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e ________________________ __ ..> ::::::::====-::-.. -- Eate livro foi editado em conrinio com I UNIVERSIDADE GAMA FILHO FACULDADES INTEGRADAS EsrAclO DE sA • ,,- Iml ADMINISTRAÇÃO - ELEMENTOS DE ADMINISTRAÇÃO Walter Gaspar Filho e Jovelino G. Pires 296 págs. - 2ª Ed . - Brochura _ - ELEMENTOS DE ADMINISTRAÇAO DE PESSOAL Belmiro Siqueira 220 págs. - 3ª Ed. - Brochura - INTRODUÇÃO À ADMINISTRAÇÃO Jovelino G. Pires e Diana F. Menezes 144 págs. - Brochura - INTRODU ÇÃO AO COMPUTADOR Arcadio Joaquim Vieira Filho - MARKETlNG NA EMPRESA PRIVADA Virgilino B. Andrade 152 págs . - Brochura - O ANALISTA DE O & M Reinaldo Pereira Lei te Jr. - O MODELO PERT/CPM APLICADO A PROJETOS Zigmundo Salomão Cukierman 250 págs. - 2ª Ed. - Brochura IAlI ARTES - HISTORIA DAS ARTES Carlos Cavalcanti 358 págs. - 3ª Ed . - Encadernado I:DI COMUNICAÇÃO - DICIONÁRIO DE TELECOMUNICAÇÕES João Victório Pareto Neto - RELAÇÕES PÚBLICAS (FUNDA MENTOS ELE· GISLAÇÃO) Marcos Fernando Evangelista 180 págs. - 2ª Ed. - Brochura Aumente, qualifique e complete sua biblioteca , com uma vantagem : Você não precisa sair de casa. Peça pelo Reembolso Postal. CARLOS CAVALCANTI COMO ENTENDER A PINTURA MODERNA 5<! edição ~ ARTES ~ Editora Rio © Copyright by CARLOS CA VALCANTI Capa : Lay-out da Editora Rio Gravura: O Cristo de São João da Cruz, de Salvador Dali (I 904) Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida, sejam quais forem os meios empregados (mimeografia, xerox, da ti/agrafia, gravação, reprodução em disco ou fita), sem a permissão por escrito da Editora. Aos in[ralores se aplicam as sanções previstas nos artigos 122e no da Lei 5. 988 de 14 de dezembro de 1973. Todos os direitos desta edição reservados à EDITORA RIO - Sociedade Cultural LIda. Rua Dona Cecnia, 25 - Tels.: 273-2793 e 273-2743 FICHA CATALOGRÁFICA (Preparada pela Biblioteca Central das Faculdades Integradas Estácio de Sá) Cavalcanti, Carlos 1909-1974. C376 Como entender a pintura modema. S. ed. Rio de Janeiro, 5 ed. Ed. Rio 1981. 224 P ilus!. 23 cm. Bibliografia. I . Pintura moderna. 2. Pintura-História. I. Título. 1 8~ COO 759.06 Indice para o Catálogo Sistemático I. Pintura moderna 759.06 2. Pintura-História 759 Sobre o Autor CARLOS CAVALCANTI , (oubado às lelras pàtrias em 1974 desempenhou as seguintes funções: Professor de História do Arte, por concurso, do Instituto de Belof-Artes do Guanabara (1950) . Membro do júri do Salão Nocional de Arte Moderno (1961 e 1965) e de outros salões oficiais e particulares. Membro do Asso· ciação Internacional de Criticas de Arte, Seção Brasileiro. Membro do Con~ selho de Artes Plóstlcos do Museu do Imagem e do Som, Rio de JaneIro. Antigo membro do Conselho Técnico do Museu Nocional de Belol·Artes, Rio de Janeiro. As.sessor de Artes Plóstlcas do antigo Conselho Nocional de Cultu. ro, otual Conselho federal de Cultura. Chefe do Seçõo de Artes Plóstlcas do Olcion6rio Oelta·Larous.se (1967) Conservador de Museu, por concurso, do MinIstério do Educação e Cultura (19.40) . Membro do As.socloçõo Brasileiro de Museologistas, Rio de Janeiro. Coordenador do Olcionório Brasileiro .se Artistas Plóstlcos em elaboração pelo Instituto NocIonal do Livro. Membro do Soc::iedade Brosllelra de Belas·Artes, Rio de Janeiro. Prêmio de Crftlca de Artes, do Assoc iação Brasileiro de Crltlcos de Arte, em 1972. Exer~~u ~inda as seguintes atividades na Televisão e no Rádio: Primeiros cursos no pors através do ródla e do televisão sobre artes plóstlcas - A ''''turo Medem., Universidade de Cultura. Popular, TV Con· tlnentol, Rio de Janeiro (1963) e Aprende. Ver a Pintura, UniversIdade de Cultura Popular, TV Tupl, Ria de Janeiro (1969). Produtor de programas sobre Artes Plóstlcos poro o TV Educativo do Ministério da Educação e Cultura (1972) . OBRAS DO AUTOR En.aios Sobre Arte/Pongetti, 1955 História das Artes/Civilização Brasileira , 1970 Os Mistérios da Pintura Moderna/Universidade de Cultura Popular, TV Continental, GB, 1963 Aprenda a Ver a Pintura Moderna Idiafilmes e textos) /INCE, 1965 Arte e Sociedade/ MEC - Serviço de Documentação; 1966 Conheça os Estilos de Pintura/Civilização Brasileira , 1967 Aprenda a Ver Pintura/Universidade de Cultura Popular, TV Tupi, GB, 1969 História da Pintura/ MEC, TV Educativa, GB, 1972 Pequena História da Pintura/SENAC, 1973 II III IV lNDICE o alijar explica o livro ... . . . • . ... .. . .. '.' . . ..•. No/a à 3' Edição ............. . •... . ........ . • . Da pré-HiJtória dO RealiJmo .......... ... . . .... . A pintura egípcia, 21. A pintura g rega, 22. A pintura romana , 23. A primitiva pintur.a cristã, 23. Bizantinos e românicos, 24. A pintura gótica, 2~L A pintura ren'as· cer.tista, 26. A pintura barroca, 27 . O Academismo. 28. A pintura rococó, 29. O Neoclassicismo, 30. A pintura romântica , 31 " Os reali sta s, 32. A neceJJidade humana de expreuão artística - Arle e Sociedade ............. .. ............. ' .7 ~' •• •• 11 17 19 35 v - Forma e Con/elído .... . ...... . . .. ... . . . . .. . .... 51 VI - Plasticidade e I1I1Jlfafão - O valor Jtlper-hiJlórico da Arle .............................. . .. . .... 57 VII A deformação ....... . . • . • . ...• .• . .... . . • . . . . . . 67 VIII O lmpreJSionistIJo ......... . ... . . . . . . . . . . . . . . . . . 71 Comparações entre neoclássicos, românticos, rea listas e im- pressionistas, 73 . Como trabal ha uQl neoclássico, 74 . Como traba lha um romântico, n . Como traba lha um rea lista, 76. Como trabalha um impressionista, 77. A natureza cientifica do Impre~s ioni smo, SO. Os prin-dpios da pintura imp(.es· sionista, -SI . C'lCactcdst icas ge rais do Impressionismo, S9. Os pintores impressionistas, 91. IX - Cézanne e a reafão ao· ltnpreSJiol1iJmo ..... . ....... 101 X XI XII XIII XIV A visão plástica do mundo r 102. Simplificação das formas. 103 . A cor de Cézanne, 104 . A origem do cubismo, IO~L Vali Go/!,h ... . .......................... . .... . Gaflglún ......... . ...•......• . • . . .... .. .•. .. .. O Expressionismo . . ...•.• . •. . . . .•...•......•... FoviJ1nO . ... .. . . . . .. . ....... • : ............ _ .. . O C"bismo . . ...... . .. . . .. ... . .... . . . ........ . O Cubismo analitico, 130 . O Cubismo sintético. 131. Le- tras e «collages», 132 . Infl uência do Cubismo, 133 . 107 111 115 121 127 XV - O Fil/lirismo ... . .. . . . . .. ...... .. ........ .. .... 135 A expressão da velocidade, 136. As linhas de forç·a, 137. Signifiração do Futurismo, 13R. " XVI - O AbJlracionismo .......... .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139 o Abstracionismo no passado, 139. As pesquisas de Kan- dinsky, 141 . Explicações do apa recimento d!l Abstracionis· mo, 145. As artes, a ciência e a técnic.a, 147. Nova inter. pretação do Universo. 148. XVII - IngéntloJ e PrimillVOJ . . .... ...... . ,. . ....... ... 151 Os Primitivos. 1)2 . Arte negra, l H XVIII - AJ letUléncia.r abJlralaJ . ....... . ............. . .. 155 Orfismo, 156. Suprematismo, 157. Raionismo, 159. Neoo phlstidsmo ou Concretismo. 160 . XIX - O Dadaínno. O PI/rismo . A EJeola de Paris . . . . . . . . 165 Sát ira social e criação plástica, 167. Purismo, 169. Escola de Paris, 169. XX - O SI/rrealismo - O Taehismo - O Grafismo .. . . . . 173 O manifesto surceal ista, 174 . A poesia surreali sta. 175. A pintura surrea li sta, 176. Os dois Surrealismos, 178. O Tachismo, 179 . O Grafismo, 180. XXI - A Pop.Arle .. . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 183 Realistas, impression istas e cubistas, 183. A influência da. daIsta, 184. A denominação, 185. O sign ificado da Pop, 185. Imagem da sociedade de consumo, 186. Novas fontes de belez-a, 186 . Mini-história da Pop, 187. XXII - A Op-Arle ... . .............. . .. . . . . . . . . . . . . . . 189 Razão e sentimento, 189 . Expression ismo e Construtivi smo, 190. Arte da sociedade de massa, 190 . A peça única, 19l. A Op-Arte ou Arte Cinética, 192. As unidades plásticas, 192. As imagens profundas e o folclore planetário, 193 . A arte da sociedade do futuro, 194 . Os múltiplos, 194. As técnicas tradiciona is, 195. Reprodução e recriação, 195. XXIII - A pillltlra moderna 110 BraJil . ............. . ... . . . 197 A Missão Francesa de 1816, 198 . As tradições acadêmicas, 199. Eliseu Viscont i, 200. Out ros Modernos, 201. A Se- mana da Arte Moderna, 203 . Portinari, 205. A evolução dã. pintura moderna brasileira, 207. A inautenticidade ar- tistica, 209. Alguns , modernos, 210. XXIV Conclflsão . ...... ; .......... . ...•.••. .. . . . • ... Bibliografia smnária . ..... •. . . .•. . . ...•.. . .. . . . 