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Artigo Liberalismo

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O SURGIMENTO DO ESTADO LIBERAL[2: Trabalho apresentado na disciplina de Filosofia, do Curso de Direito, do Centro de Ciências Sociais Aplicadas, para obtenção de nota do semestre.]
Ana Luiza Pereira Santiago**[3: ** Acadêmicos do curso de Direito da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA.]
Andressa Rocha Santos**
Emilly da Luz Barbosa**
Hyago Silva Borges de Oliveira**
Paula Marques Evangelista**
Prof. Me. William Freitas***[4: *** Professor responsável pela disciplina Filosofia do curso de Direito da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA.]
RESUMO: Tem-se como objetivo principal esclarecer, de forma contextualizada e assentada em premissas de grandes teóricos, o advento do conceito de Liberalismo, suas importantes correntes e as devidas repercussões ao passar da história. Ademais, busca-se fomentar uma análise histórica-temporal que venha situar os acontecimentos em um formato cronológico coerente e fundamentado, expondo, assim, os imprescindíveis elementos que compõem a doutrina em questão e os fatos que possibilitaram sua efetivação naquele cenário; também, em uma didática explicativa, é dissertado a respeito dos desdobramentos do Liberalismo e seus, respectivos, princípios e legados.
PALAVRAS-CHAVES: Liberalismo. Intervenção mínima estatal. Liberdades. Direitos. Feudalismo. 
1 INTRODUÇÃO
A história das sociedades é marcada, sobretudo, por inúmeros acontecimentos que tendem a extinção de estruturas sociais outrora vivenciadas, mudando, assim, os pensamentos e anseios que eram compartilhados, até então, no meio social. A gênese do Liberalismo surge à luz de um cenário de mudanças no que tange ao sistema de organização social estabelecido na Idade Média, trazendo, portanto, consequências e novas vertentes no que se refere à relação existente entre a figura do Estado e o indivíduo.
A crise do feudalismo inaugura esse marco histórico, que trará como resultado um estilo de vida pautado nos princípios da mínima intervenção da instituição estatal no decorrer das decisões de diretrizes políticas, econômicas e sociais. O sistema feudal apresenta seus indícios de falência, sobretudo, pela estrutura a qual determinou uma configuração altamente estamental – com ínfimas possibilidades de mobilidade social –; a relação do senhor feudal versus servos; as condições de uma vida limitada em prol da sobrevivência; a mínima participação da burguesia nos assuntos relacionados à sociedade, devido ao poder exacerbado concedido ao clero, à nobreza e aos proprietários dos feudos. Somados esses fatores à conjuntura instalada na Baixa Idade Média, em decorrência dos surtos demográficos e dos indícios capitalistas, eis que esse sistema vigente entra em seu período de turbulência.
O Iluminismo aparece como uma solução racional para retificar os conhecimentos divulgados pela ordem dominante de cunho autoritário e dogmático. Dessarte, o movimento iluminista surgiu em um momento do desenrolar das problemáticas vivenciadas pela burguesia no que envolve a intervenção do Estado na economia e os limites de participação política. Portanto, os adeptos do Iluminismo defendiam, sobretudo, uma sociedade centralizada no indivíduo, e visando assegurar essa ideia seria fundamental que o homem gozasse de direitos que proporcionassem esses princípios de liberdade.
As Revoluções Liberais foram propulsoras da disseminação das noções dessa nova vertente teórica, em especial, os movimentos que se desenrolaram na Inglaterra, França e Estados Unidos da América. Os ideais liberais ecoaram nas Revoluções Gloriosa, Francesa e Americana como forma de denunciar as arbitragens vivenciadas pelo antigo regime e uma saída desse modelo, até então, vigente. Esses momentos históricos foram palcos de mudanças e passagem para uma nova forma de sistematização dos preceitos do arranjo social, político e econômico.
