Baixe o app para aproveitar ainda mais
Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original
lO l)ireiln COI,srilucirlll(l1 N~ iiterallua ,wcional podem ver-se: BOAVENTURA S0USA SANTOS, llIlrodllção (I lima Ciêllria 1'ti.,.M"r/cma, Afron. tamento, Lisboa. 1"'19. _ "Pós.M{I<.Jcrnisrno c 'l'COfi:l Crític;l'\ in llrl';\Itl Crilira til' Cihu-ias Socia;s, Março, 1988. __ .. Mllderll(./1'6s.Moderll"", in IIrl'i.<IIJ dt' Cmnlll,icnçào r 1.i1J~II(llIem,n." {,f7. "()~ úi",ilns humano" 11:1(11;lo;.mndrrni<!atie". inl);,t'ilo f,Soâ,'t/o(li'. 4/1f}W'. (l. l ss. MANI!l:1 MAUIA ('AnUII./lo.[;logio da Modernidade, L.ishoa. 1')1;<1. MIou!:!. BATIS'IA I'EHUllA. Mod,.midad,' I' 7i'ml"'. I'(/m (/1110 I,('illll'{l d" /li.\( /f'1O Moderno, C'oilllh,a. I 'I'JI), i \ I f. 'j'--"-. I - Novos "paradigmas", novos "saberes", novos "direitos" Âo iniciar-se um Curso de Direito Constitucional e Ciência"folí- tica nos finais da década de 80 e começos da década de 90, podá-se- -ia repetir. ponto por ponto, aquilo que um autor português escreyéu h:í vinle anos: ";, npssa volta !lIdq mudpu", .'. ~'"I . ? Fazendo a /IIi.I'(' (/1/ {loi/ll da situaç~o do Uireito I',íhlico no fim da déca. da de (,O, l'Sl'Il'V('U Ho(;í'HIIl SOAIlI,S, lJircilo J'IilJ/irlJ (,"Sod('rJa"t~ Tt'cnil:a. ('oimllra, I ()(,9: "~e fos~e possível a 11111 jurista parlicularmente interessado pcla~ ('I)isas do direito público entraI no sono da princesa da fáhula, nãu pleci~aria de deixar corter os cem anos para descobrir atônito que à sua volta tudo mudou. Bastava-lhe te.r esperado pelo desencanto dos últimos vinte anos e verificaria que o seu castelo de cons!ruçües c os seus servidores est:wam irremediavelmente suhmersos no silvado de uma nova realidade perante a qual se encontram indefesos, E o drmnáti('o. qllase trágico. é que não há forças henfazejas que rasguem novas clareiras c Iracem novas sendas para um regresso iH) velho mundo. como numa readmissão do paraíso c, apesar de ludo, de lIIuitos lados se f10ta um esfOlço para mergulhm na realidade com /Im arse- lI;d o"~olcto. c, pior aillda, com um pOlh",I' dissonante c/lm os tempos". Passada Ullla vintena de allos. os problemas que hoje se põem ao estudiosu do direito cOlIstitucional e da ciência política sflo semelhan- tes, llla~ nUlll c()nJq,t\.L~ esp~\Q) discu!.~i.~o5sºr.'~plctal1Jente outro~:. Em terlllOS intcrrogativos: qual o ÍIlSlrllJllelllOriuf7I, o corpus teúrico e o discurso dos juspublicistas para captarem as transforlllaçües e dcslocae,.tlcs do "cspaço político" ncslcs líltilllOS vinte anos? E com quc "l'~pírilo", COlll que "alma", COIl1que "fé", com que "pré-com- prcensão ", eles cnfrentam os desafios de uma época que se pretende não j:í lIIor/emo, 111 as .sim I'ÔS-I1lVdC1'1lfl? Terão chegadp JJlnJ.bçm ao C:lJlUli!.illu..!.irei.t9..I?-"lhlíco, e, ~.llbH;!.ud(),_a.odirç.i(o cpnfi.li,l!!.Çjon_a.l, n_o~o~._~:.I)aracJJ.g._rI1_a~'_~.. !10.Y.'ls '~m~)ili!s"e novo~ :~s,!hITes"? Adian- tando algumas inúic<lç()cS que, ao longo do curso, terão outros desen- volvimcntos. salicntar-sc-f! que as inquietações de um jurista cons- litucion;d ohrigam a uma a/J<'rlura aos fI{)\'OS moles do direito e da política c ;1 disfll/lohilidadc il/lcrsu!JjeetÍl'o úcsses novos motes. Em crí"c cstiío muitos tios "vodbulos dcsignantes" -"Constituição", "Fslado", "Lei". "Dclllol'Taci:l''', "Direitos IIUm<llIO"", "Soberania", / 12 Direito Constitucional oDireito Constitucional entre o moderno e o pós-moderno J; "Nação" -que acompanharam, desde o início, a viagem do constitu- cionalismo. Começar