213 219 Para Julieta APrenda qllem não sOllqer, emende e acres- cente qllem sotlber e lodos dêem graças ao Senhor. PHBUPPE NUNES Tratado de Pintura, Simetria e Perspectiva. Lisboa, 1767. NOTA DA EDITORA A EDITORA RIO, que zela por seu trabalho caracterizado pela bicromia, abre exceção para a obra do falecido CARLOS CAVALCANTI, pois o valor artfstico desta merece um parênteses em sua linha editorial. o Autor Explica o Livro Quando se fala de Pit1lura M oderna, mesmo entre pessoas semí- veis, i11teligenles e apetrechddas de algtlma! lei/llrM, ouve-se geralmente esta frase: - "Gosto, mas não entendo/II - 011 Jllmár!a condel1ação: - tlNão entendo/" Não faz mllilo, 1111ma, expoJição escolar de arle, encontre; conhe- cido jorna/iI/a e eICritor, alllor de livros de hiJlória, com tinlfIYaJ socio- lógicas, relativamente bem vendidos. Ellava dianle de lI111a composifão abstraIa geométrica. Voltoll-se indignado para mim: - Pode-se comparar eI/a bobagem com o ri Rapto das Sabbla.I", de David, verdadeira obra-prima? Isto, até ell faço! Depois, em face de 01llro qllaaro, este com as figllras e aI árvoreJ baJtan/es deformadaJ: . - Olllro dia, CarloI, "fiqllei sabendo haver iido Van Gogh quem começou a fazer mOitrengoi 11a pintllra, Ollvindo esta hereJia, capaz de lançar ao chão, eitorcendo-u de raiva, 11m eiteta moderno, achei melhor ficar calado, Não redtiziria com fa. cilidade aqllela erlldição, iolidamente entaipada de preconceitoi, aOi atuaiJ sig1Jificados da arte, na H/a inceuante e harmoniosa evolllção atra1JéJ ilos tempos . Qualqller 11m de nós, medianamente intereuado nos problemas ar- , tíJlicos, poderá contar casos e dar depoimelltos sobre o verdadeiro mar- ginalismo social em qlle vivem, nesta e em olltras terras civilizadas, as artes plásticas em geral, particlllarmente a pintllra e a escllltllra, 11as IlIas novas formas técnicas e expressivas , Nmn país como ° nosso, milito vasqlleiro em escolas primárias, quanto mais em educação e' vlllgarização artísticas, esse antagonismo entre ° grande príblico e as novas formas de arte assllme, mlliJas vezes, aspectoJ ",riosos, Nllns CllrsOJ públicos qlle andei dando, precisamente sobre pintllra modema, enc011trei criaturaJ de semibilidade e inteligê11Cia, qlle me diueram estavam ali na esperança de qlte o profeJIor lhes abrisse uma janela, mn basclllante, lima frj,lcha fjlle fOfse, à compreemão das beleza- :iessa nova pintllra e, sobretlldo, 12 COMO ENTENDER A PINTURA MODERNA das razões misteriosas dessas impenetráveis belezas. Gostavam de a/gll- mas tendências, porque são decorativas, especialmente para 01 apartamen- tos modernos, q/le têm cada parede de lima COf, o leto e o chão de GII/ras, móveis geometrizadrJJ e auimétricoJ, porém, não tU entendiam. Eram mil/érios bonitos . Dfllras pesIoas, honestas consigo mesmas, confessaram-me ter amigoI admiradores e defensores exaltados da pin/llt'd moderna. Tlldo fizeram por onde senti,. ti mesma admiração e, . diante de !/ICeUiVOI fracassoI, sen- tiram-se dominadas POl' verdadeiro complexo de inferioridade inleJectllaJ. Pertmle si próprias, c011Jideravam-se - com devida licença peja .má pa- lavra - burras . Ainda alllras, ao q/le as aparê1/Cias indicavam, fhÍgiam gostar, por- que lhes parecia chique ou sinal de . personalidade entender de phltura moderna, Falavam, porém, sobretudo dos altos prefos alcanfados por obras de artistas 'lacionais e estrangeiros, Pa11CeJti, Van Gogh, Picasso, ou de {piamo Portinari, ainda vivo na época, estava pedindo por um retrato. 'São commlJ, são a maioria, em todas as camadas, m'esmo naquelas consideradas instruídas, esses casos de pessoas inteligentes e sem/veis, bas- tante lidas, que se mostram, quando não indignadas, pelo menos perple- xas, com as formas que a pilltm'a está assumindo na atualidade. Todos sabemos que as inovações, em qllaisquer das atividades hll- manas, especialmente nas artes, área das intimidades proflmdas e deli- cadas do sentimento, clIStam a vencer a! "t'e.Iistências oritmda.r da tradição e da inércia . Na pintura moderna; 1Jwitas de !uar tendênCias, embora. velha! de quase mil séwlo • como o Impressionismo e Cézanne, ainda não obtiveram reconhecimento Un4"ime do grande plíblico, ienão de certas minoria!, qlle podem ser considerada! fealmente aristocráticas pela sen- Jibilidade . Esse verdadeiro marginalismo social da pintura contemporânea, trans- formada em arte de ricos e de intelectualizados, asslmto obrigat6rio do jornalismo mllndano e privilégio de POIlCOS, nllma éPOC4 de intemiva e ráPida. socializafão da cultllra, decorre de várias callsas, longas de deblllhar nestas linhas de introdllfão. Entre outras, como tem sido acentllado por mais de 11m estudioso, decorre do sell caráte,. !imbólico, com a progressiva mbstitllifão da imagem vimal, facilmente inteligível e comlmicável, por símbolos e signos, geralmente pessoais, portanto herméticos ou incomu- nicáveis, Mas agrava-se, também, com o caráter igllalmente ininteligíve( de ma crítica. . Qi críticos da pintura moderna IIJam geralmente linguagem P OIlCO aeeulvel ao grande p1íblieo . UIam lerminologia própria do ofício e dos "ale- lieres", com metáforaI e palavras técnicas, verdadeiras charadas para o leitor o l utor explie. o livro 13 comum não iniciado. Escrevem 1I11S para os olltros· 011 para os artistas. Rt;Zramente Je lembram da maioria dos mortais, ávida de objetividade e didatismo} nessas coisas intrigantei da pintllra moderna . De sorte qlle} saindo dos mistérios da pintura} o homem de todos os dias cai tIOS mis- lérios da crítica. Esta lhe parece Ião misleriosa e incompreensível qllanlo aqllela. PerPlexo com o pintor} 'pe,'plexo continllará com o crítico. Eua aJlSênc;a de didatismo na crítica da pint1lra moderna não Je verifica apenas em 110SS0 país, Possuímos críticos bem i'lfo,rtnados e Jrí- cidos . S6 pão cito tlOmes para não cometer esq1lecimentos injustos. Ve- rifica-" por Ioda a pal'le , Não faz muito tempo, a revista de arte f rtfl1cesa Aujourd'hui oClIpa- va-se do assunto, Transcrevell trechos de crítica} algllns assinados por nomes conhecidos in/erndcionalmente} 01 . quâis exigiam bola de cristal para que lhes adivinhássemos o sentido, A revista pedia tntlito sensata- mentemai! objetividade e clareza} em benefício dos leitores e de maior receptividade das novaS expressõef da p;'lt/lt'a . JIIstamente para evi/al' esse mal e desejando escrever para o plíblico em geral interessado por pitltl"a} procurei coúservar neste livro a orien- tação didática das palestras qlle o compõem, prommciadas em diferentes oportlmidades para allditórios diferentes. Fugi o mais pouível à termi· nologia consagrada entre artis/as e especialis/as, PrQcurei apresentar os problemas da phlt"ra, expressivos e técnicos, 110 passado e '10 presente, da maneira mais .objetiva e acessível, mesmo ar pessoas pOIlCO familia- rizadas "com o assllnto . Não me pareceu aconselhável iniciar a hist6ria da pintllra moderna com a pr6pria pint1lra modema. A mptllra entre o pauado e o presente parece mlli/o violenta e slíbita} qllando 1111 veldade se processoll grada- tivamente . Seria alimentar talvez certas perPlexidades, não s6 pela com- Plexa variedade das tendências a/llais, qlle militas vezes se misturam, tor- nando-se coulllSas e outras vezes são antagôn;cas, como também porqlle" mlljtas representam l1a/llral evoltlção de outras no paIJado . Por euas razões de ordem didática} preferi vir rapidamente do começo} mais com os latos} menos com as pala"vras, DeIJe modo, o primeiro ca- pítlllo abrangerá sumária evolllção da pil1/IIrtll desde os tempos pré-his- tÓ1'icos ao Realismo} em 1855 , l1a P1'auça. Abrange1'á} p01'/anto, mais" de qllarenta mil anos de f OY11/t1S e cores criadas pelo homem. Realizará assim o lei/ol' rápida viagem pela evolllção da pi'I/lIra, qllan- do serão caracterizados os diferentes estilos do passado. Terá oportllm- dade de fazer observações bastan/e esclarecedoras} que certamente o aj1l- darão a compreender melho1' os problemas q1le a pintllra dos 110!JOS dias está desafiadoramente apresentando. Essas observações comtiJtlirão a ma- téria dos dois caPítulos seguintes, C01l1 estes lemas: U A ~leceJSidade hll- J 14 COMO ENTENDER A PINTURA MODERNA "mana de expre!Ião arlÍslicall , "Arle e Sociedade", flForma e COII/erido", Ir Plasticidade e ]J/I,Slfdfáoll, ((A Deformafãoll e o "Valor super.hislórico "da obra de ar/e". À primeira vis/a, eIseI lemas parecem complicado!. Na verddde, são mais simples do q/le se poua imaginar. São indiIPel1sáveis à compreensão de aspectos téc11icos e expreuivoJ da pintllra criada pelo homem moderno, explorador dos espaços interplanetárioJ. Depois de realizada a 110IJa viagem e auim mil1l1cionado~ de noções históricas e críticas, cOl1sideradm neceJsáriaJ, é que alllor e leitor entrarão 1101 caminhos da pintllra moderna propriamente dila . Retomaremos o nosso iti~lerário histórico, interrompido no Realismo, em 18.55, com o esllldo do Itllpreuiollismo, qlle aparecera em 1874. Quando SIIrgiu, o ImpreJJionistlJo desencadeou reações que hoje 110S pa,- recem perfeitamente irracionais 011 zoológicas, como está em moda dizer . DeJde militas anos, no entallto, desfeitas as incompreensões momentâ- fleas, a escola impreJJionista representa, ao lado das catedrais góticas, as duas mais a{/as e genllínas criações do gênio artístico francês. Os fat f!s levam a crer qlle sllcederá o mesmo com as tendências abslralas e deform(ldoras da pintllra contemporânea, agora repelidas por peJJoas tão consideráveis e respeitáveis como aqllelas qlle nos idos de 1874, 110S blllevares, salões e redaçõeJ parisiemes, pediam hosPício para Monet, Renoir e Degas, ar/istar qlle agora parecem Inllilo ajltizaaos às exigências da sensibilidade c011temporânea . Depois do ltnpressi01JiStnO, veremos a reação qlle lhe fora oposta por Palll Céza/me (1839-1 906), i"l/amen/e (onliderado o pai da pin/llra moderna e hoje glória Imiversal, embora reprovado por incapacidade ar- tística no veslibll/ar da Esco/a de Be/as Artes (Paris), com grande alegria do pai, qlle o sonhava gerente do banco da família , Em segllida, exami- naremOI doiI ar/iI/aI rebeldel e loli/áriol, Vill("'/ Vali Gogh (1853-1890) e Palll Gallgllin (1848-1903). Nas obras desses artistas, todos praticamente alltodidatas - Cézanne, Vali Gogh e Gallgllifl - qlle reagiram cada UtlJ a sell modo ao Impres- sionismo, ainda iúf/llenciadps por e/e, estão as seme1ites das trê! primeiras grandes tendências do qlle se convencionoll denominar Pintura M oderna: O Expre1JioniImo (Vali Gogh), o FoviImo (Gallgllill ) , e o ClIbiImo (Cézanne) . Estlldadas essas "'ês primeiras tendências, qlle surgiram '11OS princí- Pios do séwlo, passaremos a estlldar as demais que foram aparecem/o, desde o Fllturismo, em 1909, ao Expressi01JiStlJO Abitrato dos nOJJOS dias, ;llnlamente