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Os Economistas Thomas Robert Malthus Ensaios sobre a população

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THOMAS ROBERT MALTHUS
ENSAIO SOBRE A POPULAÇÃO
*
Tradução de Antonio Alves Cury
*
 Traduzido de Population: The First Essay. Ann Arbor Paperbacks, The University of Michigan
Press, 1959.
PREFÁCIO
Este ensaio se originou de uma conversa com um amigo acerca
do tema do ensaio do Sr. Godwin sobre a avareza e a prodigalidade,
no seu Enquirer. A discussão começou com a questão geral sobre o
aperfeiçoamento futuro da sociedade, e o autor tinha inicialmente a
intenção de simplesmente expressar ao amigo seus pensamentos por
escrito de uma forma mais clara do que pensava que poderia fazê-lo
numa conversa. Como o assunto se lhe apresentou, ocorreram algumas
idéias que ele não se lembrava de ter percebido antes, e como pensou
que qualquer mínimo esclarecimento sobre um tema, no geral tão in-
teressante, poderia ser recebido com boa vontade, resolveu organizar
seus pensamentos de forma adequada para publicação.
O ensaio poderia ter sido, sem dúvida alguma, muito mais com-
pleto, mediante uma compilação de maior número de fatos na elucidação
da argumentação geral. Mas uma longa e quase completa interrupção
por causa de muitos negócios particulares, aliada a uma vontade (talvez
imprudente) de não atrasar muito além do prazo que originariamente
se propunha, impediram o autor de dar ao assunto uma completa aten-
ção. Ele supõe, contudo, que os fatos que expôs não servirão de base
para criar nenhuma evidência sem valor, por causa da validade de
sua opinião com relação ao aperfeiçoamento futuro da humanidade.
Atualmente, da forma que o autor concebe esta opinião, pouco mais
lhe ocorre ser necessário para fundamentá-la do que uma simples afir-
mação, além da mais superficial visão da sociedade.
É uma verdade óbvia, observada por muitos escritores, que a
população deve sempre ser mantida abaixo do nível dos meios de sub-
sistência; mas nenhum escritor que o autor cita investigou particular-
mente os meios pelos quais esse nível é atingido; é uma concepção
desses meios que constitui, no seu modo de pensar, o mais forte obs-
táculo no caminho de um grande aperfeiçoamento futuro da sociedade.
O autor espera que essa concepção surja da discussão deste interessante
assunto porque ele é movido unicamente por amor à verdade e não
por preconceito contra qualquer grupo de homens ou de opiniões. O
235
autor afirma ter lido alguns estudos sobre o aperfeiçoamento futuro
da sociedade com uma disposição de ânimo muito diferente do desejo
de achá-los visionários, mas ele não adquiriu aquele domínio sobre o
seu conhecimento que lhe possibilitaria crer no que queria, sem a evi-
dência, ou recusar sua aprovação ao que poderia ser desagradável quan-
do seguido da evidência.
Esse ponto de vista que o autor formulou sobre a vida humana
tem um aspecto sombrio mas ele percebe conscientemente que extraiu
essas negras tintas de uma convicção de que elas estão realmente no
quadro e não de uma visão parcial ou de uma depressão inerente ao
temperamento. O pensamento teórico que ele esboçou nos dois últimos
capítulos explica sua própria interpretação, de maneira satisfatória no
que diz respeito à existência da maioria dos males da vida, mas se
ele terá os mesmos efeitos sobre os outros, deve ser deixado ao julga-
mento de seus leitores.
Se o autor lograsse atrair a atenção dos homens mais capazes
para o que ele admite ser a principal dificuldade no caminho para o
aperfeiçoamento da sociedade e conseqüentemente tivesse essa dificul-
dade removida, mesmo na teoria, de bom grado, ele mudaria suas
atuais opiniões e se alegraria com a certeza de seu erro.