Embasados por filósofos e teóricos, os vieses do Liberalismo foram fundamentados por meio de uma percepção da necessidade de defesa dos direitos naturais dos homens, assegurados na premissa da mínima intervenção do Estado na economia, haja vista, que esse setor pode regular-se por si mesmo, devido às leis de oferta e procura, ao princípio da livre concorrência e à circulação monetária. No âmbito político, a instituição estatal irá comprometer-se em garantir a potencialização das liberdades individuais, o direito à vida e à propriedade privada. Na esfera do liberalismo ético, são maximizadas as perspectivas pessoais, civis e sociais.
2 PANORAMA HISTÓRICO: do feudalismo aos primeiros indícios das revoluções liberais.
2.1 Ascensão e crise do sistema feudal
O feudalismo consistiu em um conjunto de práticas que envolviam questões de ordem econômica, social e política. Seu surgimento está atrelado a duas experiências históricas concomitantes: a crise do Império Romano e as Invasões Bárbaras. Nesse período, houve um intenso processo de ruralização devido às constantes guerras promovidas pelas invasões e a crise dos centros urbanos da civilização clássica.
Dentro desse contexto, estiveram presentes a retração das atividades comerciais, a perda do espaço de circulação de moedas, e a produção agrícola ganhara caráter de subsistência. Com isso, implementou-se relações de servidão entre os antigos escravos e plebeus – que passaram a ser camponeses – e os senhores feudais – responsáveis pela administração e pela proteção das unidades básicas de produção: os feudos. 
Tendo em vista que essas unidades produziam tudo o que era necessário para a manutenção da sociedade, seu abastecimento era quase, exclusivamente, interno, e elas ainda indicavam a fortuna de um homem. As relações mercantis eram escassas e, muitas vezes, baseadas na simples troca de produtos. Ademais, detinham rudimentares técnicas de trabalho agrícola, fato que contribuía para a baixa taxa de produção. 
Quanto ao aspecto político, destacou-se por ser uma sociedade estática – com divisão em estamentos – e de poder descentralizado. Tal característica é diretamente influenciada pela natureza econômica do feudalismo, visto que, como praticamente não havia comércio, a circulação de moedas era exígua. Sem ela, o rei não conseguiria arrecadar impostos e, portanto, não teria como formar um exército, o qual seria responsável pela manutenção da ordem social através de um aparato coercitivo. Sendo assim, as funções do rei, na Idade Média, eram apenas “decorativas”, enquanto os senhores feudais detinham, efetivamente, a dominação de seus lotes de terra. 
Outra característica marcante dessa estruturação deve-se ao papel da Igreja Católica. O período medieval estabeleceu a consolidação do cristianismo no interior de toda a Europa, o que influenciou significativamente, com as ditas “verdades absolutas”, a conduta dos homens. Outrossim, a Igreja era a maior detentora de terras do mundo feudal e pregadora da crença de que o homo sapiens deveria contentar-se com o que lhe foi dado por Deus, como forma de justificar a rígida “pirâmide” social da época. 
No século X, esse sistema de organização atingiu o seu auge, alastrando-se por quase todo o continente europeu. Entretanto, assim como em todas as relações de produção, o feudalismo passou por um momento de crise, durante a Baixa Idade Média (séc. XII-XV), determinando, assim, a sua substituição. 
Dentre os “gérmens” que protagonizaram sua instabilidade, pode-se destacar o intenso crescimento demográfico – o qual gerou crise de alimentos, pois a produção não era suficiente para atender a demanda – e o renascimento comercial – estimulado pelo progressivo êxodo rural e a emergência de burgos (antigas feiras comerciais), habitados por um novo segmento social: a burguesia. 
A prosperidade econômica encontrou sua “razão de ser” no retorno a uma economia monetária, na disponibilidade de excedentes da produção – provenientes dos burgos –, na melhoria dos transportes marítimos – desenvolvidos para a Expansão Marítima europeia –, na intensificação da vida urbana e na descoberta de novas rotas comerciais para o Oriente no decorrerdas Cruzadas. 
2.2 A burguesia 
Historicamente, originou-se do povo ao longo do renascimento comercial e urbano, fato que caracterizou o início do sistema econômico capitalista. À princípio, tal classe não detinha tanto poder e influência, porém, aos poucos, assumiu um papel central na sociedade. 
