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UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA - PRPGP CENTRO DE HUMANIDADES - CAMPUS III “OSMAR DE AQUINO” DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA DISCIPLINA: Geografia, Território e Planejamento Rural PROFESSORA MS.:Alecsandra Pereira da Costa Moreira ALUNAS: Mônica Alves Bezerra Rebeka Amaro dos Santos Sharlene da S. Bernardino RELATÓRIO DE AULA DE CAMPO REALIZADO NA COMUNIDADE QUILOMBOLA DE PARATIBE GUARABIRA 2010 COMUNIDADE QUILOMBOLA DE PARATIBE 1. LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO A Comunidade Quilombola de Paratibe está localizada no Estado da Paraíba, no município de João Pessoa, mais especificamente no Bairro do Valentina de Figueiredo, constituindo um quilombo urbano por estar dentro da cidade. Foi reconhecida pela Fundação Palmares em 11 de julho de 2006. (Ver Mapa 01) FONTE: MACENA, H. L. S. 2010. 2. DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES Realizamos a nossa aula de campo no dia 23 de julho de 2010. A qual teve como objetivo a compreensão do espaço quilombola sob a ótica dos estudos geográficos, que a partir de uma leitura da paisagem e entrevistas com os membros da comunidade, pudéssemos propor um planejamento territorial para área em questão. O ponto de partida da aula de campo foi na parada 118 da Integração, próximo ao Terminal Estadual Rodoviário de João Pessoa, por volta das 8:30 horas. Chegamos a Comunidade Quilombola de Paratibe às 10 horas, onde fomos recebidos pela estudante Jorlene, irmã da Ana, presidente da Associação da Comunidade. 1º Ponto: Núcleo 12 Irmãos O Núcleo 12 Irmãos recebeu este nome por ser formado por 12 irmãos que moram próximos. Neste núcleo, como em toda a comunidade, há coleta de lixo 3 vezes por semana, água encanada e luz elétrica. A água falta com frequência e a luz elétrica não flui bem. A maioria das casas tem fossas sépticas, e todas possuem banheiro dentro de casa. Existe um espaço aberto que é usado para fazer as festividades, já que a comunidade não possui um espaço físico para tal. As casas dos moradores foram beneficiadas pelo Projeto da Prefeitura Municipal de João Pessoa PSH – Programa de Subsidio Habitacional. SANTOS, R. A. Foto 01 – Casa Construída pelo PSH: as casas do PSH são padronizadas, possuem água encanada, caixa d’água, energia elétrica, através do Programa Luz para Todos, e placa identificadora do projeto afixada na frente da casa. SANTOS, R. A. Foto 02 – Horta Comunitária no Núcleo 12 Irmãos: apesar de projetos como este promover a Educação Ambiental, e da coleta regular do lixo, alguns moradores continuam a depositar lixo nos locais próximos às suas casas. 2º Ponto: Desmatamento realizado pela Energisa Uma grande área dentro da Comunidade Quilombola de Paratibe esta sendo desmatada pela Empresa responsável pela eletrificação do Estado da Paraíba – Energisa – a qual alega ser preciso para melhorar a energia no local. SANTOS, R. A. Foto 03 – Desmatamento realizado pela Energisa: A Energisa não consultou a comunidade para realizar esse desmatamento. E os supervisores quando notaram nossa presença, deram as costas para não osfotografarmos. 3º Ponto: Casa de Ana No decorrer desta visita à Comunidade, tivemos a oportunidade de conversar um pouco com Joseane (Ana). Ela que é presidente da Associação da Comunidade de Paratibe e Agente Comunitária de Saúde. Ana, muito atenciosa, falou-nos um pouco da Comunidade, dos problemas que ainda enfrentam e de algumas conquistas adquiridas. Segundo ela, a Comunidade ainda vêm lutando para ter acesso as políticas públicas, mas a mesma enfatizou o problema da falta de participação dos membros da comunidade. A qual é muito baixa, onde nem todos participam da Associação para propor ou até mesmo para ir à busca de melhorias, visto que é pequena a taxa que é cobrada pela Associação para se associar, de apenas três reais. Um outro problema destacado pela presidente é a expansão urbana, com o crescente número de residências naquele território. Ocorreu a redução de terra livre para trabalhar, onde os moradores que sobreviviam da agricultura não tem mais espaço suficiente para trabalhar, então vão em busca de outro meio para sua sobrevivência, dessa forma a profissão que mais se observa hoje na Comunidade, devido ao baixo nível de escolaridade dos moradores de Paratibe, é a de empregada doméstica, pedreiro e servente. Ainda de acordo com a presidente, a Comunidade ainda não possui nomes de ruas, números de casas o que significa um grande problema, impossibilitando dessa forma o serviço dos Correios na Comunidade. Hoje a Comunidade está dentro do programa social do pão e leite, possui escola, posto de saúde, mas não atende especificamente a Comunidade quilombola, mas sim todos os moradores em geral. 