le Cor- busier dominou a reunião, que estratificou o urbanismo em quatro categorias: 1. alojamento, 2. trabalho, 3. lazer e 4. trans- porte. Le Corbusier reiterou esses princípios no livro La Ville Radieuse (1933), detendo-se na sociologia urbanística, no empe- 49. Entrevista com José de Souza Reis, Rio de Janeiro, agosto de 1981. 50. DAMAZ, Paul. Art in European Architecture, Nova Iorque, Reinhold Pu- blishing Corp., 1956, p. 29. 51. Pietro Maria Bardi, o crítico de arte italiano que se mudou para São Paulo em 1947, pagou a passagem de Le Corbusier para o Patris II, que trans- portou os arquitetos do CIAM de Marselha a Atenas, ida e volta. Entrevista com P. M. Bardi, São Paulo, junho de 1981. nho de satisfazer às necessidades psicofisiológicas do homem. 5 2 A cidade luminosa distribuía eficientemente as 24 horas do dia, especificando o tempo gasto no trabalho, no lazer, no sono. Ademais, o -livro -s^bdMdia^as necessidades psicofisiológicas do homem ^ i n a . ã n coletiva e l iberdade individual, ten- tando definir também um complexo arquitetomco-urDamstico (cidade e campo) que lograsse satisfazer a ambas. O livro de- monstrava a necessidade de opor a harmonia ao caos. Harmonia era o que intentava Charles Fourier no começo do século XIX, quando planejou uma sociedade utópica alojada numa pgtmtiira, n Fa 1 ajTgtgrin. onde as paixões sociais eram disciplinadas. Fourier argumentava que a sociedade poderia atingir uma condição harmônica através da atração passional, instigada de início pela sociedade e posteriormente responsá- vel pelo caos dessa mesma sociedade. As paixões de Fourier lembram imediatamente a tentativa de Le Corbusier de aten- der ao aspecto psicofisiológico do homem, já que ambas de- pendiam da s a . t i s f a ^ ^ ^ i m ô n i c a du i n d i y i c l ^ g ^ ^ ^ ^ u j ^ g i i ^ L c o m u n i t á r i o ^ a f f r a v e ^ i ^ n n e ^ e a ^ m j a ^ ^ íHIocieaaaelSabemos que Le Corbusier estava a par das teorias de Fourier graças a referências casuais que fez no final da dé : cada de 40." As idéias utópicas de Le Corbusier t raem a in- fluência da visão social de F"iiri°j; ff nidinijnjm na Unité d'Ha bib tation (1946-1952), em Marselha, que adota e&tùaliza inúmeros aspectos dõ Falanstério, conforme salienta Peter Sàrenyi..54 Se- renvi realçou a importância da célula individual-due Le Cor- busier viu pela primeira vez ntTMonastério atnenranïo~Orienté~ MStttõ. A tentativa de Le Corbusier de satisfazej^as necessida- des individuais e sociais do hom^m-e»HiHi£»--TOmplexo habita- cional auto-suficiente se baseava na construção compartimen- tada daquele monastério. Entretanto, poder-se-ia fazer outras 52. LE CORBUSIER. The Radiant City, New York, Grossman, Orion Press, 1967. A palavra psicofisiológico Foi inventada por Le Corbusier e usada pela primeira vez em La Ville Radieuse. 53. Para referências de Le Corbusier a Charles Fourier, ver: LE CORBUSIER. Manière de Penser sur t'Urbanisme, Paris, Edition Denoel, 1946, p. 44, e LE CORBUSIER. "Unité d'Habitation de Marseille", Le Point, nov. 1950. 54. SERENYI, Peter. ^'Le Corbusier, Fournier and the Monastery of Ema", Art Bulletin, dez. 1967, ppT 277-87. comparações entre os dois homens no tocante à sua visão da interação social. À semelhança da cidade e da fazenda radiante, o Falansté- rio de Fourier dividia as atividades humanas pelas vinte e qua- tro horas do dia, dest inando tempo ao sono, ao trabalho, ao la^" zer. As atividades sociais do Falanstério se cumpriam na Bolsa, instituição não apenas de economia, mas também de passatem- po: "Cada um se dirige, tanto quanto possível, à Bolsa, onde se encontra bastante distração, graças à complexidade do jogo". 5 5 A Bolsa era ainda um ponto de encontro bem no centro do Falanstério: "Nas bolsas de Harmonia, cada qual deseja mani- festar suas intenções e torná-las conhecidas de toda a assem- bléia".5 6 As atividades econômicas e sociais da cidade-radian- te de Le Corbusier se concentravam no Clube, que as com- binava da mesma maneira que a Bolsa de Fourier: "O Clube é lugar de reuniões amistosas, de negócios, sociais, políticas; é lugar de divertimento (cinema, teatro e tc . ) " . 