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Psicologia Juridica Unidade II R (2)

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A família vista pela psicologia jurídica: do pátrio poder aos laços amorosos 
contemporâneos 
 
A família que acabamos de conhecer nos módulos anteriores, sobre tudo pela teoria 
psicanalítica de Sigmund Freud que elabora o Complexo de Édipo como sendo a chave de 
compreensão da psique e que desenvolve uma topologia, de acordo com a qual encontramos a 
lei como uma das instâncias do inconsciente (o superego), tem seu correlato no antigo Código 
Civil brasileiro de 1916. Nele, o pai aparece como a figura dominante da família, a ele cabe o 
pátrio poder. Contrário à concepção que hoje temos de família, a família tradicional regrada 
pelo antigo Código Civil é uma família nuclear. Impensável uma família que não seja composta 
por pai, mãe e filhos! Impensável essa família não ser constituída pelo casamento. Na lógica 
patriarcal da antiga legislação civil, o pátrio poder constituia na família uma hierarquia a partir 
da figura do pai. O homem é o chefe da sociedade conjugal. A mulher casada é relativamente 
incapaz. A separação do casal não era possível e, quando ocorria, investigava-se a culpa pelo 
fracasso do casamento. Além disso, desconfia-se da capacidade das mulheres criarem os 
filhos homens. A guarda do filho varão, a partir dos seis anos de idade, ficava com o pai. 
Estamos, portanto, diante de um código moral assimétrico sexual, que, durante o século XX, 
vai perdendo suas feições. 
Depois das duas grandes guerras, em toda parte do mundo, mulheres assumem postos de 
comando. No lugar dos homens (não podemos esquecer que muitos morreram nas guerras), o 
Estado faz a função do provedor, função essa que se expressa no direito social. Com a 
emancipação feminina, a invenção de meios anticoncepcionais mais seguros, as mulheres 
tornam-se mais independentes e encaram com mais facilidade uma eventual separação do 
casamento. O divórcio implica um afastamento de pais e filhos. Novas formas de convívio 
familiar dão lugar à família nuclear e, consequentemente, o Complexo de Édipo deixou de ser a 
chave de compreensão do inconsciente. 
A Constituição Federal de 1988 dá conta dessas mudanças, quando desenha no artigo 226 e 
seguintes a nova família que está sob a proteção da Lei. A família contemporânea pode ser 
biparental, constituída por casamento ou união estável; para muitos, heterossexual ou 
homossexual, uma vez que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a união estável 
homossexual. A Constituição reconhece também a família monoparental, aquela constituída 
por um dos pais e seu(s) filho(s). Com isso, a Lei brasileira permite a constituição e 
reconstituição livre da família, não mais obrigada a seguir um único modelo previsto em lei. 
Diante disso, o pátrio poder cede também a uma forma mais igualitária de gerir a família: o 
poder familiar. O Código Civil de 2002, que entrou em vigor em 2003, pressupõe a igualdade 
dos cônjuges. Prevê a dissolução da sociedade conjugal no caso da impossibilidade de 
comunhão de vida. Além disso, prevê, apesar da separação do casal, a manutenção do vínculo 
de pais e filhos pela guarda compartilhada. Esse vínculo é caro ao legislador, uma vez que os 
filhos têm o direito de convivência familiar. Por essas e outras razões, a Alienação Parental, o 
ato de afastar o filho do pai ou da mãe, foi proibida por lei e foi dada à Justiça a possibilidade 
de intervenção nos casos em que ela ocorre. 
 
Questão dissertativa: 
 
Uma das questões polêmicas de nosso tempo é o casamento entre pessoas do mesmo sexo. 
No Brasil, esse casamento é permitido? Argumente! 
 
Referência bibliográfica: 
BRANDÃO, E. P.; GONÇALVES, H. S. Psicologia Jurídica. Rio de Janeiro: Nau, 2004, p. 51. 
FORBES, Jorge. Inconsciente e responsabilidade: psicanálise do Século XXI. São Paulo: 
Manole, 2012. Cap. 6.2. 
 