Na primeira versão do Estado Moderno – o Estado Absolutista – o poder político foi centralizado, de forma que o monarca passava de um papel simbólico (no feudalismo) para um concreto. Desse modo, diferentemente do Antigo Regime, previa o exercício do poder sem interferência da Igreja Católica ou de senhores locais, a fim de concentrá-lo totalmente em suas mãos. 
A estruturação do Absolutismo só foi possível graças ao apoio da classe burguesa, que o deu em troca de privilégios no mercado. Nesse contexto, o rei concedia o monopólio de áreas de atuação e de mercadorias aos comerciantes aliados, estabelecia planos fiscais e regulava todo o processo econômico. Essa política financeira ficou conhecida como Mercantilismo.
No início, foi bom para os dois lados: a nobreza, detentora do poder político, recebia apoio, e a burguesia enriquecia. Não obstante, ao perceber que tal prática chegou a um ponto de estagnação, não permitindo mais o seu crescimento, os comerciantes passaram a questionar a ordem estabelecida e lutar por participação política. 
Logo, implantou-se um clima de inconformismo e crise social. A Revolução Científica no século XVII favoreceu os detentores dos meios de produção, ao passo que prepararam a Ideologia Liberal do mundo Ocidental. A Revolução Industrial representou essa mudança no nível econômico; enquanto, as Revoluções Liberais, no político-jurídico; e o Iluminismo, no ideológico. 
2.3 O Iluminismo
As origens do Iluminismo ligam-se aos progressos da ciência e da filosofia ocorridos no século XVII, principalmente ao Racionalismo de Descartes e ao Empirismo de Locke. Essa ideologia defende a liberdade, o progresso e o homem. 
O homem aprende todos os dias, avança, observa, parece-lhe que as trevas recuam: é o “Século das Luzes”. O progresso dos conhecimentos desenvolve a fé em um progresso contínuo da humanidade, em direção a um estágio superior. Tal ideia favorece, em muita gente, um desprezo pelo passado, que leva a rejeitar as velhas crenças e os velhos textos, assim como as velhas tradições. Daí a edificação de novas concepções do mundo, racionalistas, deístas ou materialistas [...] (MOUSNIER; LABROUSSE, 1958, p. 9) 
A Ilustração é deísta – isto é, acredita na presença de Deus na natureza e no homem, bem como que a sua existência só pode ser comprovada por meio da razão – e anticlerical, porque nega a necessidade da intermediação da Igreja entre o homem e Deus, assim como defende a separação entre Igreja e Estado. 
Vale ressaltar que, para os seus teóricos, o homem é naturalmente bom, sendo corrompido pela sociedade, e todos nascem iguais. Por isso, prega uma comunidade que garanta liberdade de expressão e culto de forma universal. Os direitos naturais, como a liberdade individual, direito de posse, tolerância e a igualdade perante a lei seriam obrigações inquestionáveis do governante. 
Depreende-se, então, que, para a burguesia incipiente, as ideias predominantes no século XVIII foram cruciais para impeli-la uma luta armada contra as forças de conservação do Antigo Regime. Posto isso, os pensadores iluministas formularam os fundamentos ideológicos dessa classe em direção a Revoluções, as quais ficaram conhecidas como Revoluções Liberais. 
3 AS REVOLUÇÕES LIBERAIS
As revoluções liberais tiveram seu marco inicial no século XVIII e se desenvolveram no século XIX na qual possuíam forte atuação das ideias iluministas. A explosão das “luzes” foi preparada com o racionalismo cartesiano, a revolução científica e o processo de laicização da política e da moral. Podem ser destacadas como revoluções liberais a Revolução Americana, a Revolução Francesa, as revoltas anticoloniais, a Revolução Liberal do Porto, a Revolução Gloriosa, dentre outras. As principais foram as que aconteceram na Inglaterra, nos Estados Unidos e na França, cujos legados influenciaram outras nações.