5 1 Ademais, i m a - ginara os moradores alojados num grande prédio de aparta- mentos próximo ao Clube, algo assaz parecido à comunidade" formulada por Fourier. Para este, os moradores seriam fazen- deiros a cultivar sua própria terra, mas residentes num locãT comunitário, o Falanstér io 1_ A idéia de um alojamento central, dentro de uma cidade cujas atividades de lazer pudessem ser organizadas, encon- trou duas outras propostas nos anos 30. A primeira está na III Conferência de Le Corbusier, pronunciada no Rio de Ja- neiro em 1936. Ali, apresentara ele a idéia de laboratórios de dos n o s c n S m S j ^ ^ ^ ^ ^ S S T M a i s tarde, e s s e ^ a b o r a t ó r i o s se t r ans to rmara r rwí^M useu do ^CóhhecTmento, sugestão feita p a r a o campus da Universidade^ Federal do Brasil^ no Rio e^ derivada da concepção de Le Corbusier de u m museu em per- pé tuo^resc imento . A idéia original aparecera sob a forma de 55. FOURIER, Charles. Des Manuscripts de Chartes Fourier, Paris, Librairie Phalansterienne, 1851, tomo I, p. 103. 56. Ibid., p. 193. 57. LE CORBUSIER. Oeuvre Complète 1934-1938, Zurique, Les Editions d'Ar- chitecture, 1975, p. 114. um Museu Mundial do Mundaneum (1929). O proje to ia além de um mero edifício onde se exibisse arte, era antes um nú- cleo de reunião p a r a os joyens_cont_endo cinemas, teatros, o rF cinas e bibliotecas. • — La Ville Radieuse abordava o tema da autoridade, assun- to que preocupou Le Corbusier Ha década-atje 3$. J gtauele, autor ida de significava. u m individuõ~~õu~ um grupo esclare- cido guindado ao poder. No livro, definia a au tor idade ideaT como umjCTfl d.p. fa^le™ isto j ^ y j g ^ p a r a ^ o s seus; contudo, a verdadei ra autoridade estava associada ao tflUflSõ da politisa. O modelo tradicional não era outro senão Luís XIV, cuja encomenda de Versalhes dera_a Colbert _a oportunidade "que L ê Corbusier t a n t o ^ ^ b i c í õ n i v a . Aliás, ele mesmo o confessa em Précisions: "Há anos sou per- seguido pela sombra de Colbert". 5 9 No século XX, a constru- ção de novas capitais reafirmaria esse senso de autoridade. Brasília exemplifica o ressurgimento de uma autoridade es- clarecida: foi proje tada por Lúcio Costa, com arqui te tura de Oscar Niemeyer, sob os auspícios do presidente Juscelino Kubitschek. Já no final da carreira, Le Corbusier pensou des- cort inar um símbolo de autoridade em Nehru, pela encomen- da que este fez de projetos para os edifícios governamentais de Chandigarh. Le Corbusier foi atraído por diversas filosofias políticas na procura de uma autoridade capaz de criar harmonia; en- tretanto, jamais foi adepto ferrenho de nenhum movimento. Após a revolução russa, os comunistas lhe pediram que de- senhasse o Centrosoyus (1928-1934), e, mais tarde, elaborou o plano para o Palácio dos Sovietes (1931). O que fomentara suas esperanças fora a oportunidade de t rabalhar na Rússia in tentando pôr em prática a arqui te tura e o urbanismo da era da máquina. E l e se r i a . por a s g ^ g j ^ r e r ^ Q ^ _ m a s Stálin pôs tudo a p e r d e r J ^ ] ^ Nos anos 30, Le C o rb u s iei i colabor ou ativamentg _eip dois jornais. Plans (1931-1933) e Prélud e f 1933-193.51. responsáveis 58. LE CORBUSIER. The Radiant City, p. 228. 59. LE CORBUSIER. Précisions, p. 187. pela disseminação do sindicalismo e defensores da idéia de sc transferir o controle da produção aos trabalhadores sind'i- ^ "balizados, se necesiSno com recurso à luta armada. O Siovl-™' "ffleKfB^STÇirfçDU reconhecimento entre 1890 e 19Í4, mas, após a Primeira Grande Guerra, os direitos dos operários franceses foram sufocados por uma ordem nada flexível. 