7 de junho de 1798
OS ECONOMISTAS
236
SUMÁRIO
CAPÍTULO I — A questão formulada. — Pequena perspectiva
para sua determinação a partir do antagonismo de suas
partes opostas. — O principal argumento contra a per-
fectibilidade do homem e da sociedade nunca foi respon-
dido adequadamente. — A natureza da dificuldade de-
corrente da população. — Resumo do principal argumento
do ensaio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 243
CAPÍTULO II — As diferentes proporções em que crescem a
população e o alimento. — As conseqüências necessárias
dessas diferentes proporções de crescimento. — A oscila-
ção produzida por elas na condição das classes mais bai-
xas da sociedade. — Razões pelas quais essa oscilação
não foi tão estudada como se poderia esperar. — Três
proposições de que depende o argumento geral do ensaio.
— Os diferentes estágios que a humanidade experimen-
tou, apresentados em uma análise com relação a essas
três proposições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 249
CAPÍTULO III — O estágio selvagem ou da caça, revisto re-
sumidamente. — O estágio do pastoreio ou as tribos de
bárbaros que invadiram o Império Romano. — A supe-
rioridade do poder de crescimento da população em com-
paração com os meios de subsistência. — A causa do gran-
de fluxo da emigração setentrional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 255
CAPÍTULO IV — O estágio das nações civilizadas. — A pro-
babilidade de que a Europa seja hoje muito mais populosa
do que na época de Júlio César. — O melhor critério
sobre o crescimento da população. — O provável erro de
Hume num dos critérios que ele propõe como auxiliar de
uma estimativa da população. — O lento crescimento da
população na atual idade, na maioria dos Estados da Eu-
237
ropa. — Os dois principais obstáculos ao crescimento da
população. — O primeiro, ou obstáculo preventivo, ana-
lisado com relação à Inglaterra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 261
CAPÍTULO V — O segundo, ou obstáculo positivo ao cresci-
mento da população na Inglaterra. — A verdadeira causa
pela qual a imensa soma arrecadada na Inglaterra para
os pobres não melhora sua condição. — A forte tendência
das leis dos pobres para invalidar seu próprio objetivo.
— O paliativo proposto para a miséria dos pobres. — A
absoluta impossibilidade decorrente das leis fixas de nos-
sa natureza de que a pressão da necessidade possa ser
sempre completamente eliminada das classes baixas da
sociedade. — Todos os obstáculos ao crescimento da po-
pulação podem ser reduzidos à miséria e ao vício . . . . . . 267
CAPÍTULO VI — As novas colônias. — As razões de seu rápido
crescimento. — As colônias norte-americanas. — O ex-
cepcional exemplo de crescimento dos núcleos coloniais
afastados. — A rapidez com que mesmo os velhos Estados
se recuperaram das devastações da guerra, da peste, da
fome ou dos cataclismos da natureza . . . . . . . . . . . . . . . . . 277
CAPÍTULO VII — A provável causa das epidemias. — Algumas
das tabelas do Sr. Susmilch. — Repetições periódicas de
estações insalubres previstas em determinados casos. — A
proporção de nascimentos em comparação com os óbitos,
em qualquer país e em breves períodos: um critério inade-
quado do crescimento real médio da população. — O melhor
critério de um permanente crescimento da população. — A
grande escassez dos meios de vida, uma das causas da fome
na China e no Hindustão. — A má intenção de um dos
artigos do Projeto de Lei dos Pobres do Sr. Pitt. — Um
único caminho adequado para estimular o crescimento da
população. — As causas da prosperidade das nações. —
Fome, o último e mais pavoroso método pelo qual a natureza
reprime o excesso da população. — As três proposições con-
sideradas como demonstradas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 281
CAPÍTULO VIII — O Sr. Wallace. — O erro de se supor que
a dificuldade provocada pela população está a uma grande
distância. — O esboço do Sr. Condorcet sobre o progresso
do espírito humano. — Período em que a oscilação men-
cionada peloSr. Condorcet deve ser aplicada à espécie
humana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 291
OS ECONOMISTAS
238
CAPÍTULO IX — A conjectura do Sr. Condorcet a respeito da
perfectibilidade orgânica do homem, e a continuação in-
definida da vida humana. — A falácia do argumento que
infere um progresso ilimitado de um aperfeiçoamento par-
cial; o limite que não pode ser verificado, exemplificado
com a procriação dos animais e o cultivo das plantas . . . . 295
CAPÍTULO X — O sistema de igualdade do Sr. Godwin. — O
erro de se atribuir todos os vícios da humanidade às ins-
tituições humanas. — A primeira resposta, totalmente
insuficiente, do Sr. Godwin à dificuldade resultante da
população. — O belo sistema de igualdade do Sr. Godwin
supostamente realizável. — Sua completa destruição,
simplesmente a partir do princípio da população, no curto
prazo de trinta anos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 301
CAPÍTULO XI — A conjectura do Sr. Godwin a respeito da
extinção futura da paixão entre os sexos. — Pequenas
bases tangíveis para tal suposição. — A paixão amorosa
conciliável com a razão ou com a virtude . . . . . . . . . . . . . 313
CAPÍTULO XII — A conjectura do Sr. Godwin com respeito à
continuação indefinida da vida humana. — Inferência ine-
xata a partir dos efeitos dos estimulantes mentais sobre
a estrutura humana, exemplificados em várias situações.