3.1 A Revolução Gloriosa
Chauí (2000) aduz que as ideias liberais se consolidaram a partir da Revolução Gloriosa de 1668 na Inglaterra. De acordo com Mello (apud WEFFORT, 2011), o século XVII teve seu destaque devido à oposição entre a Coroa e o Parlamento, controlados pela dinastia Stuart, apoiadora do sistema absoluto, e a burguesia ascendente, partidária do liberalismo. O conflito possuiu, também, caráter de conotação religiosa e se mesclou com as lutas sectárias entre grupos religiosos. A crise político-religiosa foi agravada pela rivalidade econômica entre os beneficiários dos privilégios e monopólios mercantilistas concedidos pelo Estado e os setores que defendiam a liberdade de comércio e de produção. 
O filósofo John Locke foi o principal teórico que influenciou o desencadeamento do conflito (HORTA, 2004). Locke influenciou a posteriori a justificação moral, política e ideológica para a Revolução Gloriosa e para a monarquia parlamentar inglesa. Conforme Locke (apud FARACO, 2015), o Estado existe não a fim de promover a salvação espiritual, e sim, para servir os seus cidadãos e garantir as propriedades essenciais do ser humanos sob uma constituição e, a partir desse pressuposto, o Absolutismo foi visto como o inimigo autocrático da consulta à nação, o adversário despótico dos direitos, o usurpador burocrático das elites naturais da sociedade e o antípoda coercitivo da Inglaterra consensual.
“Em defesa da Liberdade, do Parlamento e da Religião Protestante” (MELLO, 1999), com este lema, Guilherme de Orange desembarcou em solo britânico para depor o rei Jaime II e encerrar um longo e tumultuado período da história inglesa, ou seja, a Revolução Gloriosa assinalou o triunfo do liberalismo político sobre o absolutismo e, com a validação do Bill of Rights em 1689, foi assegurada a supremacia legal do Parlamento sobre a realeza e instituiu-se, na Inglaterra, uma monarquia limitada.
A Revolução de 1668 marcou o período de restauração na Inglaterra, cujo objetivo foi buscar um equilíbrio e gerar regras para que o indivíduo não pudesse se sobrepor ao outro de forma injusta. Outros focos podem ser destacados do mesmo, como a preservação dos direitos inalienáveis do homem e a garantia da liberdade econômica e religiosa.
3.2 A Revolução Francesa
“Liberdade, Igualdade e Fraternidade” foi o lema da Revolução Francesa que marcou a história moderna, transpôs as barreiras da distância e ecoou por todo o mundo, pondo abaixo regimes absolutistas e ascendendo os valores liberais. 
As críticas às instituições feudais, desenvolvidas e difundidas pelos iluministas, constituíam o indício da virulência da luta que a burguesia tratava no campo político em contraposição às classes que firmavam o domínio feudal. O conflito entre as novas forças sociais ascendentes chocava-se com a monarquia absolutista, a qual assegurava consideráveis privilégios para quinhentas mil pessoas em um país que possuía uma população de aproximadamente vinte e três milhões de habitantes no final do século XVIII. A classe privilegiada, composta pelo clero e pela nobreza, não apenas usufruía dos impostos pagos pelo terceiro estado e possuía o direito de receber tributos feudais, como também impedia a organização de livre-empresa, a exploração eficiente da terra e demonstrava-se incapaz de criar uma administração padronizada através de uma política tributária racional e imparcial. 
A monarquia, inicialmente, favoreceu os interesses econômicos da burguesia, entretanto, a classe burguesa não mais se contentava em ter o poder econômico. Ela queria, sim, tomar para si o poder político que até então era privilégio da aristocracia. Como Bonavides (1980) aduz: “[...] a monarquia absolutista não foi jamais a burguesia politicamente no poder”. A classe burguesa, ao tomá-lo em 1789, se contrapôs aos fundamentos da sociedade feudal, a fimde traçar um Estado que assegurasse sua autonomia em face da Igreja e promovesse o sistema capitalista. 
O objetivo da Revolução de 1789 (MARTINS, 1994), além de reestruturar o corpo do Estado, era abolir radicalmente a antiga forma de sociedade, com suas tradições, costumes e hábitos arraigados e, ao mesmo tempo, promover inovações na economia, na política e na vida cultural. A revolução desferiu os golpes da igreja, confiscando suas propriedades, suprimindo os votos monásticos e transferindo para o Estado as funções da educação, tradicionalmente controladas pela Igreja. Investiu contra e destruiu os antigos privilégios de classe, amparou e incentivou a liberdade econômica e a participação política da burguesia.