4º Ponto: Casa do Sr. Francisco (rezador) O próximo ponto a ser conhecido na Comunidade de Paratibe foi à casa do Sr. Francisco que é o rezador, cujo qual possui um importante papel para a Comunidade. Durante a nossa conversa o Sr. Francisco disse que não é natural da Paraíba, mas sim do Rio Grande do Norte. Mas, já faz muitos anos que veio para a Comunidade juntamente com sua família e que já se considera filho daquele local. O Sr. Francisco é pertencente á religião católica e espírita da Umbanda. Segundo o mesmo, muitas pessoas, tanto da própria Comunidade quanto de fora dela, vêm à sua casa para ele rezar. Daí a sua grande influência e credibilidade na Comunidade devido ao fato dele já ter feito muitas rezas, curas e de até ter sido entrevistado por jornais da Paraíba. Quando perguntado de como teria adquirido todo aquele conhecimento a cerca das rezas, ele nos afirmou que já nasceu com esse dom, que desde muito pequeno já tinha este prática de rezar muito. Nota-se com isso é que a imagem do rezador ainda é muito presente, principalmente em cidades de pequeno e médio porte, onde sua presença se dá com maior nitidez. Isto mostra que para algumas pessoas, apesar do tempo, à fé no rezador ainda se mantém viva, como também a proximidade que se estabelece entre o rezador e a Comunidade faz com que se perpetue cada vez mais a presença do rezador. BEZERRA, M.A. FOTO 04 – Visita à casa de Ana: Presidente da Associação Quilombola de Paratibe. BEZERRA, M. A. FOTO 05 – Sr. Francisco: rezador da Comunidade Quilombola de Paratibe. 5º Ponto: Núcleo Maribondo (Casa de D. Elza) O Núcleo Maribondo foi mais um ponto visitado dentro da Comunidade Quilombola de Paratibe, onde fomos recebidos por D.Elza, moradora deste núcleo. A mesma nos apresentou aquele local, falou um pouco dele, de como tudo era antigamente, dos problemas que ainda enfrentam, a exemplo do desemprego, e de algumas melhorias alcançadas. Dona Elza não soube nos informar a origem do nome do núcleo, o porquê de ser chamado de Maribondo, mas nos contou que, antigamente, naquele local tudo era mata e que havia muitas árvores frutíferas, a exemplo da mangueira, coqueiro, cajueiro, entre outras, e que sobreviviam da venda de seus frutos. Mas com o passar do tempo, o crescimento urbano modificou a paisagem local, e hoje, assim como toda a Comunidade, os moradores sobrevivem de outra forma, principalmente os homens, buscando emprego na construçãocivil. Dona Elza citou o exemplo de seu próprio filho, o qual trabalha como servente. Outro problema vivido pela Comunidade de Paratibe consiste no fato de não ser conhecida. Pois, segundo D. Elza a Comunidade permanece desconhecida para muitas pessoas de outras localidades. Ela disse que é um grande problema, principalmente quando é preciso colocar o seu endereço em algumas instituições, em hospitais, e entre outros locais, é preciso muitas vezes mencionar pontos de referência próximos ao local para situar as pessoas. SANTOS, R. A. FOTO 06 - Visita ao núcleo Maribondo, onde fomos recebidos pela moradora D. Elza. 3. PLANEJAMENTO TERRITORIAL A comunidade de Paratibe apresenta uma paisagem mesclada entre rural e urbano. A presidente da associação quilombola nos informou que a dificuldade em definir o território entre urbano e rural não se limita a dimensão paisagística, ela se apresenta também nos órgãos públicos que possuem atividade no local. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrário – INCRA - delimitou há algum tempo área como rural, no entanto a Prefeitura Municipal de João Pessoa classifica a mesma área como urbano. Vários problemas são causados por esta indefinição, um deles é o fato das ruas não serem nomeadas nem numeradas, o que dificulta a comunicação, pois, as únicas correspondências que chegam ao local são a contas de água e luz. Outra dificuldade gerada em reconhecer o espaço como sendo urbano está no fato de alguns membros da comunidade, que sobreviveram até então, da pesca e agricultura não terem direito a aposentadoria. Ana nos informou ainda que o território vem sendo remarcado para ser possível requerer junto a Fundação Cultural Palmares o reconhecimento territorial como espaço quilombola. Este reconhecimento tem demorado justamente, em