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Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● PARASITOLOGIA 1 www.medresumos.com.br TENÍASE E CISTICERCOSE HUMANA A teníase é uma doença causada pela forma adulta da tênia (Taenia solium e Taenia saginata, principalmente), com sintomatologia mais simples. Muitas vezes, o paciente nem sabe que convive com o parasita em seu intestino delgado. São duas fases distintas de um mesmo verme, causando, portanto, duas parasitoses no homem, o que não significa que uma mesma pessoa tenha que ter as duas formas ao mesmo tempo. As tênias também são chamadas de solitárias, porque, na maioria dos casos, o portador traz apenas um verme adulto. São altamente competitivas pelo habitat e, sendo seres monoicos com estruturas fisiológicas para autofecundação, não necessitam de parceiros para a cópula e postura de ovos. Em resumo: a teníase é uma parasitose intestinal ocasionada pela presença das formas adultas de Taenia solium ou Taenia saginata. É transmitida através da ingestão de carnes cruas ou mal cozidas de porco (T. solium) ou boi (T. saginata) contaminadas com larvas ou cisticercos. Pode ser caracterizada por dores abdominais, nauseas, debilidade, perda de peso. O homem ao ingerir acidentalmente ovos de T. solium adquire a cisticercose humana, caracterizando-se como uma enfermidade somática. A doença acomete tanto o homem quanto os animais: quando um porco apresenta um cisticerco, diz-se que o mesmo está com cisticercose. Bem como ocorre com o homem portador de cisticerco – também acometido de cisticercose. Porém, o portador natural da cisticercose é o porco. O homem é um portador acidental (hospeiro intermediário acidental). CLASSIFICAÇÃO Filo: Platyhelminthes (simetria bilateral; ausência de sistema digestivo) Classe: Cestoda Família: Taeniidae Gênero: Taenia Espécie: o T. solium (H.I.: suínos): mais patogênica que a segunda devido a presença do rostelium (uma coroa de espinhos ou acúleos, formada por uma dupla camada de acúleos). Seus ovos, quando ingeridos, causam a cisticercose. o T. saginata (H.I.: bovinos) A classe Cestoda compreende um interessante grupo de parasitos, hermafroditas, de tamanhos variados, encontrados em animais vertebrados. Apresenta o corpo achatado dorsoventralmente, são providos de órgãos de adesão na extremidade mais estreita, a anterior, sem cavidade geral, e sem sistema digestório. Os cestódeos mais frequentemente encontrados parasitando os humanos pertencem a família Taenidae, na qual são destacadas Taenia solium e T. saginata. Essas espécies, popularmente conhecidas como solitárias, são responsáveis pelo complexo teníase-cisticercose, que pode ser definido como um conjunto de alterações patológicas causadas pelas formas adultas e larvares nos hospedeiros. Didaticamente, a teníase e a cisticercose são duas entidades mórbidas distintas, causadas pela mesma espécie, porém com fase de vida diferente. A teníase é uma alteração provocada pela presença da forma adulta da Taenia solium ou da T. saginata no intestino delgado do hospedeiro definitivo, os humanos; já a cisticercose é a alteração provocada pela presença da larva (vulgarmente denominada canjiquinha) nos tecidos de hospedeiros intermediários normais, respectivamente suínos e bovinos. Hospedeiros anômalos, como cães, gatos, macaco e humanos, podem albergar a forma larvar da T. solium. Arlindo Ugulino Netto. PARASITOLOGIA 2016 Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● PARASITOLOGIA 2 www.medresumos.com.br MORFOLOGIA Tamanho médio: o T. solium: 2 a 4 metros o T. saginata: 4 a 12 metros. Divisão morfológica: Escólex ou cabeça (quatro ventosas com a presença do rostelium na sarginata); Colo ou pescoço. VERME ADULTO A T. saginata e T. solium apresentam corpo achatado, dorsoventralmente em forma de fita, dividido em escólex ou cabeça, colo ou pescoço e estróbilo ou corpo. São de cor branca leitosa com a extremidade anterior bastante afilada de difícil visualização. 1. Escólex: pequena dilatação situada na extremidade anterior, funcionando como órgão de fixação do cestódeo à mucosa do intestino delgado humano. Apresenta quatro ventosas formadas de tecido muscular, arredondadas e proeminentes. A T. solium possui o escólex globuloso com um rostelo ou rostro situado em posição central, entre as ventosas, armado com dupla fileira de acúleos, em formato de foice. A T. saginata tem o escólex inerme, sem rostelo e acúleos. 