3.3 A Revolução Americana
A Revolução Americana consistiu na tentativa de universalizar a liberdade, com a fundação de um novo corpo político, ou seja, opta pela comunidade política, enquanto a Revolução Francesa opta pelo Estado-nação.
Ela eclodiu durante uma contextura histórica favorável, decorrendo em um país que estranhava a difícil situação de miséria da população e de um povo que tinha larga experiência de governo autônomo. Decerto, uma de suas maiores graças foi ela ter sido produto do conflito defronte a uma “monarquia limitada”. Os revolucionários não foram tentados a atribuir a mesma origem à lei e ao poder. A preliminar do poder era o povo com relação aos americanos, no entanto a matriz das normas deveria ser a Carta Magna do país, e não a vontade do povo.
Arendt (1988) aduz dois problemas da Independência das 13 colônias. A primeira foi à suspensão do adjetivo público na busca da felicidade de direitos. A Revolução falhou ao confinar o cidadão na busca de uma liberdade privada. A segunda foi à supressão de algumas classes dos direitos de cidadão.
A revolução, mesmo que tivesse dado liberdade ao povo, não proporcionou um espaço em que ela pudesse ser exercida como prometido pelos ideais liberalistas. Apenas os representantes do povo tiveram oportunidade de realizar atividades da liberdade, dando-a apenas de forma parcial ao povo. Houve menos exercício de liberdade política na República dos Estados Unidos da América do que houvera nas colônias na América britânica.
4 CONCEITUAÇÃO DE LIBERALISMO (ASPECTO GERAL)
É uma doutrina político-econômica que surge, em sua essência, da vontade de limitação do Estado para a consequente ascensão da liberdade individual, dos direitos individuais, da igualdade perante a lei, da proteção à propriedade privada e do livre comércio. Essa vontade era intimamente ligada às lutas da burguesia na Inglaterra do século XIII e é, por isso, que, por muitas vezes, o liberalismo foi e ainda é facilmente associado a essa classe social.
 Para o liberalismo, portanto, o Estado Mínimo é necessário para que se possa garantir as pautas defendidas, que são variadas, conforme indicadas acima. Outrossim, o mercado é considerado o grande provedor e regulador da sociedade na percepção dos liberais.
Nesta perspectiva, o liberalismo não pode ser entendido como um corpo de ideias descoladas da realidade, mas sim como uma ideologia da sociedade burguesa, fruto das ações concretas dos homens. O liberalismo é um conjunto de ideias que têm a finalidade de assegurar a liberdade individual e a propriedade privada. Estas ideias filosóficas foram geradas a partir do surgimento de uma nova sociedade econômica no final da Idade Média: a sociedade capitalista. 
Chauí (2000), ao situar o liberalismo em alguns países, afirma que o mesmo se consolidou em 1668 na Inglaterra, com a Revolução Gloriosa e no restante da Europa só após a Revolução Francesa, em 1789. Já nos Estados Unidos, foi com a luta pela Independência, em 1776. 
Os princípios fundamentais do liberalismo podem ser sintetizados em: Liberdade, Tolerância, Defesa da Propriedade Privada, Limitação do poder e Individualismo, de modo a atender às necessidades de uma classe que passou a se constituir como tal nos fins da Idade Média, a burguesia. 
Como afirma Bobbio et al. (1997), a liberdade apregoada pelos liberais tem algo de unívoco, a defesa de que o Estado limite a liberdade natural ou o espaço de arbítrio de cada indivíduo. A tolerância é outro princípio do liberalismo, que se caracteriza pela ideia de liberdade religiosa e toma corpo a partir da Reforma Protestante, que libertou os homens dos laços religiosos. 
A limitação do poder também é uma tônica do pensamento liberal, que se opõe ao princípio de liberdade do Estado, e defende o poder reduzido a um mero procedimento político e jurídico. 