— Conjecturas não fundamentadas em algumas indi-
cações do passado não devem ser consideradas conjec-
turas filosóficas. — A conjectura do Sr. Godwin e do
Sr. Condorcet quanto ao acesso do homem à imortali-
dade na terra: um curioso exemplo da inconseqüência
do ceticismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 317
CAPÍTULO XIII — O erro do Sr. Godwin em considerar dema-
siadamente o homem do ponto de vista de um ser sim-
plesmente racional. — No complexo ser que é o homem,
as paixões sempre atuarão como forças perturbadoras nas
decisões da inteligência. — Os raciocínios de Godwin so-
bre o tema da coerção. — Algumas verdades por natureza
não comunicáveis de um homem para outro . . . . . . . . . . . 327
CAPÍTULO XIV — As cinco proposições não fundamentadas
do Sr. Godwin com relação à verdade política, das quais
depende todo o seu trabalho. — Razões que temos para
admitir, dada a miséria provocada pelo princípio de po-
pulação, que os vícios e a fraqueza moral do homem nunca
poderão ser totalmente erradicados. — A perfectibilidade,
MALTHUS
239
no sentido em que o Sr. Godwin usa o termo, não aplicável
ao homem. — A natureza da real perfectibilidade do ho-
mem devidamente explicada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 333
CAPÍTULO XV — Modelos demasiado perfeitos podem, algumas
vezes, mais impedir do que promover o aperfeiçoamento.
— O ensaio do Sr. Godwin sobre a avareza e a prodiga-
lidade. — A impossibilidade de dividir pacificamente en-
tre todos o trabalho necessário de uma sociedade. — Os
ataques ao trabalho podem produzir o mal presente com
pouca ou nenhuma possibilidade de se conseguir um bem
futuro. — Um crescimento do volume do trabalho agrícola
deve sempre ser um benefício para o trabalhador . . . . . . 339
CAPÍTULO XVI — O provável erro do Dr. Adam Smith em
apresentar todo o aumento da renda ou do capital de
uma sociedade como um aumento dos fundos para a ma-
nutenção do trabalho. — Situações em que um aumento
da riqueza pode não apresentar nenhuma tendência para
melhorar a condição do trabalho do pobre. — A Inglaterra
cresceu em riquezas sem um aumento proporcional dos
fundos para a manutenção do trabalho. — A situação dos
pobres da China não melhorou pelo aumento dos bens
produzidos pelas manufaturas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 347
CAPÍTULO XVII — A questão da definição adequada da riqueza
de um Estado. — A explicação dada pelos economistas
franceses para considerar todos os manufatores como tra-
balhadores improdutivos não é a verdadeira explicação.
— O trabalho dos artífices e dos manufatores é muito
produtivo para os indivíduos, não, porém, para o Estado.
— Um notável trecho dos dois volumes de estudos do Dr.
Price. — O erro do Dr. Price em atribuir a prosperidade
e o rápido povoamento da América principalmente a seu
particular estágio de civilização. — Nenhum proveito pode
ser esperado se fechamos nossos olhos às dificuldades na
busca do aperfeiçoamento da sociedade . . . . . . . . . . . . . . . 355
CAPÍTULO XVIII — A permanente pressão da miséria sobre
o homem, pelo princípio de população, parece orientar
nossas esperanças para o futuro. — O tempo de provação
inconciliável com nossas idéias da presciência de Deus.