 
 
Do menor ao jovem cidadão: a criança, o adolescente e sua família na Lei 
 
Como já foi visto, as teorias predominantes na psicologia concordam em um ponto: o ser 
humano é um ser cultural. Por isso, a lei e a cultura são formadoras do sujeito. 
Consequentemente, a infância deve ser vista no contexto cultural. 
 
 
A infância na lei: menor como objeto de direito 
 
Se a infância é uma construção cultural, ser criança é diferente de uma época para outra, como 
a constituição e a estrutura da família também variam com o tempo, como vimos. 
Só há uma infância no Direito a partir da modernidade e da industrialização. Antes disso, as 
crianças eram tratadas como pequenos adultos. Marca dessa descoberta de infância é o 
“Health and Moral of Aprentices Act”, de 1802, que proíbe o trabalho infantil e preconiza o 
aprendizado. 
A visão da família do início do século XX, no Brasil, com seu modelo patriarcal e moralizante, 
forma ideia sobre a infância, quando estabelece a diferença entre a “normalidade” e a 
“anormalidade” da situação irregular no Código de Menores (de 1927 e de 1979). 
No Código de Menores, a criança em situação irregular é tida como um objeto de direito. 
Segundo esse código, cabe ao Estado fazer com que os menores e as famílias que não 
obedecem ao padrão da família estabelecida pelo Código Civil da época se enquadrem nesse 
padrão higienista de uma família normal. 
 
 
A criança cidadã na Convenção dos Direitos da Criança 
 
Hoje, parece óbvio o fato de a criança ser uma cidadã. Não há “menores” a serem tutelados e 
administrados por “maiores”, mas seres humanos que nascem cidadãos. A cidadania é, por 
assim dizer, o presente de boas-vindas que a sociedade prepara para os recém-nascidos. Não 
resta dúvida para determinar o início da infância no nascimento. A questão é como a lei define 
a infância e a adolescência, já que, hoje, não há clareza sobre o assunto, já que a 
adolescência é “esticada” até a idade madura. 
Pela Convenção sobre os Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas, criança é 
“todo ser humano com menos de 18 anos de idade, a não ser que em conformidade com a lei 
aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes”. Em seu preâmbulo, a Convenção 
sobre os Direitos da Criança sublinha a importância da dignidade e dos direitos iguais e 
inalienáveis de “todos os membros da família humana”. Com isso, já deixa entender que a 
criança cresce em uma família “como grupo fundamental da sociedade e ambiente natural para 
o crescimento e o bem-estar de todos os seus membros, e em particular das crianças”. Cabe 
aos pais, aos demais membros da família ampliada ou à comunidade a responsabilidade de 
“proporcionar à criança instrução e orientação adequadas e acordes com a evolução de sua 
capacidade, no exercício dos direitos reconhecidos” (art. 5º). A família e, no sentido mais 
amplo, a comunidade, têm, portanto, uma dupla função: a de inserir a criança na cultura e a de 
defender seus direitos, uma vez que a criança está limitada na capacidade do exercício de 
seus direitos. 
No topo do elenco dos direitos fundamentais está o direito à vida (art. 6º) que implica a 
responsabilidade do Estado de não somente garantir a sobrevivência, como também o 
desenvolvimento da criança. Vida humana é, portanto, mais do que vida no sentido biológico. 
Implica, por lei, a inserção da criança na cultura. Assim, a Convenção da ONU garante à 
criança um nome e uma nacionalidade, em outras palavras, uma identidade, no sentido jurídico 
e psíquico. Essa identidade está estreitamente ligada à família e ao direito de “conhecer os 
pais e ser cuidada por eles” (art. 7º). O Estado é obrigado, pelo art. 8º, a preservar a 
 
