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RESUMO COSTUME/ PLURALISMO/ DIREITO SUBJETIVO

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COSTUME PLURALISMO JURÍDICO HISTORICIDADE DE D. SUBJETIVOS
TEXTO LONGO
Inicialmente, caracteriza-se a emergência e a crise de um projeto moderno de sociabilidade, identificado com os 
interesses da burguesia enquanto classe social em ascensão, com o modo de produção capitalista e com a propriedade 
privada dos meios de produção e que, no campo do direito, foi representado pela doutrina do monismo jurídico. Após, 
passa-se a análise do pluralismo jurídico enquanto projeto que se contrapõe à ideia de que o Estado é o único centro 
produtor de normatividade. Para tanto, caracteriza-se o pluralismo jurídico e as suas formas de manifestação nas 
sociedades atuais, com destaque para o direito de Pasárgada. Por fim, através de um diálogo entre os pensamentos da 
época, procura-se compreender as possibilidades do pluralismo jurídico dentro de um projeto maior de resgate da 
emancipação social.
As modificações originadas pelo esfacelamento do feudalismo e pela instauração do capitalismo, como modelo de 
desenvolvimento econômico e social, representaram uma nova forma de pensar e de agir do homem, assentada nos 
valores, crenças e interesses particulares de uma classe social que estava se consolidando no poder e que, para tanto, 
precisava difundir para toda a sociedade que a sua visão de mundo e seus padrões de comportamento econômico-social 
eram modernos e que deveriam, por isso, se generalizar e se eternizar para o bem de todos. Dessa forma, foi 
desenvolvido o projeto ocidental burguês de sociedade, caracterizado por ter como base de sustentação, sobretudo, a 
criação de um Estado Nacional Soberano, o modo de produção capitalista, a ideologia liberal-individualista e uma nova 
forma de racionalidade, livre de crenças, mitos, preconceitos e fantasias, de índole técnico-formal.
No campo do direito, referido projeto burguês de sociabilidade foi representado pela doutrina do monismo jurídico, 
segundo a qual em cada Estado há apenas um ordenamento jurídico: o ordenamento positivo estatal. Tal concepção 
atribuiu ao Estado Moderno o monopólio exclusivo da produção das normas jurídicas, ou seja, o Estado é o 
único agente legitimado capaz de criar legalidade para enquadrar as formas de relação social que vão se 
impondo
Contrapondo-se a essa compreensão, a sociologia e a antropologia jurídicas identificam a existência de uma pluralidade 
de ordenamentos jurídicos vigorando, ao mesmo tempo e em um mesma sociedade, já que o fenômeno jurídico não se 
esgota nas leis, e sim é fruto das relações sociais dentro de um projeto maior de resgate da emancipação social.
A modernidade apresenta-se como um momento de ruptura, um verdadeiro divisor de águas entre duas épocas 
distintas da história da humanidade ocidental: a primeira, que foi suplantada pelos tempos modernos, era 
caracterizada por uma sociedade dividida em estamentos, fundada na posse da terra e na produção agrária e se 
identificava com um tipo de sociabilidade fundada no domínio de relações de dependência pessoal, que 
ligavam o indivíduo à comunidade, através de relações de servidão ou de parentesco e a segunda, que estava 
surgindo a partir do desenvolvimento do mercado mundial, da expansão do modo de produção capitalista e da 
emergência, cada vez mais significativa, de uma classe social - a burguesia. Ao invés da descentralização 
econômica, social e política existente à época do regime feudal, o que a ascendente burguesia necessitava era 
de um Estado forte, centralizado, que protegesse a sua propriedade privada e favorecesse seu progresso 
material.
Esse modelo de direito, positivo e centrado no Estado, concebido como um corpo abstrato de leis gerais e 
aplicado através de uma justiça baseada em critérios técnico-formais, serviu adequadamente aos interesses da 
burguesia por mais de dois séculos, que, como dito anteriormente, necessitava de um poder centralizado e 
burocrático que lhe garantisse segurança e estabilidade.
Segundo o pensamento de Boaventura de Sousa Santos, a modernidade emergiu como um potencial e 
ambicioso paradigma socio-cultural que tinha por base a tensão entre regulação e emancipação social. 
Entretanto, a partir do momento em que o desenvolvimento e o progresso societal foram reduzidos ao 
desenvolvimento do capitalismo, a emancipação foi reduzida e transformou-se no duplo da regulação. Assim, 
positivismo apareceu como construção ideológica destinada a reduzir o progresso societal ao desenvolvimento 
capitalista, bem como imunizar a racionalidade contra a contaminação de qualquer irracionalidade não 
capitalista sendo, pois, a ciência moderna e o direito moderno as duas faces do
conhecimento-regulação.
