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Anorexia Nervosa

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Psicologia &m foco, Aracaju, Faculdade Pio Décimo, v. 1, n. 1, jul./dez. 2008 
 
Vol. 1 (1). Jul./Dez 2008 
_____Psicologia &m foco 
Anorexia Nervosa: uma Revisão Bibliográfica 
_________________________________________________________ 
 
 
 
Carlos Michell Torres Santos1 
Glessiane de Oliveira Almeida2 
Faculdade Pio Décimo – Sergipe/Brasil 
 
 
 
Resumo: O presente estudo busca esclarecer a etiologia, diagnóstico e tratamento da Anorexia 
Nervosa. Tal patologia tem origem multifatorial e envolve severas perturbações no comportamento 
alimentar, sendo seu principal atributo o medo mórbido de engordar. Por meio de uma revisão 
bibliográfica, efetuada em meio eletrônico, foi possível observar que a fisiopatologia da doença 
permanece obscura e que, por conseqüência, sua terapêutica ainda é limitada, e deve ser centrada em uma 
abordagem holística para possibilitar seu sucesso. 
 
Palavras-chave: Anorexia Nervosa; Transtornos Alimentares; Perda de Peso. 
 
 
 
Anorexia Nervosa: A Bibliographic Review 
 
 
 
Abstract: The present research review etiology, diagnosis and treatment of Anorexia Nervosa. 
Thus pathology has a multifactorial origin and involves severe perturbations on eating behavior, with 
main attribute of morbid fear in gain weight. By a bibliographic review, it was possible to observe that 
physiology of this illness is obscure and, due to this, its therapeutics is still limited, may be centered in a 
holistic approach to make its success possible. 
 
Keywords: Anorexia Nervosa; Eating Disorders; Weight Reduction. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1 Fisioterapeuta, Especialista em Acumputura; Mestre em Ciências da Saúde e professor do curso de psicologia da Faculdade 
pio Décimo. Endereço eletrônico: michlellfisio@hotmail.com 
2 Aluna do curso de psicologia da Faculdade Pio Décimo. 
 
 
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Introdução 
 
 
Cordella e outros (2006) afirmam que os 
transtornos alimentares são enfermidades que 
trazem um sofrimento intenso não apenas para o 
portador, mas também para seus familiares. 
Segundo Santos e outros (2004), estas desordens 
contemplam basicamente a anorexia e bulimia 
nervosa, as quais são de duas a cinco vezes mais 
comuns que as outras alterações do 
comportamento alimentar. 
De acordo com o DSM-IV (1995) anorexia 
nervosa (AN) envolve severas perturbações no 
comportamento alimentar do indivíduo, sendo seu 
principal atributo o medo mórbido de engordar. 
Tal patologia caracteriza-se pela dieta 
severamente restrita, resultando em um peso 
corporal ao menos 85% abaixo daquele esperado 
para idade e altura. Por sua vez, a bulimia é 
denotada por freqüentes flutuações no peso e 
episódios recorrentes de abuso alimentar 
compulsivo seguido pela auto-indução ao vômito, 
expurgo, jejum, uso de laxantes ou abuso do 
exercício físico, na tentativa de evitar o ganho de 
peso (ABREU; FILHO, 2005; PRYOR, 1995; 
APA, 1993). Neste sentido, o presente estudo 
busca identificar a etiologia, diagnóstico e 
tratamento dos pacientes acometidos pela anorexia 
nervosa. 
 
