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DEFINIÇÃO 01 2 REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DO ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA (EIV) Benny Schvasberg Conforme preconizado pelo Estatuto da Cidade, o EIV – Estudo de Impacto de Vizinhança constitui um instrumento da política urbana municipal, instituído pelo Estatuto da Cidade, Lei Federal nº. 10.257/01, destinado a promover uma melhor distribuição de benefícios e ônus do processo de urbanização. O EIV, assim como os demais instrumentos de política urbana, vincula-se aos princípios constitucionais do cumprimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, especialmente: A promoção da gestão urbana democrática e participativa; O planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas no território municipal, de modo a evitar e corrigir distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente; A ordenação e controle do uso do solo, para evitar: a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos; b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes; c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivo ou inadequado em relação à infraestrutura urbana; d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infraestrutura correspondente. Nesse contexto, o papel precípuo do EIV é analisar e informar previamente à gestão territorial quanto às repercussões da implantação de um empreendimento no território, para que seja avaliado na ótica da harmonia entre os interesses particulares e o interesse público. Desse modo, três aspectos do EIV ficam bem demarcados nestas definições, como veremos a seguir. O EIV como estudo de natureza técnica O EIV é um documento técnico cuja elaboração é, via de regra, prévia à aprovação, autorização de construção e licenciamento de determinadas atividades e empreendimentos, públicos ou privados, a fim de examinar ex-ante as consequências positivas e negativas de sua implantação sobre a vizinhança. Ele orienta tanto a prefeitura no julgamento e análise de projetos potencialmente geradores de impacto urbano, quanto aos moradores sobre aqueles impactos. 02 A partir do EIV, é possível negociar alterações otimizadoras na concepção arquitetônica e urbanística de projetos para que promovam, por exemplo, alterações na área construída, na disponibilidade de áreas verdes ou de uso comunitário no interior do empreendimento, resultando em maior eficiência e eficácia em termos da infraestrutura urbana a ser utilizada. Por essas razões é recomendável, sempre que possível, a realização do EIV prévio. No entanto, o EIV pode também ser elaborado após o empreendimento ser parcial ou integralmente implementado. Nesse caso, possui um caráter de avaliação pós-ocupação, quando a implantação do empreendimento passou a interferir de alguma forma na vizinhança. O pressuposto do EIV pós- implantação é que os impactos negativos de vizinhança avaliados não podem ser considerados como “fato consumado”, mas como passiveis de medidas mitigadoras, mesmo que a posteriori. Inclusive, considerando a existência de eventuais fatos urbanos novos posteriores à implantação do empreendimento, que deverão ser agregados aos conteúdos do EIV. O EIV como instrumento de política urbana e de garantia do cumprimento da função social da cidade A elaboração do EIV, sobretudo de forma prévia à aprovação e licenciamento do empreendimento, pode antecipar e minimizar problemas e dores de cabeça para a comunidade, os quais só seriam sofridos posteriormente. Contudo, apesar da possibilidade de ensejar mudanças projetuais, o EIV não pode ser considerado um instrumento de controle edilício como o Código de Obras e Edificações. O instrumento destina-se a garantir o bem-estar social e os direitos coletivos da população ao ambiente urbano saudável e não a regulamentar a elaboração de projetos e obras de modo geral. Um empreendimento em conformidade com as regras urbanísticas e edilícias vigentes pode estar sujeito a EIV, caso represente causa de impactos em potencial, os quais (juntamente com as formas e medidas de mitigação) não são, na maioria dos casos, previstos nas normas e legislação urbanística em vigor. Assim, identificados os impactos gerados e sua magnitude, o licenciamento pode ser condicionado à adoção de medidas mitigadoras ou mesmo negado. Essa possibilidade representa uma grande inovação na cultura técnica de licenciamento, que, tradicionalmente, tende a se restringir à análise de conformidade – urbanística e edilícia – dos projetos, atividades e ou empreendimentos a partir dos regramentos gerais estabelecidos. O EIV se constitui, assim, em instrumento efetivo de gestão urbana, podendo inclusive ser uma fonte de economia para o setor público que teria que arcar com custos decorrentes de ações necessárias para a mitigação daqueles impactos. 