com fi 1'inlllra Inural e o 1/S0 de novos materiais e 110Vas técnicas de pintar , o autor explica o livro 15 Como alltor, tenho esperanças de qlle este mal1l1aJ alcance os seus objeiivos - mostrar a alltentlcidade da pintllra modema, por mais hlSó· li/as 011 absllrdas qlle pareçam algllmas de SI/as tendências e, ao mesmo tempo, torná-Ias compree1lsíveis ao plíblico interessado, Trata-se de, sim- pJes compê1ldio de i1lformações históricas e críticas, capazes de servir de i1liciação àJ pessoas qlle, como Leonardo da Vinci, também c01lsideram ° oJhar, ° ,'ei dos sentidos, e a pintllra, a rainha das artes, Nota à 3~ edição QllrliC poderid repelir fi 110/fI ti 2' edição. Fazendo charme de mo- deiloi, certo! flN/orei COi/llmflm geralmente e/ogial' lII(iJ flo ,/al ediçõei, f/lle (0111idera1Jl Jempre me/boJ'ei do 1"e r1J ip'aJ1l/dflsJ Jobretlldo fjllt111do tr,lb(rlbos didátiros, COl1l0 1les/e caso, CbtlJJltllll fi obra de lil'rinbo e eXtlg.fll'flll; os flgrtideÓmelll 0i dOi ctlros (' benel/olen/es lei/ores, Não lenbo ' l1Miores ali me110J'CJ e/agias a estrl l :' l'rcirtl ediçÍlo , Apclltls (/ informação de 1"e tlrrCJccn/ei dois capít,dosJ / 1 PolI-Ar/(' (! A Op-Arlc_. (ilém dOi 1J1CIIJ agl'fldeúmelltoJ aos ((/I'f)J e bC'IICI'IJ/clllei lei/orC!. o A II/or, Da Pré-Hist6ria ao Realismo o HOMEM COMnçou A DJiSENHAR, PINTAR E PRATICAR OUTRAS ARTES, canto, dança, música, ainda, nas cavernas da Pré.Hisfória, assim que se desprendeu da pura animalidade. Desde os bancos ginasiais, sabemos dividir·se a Pié·Hist6ria em d~as grandes idades - a Idade da Pedra Lascada ou Paleolítica e a Idade da Pedra Polida ou Neolítica. Essas idades são calculadas em dezenas de milhares de anos. ' Não se sabe ao certo. "Tudo nos primeiros cami· nhos do homem acaba se evaporando em 'conjeturas e suposições. Conforme também sabemos, a Idade 'da Pedra Lascada ou Paleolítica divide·se em dois longos períodos - o Pa[eoHtico Inferior e o Paleolítico Superior, um bas'tante recuado no tempo, outro mãis aproximado. :a so- mente no Paleolítico Superior, distanciado uns cinqüenta mil anos da era histórica, que se encontram mais numerosos vestígios de manifestações artísticas, expressas de modos diversos, mas, para o nosso caso, na deco .. ra,:io das paredes das cavernas que serviam de habitaçã'o, refúgio ou san· tuário ao homem . Essa primeira pintura aparecida na face da terra era executada por nômades caçadores e pescadores " representava quase excluo sivamente animais comestiveis. Fazia-se rudimentarmente com substâncias minerais dissolvidas em água, gorduras animais ou vegetais e aplicadas com as mãos ou arremedos de pincéis, soprados por meio de canudos, quando não com· bastonetes. Era, também, figurativa e realista. Dí7JSe figuratívo' do pintor que representa as imagens visuais do mundo exterior, as formas c as cores como se mostram ao olhar . Seríamos um pintor figurativo se ao desenhar c pintar um homem o fjzéss~ríloS confurme nossa percepção ou sensação visual imt:diata - . cabeça, olhos, tronco, membros - reproduzindo objetivamente a forma dessas partes do corpo. Poderiamos alterá.[as de certa feição pessoal, modificá·[as ou defor. má.las um pouco,· mas, guardaríamos, em última análise, a impressão visual, a transcrição --da sensação"ótica diret. d. imagem humana. 'Se representarmos • imagem humana, não com exatidão ou fidelidade foto. 20 COMO Er-<TENOER' A. I"IN'TUjlA MG9ERr-<A gráfica, mas com verdade, isto é, acentuando,lhe os elementos mais cara<. tC;rísticos, que mais expressivamente a definem, seremos figurativos rea· listas. Ao representar um tigre, por exemplo, o realista procu'ra acentuar. lhe ' os traços caracterlsticos - a força elástica e a ferocidade. Diz·se abstrato ou abstracionista do pintor que se abstrai ou , recusa as imagens visuais ou as sensações óticas do mundo exterior, sul>stituindo,as por fonnas e cores, que não se relacionam com as aparEcidas exteriores e exprimem reações afetivas ou idéias e conceitos de natureza intelectual. Certo que (, figurativismo - realista; fundando·se em sensações, no coo nhecimento e interpletação do mundo à base dos sentidos, é de mais fácil comunicação, pela universidade aa experiência visual. Ao passo que se fundando não em sensações imediatas, mas em sentimentos, idéias, ou simples impulsos instintivos, traduzidos por meio de símbolos e signos, verdadeiras metáforas da realidade visual, cuja significação. muitas vezes exige prévio e mútuo acordo entre o artista e o contemplador da obra, a pintura abstrat. é, por isso mesmo, mais hermética ou de comunicação ., mais diflcil\ A esquematização geométrica ou a estilização, como geralmente se diz, das formas visuais, assim como a deformação, isto é, a sensação tea· balhada e módific.da pela interferência d~ elementos intelectuais ou senti· mentais, são fases intermediárias do figurativismo realista e do abstracio· nismo. 'Pois a pintura do homem da pedra lascada era figurativa e realista c no capítulo Arle e Sodeddde saberemos o porquê. Surpreende pela simplícidade da técnica e extraordinário poder de expressão. Em meia dÍlzi:l de traços e cores, a forma, o movimento, o carátcr do animal são c"pt.dos com verdade incomparável. Poucos artistas civilizados consegui. rito depois com recursos técnicos tão limitados iguais .efeitos expressivos, como os que se observam nas pinturas das cavernas francesas e espanholas de Montina.c·Lascaux 'e de Altamira. (Fig. 1). Os rnilênios passam como estão passando os minutos. Encontramo· ·nos, agora, na Idade da Pedra Polida ou Neolítica, depois de atravessar o Mesolítico, transição entre o lascar e o polir a pedra. O homem que aprendera a desenhar e pintar, continua desenhando e pintando, como também continua a ritmar os sons, os movimentos e as palavras, criando música, dança e canto", Mas, agora, quando aprendeu a polir a pedra e ddxou de ser excluo sivamente caçador e pescador, para tornar·se agricultor e criador, mudando de estilo de vida, mudou também de religião e de pintura. As mudanças de vida 'são, completas. Não é mais um crente nos poderes da magia, como seu antecessor paleolítico, Agora é dominado pela crença nos po· D. fré.Hilfóril 10 Realismo deres anímicos, isto é, as coisas e. os ser~ possuem uma realidade invislvel, a 3m;.. NII pintura não é mais aquele fi8'lriltivista realista da pedra las· cada, que reproduzia visualm~~ as imag<:ns da realidade, mattava a anatomia, o ·movimento, o carátl:t· dt1 aJjimal. II, agora, um geometrizador das formas, com tendências à abstração, ~tá: estilizando, fugindo às ima- gens visuais. Não está: tradlli'irÍdo s6 sensações, também sentimel)tos e idéias. (FIg. 2) Esse sentimento geométrico e decorativo, com tendências pronuncia-o .das ao abst.rato e simbólico. p<tdomina durante todo o N~lIticQ e o iDíciC). da Idade dos Metais. Constituirá o· fundamento da pintura doS primeiros povos hist6ricos . A PINTURA nGfPCIA Realmente . Quando, por exemplo, nas planfcies do Golfo Pérsico com os acádios c sumérios, ao longo do Nilo com os egípcios, ou nas ilhas do mar Egeu com os cicládicos, aparecem, naquelas partes do mundo, os primeiros povos hist6ricos, a pintura estã justamente evoluindo do geo· metrismo neolltico para novas formas de flgurativlsmo realista. Mas, dessas pinturas do amanhecer da Hist6ria, aquela de maior in- teresse e merecedora de nossa atenção é 3 egípcia . Durou de três a quatro mil anos, dentro das mesmas formas técnicas e expressivas, presididas pela lei de Frontalidade, isto é, aquela maneira peculiarmente egípcia de repre- sentar a figura humana, o rosto de perfil, c0l" o olho de frente, o tronco de frente, as pernas e os pés de perfil. (Fig. 3) () Embora figurativa, representandus imagens visuais, ILpJntura cgíp; cia em essência é abstrata".Eor ue não revela observação di reta da reali· cinGe . Não se baseia exclusivamente em sensações 6ticas mas Jgua nente, -..ru:! transer! ~ .. da rcalidage feitas "p}To sCiillãieoto, ~o religioso. No capítulo Arte e Sociedade, veremos por que os egípcios foram tão constantes e expressivos deformadores. . ~Como entre os ré.históri&os, ~m entre . eles, ..... a pjnturaJ~ra A[O_ ~er~ artes ..!.m geral, ~á..! serviço unicamente da religião, sendo,~r tanto, uma ~rte dirigi~a. Adquire, or isso,. earáter convencional, mágico Y sjmh61ico. - - . - _ 11 ~ito sintética..!lo desenho e no colorido" .1:ião utiliza o claro- I escuro, isto é, as grada ões ffitte a uz e a sombra para transmitir a ilusão ~ v~e~effi ...Y§a~s regras ~--erspCctiva~c:a; para ~~ a sensação de espaço ou.. profundidade. Dot dos.. de excepcional habilidade técnic~ imaginação artística~ do:?,...'?s "!1ípcios ~am os lrimeiros~ estilizar as f~re!... e OS _lO_· _v_en_t_or_es~. ) \ COMO· ENTENDER A HINTURA MODERNA da técnica de intura afresco._ A lliR!l1ra ~CI)J.-Wta diretamenll:Jl.a,- f'edé, ru ,""super lcie recebe revestimentos especiais de -c.r e areia , Quan- o . essés rev:~htnt9s ~in<ta estllo i1íriidõ~-~~-res s', ail~denomina.çãO italIana a re co o pmtor trabalha COm as !:intas dIssolVIdas em água , uando QS revestimentos secam, as. tintas cristalizam·se e adquirem enorme durabilidade, Di-se tambê·m ii pi..,h,Jra· afresco o nome de pintu.ra mural,. porque ê feita dlretamenl<: B0 muro ou para nele ser aplicada. A PINTURA GREGA Depois da pintura egi"pcia, deixando de lado a mesopotâmica, encon- tramos a pintura grega_ Como a própria arte grega, divide-se, histórica e estilisticrunente, em três períodos - o Arcaico, o Clássico e o Helenistico . Não restaram" porém, obras originais desses três pedodos _ Todas desapareceram, des.