O princípio do individualismo também se faz presente no pensamento dos liberais, conceituado segundo o Dicionário de Ciências Sociais (1987, p. 689):
Como uma teoria política que enfatizando os direitos da propriedade como condição necessária à liberdade, procura delimitar os poderes governamentais no desenvolvimento dos processos social e econômico. Também é entendido como crença de que o indivíduo é um fim em si próprio e, como tal, deve compreender seu ego e cultivar seu próprio julgamento, apesar das pressões sociais no sentido da conformidade. 
 
De acordo com Laski (1973), o centro criador do pensamento liberal, no século XVIII, é a França. A Revolução Francesa de 1789 tinha por princípios uma Constituição que destruísse os decretos e privilégios arbitrários, o controle do sistema tributário por intermédio de representantes, a liberdade civil e política e a emancipação da agricultura e do comércio. 
5 LIBERALISMO ECONÔMICO – ADAM SMITH
O liberalismo econômico opõe-se inicialmente à intervenção do poder do rei nos negócios, que se exerciam por meio de procedimentos típicos da economia mercantilista, tais como a concessão de monopólios e privilégios. A economia liberal consolidou-se com o escocês Adam Smith (1723-1790) e o inglês David Ricardo (1772-1823), que defendiam a propriedade privada dos meios de produção e a economia de mercado baseada na livre iniciativa e competição.
Adam Smith (1723-1790), representante do chamado Liberalismo Econômico, partia do princípio de que cada homem é adequado a julgar suas ações, defendia que eles têm propensão natural para a troca e ainda acredita que o papel do Estado é o de proteger as atividades espontâneas dos indivíduos. Ele sustenta a tese de que, em uma sociedade bem dirigida, a riqueza universal chega até às camadas baixas da população. Adam Smith discutiu a divisão do trabalho, porque o contexto no qual estava inserido permitia-lhe falar de um trabalho socialmente dividido, baseado no contrato de patrão e empregado. 
Essa divisão do trabalho, da qual derivam tantas vantagens, não é, em sua origem, o efeito de uma sabedoria humana qualquer que preveria e visaria a esta riqueza geral à qual dá origem. Ela é a consequência necessária, embora muita lenta e gradual, de uma certa tendência ou propensão existente na natureza humana que não tem em vista essa utilidade extensa, ou seja: a propensão a intercambiar, permutar ou trocar uma coisa pela outra (SMITH, 1996, p. 73).
Essa propensão natural para a troca, segundo ele, permitiria trocar o excedente do seu próprio trabalho e estimularia as pessoas ase dedicarem a uma ocupação específica e a cultivar o talento. Sobre esta questão, Adam Smith (1996, p. 75) explica que:
Na realidade, a diferença de talentos naturais em pessoas diferentes é muito menos do que pensamos; a grande diferença de habilidade que distingue entre si as pessoas de diferentes profissões, quando chegam à maturidade, em muitos casos não é tanto a causa, mas antes o efeito da divisão do trabalho.
Quanto ao Liberalismo Econômico, que se opõe à intervenção política nos negócios, os primeiros a se insurgirem contra o controle da economia foram os fisiocratas, cujo lema era “laissez faire”. Sob este lema, não há lugar para a ação econômica do Estado, que deve somente garantir a livre-concorrência entre as empresas e o direito à propriedade privada quando esta for ameaçada.
Em sua principal obra, A riqueza das nações,Smith defende a ideia de que a economia de mercado funciona melhor quando não depende da interferência do governo. 
“A liberdade no mercado significa liberdade de escolha: que as empresas possam escolher que produtos fabricar; que os trabalhadores possam escolher para quem trabalhar; e que os consumidores possam escolher que produtos ou serviços consumir” (HEYWOOD, 2010, p. 60).
Com base na ideia de livre mercado, o liberalismo econômico acredita que o mercado e o próprio sistema criariam suas regras de funcionamento e, por isso, defendem a ideia de um Estado mínimo, que não fizesse qualquer intervenção no mercado e na economia. De certo modo, acreditam que as leis econômicas e financeiras são como as da física ou da matemática: elas têm certa ordem e são autorreguladoras, de modo que se bastam para repor no seu devido lugar qualquer desorganização momentânea da economia, e isto sem a intervenção do Estado. O próprio mercado era o grande regulador de tudo, e por isso não há a necessidade de intervenção do Estado. A livre concorrência entre os produtores e o poder de organização da iniciativa privada devem agir, portanto, livremente.