60 Com a Fran- ça ocupada pelos alemães durante a Segunda Guerra Mundial e os líderes sindicalistas mancomunados com o governo de Vichy, Le Corbusier ofereceu-se para colaborar numa política de moradia e até elaborar um projeto para a reconstrução do pós-guerra. 61 A origem do interesse de Le Corbusier pelo sindicalismo e de suas tentativas para criar uma sociedade utópica pode ser rastreada desde sua cidade natal. E1ê__sê criou em La Chaux- de-Fonds, no coração do Jura, Suíça ocidental. O Jura fora notável pelos movimentos anárquicos de 1860 e 1878, mais tarde substi tuídos por formas de socialismo e_ sindicalismo. Lênin conhecera alguns habi tantes do local e ali discursara em 18 de março de 1917, logo após a abdicação do czar Ni- co lau ." Fourier chegar fi r r i f f g T n n a pingar a região como exem- plo da atração passional em sua organização sócio-política. 5 7 " A indústria principal do cantão era a de relógios; entretanto, no século XIX, a produção agrícola também era significativa, e os produtos eram distribuídos pro rata entre os contribuintes. A vida se caracterizava jqo Jur a pela absoluta igualdade so- cial entre seus habitantes, que viviam nas imediações do lo- cal de trabalho. A vida erã rigidamente controlada, porquanto o comércio, a indústria e as atividades artesanais abriam c fechavam ao mesmo tempo. No século^XX, j i agricultura e a relojoaria se dividiam por famílias, e os Jeanneret , família de 60. STEARNS, Peter N. Revolutionary Syndicalism and French Labor: A Cause Without Labor, Rutgers, N. J., Rutgers University Press, 1971, p. I. 61. VON MOOS, Stanislav. Elements of a Synthesis, p. 214, 62. SEKLER, Mary Patricia May. The Early Drawings of Charles-Edouard Jeanneret, p. 8. 63. BRISBANE, Albert. Social Destiny of Man, Filadélfia, C. P. Stollmeyer, 1840, p. 32. Informação colhida diretamente das notas de Fourier por Brisba- ne, que as traduziu. Le Corbusiet\ se ocupavam da últ ima. As longas horas de té- dio e a cansativa meticulosidade do trabalho dos relojoeiros faziam-nos procurar o intercâmbio social à tardinha, compro- misso essencial do quotidiano. Vemos daí que as propensões políticas do arquiteto podem ser compreendidas relacionando- se a es t rutura social de seu cantão aos contatos políticos que encetou durante os anos 30; está aí também a origem de sua tentativa de recriar a vida harmoniosa do Jura nos projetos urbanos. Apesar cie tudo, "suã^TÍgaçãcTcom ~a política itücr-pas- sava de uma busca que o levasse a alguma autoridade inspi- e n c õ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ j ^ ^ ^ B B ^ d e Le Corbusier se adapt; > um"'3ã3fÕ^ltem a politico quando havia oportunidade r n a - terializar^sgus planos, quer t rabalhando parados comunistas da~Russia ou parlTa di tadura de Vargas no Brasil .6 4 64 Nos anos 30, Le Corbusier trabalhou para o regime comunista da Rússia, para a colônia francesa da Argélia e para a didatura demagógica de Vargas no Brasil. Tendo oportunidade de trabalhar, pouco lhe importava a política local. Achava que um arquiteto não deve assumir o papel de político, ' l l enho afirmado que a.política e qs^jjrojetos arquitetônicos são duas coisas diversas, dflis fenAmgnos que, requerem indivíduos de" sangue diferente. " LECORBU- SIER. "Le Congrès Internationaux d'Architecture Moderne: Légifèrent sur des Bases Nouvelles", VI Conferência, Insti tuto Nacional de Música, Rio de Ja- neiro. 