- truídas pelo homem ou pelo tempo_ O conhecimento da pintura da Grécia antiga se faz, port.anto, de modo indireto ou' comparativo, através de deco- rações de vasos de cerâmica, da escultura e de referências de escritores da antigiUdade _ A pintura romaria - os romanos imitaram os grego. - é outra fonte informativa . A fase arcaica conservava ainda sobrevivências geométricas do nco~ lítico. Esquemática, simples no desenho e na cor, representava os temas místicos e populares do passado das tribos e povos formadores da Grécia _ Fazia-se, sobretudo, nas decorações murais afresec nos lugares pú- blicos - mercados, pórticos, arsenais, exterior dos templos. Nas fases clássica e helen(stica, correspondentes aos séculos v e IV A . C. e aos tempos posteriores a Alexandre, perde quase por completo seu caráter mural e passa a praticar.se principalmente no quadro de cava- lete de menores dimensões, facilmente transportável, destinado não mais à contemplação coletiva, mas ao olhar de um indivíduo . Fica, por isso rltcsmo, menos sintética. Torna·se mais realista, analítica ou minuciosa. ~,-< Na fase clássica, como a escultura, através da qual a conhecemos, \$' / adquire acentuado ·realismo figurativo, numa concepção matemática e ideal da beleza da forma. 11 a chamada idade de ouro ou século de Pérides, cujos melhores exemplares são .s obras do escultor Fldias, especialmente \ I sllas decorações no Partenon, templo de Atenas, consagrado à deusa Ate- néia, padroeira da cidade , Distingue,se pela regularidade harmoniosa da forma, C<Juilíbrio sereno da composição e cuidadosa execução técnica , (fig . 4) '-, Na fase helenística, correspondente .à expansão da arte grega no mun- do antigo, desaparecem a regularidade. harmoniosa e o equilíbrio sereno ! Da P,é.História ao RealilMo 23 da fase clássica. Caracteriza.se pela movimentação tumultuosa das formas, gosto do pitoresco e dramaticidade. Para fazermos idéias dos contrastes entre o clássico e helenístico, basta comparar um baixo.relevo de Fídias com o conhecido grupo do Laocoonte, obra helenística, movimentada e patética. Em ambas as fases, clássica e helenística, os pintores gregos aplicam o claro· escuro para dar a sensação de volume e instituem as regras da Feespectiva científica que permitem a ilusão do espaço ou profundidade. N a fase clássica, ocorre fenômeno até aqui desconhecido. A pintura deixa de servir exclusivamente à religião, representa também assuntos pro· fanas e torna-se, graças ao pequeno quadro de cavalete, objeto de valor comercial - compra·se c vende-se pintura . A PINTURA ROMANA Sabemos que tendo conquistado militarmente a Grécia, Roma fora por ela espiritualmente conquistada . O romano antigo não era um povo dotado de Imaginação criadora e sensibilidade artíst ica. Possuía era senso pdtico e político. Adaptou ao seu temperamento utilitarista C, sobretudo, aos seus interesses polIticos, as formas artísticas dos povos que ia conquistando e submetendo. As influências gregas foram as mais dêdsivas na sua arte . Recebeu-as primeiro através dos etri.:iscos, povo industribso de remotas e obscuras ori· gens gregas, instalado no centro da península. Depois, foram as influências das colônias gregas do sul da Itilia e da Sicília, cidades ricas c cosmo- politas. Finalmente, influências diretas da Grécia, depois da conquista mil itar, quando cm Roma se tdmou moda adotar idéias e costumes gregos. Por isso mesmo, na técnica e na expressão, a pintura romana é uma v:ui :1 nte: da pihtur;1 grega das fases ctíssica e helenística, sobretudo desta última : Apenas, por seu carátcr prático, O romano acentuou-lhe as fina- lidades decorativas. Associou·a ~om maior fre9ütncia à arquitctura e mar- cou-a de mais forte realismo. A PRIMITIVA PINTURA CRISTà Depois de Roma antiga, chegamos a um ponto culminante não Só dOa história da pi'nfura, como da história da p"rópria humanidade européia. Estamos assistindo ao advento do Cristianismo, fcito religião oficial do Império Romano, pelo imperador Constantino, no ano de 313, em Milão . Estamos, portanto, às portas da Idade Média. N asce a primitiva pinlur~ cristã, qlle vem da obscuridade c d:ô temor das catacumbas. 24 COMO EI'ilTENDER A RINTURA MODERNA Como a neoHtica, a ~gípcia, a grega arcaica e diversas das têndências atuais, afast1lm-se da observação direta d1l realidade, embora figurativa, por- que cstá dc novo a scrviço exclusivo da religião. Dcixa de traduzir sen- saçõcs visuais. para traduzir sentimentos e idéias religiosos. Por isso, deixa de scr realista, para tornar-se simbólica e deformar as imagens da rea- lidadc. Possuindo do mundo uma concepção mística e não racionalista, como o possuíam o grego c1á'ssico e o romano, o pintor cristão primitivo fecha os olhos ii realidade exterior para abri-los às suas realidades interiores de crcnte. Representa verdadeiras abstrações - os dogmas e mistérios da nova fé, ora dc forma abstrata, ora de forma figurativa _ (Fig. 5) Mais tarde, porÚn, depois de oficializado o Cristianismo, que passa ·a Scr a religião tamhém das classes ricas, não mais apenas das massas popularcs do vasto império romano, a primitiva pintura cristã inspira-se dirctamente nas formas da pintura pagã helenística e romana. BIZANTINOS li ROMÂNI.COS Nos primeiros séculos depois da oficialização do Cristianismo, essa primitiva pintura cristã divide-se em dois grandes ramos - um oriental, outro ocidcntal. O ramo oriental é a bizantina. Expressa-se, sobretudo, na técnica dos majestosos e cintilantes murais de mosaicos, feitos de pequeoos cubos de pt:dra ou artificiais, embutidos na parede (om argamassa; e nos /COI101, cluadcos religiosos pintados à têmpera ou encáustica, com incrustações de pedras preciosas, metais valiosos e matérias raras. , Na pintura ã têmpera, as tintas são dissolvidas num adstringente, cola ou caseína de ovo, para que possam aderir melhor à superfície. Na en· cáustica, numa solução de cera quente. Quando a cera esfria e endurece, a pintura adquire certo brilho de verniz. Também posta a serviço da religião, num regime teocrático, a pintura bi:r.anlina oócdece à lei da Front~Iidade, sob formas diferentes da egípcia. Desse modo, é também uma arte dirigida. Na execução dos mosaicos: afrescos ou IC0110S, os artistas obedeciam a verdadeiros formulários prcs'- cri tos pelos padres e aprovados nos condlios, pois a pintura tinha por principal finalidade a propagação das verdades da fé e da Hist6ria Sa-' grada, entre as populações iletradas da Idade Média. A pintura bizantina dcsenvolve·se pratican:>e"te por mil anos por .todo o vasto império de Bizâncio, finalinente destruído pelos turcos, em 1453. InfluenCia as artes na Asia Menor, GréCia, Af~ica cÍiJ Norte, Rússia ·e países balcânicos. (Fig. 6) .;J. J n • Lt . ( I', ~ t'; V Da P,é~História ao RuUsmo 25 o ramo ocidental da · primitiva pintura crislã é a pintura românica. RSsim chamada, como as línguas italianas, francesa, espanhola e portu· guesa, que provêm do latim, por derivar das formas artísticas romanas . ~ão as formas eruditas romanas tratadas como verdadeiros dialctos acUs- ticos pelos povos outrora chamados bárbaros e postos de início sob o do- mfnio de Rõma . e uma pintura sobrecarregada de expressão pela intervenção de fortes sentimentos religiosos e, por isso mesmo, bastante deformadora das ima- gens visuais, rudimentar de técnica, muitas vezes ingênua e de inspiração . popular. Desconhece a perspectiva e o claro-escuro, não representando inicialmente a ilusão de espaço e de volume por meio desses processos conehcidos na antigüidade. Destinada a traduzir especialmetne senitmen· tos, distingue.se pela vivacidade do colorido. Sua técnica mais generalizada é a do mural afresco, no interior das obscuras e pesadas igrejas românicas. (Fig . 7) Expandindo.se pelo ocidente europeu, a pintura românica evoluiu a partir do ano de 1200 para novas formas técnicas e expressivas, que vão constituir. a pintura gótica. Q..A-p11e'1S""'" PuI1.(\A, ""i ",e5~ \ A-\5, "- .... ('11'·"" ... ,.,5 J (+(V~~). A PINTURA GÓTICA CJ.LI, nA H>-~ .nA .l n,,~ ~ A l. Dos anos de 1200 a 1400, a pintura européia pode ser caracterizada por laboriosa libertação de duas influências dominadoras - a dos mo· saicos e íC01JOJ bizantinos, muito convencionais e rígidos, e a das minia· turas, isto é, as itustrações feitas à mão dos livros medievais, como sabe· mos igualmente confeccionados à mão. À medida que a sociedade européia começa a emergir da economia agrária e artesanal da primeira Idade Média, para alcançar a economia manufatureira e mercantilista da Renasçença, começam também a desa· parecer as formas artísticas cOrCespondentes, que na pintura se expressa· vam justamente pelos estilos românico e binzantino . As influências bizantinas fizeram·se sentir mais no sul e no oriente europeu, ao passo que a das miniaturas nos países do norte . Os pintores nórdicos são mais minuciosos, amigos do detalhe, pouco sintéticos, como se as suas pinturas, iguais às ilustrações dos livros, fossem para ser vistas muito de perto ou cheiradas, como diria Rembrandt . O pintor gótico do norte da Europa é assim bastante analítico e, pela veemência do sentimento religioso, ainda muito simbólico e defor· mador das imagens da realidade. Mas, está voltando, gradualmente, à observação da natureza, à representação realista do mundo à base de sen· sa9ões. Não é mais o místico bizantino ou românico, que representa :t COMO ENTEND5R A PINTURA MODERNA realidade à base de sentimentos e idéias religiosas, carregando.se de sim, holismo. Volta a transmitir a ilusão do espaço e do volume, aplicando a perspectiva e o claro-escur.o, assim como maior realismo na paisagem " nos movimentos do corpo humano. (Fig. 8) Na última fase da pintura g6tica, nos anos de 1400 a 1500, 'pa· recem os pintores cha~ados pré-renascentistas, porque