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1 PRIMEIRA PARTE PROJETO COPA DO MUNDO DE 2014 CHILDHOOD BRASIL PREVENÇÃO E ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO CONTEXTO DO MUNDIAL Relatório realizado entre maio e agosto de 2012: Um mapa das ações e discussões empreendidas pelos governos federal, estaduais e municipais e a articulação de organizações da sociedade civil para enfrentar a violência sexual contra meninos e meninas nos preparativos da Copa e durante a competição Consultoras: Eliane Trindade e Patrícia Andrade 2 ÍNDICE PRIMEIRA PARTE – MAPA NACIONAL 1. PANORAMA INTRODUTÓRIO - pág. 5 2. O RELATÓRIO – pág. 6 3. CENÁRIO NACIONAL – pág. 7 4. ATORES GOVERNAMENTAIS – pág. 8 4.1 Secretaria de Direitos Humanos – pág. 8 4.2 Ministério do Turismo – pág. 19 5. OUTROS ATORES – pág. 26 5.1 A experiência do Projeto Vira Vida – pág. 26 5.2 Protoganismo adolescente – pág.29 5.3 Aliança Nacional de Adolescentes (ANA) – pág.38 5.4 Projeto Os Direitos Humanos da Criança e do Adolescente no Circuito da Copa de 2014 e os Objetivos do Milênio – pág. 40 5.5 Projeto Itaú Criança, da Fundação Itaú Social – pág. 44 5.6 Projeto Bola na Rede – Um gol pelos direitos de crianças e adolescentes – pág. 45 5.7 Articulação empresarial – pág. 48 5.8 Programa SEST/SENAT de Enfrentamento à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes – pág. 50 6. A MOVIMENTAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL – pág. 51 7. ESTRUTURA DE GOVERNANÇA – pág. 67 7.1 CONHEÇA O CGCOPA – pág. 69 3 7.2 Funções do CGCOPA – pág. 70 7.3 CONHEÇA O GECOPA – pág. 70 7.4 Composição do GECOPA – pág. 71 7.5 ÁREAS DO GOVERNO RELACIONADAS AO TEMA – pág. 76 7.6 AS CÂMARAS SETORIAIS – pág. 77 7.7 AS REDES NACIONAIS DA SOCIEDADE CIVIL – pág. 88 SEGUNDA PARTE - A SITUAÇÃO NAS CIDADES-SEDE 1. INTRODUÇÃO: O CENÁRIO NOS DOZE ESTADOS-SEDE –pág 92 2. RELATÓRIOS LOCAIS 2.1 Belo Horizonte 2014 – pág. 97 2.2 Brasília 2014 – pág. 125 2.3. Cuiabá 2014 – pág. 144 2.4. Curitiba 2014 – pág. 172 2.5. Fortaleza 2014 – pág. 203 2.6. Manaus 2014 – pág. 238 2.7. Natal 2014 – pág. 278 2.8. Porto Alegre 2014 – pág. 297 2.9. Recife 2014 – pág. 332 2.10. Rio de Janeiro 2014 – pág. 387 2.11. Salvador 2014 – pág. 412 2.12. São Paulo 2014 – pág. 442 4 3. LISTA DE ACRÔNIMOS – pág. 470 4. ANEXOS 5 1. PANORAMA INTRODUTÓRIO A Copa do Mundo da FIFA é um dos maiores eventos do planeta. A disputa entre as melhores seleções nacionais de futebol mobiliza bilhões de pessoas em todo o mundo, das mais variadas culturas e crenças. Provoca paixões e emoções. Une povos. Gera empregos e renda, ajudando a promover o desenvolvimento do País-sede. Em 2014, o Brasil sediará, mais uma vez, esse torneio. E a Copa do Mundo se apresenta como uma oportunidade singular para que o País do futebol mostre ao mundo inteiro que não é só bom de bola. Um evento com tamanha dimensão deve ser encarado, na verdade, como uma grande chance para que o Brasil avance na construção de um modelo de desenvolvimento cada vez mais equilibrado, sustentável, capaz de promover o crescimento econômico aliado à distribuição de renda. Estima-se que a Copa do Mundo da FIFA de 2014 agregará 183 bilhões de reais ao PIB do País e mobilizará 33 bilhões de reais em investimentos em infraestrutura, com destaque para a área de transporte e sistemas viários. Cerca de 3,7 milhões de turistas, brasileiros e estrangeiros, deverão gerar, no período do evento, 9,4 bilhões de reais, de acordo com dados oficiais. Em todas as áreas, 700 mil empregos permanentes e temporários serão criados. 6 Em meio a polêmicas, atrasos e situações embaraçosas entre o governo brasileiro e a FIFA, as obras para o Mundial estão em andamento tanto em âmbito nacional quanto nas doze cidades-sede da Copa: Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá, Curitiba, Fortaleza, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo. Mas qual será o legado que a Copa do Mundo deixará para o Brasil e o seu povo? O Mundial realmente terá condições de promover melhorias em áreas como infraestrutura, turismo, criação de emprego e renda e promoção da imagem do País em escala global? É nesse cenário que entram as preocupações com a garantia dos direitos humanos e a proteção de crianças e adolescentes. Ao mesmo tempo em que um evento desse porte representa grandes oportunidades de desenvolvimento, pode agravar situações de vulnerabilidade entre crianças e adolescentes, caso não sejam tomadas medidas importantes no sentido de incluir socialmente esses meninos e meninas, prevenindo e enfrentando problemas como a exploração sexual. 2. O RELATÓRIO O estudo que apresentamos nas próximas páginas é resultado de um amplo e detalhado levantamento realizado na esfera federal e nas doze cidades-sede do Mundial para mapear as iniciativas que estão sendo adotadas com o objetivo de enfrentar a exploração sexual no contexto da Copa, protegendo as crianças e os adolescentes brasileiros de qualquer forma de violação de seus direitos. 7 Este levantamento também traz uma espécie de mapa da governança da Copa do Mundo, indicando como está estruturado o plano de ação para o Mundial e quem são os principais atores governamentais e não governamentais encarregados de lidar com os projetos e as ações voltadas para a competição. 3. CENÁRIO NACIONAL De acordo com dados do Disque 100, do governo federal, entre maio de 2003 e março de 2011, foram registradas 275.638 denúncias de violações de direitos humanos de crianças e adolescentes. Desse total, 27.664 foram de casos de exploração sexual de meninos e meninas, uma média de 294 denúncias por mês. Segundo o Disque 100, há ocorrência de exploração sexual em 2.930 municípios brasileiros. O estudo Matriz Intersetorial e Copa do Mundo, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), realizado a partir dos dados do Disque 100, evidencia que as doze cidades-sede da Copa são áreas com grande vulnerabilidade à prática da exploração sexual de crianças e adolescentes. No período entre 2005 e 2010, essas doze cidades registraram 6.570 denúncias. Com base nesses números, a Secretaria de Direitos Humanos colocou entre suas prioridades de ação no Plano Plurianual (PPA) para o período de 2012 a 2015 a necessidade de haver uma intervenção especial em rodovias, fronteiras, grandes obras e cidades-sede da Copa do Mundo. As discussões sobre como enfrentar o fenômeno da exploração sexual de crianças e adolescentes no contexto da Copa do Mundo já estão acontecendo 8 dentro do governo federal, muito embora ainda que de forma tímida e sem envolver todos os órgãos que compõem o Comitê Gestor do Mundial (leia mais sobre a formação do Comitê no item “Estrutura de Governança”). 4. ATORES GOVERNAMENTAIS Na perspectiva da Copa de 2014, o debate e a elaboração de ações para que seja possível promover a inclusão social de meninos e meninas em situação de vulnerabilidade, prevenir e enfrentar a exploração sexual, acontece, sobretudo, no âmbito da Secretaria de Direitos Humanos e, no Ministério do Turismo, dentro do Programa Turismo Sustentável e Infância.4.1 Secretaria de Direitos Humanos *Protagonismo governamental Na avaliação da Secretaria de Direitos Humanos (SDH), cabe ao governo federal e aos governos estaduais e municipais assumir o papel de protagonistas na condução das políticas públicas de proteção da infância e da adolescência no contexto do Mundial. Isso porque, segundo Carmen Oliveira, Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, na África do Sul, esse papel foi desempenhado, principalmente, pela sociedade civil. “Na África do Sul, alguns problemas foram exacerbados: envolvimento com drogas, trabalho infantil, gravidez, aumento de atos infracionais e desaparecimento de crianças e adolescentes. A experiência da África do Sul 9 deixou duas avaliações bem contundentes para nós, do governo brasileiro: o protagonismo desse processo deve ser do Poder Público e o maior legado que a Copa pode deixar é o fortalecimento das políticas públicas”, analisa Carmen Oliveira. Para ela, o grande desafio em relação à Copa é a convergência de ações. “É fundamental que se crie uma agenda convergente, pois o gestor municipal está ficando confuso com tantos atores em cena: ONGs, organismos internacionais, governos”, diz Carmen Oliveira. “Temos que aproveitar para melhorar a rede de atendimento às crianças e aos adolescentes, que tem fragilidades”, conclui. *Fortalecimento do Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes No panorama das políticas públicas nacionais, algumas ações já estão sendo planejadas para prevenir e enfrentar a exploração sexual de crianças e adolescentes. Segundo Carmen de Oliveira, em 2011, por exemplo, a SDH já financiou ações em algumas cidades-sede da Copa por meio do Programa de Ações Integradas e Referenciais de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto- juvenil no Território Brasileiro (PAIR), desenvolvido por quase todas as capitais brasileiras. A ideia é que o PAIR faça um diagnóstico das políticas públicas existentes voltadas para essa e outras questões que envolvem a infância e a adolescência. Algumas cidades já foram conveniadas e outras serão em 2012. O objetivo é desenvolver um Plano de Intervenção Intersetorial, com ações que vão além da problemática da exploração sexual de crianças e adolescentes. 