identidade, a nacionalidade, o nome e as relações familiares da criança e do adolescente com 
suas leis e políticas públicas. 
Por outro lado, a criança tem, hoje, o direito de formular seus próprios pontos de vista. Deve 
ser ouvida em todos os assuntos que lhe dizem respeito (art. 12). Liberdade de expressão, de 
crença, de associação, de reunião pacífica, inviolabilidade de seu lar, de sua correspondência 
e de sua honra constamdo rol de direitos tanto quanto a proteção contra violência, assistência, 
saúde, lazer e educação. 
A Convenção enfatiza, em seu art. 29, o exercício dos direitos culturais, sobre tudo ao direito à 
educação.[1] É importante apontar para alguns aspectos desse artigo. Em primeiro lugar, reflete 
a ideia do desenvolvimento da personalidade na infância e adolescência. Diferencia dos 
conceitos de “aptidões” e de “capacidade mental” o conceito de “personalidade”. A finalidade 
da educação é de “imbuir respeito” aos direitos humanos, aos seus pais e aos valores culturais 
de seu país e de civilizações diferentes da sua. Se, por um lado, o respeito aos pais remonta à 
lei desde os tempos bíblicos, o respeito aos valores culturais nacionais é exigido desde a 
modernidade, o respeito aos valores de pessoas e civilizações diferentes reflete um dever 
moral considerado essencial para a convivência na sociedade contemporânea globalizada. 
Trata-se de um dever moral, uma vez que a Convenção lança um ideal a ser seguido pelo 
Estado, pela família e sociedade e pelos próprios jovens. 
Jovens em conflito com a lei têm, no art. 40, os direitos e as garantias processuais 
assegurados aos adultos acusados de ter cometido delitos: a presunção da inocência e o 
direito do contrário, dentre outros. Vale destacar o item 3 do artigo que recomenda à legislação 
nacional levar em consideração: “a) [...] idade mínima antes da qual se presumirá que a criança 
não tem capacidade para infringir as leis penais; b) a adoção [...] de medidas para tratar dessas 
crianças sem recorrer a procedimentos judiciais, [...]” Dever do Estado é, portanto, 
disponibilizar um conjunto de instituições e programas alternativas às penas sofridas pelos 
adultos. Medidas para o tratamento das crianças e dos adolescentes “fora da lei” decorrem, 
portanto, do exercício dos direitos humanos que visam sua “dignidade humana”, como quer a 
lei internacional. 
 
 
O Estatuto da Criança e do Adolescente 
 
O ECA, consequência e regulamento dos artigos 226 ss da Constituição Federal de 1988, 
estende sobre a criança e o adolescente uma verdadeira rede de proteção que tem como 
núcleo a família e a rede familiar, passa pela comunidade, representada pelas organizações 
não governamentais, pela sociedade que se faz representar nos conselhos tutelares, até o 
Estado que ampara os direitos dos jovens pela administração pública e pela Justiça da Infância 
e da Juventude. 
Criado e promulgado quase que concomitantemente com a Convenção da ONU, o Estatuto da 
Criança e do Adolescente (ECA) traz mudanças paradigmáticas no trato de crianças e 
adolescentes que “gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana” (art. 
3, do ECA). Merecem a atenção da família, da comunidade, da sociedade e do Estado, enfim, 
sua “proteção integral” (art. 1º, do ECA). 
A ideia da função repressiva, punitiva e discriminatória do Estado cede, portanto, a outra, a da 
dignidade e da cidadania da criança e do adolescente. Quando o jovem entra em conflito com a 
lei, quem merece proteção é a criança ou o adolescente. Diferentemente da Convenção da 
ONU, o Estatuto faz a distinção entre a criança, “a pessoa até doze anos de idade incompletos” 
e o adolescente, pessoa “entre doze e dezoito anos de idade” (art. 2º, do ECA). As medidas 
protetivas no art. 101 do estatuto são aplicadas às crianças em situação de risco. O risco é 
descrito no art. 98 como sendo ameaça ou violação dos direitos reconhecidos no próprio 
estatuto. A ameaça pode partir da sociedade e do Estado, dos pais ou responsáveis ou, ainda, 
da “própria conduta” da criança e do adolescente. 
 
