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Unidade 2 Cinemática da partícula 2.1 Deslocamento A análise do movimento é um problema fundamental em física, e a forma mais simples de abordá-la é considerar primeiro os conceitos que intervêm na descrição do movimento, sem considerar suas causas. A cinemática (da palavra grega kinematos, que significa movimento) tem por objeto de estudo as descrições dos movimentos, fornecendo a linguagem necessária para descrever como os objetos se movem, sem considerar ainda o problema de como determinar o movimento que se produz numa dada situação física, o qual é objeto de estudo da dinâmica. Um corpo pode mover-se de duas maneiras basicamente diferentes: pode mudar apenas sua orientação, ou pode mudar apenas sua localização. No primeiro tipo do movimento, o corpo modifica sua orientação girando em tomo de seu centro (movimento de rotação pura), enquanto mantém fixa a posição deste ponto. No segundo tipo do movimento, o corpo muda sua localização variando a posição do seu centro e, enquanto isso, não gira em tomo deste ponto (movimento de translação pura). Naturalmente, um objeto também pode experimentar ambos os tipos de movimento simultaneamente. Mas num primeiro momento será descrita apenas em mudança de localização, ou seja, apenas o movimento de translação. De início será descrito apenas o movimento de um corpo ideal, que será denominado partícula, evitando-se complicações na descrição do movimento. Matematicamente, uma partícula é tratada como um ponto, um objeto sem dimensões, de tal maneira que rotações e vibrações não estejam envolvidas em seu movimento. Realmente, um objeto sem dimensões não existe na Natureza. Entretanto, o conceito de “partícula” é muito útil porque os objetos reais, com boa aproximação, muitas vezes se comportam como partículas. Para ser tratado como partícula, um corpo não precisa ser “pequeno”, no sentido comum que se atribui a esta palavra. Por exemplo, a Terra e o Sol, em relação à distância que separa estes dois astros, podem ser considerados como partículas e pode-se, sem erro apreciável, descobrir muita coisa sobre o movimento do Sol e dos planetas, tratando estes corpos como partículas. Para descrever o movimento é necessário haver um referencial. No caso do movimento em uma única direção (movimento unidimensional), um referencial adequado é uma reta orientada em que se escolhe um ponto tomado como origem (o ponto O na Figura 2.1). A posição da partícula em movimento no instante t é descrita pela função correspondente .tx Logo, com um referencial podemos saber quando a posição de um objeto varia. O deslocamento indica uma mudança de posição. Assim, o deslocamento de uma partícula da posição A ( Ax ) para a posição B ( Bx ) pode ser determinado pela diferença AB xx . Figura 2.1 – O deslocamento em relação ao referencial é dado pela diferença entre a posição final e a posição inicial. Neste caso, o deslocamento é mxx AB 15520 . 2 2.2 Velocidade e aceleração O movimento em uma única direção mais simples é o movimento uniforme, que tem como característica principal o fato de a velocidade ser constante e o gráfico da evolução temporal do movimento ser uma reta, conforme indicado na Figura 2.2. A velocidade v do movimento uniforme é definida por: , )()( 12 12 tt txtx t x v (2.1) ou seja, é a razão do deslocamento x em relação ao intervalo de tempo .t Tomando o metro como unidade de distância e o segundo como unidade de tempo, a velocidade é dada em metros por segundo ( sm ). Outra unidade de velocidade é o quilômetro por hora ( hkm ). Figura 2.2 – Exemplo de gráfico )(tfx para o movimento uniforme. Qualquer movimento retilíneo no qual a velocidade varie com o tempo é denominado não-uniforme. Neste caso, o movimento é “acelerado”, e o gráfico )(tfx não é mais uma reta (Figura 2.3). Pode-se estender (2.1) a um movimento acelerado definindo a velocidade média: , )()( 12 12 21 t x tt txtx v tt (2.2) onde 21 tt v representa a velocidade média entre os instantes 1t e , 2 t conforme indicado na Figura 2.3. A velocidade média não dá detalhes sobre o movimento. A trajetória pode ser curvilínea ou retilínea e o movimento pode ter sido uniforme ou variado. A velocidade média envolve, apenas, o deslocamento total e o intervalo de tempo total. Este conceito é útil em viagens onde se pode fazer o cálculo da velocidade média em um trecho e, com base no valor obtido, estimar se mantendo este valor da velocidade média é possível completar o percurso no tempo previsto. Figura 2.3 – Exemplo de gráfico )(tfx para um movimento retilíneo não-uniforme. Fonte: Nussenzveig, 2002, p. 25. A velocidade instantânea )(tv num instante t qualquer num movimento descrito por )(tx é dada por: .)