10 *A Implantação do Programa de Ações Integradas e Referenciais de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-juvenil no Território Brasileiro (PAIR) Fruto de uma iniciativa conjunta do governo brasileiro e da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), o PAIR foi criado em 2002 como uma experiência-piloto de operacionalização das diretrizes e metas estabelecidas no Plano Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual Infantojuvenil, que foi aprovado no ano 2000, numa construção do Poder Público em parceria com a sociedade civil. Atualmente, esse programa abrange mais de 600 municípios brasileiros. Segundo Joseleno Vieira dos Santos, coordenador do PAIR na SDH, no que se refere ao cenário da Copa do Mundo de 2014, atualmente a Secretaria está apoiando a implementação do programa em Fortaleza, uma das doze cidades- sede (leia mais no relatório sobre Fortaleza). Mas estão sendo feitos contatos com os seguintes Estados: Rio Grande do Norte, Bahia, Pernambuco, Amazonas, Mato Grosso e Distrito Federal para propor a implantação do PAIR nos municípios-sede do Mundial e em, pelo menos, mais três cidades de cada Estado, que poderão sofrer forte impacto no turismo relacionado com a Copa. O apoio para a implantação do PAIR nas demais cidades da Copa 2014 (São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Curitiba e Porto Alegre) dependerá de disponibilidade orçamentária, de acordo com Joseleno Santos. 11 Os repasses de recursos são feitos a partir de um convênio assinado entre o governo estadual e a SDH, prevendo ações de acordo com a metodologia do PAIR. Normalmente os convênios têm vigência de 18 meses. “Infelizmente, temos expectativas de que, com a realização da Copa do Mundo em 2014, a questão da exploração de crianças e adolescentes se acentue”, analisa o coordenador do PAIR. Segundo Joseleno Santos, está sendo construída, na Comissão Intersetorial de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes do governo federal, uma agenda de convergência que envolva ações dos vários ministérios, secretárias, organismos internacionais e sociedade civil organizada, voltadas para a prevenção, a mobilização, a realização de campanhas, a capacitação das redes locais de proteção aos meninos e meninas e o atendimento mais qualificado das vítimas de violência sexual. *Disseminação da metodologia do PAIR nas cidades-sede da Copa Ainda no âmbito do PAIR uma ação importante é o projeto desenvolvido pelo Instituto Aliança, com apoio da Secretaria de Direitos Humanos e parceria com o Comitê Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, Universidade Federal do Mato Grosso do Sul e Universidade Estadual do Ceará. Sediado em Salvador, o Instituto Aliança foi criado em 2002 e tem como principal missão “educar jovens, organizações e comunidades para o 12 desenvolvimento humano sustentável”, em âmbito nacional, mas prioritariamente, na região Nordeste. O objetivo dessa iniciativa é disseminar a metodologia do PAIR em escala, para públicos diferenciados em municípios de pequeno, médio e grande porte, utilizando plataformas de ensino semipresencial e a distância. O projeto foi aprovado em dezembro de 2010 para execução até novembro de 2011. No entanto, a partir de aditivo aprovado pela SDH, o prazo de implementação foi prorrogado até abril de 2013. Entre março de 2011 e julho de 2012, foram formadas cinco turmas, com a participação de mais de 1000 profissionais de todas as regiões brasileiras. A meta colocada para o Instituto Aliança pela Secretaria de Direitos Humanos é adequar a metodologia de formação presencial para a modalidade a distancia. A metodologia proposta combina, assim, aulas semipresenciais e a distância, levando-se em consideração o nível de incidência do fenômeno nos municípios mapeados pela SDH. O público-alvo da iniciativa é formado por equipes técnicas que atuam nas redes de proteção voltadas a crianças e adolescentes, em especial, às vítimas de violência sexual; gestores estaduais e municipais, conselhos de direitos, tutelares e setoriais. Segundo Graça Gadelha, coordenadora do projeto, nessa segunda etapa de disseminação do PAIR, por meio da educação a distância, foram selecionadas as cidades-sede da Copa de 2014, em comum acordo com a SDH. Serão formadas quatro turmas, enfatizando módulos conceituais sobre o tema. “O trabalho de disseminação da metodologia direcionado para as próximas quatro turmas focalizará nesses municípios a validação dos conteúdos, materiais e 13 instrumentais produzidos em função dos grandes eventos esportivos”, explica Graça. A previsão é de formar, pelo menos, 1200 profissionais em 2012 nas redes de proteção das cidades-sede da Copa. Os cursos já estão rendendo bons frutos. O relatório final de avaliação do projeto, que incluiu o período relativo a dezembro de 2010 a julho de 2012, correspondente às cinco primeiras turmas, destacou os seguintes pontos: A maioria dos alunos disse que o curso promoveu reflexões e debates sobre conceitos importantes e ajudou a refletir sobre suas práticas profissionais. A maioria dos alunos considera os textos-base como ótimos e os materiais complementares ótimos ou bons. A participação dos professores e os debates propostos também foram avaliados, pela maioria dos alunos, como ótimos ou bons. A maioria do público participante considerou como ótima a contribuição do curso para sua prática profissional. Os alunos, em sua maioria, afirmaram que, se fossem participar de um curso com o mesmo conteúdo, optariam por participar de um curso de pós- graduação totalmente a distância ou participaria de um curso de pós- graduação semipresencial. Na avaliação de Graça Gadelha, entre os principais desafios do projeto estão a dimensão continental do Brasil e a complexidade do fenômeno da violência sexual. Isso, segundo ela, exige a construção de novos modelos de formação e qualificação de profissionais que atuam nessa área, com o objetivo de ampliar as ações de integração e fortalecimento de redes locais nos processos de 14 implementação de políticas públicas que tenham como foco a proteção integral de crianças e adolescentes. A proposta, de caráter inovador, prevê ainda o desenvolvimento de oito módulos sobre o tema “violência sexual contra crianças e adolescentes”, abordando aspectos conceituais e metodológicos, disponibilizando também materiais didático-pedagógicos para utilização nos processos de formação e capacitação das redes locais de proteção e enfrentamento da violência sexual infantojuvenil, consolidando os materiais produzidos e aprendizados obtidos para disseminação em escala. * Plano Brasil Protege Crianças e Adolescentes O governo federal elaborou um plano nacional de proteção à infância e à adolescência. O Plano Brasil Protege Crianças e Adolescentes, ainda sem data para lançamento, tem como foco de intervenção os municípios de maior vulnerabilidade, nos quais estão incluídas as cidades-sede da Copa do Mundo. As ações específicas para os municípios da Copa do Mundo estão incluídas no PAIR e envolvem: 1) diagnóstico da situação; 2) Plano Operacional local; 3) Mobilização e capacitação das redes de proteção sobre esse tema. O Plano Nacional Protege Crianças e Adolescentes, que visa criar uma rede de proteção para enfrentar a violência física, sexual e psicológica contra meninos e meninas, engloba ações em 400 municípios, com recorte de gênero e de raça. Segundo a ministra Maria do Rosário, da SDH, o Brasil Protege vai padronizar a notificação da violência por profissionais da educação, assistência social e saúde. 15 “Nós vamos capacitar ainda mais o professor, a escola, a unidade de saúde e a assistência social para visitar as famílias”, disse a ministra, ao explicar que essas instâncias terão uma ficha única, que irá para a unidade de saúde que atenderá a criança vítima de violência e, ao mesmo tempo, será encaminhada para o Conselho Tutelar. “Com essa rede de proteção, será possível observar melhor as violências no ambiente familiar e apoiar a família. Muitas vezes, nós vamos precisar atender e tratar, mas, também, responsabilizar a situação do abuso sexual no ambiente familiar”, explicou Maria do Rosário no dia 10 de julho, em entrevista ao programa de rádio Bom Dia, Ministro. De acordo com ela, o Plano possui três grandes eixos de ação. O primeiro é o direito da criança de estar com a sua família e não nas ruas ou abandonada em instituições. O segundo é o enfrentamento à violência sexual e o terceiro são os adolescentes em conflito com a lei. *Ações importantes envolvem outros ministérios e órgãos de proteção à infância Outras ações importantes com vistas à proteção de crianças e adolescentes durante a Copa estão em curso e serão coordenadas pela SDH. Durante o Mundial, haverá Conselhos Tutelares funcionando por 24 horas. E será criada uma Central de Atendimento de denúncias de violações de direitos, com o número 125. Haverá um help desk jurídico nessa Central, que dará assistência para os outros Conselhos Tutelares. Também terá uma Central de Inteligência que vai ser operada pelo setor de Segurança Pública. 