14 de agosto de 1936, p. 1. Contexto Arquitetura moderna brasileira antes de 1936 O desenvolvimento da arquitetura moderna no Brasil teve seu ponto de part ida na Semana de Arte Moderna de 1922, paralelamente ao que ocorria em outros países da América Latina; entretanto, o Brasil se destacou, nos primórdios do século, por um grupo inovador de engenheiros que aprimo- rou a tecnologia do concreto armado, e de arquitetos e en- genheiros iconoclastas que atualizou o currículo da Escola Nacional de Belas-Artes. Essas realizações prepararam o Bra- sil para a visita de Le Corbusier em 1936 e a implantação de suas teorias. O orgulho nacional e as reformas sociais t ransformaram as artes, na América Latina, durante a primeira metade do século XX, num veículo para a expressão vernacular. A dita- Être, ou ne B.Q.S etre. Le passe. L avenir. On napasfini de découvrir te Brésil que vit au jour le jour. Est-ce sa force ou sa faiblesse? Biaise Cendrars, Le Brésil des hommes sont venus. dura de Vargas (1930-1945), a revolução socialista no México (1910) e o regime de Perón na Argentina (a part ir de 1945) nasceram do desejo de exprimir o nacionalismo e o individua- lismo em oposição à dominação européia. A consciência nacio- nal encorajou os artistas a se revoltarem contra os precedentes estrangeiros e em favor de uma expressão local. No México, o Novo Realismo Pictórico ganhou vida nos murais de Diego Ri- vera e David Siqueiros, e, mais tarde, na arqui te tura de Juan O' Gorman. Praticamente todo país latino-americano insuflou alguma forma de nacionalismo nas artes: por exemplo, a re- volta contra a Academia de San Alejandro, em Cuba, lidera- da pelo pintor Victor Manuel, em 1924; o Salão de Maio do Sindicato dos Artistas e Escritores Equatorianos, em 1939; e a Semana de Arte Moderna de 1922, no Brasil . 6 S Esses grupos encora jaram a busca de uma arte nacional, fosse ela, na ori- gem, neocolonial, primitiva, moderna ou autóctone. A pesqui- sa das raízes nacionais visando à inspiração artística era um passo que os países da América do Sul deviam necessaria- mente dar já no início do século, para se l ibertarem do neo- clássico e dos demais estilos cultuados nas escolas de belas- artes, antes de part i rem para o modernismo internacional. Uma vez que a arqui te tura colonial era inerentemente funcio- nal, uma busca de expressão vernacular talvez tenha propi- ciado o desenvolvimento do moderno estilo funcional e pro- movido uma arqui te tura fundada em necessidades locais. In- felizmente isso nem sempre aconteceu, e, após um breve in- terregno de expressão nacionalista, os países sul-americanos voltaram a imitar os protótipos europeus. Uns poucos desta- cados iconoclastas persistiram, outros ou adotaram a repre- sentação indígena ou passaram a copiar padrões europeus, desconsiderando as condições ambientais. O Brasil emergiu do academicismo do século XIX com a Semana de Arte-Mo^erna, ocorrida em São Paulo no mês Tie feverei ro) deV1922. O evento, simbolicamente, marcava a independência da influência artística européia, já que na oca- sião se comemorava o centenário da Iii^epeíidênçja. O movi- 65. CASTELO, Leopoldo. iMtin American Art and Architecture, pp. 222-32. mento tendia para o nacionalismo e a revivescència dos va- lores indígenas, bem como para o futurismo, passado ao Bra*- sil pelos jornais italianos. Paulo Prado financiou o grupo van- guardista, que assim se transferiu de uma livraria para o Tea- tro Municipal, onde um público bem maior podia presenciar o acontecimento. A arquitetura, porém, desempenhou um pa- pel menor nas festividades. Houve concertos de Villa-Lobos, leituras de Graça Aranha, declamações, coreografias e uma exposição de quadros de Di Cavalcanti, Lasar Segall e Anita Malfatti, bem como esculturas de Victor Brecheret. Quem re- presentou a arqui te tura foi o espanhol Antonio Garcia MoyaT apresentando esboços visionários de estruturas inspiradas em sua visão pessoal, noturna, do futurismo. De dia, Moya dese- nhava casas em estilo neomourisco e espanhoL .tradicional. Sua contribuição para a arqui te tura brasileira é irrelevante, masa_Semana^ em_si, despertou o interesse do púb l i cope l a s artes e deu aos artisJifr n o V u O evento criou um ^ V f l f l f ^ W g " à chegada de War- cnavchik em Câsa, na- Vila Mariana, tanto impres- sionou Le Corbus ie ix j t i ' lgBftlEm 1925^Warchavchik apresen- tou suas idéias n i y r i A a ^ S m W o n e i r o ^ ^ p ^ ^ r e a t m ^ sobre arqui tetura f u n c i o i i a t ^ s ^ ^ ^ ^ y j ^ j ^ y t e t i j j y ^ g d e n i a ^ ^ Nes- te que foi o primeiro artigo do , o autor citava a~"máquina para se mora r" de LeCüfbúsier , dis- cutindo a beleza estética do automóvel. Poucos meses depois, Rino Levi, jovem arquiteto brasileiro então es tudando na Itá- na^escrcveu a um jornal paulista expondo o que acontecia na Europa enTtermos de arqui te tura moderna, relacionando-a com o urbanismo. Esses artigos apareceram no mesmo ano em que Gropius publicou Internationale Architectur, que repas- sava o desenvolvimento da arqui tetura moderna em toda a Europa e levou Alfred Barr a classificar o movimento como 66. 0 artigo de Warchavchik. "Acerca da Arquitetura Moderna", foi inicial- mente publicado no jomal italiano II Piccolo, a 14 de junho de 1925, em São Paulo, sob o título "Futurismo", e, em I," de novembro de 1925, no Correio da Manhã do Rio de Janeiro, sob o título "Acerca da Arquitetura Moderna". FERRAZ, Geraldo. Warchavchik e a Introdução da Nova Arquitetura no Bra- sil: 1925 a 1940, São Paulo, Museu de Arte de São Paulo, 1965, pp. 20-40. estilo internacional. 61 Em 1925, já os preceitos da _arquitetura moderna estavam firmados no Velho Mundo; no Brasil, e n : tretanto, tudo apenas começava. O problema de introduzir a arqui tetura moderna no Bra- sil, em 1929, não se restringia simplesmente a al terar perspec- tivas pessoais ou ati tudes tradicionais frente à arte: era pre- ciso criar toda uma infra-estrutura industrial que sustentas- se os novos métodos de construção. Depois de 1925 e antes da chegada de Le Corbusier em 1929, pouca coisa se fizera. A casa de Warchavchik surgira do trabalho artesanal: os moldes das janelas foram feitos à mão, e os construtores da es t ru tura receberam orientação especial para o preparo do concreto ar- mado. 6 8 Aço, cimento e vidro vinham da Europa. 0 Brasil, em- bora república desde 1889, ainda se ressentia de uma econo- mia colonial, exportando matérias-primas e importando ma- nufaturados. Em 1900, a Estação da Luz, em São Paulo, fora trazida peça por peça da Inglaterra e montada no local. Até 1950 costumava-se importar materiais da Europa: cimento da Noruega, terracota da França, ferro da Inglaterra. A despeito — ou talvez por causa — da dificuldade em obter material, o Brasil teve inúmeros engenheiros inovado- res, que promoveram o uso do concreto a rmado no país. Em 1912, um estudante de Hennebiaue. R. Ri^dlinger . fundou a Companhia Constrüttífa em CTmemo Armado n o 1 Rio de Ja- neiro. Sendo a mão-de-obra barata o principal recurso brasi- leiro, a utilização do concreto armado era facilitada, já que este requeria aplicação intensiva de trabalho. A empresa de Riedlinger atraiu muitos estudantes de engenharia como apren- dizes, e Emí l i^Baumpar ten^ t ornou-se seu aluno predileto O t a l e n t o i n s t t n t i v ^ a ^ B a u m g ã r t e n foi saudado em 1931 no Engineering News Record, 69 num artigo sobre a ponte Her- val sobre o rio do Peixe, em Santa Catarina. Baumgarten pro- jetou uma viga em balanço com 68 m, construída sem esco- 67. BANHAM, Reyner. Theory and Design in the First Machine Age, Nova Iorque, Praeger Publishers, 1967, pp. 274, 287. 68. FERRAZ, Geraldo. Warchavchik e a Introdução..., p. 51. 69. SCHJODT, Rolf. "Long Frame Methods", Engineering News Record, 6 ago. 1931, pp. 208-9. ras. A atmosfera progressista reinante no país nos anos 30 possibilitou o fato de que Le Corbusier introduzira uma me- todologia aplicável ao contexto local numa época em que o predomínio do concreto armado só carecia de um quadro fun- cional a que pudesse se adequar. t a m b l ^ ^ X ^ ^ I ^ J ^ ^ ^ ^ ^ g ^ s t ü d á t e de engenharia, iniciou a revista em 1932 sob o título de Revis- ta da Diretoria de Engenharia da Prefeitura do Distrito Fe~ aeral, conhecida depois de 1935 como PDF, apenas. PDF fora fundada pelo governo, mag que permitiu a