( 0 dt dx t x imtv t (2.3) A equação (2.3) mostra que a velocidade instantânea representa o coeficiente angular da tangente ao gráfico no ponto considerado (Figura 2.4). A velocidade instantânea é positiva ( 0dtdx ) num ponto onde x está crescendo com ,t negativa ( 0dtdx ) num ponto onde x está decrescendo com t (marcha-a-ré, por exemplo), e nula ( 0dtdx ) quando a curva tem tangente horizontal no ponto considerado (neste caso, a partícula estará momentaneamente em repouso). Figura 2.4 – A velocidade instantânea no ponto .P Fonte: Nussenzveig, 2002, p.27. A grandeza física que mede a rapidez de variação da velocidade com o tempo é a aceleração. Define-se a aceleração média no intervalo 21, tt através da relação: t v tt tvtv a tt 12 12 )()( 21 (2.4) Adotando o metro como unidade de comprimento e o segundo como unidade de tempo, a unidade de aceleração é o metro por segundo ao quadrado ( 2sm ). Tomando sempre ,12 tt tem-se que a aceleração média é positiva quando v cresce de 1t para ,2t e negativa quando decresce. Se a velocidade é positiva (a 4 partícula move-se no sentido positivo do referencial), v cresce ou decresce conforme v cresça ou decresça, mas se 0v é o contrário: v cresce quando v decresce. Assim, para um carro em marcha-a-frente, a aceleração é negativa quando o carro está freando, mas em marcha-a-ré é o contrário: frear em marcha-a-ré corresponde a uma aceleração positiva. A aceleração média pode geralmente ser variável durante o movimento, de maneira que a aceleração instantânea é definida como a derivada em relação ao tempo da velocidade instantânea: ,)( 2 2 dt xd dt dx dt d dt dv ta (2.5) onde foi introduzida a definição de derivada segunda de x em relação a ,t indicada pela notação .22 dtxd Sendo a derivada da velocidade, a aceleração instantânea representa a inclinação da reta tangente num ponto no gráfico ),(tfv ou seja, )(ta é o coeficiente angular da tangente à curva no ponto correspondente ao instante t . 2.3 Movimento retilíneo uniformemente acelerado Um movimento retilíneo chama-se uniformemente acelerado quando a aceleração instantânea é constante (independente do tempo). Neste caso: . 2 2 consta dt xd dtdv (2.6) Sendo a aceleração constante, então a aceleração instantânea é igual à aceleração média, de modo que: , 0 0 tt vv t v aa ou: ),()( 00 ttavtv (2.7) mostrando que a velocidade é uma função linear do tempo no movimento uniformemente acelerado, ou seja, o gráfico )(tfv é uma reta, cujo coeficiente angular é a aceleração. Quando a velocidade varia uniformemente com o tempo, seu valor médio em qualquer intervalo de tempo é igual à média dos valores da velocidade no início e no fim do intervalo. Isto é, a velocidade média ,v entre 00 t e ,tt é: . 2 0 vvv (2.8) Lembrando que a equação horária do movimento uniforme é dada por: ,0 tvxx que combinada com (2.8) fornece: . 2 0 0 t vv xx (2.9) Substituindo (2.8) em (2.9), obtém- se a equação horária do movimento: . 2 1 )( 200 tatvxtx (2.10) Eliminando o tempo entre (2.7) e (2.10), obtém-se: .2 0 2 0 2 xxavv (2.11) As equações (2.7), (2.9), (2.10) e (2.11) formam um conjunto completo para descrever qualquer movimento ao longo de uma linha reta com aceleração constante. Na natureza, o exemplo mais familiar de movimento retilíneo uniformemente acelerado é a queda livre de um corpo a partir do repouso. Galileu foi o primeiro a observar que, desprezando a resistência do ar, todos os corpos caem com a mesma aceleração, não importando seu tamanho, seu peso ou sua constituição. Se a altura de queda 5 não for muito grande, a aceleração de queda livre permanecerá constante durante todo o movimento. Este movimento ideal, no qual são desprezadas a resistência do ar e alguma variação da aceleração com a altitude, é chamado de “queda livre”. A aceleração de um corpo em queda livre é conhecida como aceleração da gravidade e é representado pelo símbolo .g Próximo à superfície da Terra seu valor é aproximadamente igual a ;8,9 2sm sua direção é normal à superfície terrestre e seu sentido para o centro dela. 2.4 Movimento no plano Para especificar a posição de uma partícula a qual se move num plano são necessários dois parâmetros que são suas coordenadas. No caso das coordenadas cartesianas, a posição de uma partícula em movimento no plano será descrita pelo par de funções ,, tytx onde tx é a abscissa e ty a ordenada da partícula no instante .t Reduz-se, assim, a descrição de um movimento bidimensional à de dois movimentos unidimensionais simultâneos, cuja composição leva ao movimento no plano, conforme indicado na Figura 2.5. Para o caso do movimento numa trajetória curvilínea num plano, a posição, ou deslocamento a partir da origem, é especificado pelo vetor ;r sua velocidade é representada pelo vetor v e a aceleração por .a Estes vetores estão inter-relacionados da seguinte maneira: ,ˆˆ jyixr (2.12) ,ˆˆ jviv dt rd v yx (2.13) ,ˆˆ jaia dt vd a yx (2.14) onde iˆ e jˆ representam os vetores unitários (vetores de módulo igual a 1) nas direções x e ,y respectivamente. Um caso particular de movimento em um plano é aquele com aceleração constante. Neste caso, enquanto a partícula se move a aceleração a permanece constante em módulo, direção e sentido. Portanto, os componentes de ,a em qualquer sistema de referência, também não variarão, isto é, .constax e .constay Nesta situação, o movimento da partícula pode ser descrito como a superposição de dois movimentos componentes que ocorrem simultaneamente, com acelerações constantes, ao longo de duas direções perpendiculares. A partícula descreverá, em geral, uma trajetória curvilínea no plano. As equações que dão a posição e a velocidade da partícula, movendo-se em um plano e sujeita a uma aceleração constante, são respectivamente: . 