16 Isso tudo funcionará nas 12 cidades-sede e também em João Pessoa. O governo federal vai operar a construção e a equipagem desse sistema e haverá um co- financiamento para a linha 125, que a Anatel já disponibilizou para essa finalidade. Esse Call Center específico para a Copa vai operar em parceria com o Disque-Denúncia 100, em linha direta. As denúncias serão enviadas diretamente para o Sistema de Informação para Infância e Adolescência (SIPIA) pela internet e haverá um monitoramento de todas elas pelo Disque 100. A ideia, segundo Carmen Oliveira, é que toda essa estrutura seja mantida mesmo depois da Copa do Mundo, como um legado mesmo, fortalecendo, assim, esses canais de denúncias de violências cometidas contra crianças e adolescentes. Haverá ainda a distribuição de kits para os Conselhos Tutelares, com carros, computadores, telefones fixos e móveis e impressora. É importante lembrar que 98% dos municípios brasileiros já têm Conselhos Tutelares, mas ainda permanece o desafio de equipá-los e capacitá-los melhor. O Ministério da Justiça está desenvolvendo ações de prevenção ao desaparecimento de crianças e adolescentes durante os jogos. Haverá, por exemplo, distribuição de pulseiras com identificação para as crianças. O objetivo é desenvolver estratégias para que os governos estaduais e municipais lancem mão delas depois em outras ocasiões. *Conselho Tutelar Móvel estreia na Copa 17 Outra ação do governo federal é a implantação do Conselho Tutelar Móvel, que funcionará numa carreta dentro dos estádios para atender situações de desaparecimentos de crianças e adolescentes, atos infracionais, trabalho infantil, envolvimento com drogas, exploração sexual e outros problemas. A ideia é que essas carretas sejam doadas aos governos estaduais e que possam ser usadas depois em grandes eventos. Uma iniciativa que o governo federal vai copiar da África do Sul é a instalação de espaços seguros de convivência nos estádios, que vão funcionar junto com o Conselho Tutelar. Esses espaços acolherão as crianças que estão perdidas dos pais, filhos de trabalhadores e outros. Também haverá capacitação de policiais e guardas municipais sobre temas ligados à proteção da infância e da adolescência, como a exploração sexual. Outra ação é a implantação nas capitais da Copa de Núcleos Integrados, compostos por Delegacia, Juizado, Vara especializada e Ministério Público. O Ministério da Justiça vai apoiar a construção desses equipamentos. Além disso, haverá Núcleos de Atendimento às Crianças Vítimas de Violência nas urgências dos Hospitais, uma ação do Ministério da Saúde. Enfim, o objetivo é criar uma rede consistente de proteção às crianças e aos adolescentes nessas cidades. No âmbito do Ministério do Turismo, um projeto que está sendo desenhado, inspirado em iniciativa da Espanha, é a formação de adolescentes para serem condutores turísticos, a partir de 16 anos. 18 Outra linha de ação é com a própria mídia, formulando orientações e parâmetros para a imprensa nacional e internacional. Esses guias serão distribuídos principalmente para os correspondentes internacionais. *Preocupação com as férias escolares Uma preocupação grande que a SDH tem é com relação às férias escolares, já decretadas pelo Ministério da Educação durante o período da Copa. Segundo Carmen Oliveira, a interrupção da escola não foi uma boa ideia porque pode deixar crianças e adolescentes ociosas e, portanto, mais expostas a situações de vulnerabilidade e violações de seus direitos. Já há uma articulação da SDH como MEC para encontrar uma solução para esse problema. Um caminho viável é o fortalecimento do programa Mais Educação, de Ensino em Tempo Integral, que oferece atividades no contraturno escolar. *O compromisso público da Ministra Maria do Rosário Durante a 19ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, realizada em Genebra (Suíça) em fevereiro deste ano, a ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, reafirmou o compromisso do governo brasileiro de aproveitar as oportunidades trazidas pelos megaeventos esportivos para promover a inclusão social. "O legado é tão importante quanto os eventos. Por isso, queremos jogos bem sucedidos especialmente do ponto de vista dos Direitos Humanos", disse a ministra, durante o painel sobre Esportes e Direitos Humanos. "Estamos redobrando a atenção contra a exploração sexual de crianças e adolescentes, 19 fortalecendo estruturas de proteção como os Conselhos Tutelares nas cidades- sede da Copa e em todo o Brasil", afirmou a ministra. Maria do Rosário sublinhou os esforços do governo para a realização de megaeventos. “São desafios presentes na agenda do governo brasileiro a erradicação do trabalho infantil, o enfrentamento a todas as formas de violência e exploração sexual, a proteção à primeira infância e a garantia de acesso à educação”, destacou. “Fortes investimentos sociais contribuem para o momento positivo, com desenvolvimento, distribuição de renda, inclusão social e de pleno emprego assegurado. Esses resultados são fruto do esforço do governo e de todos os brasileiros e brasileiras”, avaliou Maria do Rosário. 4.2 Ministério do Turismo Uma pesquisa sobre o perfil do turista na África do Sul durante a última Copa mostrou que a maioria é formada por homens, jovens, com alto grau de instrução, renda alta e que viajam sozinhos, o que, obviamente, aumenta a preocupação com a exploração sexual. O Ministério do Turismo também está fazendo um monitoramento na Internet de sites do Brasil e do mundo inteiro com apelo sexual. Cerca de dois mil sites já foram derrubados. “O maior legado de um evento como a Copa do Mundo é o legado de imagem do País. A Copa é uma oportunidade de apresentar o Brasil para o mundo. E o 20 Brasil tem que escolher a imagem que quer apresentar”, diz Ítalo Oliveira Mendes, técnico do Ministério do Turismo que até o final de 2011 participou das discussões dentro do Comitê Gestor da Copa (CGCOPA). *Programa Turismo Sustentável e Infância de olho no Trade Turístico na Copa Uma importante ação com vistas à prevenção e ao enfrentamento da exploração sexual no contexto da Copa do Mundo foi implantada pelo Programa Turismo Sustentável e Infância no final de 2010, numa parceria com o Centro de Excelência em Turismo (CET) da Universidade de Brasília, a UnB. O objetivo do projeto do Ministério do Turismo era formar multiplicadores no Brasil inteiro, com a visão de prevenir e enfrentar a exploração sexual na Copa do Mundo de 2014. A ideia era formar pessoas para trabalhar com essa questão. O projeto abarcou, inicialmente, os 27 Estados, e começou a ser implementado no final de 2009, indo até o final de 2010. O papel dessas pessoas era articular a rede de enfrentamento à violência sexual com a cadeia do turismo. “A intenção era fazer com que essas duas redes passassem a conversar e a entender as demandas de cada uma”, explica Aurélia Pinto, da coordenação geral do Programa Turismo Sustentável e Infância. Foram realizadas oficinas de capacitação dessas duas redes nas 12 cidades-sede e também em João Pessoa, que é uma subsede da Copa. Houve um seminário nacional, realizado em Brasília, onde foram ouvidos representantes da África do Sul, que parabenizaram o Brasil por estar começando esse processo de 21 mobilização tão cedo. O encontro preparatório contou com a presença de 300 pessoas e as oficinas tiveram 423 participantes. Outra iniciativa foi o lançamento da campanha de sensibilização sobre esse tema, no final de 2010. Intitulada, “Um Gol pelos Direitos das Crianças e Adolescentes”, a campanha veiculou 11 vídeos, enviou 47 mil emails, criou perfis nas redes sociais e dois hotsites, teve 522 inserções nacionais em veículos da imprensa, entre outras ações. *Planos de Ação em diferentes estágios nos Estados No final do processo, cada Estado elaborou um Plano de Ação para enfrentar a questão na Copa do Mundo. Mas, em 2011, com a mudança de governo, o projeto parou e não foi retomado até hoje. A intenção do Ministério é continuar esse processo. O passo que tem de ser dado agora é colocar em prática todos esses Planos de Ação nos Estados. Essa intenção esbarra, entretanto, na questão financeira. O orçamento do programa Turismo Sustentável e Infância (TSI) para 2012, por exemplo, é de apenas 4,2 milhões de reais. O projeto do CET com o Ministério do Turismo teve três momentos. Foi assinado o convênio em 2009, com o objetivo de prevenir a exploração sexual no setor do turismo e promover ações articuladas entre essa área e a rede de proteção à infância e à adolescência. 