Quando a criança ou o adolescente entram em conflito com a lei, são aplicadas as medidas 
socioeducativas, previstas no art. 112. Essas medidas que já têm o sabor amargo de 
penalidades quando o próprio adolescente se colocar em uma situação de risco. A criança, 
obviamente, pode cometer delitos. No entanto, presume-se que a criança não sabe o que faz, 
enquanto o adolescente tem capacidade para saber, mas não o discernimento pleno “para 
entender o caráter ilícito do fato e governar a própria conduta”.[2] Se ele passa, aos 18 anos, a 
entender ou não o caráter ilícito é uma questão que, até para a Justiça, não está clara. Não há 
como estabelecer um critério genérico para diferenciar se um jovem é imputável ou não.[3] O 
ECA prevê, portanto, para jovens infratores da lei até 18 anos a possibilidade de “requisição de 
tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial” (inciso V) 
e da “inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao 
adolescente” (inciso IV, do art. 101, do ECA). Em casos excepcionais, essas medidas podem 
ser aplicadas a jovens de até 21 anos (parágrafo único do art. 2º). 
Educação em vez de punição, tratamento em vez de disciplina, assim determina a lei. 
Aparentemente inaugurou novas práticas de a Justiça lidar com crianças e adolescentes 
infratores da lei. Mas, no cotidiano, a mudança da lei, por si só, não implica mudanças de 
postura dos envolvidos. “Há, particularmente, uma alteração do discurso, que busca corrigir 
uma discriminação, que, por essa via, se fazia das crianças em condições de pobreza, 
abandono e infração, quer eram invariavelmente referidas como menores, sob vigência do 
Código (de Menores). No entanto, o que se pode notar é que há algo de absurdamente 
resistente no plano dos discursos e práticas concretas, que insiste em permanecer.”[4] 
 
 
Questão dissertativa: 
 
Existe ainda hoje, depois da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, a 
possibilidade de se utilizar o termo “menor” para designar uma “criança ou um adolescente”? 
Explique a mudança da concepção teórica jurídica. 
 
 
 
[1] “Art. 29. Os Estados Partes reconhecem que a educação deverá estar orientada no sentido 
de: 
a) Desenvolver a personalidade, as aptidões e a capacidade mental e física da criança em todo 
seu potencial; 
b) Imbuir na criança o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais, bem como 
aos princípios consagrados na Carta das Nações Unidas; 
c) Imbuir na criança o respeito aos seus pais, à sua própria identidade cultural, ao seu idioma e 
seus valores, aos valores nacionais do país que reside, aos do eventual país de origem, e aos 
das civilizações diferentes da sua; 
d) Preparar a criança para assumir uma vida responsável numa sociedade livre, com espírito 
de compreensão, paz, tolerância, igualdade de sexos e amizade entre todos os povos, grupos 
étnicos, nacionais e religiosos, e pessoas de origem indígena; 
e) Imbuir na criança o respeito ao meio ambiente.” 
[2] AMARANTE, Napoleão, X. do. Comentário do art. 104 do Estatuto da Criança e do 
Adolescente. In: CURY, Munyr (org.). Estatuto da Criança e do Adolescente: Comentários 
jurídicos e sociais. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 499. 
[3] AMARANTE, Napoleão, X. do. Comentário do art. 104 do Estatuto da Criança e do 
Adolescente. In: CURY, Munyr (org.). Estatuto da Criança e do Adolescente: Comentários 
jurídicos e sociais. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 501. 
[4] GUIRADO, Marlene. Em instituições para adolescentes em conflito com a lei, o que pode a 
nossa vão psicologia? IN: GONÇALVES, Hebe Signorini & BRANDÃO, Eduardo Ponte. 
Psicologia Jurídica no Brasil. Rio de Janeiro: NAU, 2004, p. 263. 
 