— O mundo, provavelmente um forte processo para des-
pertar a matéria para a espiritualidade. — A teoria da
formação do espírito. — Os estímulos surgidos das ne-
OS ECONOMISTAS
240
cessidades do corpo. — Os estímulos surgidos da atuação
das leis gerais. — Os estímulos surgidos das dificuldades
de vida resultantes do princípio de população . . . . . . . . . 363
CAPÍTULO XIX — Os sofrimentos da vida necessários para
enternecer e humanizar o coração. — Os estímulos sur-
gidos da solidariedade social produzem freqüentemente
caracteres de uma ordem mais elevada do que os simples
possuidores de aptidões. — O mal moral provavelmente
necessário para a criação da perfeição moral. — Os es-
tímulos surgidos das necessidades intelectuais continua-
mente alimentados pela infinita diversidade da natureza
e a obscuridade que envolve os assuntos metafísicos. —
As dificuldades que tem a Revelação de ser explicada
com base nesse princípio. — O grau de evidência que
possuem as Escrituras, provavelmente mais apropriado
para o aperfeiçoamento das faculdades humanas e o pro-
gresso moral da humanidade. — A idéia de que o espírito
é formado pelos estímulos parece explicar a existência
do mal natural e moral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 371
MALTHUS
241
CAPÍTULO I
As grandes e inesperadas descobertas que ocorreram nos últimos
anos na filosofia natural, a crescente difusão do conhecimento geral a
partir do desenvolvimento da arte da impressão, o espírito de pesquisa
ativo e firme que predomina por todo o mundo letrado e mesmo no
iletrado, as novas e extraordinárias luzes que foram lançadas sobre
os assuntos políticos e que fascinam e chocam o intelecto, e especial-
mente o tremendo fenômeno de horizonte político — a Revolução Fran-
cesa, que, como um cometa resplandecente, parece destinado a infundir
nova vida e vigor ou a arrasar e destruir os tímidos habitantes da
terra —, tudo isso concorreu para converter muitos homens talentosos
à idéia de que nós estamos chegando a uma grande época, com as
mais importantes mudanças que, em certa medida, seriam decisivas
para a sorte futura da humanidade.
Tem sido dito que a grande questão está hoje em debate: se
doravante o homem se lançará para a frente, com velocidade acelerada,
em direção a um aperfeiçoamento ilimitado e até agora inimaginável,
ou se será condenado a uma permanente oscilação entre a prosperidade
e a miséria e, depois de todo esforço, ainda permanecerá a uma inco-
mensurável distância do objetivo desejado.
Entretanto, com a apreensão de todo amigo da humanidade
que deve esperar o fim desta aflitiva incerteza, e com o zelo da
mente indagadora que acolheria todo esclarecimento que pudesse
ajudar na sua visão do futuro, há muito a se lamentar que os es-
critores, em cada aspecto desta momentosa questão, ainda se man-
tenham a grande distância um do outro. Seus argumentos comuns
não chegam a um estudo imparcial.A questão não é levada a se
sustentar nos detalhes menores e, mesmo na teoria, parece estar
longe de se aproximar de um equacionamento.
O defensor dessa ordem de coisas é capaz de considerar a escola
dos filósofos especulativos como um bando de vilões astutos e enge-
nhosos que elogiam a caridade fervorosa e retratam quadros cativantes
de um estágio mais feliz da sociedade, somente o mais próprio para
243
torná-los capazes de destruir as atuais instituições e promover seus
planos grandiosos de ambição, ou como um bando de entusiastas sel-
vagens e loucos cujas especulações estúpidas e absurdos contra-sensos
não são dignos da atenção de nenhum homem sensato.
O defensor da perfectibilidade do homem e da sociedade devota
ao protetor das instituições igual desprezo. Ele o estigmatiza como
escravo dos preconceitos mais ridículos e tacanhos ou como defensor
dos abusos da sociedade civil, apenas porque se beneficia deles. Ele o
retrata como uma personalidade que prostitui sua inteligência de acordo
com seu interesse, ou como alguém cujos poderes do raciocínio não
têm dimensão para se empenhar em qualquer coisa grande e nobre,
que não consegue ver além de cinco jardas à sua frente e que deve
ser, por esse motivo, completamente incapaz de examinar os pontos
de vista do esclarecido benfeitor da humanidade.