virtude, de tanto o INCRA quanto a PMJP não apresentarem uma posição definitiva sobre o território. Na Associação da comunidade Quilombola são realizadas reuniões mensais, na busca por informar e conscientizar os membros sobre a importância de ser associado, para que a comunidade ganhe força e possa definitivamente ter seu território definido e reconhecido. Nesse sentido Haesbart, 2007 coloca que: O território é primeiro um valor, pois a existência e mesmo a imperiosa necessidade para a toda sociedade humana de estabelecer uma relação forte, ou mesmo, uma relação espiritual com seu espaço de vida, parece claramente estabelecida. (HAESBART, 2007 pág. 48) A especulação imobiliária, que é notável no local pela presença de condomínios particulares, granjas e alguns sítios também interferem na questão territorial, embora algumas obras estejam embargadas. Pois, os agentes imobiliários incitam os moradores para o fato de que quando o território vier a ser reconhecido como quilombo ele passará a ser coletivo o que impedirá vendas individualmente. Esta constatação leva muitos membros da comunidade a não se associarem, o que acaba por dificultar o processo de reconhecimento. A moradora Jorlene nos informou ainda, que a única escola local que só tem o ensino fundamental, se recusa a trabalhar temas relacionados à cultura africana. O que dificulta ainda mais que muitas pessoas da comunidade - a maioria mestiça - a não se reconhecerem como negros. Ao refletirmos sobre a situação territorial da comunidade percebemos que uma série de medidas precisam ser tomadas para que a comunidade ganhe reconhecimento territorial. A primeira delas é uma política educacional que valorize a cultura africana, pois para Santos (1994), é fundamental conhecer a lógica interna da cultura para que suas práticas e costumes sejam aceitos e compreendidos. BERNARDINO, S. S. FOTO 11 - Condomínio particular: espaço privado dentro da Comunidade Quilombola. Assim, à medida que a identidade cultural da comunidade seja reforçada, ela manifestará maior força para requerer um território onde estes traços culturais sejam sinônimos de identidade territorial. A esse respeito, Bonnemaison e Cambrézy apud Haesbart, colocam que nas sociedades pré industriais; O território se definia por um princípio um princípio cultural de identificação ou se preferirmos, de pertencimento. Este princípio explica a intensidade da relação ao território. Ele não pode ser percebido apenas como uma posse ou como uma entidade exterior á sociedade que o habita. É uma parcela de identidade, fonte de uma relação de essência afetiva ou mesmo amorosa ao espaço. (HAESBART, 2007 pág. 50) . A efetivação identitária da comunidade enquanto quilombo reduzirá as questões internas sobre a posse da terra e levará a mesma a exigir com maior vigor, um posicionamento dos políticos e políticas públicas, já que estes tem historicamente uma dívida social imensa com etnia negra. Uma das possibilidades de resolução do impasse territorial na comunidade de Piratibe seria a desapropriação para fins sociais, pois a mesma visa reduzir as desigualdades sociais, desigualdades estas, que são visíveis na comunidade. 4. CONCLUSÃO A aula de campo realizada na comunidade de Piratibe levantou uma série de questionamentos a respeito das políticas de planejamento. Pois, nos depararmos com uma situação que muitos não tinham conhecimento. E que enquanto planejadores urbanos não soubemos apresentar uma solução imediata e efetiva para o impasse territorial que nos foi mostrado. Outro ponto muito proveitoso da pesquisa em campo foi conhecer um pouco mais de perto a cultura negra, já que a mesma foi negada de muitos de nós em virtude de uma política educacional racista e excludente. Dessa maneira, concluímos que a aula na comunidade de Piratibe nos levou a refletir que as questões territoriais não são simples de resolver. Sendo necessário analisar os fatores, culturais, políticos e identitários. REFERÊNCIAS HAESBART, Rogério. Concepções de Território para Entender a Desterritorialização. In: SANTOS, Milton... {et.al.}. Território, Territórios: ensaios sobre o ordenamento territorial. 3º Ed. Lamparina: São Paulo, 2007. MACENA, H. L. S. Acesso às políticas públicas pelas comunidades Quilombolas na Paraíba: uma análise das comunidades do Paratibe, Mituaçú e Pedra D’água. João Pessoa, 2010. (Monografia de graduação - UFPB) SANTOS, José Luís dos. O que é cultura. 14 ed. Brasiliense: São Paulo, 1994.
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