22 “Faltava um envolvimento do setor com a rede de proteção”, diz a professora da UnB Elisângela Machado, que coordenou o projeto. Em 2010, as ações começaram. “O objetivo maior era fazer com que o trade turístico conversasse com a rede de proteção e que cada um entendesse as demandas e as dificuldades do outro”, explica a professora. Foram realizados cinco seminários em todo o Brasil, com execução da UnB. E foram elaborados Planos de Ação Estaduais, com metas e resultados. Houve a formação de multiplicadores em 2010, com a implantação da metodologia desenvolvida pelo setor turístico para os países da América Latina, em evento que aconteceu em 2009, em Quito, capital do Equador. De lá para cá, alguns Estados conseguiram avançar bastante nos seus Planos de Ação. Entre eles, Elisângela destaca São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Paraná. Santa Catarina, embora não seja cidade-sede da Copa, é considerada um expoente nesse processo, pois o convênio do CET com o Ministério do Turismo começou ampliado, ou seja, foram feitas mobilizações em todos os Estados da Federação e, num segundo momento, focou-se nas cidades-sede da Copa. *A largada nas Oficinas Pró-Copa Em 2010, foram realizadas as oficinas Pró-Copa nas 12 cidades-sede e em João Pessoa. A intenção era fazer com que o setor do turismo se enxergasse como co- responsável nessa prevenção, afirma Elisângela. “Conseguimos sensibilizar, mas ainda há um grande desafio para o próprio setor, que é como promover a 23 inclusão social desses meninos e meninas no trade turístico”, ressalta a professora da UnB. De acordo com Elisângela Machado, as oficinas trabalhavam em três linhas: como incluir o tema da exploração sexual nas formações de profissionais, como promover a inclusão social dentro do setor e como promover a responsabilidade social das empresas do trade. “Inserir esse tema nos cursos de qualificação foi mais fácil, mas há uma grande dificuldade do setor em adotar um Código de Conduta, com regras claras para enfrentar a exploração sexual”, diz Elisângela. A dificuldade se dá, sobretudo, com os pequenos estabelecimentos. Muitos nem sequer sabem que a exploração sexual é crime. “Chegar a eles é mais difícil, pois muitos sobrevivem do turismo sexual”, lamenta a professora. Segundo Elisângela, na Bahia, por exemplo, o setor está desenvolvendocampanhas em parceria com o Ministério Público. No Distrito Federal, a Associação Brasileira da Indústria Hoteleira (ABIH), o Convention Bureau e a Secretaria de Assuntos Sociais assinaram um documento recentemente em favor da prevenção da exploração sexual, um desdobramento dos trabalhos feitos nas oficinas Pró-Copa. Outros trabalhos interessantes estão em andamento em Estados como Paraná, Pará e Minas Gerais, de acordo com a professora do CET (leia mais sobre as ações estaduais no item “O Cenário nos doze Estados- sede”). *Três grandes linhas de ação 24 De acordo com Ítalo Mendes, coordenador geral de Gestão e Planejamento do Ministério do Turismo, no âmbito do governo federal, o tema da exploração sexual de crianças e adolescentes vem sendo tratado em três instâncias diferentes: 1) O Programa Turismo Sustentável e Infância, do Ministério do Turismo; 2) O grupo de discussão da Casa Civil sobre o impacto social das grandes obras e dos megaeventos; 3) As ações capitaneadas e coordenadas pela Secretaria de Direitos Humanos. Segundo Ítalo Mendes, para a Copa, o governo federal definiu três ciclos de planejamento. 1) Infraestrutura e grandes obras, que foi fechado em 2010; 2) Serviços e logística (energia, telecomunicações e turismo), hoje em andamento; 3) Ações sociais, no qual se inclui o tema da exploração sexual de crianças e adolescentes, que ainda não começou. Ele explica que, num primeiro momento, as ações do Ministério do Turismo englobaram a capacitação de profissionais (com foco na exploração sexual também), obras turísticas, promoção, estruturas temporárias e o Programa Turismo Sustentável e Infância (TSI). Ocorre que houve a decisão de excluir, por enquanto, o TSI e as ações voltadas para a instalação de estruturas móveis, focando em três pontos: oferta hoteleira, qualificação profissional e infraestrutura. “No entanto, já existem algumas ações sendo discutidas no âmbito dos preparativos para a Copa. Uma delas, que tem um forte viés social, é o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC) Copa”, diz Italo Mendes. 25 *Qualificação profissional para o Mundial O PRONATEC Copa é um programa lançado pelo Ministério do Turismo em parceria com o Ministério da Educação para promover a qualificação profissional visando à Copa do Mundo. Serão oferecidas 40 mil vagas por semestre e o projeto vai capacitar quem já trabalha no trade turístico ou quem quer atuar nesse setor. Serão 32 atividades ligadas ao receptivo turístico, além de cursos de inglês, espanhol e libras. Os participantes receberão auxílio estudantil, alimentação e transporte. Ao todo, até a Copa, a previsão é que serão ofertadas 240 mil vagas pelo Sistema S (SENAI, SESC, SESI e SENAC) e por instituições federais de educação profissional. Elas serão abertas nas doze cidades-sede da Copa e no seu entorno para jovens a partir de 18 anos. *Articulação com o Ministério da Justiça Segundo Ítalo Mendes, há também discussões paralelas com o Ministério da Justiça, por meio de sua Secretaria de Segurança de Megaeventos, e a Polícia Rodoviária Federal, para envolver os profissionais de segurança pública no tema da exploração sexual. De acordo com o estudo Mapeamento dos Pontos Vulneráveis à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes nas Rodovias Federais Brasileiras, realizado pela Childhood Brasil, Departamento da Polícia Rodoviária Federal, Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) e Organização Internacional do Trabalho (OIT), no ano de 2012 26 foram registrados 1.776 locais vulneráveis a essa prática criminosa nas estradas de todo o País. Outro esforço conjunto, que envolve os Ministérios do Turismo e da Justiça, é o trabalho de comunicação junto aos turistas estrangeiros informando que a exploração sexual é crime no Brasil. Mas esse tema ainda não foi apresentado ao Grupo Executivo da Copa (GECOPA), segundo Ítalo Mendes. De acordo com ele, há também as discussões com a Secretaria de Direitos Humanos, que está muito preocupada com esse tema, principalmente a partir da experiência da África do Sul. 5. OUTROS ATORES 5.1 Inclusão Social de Meninos e Meninas: a experiência do Projeto Vira Vida Criado em 2009, o Projeto Vira Vida, do SESI, que capacita jovens entre 16 e 21 anos em situação de exploração sexual em áreas como moda, gastronomia, comunicação digital, gestor de negócios e administração, está hoje presente em 16 Estados (abrangendo 19 cidades) e já formou cerca de 2 mil pessoas. Agora, a prioridade do projeto será atender as doze cidades que sediarão os jogos da Copa de 2014. O Vira Vida já está em nove delas, faltando ser implementado em São Paulo, Cuiabá e Manaus. Segundo Jair Meneguelli, presidente do Conselho Nacional do Serviço Social da Indústria (SESI), a implantação nessas três cidades já está acontecendo. 27 O Vira Vida oferece cursos de formação profissional de um ano aos jovens de baixa renda, que residem nas periferias das grandes cidades e têm sua trajetória marcada por experiências relacionadas a trabalho doméstico, abuso e exploração sexual, gravidez precoce e dependência química. Para atingir esse público, o projeto conta com o apoio de todo o Sistema S, associações, ONGs e instituições que trabalham com esses jovens. O programa oferece ainda atendimento psicossocial ao jovem e à sua família, tratamento médico e odontológico e orientação jurídica, além de uma ajuda de custo mensal de 500 reais. Depois de formados, o Vira Vida ajuda os alunos a se inserirem no mercado de trabalho e acompanha o desempenho do jovem durante um ano junto à empresa. Além da ampliação do Vira Vida, o SESI está colocando em prática outras ações de enfrentamento à exploração sexual. Nesse sentido, a entidade já realizou dois seminários internacionais sobre o tema, um em Portugal e outro na Espanha, reunindo agentes públicos, do terceiro setor, do empresariado e dos sindicatos justamente para esclarecer que a exploração sexual é crime no Brasil e pedir a colaboração desses atores no sentido de coibir o turismo sexual. Outros dois seminários serão realizados ainda este ano, na Itália e na França. “A nossa preocupação é sensibilizar, principalmente, os sindicatos. Qual é o perfil do turismo sexual? São trabalhadores europeus que juntam dinheiro o ano inteiro para viajar ao Brasil em busca de sexo com crianças e adolescentes”, diz Meneguelli. 28 O SESI também já assinou um acordo de cooperação com a Associação Brasileira da Indústria Hoteleira (ABIH) para implantar campanhas de prevenção à exploração sexual com vistas à Copa. Serão instalados letreiros nos hotéis dizendo que isso é crime no Brasil e serão colocados folhetos nas camas dos quartos com a mesma mensagem. Está em curso ainda uma negociação com os sindicatos dos taxistas das doze cidades-sede. A ideia de Meneguelli é colocar nos recibos mensagens alusivas ao enfrentamento da exploração sexual e também o que diz o ECA em relação a isso. Um projeto-piloto será implantado em breve em Brasília. Outro acordo está sendo fechado com a Infraero para veicular um vídeo contra o turismo sexual nos aeroportos e nos voos de todas as companhias aéreas. O SESI quer alcançar, com suas campanhas, todo o trade turístico e, segundo Meneguelli, já estão sendo feitas articulações nesse sentido. Por isso, além dos hotéis e taxistas, serão englobados bares, restaurantes e outros estabelecimentos que trabalham nessa área. A meta do Vira Vida, alcançandoas cidades-sede, é chegar a um atendimento de 3.500 jovens por ano. E o desejo de Meneguelli é transformar o programa em política pública. Segundo ele, todos os governos estaduais e municipais têm se mostrado sensíveis ao tema da exploração sexual e querem adotar ações no sentido de coibir essa prática durante a Copa. “Temos programas a serem implantados em todo o País. Eles não foram inspirados na Copa, mas, com essa preocupação, vamos tornar mais ágil a implementação dessas ações nas cidades que sediarão os jogos”, diz Meneguelli. 