anunciadores da Renascença . Distinguem·se por progressiva libertação do convencionalismo bizantino e da minúcia oriunda das miniaturas. Os italianos Giotto (1266· 1336) e Masaccio (1401·1428) antecipam essa libertação . Na transição da pintura gótica para a pintura renascentista, ocorre acontecimento de enormes conseqüências na técnica de pintar - desco~ bfe-se OU nperfeiçoa-se a pintura a óleo, isto é, as tintas dissolvidas no óleo de linhaça. Atribui·se essa descoberta ou aperfeiçoamento aos fla. mengos chamados irmãos Van Eyck, Humbert e jean (1390·1441), au· tores de obras celebradas pela precisão da análise, segurança técnica, coo lorido c perfeita conservação ainda hoje . A PINTURA RENASCENTISTA Desse modo, quando chegamos à Renascença, a pintura está. cri que .. cida de novo processo técnico - o processo a óleo, inegavelmente mais prático do que os processos tradicionalmente conhecidos de afresco, têm· pera c encáustica. O homem da Renascença já é um homem moderno de espírito ra· cionalista e mentalidade científica. Enquanto a ciência da Idade Média era a Teologia, isto é, o estudo e conhecimento de Deus, a ciência da Renascença é o Humanismo, isto é, o estudo e o cOQ,hecimento do homem Oean Cassou). Enquanto o pintor da Idade Média, como Duccio de Siena, antes de pintar a Virgem, caía de joelhos, fechava os olhos e espe. rava a forma ideal de beleza através da revelação divina, o pintor renas~ centista, como Rafael, abria bem os olhos à natureza, estudava anatomia c geometria, buscando, muitas vezes, para modelo de suas Madonas, as belas e opulentas foimas de sua apaixonada Fornarina . Essas diferenças entre o homem medieval e o homem renascentista contrast:lffi melhor em duas outras figuras humanas ..:..... São Francisco de Assis e Leonardo da Vinci. Ambos se aproximam e se distanciam, a um só tempo, pelo mesmo amor - o dos pássaros. Enquanto São Fran~ cisco amava·os misticamente, chamando-os irmãos, dirigindo-lhes palavras de fraternidade, Leonardo também os amava; mas, para observar.lhes o vôo e estudar as possibilidades de construir a máquina que permitisse ao home1\l voar . Oa Pré .. Mistória aO'~R:.:.1i~,,:m:o~-------~e-__ Pois cacioqalislfio e científico do liomem temas r~ligiosos, a pintura renascentista não . • mística, simbólica pem deformadora, mas, realista e de inspiração cien- tífica e profana_ As tcorias artísticas renascentistas fundaram-se no conhecimento e estudo das obras da antigüidade clássica greco-romana, que na época co- meçaram a ser descobertas e admiradas, por iniciativa de príncipes e papas protetores das artes _ As afinidades entre a pintura renascentista e o clas- sicismo grego são assim bastante evidentes, ambas as concepções de arte muito semelhantes. Enquanto os italianos ou os latinos em geral buscam a beleza da forma, sendo mais visuais e plásticos, os renascentistas nórdicos,' alemães c flamengos, acentuam a beleza do caráter, sendo mais subiehvos. (Fig. 10) A PINTURA DARROC" A visão e a interpretação científicas da realidade, o controle do sen- timento pela razão, esses e outros característicos renascentistas, diminuem e praticamente se apagam, quando no século seguinte, 1600 a 1700, che- gamos ao Barroco. . Identifica-se o Barroco pela destruição daqueles princípios de ordem, proporção e beleza ideal da forma encontrados em Leonardo, Rafael, An- drea de! Sarto, Ticiano e outros renascentistas italianos, como também embora atenuados, em muitos artistas do norte da Europa. . A pintura barroca - muito parecida com a arte helenística (com- p.re-se o grupo do Laocoonte ou a Vitória de Samolrácia com as compo- sições de Miguel Angelo e. Tintoretto) - notabiliza-se pelo dinamismo c movimentação das formas, violentos contrastes de sombra e luz, para obtenção de intensos efeitos expressivos, bastante emocionais, ora dramá .. tkos, patéticos mesmo, ora suntuosos, grandiloqüentes e cenográficos. Essa movimentação das formas, dramática ou decorativa, observa·se tam .. bém na arquitetura e na escultura. Miguel Angelo, por exemplo, foi um j dos primeiros grandes barrocos. (Fig. 11) Nos quadros renascentistas clássicos o eixo da composição é predo .. minantemente central, uma vertical imaginária dividindo.a, simetricamente, 28 COMO ENTENDER A PINTURA MODERNA em duas partes i8'!ais e comunicando. sentimentos de ordem e estabili: dade. Nos quadros barrocos, essa linha imaginária e predominante tende a ser geralmente uma diagonal, que sugere sensações de instabilidade, movimento, deso"!~1!I ~mociQnal. As sombras e luzes nos clássicos renascen-, tistas têm por finalid,ade principal camunicar sensações de volume ou de espaço. Nos barrocos, adquiriQdo fortes conteastes, comunicam sentimen· tos, reaçõcs emocioaais, sugestões de drama e mistério, do que propria- mente sensações flsicas de volume e de espaço. Compar ... e a Ceia de Leonardo (Fig. 12) com a Ceia de Tinto, .. tto (Fig. 13) e teremos as diferenças entre renascentismo clássico e barroco. o ACADEMISMO 11 na fase inicial dessa pintura barroca que se estabelecem as COncep, çõcs posteriormente chamadas Academismo. Não será difícil faz« rapidamente a história dessa concepção de arte em geral e de pintura em particular. Depois do desaparecimento dos grandes mestres renascentistas, o último dos quais fora Ticiano, a pintura italiana sofrera sensível decadência, surgindo numerosos artistas denomi. nados tntllleirÍJlaJ. Desenhavam e coloriam muito bem, com facilidade brilhante, mas eram pobres de poder expressivo. Na verdade, possuíam apenas a maneira hábil de fazer, em outras palavras, virtuosismo técnico. 11 o mesmo de um escritor, conhecendo bem gramática, colocando direito os pronomes, fazendo certas as concordâncias e regências dos verbos, mas inexpressivo, sem o poder de comunicar emoções, poder próprio e distintivo do ver- dadeiro artista. Era o caso desses maneiristas, que fervilhavam pela Itália. Foi em fáce desse quadro de decadência, que três pintores resolveram fundar, na cidade italiana de Bolonha, uma academia de pintura, mais tarde famosa. Eram parentes e chamavam-se os Carracei - Aníbal (1560- 1609), Agostinho (1557-1602) e Ludovico (1555-1619). A academia recebeu a denominação significativa de Academia dos Bcm Ellcamillhados (1585) e no seu programa de ensino estão as raízes da pintura acadêmica. Passemos os olhos por esse programa. Segundo 3. doutrina dos Carracci, a pintura destina-se a representar temas, assuntos, cenas e "acontecimentos superiores de grande elevação moral e espiritual. O pintor deve inspirar-se, portcu:tto, na mitologia grega, nas histórias Sa- grada e Antiga, buscando sempre idealizar a natureza, o homem e a vida . Necessita, desse modo, ser erudito, conhecedor de história, religião, lite- ratura e filosofia. Precisa também conhecer bastante anatomia, porque a Da Pré·História ao. Realismo 29 essêneia da Beleza está no corpo humano, corretamente proporcionado e idealmente representado, Segundo ainda o programa dos Carracei, os mestres da Renascenç~ haviam sido insuperáveis em determinadas técnicas e recursos expressivos. Nenhum pintbr, por exemplo, havia conse8llido maior perfeição no claro, escuro do que Leonardo da Vinei, assim como Miguel Angelo fora sem igual no desenho, Rafael na composição, Ticiapo no colorido, pleno de magnificentes suntuosidades, Para' que um pintor produzisse uma obra- prima, bastaria reunir as qualidades marcaptes desses mestres - o claro- escuro de Leonardo, o desenho de Miguel Angelo, a composição de Ra- fael e o colorido de Ticiano, Como esses mestres haviam alcançado essas excelências inspirando-se nas obras da antigüidade clássica greco-romana, o programa dos Carracei determinava que o pintor deveria começar a aprender desenho copiando as cópias das estátuas antigas, gregas e romanas, para depoIs passar a de- senhar diretamente a figura humana, o modelo profissional de atelier, bem proporcionado, bonito, em atitudes copiadas também da estatuária clássica , A luz da pedagogia, e da estética dos nossos dias, essa concepção e esse ensino da pintura não resistem à menor análise. Sempre sofreram, especialmente na segunda m~tade do século XIX, sérias restrições, Todavia, 'pesar de instituídos nos fins do século XVI numa cidade italiana, ainda hoje prevalecem, como sabemos, nas academias de arte oficiais de muitos países. Sob a denominação de neoclassicismo, foram trazidos ao nosso país pela Missão Francesa de 1816, mandada buscar por Dom J030 VI, para ' inaugurar o ensino artístico oficial. Não é chegado, entretanto, o momento de examinar essa concepção de pintura, senão quando atingimos o século XIX, com o aparecimento do Neoclassicismo, que não passa, em última análise, de uma adaptação do programa dos Carracci , A }lINTURA ROCOCÓ Expressando, no seu dinamismo, o surto da economia manufatureira c mercantilista européia e os prenúncios da burguesia industrial, a pintura barroca evoluiu, no século XVllJ, para novas formas estilIsticas, que ' se denominam Rococó, O estilo rococó é eminentemente franck , Sua pr6pria denominação vem da corruptela da palavra francesa rocaiJle, con.cha, um dos seus mais constantes e característicos elementos decorativos. Na arquitetura, na escul· tura, na pintura, nas artes decorativas em geral, esse estilo expressa a vida ociosa e requintada, o espírito galante e fútil da nobreza européia no sé· 30 COMO ENTENDER A PINTURA"'t<i/QDERNA ··.