Lei, violência contra a mulher e as questões de gênero 
 
Maria da Penha é o nome de uma lei que traz uma série de medidas para não só punir, como 
impedir que aconteçam agressões contra mulheres cometidas pelos próprios companheiros. 
Por que esse nome de mulher? Maria da Penha é uma senhora que estudou, formou-se na 
universidade e casou-se com um professor universitário. Como para muitas mulheres, o 
casamento tornou-se um pesadelo. Maria da Penha era agredida pelo marido que tentou por 
duas vezes matá-la. Mas à diferençada maioria das vítimas de agressões no âmbito 
doméstico, Maria da Penha lutou para conseguir que, em 2006, fosse promulgada a lei que não 
só pune mais severamente os crimes cometidos no lar, como também procura fazer com que 
esses crimes não sejam facilitados, ou não aconteçam. 
Para abordar a questão da violência contra a mulher é importante esclarecer o uso de dois 
conceitos por estudos sociológicos e antropológicos: sexo e gênero. Do ponto de vista da 
biologia (e, consequentemente, da medicina), a distinção entre homens e mulheres se faz a 
partir da determinação do sexo. Para a biologia, os órgãos sexuais são determinantes para 
dizer se alguém nasce menino ou menina. Já a sociologia e a antropologia que têm como 
objeto de estudo a sociedade e a cultura humanas empregam o conceito de gênero, uma vez 
que o que ser homem ou mulher é uma construção cultural. As fitas rosa ou azuis no berço de 
um bebê são exemplo dessa construção a partir da cultura que faz de um ser humano um 
homem ou uma mulher. 
As mais diversas propostas da psicologia reconhecem a diferença biológica e cultural entre 
homens e mulheres. Assim o faz, por exemplo, a proposta psicanalítica lacaniana que analisa 
as diferentes “posições discursivas” entre homens e mulheres. Isso quer dizer em outras 
palavras que homens e mulheres pensam, falam e agem de maneira diferente. Nesse contexto 
é importante dizer que o jeito de ser masculino ainda é muito predominante nas mais diversas 
culturas, inclusive na nossa. Ainda valorizam o pai como orientador da linguagem. Para dar um 
exemplo: corriqueiramente dizemos “o juiz”, “o presidente”, “o patrão” para marcar posições de 
poder como posições masculinas, nem que sejam ocupadas por mulheres. 
À posição masculina na linguagem não escapam nem homens nem mulheres. Quem vai negar 
que o pai é importante para nortear o filho? Quem vai negar a importância da ordem para a 
convivência em sociedade? Quem pode descartar o uso da razão e da lógica para a ciência e o 
conhecimento em geral? Nem homens, nem mulheres. 
No entanto, há traços no jeito de ser das mulheres que escapam do jeito de ser masculino. As 
mulheres prezam a diferença, a emoção, a mística. No entanto, o que as mulheres prezam é 
historicamente descartado como sendo “loucura”, “bruxaria”, “sem valor”. Por que isso é 
importante saber? Porque o jeito feminino de ser assusta e pode ser uma das mais diversas 
razões da agressão contra mulheres. Na lógica masculina, lógica essa que exige do homem o 
sacrifício da satisfação junto à mãe (para lembrarmos do Complexo de Édipo masculino), o 
homem procura, ainda que na fantasia, aquilo que crê ter perdido, quando foi separado da 
mãe: o objeto do seu desejo, a mulher. Nesse sentido, no sentido da sexualidade masculina, a 
mulher é um objeto. É só passar numa banca de revistas e ler o conteúdo das revistas 
masculinas e femininas. Pois as mulheres, por outro lado, oferecem-se como objetos do desejo 
masculino. Essa relação entre procurar um objeto e ser um objeto do desejo não é natural, é 
cultural. No entanto, há um problema: o belo objeto do desejo pode tornar-se desejo, o reverso 
do objeto do desejo, pode tornar-se, enfim, descartável. 
Os homens e as mulheres podem aceitar essas diferenças culturais e superar as divergências 
na maneira de ser de cada um pelo amor. Ou não. 
Infelizmente, a insatisfação e a estranheza de um em relação ao outro pode gerar angústia e 
violência. A mulher, antes lindo objeto de satisfação, vira dejeto. Mas, como mesmo “mulher 
objeto” não se deixa dominar completamente, instaura-se uma relação entre o casal que 
“mescla de violência, sedução, afeto, presentes, arrependimento” [1]. Juntam-se a esses dados 
subjetivos a dependência econômica da mulher e a legitimação social do “crime em defesa da 
honra”. Mas, em decorrência principalmente das questões afetivas envolvidas, o casal entra 
 