2. Colo: porção mais delgada do corpo onde as células do parênquima estão em intensa atividade de multiplicação, é a zona de crescimento do parasito ou de formação das proglotes. 3. Estróbilo: é o restante do corpo do parasito. Inicia-se logo após o colo, observando-se diferenciação tissular que permite o reconhecimento de órgãos internos, ou da segmentação do estróbilo. Cada segmento formado denomina-se proglote ou anel, podendo ter de 800 a 1.000 e atingir 3 metros na T. solium, ou mais de 1.000, atingindo até 8 metros na T. saginata. A estrobilização é progressiva, ou seja, a medida que cresce o colo, vai ocorrendo a delimitação das proglotes e cada uma delas inicia a formação dos seus órgãos. Assim, quanto mais afastado do escólex, mais evoluídas são as proglotes. As proglotes são subdivididas em jovens, maduras e grávidas e têm a sua individualidade reprodutiva e alimentar. Proglote jovem: são mais curtas do que largas e já apresentam o início do desenvolvimento dos órgãos genitais masculinos que se formam mais rapidamente que os femininos. Este fenômeno é denominado protandria. Proglote madura: possui os órgãos reprodutores masculino e feminino completos e aptos para a fecundação. Proglote gravídica: situadas mais distantes do escólex, são mais compridas do que largas e internamente os órgãos reprodutores vão sofrendo involução enquanto o útero se ramifica cada vez mais, ficando repleto de ovos. A proglote grávida de T. solium é quadrangular, e o útero formado por 12 pares de ramificações do tipo dendríticas, contendo até 80 mil ovos, enquanto a de T. saginata é retangular, apresentando no máximo 26 ramificações uterinas do tipo dicotômico, contendo até 160 mil ovos. O desprendimento contínuo das proglotes gravídicas (que serão liberadas nas fezes juntas aos ovos) é chamado de apólise. OVOS E PROGLOTES GRAVÍDICAS São esféricos, morfologicamente indistinguíveis, medindo cerca de 30mm de diâmetro. São constituídos por uma casca protetora (o embrióforo), que é formado por blocos piramidais de quitina unidos entre si por uma substância (provavelmente proteica) cementante que lhe confere resistência no ambiente. Internamente, encontra-se o embrião hexacanto (ou seja, que apresenta seis espinhos, independente da espécie) ou oncosfera, provido de três pares de acúleos e dupla membrana. Nos exames de fezes, por meio dos ovos apenas, é quase que impossível diferenciar uma espécie da outra. A diferenciação é evidente apenas observando as proglotes gravídicas liberadas nas fezes juntos aos ovos: as proglotes da T. saginata são maiores, mais retangulares e com mais ramificações uterinas (com aspecto mais cheio), sendo as ramificações da T. saginata do tipo “diplotônica” (agrupadas em pares); diferentemente da proglote da T. solium, cuja proglote gravídica é menor e mais quadrangular e suas ramificações uterinas são do tipo “dendríticas”. CISTICERCO OU LARVA O cisticerco da T. solium é constituído de uma vesícula translúcida com líquido claro, contendo invaginado no seu interior um escólex com quatro ventosas, rostelo e colo (receptáculo capitis). O cisticerco da T. saginata apresenta a mesma morfologia diferindo apenas pela ausência do rostelo. A parede da vesícula dos cisticercos é composta por três membranas: cuticular ou externa, uma celular ou intermediária e uma reticular ou interna. Estas larvas podem atingir até 12mm de comprimento, após quatro meses de infecção. No sistema nervoso central humano, o cisticerco podese manter viável por vários anos. Tem-se três espécies de cisticerco: Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● PARASITOLOGIA 3 www.medresumos.com.br Cysticercus bovis: cisticerco da T. saginata que, diferentimente do cisticerco da T. solium, não apresenta acúleos. Cysticercus cellulosae: cisticerco da T. solium que apresenta escólex (com acúleos) e vesícula translúcida. Cysticercus racemosus: considerada uma forma anômala do Cysticercus cellulosae, onde não se observa escólex, sendo eles formados por várias membranas