2 1 2 00 tatvrr (2.15) .0 tavv (2.16) Um caso importante de movimento num plano com aceleração constante é o movimento dos projéteis na vizinhança da superfície da Terra. Numa situação típica, pode-se considerar a Terra como plana e a aceleração da gravidade como constante. Adotando o eixo Oy na direção vertical com orientação para cima, segue que .constga Assim: .jˆga (2.17) Figura 2.5 – À medida que o ponto P, que dá a localização da partícula se move, descrevendo a trajetória da partícula no plano, suas projeções sobre os eixos Ox e Oy se movem correspondentemente, descrevendo movimentos unidimensionais. Tomando a posição inicial de lançamento na origem, segue que .000 yx Considerando que o instante inicial seja ,00 t e sendo o ângulo entre o vetor velocidade inicial 0v e o eixo horizontal, temos que: . ,cos 00 00 senvv vv y x (2.18) As equações (2.16) e (2.17) ficam então: ,cos0 vvx (2.19) .0 tgsenvvy (2.20) ,cos0 tvx (2.21) . 2 1 2 0 tgtsenvy (2.22) As equações (2.21) e (2.22) nos fornecem x e y em função do tempo decorrido desde o lançamento. Combinando-as, e eliminando t entre elas, obtém-se: , )cos(2 )( 2 2 0 x v g xtgy (2.23) que é uma equação do tipo ,xfy conhecida como equação da trajetória do projétil. Como , 0 v e g são constantes, a equação (2.23) é da forma ,2cxbxy que é a equação de uma parábola. Portanto, a trajetória de um projétil é parabólica. 7 Exercício 2.1 Imagine a seguinte situação: Você vai até a padaria comprar pão e na volta encontra um conhecido e fica conversando por 5 minutos e depois retorna ao ponto de partida, demorando 20 minutos no total. Nesta situação, qual sua velocidade média? Exercício 2.2 A velocidade indicada no velocímetro de um carro ou moto representa a velocidade média ou a velocidade instantânea? Explique. Exercício 2.3 A castanheira é uma árvore nativa da Amazônia, podendo alcançar m50 de altura, e seu fruto, conhecido como “ouriço”, possui formato esférico, achatado nas pontas, podendo chegar a dois quilogramas de massa. Quando maduro, o ouriço “despenca”, indicando que suas sementes estão prontas para consumo ou plantio. Calcule a velocidade que um ouriço com um quilograma de massa ( kgm 0,1 ), despencando de uma altura de m30 atinge o solo. Considere que durante toda queda, o movimento do ouriço é uma “queda livre”, de modo que a equação (2.11) possa ser aplicada. Adote o valor 210 smg para a aceleração de queda livre do ouriço. Exercício 2.4 (a) A partir da equação (2.23) mostre que o alcance de um lançamento é dado pela equação: ,2 2 0 sen g v A Onde 0 v é o módulo do vetor velocidade inicial e o ângulo que esse vetor forma com a direção horizontal. Adote a origem do sistema de eixos no ponto de lançamento. (b) Na prova olímpica do salto em distância tem importância a altura que o atleta pula? Que fatores determinam o alcance do salto? Responda com base no resultado do item (a). Exercício 2.5 Enquanto pensava em Isaac Newton, uma pessoa em pé sobre uma passarela inadvertidamente deixa cair uma maçã por cima do parapeito justamente quando a frente de um caminhão passa exatamente por baixo dele.O veículo move-se a hkm55 e tem m12 de comprimento. A que altura, acima do caminhão, está o parapeito, se a maçã passa exatamente rente à traseira do caminhão? Exercício 2.6 Um balão sobe com velocidade de sm12 e está a m80 acima do solo quando dele se deixa cair um objeto. Quanto tempo decorrerá até que o objeto atinja o solo? 8 Exercício 2.6 Um paraquedista, após saltar de um avião, cai ,50m sem atrito. Quando o paraquedas se abre, o paraquedista recebe um retardamento de .0,2 2sm Atinge o solo com a velocidade de .0,3 sm (a) Quanto tempo o paraquedista se mantém no ar? (b) De que altura saltou? Exercício 2.7 (a) Prove que, para um projétil lançado num ângulo 0 acima da horizontal, em relação a um terreno plano, a razão da altura máxima H para o alcance A é dada por .41 0tgAH (b) Encontre o ângulo de lançamento para o qual a altura máxima e o alcance horizontal são iguais. Exercício 2.8 Uma bola cai do topo de uma escada com velocidade horizontal de .5,1 sm Os degraus têm cm20 de altura e cm20 de largura. Que degrau a bola atingirá primeiro?
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