\3? culo XVIfl, quando está sendo derrubada. das pOsiçÕes econômicas e polí. ticas que ocupava pela vigorosa ascensão da burguesia. Ficaremos com melhor idéia do rococó imaginando num pequenJ salão oval, decorado de ~spelhos, guidandas e amorzinhos, um marque- sinho empoado, ao lado de frágil mesinha dourada de pernaS capricho- samente retorcidas, convidando gentilmente uma marquesinha à Maria Antonieta para dançar o minueto. Se a pintura barroca expressava, sobretudo, intensidade e violência de sentimentos, tocados de certo caráter naturalista, o rococó é feito de sentimentos aristocráticos de galanteria, mundanidade, fantasia decorativa e, muitas vezes, requintado erotismo. (Fig. 14) Por isso mesmo, adquire nà pintura, como nas demais artes, certa leveza de técnica, graciosidade elegante de desenhar e de pintar, lumino· sidade de colorido, tudo isso bastante adequado aos seus assuntos predi- letos, que são agora flagrantes de ~~~doik.Pastorais idílicas e cenas mito- 16gicas galantes. Na pintura, é aep~'d'- técnica do pastel - o pastel é uma espécie de giz aplicado em geral sobre camurça ou papel ligeira- mente rugoso, para permitir melhor aderência - sedutora e efémera, como a pr6pria vida ou os próprios destinos da aristocracia, de que o rococó é autêntica e n:veladora manifestação artística. :5cL-Lc"' .... :r ...... k.:" ~~1O~_ - ~"'-d..::J O NEOCLASSICISMO ~ J \ Depois do Rococó, nos fins do século xvm e prlDClplOs do XIX, " ,oincidindo com .s transfomações sociais que se iniciam com a Rev01ução Francesa, apan:ce na Europa o Neoclassicismo. O Neoclassicismo ou Academismo tem muitos e Intimos pontos de contato com as concepções estéticas e o programa de ensino daquela academia dos Carracci, que havíamos deixado em Bolonha, quando sobre- voávamos o Barroco. Segundo a estética neoclássica, difu"ndida pelo his- toriador de arte alemão, Joaquim Winckelmann (1717-1768), apaixonado da antigUidade grega e por seu compatriota Antonio Rafael Meng (172"8- 1779), pintor convencional e medíocre, existe um belo ideal, absoluto e eterno, praticamente inatingível ao homem. Quem mais se aproximou desse belo foram os artistas do classicismo grego, particuiarmente os escultores, quando ao lado de apurada execução técnica alcançaram notável regula- ridade da forma e serenidade de expn:ssão. Para um artista aproximar-se desse ideal ou mesmo atingi-lo, bas- tava inspirar-se o mais posslvel nas obras deixadas pelo classicismo greco· ·romano ou pelo renascimento italiano, que se inspirara. por sua vez, nos gregos e romanos. Em conseqüência., os neoclássicos passam, também, a Da Pré.Hist6ria .10 Realismo 31 inspirar-se diretamente . nas obras da antigiiidade c1issica e da Renascença italiana. Procuravam imitá-Ias. Os pintores elegem especialmente Rafael. O neoclassicismo toma-se, desse modo, uma arte «Iética e normativa, que imita a liberdade de cri~ção e de expressão do artista, dificultando-lhe ou destruindo-Ihe a originalidade pessoal, pois as soluções dos problemas técnicos e expressivos estão previamente determinadas, como ocorria nas aulas da academia bolonhesa . Por sua natureza histórica e literária, a neoclássica é uma pintura na qual a linha ou o desenho predomina sobre a cor . Isso significa a predo- minância das faculdades intelectuais sobre as emocionais, da razão sobre o sentimento. Por esse caráter intelectual e por suas convenções, torna-se pouco favorável aos acentos pessoais e nacionais. Adotando regras técni- cas e expressivas padronizadas, estabelecidas num verdadeiro formulário, os neoclássicos ou acadêmicos geralmente se parecem, apesar das diferen- ciações de raça, nacionalidade e indivIduo. (Fig. 15) A arquitetura, a escultura e a pintura inspiram-se diretamente nos modelos da antiguidade clássica .greco-romana, copiando-lhes as formas. A porta de Brandenburgo, em Berlim, o Arco do TriUnfo e a igreja da Madeleine, em Paris, e a Casa da Moeda, no Estado da Guanabara, são monumentos neoclássicos. O italiano Antonio Canov (1757-1822) e o dinamarquês Bertel i ThomwaldsenJ( I779-1844) são escultores neocUssicos. Na pintura euro- .;, péia, os mais destacados representantes do NeoclassiciSMO ou Academismo são os franceses Jacques Louis David 1748-1825) e Jean Dominiql\ê Ingres (1780-1867)_ A PINTURA ROMÂNTICA Contra as limitações do Neoclassicismo ou Academismo, insurgem-se os românticos, com os franceses Théodore Gericaul , (1791-1824) e Eu- géne Delacroix (1789-1863) . Pregam a liberdade de expressão individual, acima das regras e nOr- mas acadêmicas e conferem maior valor expressivo à cor, menos ao dese- Ilho . Mais sentimento, menos razão. Enquanto os neoclássicos são essencialmente lineares, expressando-se m:lis com a linha ou o desenho, os românticos são coloristas, imaginativos e emocionais, permitindo mais Hvre afirmação das características nacionais c.: pessoais do artista . Como os barrocos e, mais remotamente, os helenís- ticas, movimentam as formas e a composição, acentuando os contrastes dé cores c luzes, para maior intensidade da expressão dos sentimentos . 32 COMO ENTENDER A PINTURA MODERNA Embora tendendo ao realismo, pelo gosto do pitoresco, do exótico e da paisagem, conservam certos preJuízos e convenções acadêmicos, inclu- sive pelo caráter narrativo, histórico e literário de suas obras. (Fig. 16) Voltam-se para a natureza, surgindo numerosos paisagistas, como, en· tre outros, J~aptiste Corot . ( l7t96-1875) . . Gericault Delacroix são! no entanto, os mais característicos român- ticos. Estilisticamente, os românticos do século XIX po!lem ser filiados aos helenisticos e barrocos. Os REALISTAS As sobrevivênCias acadêmicas existentes nos românticos são <ombati. das pelos Realistas, na segunda metade do século XIX. Quem melhor definiu a nova concepção de pintura foi o francês Gustave Courbetl (1819-1877). Disse que jamais pintaria um romano da antigüidadc 011 um anjo porque jamais os vira. O Realismo é assim a representação das coisas objetivas e visíveis. Ser realista, porém, não I: ser exato como a fotografia, mas, verdadeiro, fixando os elementos ca- racterísticos e expressivos das coisas e dos seres. "A pintura" dizia Courbct "é uma arte essencialmente objetiva e consiste na representação das coisas reais e existentes . Um motivo abs~ trato, invisível, não pertence ao domínio da pintura. A imaginação na arte consiste em saber achar a expressão mais completa de uma coisa exis .. tente, jamais na sugestão ou criação da mesma. O belo está na natureza e cncontra·se na realidade, sob as mais diversas for·mas. O belo, comq o verdadeiro, é algo relativo ao tempo em que se vive e ao individuo apto a concebê-lo. /I. expressãp de beleza está em r~lação direta com o poder de percepção adquirido pelo artista. Não pode haver escolas, s6 existem pintores. " Logicamente os realistas abandonam.os temas históricos e literários preferidos dos românticos. Fixam as cenas da vida cotidiana e flagrantes popul.res, impregnando-se muitas vezes das idéias socialistas da época. Representando somente aquilo que está diante dos olhos, os realistas não conferem maior importância a certos cuidados artísticos oriundos do Neoclassicismo e persistentes no Romantismo - idealização da realidade, efeitos de composição, 'premeditadas relações emocionais de cor e certo subjetivismo. Vamos aos exemplos para melhor acentuar as diferenças entre neo· clássicos, românticos e reálistas . 'O pintor neoclássico, com as suas idéias de subl imidade da pintura, 'dificilmente escolheria para assunto de um dos Da Pré .. História ao Realismo 33 seus quadros o seu vizinho, simples homem da rua, bebendo cerveja ge- lada num dia de calor . Consideraria esse tema indigno da pintura, que só deveria representar acontecimentos e tipos superiores da mitologia, da história e da literatura o Para representar um homem bebendo, buscaria uma figura da mitologia ou da história antiga, um deus como Apolo, um herói como Alexandre o oE o mostraria numa atitude de nobéeza con- vencional, regular e belo de formas, idealizado, lembrando uma estátua grega . Para fazer o desenho, o colorido e as sombras, procuraria ver como c:ssas coisas foram feitas por um mestre acadêmico ádmirado ou por um gl"ande artista da Renascença, cujas obras estudaria e procuraria imitar o Já o romântico poderia escolher o vizinho bebendo o seu copo de cerveja o Mas, pela intervenção excessiva do sentimento e da imaginação, haveria de conferir-lhe certos acentos dram~ticos obtidos pelas liberdades do desenho c da cor . Poderia acentilar sugestões de desencanto da vida, sofrimentos morais ou injustiças sociais, de bondade ou maldade do ca- rátc.:r, sensibilizando bastante o contemplador o O realista, hão o O realista representaria o seu vizinho tal c qual o estava vendo, num sentido por assim dizer documental, sem que sua pin- lura fosse reprodução fid, exata, verdadeira fotografia da realidade. Seria verdadeira, porque o realista pode ser inclusive bastante sintético, elimi·· nando o que lhe parece supérfluo e inexpressivo, para fixar apenas os dementos considerados expressivos e definidores o Ser realista, convém repetir, não é ser exato, mas verdadeiro. (Fig. 17) Na pintura realista há uma nuança que se chama Naturalismo. Não sc: râ difícil distinguir essa nuança se nos servirmos da literatura, fazendo comparações entre dois conhecidos romancistas franceses - <Sustave FIau- bert e Emile Zola, contemporâneos, aliás, dos pintores realistas, pois os esti los, refletindo condições históricas e sociais, andam sempre juntos nas diferentes artes, que mantêm assim afinidades na técnica e na expressão o As personagens de Flaubert, como Madame Bovary, são batidas por conflitos d'alma, insatifações e aspirações indefinidas, estados de angústia, AO passo que as de Zola são perturbadas por desejos físicos, sensações, corpo, não alma o FIaubert poderia escrever a história sentimental e social de uma família francesa da segunda metade do século XIX . Zola escreveu