Neste debate inamistoso, a causa da verdade não consegue senão
ter prejuízos. Os argumentos realmente bons, sobre cada aspecto da ques-
tão, não são reconhecidos como tendo seu valor próprio. Cada um adota
sua própria teoria, pouco interessado em corrigi-la ou aperfeiçoá-la por
uma preocupação com o que é desenvolvido pelos seus adversários.
O defensor da ordem atual das coisas condena todas as especu-
lações políticas em conjunto. Ele próprio não se permite examinar os
argumentos a partir dos quais é deduzida a perfectibilidade da socie-
dade. Muito menos se dará ele ao trabalho de modo franco e honesto
para empreender uma explicação de sua própria falácia.
Da mesma forma, o filósofo especulativo afronta a causa da ver-
dade. Com os olhos voltados para um estágio mais feliz da sociedade,
nos benefícios que ele pinta com as cores mais fascinantes, ele próprio
se permite deliciar-se com as mais cruéis diatribes contra toda presente
instituição, sem usar os seus talentos para estudar os meios mais se-
guros e melhores de eliminar os abusos e sem parecer conhecer os
terríveis obstáculos que ameaçam opor-se, mesmo na teoria, ao avanço
do homem em direção à perfeição.
É uma verdade reconhecida pela filosofia que uma teoria verda-
deira sempre será confirmada pela experiência. Entretanto, tanto atrito
e tantas pequenas circunstâncias ocorrem na prática que é quase im-
possível à inteligência mais aberta e perspicaz prever que, em poucos
assuntos, uma teoria possa ser declarada correta e que não tenha re-
sistido ao teste da experiência. Mas uma teoria não verificada na prática
não pode ser razoavelmente assegurada como provável, muito menos
como correta, até que todos os argumentos contra ela tenham sido
sabiamente confrontados e refutados clara e firmemente.
Li com grande prazer algumas especulações sobre a perfectibilidade
do homem e da sociedade. Fiquei entusiasmado e feliz com o quadro
encantador que descreveram. Anseio fervorosamente por esses venturosos
aperfeiçoamentos. Mas vejo, no meu entender, grandes e insuperáveis
OS ECONOMISTAS
244
dificuldades no seu caminho. É meu propósito expressar essas dificul-
dades, demonstrando, ao mesmo tempo, que longe de me regozijar com
elas, como um motivo de vitória sobre os amigos da novidade, nada
me daria mais prazer do que vê-las completamente eliminadas.
A argumentação mais importante que apresentarei certamente
não é nova. Os princípios sobre os quais está subordinada foram ex-
plicados parcialmente por Hume e, de modo mais geral, pelo Dr. Adam
Smith. A argumentação foi desenvolvida e aplicada ao atual tema,
embora sem o devido peso ou de acordo com um ponto de vista mais
convincente, pelo Sr. Wallace, e pode ter sido firmada, provavelmente,
por muitos escritores que nunca conheci. Eu, certamente, por esse mo-
tivo, nunca pensaria em desenvolver novamente essa argumentação,
embora pretenda colocá-la sob um ponto de vista de alguma forma
diferente de tudo que tenho visto até aqui, ainda que ela tenha sido
respondida de forma completa e satisfatória.
A causa desse descuido, por parte dos defensores da perfectibi-
lidade da humanidade, não é bem explicada. Não posso duvidar de
talentos de homens tais como Godwin e Condorcet. Estou relutante
em duvidar de sua imparcialidade. No meu entendimento, e provavel-
mente no de muitos outros, a dificuldade se revela insuperável. En-
tretanto, estes homens, de reconhecido discernimento e capacidade,
mal se dignam mencioná-la e mantêm o curso de suas especulações
com irrefreável entusiasmo e inquebrantável fé. Não tenho certamente
nenhum direito de dizer que eles fecham propositadamente seus olhos
a tais argumentos. Devo duvidar a priori da validade deles quando
negligenciados por tais pessoas, embora, forçosamente, sua verdade
possa chocar-se com o meu próprio pensamento. Entretanto, com relação
a isto, deve ser reconhecido que estamos todos por demais sujeitos a
errar. Se vi um copo de vinho reiteradamente oferecido a uma pessoa
e ela não tomou conhecimento disso, eu estaria inclinado a pensar que
ela era cega ou mal-educada. Uma filosofia mais justa poderia me
ensinar antes a pensar que meus olhos me enganavam e que o ofere-
cimento não era o que eu pensava que fosse.