o Curso por algumas dessas palavras. viajantes jigDifica r@!J s6 a.vreselltar aos ah:!nosa!guns dos core term~ ("concei- tos centrais") da nossa disciplina,.ID;;l..5.também,.c,Qnfrontádns..cDllLO's. ngvos "arquétipos", os novos "discursos" e os novos "mitos" do universo político. Ultrapassaria as possibilidades de um Curso de Direito Constitucional e de Ciência Política embrenharmo-nos na complexa questão da caracterização do "pós-moderno" e da "pós-modernidade". A utilização do termo "pós- -moderno" começa nas querelas literárias da década de 30, nos Estados Unidos, transita para a história (A. TOYNBEE),prossegue na arquitectura (Ch. JENCKS),é absorvido pelos sociólogos da "pós-história" (A. GEIlLEN)e da sociedade pós- -industrial (H. FREYER,DANIELBEU), e culmina num poderoso movimento filosófico-cultural em que desempenham papel fundamental autores franceses como MICIIEL FOUCAULT,GILLES DELEUZE, JEAN BAUDRILLARD,JACOUES DERRIDA,JBAN-FRANÇOISLYOTARD,MICHELSERRES.l'ara os alunos que dese- jarem ir mais longe aconselha-se a leitura de J. F. LYOTARD,La Condition postmoderne, 1979 (trad. portoA Condição pós-moderna); GIANNIVAmMo, La Fine della Modernità, 1985 (existe trad. portuguesa); W. WELSCII, Unsere Postmodern Modern, 1987; P. KOSLOwSÍ<l,Die postmoderne Kultur, München, 1988. Na doutrina portuguesa consultem-se sobretudo os trabalhos de BOA- VEN11JRADESOUSASANTOS:O Social e o po/(tico na tran.dçdo Pós-Moderna (1988); Introdução a uma Ciência Pós-Moderna (1989). Cfr. também a útil colectânea em língua espanhola de J. PICO,Modernidad y Postmodernidad, Madrid, 1988, e o número da revista de filosofia espanhola DoxA . 6, (1989). tI - ÁS'~palavrasviaJantes"----------~~ 1. Constituição .. No centurdo--nosso estudo vai estar a "palavra" Con5titu;ção_ Independentemente de saber qual foi a "arqueologia" deste conceito (dr, infra, caI'. 3.0), pode avançar-se com uma noção habitual e tendencialmente rigorosa de Constituição: "Çonstituição.é uma ordenação sistemáti::a e racional da comu- nidadepol£tica, plasmada num documento escrito, mediante o qual se garantem os direitos fundamentais e se organiza, de acordo com o prinC£pioda divisão de podere.ç,o poder po/ft;co ". Não se discutirá aqui o processo genético de tál concbito I, Salientar-se-á a sua consonância com a ambitio saetul~ isto é, Côrrl aS pretensões da modernidade e do sujeito moderno: oS homeriS ~4b capazes de construir utn projecto racional, cotldensarldo lts idetà~ básicas desse projecto num pacto fundador - a conSHttiiçgo. Eiti termos mais filosóficos, dir-se-ia que a..i.deia..de-CODS.ti..t1iiçâoé indis,; sociável da ideia de subjectividade projectante. orl, se se preferir, dá ideia de razão iluminante oule iluminista 2.~SjJbjectividade, raciomiti:: da.d~.,_c.ie.ntifjcidad.e~.is.JLb.1l.,Çkgwll»dfiJosófico-político-ºª..gé.n~_~. d.au:.o.nsiliuiç.ões...modemas1...Através de um documento escrito con- cebido como produto da razão que organizá o mundo, ilutninándo-o e iluminando-se a si mesma, pretendia-se também coltvertet li lei escrita (= lei constitucional) em instrumento jurídico de constihtição da sociedade. As coisas colocam-se, para os juristas pós-modernos, em termos substancialmen te diferentes. A-ideia..de..con.stittiição-c.om.l:L_~.:te.n.tnL' .d.e.JillLCJillj,lilltQJlormatiyo "actiYo" e~fjnªlís..tiko':':,_r.