29 “Ou a gente monta uma rede do bem para prevenir e enfrentar a exploração sexual ou a gente não vai ter condições de enfrentar essa rede criminosa que está extremamente estruturada. Por mais capilaridade que tenhamos no Sistema S, sozinhos não vamos conseguir avançar tanto. Temos que fazer as parcerias com os governos e com as outras organizações”, acredita o presidente do SESI. 5.2 Protagonismo adolescente Em abril de 2011, começou a ser gestada uma iniciativa interessante de mobilização de adolescentes pelo direito ao esporte seguro, inclusivo e para todos, já com vistas à Copa do Mundo de 2014 e às Olimpíadas de 2016. Sob a coordenação do UNICEF, foi promovido, no Rio de Janeiro, o Encontro Nacional de Adolescentes pelo Direito ao Esporte. O evento contou com a participação de 202 meninos e meninas. No final dos debates, os adolescentes divulgaram uma carta com diversas propostas para a adoção de ações capazes de promover o esporte seguro e inclusivo, transformando megaeventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas de 2016 numa grande oportunidade para garantir os direitos de crianças e adolescentes. Nessa carta, os adolescentes pedem mais planejamento para que os eventos não sejam indutores de violações de direitos e mais programas que assegurem o direito ao esporte, como escolas abertas e cidades mais amigáveis à prática de atividade física. Eles manifestaram preocupação especial com o tema da exploração sexual: “Se não houver uma boa preparação, podem acontecer situações de exploração infantil e de abuso sexual”. 30 Um dos desdobramentos desse encontro foi a criação da Rede de Adolescentes e Jovens pelo Esporte Seguro e Inclusivo (REJUPE), sob a coordenação do unicef e com apoio técnico do Instituto Internacional para o Desenvolvimento da Cidadania (IIDAC). O objetivo da rede é promover a integração e a participação qualificada de adolescentes das cidades-sede da Copa do Mundo de 2014 em espaços de discussão de políticas públicas de esporte seguro e inclusivo para crianças e adolescentes brasileiros. A ideia é garantir que jovens lideranças contribuam para a construção de um legado social positivo para os megaeventos esportivos que serão realizados no País. A REJUPE funciona virtualmente, com grupos de adolescentes organizados nas redes sociais e também realiza encontros presenciais. De olho na Copa do Mundo, os jovens estão mobilizados. Já foram realizados 11 encontros locais, nas cidades sede da Copa (falta apenas Brasília) com grupos de cerca de 30 adolescentes ou mais, participação do Poder Público (representatividade estadual e municipal) e organizações não governamentais em cada uma das localidades. “Dentre outras atividades, na programação desses encontros tivemos uma breve apresentação sobre o projeto da Copa para cada cidade, realizada em quase todos os casos por representantes das Secopas, para que os adolescentes conhecessem 31 mais de perto o que está sendo construído e planejado em suas respectivas cidades. Após essas apresentações, os adolescentes tinham espaço para fazer perguntas e debater com esses representantes sobre questões mais específicas que lhes afetam diretamente”, conta Ana Maria Moledo, coordenadora da REJUPE. Segundo Ana, ao final de cada encontro, os adolescentes elaboraram "cartas" com propostas, demandas para o Poder Público e sugestões do que poderia ser feito em diversas áreas para a garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes durante a realização dos megaeventos esportivos. O foco principal de discussão entre os adolescentes da REJUPE é a garantia do direito ao esporte seguro e inclusivo para todos e todas as crianças e adolescentes. No entanto, de acordo com Ana Moledo, outros assuntos de vital importância para a garantia de seus direitos como um todo e ligados às discussões sobre o legado social dos megaeventos esportivos, tais como enfrentamento à exploração sexual, controle do orçamento público e sustentabilidade ambiental, também são foco de debate da Rede. “Nas cartas dos adolescentes das diversas cidades, essas temáticas também se encontram entre suas preocupações e recomendações”, afirma Ana. O próximo passo é a formação de núcleos gestores locais, com a participação de adolescentes, atores públicos e representantes de ONGs. Segundo Ana Moledo, isso é fundamental para garantir que as propostas feitas pelos adolescentes nos encontros sejam realmente levadas em conta pelo Poder Público. A ideia é que os adolescentes também participem dos Comitês Pró-Copa, tendo, assim, a 32 oportunidade de influenciar as políticas públicas voltadas para a garantia do direito ao esporte seguro e inclusivo. “Estamos preocupados em como vamos vivenciar a chegada de turistas de todos os tipos e como tudo vai funcionar após os grandes eventos esportivos. Queremos utilizar a Copa e as Olimpíadas para incentivar a prática do esporte e torná-lo mais acessível para todas e todos.” Dessa forma começou a intervenção de Aline Freitas, de 16 anos, durante a mesa de abertura que deu inicio ao 1º Encontro da REJUPE de Recife, realizado em abril de 2012. A fala de Aline recolhe os anseios de centenas de adolescentes mobilizados nas 12 cidades-sede da Copa do Mundo de 2014 com o apoio do UNICEF, do IIDAC, bem como de grupos e organizações da sociedade civil e do governo nas diferentes localidades, para debater e elaborar propostas sobre o legado social dos megaeventos esportivos e para a garantia do direito a uma prática desportiva segura e inclusiva. As capitais dos Estados-sede da Copa acolheram a programação de atividades da REJUPE e realizaram encontros presenciais nos quais os adolescentes participantes tiveram a oportunidade de conhecer mais de perto os planejamentos de suas cidades e Estados para a Copa e Olimpíadas propiciando, assim, a criação de planos de ação locais que recolhem as propostas das jovens lideranças para a garantia de sua participação efetiva na construção de um legado social positivo dos megaeventos desta década. No momento em que o Brasil se prepara para grandes eventos como a Copa das Confederações em 2013, a Copa do Mundo da FIFA de 2014 e os Jogos 33 Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, os adolescentes se perguntam quais as ações e estratégias que os diferentes órgãos governamentais estão desenvolvendo para que a garantia do direito ao esporte, seguro e integrador com todas as crianças e adolescentes, seja um dos mais importantes investimentos e, consequentemente, a maior e melhor “herança” que os megaeventos possam deixar para o País. “Nosso interesse é dar voz de participação aos adolescentes para que eles possam questionar, debater e encontrar alternativas que nos ajudem a lidar com os legados, indiscutivelmente, deixados por esses acontecimentos. Em nossa passagem pelas diferentes cidades-sede, encontramos uma receptividade importante e uma preocupação em torno dos direitos humanos que permeiam o processo educacional nesse âmbito”,explica o presidente do IIDAC, Gilson Scharnik. Dentre os principais objetivos desses encontros nas cidades-sede está o de articular redes estaduais que promovam a integração dos adolescentes e jovens participantes em espaços de discussão de políticas públicas voltadas ao esporte seguro e inclusivo. Os debates pela garantia do direito ao esporte mobilizaram, por exemplo, jovens lideranças, representantes do governo e da sociedade civil nos Estados do Ceará e do Rio Grande do Norte na realização do 1º Encontro REJUPE de Fortaleza e Natal, promovido em abril de 2012. As reuniões em ambas as capitais nordestinas deram sequência à serie de encontros da Rede realizados desde fevereiro nas 12 cidades-sede da Copa do Mundo. Durante cada um dos encontros, os adolescentes conheceram o 34 planejamento dos Estados e dos municípios para os megaeventos esportivos, como a Copa de 2014, e elaboraram propostas para promoção e defesa dos direitos de crianças e adolescentes no esporte e por meio do esporte. A Rede da capital carioca realizou, em março, seu primeiro encontro local, com a participação especial do presidente do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Londres 2012 (LOCOG, na sigla em inglês), o ex-atleta Sir Sebastian Coe. Durante uma hora de conversa as 30 lideranças juvenis tiveram a oportunidade de conhecer mais de perto os projetos e iniciativas desenvolvidos na capital britânica para garantir a participação de adolescentes e jovens na construção do legado social das Olimpíadas de 2012. O investimento estrutural para a inclusão de pessoas com deficiência e o reaproveitamento dos grandes espaços por parte da comunidade foram algumas das questões levantadas pelos adolescentes em seu diálogo com Lord Coe. Essa troca de experiências entre as duas cidades inspirou os adolescentes da REJUPE para o planejamento estratégico posterior, no qual eles definiram atividades para a efetiva promoção do esporte seguro e inclusivo em suas escolas e comunidades. Criar dentro do governo um grupo de trabalho destinado a planejar ações para que os megaeventos esportivos promovam o direito ao esporte seguro e