Anorexia Nervosa: Breve histórico e 
Epidemiologia Atual 
 
Os relatos iniciais de um sofrimento auto-
imposto através da restrição alimentar datam da 
idade média e, na época, estavam relacionados à 
conduta religiosa de privação (BIDAUD, 1998; 
HERSCOVICI; BAY, 1997). Todavia, o primeiro 
relato médico de AN foi descrito por Richard 
Morton (1694), através do caso de uma jovem 
mulher com recusa em alimentar-se e ausência de 
ciclos menstruais, a qual rejeitou qualquer ajuda e 
foi a óbito devido à inanição (CORDAS, 2004). 
Na segunda metade do século XIX a AN torna-se 
uma entidade autônoma e demarcada a partir dos 
relatos do francês Charles Laségue (1873) que 
descreve a anorexie histérique. No ano seguinte, 
William Gull descreveu três meninas com quadro 
que se caracteriza atualmente como anorexia 
restritiva (quando o emagrecimento ocorre em 
virtude de dietas, jejuns ou exercícios em excesso) 
e denominou-o de “apepsia histérica”. Suas 
observações mencionavam emagrecimento 
proeminente, bradicardia, baixa temperatura 
corporal, edema nos membros inferiores, 
amenorréia e obstipação. Todavia, o primeiro 
autor a mencionar a distorção da imagem corporal 
foi Brunch em 1962 (CORDAS, 2004). 
 Atualmente, a AN é o transtorno mental 
responsável pela maior taxa de mortalidade nos 
países industrializados (SIGNORINI et al, 2007; 
SULLIVAN, 1995). De acordo com Hoek (2006), 
entre 80 e 90% dos pacientes acometidos pela AN 
são do sexo feminino, uma vez que a preocupação 
com peso e imagem corporal prevalece nas 
mulheres (HOSKINS; DELLEBUUR, 2000; 
FIELD et al, 1999; FRIEDMAN, 1998). Além 
disso, esta entidade é a causa mais freqüente de 
perda de peso em mulheres jovens e admissões 
hospitalares entre crianças e adolescentes (HOEK, 
2006). 
 
Etiologia 
 
Para Gaspar (1999) a AN é uma 
perturbação alimentar que afeta a maioria de uma 
população jovem, feminina, de raça branca, 
residente no espaço urbano, e de classe social 
média pertencente às sociedades Ocidentais 
contemporâneas. Sua manifestação tem início 
praticamente na adolescência, mais 
especificamente entre 15 e 18 anos, uma vez que 
nesse período ocorrem mudanças marcantes na 
fisiologia e bioquímica, como um acúmulo 
acentuado de gordura, especialmente nas mulheres. 
 
 
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O ganho de gordura durante a adolescência cessa e 
até se reverte nos homens, enquanto nas mulheres 
continua a aumentar, chegando a um índice de 
gordura corporal de 27% aos 16 anos (CASTRO; 
GOLDSTEIN, 1995). 
Borges e outros (2006) relatam que 
geralmente os pacientes relatam que o início do 
quadro se deu após um fator estressante como 
algum comentário sobre seu peso, término de 
relacionamento, ou perda de ente querido, 
concomitantemente esses pacientes apresentam 
traços de personalidade como preocupações e 
cautela em excesso, medo de mudanças, 
hipersensibilidade e gosto pela ordem. Os fatores 
pessoais, comportamentais e sócio-ambientais, tais 
como imagem corporal negativa, baixa auto-
estima, temor em se tornar gordo, dieta crônica e 
pressão social para ser magro são identificados 
como fatores de risco para o aparecimento desta 
patologia (AFFENITO; KERSTETTER, 1999; 
STEIGER et al, 1999; FRIEDMAN, 1998; 
JARRY, 1998; LECHKY, 1994). 
Devido ao fato de 90% dos indivíduos 
atingidos serem do sexo feminino (ALVES; 
VASCONCELOS; CALVO, 2008) presume-se 
que a tensão da sociedade, pautada no modelo de 
beleza feminina regido pela magreza, exerça 
participação significativa na AN (CASTRO; 
GOLDSTEIN, 1995; STICE et al, 1994). Segundo 
Alves, Vasconcelos e Calvo (2008), os estudos 
sobre anorexia nervosa no Brasil são escassos, 
sobretudo quando se busca um enfoque 
populacional. Todavia, este mesmo autor refere 
que as prevalências de comportamentos 
alimentares anormais, os quais sinalizam risco 
para o desenvolvimento da doença, oscilam de 4,9 
a 25%, variando conforme grupo étnico, idade, 
atividade ocupacional e grau de urbanização dos 
indivíduos investigados. 
Dentro do modelo multifatorial que rege o 
aparecimento desta entidade, é possível enumerar 
fatores predisponentes (sexo feminino, história 
familiar de transtorno alimentar, baixa auto-estima, 
perfeccionismo e dificuldade em expressar 
emoções), fatores precipitantes (dieta, separação e 
perda, alterações da dinâmica familiar, 
expectativas irreais e proximidade da menarca) e 
ainda fatores mantenedores (alteraçõesendócrinas, 
distorção da imagem corporal, distorções 
cognitivas e práticas purgativas) (PHILIPPI; 
ALVARENGA, 2004). 
 Estudos envolvendo gêmeos e família 
(BULIK et al, 2000), estudos de imagens cerebrais 
dos familiares afetados e não afetados, além de 
análise genética sustentam a observação que AN é 
encontrada em famílias com traços obsessivos, 
perfeccionistas, competitivos, ou ainda autistas. 
 