No Estado liberal típico dos países capitalistas centrais o que se esperava, de acordo com a ideologia econômica preponderante, era um Estado que devia ser mínimo, apenas intervindo na vida social e no mercado para assegurar as condições estritamente necessárias para que a sociedade e a economia atuassem por si sós (COELHO, 2006, p. 180)
Podemos apontar como sendo algumas das principais características do liberalismo econômico: o individualismo; a ideia de livre mercado (liberdade econômica); um governo limitado (participação mínima do Estado nas questões econômicas da nação); e, acrescente a isso, a defesa da propriedade privada.
Observa-se assim que, de modo geral, a ideia central do liberalismo econômico é a defesa da liberdade de ação produtiva e, por conseguinte, a emancipação da economia. Com raízes nas ideias liberais defendidas pelos fisiocratas, o liberalismo econômico surge na Europa e na América no final do Séc. XVIII associado ao liberalismo político nascido nas Revoluções Americana e Francesa. Segundo o liberalismo econômico, devem ser priorizadas a liberdade de iniciativa econômica, a livre circulação da riqueza, a valorização do trabalho humano e a economia de mercado (defesa da livre concorrência, do livre cambismo e da lei da procura e da oferta como mecanismo de regulação do mercado), opondo-se assim ao intervencionismo do Estado e à adoção de medidas restritivas e protecionistas defendidas pelo mercantilismo.
6 LIBERALISMO POLÍTICO E ÉTICO
O Liberalismo Político obteve maior destaque no século XVIII quando o desgaste do poder real tornou-se evidente e, consequentemente, o absolutismo começou a entrar em decadência. A ideologia de tal remete ao fato de que o homem tem direito à liberdade, felicidade e, principalmente, à vida, sem que o Estado possa intervir contrariando tais direitos, ou seja, o Estado deve garantir a segurança dos indivíduos sem intervir na sua liberdade.
Esse termo surgiu em 1776 na obra O senso comum de Thomas Paine, na qual o mesmo afirma que “o Estado é um mal necessário”. Nessa obra, Paine também menciona que o policiamento e o poder judiciário são garantidores da liberdade individual, por mais que possam também ameaçá-la. 
Durante o iluminismo, os poderes dos reis foram se desgastando e, em contraposição ao poder absoluto, os liberalistas limitaram o poder do Estado, assim como favoreceram, teoricamente, o indivíduo e suas características individuais. 
Pode-se perceber, então, que, através do Liberalismo Político, os poderes e funções do Estado são moderados pelas normas e pelas leis (princípio do Estado Mínimo), entretanto, os ideais do liberalismo podem variar em cada país, pois é um conceito mutável e relativo ao meio no qual se está inserido. 
Relacionado ao Estado liberalista, o conceito de Estado Mínimo significa que o governo não pode atuar em todos os âmbitos da vida particular e social do indivíduo (liberdade individual, igualdade de raça, gênero, religiosa e a liberdade de imprensa, cultural e de concorrência). Em razão desse conjunto de direitos que não são alcançados pelo Estado, o mesmo seria limitado pelo plano legal (normas e regras que limitam o poder e evitam seu abuso).
Os princípios deste garantem ao cidadão a transparência do governo, os direitos individuais e civis (através do livre consentimento dos cidadãos) e a igualdade de direitos e deveres para todos. Com isso, tentou-se criar uma teoria que conciliasse a liberdade dos cidadãos com a manutenção política. Um de seus princípios afirmava que a propriedade deveria ser garantida pelo trabalho do indivíduo, o que mais tarde tornou-se um dos princípios do capitalismo liberal. Mas quase que concomitantemente com o surgimento do liberalismo, no século XIX, ocorre também a Revolução Industrial, que iria mudar drasticamente a forma com que se lidava com a moeda. Este fato será decisivo no pensamento democrático do ocidente daí em diante.