inclusivo para crianças e adolescentes do Estado. Essa foi uma das propostas aprovadas pelos 45 adolescentes que participaram do I Encontro Baiano da REJUPE, 35 realizado, em fevereiro, na Fundação Luís Eduardo Magalhães (Flem), no Centro Administrativo da Bahia (CAB), em Salvador. Representando 17 organizações não governamentais, os adolescentes também propuseram que sejam desenvolvidos projetos esportivos e sociais para melhorar os espaços destinados às práticas esportivas, a criação de equipamentos de esportes nas escolas e a capacitação de professores para atuar com o esporte inclusivo e educacional. Entre outras ações, eles propõem também que haja oferta de esportes menos conhecidos e divulgados nas aulas de educação física, o que implica na construção de pistas de atletismo e piscinas nas escolas e de mais quadras com materiais didáticos adequados à diversidade de modalidades esportivas, com atenção especial para as modalidades femininas. Na abertura do evento, a chefe de gabinete da Secretaria para Assuntos Internacionais e da Agenda Bahia, Suzana Sá, representando o secretário Fernando Schmidt, destacou que o governo da Bahia acolheu com entusiasmo a proposta do UNICEF de apoiar a organização da REJUPE na Bahia e ser o Estado a realizar o primeiro da série de 12 encontros da Rede nas cidades-sede da Copa do Mundo de 2014. “Este apoio se dá, por uma questão de coerência, na medida em que se identifica a inquestionável legitimidade da mobilização juvenil e sua pertinência com a prática democrática do nosso governo.” Ela enfatizou dois aspectos relevantes da mobilização dos jovens. Um deles, “a participação do adolescente na discussão de temas que dizem respeito a sua própria vida, exercitando já a cidadania e o envolvimento do adolescente com o 36 esporte seguro e inclusivo, no processo de sua formação educacional, o que é reconhecidamente importante para o seu desenvolvimento integral”. Também ressaltou o grande desafio que precisa ser enfrentado, que é o de tornar efetivo o direito ao esporte no mesmo patamar dos direitos à saúde e à educação. “A experiência histórica da luta pela conquista de direitos em todo o mundo tem demonstrado que a sua efetividade depende sempre de políticas públicas concebidas, implementadas e fiscalizadas com a participação da sociedade, em especial, dos segmentos que detêm o protagonismo dessas ações. A REJUPE surge com essa missão, na esteira dos megaeventos esportivos que o Brasil e a Bahia sediarão nessa década.” O esporte como direito fundamental foi defendido por quase todos os palestrantes. O oficial do UNICEF para Assuntos Governamentais, Mário Volpi, afirmou que o Brasil tem condição de posicionar o esporte como direito fundamental e proporcionar as condições para o acesso de todos. O representante do IIDAC, Gilbert Scharnik, disse que sem esporte a qualidade de vida é menor e que o esporte não pode ser tratado como um direito secundário. O diretor-geral da Superintendência dos Desportos do Estado da Bahia (SUDESB), Raimundo Nonato, concordou e chamou a atenção para o fato de que até 2017 o Brasil vivenciará grandes eventos esportivos internacionais e é preciso estar atento ao poder transformador do esporte e à sua capacidade de aproximar as pessoas da cidadania. Na mesma linha, o coordenador de Esportes do Escritório Municipal da Copa do Mundo FIFA 2014 de Salvador, Emerson Ferreti, falou sobre a importância do 37 esporte e os legados sociais esperados após os megaeventos esportivos, a exemplo da democratização do esporte, sustentabilidade ambiental, qualificação profissional, inclusão social e fortalecimento cultural. Representando o secretário do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte, Nilton Vasconcelos, o chefe de gabinete Elias Dourado afirmou que a Copa do Mundo tem dono, a FIFA, e é preciso muita negociação para conseguir ampliar o ganho de ter trazido a Copa de 2014 para o Brasil. “Essa negociação não é fácil e pedimos ao UNICEF que também contribua dialogando com a FIFA e apresentando as reivindicações dos jovens.” Elias Dourado fez referência às ações que estão sendo desenvolvidas pelo Governo da Bahia como os projetos Legados Sociais e Oportunidades da Copa 2014, em parceria com a Universidade do Estado da Bahia (UNEB). O primeiro é direcionado a crianças, jovens, idosos e será realizado em 16 municípios baianos, sendo contemplados oito bairros de Salvador. O projeto Oportunidades Copa 2014, dirigido a empresas dos ramos de hotelaria, bares e restaurantes, taxistas, baianas de acarajé, ambulantes da capital e de outros municípios, promoverá capacitação em parceria com o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE/BA). As ações do governo foram detalhadas pelo representante da Secopa, Márcio Lima, que destacou a construção da Arena Fonte Nova e entorno, mobilidade urbana e acessibilidade, infraestrutura turística, ações de qualificação profissional, fortalecimento e valorização da cultura local, estruturação do 38 sistema de segurança pública, qualificação da rede hospitalar e sistema de saúde e infraestrutura tecnológica. O encontro contou com a participação de três atletas, cada um deles referência inspiradora do esporte como elemento de transformação e que, em suas falas, insistiram na importância de o esporte ser compreendido como direito fundamental pelo poder que tem de contribuirpara o desenvolvimento integral da pessoa e do cidadão - Raimundo Nonato (Bobô), Emerson Ferreti e Gilson Andrade, este último jogador da Seleção Brasileira de Basquetebol de 1974 a 1989, formado em Business and Language e Bacharel em Direito. 5.3 Aliança Nacional de Adolescentes (ANA) Outra iniciativa que envolve a participação de meninos e meninas nas discussões em torno da Copa do Mundo de 2014 é a Aliança Nacional de Adolescentes (ANA). O projeto é realizado pelo ECPAT Brasil e pelo Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, por meio de convênio entre a ONG Coletivo Mulher Vida e a Secretaria de Direitos Humanos, contando ainda com a parceria do Grupo de Pesquisa sobre Tráfico de Pessoas, Violência e Exploração Sexual de Mulheres, Crianças e Adolescentes (Violes) da Universidade de Brasília. Seu principal objetivo é o fortalecimento da participação dos adolescentes no enfrentamento à violência sexual em âmbito nacional, com foco nas 12 cidades-sede do Mundial. A execução começou em abril de 2012 e se estenderá até fevereiro de 2013, podendo ser prorrogada. Várias ações estão previstas, entre elas, a realização de um encontro sobre participação juvenil no enfrentamento da violência sexual, envolvendo 300 39 pessoas, entre adolescentes e profissionais da área da infância. O evento acontecerá em Olinda entre os dias 23 e 24 de outubro e será dividido em dois momentos. O primeiro será um encontro ampliado, envolvendo representantes do Comitê Nacional, da Rede ECPAT Brasil e da rede local de enfrentamento à violência sexual e tendo como tema "O adolescente como agente de autoproteção e de prevenção à Exploração Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes (ESCCA)". O segundo momento será uma formação sobre violência sexual, prevenção, aspectos legislativos e políticos e participação na prevenção e na autoproteção à ESCCA, finalizando com orientações para a elaboração de um plano local de mobilização para esse enfrentamento. Esse encontro será direcionado para as lideranças adolescentes do Comitê Nacional e da Rede ECPAT Brasil. O projeto englobará ainda a realização de 12 painéis de fomento ao engajamento de adolescentes no enfrentamento à violência sexual nas cidades-sede da Copa. Como parte desse processo, a iniciativa terá, em cada cidade, um evento destinado ao debate do tema sobre adolescentes, autoproteção e participação na prevenção e no enfrentamento à violência sexual. Nesses encontros, serão distribuídas cartilhas de estímulo ao envolvimento dos adolescentes. Os painéis serão realizados de forma colaborativa com as redes locais. Outra ação é a mobilização dos adolescentes por meio da internet. A ideia é criar redes virtuais de jovens para o enfrentamento à violência sexual, com instrumentos como blog, chats, boletim eletrônico, e-grupo e participação nas redes sociais como Twitter e Facebook. A campanha, cuja personagem central é a menina ANA, visa mobilizar cerca de 1.000 meninos e meninas em todo o 40 Brasil, principalmente nas cidades-sede da Copa, garantindo o diálogo entre adolescentes das 27 unidades da Federação, a troca de experiências e o fortalecimento das pautas políticas. 