aderidas umas às outras, formando agrupamentos semelhantes a cachos de uvas. E encontrada no sistema nervoso central, com maior frequência nos ventrículos cerebrais e espaço subaracnoideo (neurocisticercose). Não foi encontrada em animais domésticos. CICLO BIOLÓGICO Para o indivíduo estar parasitado, ele deve possuir a forma adulta do verme no seu intestino delgado. Os humanos parasitados eliminam as proglotes grávidas cheias de ovos para o exterior. Em alguns casos, durante a apólise pode ocorrer formação de hérnia entre as proglotes devido à não-cicatrização nas superficies de ruptura entre as mesmas, o que facilita a expulsão dos ovos para a luz intestinal e a eliminação com as fezes. Mais frequentemente as proglotes se rompem no meio externo, por efeito da contração muscular ou decomposição de suas estruturas, liberando milhares de ovos no solo. No ambiente úmido e protegido de luz solar intensa os ovos têm grande longevidade mantendo-se infectantes por meses. Um hospedeiro intermediário próprio (suíno para T. solium e bovino para T. saginata) ingere os ovos, e os embrióforos (casca de ovo) no estômago sofrem a ação da pepsina, que atua sobre a substância cementante dos blocos de quitina. No intestino, as oncosferas sofrem a ação dos sais biliares, que são de grande importância na sua ativação e liberação. Uma vez ativadas, as oncosferas liberam-se do embrióforo e movimentam-se no sentido da vilosidade, onde penetram com auxílio dos acúleos. Permanecem nesse local durante cerca de quatro dias para adaptarem-se às Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● PARASITOLOGIA 4 www.medresumos.com.br condições fisiológicas do novo hospedeiro. Em seguida, penetram nas vênulas e atingem as veias e os linfáticos mesentéricos. Através da acorrente circulatória, são transportadas por via sanguínea a todos os órgãos e tecidos do organismo até atingirem o local de implantação por bloqueio do capilar. Posteriormente, atravessam a parede do vaso, instalando-se nos tecidos circunvizinhos. As oncosferas desenvolvem-se para cisticercos em qualquer tecido mole (pele, músculos esqueléticos e cardíacos, olhos, cérebro etc.), mas preferem as estruturas de maior movimentação e com maior oxigenação (masseter, língua, coração e cérebro). No interior dos tecidos, perdem os acúleos e cada oncosfera transforma-se em um pequeno cisticerco delgado e translúcido, que começa a crescer atingindo ao final de quatro ou cinco meses de infecção 12mm de comprimento. Permanecem viáveis nos músculos por alguns meses e o cisticerco da T. solium no SNC, alguns anos. A infecção humana ocorre pela ingestão de carne crua ou malcozida de porco ou de boi infectado. O cisticerco ingerido sofre a ação do suco gástrico, evagina-se e fixa-se, através do escólex, na mucosa do intestino delgado, transformando-se em uma tênia adulta, que pode atingir até oito metros em alguns meses. Três meses após a ingestão do cisticerco, inicia-se a eliminação de proglotes grávidas. A proglote grávida de T. solium tem menor atividade locomotora que a de T. saginata, sendo observada em alguns pacientes a eliminação de proglotes dessa espécie ativamente pelo ânus e raramente pela boca. A T. solium tem uma longevidade de três anos enquanto a T. saginata até dez anos. Durante o parasitismo, várias proglotes grávidas se desprendem diariamente do estróbilo, três a seis de cada vez em T. solium e oito a nove (individualmente) em T. saginata. O colo, produzindo novas proglotes, mantém o parasito em crescimento constante. OBS 1 : Um indivíduo que possua T. solium em seu organismo pode estar mais susceptível à desenvolver neurocisticercose por meio de uma autoinfecção externa, em que ao liberar ovos da T. solium nas fezes, caso não haja uma boa higiene pessoal e com seus alimentos, esses mesmos ovos podem retornar ao TGI do indivíduo, gerando, dessa vez, cisticercose. OBS²: Uma infecção pode se dar por meio de uma autoinfecção interna, que está geralmente associada a movimentos retroperistálticos, em que ovos retornam por meio do vômito, chegam ao estômago e retornam ao intestino, ocorrendo de maneira interna, sem a exteriorização dos ovos. OBS³: Duas situações são fundamentais para que ocorra a cisticercose: os ovos ingeridos devem ser de T. solium e eles devem passar pelo estômago, para que haja o enfraquecimento do embrióforo. TRANSMISSÃO Teníase: o hospedeiro definitivo (humanos) infecta-se ao ingerir carne suína ou bovina, crua ou malcozida, infetada, respectivamente, pelo cisticerco de cada espécie de Taenia. A cisticercose humana é adquirida pela ingestão acidental de ovos viáveis da T. solium que foram eliminados nas fezes de portadores de teníase. Os mecanismos possíveis de infecção humana são: Autoinfecção externa: ocorre em portadores de T. solium, quando eliminam proglotes e ovos de sua própria tênia, levando-os a boca pelas mãos contaminadas ou pela coprofagia (observado principalmente em condições precárias de higiene e em pacientes com distúrbios psiquiátricos). Autoinfecção interna: poderá ocorrer durante vômitos ou movimentos retroperistálticos do intestino, possibilitando presença de proglotes grávidas ou ovos de T. solium no estômago. Estes depois da ação do suco gástrico e posterior ativação das oncosferas voltariam ao intestino delgado, desenvolvendo o ciclo autoinfectante. Heteroinfecção: ocorre quando os humanos ingerem alimentos ou água contaminados com os ovos da T. solium disseminados no ambiente através das dejeções de outro paciente. Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● PARASITOLOGIA 5 www.medresumos.com.br CISTICERCOSE HUMANA Diferentemente da teníase, que se desenvolve a partir da ingestão do cisticerco presente na carne do boi ou do porco, a cisticercose humana é obtida a partir da ingestão do ovo de T. solium presente na carne de porco ou até mesmo em alimentos. Como já foi visto, a infecção pode se dar por autoinfecção externa, interna ou hetero-infecção. O cisticerco (Cysticercus cellulosae) apresenta uma parede em forma de vesícula composta por membrana cuticular, celular e reticular. Ele pode ser encontrado nos tecido celular subcutâneo, muscular, cerebral e nos olhos de suínos e, acidentalmente, no homem. Como o cisticerco não se localiza em momento algum no TGI, o exame patológico de fezes não será um método efetivo para diagnóstico. Não está bem estabelecido grau o de alteração que a cisticercose provoca nos animais. Como em geral os suínos são abatidos precocemente (em tomo de seis meses), muitas vezes não se notam alterações relevantes. Mas em reprodutores mais velhos, o encontro de cisticerco no coração, músculos mastigadores, respiratórios e cérebro leva a crer que sejam capazes de produzir sintomatologia, porém não bem estudadas. Em cães, apesar de não ser um encontro frequente, a presença do C. cellulosae no SNC provoca sintomas nervosos, muitas vezes semelhantes a raiva canina. OBS: Teníase Ciclo Heteroxeno se dá por médio da ingestão do cisticerco Cisticercose Ciclo Monoxenico se dá por meio da ingestão dos ovos de T. solium. É uma doença pleomórfica pela possibilidade de alojar-se o cisticerco em diversas partes do organismo, como tecidos musculares ou subcutâneos; glândulas mamárias (mais raramente); globo ocular e com mais frequência no sistema nervoso central, inclusive intramedular, o que trazmaiores repercussões clínicas. Em estudo clínicoepidemiológico da neurocisticercose no Brasil observou-se que as oncosferas apresentam um grande tropismo, 79-96%, pelo sistema nervoso central. PATOGENIA Cysticercus racerosus: alterações na morfologia (o tamanho do cisticerco reduzido). C. cellulosae: é o principal responsável pelas lesões graves ao organismo humano. Pode causar a cisticercose subcutânea, muscular, nervosa ou ocular. Os ovos, ao serem ingeridos e chegarem ao estômago, têm o seu embrióforo fragilizado, liberando a oncosfera. Esta, após passar um curto período de tempo no intestino, alcança a circulação geral, pela qual será distribuída a um órgão alvo: olho (cisticercose ocular), SNC (neurocisticercose), tecido subcutâneo, língua, mama, etc. Durante a migração, a oncosfera causa pouco dano. Os principais danos causados por ela se dão no órgão onde se esta se instalou após percorrer a circulação geral. A sua presença nos órgãos gera uma reação inflamatória caracterizada por uma grande migração de eosinófilos e neutrófilos. Quando morre, causam uma reação inflamatória com proliferação fibroblastica, calcificação e compressão do tecido circunjacente. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As manifestações clínicas causadas pelo C. cellulosae dependem de fatores, como número, tamanho e localização dos cisticercos; estágio de desenvolvimento, viáveis, em degeneração ou calcificados, e, finalmente, a resposta imunológica do hospedeiro aos antígenos da larva. A cisticercose muscular ou subcutânea provoca pouca alteração e em geral, é uma forma assintomática. Os cisticercos aí instalados desenvolvem reação local, formando uma membrana adventícia fibrosa. Com a morte do parasito há tendência a calcificação. Quando numerosos cisticercos instalam-se em músculos esqueléticos, podem provocar dor, fadiga e cãibras (quer estejam calcificados ou não). A cisticercose cardíaca pode resultar em palpitações e ruídos anormais ou dispneia quando os cisticercos se instalam nas válvulas. Em geral, os pacientes acometidos apresentam: alterações na função das válvulas cardíacas e diminuição do débito cardíaco. A cisticercose das glândulas mamárias é uma forma rara. Clinicamente pode-se apresentar sob a forma de um nódulo indolor com limites precisos, móvel, ou ainda, como uma tumoração associada a processos inflamatórios provavelmente devido ao estágio degenerativo da larva. Na cisticercose ocular sabe-se que o cisticerco alcança o globo ocular através dos vasos da coroide, instalando- se na retina. Aí cresce, provocando ou o descolamento desta ou sua perfuração, atingindo o humor vítreo. As consequências da cisticercose ocular são: reações inflamatórias exsudativas que promoverão opacificação do humor vítreo, sinéquias posteriores da íris, uveítes ou até pantoftalmias. Essas alterações, dependendo da extensão, promovem a perda parcial ou total da visão e, as vezes, até desorganização intra-ocular e perda do olho. O parasito não atinge o cristalino, mas pode levar a sua opacificação (catarata). A cisticercose no sistema nervoso central pode acometer o paciente por três processos: presença do cisticerco no parênquima cerebral ou nos espaços liquóricos; pelo processo inflamatório decorrente; ou pela formação de fibroses, granulomas e calcificações. Os cisticercos parenquimatosos podem ser responsáveis por processos compressivos, irritativos, vasculares e obstrutivos; os instalados nos ventrículos podem causar a obstrução do fluxo líquido cefalorraquidiano, hipertensão intracraniana e hidrocefalia e, finalmente, as calcificações, que correspondem a forma cicatricial da neurocisticercose e estão associadas a epileptogênese. As localizações Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● PARASITOLOGIA 6 www.medresumos.com.br mais frequentes dos cisticercos no SNC são leptomeninge e córtex (substância cinzenta). Cerebelo e medula espinhal já são mais raras. As manifestações clínicas em geral aparecem alguns meses após a infecção. Em cerca de seis meses o cisticerco está maduro e tem uma longevidade estimada entre dois e cinco anos no SNC. Neste processo, são identificados os quatro estágios do cisticerco, citados anteriormente, que culminam com a sua degeneração. Em geral, os pacientes acometidos apresentam: mal estar, cefaleia, dificuldade motora, ataques epileptiformes e loucura. DIAGNÓSTICO PARASITOLÓGICO É feito pela pesquisa de proglotes e, mais raramente, de ovos de tênia nas fezes pelos métodos rotineiros ou pelo método da fita gomada. Para as duas tênias, o diagnóstico é genérico, pois microscopicamente os ovos são iguais. Para o diagnóstico específico, há necessidade de se fazer a "tamização" (lavagem em peneira fina) de todo o bolo fecal, recolher as proglotes existentes e identificá-las pela morfologia da ramificação uterina. CLÍNICO O diagnóstico da cisticercose humana tem como base aspectos clínicos, epidemiológicos e laboratoriais. O diagnóstico laboratorial tem como base a pesquisa do parasito, através de observações anatomopatológicas das biopsias, necropsias e cirurgias. O cisticerco pode ser identificado por meio direto, através do exame oftalmoscópico de fundo de olho ou ainda pela presença de nódulos subcutâneos no exame fisico. IMUNOLÓGICO Durante algum tempo os métodos usados para detectar anticorpos anticisticercos