num círculo vicioso de discussão, agressão, queixa na delegacia, arrependimento, sedução e 
retirada da queixa para, depois de algum tempo, retomar o ciclo. 
A Lei 11340/2006, a Lei Maria da Penha, trata de qualquer agressão contra a mulher, não 
somente a física. Uma agressão verbal pode ser violência psicológica. Uma relação sexual 
indesejada pode ser qualificada como violência sexual, deixar a mulher sem recursos, violência 
patrimonial, e assim por diante. Se uma mulher se encontra nessa situação, a Justiça deve 
tomar medidas para, principalmente, afastar a mulher de seu parceiro agressor. 
Finalmente, em qualquer hipótese de agressão contra a mulher, a lei garante, dentre outras 
medidas, o atendimento por equipe multidisciplinar que possa oferecer um tratamento. 
Finalidade é retirar a mulher não do lar, mas da posição de vítima, do dejeto, na qual ela 
mesma se coloca, para que ela possa tornar-se sujeito de sua própria ação. 
 
Questão dissertativa: 
 
Qual é a diferença entre os conceitos “sexo” e “gênero”? 
 
Referência bibliográfica: 
MORGADO, R. Mulheres em situação de violência doméstica: limites e possibilidades de 
enfrentamento. In: BRANDÃO, E. & GONÇALVES, H. Psicologia jurídica no Brasil. Rio de 
Janeiro: Nau, 2004. 
 
 
 
 
[1] MORGADO, R. Mulheres em situação de violência doméstica: limites e possibilidades de 
enfrentamento. In: BRANDÃO, E. & GONÇALVES, H. Psicologia jurídica no Brasil. Rio de 
Janeiro: Nau, 2004, p. 315. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Psicologia jurídica na execução penal 
 
De início, cabe indagar: o que é crime? Pois, o conceito de crime, de criminoso, de pena e de 
prisão varia no tempo e no espaço. Em outras palavras: o que foi crime outrora, hoje não é 
mais. Penas foram aplicadas e abolidas. Novas penas são aplicadas para novos crimes. O 
tema merece, portanto, uma abordagem crítica, tal como foi realizada, por exemplo, pelo 
psicólogo e filósofo francês Michel Foucault, cuja obra influenciou as reflexões contemporâneas 
sobre o sistema prisional. Resumindo essas reflexões, podemos dizer que a prisão, a principal 
pena aplicada aos que cometem crimes aos olhos da sociedade, é um poderoso meio de 
marginalização daquilo das chamadas “classes perigosas”. 
Quais são essas classes perigosas? Ao final da Idade Média europeia, com a nascente 
sociedade do trabalho, começou-se a valorizar quem trabalhasse. Nem sempre foi assim. 
Durante toda Antiguidade e boa parte da Idade Média, o trabalho era desvalorizado, era o 
próprio castigo, como lembra a própria palavra trabalho, cuja raiz latina é tripalium, o tridente, 
instrumento de tortura. Com a valorização do trabalho, há, consequentemente, a 
marginalização da vagabundagem. Os pobres, soltos no mundo, são recolhidos em casas de 
pobres, onde aprendem a obedecer à disciplina do trabalho. Assim, operários, mulheres, 
vagabundos e criminosos são indiscriminadamente recolhidos, cadastrados e tratados para 
fazerem funcionar as primeiras fábricas na França. [1] 
Vistas por essa ótica, as classes marginalizadas são aquelas nas quais não se pode confiar e 
sobre as quais se quer adquirir o controle social. Essa desconfiança foi, no Brasil, dirigida aos 
escravos negros, presos por sua condição de serem objetos de compra e venda. Sendo 
estranhos, “assombravam” a vida da elite. É interessante fazer aqui um parêntese e mencionar 
um ensaio de Sigmund Freud, O estranho, no qual descreve a mescla entre angústia e atração 
que o estranho nos provoca e que “aprisionamos” pelo recalque no inconsciente. Seria a prisão 
uma forma de “recalque” de contradições, conflitos não resolvidos pela sociedade? Hoje, os 
criminosos que mais preocupam a sociedade no Brasil são os traficantes. Verdadeiras guerras 
travam-se entre o Estado e os traficantes de drogas ilícitas. 
Mas não somente as classes consideradas perigosas mudam ao longo da história e 
dependendo do lugar. Há também mudanças no tipo de pena para os que sãoconsiderados 
criminosos. Visam ao corpo na sociedade feudal, na qual preferencialmente se aplicava o 
suplício e a pena de morte. Visam à liberdade na sociedade industrial e os bens na sociedade 
pós-moderna que, muitas vezes, substitui a pena privativa de liberdade por severas multas. 
Como já foi visto, a pena privativa de liberdade nasce junto às outras instituições, tal como a 
fábrica, que visam à disciplina. Para Michel Foucault, têm como metáfora o chamado 
Panópticum de Bentham. Nele, as pessoas estão num campo de visibilidades. Podem ser 
vistas e controladas sem ver quem as controla. Com isso, espera-se, introjetam a disciplina que 
as fazem funcionar adequadamente na sociedade moderna que tem como valor moral central o 
trabalho produtivo. A falta de disciplina é perigosa. Vai à contramão da sociedade burguesa. 
Assim, com a burguesia nasce também o conceito de delinquente. Delinquente não é somente 
o cidadão criminoso que lesa um direito de outro cidadão, mas aquele que se revolta contra a 
ordem do Estado. Não somente a vítima tem um direito de ver seu agressor sendo punido. A 
própria sociedade tem interesse na reclusão do ator. Essa serve, na concepção moderna, para 
vigiar, isolar, controlar e educar o detento que deve ser futuramente reintegrado à sociedade. 
A prisão serve, portanto, como uma tecnologia corretiva a partir de uma questão subjetiva: 
personalidade do preso. A partir de um diagnóstico do preso é estabelecida sua terapêutica e o 
prognóstico para sua ressocialização bem sucedida. Na Lei de Execução Penal brasileira, esse 
processo está na mão da Comissão Técnica de Classificação (CTC). Médicos, psicólogos e 
assistentes sociais emitem laudos que permitem diagnosticar o preso e prognosticar se ele tem 
condições de futuramente reintegrar-se na sociedade. 
A atuação dos profissionais que compõem a CTC encontra críticas. Quais critérios se adotam 
para fazer o diagnóstico? Quais para fazer o prognóstico? Será que os juízes responsáveis 
pela execução penal simplesmente avalizam os laudos técnicos? Como o “tratamento penal” 
 