5.4 Projeto “Os Direitos Humanos da Criança e do Adolescente no Circuito da Copa de 2014 e os Objetivos do Milênio” O projeto Direitos de Crianças e Adolescentes - Circuito Copa e Objetivos do Milênio é uma iniciativa coordenada pelo Fórum DCA do Rio de Janeiro, com apoio do Instituto Brasileiro de Inovações em Saúde Social (IBISS) em parceria com diversos fóruns estaduais das cidades-sede da Copa 2014, o Fórum Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA), o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR). O objetivo principal dessa ação é oferecer uma contribuição para o fortalecimento dos fóruns e redes locais dos direitos da criança e do adolescente das 12 cidades-sede da Copa de 2014 por meio do desenvolvimento de ações de qualificação da sociedade civil organizada, responsável pelo processo de controle social. A mesma sociedade civil organizada que, em conjunto com o Poder Público, deverá elaborar as respectivas políticas estaduais dos direitos humanos da criança e do adolescente, assim como realizar o monitoramento das políticas públicas deliberadas, tendo em vista os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), um conjunto de metas estabelecidas pelas Nações Unidas a 41 serem cumpridas pelos países signatários até o ano de 2015. Entre os Objetivos do Milênio estão o fim da extrema pobreza, a promoção da igualdade entre os sexos, a erradicação de doenças que vitimam milhões de pessoas ao redor do mundo e o fomento de novas bases para o desenvolvimento sustentável. Compromissos assumidos por 191 países. Essa iniciativa pretende atuar antes da Copa de 2014 no sentido de garantir que os Estados desenvolvam ações de prevenção para que não ocorram violações dos direitos das crianças e adolescentes durante o Mundial. Na Copa, o foco estará voltado para a fiscalização e a denúncia de situações ou ações que violem direitos. Para tanto, o projeto desenvolveu uma boa articulação com o Ministério Público. O projeto não aponta iniciativas diretas de enfrentamento à exploração sexual. No entanto, ao assegurar a articulação e formação dos atores que atuam nessa área de defesa dos direitos, garante maior informação e possibilidade de atuação conjunta, o que confere mais força ao movimento social. O projeto começou em maio de 2012 e termina em dezembro deste ano, podendo ser prorrogado e até estendido para todo o território nacional, dependendo da avaliação de seus resultados. As ações são divididas em quatro etapas: Etapa 1: Processo de qualificação e fortalecimento dos Fóruns Estaduais dos Direitos da Criança e Adolescente dos Estados-sede da Copa de 2014: a) Identificar as entidades da sociedade civil e movimentos sociais/populares com atuação na área da criança, adolescente e juventude nos doze Estados. 42 b) Realizar 24 seminários locais (dois encontros em cada cidade-sede), presenciais, com temas de referência da Política de Direitos Humanos/ Plano Decenal da Infância e criação de indicadores de monitoramento dos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODM), visando o fortalecimento das redes locais e uma maior participação nos espaços de controle e deliberação de políticas públicas. Etapa 2: Construção de portal multimídia que possibilitará: a) Consulta e download de acervo multimídia de material (pesquisas, publicações, vídeos...) sobre as temáticas trabalhadas. b) Fóruns virtuais de debates entre as cidades-sedes que serão moderados por profissionais qualificados. c) Acompanhamento público das discussões e implementação de todas as etapas do projeto para interação (avaliação, sugestões, monitoramento etc). d) Campanhas temáticas. e) Enquetes públicas. Etapa 3: Criação de metodologia de acompanhamento conjunto dos indicadores criados para os Estados-sede da Copa atingirem/monitorarem os Objetivos do Milênio. Etapa 4: Construção junto aos participantes de um manual de monitoramento das políticas públicas e do Orçamento. Resultados esperados: a) Entidades e movimentos sociais e fóruns dos doze Estados identificados, cadastrados, interagindo e se relacionando. 43 b) CONANDA, conselhos estaduais e fóruns atuando de forma integrada nas suas respectivas regiões e ações. c) Estadose Municípios mobilizados para a construção das respectivas políticas estaduais e municipais /planos decenais. d) Estados e municípios qualificados acerca das temáticas e da metodologia de monitorando dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. e) Fortalecimento da incidência política da sociedade civil organizada. f) Criação de fóruns municipais e regionais. g) Estados e municípios articulados e participativos na elaboração das políticas públicas da seara da infância e adolescência. O projeto beneficiará a população de crianças e adolescentes e as suas respectivas famílias. O benefício se dará por meio da construção qualificada das políticas de direitos humanos de crianças e adolescentes assim como da qualidade de vida proveniente do alcance dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Segundo a coordenação do projeto, no entanto, não é possível estabelecer a quantidade de crianças e adolescentes que serão atingidos pela iniciativa. Isso porque as ações visam à formação e à articulação das entidades que atuam na defesa de meninos e meninas de forma preventiva. De acordo com a coordenadora geral dessa ação, Mônica Alkmin, o maior desafio é a diversidade da realidade nacional no que diz respeito à participação da sociedade civil no monitoramento das políticas públicas, dificultando a articulação entre os Fóruns e Redes nos 12 Estados. Segundo ela, enquanto alguns já têm garantido esse espaço de controle social, outros ainda trabalham 44 em uma lógica de sobrevivência institucional. “Ainda temos como obstáculo o alto custo que essa mobilização nacional traz ao projeto”, diz. “Entendemos que informação e articulação são fundamentais para a proteção e a promoção de direitos humanos. O tema Direitos Sexuais e o enfrentamento à exploração sexual no período que antecede e durante a Copa são focos das formações e do portal informativo”, explica. 5.5 Projeto Itaú Criança, da Fundação Itaú Social Criado em 2005, com o foco voltado para o fortalecimento do Sistema de Garantia de Direitos de crianças e adolescentes, o projeto Itaú Criança, da Fundação Itaú Social, começou, em 2010, a se preocupar com o contexto da Copa do Mundo. A partir disso, algumas ações começaram a ser colocadas em prática nas doze cidades-sede do Mundial. O Itaú é um dos patrocinadores da Copa do Mundo e da seleção brasileira. Uma das principais iniciativas é a qualificação dos Conselhos Municipais de Direitos para trabalhar melhor a temática da exploração sexual visando a Copa do Mundo. Nesse sentido, têm sido realizados encontros, debates e seminários nas cidades-sede, com a participação de especialistas no tema e organizações da área dos direitos de crianças e adolescentes como UNICEF, CONANDA, Fundação Abrinq, Fundação Telefônica, dentre outras instituições. “Montamos um cronograma de formação dos Conselhos de Direitos para trabalhar um conjunto de ações voltadas para a Copa do Mundo”, explica 45 Priscila Dias Leite, gestora de programa do Itaú Criança. Segundo Priscila, serão realizados encontros regionais para discutir o tema. Entre os assuntos abordados, estão, por exemplo, a identificação dos setores mais afetados e impactados pelas obras do Mundial, a importância de se diagnosticar a situação da criança e do adolescente em cada município e a necessidade de se construir um plano de ação conjunta dos 12 Conselhos de Direitos para enfrentar problemas como a exploração sexual. “Nesses encontros, vamos abordar também a questão do Orçamento público. Se os Conselhos estiverem empoderados sobre o assunto Copa do Mundo, terão mais condições de reivindicar ações voltadas para a proteção das crianças e dos adolescentes nesse contexto”, acredita Priscila. Ela informa que a ideia é lançar esse pacote de ações na Copa das Confederações, em 2013, como um teste para o mundial de 2014. 5.6 Projeto Bola na Rede – Um gol pelos direitos das crianças e adolescentes No segundo semestre de 2010, começou a ser gestado mais um projeto voltado para o enfrentamento da exploração sexual de meninos e meninas no contexto da Copa do Mundo. Trata-se do projeto Bola na Rede – Um gol pelos direitos das crianças e adolescentes, uma iniciativa da Rede Evangélica Nacional de Ação Social (RENAS). O Movimento Bola na Rede teve sua origem no V Encontro Nacional da RENAS, realizado em agosto de 2010, na cidade do Recife (PE). Naquela ocasião, os participantes assumiram o compromisso de desenvolver ações 46 concretas para melhorar a qualidade de vida de pessoas em situação de pobreza e miséria. Uma das propostas discutidas no encontro foi justamente a de mobilizar as organizações filiadas e a igreja brasileira para ajudar governos e sociedade no enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes. Assim, nasceu o projeto, que tem a finalidade de promover ações estratégicas entre os anos de 2011 a 2014, em parceria com redes e organizações da sociedade civil, órgãos do Sistema de Garantia de Direitos e igrejas evangélicas, visando a prevenção da exploração sexual de crianças e adolescentes no turismo, com foco nas 12 capitais onde haverá jogos da Copa do Mundo em 2014. O movimento pretende somar forças na sensibilização e na educação da sociedade civil para a questão do enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes. Outro objetivo é ajudar na articulação e mobilização da sociedade civil para a construção de uma cultura de garantia de direitos e auxiliar no fortalecimento das redes de proteção à infância e à adolescência. Para tanto, o projeto tem três linhas principais. A primeira é a realização de ações de sensibilização no Dia Nacional de Enfrentamento ao Abuso e à Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes de 2011 até 2014. A segunda é a promoção de campanhas de “Vacinação por Bons Tratos a Crianças e