03 O EIV como instrumento de mediação de conflitos O EIV consiste em uma nova estratégia de gestão que incorpora a ideia de participação do cidadão em processos decisórios sobre o destino da cidade. Na medida em que é capaz de constituir arenas de diálogo nas quais a disputa de interesses particulares e coletivos pode pactuar soluções mediadas pelo poder público, o EIV pode funcionar como instrumento de mediação de conflitos. A partir desse ponto, pode-se inferir que os interessados na aprovação dos projetos de empreendimentos sujeitos ao EIV não se limitam ao poder público, proprietários, projetistas e empreendedores. Incluem também a vizinhança imediata e, a depender do porte e dos impactos dos empreendimentos, os moradores do bairro ou da cidade em seu conjunto, contribuindo para a consolidação dos princípios da gestão democrática. Atividades temporárias e esporádicas tais como festivais, feiras, eventos culturais e esportivos, frequentemente são geradoras de incômodos diversos e impactos de vizinhança. O EIV dessas atividades indica impactos e formas de mitigação ou compensações. Constitui-se, assim, em mecanismo que favorece as partes envolvidas – vizinhança e poder público - na pactuação de soluções que conciliem interesses particulares e coletivos. O EIV e a manutenção do interesse público De modo geral, a utilização do EIV é motivada pela preocupação com a ordem urbanística e pelo uso socialmente justo e ambientalmente equilibrado dos serviços, bens, equipamentos e infraestrutura da cidade, incluindo a população urbana como um ator central na decisão de implantação ou autorização de determinado empreendimento ou atividade na cidade. Na cultura urbana brasileira, no entanto, não é raro se deparar com posturas conservadoras ou exclusivistas, tanto por parte de moradores quanto dos técnicos das prefeituras, que podem desviar a atenção da finalidade real do instrumento da promoção do equilíbrio entre os usos e atividades no território das cidades para a preservação dos interesses privados de um grupo de pessoas. Sob esse aspecto, cabe destacar que a noção de vizinhança para fins de EIV não se limita aos vizinhos residentes, mas também a outras pessoas que, ainda que não sejam moradores, desenvolvem atividades localizadas nas proximidades da obra ou da atividade, como usuários de escolas, entidades assistenciais e outros que usufruem das redes de infraestrutura, serviços e equipamentos instalados. Nesse sentido, deve-se ter cuidado para que a avaliação do EIV esteja sempre vinculada ao interesse público e coletivo, identificando-se, nesse processo, interesses de grupos individuais que podem gerar conflitos e desviar o instrumento do seu objetivo primeiro. 04 ASPECTOS E CONTEÚDOS DO EIV O EIV deve examinar informações acerca dos mais variados aspectosdecorrentes não só da implantação do empreendimento ou atividade em si, mas também de seu potencial de alteração das características urbanas pré-existentes. Embora os aspectos negativos tenham preponderância em razão de merecerem maior atenção nos conteúdos do EIV, não se deve perder de vista os impactos positivos a serem avaliados e otimizados. Para uma aplicação equilibrada do EIV, é imprescindível a análise da relação risco-benefício quase sempre envolvida na implantação da atividade ou empreendimento impactante. tanto na sua vizinhança imediata, quanto na vida urbana de forma mais ampla. É importante a busca de soluções viáveis e pactuadas para a cidade e seus diversos segmentos sociais. O artigo 37 do Estatuto da Cidade relaciona aspectos mínimos a serem analisados no EIV tais como: adensamento populacional em relação aos equipamentos urbanos e comunitários disponíveis, à geração de tráfego e à demanda por transporte público; preservação da qualidade ambiental, à luz do uso e da ocupação do solo, a ventilação e a iluminação, a paisagem urbana e os patrimônios natural e cultural; aspectos econômicos, considerando a valorização imobiliária decorrente da instalação do novo empreendimento. Todavia, o Estatuto da