 Conforme se pode observar, o fenômeno do pluralismo jurídico, apesar de ter sempre por base de
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sustentação a assertiva de que o Estado não é o único centro produtor de normatividade jurídica, possui
diferentes vertentes, que podem ter um caráter mais conservador, mais liberal ou mais radical. Griffiths 
reconhece a existência de dois tipos de pluralismo: aquele que é permitido pelo próprio Estado e aquele, 
realmente autêntico, que consegue desgarrar-se do controle estatal. Além disso, não se pode reduzir a uma 
categoria conceitual todas as formas de manifestação do pluralismo jurídico, pois as sociedades, apesar de 
serem juridicamente plurais, o são de forma diferentes. Essa diferenciação deriva da forma como os sistemas 
jurídicos existem e coexistem com o direito estatal, da influência que recebem do ordenamento oficial, do 
reconhecimento, por parte deste, da existência de normatividades paralelas.
O DIREITO DE PASÁRGADA
 
Boaventura de Sousa Santos, no livro O Discurso e o Poder, resultado de seus estudos empíricos, realizados 
durante os anos 70, numa comunidade do Rio de Janeiro, afirma e analisa a existência de um direito, diferente 
do estatal, que vigora naquela comunidade, fruto da organização social entre os moradores. A Comunidade de 
Pasárgada originou-se a partir de ocupações em terrenos particulares, razão pela qual é tida, pelo direito oficial 
estatal, como ilegal, dai o resultado de ser, praticamente, invisibilizada pelo Estado, conforme se constata da 
ausência de políticas públicas e da prestação de serviços públicos, entre eles, os mais básicos de infraestrutura, 
tais como o fornecimento de água e esgoto. Diante disso, seus moradores, geralmente, não são reconhecidos 
pelo Estado enquanto sujeito de direitos, mas tão somente como objetos de repressão criminal. Assim, diante da 
ausência do Estado e aqui destaca-se, em especial, do direito estatal, os moradores de Pasárgada acabam por 
se organizar, de forma a melhorar o desenvolvimento da comunidade e garantir a segurança e a ordem nas 
relações sociais.
 
O direito de Pasárgada, por não ser oficial, tem a sua validade restrita ao interior da comunidade. É 
caracterizado por ter um discurso jurídico informal e uma linguagem comum, diferentemente do formalismo 
jurídico, de linguajar rebuscado, imposto pelo direito positivo estatal. Analisando as diferenças entre o direito 
de Pasárgada e o direito estatal, Boaventura identifica, no primeiro, um espaço retórico maior.Nesta 
comunidade, as decisões, antes de se constituírem na aplicação direta de fatos à normas, são produtos da 
aplicação, gradual, provisória e reversível, de topoi, cuja carga normativa (extremamente vaga em abstrato) se 
vai especificando à medida que se envolve, pela argumentação, com a situação concreta, no intuito de se obter 
uma decisão que seja aceita pelas partes e pelo auditório relevante (composto, normalmente, por acompanhantes 
das partes).
Além disso, no direito de Pasárgada, as decisões assumem, via de regra, formas de mediação ou negociação, 
diferentemente do que ocorre no domínio do direito estatal, em que há a polarização entre vencedor e vencido. 
Outra diferenciação trazida por Boaventura, entre ambas as manifestações normativas, reside em que, no direito 
de Pasárgada, o discurso jurídico não é legalista, ao contrário, projeta um pensamento essencialmente comum e 
quotidiano, através de uma linguagem também comum, diferentemente do direito estatal, legalista e 
representado por uma linguagem técnica e rebuscada. No direito de Pasárgada, as distinções entre forma e 
conteúdo são pouco rígidas, sendo que os formalismos processuais, ao invés de se constituírem como o limite 
do discurso jurídico, como no caso do direito positivo estatal, são utilizados como argumentos. Diferentemente 
do direito estatal, o grau de institucionalização do direito de Pasárgada é muito pequeno, o que acarreta um 
baixo grau de especialização profissional e favorece “uma circulação retórica que tende a subverter qualquer 
divisão rígida do trabalho jurídico, o que, por esta via, potência a proximidade entre o agente privilegiado do 
discurso (o presidente) os demais participantes e o auditório”.
Ainda no que refere à diferenciação entre o direito de Pasárgada e o direito Estatal (denominado, pelos 
moradores, de direito do asfalto), percebe-se que, quanto aos instrumentos de coerção, o direito de Pasárgada, 
ao contrário do estatal, que dispõe de um amplo e institucionalizado aparato de coerção, somente os possui de 
maneira escassa, sendo que os principais instrumentos de coerção acabam sendo a ameaça e o discurso da 
violência.