~gulad~Ql e directivo da sociedade, é posta em causa de váriás forn1ãS. Eiri pri- meiro lugar, assinalam-se os limites tJ;Lregulaçõ.P doS t>tobleHill~ sociais, económicos e políticos àtravlfdo direito. "direito Só tékttlâ a sociedade, organizando-se a si mesmo" (TEUBNER). ISló sigttifÍdl que o direito - desde logo, o direito constitucionál ~ é, não úiíl direito activo, dirigente e projectante, mas uni direita reflexivo âütô- -limitado ao estabelecimento de processos de....infonnaçãoe,de lÍ1ecâ~ nismos redutores de int~rferência_s_eJl.tr.e-Yár:i..o..s..sistemasJíUt.ÓlI.o.nio..tHá sociedade (jurídico, econ6mico, social e cultural). Por isso se diZ _tluê o direito, hoje, - o direito constitucional pós-moderno - é um di~eito p~ntervenCionistq (= processualizado", "dessubstantivado", "nétl- -corporalivo", "ecológico", "medial")4. 1 Cfr., entre nós, per todos, ROOÉRlo SOARES,"Constituição", in Dicionário JurúJico da Administração; idem, "O conceito ocidental de Constituição", in RU, 119 (1986), p. 36 ss.; JORGEMIRANDA,Manual de Direito Constituciona~ Tomo 11,p. 2055 .. 2 Uma exposição magistral das categorias da modernidade ver-se-á em MtoUa BATISTAPEREIRA,Modernidade e Tempo, para uma leitura do disc~rso modern~,\ t, .. \J Coimhra, 1990, págs. 39 sS.; P. KOSLOWSKI,Die postmoderne Kultur, Clt., pp. 32 5S. , J Crr. BRUNOROMANO,Soggettività, diri:to e poslmoderno, Utia interprei~- ziolle con lIeidegger e Lacan, Bulzoni, 1981, p. 104 SS.; P. KosLOwsKJ!R. SPAEMAi-mJ IR. Low (org.), Moderne oder Postmoderne?, Heidelberg, 1986, p. XII. 4 Cfr., por todos, G. TEUBNER,Recht ais autopoietisches Syst~m, Fr~nkfuiitM, 1989, p. 82. ' . " t « 1 14 Direito Constitucional o Direito Constitucional entre o moderno e o pds-moderno 15 Em segundo lugar, e em cortexão com () que se 8tabá de dizer, a cortstituiç!o deixa de, ser possível conceber-se com um pacto fun- dador e legitimador de uma acção ptática tacionalmente transforma- dora. Por outras palavras: a constituição deixa de inserir-se no pro- -eeSS9 histó.rico_de~emancipação da socieda(k.(.quer como "texto" de garantias individuais e arranjos organizatórios de tipo liberal, quer como "programa dirigente" de cariz marxÍZante). Como se concebe, então, a constituição na épuca pós-moderna? Em termos tendenciais, adiantar-se-á a seguinte caracterização: A Constituição é um estatuto reflexivo que, atravé.'i dl' certos p,vcedimentos, do apelo a auto-regulaçfies, de sugestfies no sen- tido da evoluç(10 I'0lftico-social, permite a existência de uma pluralidade de opç(Jes polfticas, a compatibilizaçdo dos dissen- sos, a possibilidade de vários jogos po/{ticos, a garantia da mudança através da construção de rupturas (TElJBNEn, Li\J)ElJR). A posição que se vai adoptar neste Curso é ainda a da moderni- dade. Acredita-se na consciência projectante dos homens e na força conformadora do direito, mas relativiza-se "a constitucionalização da programação da verdade "( dr. i1lfra, Parte I, Caps. 2um, )U e 4u/C e D). Eis aqui uma premissa importante de muitos dos desenvolvi- mentos subsequentes: à constituição de um Estado de direito demo- crático terá de continuar a solicitar-se uma melhor organ~ relaçãu homem-mundo e dllSJ..cl.a..ç.õ..c.sJntersubjçctivas(entre e com os homens) scgurlLlo.JlJlLp.W.j.~cto-q.ltadrode "estruturas hásicas da jus- tiça" (1. RAWL.';), moldado em termos de uma racionalidade comuni- cativa selectiva (HABERMi\S). 2. Estado Desde o século passado (err. infra, capo 2°) que u conceito de Estado é assumido como uma forma histórica (a última para os modernos, porventura a penúltima para os pós-modernos) {]e um ordenamento jJJL£dÜ:.CLg£LIlL (GIANNINJ) cuJas~carac.t.e.tfs,ti.cas-01l elementos constitutivos eram os seguJ.nks: ('D- territorialidade, isto é, a existência de um território concebido como "esp.aço da soberania estadual,"; (?)