Carmem (Pòrtinho ÍSansformá-Ia numa revista de vanguarda para a arqtritelufa^rnoderna e a engenheira tecno^ logicamente avançada. Casada com Affonso Eduardo IJeidy, "um dos arquitetos da sede do Ministério da Educação e SatP" de, publicava projetos do marido e dos amigos deste, alguns dos quais surgiam com destaque na nova g e r a ç ã o ^ ^ ^ ^ j ^ ^ ^ J j ^ ^ y ^ ^ g y j ^ y y j ^ ^ t i ^ ^ y e a j j ^ a t L a ^ e forcejava por mos- T r a ^ a s t en t a t i va sve rdaae i r amen t^p rog re s s i s t a s da arquite- tura moderna da época.7 0 A Semana de Arte Moderna criou urqa (.atmosfera ppsitiva para o incremento da ar te e da a rqui te tura medemas ' l i o país. TMas as Idéiâü aVüByAdàs da Europa so se institucionalizaram quando Lúcio /j£fost a^£gi nomeado diretor da Escola Nacional de Belas-Arteq. (Lúcio yos ta nascera erri Toulouse, Fl'ança, et*n 1902, e estudara^-pintura e arqui te tura na Escola Nacional de Belas-Artes do Rio de Janeiro. Formado em 1924, participou da revivescência do neocolonial popular durante a década de 20.71 Atraíra-o o racionalismo intrínseco das construções colo- niais brasileiras, e, após a visita de Le Corbusier em 29, vis- lumbrou algo similar nos princípios que este últ imo apregoa- va. Entretanto, a transição não foi fácil. ÈTele mesmo quem afirma, a propósito da passagem do nacionalismo ao moder- nismo: "E faz lembrar as primeiras tentativas do cinema so- 70. Entrevista com Carmem Portinho, Rio de Janeiro, julho de 1981. 71. Lúcio Costa é ainda hoje uma autoridade destacada no campo da arqui- tetura colonial, e trabalha para o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, a entidade brasileira para a preservação dos bens históricos. noro — quando, com a boca já fal ando, o som ainda jcorria a t rás" . 7 2 Com apenas vinte e oito anos à época da nomeação, atualizou os métodos antiquados da Escola Nacional, ado- tando a abordagem funcional da Bauhaus e de Le Corbusier. "Manteve todos os professores antigos, mas convidou vários arquitetos e engenheiros jovens a ensinarem na escola, ins- tando-os à elaboração de um currículo voltado à funcionali- dade. Qs^mãis destacados eram: em composição arquitetôni- ca, jWarchavchik;! em engenharia, Alexander Baddeus, recém- chegado da Algmanha; em escultura. Celso Antônio, discípulo e assistente de Antoine Bourdelle. Com Baddeus e outros técnicos na escola, abria-se uma nova era para a arqui te tura no Brasil. Antes, o país imitava a Academia Francesa de Belas-Artes, onde os arquitetos só po- diam aprender construção à própria custa. No Brasil, os pri- meiros cursos de engenharia apareceram em 1923, na Escola Politécnica de São Paulo, onde se estudava engenharia estru- tural durante um ano. No mais, os engenheiros_brasiIeiros eram pedreiros autodidatas. Regulamentos de construção qua- se não existiam antes de 1930, e qualquer um podia pro je ta r e construir . 7M3addeus recebera influência da Bauhaus e intro- duziu urjMÍovo vocabulário sob uma perspectiva técnica, am- parandó-se em dgis—jornais aiem35s--pQpulares, Die Forme e Modern Bqiiftfrmen.™ As poucas empresa^-de engenharia exis- tentes^«ro Brasil em 1930 eram dirigidas por alemães ou euro- peus do norte; sua influência, no entanto, era mfaúma até o momento em que Baddeus começou a ensinar. As reformas de L u c j o C o s t a p r o v o c a r a m tensões entre os patrocinadores oficiais da escola, e, transcorrido um an,o e meio. ^ o i ^ ^ n ^ ^ ^ ^ i ^ ^ L r ^ t e s ^ e a g i r a m c o j g y j m a tíic\c de seis meses: o currículo novo VençeùTEssês "és tudantes formaranTa^geração cfearquitetos que," depois, representaria o Brasil no Museu de Arte Moderna de NoV^Tõrque, em lv43, com a most ra Brazil Builds, e con^ti- 72. COSTA. Lúcio. Sobre Arquitetura, p. 18. / 73. BOASE,Açlhur . "South American Building is Challenging", Enguieering News Record, 1944, pp.
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