Para introduzir o argumento devo pressupor que excluo da ques-
tão, no presente, todas as simples conjecturas, isto é, todas as supo-
sições, cujo provável conceito não pode ser inferido com base em quais-
quer premissas filosóficas legítimas. Um escritor pode dizer-me que
ele pensa que o homem se transformará finalmente num avestruz.
Propriamente não posso negá-lo. Mas antes que ele possa converter
qualquer pessoa sensata ao seu modo de ver, ele deveria mostrar que
o pescoço na espécie humana foi gradualmente se alongando, que os
lábios se tornaram mais grossos e mais salientes, que as pernas e os
pés estão permanentemente mudando sua forma e que o pêlo está
começando a transformar-se em tocos de penas. E, até que a probabi-
lidade de tão maravilhosa mutação possa ser demonstrada, certamente
MALTHUS
245
é perder tempo e retórica divagar sobre a felicidade do homem em tal
estágio: descrever seus poderes tanto de correr como voar, retratá-lo
numa situação em que todos os pequenos luxos sejam desprezados,
em que os homens se dedicariam somente a acumular as coisas ne-
cessárias à vida e em que, conseqüentemente, cada parcela de trabalho
do homem seria pequena, e grande sua parcela de lazer.
Penso que posso elaborar adequadamente dois postulados.
Primeiro: Que o alimento é necessário para a existência do homem.
Segundo: Que a paixão entre os sexos é necessária e que perma-
necerá aproximadamente em seu atual estágio.
Essas duas leis, desde que nós tivemos qualquer conhecimento
da humanidade, evidenciam ter sido leis fixas de nossa natureza e,
como nós não vimos até aqui nenhuma alteração nela, não temos o
direito de concluir que elas nunca deixarão de existir como existem
agora, sem um pronto ato de poder daquele Ser que primeiro ordenou
o sistema do universo e que para proveito de suas criaturas ainda faz,
de acordo com leis fixas, todas estas variadas operações.
Não conheço nenhum escritor que tenha admitido que nesta terra
o homem, fundamentalmente, seja capaz de viver sem alimento. Mas o
Sr. Godwin prognosticou que a paixão entre os sexos pode ser extinta
com o tempo. Contudo, como eleconsidera esta parte de seu trabalho um
desvio para o campo da conjectura, não insistirei mais sobre isso agora,
a não ser em afirmar que os melhores argumentos para provar a perfec-
tibilidade do homem provêm de um estudo do grande progresso que ele
já realizou desde o estado bárbaro e da dificuldade de dizer onde ele se
detém. Mas, com relação à extinção da paixão entre os sexos, nenhum
progresso, qualquer que ele seja, foi feito até aqui. Ela parece existir com
tanto ímpeto agora como existia há dois ou há quatro mil anos. Existem
exceções hoje como sempre existiram. Mas, como essas exceções não pa-
recem crescer numericamente, decerto seria uma demonstração antifilo-
sófica inferir, simplesmente a partir da existência de uma exceção, que
a exceção com o tempo se tornaria a regra e a regra a exceção.
Então, adotando meus postulados como certos, afirmo que o poder
de crescimento da população é indefinidamente maior do que o poder
que tem a terra de produzir meios de subsistência para o homem.
A população, quando não controlada, cresce numa progressão geo-
métrica. Os meios de subsistência crescem apenas numa progressão
aritmética. Um pequeno conhecimento de números demonstrará a enor-
midade do primeiro poder em comparação com o segundo.
Por aquela lei da nossa natureza que torna o alimento necessário
para a vida humana, os efeitos desses dois poderes desiguais devem
ser mantidos iguais.