-população, ou seja, a existência de um "povo" ou com.unidad.e .histori7a~e.nte ~efjnida; (:1J-politícidade: prossecução de fins.d,efJDJd.osJ:..indh!..idualizadosem termos po!flicos . .A organiza- ~oJ(tica do Estado era, por suá vei, uma parte fundimentai ("parte orgânica") dá Constituição. Esta articulação do "Estádo" com o "texto" -daí a tradicional designação de "Constituição do Estado" - é também questionada nos esquemas de representação da pós-modernidade. Vejamos como. , A organização política não tem centro: (1) é um sistema de sis- , temas autónomos, auto-organizados e reciprocamente interferentes; (2) é multipolar e multiorganizativa.Com efeito, ao lado do "Estado", existem, difusos pela comunidade, entes autónomos institucionais (ordens profissionais, associações) e territoriais (municípios, regiões). Daf a referência à Je entro (do Estado concebido como organi- zaç1iounitária e centralizada) e a . A • • ito sem Estado, isto é, de modos de regulação (contratos, concertação social, negocia- ções) constitutivos daquilo a que se poderá chamar reserva normativa da sociedade civil. Encontra-sc o "cco" das idciac;acabadas dc refcrir nos trabalhos de José I.AMEGO: ••A sociedadc sem 'centro': instituições e govemabilidade cm NIICl.AS LUIIMANN", in Risco 5/1987, p. 29 SS.; "Racionalização Social e Acção Comuni- cativa: o Balanço da 'Modcrnidade' na Tcoria Critica'.', in Risco 4/1986, p. 17 ss.. Corno se irá ver no próximo capítulo, o Estado não desaparecerá totalmente do discurso político-constitucional: ele constitut a forlha de racionalização e generalização do pol£tico nas sociedade modernas, sendo nesta perspectiva que se devem interpretar muitas das referên- cias deste Curso à categoria política do Estado (cfr. infra, capo2.°). 3. Lei Um outro conceito nuclear para a compreensão do direito cons- titucional da modernidade é o conceito de lei que, numa primeirà aproximação (cfr. infra, Parte IV, Padrão IV), se poderia definir dã seguinte forma. ,"Lei é um aeto normativo geral e abstraeto editado pelo Paria- I :mento, cuja finalidade essencial é a defesa da liberdade e pro- ; priedade dos cidadãos ". ' No quadro de referências do Estado Constitucional moderno, a ,Ici .eJJUl"forma" eleactllação do Estado que fixava duradoura, geral e abstractamente, as "decisões" fundamentais do poder político, estabe- lecia o âmbito e limites da actuação normativa do poder executivo e materializava as ideias de justiça da maioria parlamentar. \ ',~ . . ~f ••.• 16 Direito Constitucional oDireito Constitucional entre o moderno e o pós-moderno 17 '.' , '! Algumas destas dimensões continuam a ser válidas no contexto do Estado constitucional democrático actual (cfr, infra, Parte IV, Padrão IV), Todavia, assiste-se também a uma relativização do papel da lei e proclama-se sem rebuços a "crise" da lei. Porquê? Assinala-se, desde logo, o facto de a lei transportar, à seme- lhança da ideia de Constituição, a ambi~ão iluminista-racionalista do " "t" d "d'f'" d . 'd' .sUJeI o mo eruo: co I Icar a or em JUTl Ica e "armazenar" duradouramente as bases gerais dos re.giines-J-urídi.c.o.s-Posterior- mente, acentua-se ainda mais o carácter instrumental da lei como meW-da~Mãa...pJanificanle:.'