Diagnóstico e quadro clínico 
 
A primeira manifestação desta afecção é 
uma restrição dietética auto-imposta e insidiosa, 
acompanhada de exercícios físicos planejados para 
redução do peso e quase sempre despercebidos 
pelos familiares (ALVES; VASCONCELOS; 
CALVO, 2008). Normalmente, inicia-se na 
adolescência, pelo fato das transformações 
corporais e o medo exagerado de engordar, 
exigindo uma adaptação à imagem corporal. 
Embora exista uma grande controvérsia na 
definição dos sintomas desta patologia alimentar 
(WALLER, 1993), os critérios estabelecidos em 
pelo Manual de Diagnóstico e Estatística das 
Perturbações Mentais (DSM-IV) são os mais 
utilizados por investigadores clínicos e apresentam 
como as características diagnósticas principais da 
AN: recusa em manter o peso corporal acima do 
peso mínimo normal para altura e idade; perda de 
peso abaixo dos 85% do peso esperado para altura 
e idade; recusa em ganhar o peso esperado durante 
o período de crescimento, conduzindo a uma 
perda de peso corporal abaixo dos 85% daquele 
esperado; medo intenso de engordar ou aumentar 
o peso, mesmo com peso inferior ao normal; 
distúrbio da imagem corporal; excessiva 
dependência do peso ou tamanho do corpo para a 
auto-imagem; negação da doença; amenorréia, no 
caso das mulheres, ou ainda perda de pelo menos 
três ciclos menstruais consecutivos (APA, 2002). 
O DSM-IV (APA, 2002) ainda descreve 
dois subtipos de anorexia nervosa: anorexia 
nervosa restritiva, a qual ocorre quando o 
 