Cidade permite também que os municípios, na sua regulamentação, acrescentem outros aspectos conforme suas especificidades. Vamos exemplificar a seguir os aspectos de avaliação do EIV listados no artigo 37 do Estatuto da Cidade. Adensamento populacional No que se refere a quantificar o aumento populacional provocado pela implantação ou ampliação de atividade ou empreendimento, o acréscimo pode não ser direto, sobre a população que irá habitar o edifício, mas também à população atraída para o entorno por questões relacionadas ao empreendimento como geração de emprego ou melhorias no bairro. A estimativa de adensamento populacional ao longo do tempo é parâmetro útil a outras avaliações consideradas no estudo, tais como: capacidade da infraestrutura atual e acrescida; quantificação dos equipamentos comunitários; geração de tráfego e demanda por transporte público. Deve ser feita projeção de tempo para esse aumento populacional atingir seu limite e estabilizar, planejando a sincronia de execução dos serviços necessários a essa população. 05 Equipamentos urbanos e comunitários Na Lei Federal 6.766/79, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, consideram-se equipamentos públicos comunitários aqueles destinados à educação, cultura, saúde, lazer e similares (Art. 4º, §2º). Equipamentos públicos urbanos são aqueles destinados ao abastecimento de água, coleta e tratamento de esgotos, energia elétrica, coletas de águas pluviais, rede de telefonia e gás canalizado (Art. 5º, §1º). O EIV deve elencar quantidade e tipos de equipamentos comunitários existentes e sua capacidade de atendimento de acordo com o raio de abrangência da intervenção proposta. Deve, ainda, relacionar a capacidade de atendimento com a projeção de população futura, propondo a ampliação dos equipamentos existentes ou criação de novos para atender à demanda decorrente da implantação do empreendimento. Em relação aos equipamentos públicos urbanos, o EIV deve verificar a compatibilidade entre o empreendimento proposto e a capacidade das redes de infraestrutura, considerando a variação no contingente populacional (morador e usuário) da vizinhança decorrente do empreendimento. Uso e ocupação do solo e valorização imobiliária Quanto ao uso e ocupação do solo, cabe ao EIV indicar as tendências de mudança de uso do solo e transformações urbanísticas induzidas pelo empreendimento. Existem empreendimentos que geram alterações profundas na dinâmica urbana local que, em médio e longo prazos, tendem a alterar a configuração espacial e a concentração ou dispersão de atividades e, consequentemente, os preços dos imóveis nas imediações. A valorização imobiliária pode ser fator positivo ou negativo. Em áreas degradadas, como antigos centros de cidade ou zonas portuárias abandonadas, a instalação de atividades geradoras de valorização imobiliária desperta interesses no desenvolvimento e reocupação dessas áreas. Entretanto, essa valorização pode ter efeitos perversos para a população residente, geralmente de baixa renda, como a segregação social ou expulsão “indireta” em decorrência do aumento dos aluguéis e taxas nesses locais. O EIV deve, então, apontar para soluções e contrapartidas que minimizem tais efeitos, lembrando que a valorização imobiliária privada derivada de ações públicas (obras ou alterações normativas) deve estar sujeita a mecanismos de recuperação de parte dessa valorização para a coletividade. 06 Mobilidade urbana: geração de tráfego e demanda por transporte público Um dos maiores desafios do planejamento urbano contemporâneo é lidar com excessos de tráfego de veículos, especialmente particulares. A cultura do carro particular, junto à deficiência de transporte público e o baixo estímulo aos modos não motorizados abarrotam as cidades brasileiras e comprometem a mobilidade urbana. Assim, um aspecto básico dos impactos de qualquer empreendimento é o incremento de veículos nas imediações e seus efeitos na malha urbana. Interferências na mobilidade urbana durante as obras devido a fechamento parcial de vias e obstrução de passeios públicos é um outro aspecto da avaliação. Com o propósito de amenizar o impacto ao longo da implantação do empreendimento, o EIV deve apresentar ajustes ao traçado e dimensionamento do sistema viário, semáforos, sinalizações, entre outros; Para atender a população atraída pelo empreendimento, cabe elaborar um estudo de mobilidade quantificando o aumento do número