. Os impulsos iluminista e planificante para a leI acabam por gerar uma espécia de ;uridicização do mundo. a p"arlamentarização legiferante da 11,ida,a regulamentação perfec- cionista (= detalhada, pormenorizada) dos problemas sociais, com a consequente perda ou declínio do seu valor normativo. Por outro lado, a lei carrega as seqJlelas do "centralisino e clirec- çionismo" jurídico dos modernos, esquecendo a existência de equi- valentes funcionais reguladores, alternativos do direito, como, por ex., o mercado, no plano econó~ico, a autonomia contratual, no plano interprivado, os negócios ou agreements informais no plano da barga- nha política, as soluções comunitárias de conflitos, como, por ex., os "tribunais de bairro". Também neste aspecto, o presente Curso de Direito Constitucio- nal não fará tábua rasa do papel da lei perante as pressões deslegaliza- doras dos p6s-modernos, Alguns princípios estruturantes como o prin- cípio da,prevalência da lei, o princípio da reserva de lei e o princípio ~a leg~hdade da administração (cfr. infra, Parte IV, Padrão IV) con- tmuarao a merecer um relevo significativo na arquitectónica consti- tucional democrática. Mas alguma coisa fica das críticas e sugestões dos p6s-modernos, designadamente a ideia da necessidade de tomar em consideração os mecanismos de 11.;:g~p.¥ttfI.t!.'i.~~,ª'Pd.~s':Q.t~1fâ.(/.Çi' conducentes: ~ à libertação de determinados domínios da vida de ~m? ~egula!"entação racionalmente finalística através do direito (des.=.. lundlaca~ao através da deslegalização); ~ acolhimento de regras extralegals e~lJjYJ1-kJJJ£.S../J!,JJ£im1ai.s. da direitn como por ex. a "concertação de interesses", a governação através de "pe;suasões': e de "consultas", a recepção de "códigos de ética", a adesão a "reco- mendações" e "normas técnicas"; (~ direcção ou autodirecçãn sit/la- ~!va atra~és ~e. um dir~ito reaexi~o ~ue fixe as regras do jogo aos actores SOCIaIS,sem Impor autontanamente soluções substantivas. R~pare-se, poré",l: esta abertura aos processos de polarização regulátlca de uma SOCIedadepluralista não significa que a orientação dominante deste Curso esteja em consonância com os ideologemas de uma sociedade sem direito (constitucional ou legal) ou com os mode- los espontânea e emocionalmente regulativos (BLANKENBURG). Afolie de uma "sociedade sem direito" alerta-nos e sensibiliza-nos para a contingência histórica, na forma e no conteúdo, dos instrumentos legais regulativos. As alternativas "extraJurídicas" ou "extralegais" não substi1u.e--ID.-llQre.nquanto, a função formal e material das re,gub- çQ.e.s.J)ormatiy.as_do..s_pJlder..es-JlúblicD"sJegitimo..s~ 4. A invenção do "território" e do "Estado-Nação" ..~') Como já foi referido, as..cD.nstituiçõesJigam:se_quer..ao~ci- ' ~ mento do Estado" (State-building, na terminologia da moderna socio- logia e ciência política americana) quer à "constmção-Ou-sedimenta-_ ç.ãQJIeuma cOJIllIDula1te nacional (Nation-building). D.aLa..5:epresen- ta~ão" cons1Í1U.cio..n.al...diLEsla.d.o:..Nação.:-tllIl-Centropolític.o-=-o- '1 Estado -, çonformado-P-QUl..QIIIlas- a.5J1Ql:l.lJªs...da-Constituição...l- exerce a "coacçáQ_fis.kaJ.egítima" - pader.. den1w de um ter.ritó.::. ..r.io-'ladonaL_ O problema, hoje, é o de saber se o processo de institucionaliza- ção da modernidade sucessivamente desenvolvido - Estado Nacio- nal - Estado de direito - Estado democrático - Estado social - não teria chegado ao fim. Deixaremos de lado, e por agora, as quere- las relacionadas com o "Estado-providência" e concentremo-nos em mais um mote da pós-modernidade político-constitucional - a perda do lugar e da inércia geográfica e territorial (B. GUGGENBERG). Assim, os fenómenos da globalização. com os inerentes problemas