no soro, líquido cefalorraquidiano (LCR) e humor aquoso eram: a fixação do complemento (reação de Weinberg), hemaglutinação indireta e imunofluorescência que apresentavam limitações devido a baixa sensibilidade e especificidade. Posteriormente, o teste imunoenzimático (ELISA) passou a ser recomendado após a melhora na qualidade e preparo de antígenos. NEUROIMAGENS O diagnóstico através do RX utilizado durante algum tempo é limitado, pois somente evidência cisticercos calcificados que podem aparecer anos após a infecção. A tomografia computadorizada (TC) e a ressonância nuclear magnética (RNM) do cérebro foram um grande avanço para o diagnóstico de neurocisticercose. São métodos sensíveis, que fornecem informações quanto a localização, ao numero, a fase de desenvolvimento e a involução dos cisticercos. EPIDEMIOLOGIA As tênias são encontradas em todas as partes do mundo em que a população tem o hábito de comer carne de porco ou de boi, crua ou malcozida. Interessante é que pelos hábitos alimentares de certos povos, as teníases podem ser mais comuns ou raras. Assim, a T. saginata é rara entre os hindus, que não comem carne de bovino e a T. solium, entre os judeus, porque não comem carne de suíno. Os ovos das tênias são muito resistentes, permanecendo viáveis por 3 a 4 meses. A longevidade dos cisticercos também é longa. Quando abatido, vai até 10 dias a 10ºC e até 2 meses a zero graus. O congelamento à -20ºC mata em 12h, enquanto que o cozimento mata em 5 minutos. PROFILAXIA Sendo o porco coprófago por natureza, medidas de controle dirigidas no sentido de impedir o contato destes animais com fezes do único hospedeiro definitivo (os humanos) são extremamente desejáveis. Programas de intervenção dos órgãos de saúde devem ser direcionados ao tratamento dos portadores de teníase, a construção de redes de esgoto ou fossas sépticas, ao tratamento de esgotos, para não contaminarem rios que fornecem águas aos animais; a educação em saúde; ao incentivo e apoio de modernização da suinocultura, ao combate ao abate clandestino e a inspeção rigorosa em abatedouros e sequestro de carcaças parasitadas. Impedir o acesso do suíno e do bovino as fezes humanas; Orientar a população a não comer carne crua ou malcozida; Estimular a melhoria do sistema de criação de animais; Inspeção rigorosa da carne e fiscalização dos matadouros. Arlindo Ugulino Netto ● MEDRESUMOS 2016 ● PARASITOLOGIA 7 www.medresumos.com.br TRATAMENTO TENÍASE As drogas mais recomendadas para o tratamento da teníase por Taenia solium ou por T. saginata são aniclosamida ou o praziquantel. A niclosamida atua no sistema nervoso da tênia, levando a imobilização da mesma, facilitando a sua eliminação com as fezes. Devem ser ingeridos quatro comprimidos de dois em dois com intervalo de uma hora pela manhã. Uma hora após a ingestão dos últimos comprimidos, o paciente deverá ingerir duas colheres de leite de magnésio para facilitar a eliminação das tênias inteiras e evitar a autoinfecção interna por T. solium. Para o praziquantel é usado, também, o tratamento com quatro comprimidos de 150mg cada (5mglkg) em dose única. Os efeitos colaterais induzidos pelas drogas são: cefaleia, dor de estômago, náuseas e tonteiras, porém de pouca duração. O praziquantel não deve ser empregado para o tratamento da teníase em pacientes com as duas formas da doença, ou seja, a teníase e a cisticercose. Neste caso, é recomendado o tratamento separado e específico para cada uma das formas clínicas. NEUROCISTICERCOSE O medicamento atua com eficiência em pacientes sintomáticos, apresentando cisticercos viáveis múltiplos, em topografia encefálica intraparenquimatosa, subaracnoidianos e, ainda, muscular ou subcutâneo, causando a sua morte. O praziquantel rompe a membrana do cisticerco, ocorrendo vazamento do líquido da vesícula, altamente antigênico, causando uma intensa reação inflamatória local, sendo necessária a associação com altas doses de corticoide em geral em ambiente hospitalar. Devido aos efeitos colaterais graves provocados pela toxicidade do praziquantel, o albendazol vem sendo utilizado e considerado o medicamento de escolha na neurocisticercose até por ser mais barato.
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