leva em conta possíveis causas subjetivas do crime: conflitos pessoais e familiares, problemas 
econômicos e sociais? 
Hoje estão em discussão as possibilidades de como o preso pode ser respeitado como sujeito 
de direito. Apesar da Lei de Execução Penal não prever um direito do preso à assistência 
psicológica, possibilidades de tratamento individual, subjetiva e consentida são 
preconizadas. [2] Para a psicanálise contemporânea, há como responsabilizar, em vez de 
culpar por um tratamento não genérico, mas singular, que visa a uma mudança de postura. 
Nesse tratamento, o inconsciente deixa de ser justificativa para o crime. O tratamento aposta 
na possibilidade do ser humano mudar de vida, de encontrar saídas não pelo crime, mas pela 
criatividade transformadora do mundo. 
 
 
Questão dissertativa: 
 
Quais são as críticas que se pode fazer à Lei de Execução Penal que requer do psicólogo 
prognósticos decisivos sobre as possibilidades de ressocialização de presos? 
 
 
Referências: 
KOLKER, Tânia. A atuação dos psicólogos no sistema penal. In: BRANDÃO, E.P. & 
GONÇALVES, H. S. Psicologia Jurídica. Rio de Janeiro: Nau, 2004. 
FORBES, Jorge. Inconsciente e responsabilidade: psicanálise do Século XXI. São Paulo: 
Manole, 2012. Cap. 2. 
 
 
 
 
 
[1] PERROT, Michelle. Os excluídos da história: operários, mulheres, prisioneiros. 2. ed. Rio de 
Janeiro: Paz e Terra, 1988. 
 
[2] CARVALHO, Salo de. O papel da perícia psicológica na execução penal. In: BRANDÃO, 
E.P. & GONÇALVES, H. S. Psicologia Jurídica. Rio de Janeiro: Nau, 2004.

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