de interdependência e modificações nas formas de direcção e controlo dos regimes e sistemas políticos, levam necessariamente à questão de saber ... v( .1 como se deyem estruturar devereS e obrigações para lá dos "confins do /; ''1' ,~., EstadQ territorial" (S. HOFFMAN alude aqui, de forma sugestiva, a "Duties beyond Borders" ). Como se poderão regular deveres e obri- gações na "ausência" de um centro político estadual? Os fen6menos de "transnacionalização" e de regresso aos "nacio- nalismos", a "invenção" de novos espaços públicos (ex.: espaços comunitários), o alargamento dos actores não governamentais, coloca novos desafios ao direito constitucional e à "teoria das normas" que lhe está subjacente. Esse desafio da p6s-modernidade poderia sinteti- zar-se através da seguinte caracterização de constituições: 18 Direito Constitucional oDireito Constitucional entre o moderno e o pós-moderno 19 As constituições, embora continuem a ser pontos de legitima- \ ção, legitimidade e consenso autocentradas numa comunidade estadualmente organizada, devem abrir-se progressivamente a uma rede cooperativa de metanormas ("estratégias internacio- nais ", "pressões concertadas") e de normas oriundas de outros "centros" transnacionais e infranacionais (regionais e locais) ou de ordens institucionais intermédi(ls ("associações interna- cionais ", "programas internacionais "). / A globalização internacional dos prohlemas ("direitos huma- nos", "protecção de recursos", "ambiente") ai está a demonstrar que, se a "constituição jurídica do centro estadual", territorialmente deli- mitado, continua a ser uma carta de identidade pol£tica e cultural e uma mediação normativa necessária de estruturas básicas de justiça de um Estado-Nação, cada vez mais ela se deve articular com outros direitos, mais ou menos vinculantes e preccptivos (hard law). ou mais ou menos flcxíveis (.'10ft law), progressivamente forjados por novas "unidades políticas" ("cidade-mundo", "europa comunitária", "casa europeia", "unidade africana "). 5. Direitos Individuais Um topos caraclerizador da modernidade e do constitucionalismo foi sempre o da consideração dos "direitos do honwm" como l'fl'i~, essl'ndi do Estado Constitucional (dr. infra, Parte IV, Capo 1°, e Capo 5U). Quer fossem considerados como "direitos naturais", "direitos inalienáveis" ou "direitos racionais" do indivíduo, os direitos do homem, constitucionalmente reconhccidos, possuíam uma dimensâo projcctil'a de comc1/.wraçtio ,mil'(~r.\'OI.Além dc apontarcm para a rcaliza~ão pl'Ogre.uilía do homem num mundo progrl'ssivaml'nt(~ mc- Ihor (tensão escatol6gica), os direitos do homem forneciam um "crité- rio". um "fundamento", uma "verdade", um "valor" universal pata se distinguir entre" Estado constitucional" e "Estado não constitucional" (dr. infra, Parte I, Capo3U). Alguma coisa mudou no pôs-modernismo. Aparentemente, assiste-se ao reyjgillau.1J.Lruhj.e.cJiJdsJ.nJ2nos direitos fundamentais, em sintonia com o "subjectivismo radica'" que se detecta na poesia, na música, na nova "religiosidade", nos movimentos políticos e até nas teorias científicas. O.lDlJllllo p6S-OlUdc[QOserá meSDlOUIllmundo /l. ural (dos "discursos", das "histórias", das "ideias", dos "progres- sos") nde existe a enas um sin u ar' -' . , . Todavia, este indivíduo singular assUme-se corno pó~: renuncia a "verdades universais" e, em vez de projectar mundosj encontra os "fen6menos" e os "sistemas". Neste sentid~03~diz qlte..,.é_ um indivíduo tapológic;o, um l'es.p_e,ÇJado.r...ck_ac_onte_c_eI_e.s'::"'s~lb_eiaüa.