de viagens e demanda por linhas de transporte, paradas de ônibus, etc. Alerta-se para os cuidados na delimitação da área de estudo de tráfego no EIV, pois o impacto de um empreendimento isolado não é sentido exclusivamente na sua vizinhança imediata; ele irradia consequências de sobrecarga em acessos a vias e artérias próximas, uma vez que o sistema viário é interdependente e acumula seus efeitos. Aspectos bioclimáticos: ventilação, iluminação e outros O EIV deve analisar aspectos de conforto ambiental relacionados à circulação de ar, iluminação natural e aumento de temperatura, considerando os fatores relacionados às condições climáticas e regionais específicas que influenciam o microclima urbano, como variações da umidade e regime de chuvas. Devem ser observadas a adequabilidade dos espaços vazios entre as construções, a proporção entre áreas verdes e impermeabilizadas, a formação de ilhas de calor ou de túneis de vento e, ainda, o sombreamento excessivo das edificações vizinhas. Outro ponto, é a análise de geração de poluição sonora direta (gerada pelo empreendimento) e indireta, consequência das transformações urbanas decorrentes, como a intensificação de tráfego, por exemplo. Além disso, softwares de simulação permitem, atualmente, uma melhor visualização dos impactos dessa natureza, permitindo a comparação de desempenho e diagnósticos bioclimáticos. 07 Paisagem urbana e patrimônio natural e cultural Os principais impactos a serem verificados nesse item referem-se aos riscos de descaracterização da paisagem natural e do patrimônio cultural de uma cidade frente a interesses econômicos e imobiliários. Em relação à arquitetura dos empreendimentos, devem ser evitados conflitos com a identidade e a legibilidade da paisagem urbana do entorno. EIV x EIA O art. 38 do Estatuto da Cidade esclarece a dúvida, bastante comum, de que a elaboração do estudo de impacto de vizinhança não substitui a elaboração e a aprovação do estudo prévio de impacto ambiental (EIA), quando a legislaçãoambiental assim o exige. Ainda que os instrumentos não se confundam, no âmbito de uma política de planejamento e gestão urbano-ambiental integrada, deve-se, sempre que possível, sintetizar as recomendações técnicas das duas áreas em um documento único, oferecendo maior confiabilidade aos processos de aprovação de projetos e complementaridade entre licenciamento urbanístico e ambiental de atividades. Nesses termos, devem ser incluídos no estudo ambiental previsto em lei, os requisitos básicos para elaboração do EIV, conforme definido pelo Estatuto da Cidade. REGULAMENTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DO EIV Passaremos, então, a tratar de alguns dos aspectos que devemos tomar com respeito à elaboração do EIV, sua regulamentação e implementação, que deverão considerar os seguintes componentes fundamentais: 1. Portes e/ou tipos de empreendimentos ou atividades para os quais é exigível o EIV; 2. Critérios para definição da área de influência (vizinhança) de empreendimentos ou atividades sujeitas ao EIV; 3. Critérios para a definição de medidas mitigadoras, compensatórias e condicionadoras da aprovação do empreendimento ou atividade; 4. Fluxos e competências: momento do processo de licenciamento em que é exigível o EIV e atribuições do poder público e dos empreendedores na elaboração, análise e aprovação do EIV; 5. Controle social: publicização dos documentos do EIV e processos de participação da comunidade ou vizinhança na avaliação do empreendimento objeto do EIV. 08 Definição das atividades/empreendimentos sujeitos a EIV Os empreendimentos e atividades cabíveis de exigência do EIV devem estar listados em lei específica regulamentadora do EIV, ou nas normas de gabarito, uso e ocupação do solo, vigentes no município. O Conselho das Cidades, por meio da Resolução 34/2005, recomenda que essa definição esteja no plano diretor, ou em lei específica baseada nele, pois deve dialogar com os objetivos estratégicos do desenvolvimento urbano e as diretrizes de ordenamento do território para aplicar a função social da cidade e da propriedade. Com base nessas diretrizes e sua projeção espacial que devem ser decididas quais as atividades ou empreendimentos impactantes e condicionados à aprovação do EIV. Um dos critérios mais usados diz respeito ao porte do empreendimento. Exemplos de empreendimentos sujeitos a EIV devido ao porte presentes em algumas regulamentações do instrumento