a história natural, fisiológica de uma família nos Rougon-Macquart, estu- dando· lhes as taras hereditárias o Essa diferenciação a encontramos tam- bém na pintura . Courbet é naturalista. Manet realista. Courbet é Zola. Manet, o autor de Olímpia, é Flaubert. Em consegüência do Realismo é que surge o Impressionismo, onde t'stão as raí:tes da pintura moderna. Mas não entraremos imediatamente 34 COMO ENTENDER A PINTURA MODERNA no Impressionismo . Nesta rápida viagem através da história da pintura, tivemos oportunidade de fazer várias observações bastante esclarecedoras para melhor compreensão das diferentes tendências dos nossos dias, como dissemos no prefáCio. Essas observações constituirão a· matéria dos capí. tulos seguintes, terrn"inados os quais entraremos no Impressionismo e p~s· saremos a examinar- diretarnente as flSeoIas modernas-o A Necessidade Humana de Expressão Artística. Arte e Sociedade N ESTA VIAGEM QUU ACABAMOS DE RI!ALIZAR PELA EVOLUÇÃO DA pintura, desde a Pré-História ao Realismo, tivemos oportunidade de fazer várias obs;rvações, que talvez nos ajudem à melhor compreensão de ai· guns dos seus problemas antigos e modernos_ Entre as vârias observações que, naturalmente, nos ocorreram, devem estar, em primeiro lugar, as da necessidade de expressão artística que o homem pessui. Essa necessidade de expressão artística no homem pa~ rece ser tão biológica, permanente e universal, como a própria necessidade de alimentar-se. Pelo menos foi o que tivemos ocasião de observar na nossa viagem. Quando viajávamos pela Pré-História, encontramos o homem em con· diçóes ainda bastante rudimentares - não sabia ler nem escrever, não possuía , noção de tempo, nem de espaço, mal aprendera a vestir-se - aliás uma de suas primeiras vestimentas foram as cores e formas nas tatuagens - na realidade, aquele ser rudimentaríssimo sabia apen3s comer e reproduzir~se. Vivia, portanto, entre os dois instintos elementares de con· servação e de reprodução. Pois mal começa a madrugar indecisa claridade de condição humana na noite de sua animal idade, essa criatura, tão toscamente humanizada, começa a experimentar a irresistível e permanente necessidade de expres- sar-se artisticamente, pelo canto, pela dança, peIa música, pelas linhas e cores, as quais constituem o nosso problema. Aparecendo assim tão precocemente nas idades iniciais do homem como espécie, conforme vimos n3S cavernas, também precocemente aparece nas idades iniciais do homem como indivíduo, conforme vemos, todos os dias, nas cri3nças em nosso derredor. Se a encontramos na humanidade remota do machado de pedra, estamos encontrando-a -na humanidade atu3l do foguete interplandiírio. Outra observação fizemos em relação a essa necessidade de expressão artística - parece não depender da g~ografia, visto que a encontramos 36 COMO ENTENDER A PINTURA MODERNA em todos os climas, frios, quentes e temperados, nos habitantes das pla- nícies e montanhas, dos litorais c interiores. Parcce· também independer de raças, presente que está em todos os tipos raciais, definidos ou inde- finidos. Parece independer ainda do que chamamos civilização ou cultura, presente que também está nos povos altamente civilizados, armados de desenvolvimento mental e progresso técnico, como nas populações bas- tante primitivas, assim como nos indivíduos letrados e nos analfabetos. Vamos encontrá-la., ainda, nos pobres como nos ricos, nos materialistas e nos espiritualistas, nas pessoas de ·bom' ou de mau caráter. Por sua universalidade, permanência e elementarismo, acima de tan- tas cirrunstincias, essa necessidade de expressão artística deve pertencer não à natureza social do homem, mas, à sua natureza biológica, tanto sob a forma ativa do artista que cria e comunica a emoção estética, como sob a forma passiva do contemplador da obra, que recebe a emoção criada e comunicada pelo artista, Como estamos vendo, universal, permanente e elementar, no homem pré-histórico, no homem histórico, na criança e no adulto, no selvagem e no civilizado, no crente e no descrente, no r1CO e no pobre, essa neces- sidade de expressão artística parece ser um instinto, tão instintivo, diga. mos assim, como os instintos de conservação e de reprodução. Dá idéia de um instinto intermediário desses dois, um primo legítimo de ambos, dan~ do-se melhor com o primeiro, isto é, o instinto de conservação . Não será difícil aceitar esse parentesco da necessidade de expressão artística com o instinto de conservação, deSde que procuraremos analisat com simplicidade a verdadeira natureza da emoção estética . Quando con· romplamos uma obra de arte que nos agrada por qualquer motivo, o que realmente experimentamos, sob a denominação de emoção estética ou sen- timento do belo, parece ser uma sensação de bem-estar, de eufori~, um entusiasmo, em outras palavras, como se tem dito, um acréscimo de nossa vitalidade . Não importa seja depressivo o contelido da obra de arte. Dian- te de CriJlo crllcificado, - de Matias Grunewald (1470-1528), pintor renascentista alemão, - atrozmente ferido e macerado, ou diante do Nau- frágio da MedllJa - de Teodoro Gericault (1791-1824), pintor român- tico francês, - dezenas de náufragos em desespero, agonizando ou mortos, numa balsa perdida no oceano, diante dessas obras, o que realmente sen· timos é uma sutil sensação de bem-estar realmente um acréscimo de nossa vitalidade, que nos desperta a necessidade ou o desejo de comunicá-Ia aos demais para que também a experimentem. Ora, essa sensação de bem-estar ou esse acréscimo de nossa vitalidado es tá mais perto evidentemente do instinto de conservação do qUt~ do ins- rÍ llto de reprodução, que contém, apesar de sua essência egoística de prazer, A Necessidade Humna de Expressão Artística. Arte c Sociedade 37 um sentido altruístico de renúncia ou sacrifício, divisão c perda no plano vital. Para . aceitarmos essa natureza instintiva ou vital da emoção artística ou do sentimento do belo, tudo está na significação que emprestarmos à palavra ill!/ill/o. Essa palavra não deve ser tomada na acepção vulgar e pejorativa, geralmente usada para indicar impulsos e paixões grosseiros, mas, na significação de uma forma de inteligência, dotada de alta sabe-. daria, imanente e necessária à matéria viva, nos reinos animal e vegetal . Justamente por sua níltureza instintiva ou biológica e não intelectual e social é que essa necessidade de expressão artística é tão elementar, pre- coce, permanente, universal no ser humano e, segundo vários estudiosos, observada até entre irracionais. Sendo tão elementar . deve ser, na essên" cia, igual cm todas as pessoas. Deve ser a mesma, tanto num sambista carioca batendo no ccuro de gato de um tamborim, como em Beethoven, compondo a Nona Sinfonia, tanto em Einstein como num selvagem da Nova Guiné . As pessoas que lendo isso por acaso reajam é porque incorrem numa confusão muito comum, mesmo entre presumíveis ccnhecedores de arte . Coof undem a essência com a forma. Toda a questão está. em não con- fundir a essência, biológica e absoluta da Arte, vinda do universo mis- terioso dos instintos, com as suas fOm1as técnicas e expressivas, que são particulares, relativas e transitórias . Quando se diz que a necessidade de expressão artística de um garotinho de cinco anos de idade, mordendo a ponta da língua ao desenhar, ê a mesma de Mondrian, ao armar suas relações geométricas de formas e cores, fala·se da essência, que é absoluta c permanente, não das formas técnicas e expressivas, ou dos estilos, que são rdativos c transitórios . ARTE E SOCIEDADE Enquanto a necessidade de expressão artística é permanente e uni- versal, a mesma no tempo e no espaço, absoluta, portanto, as fonnas com as quais o homem a satisfaz. isto é, os estilos de arte, no nosso caso os estilos de pintura, tanto na sua técnica como na sua expressão, constantemente estão mudando. Essas mudanças dos estilos de arte em geral e dos estilos de pintura em partirular não se fazem, porém, por simples acaso, nem pelos capri- chos da fantasia individual dos ' artistas . Fazem.se, como sabemos, sob a influência direta de fatores históricos e sociais. As formas artísticas são diretamente condicionadas pelas formas sociais. Se estas são estáveis e duradouras, aquelas também o são. A cada transformação social, corres- 38 COMO ENTENDER A PINTURA MODERNA ponde uma transformação artlstica, conseqüentemente acompanhada de novas idéias e concepções do que seja Beleza, cQmo acontece, aliás, em todos os campos do conhecimento ou da expressão humana. Por outro lado, formas sociais em essEncia idênticas produzem em essência fonnas acUsticas idêQticas. Por isso mesmea, encontramos na evo .. luçãG da pintura estilos assemeUlados, verdad~iras repetições. Fundamen- talmente os mesmos, aos oUlos dos que alcançam um PO\lCO além das apa- rências. Comparem os estilos eglpcio e bizantino, o clássico grego, oro· mano, o renascentista e o neoclássicp do pri\lclpiQ do sêculo XIX, o hele- nístico com os barrocos, os romanicos com os iavistas, ambos igualmente deformadores das imagens visuais; os desenhos neolíticos com os abstratos geométricos modernos. Encontrarão expressões espirituais reveladoras, em última análise, de proce.ssos sociais essencialmente idênticos. O mais prá- tieo, porém, nessa questão de mudanças de estilo, será ver os fatos. A primeira mudança de estilo na pintura ocorreu ainda na Pré-His- tória - foi a passagem do figurativismo realista da pedra lascada para o geometrismo abstratizante da pedra polida. Para observar esta primeira mudança de estilo na histdria da pintura, acompanhemos Arnold Hauser, estudioso atento das influências dos fatos sociais nos fatos artísticos. Não padece