- mente" indiferente". . A posição expressa em desenvolvimentos subsequentes deste Curso (cfr. Parte IV,Padrão I, referente ao Estado de direito, e Padrão 11, referente aos direitos fundamentais) assentará ainda: ~) na ideia de os dir.eitos úJOdamentais cilllJiwmrem a constituir a raiz antropolágica essencial da legitimidade da constituição e do poder político; (~ no pressuposto de que se não há, hoje, "universalidades". "dogmatismos morais". "metafísicas humanistas", "verdades apodícticas", "valo- rçs éticos indiscutíveis", pode, pelo menos, estabelecer-se uma acção comunicativa 5, ou, se se preferir, intersub;ectiva. entre os homens, ein torno de certas dimensões de rind io ue im licam sem re um mínimo de comensuração universal e de intersubjectividlld..e.;A.~e~ta dimensão de universalidade e de intersllbjec.tiyjdade....teco.nduz~s sempre a uma referência - os direitos do homem. 6. Os pactos fundadores: razão moderna ou mltopolétlca p6s- -moderna? COIllOexplicar a emergência de novos "pactos fundadores"? Em termos de narratividade moderna a resposta é racional: pretende- -se um esquema político de regras que definam um esquema de activi- dades e uma justa configuração das instituições sociais- "estruturas básicas" -, de forma a permitir aos homens a organização e funcio- narllCntode uma "sociedade bem ordenada". Em termos pÓs-mnd@FA8s,~ criação de um "pacto Úmdador", como I a constituição, procura-se, antes, em est[lltll£as simbólicas, .., . - ,. F d" t ~ d 9 "~ I Sgmltlcas ou arquellplcas. :m ~.ezg pac 8 1:1A a ora a.... @m "mito" ou "mitos fundadores". Uma mitopoética narrativa, oracularmente captadora de "densos agregados significantes", "ínsitos na profundeza da alma popular", 5 Or .• sobretudo, J. HABERMAS, Vorstudien und Ergiinzungen zur Theorie des Kommullikativ('1I lialldellls, Frankfurt. 1984. Sli:ientando que o relativismo cultural não é incompativel com o universalismo dos direitos do homem. dr. KOSLOWSKJ, Die f'ostlllotiCfIlr KIIllllr, cit.. p. 157 ss. 20 Dlreito Cml.H;t/lcimwl \JnllOTECA DE CIÊNCIAS JURlorCAS (} 1Jireito COIl:titllcirmal entre o_,_n__od_(_'rn__o_e_o__p_ô_s.._IIl_o_d_cr_n_o_. . 2-! apela aos "mitos fundamentais" como operadores interpretativos (ex.: "mito do eterno retorno", "mito da idade do ouro") em vez de se ali- cerçar na argumentação, no raciocínio, na ordem lógica da demons- tração, na razão constitucional. Que dizer desta tentativa de conceher as constituições como ':c()njunt~ .de mitos"? 0, "re~resso do ~l1il()" (G, DURAND) pode signi- J lear, posItIvamente, o dlll:tIlJISIIJOda vIda sempre recomeçada (MAI'I'- S(~U), I,na,s pode tamhém, negativamcnte, transformar a explicaçiio rmtopOlétlca numa forma de manipulação do real, num modo de trans- ~elldência da, "~onexfto dos acontecimentos", numa proposta allerna- tlva da conslllulçãll "para trás", em direcção aos mitos edénlcos e aos arquétipos profundos da alma", sem qualquer ligação com os contra- tos que os hOlllens, aqui e agorll, estabelecem como regrlls h{tsicas da vida comunitária (;. 