no Brasil: I. empreendimentos localizados em grandes áreas, entre 1,5 e 2,5 ha; II. empreendimentos que possuam grande área construída: em média áreas superiores a 10.000 m²; III. edificações não residenciais com grande área construída - média superior a 3.000 m²; IV. edificações não residenciais com área de estacionamento para veículos superior a 8.000 m² ou mais de 400 vagas destinadas a estacionamento de veículos. Para definir atividades e empreendimentos sujeitos ao EIV, podem ser usados critérios de porte ou de tipo de atividade, ou uma combinação de ambos. Contudo, é importante relacionar a classificação com a localização do empreendimento no território. Uma casa de festas em área residencial, por exemplo, pode ser impactante, mas em um setor isolado pode não oferecer impacto à vizinhança. Podem haver também casos especiais em que pode caber exigência de EIV, como os chamados impactos cumulativos, ou seja, considerar no estudo que os novos impactos se somam a outras atividades existentes, agregando escala e avolumando os efeitos na região de sua implantação. Eventuais casos omissos nas normas em vigor devem ser objeto de consulta especifica no órgão de gestão e planejamento urbano e territorial da prefeitura para verificação da sua compatibilidade e inserção urbana e a necessidade de elaboração de EIV. Deve-se atentar que uma exigência de EIV, por parte dos gestores sem amparo na legislação e normativa urbanística vigente, é passível de questionamento judicial por parte de empreendedores. 09 Definição da área de influência (vizinhança) A avaliação da área de influência está ligada à extensão dos efeitos e consequências que podem decorrer do empreendimento. Logo, essa definição exige precisão tecnicamente especificada em planta com os pontos de influência dos fatores de análise do projeto. A área de influência para análise do impacto de vizinhança é diferenciada de acordo com o porte e tipo do empreendimento, assim como de acordo com as características da área de implantação. Definição de medidas mitigadoras É um desafio identificar os efeitos positivos e negativos em uma análise de custo e benefício para uma equação razoável entre os ônus e bônus do empreendimento. Há empreendimentos que causam impactos, mas são também fundamentais para a cidade e o interesse público. Nesses casos, é preciso prever medidas mitigadoras ou compensatórias que devem ser dimensionadas com base em um exercício de busca pelo interesse coletivo. A prática mostra a necessidade de estabelecer um repertório de medidas ou uma matriz de relação entre zonas urbanas e atividades para parametrizar esse dimensionamento como condicionante da aprovação e licenciamento dos empreendimentos individuais ou em conjunto. Exemplificamos a seguir algumas das contrapartidas ou medidas compensatórias mais usuais: o adensamento populacional pode ter contrapartida na exigência de áreas verdes, estações elevatórias de esgoto, equipamentos coletivos como escolas e creches; impactos negativos sobre o mercado de trabalho podem ter contrapartida na oferta de postos de trabalho dentro do estabelecimento ou alternativas de recolocação profissional para os afetados; sobrecarregamento na infraestrutura viária pode ter contrapartida em investimentos de semaforização e transportes coletivos. É bom lembrar que, tal como ocorre na prática dos TACs – Termos de Ajustamento de Conduta (promovidos geralmente entre Ministério Público, Executivo Municipal e Empreendedores), as medidas mitigadoras previstas no EIV têm sua implantação estabelecida em um cronograma de execução que é parte de um compromisso firmado entre as partes. Normalmente, o compromisso formaliza que até a conclusão da execução do empreendimento, as medidas mitigadoras previstas sejam executadas conforme o cronograma, de forma que no momento da expedição do HABITE-SE as medidas mitigadoras já deverão ter sido implantadas. 