hoje duvida q~e os d~enhos e pinturas do homem da pedra lascada, no interior das cavernas, não nasciam de puros e dcsintercs· sados prazeres estéticos do gosto ornamental das cores e das formas ou para simples alegria dos oUlos. O homem paleolítico, como qualquer outro nomem, não praticava a arte pela arte, a arte pura, completament~ desinteressada, como imagina nos seus devaneios a estética idealista. Os desenhos e pinturas paleolíticos tinham finalidade utilitária, porque pos- suíam carátcr mágico. Desconhecendo religião como a conhecemos e praticamos hoje, o ho- mem da pedra lascada vivia dominado pela crença nos poderes mágicos. Ao seu espírito de crente nos poderes mágicos, o mundo era uma rea· Jidade só. Filosoficamente falando, era o que se chama um mOl1ÍJla, isto é, concebia o mundo como uma realidade única. Não separava o visível do invisível, o mundo material do mundo espiritual, a alma do corpo. Como pintor, não separava a imagem da realidade. A realidade do bisão, lá fora, pastando, era a mesma da imagem do bisão, que estava desenha- do, na parede do interior da caverna. Era dOl!)inado, portanto, pela crença no poder mágico da imagem. Acreditava que • imagem de um. coisa ou de um ser dá poderes sobre essa coisa ou esse ser. Desenhando o bisão (lU a rena, adquiria poderes sobre o bisão ou a rena . Ess:l crença no poder mágico da imagem é mais antiga c, ao mesmo tdnpo, mais .tua! do que pensamos . I! uma sombra do homem, ,COI!)- A NcccssidaQ H.unnl de 'Expressão. Artística. Arte e Soci.cbtfe 39 panhando.o sempre. Tem resistido ao progresso e à cultura. Encontra- mo·la em todas as etapas da evolução humana, ancorada profundamente no nosso inconsciente. Os egípcios antigos possuíam-na. Contemplavam suas estátuas não com sentimentos artísticos, mas religiosos. A estátua era algo. sagrado, Era um corpo novo e duradouro, destinado a receber o .spirito eterno do morto. Se a estátua fosse mutilada, como veremos mais adiante, o espirita. do morto ficaria sofrendo no resto da eternidade, Seria brasileiramente uma alma penada. Os gregos e romalJOS, corno os orientais, tinham também crenças no poder mágico da imagem. Entre os gregos arcaicos, menos racionalistas que os clássicos, a estátua possuía caráter divino e, por isso, era simbólica, sem parecença física . S6 a mereciam os del,lses e os atletas vencedores no! jogos esportivQs de inspiração religiosa . Somente quando vitorioso pela terceira vez, é que o atleta tinh3. dir~ito aos seus traços fisionômicos na .• ~~t:ítua , '" Os romanos, nos seus primeiros tempos, possuíam .leis especiais que regulavam o uso de retratos. Era o ;IIS itnaginmn,. J)ireito ao retrato só os que houvessem prestado reais serviços ao Estado . Acreditavam que fazer a est.Íhl3 de alguém, sem o mérito de serviços públicos relevantes, traria conseqüências funestas , Quando alguém caia do poder, derruba- vam-lhe ou decapitavam-lhe a estátua, como ainda hoje fazemos nas re." voluções de rua. Na Idade Média - está nos tratadistas penais - quando um · cri· minoso escapava à justiça. executavam-lhe em efígie. Os chineseS antigos não pintavam os olhos dos dragões com medo de que voassem. As prá~ ticas de feitiçaria, universais entre selvagens e civilizados, não têm outro fundamento, senão a velha crença no poder mágico da imagem. Mesmo nós civilizados, fabricantes de satélites artificiais, futuros viajantes inter- planetários, somos dominados, inconscientemente, pela velha crença. Con- solamo-nos das ausências e mortes, com os retratos dos ausentes e mor- tos. A mocinha apaixonada que, decepcionada com o namorado, rasga-lhe o retrato, revela o mesmo incosciente do homem pré-histórico, que, dese- . nhava no fundo da caverna. Também inconscientemente acredita no poder . mágico da imagem. Rasgando o retrato, destrói, mata o ingrato . Seu impulso em essência é o mesmo, difere na [orma. Precisamente por viver dominado pela crença no poder mágico da imagem e não possuir capacidade de abstração, os desenhos e pinturas do homem paleoHtico são figurativistas realistas. Não possuindo capa- cidade de abstrair·se, o pintor paleoHtico não poderia substituir a imagem do animal por um símbolo, um signo, uma convenção, urna abstração, em suma, Seu próprio modo de vida, vivendo da caça e da pcsca" que 40 COMO ENTENDER A PINTURA MODERNA exigem predominantemente o exercício dos sentidos, das sensações, fa- zia-o realista; reproduzindo objetivamente as imagens da realidade_ Pois, então,_ di~nte · dessas imagens realistas dos animais, para. o seu esplrito de crente nos poderes mágicos da imagEm diante dos próprios animais, celebrava ritos e cerimônias mágicos para influir na abundância dos rebanhos c nas facilidades de caça_ Desenhando o animal, possuía o animal. Ferindo a imagem do animal, acreditava ferir o próprio animal. Nos desenhos e pinturas, foram encontradas numerosas incisões e repre- sentações de ferimentos, pontas de lança c fIc«has, geralmente nos lugares mortais, assim como sinais tetiformes e mãos abertas, que talvez signifi- cassem posse. Na gruta francesa de Montcspan, o arqueólogo Casteret encontrou ~m urso de argila, muito bem modelado, ao qual faltava a cabeça _ Entre as pernas, restos ósseos de um crânio de urso e, no pescoço, ainda ves- tígios da existência de um suporte. Concluindo-se que durante as ceri· mônias mágicas se adaptaria, ao corpo do urso de argila, a cabeça de um urso de verdade. Ainda se fi zeram outras observações esclarecedoras da natureza m:í- gica e, portanto, da finalidade uti litária da arte paleolítica. :e a localiza- ção das pinturas e esculturas no interior das cavernas, geralmente nas partes mais profundas e obscuras . Não possuiriam desse modo finalidade ornamental, porque s6 poderiam ser contempladas à luz artificial_ Poderia alegar-se possuía o hqm~m paleolít ico maior acuidade visual do que o civilizado, enxergaria no escuro. Mas essa alegação cai pOr terra consi- derando-se que os desenhos e as pinturas estão geralmente superpostos.- entrelaçados. desenhos novos sobre desenhos antigos, excluindo a finali- dade única de contemplação . Por outro lado, os animais representados são geralmente comestiveis, necessários à alimentação c a outras necessidades do homem, como instru- mentos, armas e vestutlrios, fei tos com os ossos e peles. Outra observa- ção Q1riosa é a ausência quase completa de representações humanas. Quan- do aparece, a imagem 'do homem é geralmente esquematizada, com inter- pretação geométrica c simbólica . Ora, Q1sta a crer que, desenhando tão bem animais, não soubesse aquele artista desenhar homens e. quando o fizesse, fossem errados e deformados, contrariando o seu realismo visual_ 1! que aí intervinham os sentimentos oriundos da crença no poder mágico da imagem. Desenhando O ' homem, adquiria poderes sobre os seus seme· Ihantes, coisa que! talvez lhe parecesse perigosa. Eram motivos religiosos. portanto, que faziam com que,? ' homem não se representasse e quando ' O fi zesse fosse de modo não realista, mas esquematizado, simbólico, verda- deiramente deformado, par,\- evitar a ação !1aquçles poderes_ A No'cessidade' H"maqa de Expressão Artística. Art" e Sociedado 41 Esse estilo de pinMa figurativista realista, com representação visual da realidade, predomina durante todo o paleolítico superior. À medida, porém, que entramos no Mesolítico, isto é, na transição da pedra lascada para a pedra polida, começamos a observar mudanças no estilo dos desenhos e pinturas do homem pré.histórico . Os desenhistas e pintores não são mais aqueles realistas do apogeu da pedra lascada . Não são mais observador~s e fixadores verdadeiros da realidade, não des· ccrn ao detalhe, não marcam a anatomia, o movimento, o caráter do ani. mal. Agora, esquematizam, geometrizam, estilizam, deformam a imagem visual da realidade . Substituem·na por símbolos e signos, convenções, abstrações. A pintura passa do figurativismo realista para o geometrismo de tendência abstrata. 11 a primeira grande mudança de estilo na evolução das artes, segundo acentua Arnold Hauser, na sua História Social da Ar/e .. Mas essa revolução estilística, o aparecimento desses geometrizadores na idade da pedra polida não se deu por acaso, nem pela fantasia dos artistas daquela época. Correspondeu à verdadeira revolução no modo de vida do homem pré· histórico . O homem deixa de viver anárquica e para· sitariamente da natureza, caçando ç pescandó. Ultrapassa a fase de caça e pesca e chega à de agricultura e pecuária. Deixa a vida nômade, toma·se sedentário. Domestica animais e vegetais. E, coisa muito importante, aprende a prever, isto é, a transcender da realidade imediata que o cerca, da realidade visual, porque agora .suas atividades de agricultor e criador dependem de acontedmentos futuros, além da sua visão. Dependem das variações do clima, da chuva, do sol. Aprendendo a prever, aprende, também, a abstrair-se das realidades visuais. As transformações observam·se não apenas na sua arte, também na sua religião . Não é mais aquele crente nos poderes mágicos. O mundo para ele não é mais uma substância única, uma realidade s6. Agora, se- para a imagem da realidade, distingue o visível do "invisível, o mundo ma. terial do mundo espiritual, o corpo da alma. Deixou de ser monista. Tor. nou-se animista, isto é, as coisas e os seres têm anima, alma, uma rea. lidade invisívél e impalpável. Possuído lia capacidade de abstrair, substituir a imagem visual por um símbolo ou um signo. A capacidade de abstrair o está levando à possibilidade de escrever. Já adquiriu, certamente, a .mais elevada das abstrações - a crença . na imortalidade da alma. . Mais
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