As principais características do Liberalismo Político são: defesa das liberdades e dos direitos individuais, da igualdade de todos os cidadãos perante a lei, da soberania nacional (o povo elege seu representante), da divisão dos três poderes, da liberdade de imprensa e religiosa, bem como da elaboração de uma constituição que preze os direitos de todos os cidadãos.
John Locke foi um dos principais pensadores de tal doutrina, pois criticou a teoria do direito divino (na qual os reis recebiam uma benção para governar a sociedade). Segundo ele, a soberania não deveria pertencer ao Estado (que deveria manter sua supremacia, porém obedecendo às leis civis e naturais), mas à população. 
Caracterizou-se principalmente por contrariar o autoritarismo em todos os níveis: individual, político e até mesmo o religioso. Acreditava que a razão deveria ser utilizada para se defender a verdade e a legitimidade das instituições sociais. Ao apoiar a separação entra a igreja e o Estado e a liberdade religiosa, recebeu grande oposição da Igreja Católica. 
Defendeu assim como Montesquieu a tripartição de poderes, considerando, porém, que o legislativo, por representar o povo, deveria ser mais forte, deixando então, os outros dois poderes subordinados a esse, fato que contrapôs Montesquieu que afirmava que os três poderes deveriam estar em equilíbrio.
Infere-se então que os objetivos dos filósofos do Liberalismo Político eram reduzir o poder do Estado, garantir o individualismo dos cidadãos e a soberania do poder do povo perante o poder do Estado.
O Liberalismo Ético, por sua vez, tem como principal doutrina a valorização do indivíduo e da sua liberdade (negativa e positiva). O Estado Moderno deve se basear em práticas éticas que possuam princípios dos Direitos Humanos aplicados na sociedade. As características únicas individuais dos cidadãos devem ser respeitadas pelo Estado e pela sociedade.
O reconhecimento ao mérito é de fundamental importância para tal modelo de organização da comunidade, pois a posição social de cada pessoa seria definida através de seu esforço e de seu trabalho para ascender socialmente, uma vez que, teoricamente, a igualdade social permitiria que todos possuíssem iguais oportunidades, e o que diferenciaria a qualidade dos indivíduos seria o esforço aplicado por eles na busca de seus objetivos.
Teoricamente, o liberalismo beneficiaria amplamente a sociedade, entretanto o liberalismo criou uma grande diferença social entre os países. Os Estados Unidos da América fortaleceram sua burguesia e cresceram mundialmente (até o período da Segunda Guerra e mantêm-se até então) utilizando sua influência política e econômica para explorar outros países (europeus, asiáticos e até mesmo, americanos).
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mediante ao que foi evidenciado no presente artigo, torna-se exposto o cenário de ruptura que deu origem ao surgimento do Liberalismo e suas diversas acepções. Portanto, o sistemaLiberal assume uma função de fundadora da ideologia da sociedade capitalista, ou burguesa.
A base do capitalismo é a economia livre, desvinculada do mercado, pautada, sobretudo, na livre concorrência, que tende a proporcionar o equilíbrio dos preços e provocar o aperfeiçoamento dos produtos ofertados, visando um destaque do contexto mercantil. Entretanto, esse sistema político-econômico apresenta suas desvantagens no que se refere à questão da acumulação dos bens e, consequentemente, a uma má distribuição de renda, devido ao fator da riqueza estar acumulada no domínio daqueles que detêm os meios de produção, gerando uma forma de poder paralelo às influências instituídas.
Em vista disso, o Liberalismo e o Capitalismo denotam conceitos diferentes, mas não excludentes e, sim complementares. Devido, o capitalismo definir-se como um sistema político-econômico e o liberalismo encaixar-se em uma concepção de doutrinas que irão assegurar seu exercício e a defesa de seus princípios. Logo, de forma evidente, fica expresso como as mudanças na conjuntura do Medievo, assim como as Revoluções Liberais, somadas com as disseminações dos ideários liberais puderam influenciar e repercutir na instalação da forma de organização presente no panorama contemporâneo.
REFERÊNCIAS
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