10 Fluxos, competências e controle social A regulamentação do EIV não pode prescindir do estabelecimento claro dos procedimentos e fluxos do processo de aprovação . Estes podem variar conforme o porte do município e a capacidade técnica instalada, mas constituem, via de regra, um ciclo composto de etapas que vão desde a solicitação de análise de um empreendimento até sua aprovação final, passando pela análise e aprovação integral ou parcial do EIV; pelo estabelecimento de condicionantes e contrapartidas e, ainda, pela realização de audiências públicas e demais procedimentos de participação da comunidade. Junto à tramitação administrativa, a participação da população é outro fator indispensável para a qualificação e aplicação adequada do EIV. O processo de elaboração e aprovação do estudo deve, portanto, atentar para as reivindicações da comunidade de modo a readequar as medidas mitigadoras para que a comunidade ouvida tenha garantida sua livre manifestação, seus direitos e seu bem-estar quanto ao empreendimento ou atividade em questão. Mesmo a participação social sendo um elemento essencial para balizar a decisão do Poder Público, o EIV pode ser aprovado em detrimento da rejeição de setores da população. Isso porque a aprovação do EIV, assim como sua exigência para os empreendimentos e atividades previstos na legislação municipal, é uma prerrogativado Poder Público e não da comunidade. FATORES RELEVANTES PARA A IMPLEMENTAÇÃO DO EIV Para a implementação do EIV é essencial capacitar os quadros técnicos da prefeitura na área de fiscalização de atividades urbanas. É muito importante também que haja integração com a área de aprovação e licenciamento de projetos para consolidar uma cultura de gestão e planejamento urbano que viabilize a implantação do EIV e demais instrumentos de política urbana. O EIV deve ser realizado por profissionais habilitados, excetuando-se os profissionais do quadro da prefeitura ou por ela contratados, de forma a garantir a idoneidade e isenção da análise e aprovação do EIV. Recomenda-se que a prefeitura abra um cadastro de profissionais e empresas habilitadas para elaboração de EIV. A habilitação do profissional coordenador do EIV constitui um dos itens avaliados pela equipe de análise e aprovação do órgão público responsável. Em caso de dúvida, deve ser consultado o Conselho Regional de registro do profissional responsável acerca de sua habilitação para elaboração de EIV. 1 1 O “ciclo do EIV”, ou seja, as suas etapas de implementação são detalhadas no Caderno Técnico de Regulamentação e Implementação do Estudo de Impacto de Vizinhança 11 Audiências públicas formais e tecnocráticas cumprem um papel desencorajador do debate. Outros métodos como oficinas presenciais mistas ou virtuais via internet e o debate no espaço do próprio local do empreendimento podem ser experiências criativas estimulantes para a participação da comunidade. O fluxo de tramitação do EIV se vincula, em geral, ao processo de licenciamento e aprovação de construção, ampliação e funcionamento de empreendimentos ou atividades. Ele envolve quase sempre órgãos de controle urbanístico, edilício e ambiental. Quanto maior a integração e articulação entre equipes e setores da administração pública envolvida, maior será a agilidade dos prazos e dos procedimentos, além da própria efetividade do instrumento. A maioria dos municípios que implementa o EIV, opta por indicar um único órgão ou comissão de interface para a coordenação de todo o processo, em geral ligado às secretarias de urbanismo, planejamento ou desenvolvimento urbano. A transparência dos fluxos administrativos, incluindo os prazos e etapas, oferece garantia de direitos aos cidadãos e empreendedores, contribuindo para qualificar a gestão urbana. No planejamento e gestão urbana, a aplicação de qualquer instrumento ganha mais efetividade quando ocorre de forma complementar com outros. O EIV tem boas possibilidades de interação e complementaridade com as operações urbanas consorciadas, as outorgas onerosas (do direito de construir e da alteração de uso), a transferência do direito de construir e com a disciplina do parcelamento, uso e ocupação do solo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Obede Rodrigues. PASQUALETTO, Antônio. BANDEIRA, Otniel Alencar. Exigência Do Estudo De Impacto De Vizinhança Para Empreendimentos Residenciais Em Goiânia- GO. In: Centro Cinetifico conhecer. Disponível em: < http://www.conhecer.org.br/enciclop/2013b/MULTIDISCIPLINAR/EXIGENCIA.pdf>. Acesso em : 20115. AVZRADEL, Pedro Curvello Saavedra. EIV e EIA: compatibilização, processo decisório e sociedade de risco. Disponível em: <http://www.ibdu.org.br/imagens/EIVeEIA.pdf>. Acesso em: 2015. BASSUL, J.R. Estatuto da Cidade. Quem ganhou ? Quem perdeu ? Brasília: Senado Federal, 2005. BRASIL. Constituição (1988). Constituição [da] Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: 12 BRASIL. 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