 
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emagrecimento acontece em virtude de dietas, 
jejuns ou exercícios em excesso; anorexia nervosa 
compulsiva periódica purgativa ou bulímica, 
advinda do fato do indivíduo dedicar-se 
regularmente a purgações que incluem vômitos 
auto-induzidos, abuso de laxantes ou diuréticos 
durante o episódio atual de anorexia nervosa 
(GIORDANE, 2006). 
A hospitalização é frequentemente indicada 
quando ocorre uma perda de peso severa e rápida 
ou ainda quando uma depressão importante 
apresenta-se concomitantemente. As queixas 
apresentadas anteriormente à hospitalização 
geralmente são vagas e os pacientes 
frequentemente demonstram falta de preocupação 
em virtude da sua perda de peso (MEHLER; 
KRANTZ, 2003). De acordo com Krantz e 
Meheler (2004), vários são os achados físicos e 
laboratoriais referentes à presença de AN tais 
como unhas quebradiças, penugem facial rala 
(lanugo), redução do volume capilar (alopécia), 
carotenodermia, redução no número de células 
CD4 e CD8, anemia, leucopenia, redução da taxa 
de sedimentação dos eritrócitos, bradicardia, 
hipotensão, hipoglicemia, hipercolesterolemia, 
hipocalemia, diabetes insipidus, dentre outros. 
Nota-se, portanto, que esta doença conduz a uma 
significante morbidez biológica, psicológica e 
social, que pode até mesmo ser fatal (TORRES; 
GUERRA, 2003). À medida que o quadro se 
instala, o corpo é constantemente negado, a tal 
ponto que se exime de ser um corpo vivo e 
desejante (SANTOS et al, 2004). 
Os portadores da AN, mesmo acometidos 
por diversas alterações orgânicas, utilizam os 
exercícios físicos como um comportamento 
compensatório, no intuito de queimar gorduras ou 
calorias provenientes da ingestão de comida ou 
bebida (APA, 2002). Tipicamente, os indivíduos 
acometidos por tal patologia elegem a prática de 
exercícios aeróbios, de moderados a vigorosos 
(JACK; KRATZ, 1994), o que gera uma alta 
morbidade em virtude da sua associação com 
regimes alimentares anormais (DAVIS et al, 
1997). A primeira conseqüência deletéria derivada 
da associação entre a redução de peso excessiva e 
prática de exercício físico, em estado de má 
nutrição, é a perda de massa muscular e, por 
conseguinte, a debilidade física (MICKEY, 1999; 
PARGMAN, 1998). A segunda conseqüência do 
baixo peso corporal seria a amenorréia derivada da 
redução do estrogênio, a qual pode levar ao 
enfraquecimento ósseo, mesmo com a reposição 
hormonal (MICKEY, 1999). 
Os efeitos da nutrição empobrecida no 
sistema cardiocirculatório representam também um 
grave risco aos pacientes portadores da AN que se 
submetem a exercícios físicos, pois o coração 
destes indivíduos diminui de tamanho e torna-se 
mais fraco. A hipotensão é um fator importante 
neste processo, por ser mais um aspecto que 
contribui com a dificuldade do fornecimento de 
oxigênio aos tecidos durante a prática do exercício 
citação. A associação entre a hipotrofia cardíaca e 
baixa pressão sanguínea pode culminar no 
prolapso da valva mitral e em arritmias, 
potencialmente fatais (op. cit.). Por sua vez, os 
vômitos freqüentes produzem desequilíbrio 
eletrolítico, podendo levar à câimbra, em virtude 
da redução do trifosfato de adenosina (ATP) ou 
dos níveis séricos de potássio, ataques epilépticos, 
anormalidades severas no ritmo cardíaco, até 
mesmo paralisia respiratória e morte (MICKEY, 
1999; JACK; KATZ, 1994). A desnutrição aguda e 
os desequilíbrios hidroeletrolíticos facilitam e 
consolidam as alterações psíquicas oriundas de tal 
patologia (SANTOS et al, 2004; PHILIPPI; 
ALVARENGA, 2004; SANTOS, 2002; VILAR; 
CASTELLAR, 2001). 
 
Tratamento 
 
O tratamento compulsório da AN é 
claramente indicado quando o paciente é incapaz 
de aceita-lo, o que na maioria dos países significa a 
detenção hospitalar citação. Todavia, a 
responsabilidade legal se torna menos clara quando 
o perigo eminente de morte ou deterioração 
irreversível desaparece (RAMSEY et al, 1999). 
A principal meta do tratamento da anorexia 
nervosa é o ganho de peso até o índice de massa 
corporal (IMC) acima de 19 (APA, 2000). Apesar 
 