Contudo, apesar da existência de um direito paralelo ao direito estatal, e das diferenças entre ambos, percebe-se 
uma constante interação entre esses ordenamentos jurídicos. O direito de Pasárgada recorre, frequentemente, ao 
direito oficial, ainda que somente a título argumentativo, seja para se legitimar, seja para construir um 
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ambiente de maior oficialidade ou seja, ainda, para impor as suas decisões, através da ameaça da aplicação do 
direito estatal, caso haja o descumprimento das regras de conduta estabelecidas pela comunidade.
A análise do estudo realizado por Boaventura demonstra que o direito de Pasárgada é um autêntico sistema 
normativo, fruto da organização social dos membros desta comunidade, e existente em razão da exclusão 
jurídica estatal. Apesar desta manifestação normativa ser caracterizada por pluralismo jurídico, este fenômeno 
vem se re-configurando em uma nova forma de expressão jurídica, identificada com a mobilização de diversos 
atores sociais em torno de resistências e de lutas contra as práticas desiguais e excludentes oriundas do 
neoliberalismo e com a reafirmação dos sistemas jurídicos não estatais.
PLURALISMO JURÍDICO CONTRA-HEGEMôNICO DE TEOR COMUNITÁRIO-PARTICIPATIVO
 
A normatividade jurídica não estatal, que se identifica como pluralismo jurídico, pode ser designada, segundo 
Boaventura por hegemônica ou contra-hegemônica. Com o primeiro caso, identificam-se as práticas jurídicas 
que, apesar de não hegemônicas, reafirmam a ideologia neoliberal e as práticas de exclusão/desigualdade social. 
Já com a segunda, identificam-se as que procuram diminuir, senão suprimir, as desigualdades na relação de 
poder e as desigualdades sociais delas consequentes e, por isso, são comprometidas com um novo horizonte de 
legalidade, capaz de aproximar a produção do direito com a sociedade civil e concretizar um ideal de 
sociedade mais justa e igualitária. O pluralismo jurídico contra-hegemônico insere-se, assim, num contexto mais 
amplo que, a partir da crise da modernidade, descontinuou-se como possibilidade de resgate da emancipação 
social. Contudo, para que isso seja possível, é necessário que se pense uma outra forma de política e de 
direito, identificados por Boaventura como globalização contra-hegemônica, mais especificamente, por 
cosmopolitismo subalterno.
No que se refere ao campo jurídico, insere-se a necessidade de se "despensar" o direito, de forma a 
compreendê-lo não como um conjunto de leis, gerais e abstratas, emanadas exclusivamente pelo Estado e 
baseado em critérios lógico-formais, mas sim como produto da vida em sociedade e, por isso, identificado 
com os mais diversos grupos sociais. Assim, as práticas normativas tidas por subalternas, que sempre existiram 
à margem do sistema normativo estatal, devem ser reconhecidas e passarem a compor o próprio conceito de 
direito. Referidas práticas são identificadas pelo autor em três tipos: práticas que, apesar de terem sido 
desenvolvidos no ocidente, foram suprimidas ou marginalizadas pela concepção dominante; práticas 
desenvolvidas fora da tradição ocidental, em especial nas colônias e, posteriormente, nos países pós-coloniais 
e, por último, concepções e práticas propostas por pelos movimentos sociais que se identificam com a 
globalização contra-hegemônica. Ressalte-se, entretanto, que, para que essas práticas conduzam à legalidade 
cosmopolita, é necessário que reduzam a relação desigual de poder e, consequentemente, a exclusão social, 
tornando a obrigação política horizontal, caracterizada pela autoridade compartilhada. 
Na mesma linha de pensamento de Boaventura de Sousa Santos, Wolkmer propõe, com o exaurimento do atual 
paradigma dominante na Ciência Jurídica, um novo paradigma jurídico, de teor comunitário-participativo, 
identificado com uma outra forma de legalidade, comprometida com a emancipação social e oriunda dos 
valores e das práticas dos movimentos sociais que se contrapõem à globalização hegemônica. Esse novo 
projeto deriva, pois, das práticas sociais insurgentes, motivadas para a satisfação de necessidades essenciais.
Contudo, para a consolidação desse projeto de pluralismo jurídico é necessário se rediscutir questões como as 
relacionadas as fontes, os fundamentos e o objeto do direito, buscando-se, dessa forma, aduzir a um novo 
direito, produzido pela própria comunidade, e não mais unicamente pelo Estado.