111 - O pantdigmn do informal - O Estado Constitu- cional informal I. Renuxo plllítico e renuxo Jurídicll O." inro.flnal é que está a dar", assim tlizem os jovens a pretexto uas mais vanadas COISilS e pessoas. De um m<)(.10 idêntico, podería- mos transferir o "dito" para o âmbito do direito constitllcioJl:d e afir- mar: "o Estatlo Constitucional informal é o que está a dar". Em lin- guagem comum insinua-se a emergência, no âmbito do direito cons- titucional, de um novo paradigma: () paradigma do Es/ado Com/i/Ii- cional informal. . Para um cultor do direito púhlico, educado e formado dcntro dos paradigmas científicos da modernidade, falar de um "Estado Consti- tucional informar' é quase utilizar o ponto arquimediano contra si mesmo. Não significou a criação de uma constituição uma t{'lI/atim de ordcnaçcio sist{'má/ica c racional da comunidade pol£/ica atravó' de um documento csuito? O hinómio "raztio/experiéncia" do ilumi- nismo não postulava necessariamente um documento escrito como reccptor/codificador dos esqucmas racionais aplicados 1\ pr:ítit'a? Oue (, Parn o estudo destes prohlemas veja-se. cnlre nós, PAULO FERHHR/\ 11/\ CUNIf/\ ,:!ít.o r C:onsti/u.ci()/l(~lislll(). Coimhra. 11JQO; idem, "1\ Constituição como mito" ~ Mllo c Id~ologl:ls (r~m torno ao prcilmhulo da C'onstilniçãoj", amhos em /','n.l(lr ()n,,,,,/O, COllllhrn. 1')'/0. se pretende, no fundo, com a "informlllização" e "aformalização" do Estado Constitucional? I O paradigma do informal não se pode desligar do debate em torno do refluxo polftico e do refluxo jur£dico. No âmbito político assiste-se ao refluxo da polftica formai (do Estado, dos parlamentos, dos governos, das burocracias, das formações sociais rlgidificadas); no domínio jllTídico. o espectáculo é o refluxo jur£dico (deslocação da produçiio normal iva do centro para a periferia, da lei para o contrato, do Estado para a sociedade). i\ interpretação ou imbricação destes dois fenómenos tem sido posta em relevo, consiueranuo-se que () "reOuxo político", articufado com O "refluxo jurídico", encontra re[racções concretas nos fenó- menos: (I) tia des-ojicializaçtio, traduzida no amoleCimento da supre- mucia hierárquica das fontes do direito formal, sobretudo do Estado; (2) da (if.'s.codijicaçiio, expressa na progressiva dissolução da ideia de "código" como corpus coerente e homogéneo, cultural e superior do uireito legal; (J) da d('s-legalização, isto é, retirada do direito legal e até de lodo o direito formal estadual (des-regulamentação) e res- tituição das ,íreas por ele ocupadas fi autonomia dos sujeitos e dos grupos. O tr;lI1sito para a ideia de Estado Constitucional informal ganha, neste contexto, transparência: se a regulamentação jurídica formal deve ser substituída por outros mecanismos (ex.: econômicos) ou por estruturas informais (ex.: tribunais de leigos). então também o direito constitucional formal se deve relirar da vida e dll política para, num uinâlllico ll("()u'sso público aberto, incorporar, preferencialmcnte, regras niio cristalizadas na constituição escrita ou em quaisquer outros textos jurídicos. . 2. ;\s regras constitucionais informais o acolhimenlo de rl:gr~s constitucionais informais, no âmbito do Direito Constituciollal, não signific;1 a dissolução d~ constituição formal na velha "constituição real'.', nos "factos pn1flicos".l\s regras informais constilucional- menle relevantes têm de obedecer a certos requisitos, nem sempre explicitados ou at{- desconhecidos pela cuforia infonnalista. como pôs em relevo M. SC1tuLTZ 1'11'1.1'1"1. /)l'/' informolc ~""fasS/llIg.waat. Berlim. pág. 20 segs. As informalidades "n<Hnlalivas" ou "regul~tivas" obedecem a certos rC(luisiloS: 1) devem cons- tituir expc('/lItil'IIS reglllares de comportalllentos que ganharam profundidade institucional. de forma a serem consideradas como verdadeiras regras de com- 1'011:t1l1euIClc decisão; 2) deve/li ter COIICXfÍOimediato com as normas jllrfd;co- r' Ci -!,., 00000001 00000002 00000003 00000004 00000005 00000006
Compartilhar