 
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da escassez de estudo na área (ALVES; 
VASCONCELOS; CALVO, 2008), Abreu e Filho 
(2004) apontam que 50% das pacientes se 
"recuperam totalmente" e isto significa o 
restabelecimento do peso, a normalização dos 
comportamentos alimentares e o retorno da 
menstruação reguar. Outros 30% experienciam 
uma recuperação parcial caracterizada por algum 
tipo de resíduo ou distúrbio no comportamento 
alimentar e pela falta de habilidade para manter o 
peso normal. E, finalmente, nos 20% restantes, a 
doença assume uma forma crônica, não 
apresentando qualquer sinal de remissão (op. cit). 
Outro estudo demonstra que em mais de 30% dos 
casos não há recuperação (LOWE et al, 2001). Em 
média, é necessário de cinco a seis anos desde o 
diagnóstico à recuperação deste pacientes 
(THEANDER, 1985). 
Uma das formas de tratamento utilizada em 
pacientes anoréxicos é a psicoterapia, embasada 
em diferentes correntes teóricas, as quais visam, 
em geral, a reorganização da maneira pela qual os 
pacientes percebem a própria realidade. O enfoque 
construtivista afirma que o desenvolvimento 
humano é contínuo e dá-se a partir da contínua 
reorganização do sistema. Para o construtivismo a 
anorexia nervosa é um episódio agudo ou crônico 
de desorganização (MAHONEY, 1998). Assim, os 
transtornos alimentares são decorrentes de uma 
desorganização na maneira como as pacientes 
constroem a realidade, ou seja, como processam 
suas experiências e seu processamento vivencial de 
modo a torná-la um sistema em equilíbrio, 
mantendo coerentes suapercepção do mundo, do 
outro e do seu próprio eu (ABREU; FILHO, 
2004). 
O modelo cognitivista entende que há entre 
o mundo e o indivíduo uma intermediação da 
atividade do pensamento, ou seja, o modo como as 
pessoas se sentem e conseqüentemente se 
comportam é o resultado de uma atividade 
cognitiva contínua, atribuidora de significados aos 
eventos do mundo externo (op. cit.). Sendo assim, 
uma abordagem que contemple o modelo 
cognitivo-construtivista levanta a questão da 
superioridade do pensar sobre o sentir e agir e 
propõe um sentido inverso, segundo o qual nossas 
construções cognitivas são fruto de uma 
organização emocional (op. cit.). A psicoterapia 
tem justamente o intuito de refazer tal construção 
da realidade, ou seja, desenvolver gradualmente, 
por parte do cliente, habilidades para responder às 
pressões ambientais desafiadoras (op. cit.) e a 
modificação de padrões emocionais para sua 
compreensão e regulação (ABREU; ROSO, 2003). 
Segundo Cobelo, Saikali e Schomer (2004), 
outra abordagem psicoterapêutica que abre novas 
perspectivas no tratamento de pacientes com 
transtornos alimentares é a psicoterapia familiar, a 
qual afirma que a dinâmica familiar possui uma 
função de grande importância no tratamento de tais 
indivíduos. Esta forma terapêutica é fundamental 
para unir família-paciente para que, juntos, possam 
encontrar maneiras e alternativas variadas de 
reconstruir e ressignificar suas vivências, pois 
esses pacientes usam o corpo para cenário de suas 
necessidades, desejos, proibições e condenações 
(op. cit.). A esta abordagem terapêutica, caberia 
transformar todo este cenário vivido pelo 
anoréxico em palavras e se libertar para 
relacionamentos mais adequados, sociais, 
trabalhando em conjunto com uma equipe 
multidisciplinar, abordando vários aspectos e 
considerando o caráter multifatorial do transtorno. 
Existem vários modelos de tratamento familiar, 
entre eles, pode-se citar o Modelo Tradicional, o 
de Terapia Familiar Estrutural, o de Terapia 
Familiar Estratégica, o de Terapia Familiar 
Sistêmica e o Modelo Milão e Pós-Milão. Essas 
formas de tratamento estão centrados em 
Entrevistas individuais com as famílias, com o 
objetivo de oferecer aos familiares um espaço que 
possibilite acolher sentimentos conflitantes como 
culpa, raiva, hostilidade, assim como exercer uma 
função de suporte à angustia e à sensação de 
impotência presentes na maioria das famílias nos 
primeiros encontros. As sessões possibilitam, 
também, um espaço para perguntas, dúvidas e 
questionamentos, oferecendo esclarecimentos 
centrados na conscientização da família sobre a 
doença, seus riscos, o tratamento e a necessidade e 
importância da equipe multidisciplinar (op. cit.) 
 