Assim, os novos pressupostos do pluralismo jurídico são identificados com os sujeitos coletivos de direito, o 
sistema de necessidades humanas, a descentralização e participação política, a consolidação de uma ética de 
austeridade e a construção de uma racionalidade emancipatória. Novos sujeitos coletivos de direito são os que 
se articulam em torno das exigências de dignidade,de participação, de satisfação mais justa e igualitária das 
necessidades humanas fundamentais de grande parcela da população e que, por isso, são capazes de 
impulsionar mudanças no projeto histórico-social.
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O sistema de necessidades fundamentais foi justificado a partir do surgimento dos novos sujeitos coletivos de 
direito, e existe em função da situação de privação e carência, de toda ordem, por que vivem os segmentos 
socialmente excluídos. Quanto aos demais pressupostos do pluralismo comunitário-participativo ressalta-se a 
exigência de implementação de uma política democrática que direcione e ao mesmo tempo reproduza um 
espaço comunitário descentralizado e participativo; a necessidade de formulação de uma ética, comprometida 
com a dignidade o outro, em contraposição à cultura individualista moderna; e a elaboração de uma 
racionalidade de caráter emancipatório, de caráter dialético e gerado no próprio cotidiano da vida social. 
Na formação dessa nova cultura, advinda da interação entre a prática e a teoria, deverão estar presentes os 
valores caracterizadores dos novos sujeitos coletivos, tais como a identidade, a autonomia, a participação, a 
satisfação das necessidades fundamentais, entre outros. Como referida forma de pluralismo jurídico está 
comprometida com os ideias de uma sociedade mais justa e igualitária, seus atores travam as suas lutas em 
torno da diminuição da desigualdade na relação de poder e da emancipação dos grupos sociais. 
O pluralismo, como projeto de emancipação, legitima-se, portanto, nas práticas sociais, de subjetividades 
insurgentes e participativas dos novos sujeitos coletivos de direito, que, ao direcionar sua luta cotidiana para a 
satisfação das necessidades humanas fundamentais e para a redução das relações desiguais de poder, são 
verdadeiros sujeitos produtores de direito.
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TEXTO CURTO PARA RESPOSTA
Com a crise do paradigma da modernidade, descortina-se o espaço para a retomada da tensão entre regulação 
e emancipação social. No campo jurídico, a crise desse paradigma representou o esgotamento de seu principal 
pilar de sustentação: o monismo jurídico, segundo o qual o Estado é a única fonte produtora de normatividade 
jurídica.
Como contraponto à referida doutrina, ressurge o pluralismo que, apesar de apresentar-se de múltiplas formas, 
e, por isso, não poder ser categorizado em apenas uma instância de análise, tem como ponto de convergência 
a tese segundo a qual existem diversos sistemas normativos operando ao mesmo tempo e no mesmo espaço 
geopolítico. Como o direito é fruto das relações sociais, a sua produção não é, e nem poderia ser, monopólio 
do Estado.
A análise do sistema jurídico de Pasárgada deixa claro a sua manifestação enquanto sistema plural. Entretanto, 
referido pluralismo reflete tão somente uma forma de organização das relações sociais entre os moradores da 
comunidade, oriunda da falta da ausência do direito estatal, em que a associação de moradores passa a ser o 
espaço jurídico preferencial. 
Enquanto fenômeno social, apresenta-se de diversas formas, desde a mais conservadora, que reforça a prática 
jurídica neoliberal e hegemônica, e que, por isso, contribui para a manutenção do status quo até a mais 
progressista, comprometida com a emancipação dos grupos sociais excluídos.
Dessa forma, privilegiando-se o pluralismo contra-hegemônico, porque indutor de mudanças estruturais no 
Estado e na sociabilidade, procurou-se, através de um diálogo entre os pensamentos de Boaventura de Sousa 
Santos e de Antônio Carlos Wolkmer, buscar-lhe os fundamentos e a legitimidade enquanto projeto jurídico.
Percebeu-se que, para a construção desse novo paradigma, é necessário, primeiramente “despensar" o direito 
moderno, concebido como um conjunto de leis, gerais e abstratas, emanadas pelo Estado, de forma a 
compreendê-lo como fruto das relações sociais e, por isso, concebido a todo instante, pelos mais variados 
grupos sociais.
Os fundamentos desse projeto o não são encontrados em um sistema ordenado de leis advindas do Estado, e a 
sua legitimidade não está adstrita ao fato de ter sido produzido a partir de um conjunto de regras processuais 
racionalmente estabelecidas, mas sim nas práticas sociais dos novos sujeitos coletivos de direito que articulam a 
sua luta em torno de um projeto que promova a satisfação das necessidades humanas fundamentais dos 
segmentos sociais excluídos, dentro da perspectiva da construção política e jurídica participativa e 
descentralizada.

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