Adolescentes”, iniciativas que contam com a participação de crianças, adolescentes e jovens capacitados e atuando como agentes de defesa de seus próprios direitos. Trata-se de uma campanha de sensibilização pública sobre as 47 situações de violência cotidiana que meninos e meninas sofrem, em que eles mesmos promoverão atitudes e condutas respeitando sua dignidade e integridade. Nessa campanha, adolescentes participam de oficinas de capacitação sobre a temática dos maus-tratos e promoção de bons tratos e de arte de rua, dados pelo programa CLAVES Brasil, parceiro técnico do Movimento Bola na Rede. Posteriormente, adolescentes e jovens “vacinam” pessoas de sua idade e adultos, convidando-os a se unirem à promoção de uma cultura de bons tratos e de garantia de direitos. Essa vacina diferente é simbolizada por uma bala ou um doce para que as pessoas lembrem sempre que crianças e adolescentes devem ser tratados com doçura e amor. A terceira ação é o fortalecimento do Mutirão Mundial de Oração por Crianças e Adolescentes em situação de vulnerabilidade social, que acontece sempre no primeiro final de semana de junho, levando às igrejas e aos movimentos cristãos a temática da exploração sexual. A iniciativa começou a ser colocada em prática em 2011, mas a ideia é fortalecer essas ações de sensibilização e conscientização sobre a questão no ano da Copa do Mundo. Os coordenadores do movimento esperam conseguir sensibilizar 10% da população brasileira nas doze cidades-sede dos jogos da Copa do Mundo de 2014. Além disso, o programa quer promover o desenvolvimento de líderes multiplicadores; a criação de uma rede de adolescentes nas 12 cidades, sendo capacitados e se tornandoprotagonistas no enfrentamento à exploração sexual; a formação de alianças estratégicas; o desenvolvimento de ações educativas nas 48 igrejas locais, formando multiplicadores de uma cultura de paz e garantia de direitos. A ideia é que, ao final desse processo, seja fortalecida uma rede de proteção às crianças e aos adolescentes nas 12 cidades, com o engajamento das igrejas e organizações filiadas a RENAS. O projeto visa também aumentar o número de igrejas informadas sobre o Sistema de Garantia de Direitos de meninos e meninas e com abertura para sensibilização e educação no tema da exploração sexual. 5.7 Articulação empresarial Em agosto de 2012, o setor empresarial começou a se movimentar para discutir ações de enfrentamento à violência sexual no contexto dos megaeventos. A Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN) anunciou, no dia 22 de agosto, a constituição de uma rede para discussão e criação de iniciativas empresariais contra a exploração sexual de meninos e meninas em grandes eventos internacionais que serão realizados no Brasil, com atuação já na Copa do Mundo de 2014. A decisão foi tomada durante um seminário da Firjan para conseguir apoio nas corporações para suas iniciativas contra a exploração sexual infantil no País. O seminário marca os dois anos da instalação de um compromisso dos industriais com o tema, o Pacto Corporativo de Enfrentamento à Violência Sexual Infantojuvenil, iniciado em 2010, próximo do começo do projeto Vira Vida, coordenado pelo Serviço Social da Indústria (SESI). “A FIRJAN está na base de estruturação desse compromisso corporativo, ao lado da secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Esse 49 compromisso, lançado há dois anos, vai crescendo na convicção da FIRJAN, na convicção do governo federal, na associação e trabalho conjunto com o CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente)”, declarou a ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário. O pedido para a constituição da rede partiu da ministra e o compromisso de mobilização da FIRJAN para criação desse movimento foi assumido pelo presidente da entidade, Eduardo Vieira, durante o evento. A rede empresarial se juntaria a redes semelhantes do governo e da sociedade civil para debater ações com vistas à proteção das crianças e adolescentes nos eventos internacionais, entre eles, a Copa do Mundo de 2014. Maria do Rosário destacou a importância da atuação em rede para enfrentar esses crimes. Ela ressaltou os esforços de se estabelecer um conjunto de equipamentos públicos qualificados, que inclua não só os conselhos tutelares e órgãos de assistência social, mas também postos de saúde e escolas, que têm potencial de ação na prevenção à violência contra crianças e adolescentes. Durante o seminário, a ministra também destacou os projetos-piloto de grandes indústrias sobre a exploração sexual infantil, o que inclui ações em obras públicas e em iniciativas que geram o deslocamento de um alto número de trabalhadores por empresas públicas, como Petrobras e Itaipu, e para os eventos públicos, pela rede hoteleira, no âmbito nacional. Durante o seminário, o presidente da Firjan criticou a baixa adesão das empresas às iniciativas de enfrentamento à exploração sexual de crianças e adolescentes. “Nós temos 10 mil associados. Pouco importa se é uma empresa controlada pelo 50 poder público, privado ou por capital estrangeiro. Estão aqui desempenhando um papel econômico e social. Se nós acharmos que a empresa é apenas um objetivo econômico, eu acho que este empresário não tem um futuro lá muito brilhante”, criticou. 5.8 Programa SEST/SENAT de Enfrentamento à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes Realizado pelo Serviço Social do Transporte (SEST) e Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (SENAT), o Programa de Enfrentamento à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes existe desde 2004. Seu principal objetivo é conscientizar os trabalhadores do setor de transporte e a sociedade sobre a importância do enfrentamento desse problema e de denunciá-lo. Trata-se de uma ação permanente do SEST/SENAT, que tem apoio de diversas instituições, entre as quais, Secretaria de Direitos Humanos do governo federal, Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI), Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, Programa Vira Vida, Programa Combate ao Tráfico de Pessoas, Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Polícia Rodoviária Federal. Entre as ações do programa estão a realização de carreatas no dia 18 de maio, blitze educativas, abordagens transversais do tema do enfrentamento e da proteção dos direitos de crianças e adolescentes nos cursos presenciais e nos eventos da instituição, além da atuação dos Agentes de Transformação Social, que são voluntários da comunidade, frentistas, taxistas e caminhoneiros que são treinados para esclarecer e orientar a população sobre o assunto, distribuindo folders e conscientizando colegas sobre a questão. 51 Durante o período da Copa do Mundo, a ideia do programa é aumentar o número de Agentes de Transformação Social (até hoje já atuaram cerca de 600 voluntários) e realizar ações para reduzir significativamente o número de crianças e adolescentes explorados por meio de atividades de esclarecimento sobre o tema. Na avaliação de Daniela Padilha, responsável pelo projeto, um dos maiores desafios é conscientizar a população sobre a importância da denúncia. “O tema, ainda hoje, é visto com naturalidade e as pessoas acabam achando que a criança ou o adolescente se “prostituiu” porque queria. Ainda não temos estabelecida a cultura de proteção dos direitos das crianças e adolescentes”, analisa Daniela. Para ela, um dos diferenciais do projeto é o fato de ele atingir diretamente os trabalhadores do transporte, por meio das ações dos Agentes de Transformação Social. 6. A MOVIMENTAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL Enquanto o governo federal se prepara para colocar em prática algumas ações voltadas à prevenção e ao enfrentamento da exploração sexual de crianças e adolescentes no contexto da Copa do Mundo e o setor empresarial começa a perceber a necessidade de se movimentar nessa direção, a sociedade civil brasileira também se mobiliza em torno desse tema. Organizações como o Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual de Crianças e Adolescentes, o Fórum Nacional de Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes (Fórum DCA), o Fórum Nacional de Enfrentamento ao Trabalho 52 Infantil (Fórum PETI), a Associação Nacional dos Centros de Defesa de Crianças e Adolescentes (ANCED) e a Rede ECPAT-Brasil se unem para construir e consolidar uma pauta única de recomendações de ações para impedir que a Copa do Mundo de 2014 e as grandes obras violem os direitos humanos da população infanto-juvenil. Nesse sentido, várias reuniões técnicas, encontros, oficinas e seminários têm sido realizados tanto em âmbito nacional quanto nos doze Estados-sede da Copa. Nas mobilizações em torno do 18 de maio de 2012, dia nacional de enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes, a preocupação com o impacto dos megaventos e das grandes obras foi central. “Estudos mostram que a atual agenda de obras de infraestrutura, incluindo aquelas realizadas no contexto dos megaeventos esportivos (Copa do Mundo e Olimpíadas), tem promovido e agravado inúmeras violações aos direitos humanos de crianças e adolescentes”, diz a carta divulgada pelas redes nacionais de defesa dos direitos de
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