 
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 Compete à psicoterapia desconstruir as 
histórias de restrição que o transtorno alimentar lhe 
impôs, desenvolvendo um sentido de confiança 
para que possam compartilhar as possíveis crises 
que irão surgindo ao longo dos encontros e manter 
ativa a luta pela mudança (op. cit.). Em alguns 
casos de AN, que apresentam comorbidade 
psiquiátrica, é necessária a abordagem 
psicofarmacológica (SALZANO; CORDAS, 
2004). Os antidepressivos são bastante utilizados 
para tratar os sintomas depressivos, mas 
apresentam sucesso limitado. Os benefícios dos 
inibidores seletivos da recaptação de serotonina na 
prevenção da recaída após o ganho de peso ainda 
são incertos (MORRIS; TWADDLE, 2007). De 
acordo com Salzano e Cordas (2004), novas 
pesquisas ainda são necessárias para determinação 
da quantidade das doses eficazes e duração do 
tratamento, bem como diferenças nos resultados 
terapêuticos com associação de psicoterapia. 
Em um estudo com 35 pacientes com AN, 
comparou-se o uso de placebo e fluoxetina (20 a 
60 mg/dia), durante um ano (KAYE et al, 2001). 
Os resultados mencionaram ganho de peso e 
melhora na psicopatologia da AN, no humor 
disfórico e nos pensamentos obsessivos somente 
para pacientes que utilizaram fluoxetina, sugerindo 
o uso da droga na prevenção de recaídas 
(SALZANO; CORDAS, 2004). Outro estudo 
apontou a olanzapina como responsável pela 
melhora na ansiedade, recusa alimentar e no ganho 
de peso (MALINA et al, 2003). Entretanto, 
nenhum psicofármaco foi claramente mais eficaz 
do que o placebo em melhorar os sintomas 
exclusivos da AN. Apesar de todas as formas de 
tratamento encontradas até o momento, a AN ainda 
não possui um tratamento farmacológico 
considerado eficaz para melhora da psicopatologia 
do transtorno (SALZANO; CORDAS, 2004). 
Uma taxa de mortalidade prematura de 
20%, bem como uma extensa proporção de casos 
que necessitaram de seis a doze anos para 
recuperação, foram observados em um amplo 
estudo (THEANDER, 1985). A comorbidade está 
associada com prognóstico mais sombrio 
(MORRIS & TWADDLE, 2007, ). Mais 
recentemente, a recuperação total foi demonstrada 
mesmo após 21 anos de uma severa AN (LOWE, 
2001, ). Em virtude das limitações oferecidas pela 
terapêutica da AN, para que se alcance um nível 
satisfatório de eficiência e eficácia, a mesma deve 
ser dada de forma multidisciplinar, o mais 
precocemente possível, e centrada na psicoterapia 
individual, familiar, terapia nutricional e 
farmacoterapia, quando necessária. 
 
Conclusão 
 
Torna-se notório, a partir do exposto 
previamente, que a etiologia da AN é multifatorial, 
com contribuição de fatores biológicos, genéticos, 
psicológicos, socioculturais e familiares. Em 
virtude das limitações encontradas no tratamento 
da AN, seu sucesso encontra-se norteado pela 
precocidade do diagnóstico e abordagem 
multidisciplinar desta patologia. Dada a alta 
prevalência relacionada a esta patologia, faz-se 
necessário que novas pesquisas sejam realizadas, 
no sentido de se estabelecer os mecanismos 
fisiopatológicos específicos envolvidos neste 
processo, para que estratégias cada vez mais 
eficazes e eficientes possam ser elaboradas no 
intuito de tratar os pacientes acometidos pela AN. 
Outro aspecto importante seria o aprofundamento 
do estudo acerca das abordagens psicoterápicas 
relacionadas à AN, bem como sua associação e 
comparação ao tratamento farmacoterápico, uma 
vez que a psicopatologia desta doença estabelece 
conseqüências individuais e necessita de 
metodologias de abordagem cada vez mais 
específicas. 
 
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Submetido em Agosto de 2008 
Versão revisada em Outubro de 2008 
Aceite final em Novembro de 2008

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