Isso implica um obstáculo que atua de modo firme e constante
sobre a população, a partir da dificuldade da subsistência. Esta difi-
OS ECONOMISTAS
246
culdade deve diminuir em algum lugar e deve, necessariamente, ser
duramente sentida por uma grande parcela da humanidade.
Por todo o reino animal e vegetal a natureza espalhou largamente
as sementes da vida, com a mão a mais generosa e pródiga. Ela foi re-
lativamente parcimoniosa quanto ao espaço e à alimentação necessários
para criá-los. As células vitais contidas nesta parte da terra, com bastante
alimento e espaço para se expandir, preencherão milhões de mundos no
decurso de uns poucos milhares de anos. A miséria que despoticamente
permeia toda a lei da natureza limita estes mundos mediante determi-
nadas restrições. Os reinos vegetal e animal se reduzem sob esta grande
lei limitadora. E a espécie humana não pode, por simples esforços racionais,
escapar dela. Entre as plantas e os animais suas conseqüências são a
perda do sêmen, a doença e a morte prematura. Na espécie humana, a
miséria e o vício. O primeiro, a miséria, é uma conseqüência absolutamente
necessária da lei. O vício é uma conseqüência altamente provável e, por
essa razão, o vemos predominar largamente, mas não pode, talvez, ser
chamado de conseqüência absolutamente necessária. A provação da vir-
tude é resistir a toda tentação do mal.
Essa desigualdade natural dos dois poderes, da população e da
produção da terra, e essa grande lei da nossa natureza que deve manter
constantemente uniformes suas conseqüências constituem a grande di-
ficuldade, que a mim me parece insuperável no caminho da perfecti-
bilidade da sociedade. Todos os outros argumentos são de importância
pequena e secundária em comparação com este. Não vejo nenhuma
forma pela qual o homem possa escapar da influência desta lei que
impregna toda a natureza viva. Nenhuma igualdade fantasista, ne-
nhuma norma agrária, no seu maior alcance, podem remover a sua
pressão mesmo por apenas um século. E, por essa razão, a lei se mostra
decisiva contra a possível existência de uma sociedade em que todos
os membros viveriam em tranqüilidade, prosperidade e num relativo
ócio, e não sentiriam nenhuma angústia para providenciar os meios
de subsistência para si e para os filhos.
Conseqüentemente, se as premissas estão corretas, o argumento
é conclusivo contra a perfectibilidade do conjunto da humanidade.
Assim, esbocei as linhas gerais do argumento, e o examinarei
mais particularmente, mas penso que será fundamentado na experiên-
cia, a verdadeira fonte e base de todo o conhecimento que invariavel-
mente comprova sua verdade.
MALTHUS
247
CAPÍTULO II
Afirmei que a população, quando não controlada, cresce numa
progressão geométrica, e os meios de subsistência numa progressão
aritmética.
Vamos verificar se essa posição é correta.
Penso que ela será levada em conta, visto que não existiu até
hoje nenhum estágio (pelo menos de que tenhamos algum conhecimen-
to) em que os costumes foram tão puros e simples e os meios de sub-
sistência tão abundantes que nenhum obstáculo, seja qual for, tenha
se colocado aos casamentos precoces nas classes mais baixas por causa
de um medo de não prover bem a subsistência de seus filhos, ou, nas
classes mais altas, devido a um medo de baixar sua condição de vida.
Conseqüentemente em nenhum estágio que conhecemos até hoje o poder
da população pôde se exercer com perfeita liberdade.
Se a lei do casamento fosse instituída ou não, o preceito da na-
tureza e da virtude parece ser uma ligação a uma única mulher. Ad-
mitindo-se a liberdade de troca, no caso de uma escolha infeliz, esta
liberdade não interferiria na população até que ela chegasse a um
ponto muito viciado; e, agora, estamos admitindo a existência de uma
sociedade em que o vício é pouco conhecido.
Por essa razão, num estágio de grande igualdade e virtude em
que os costumes simples e puros predominassem e os meios de sub-
sistência fossem tão abundantes que nenhuma parcela da sociedade
tivesse algum temor quanto aos recursos para prover fartamente a
família e fosse permitido ao poder da população manifestar-se de forma
livre, haveria evidentemente um crescimento da espécie humana muito
maior do que qualquer outro até então conhecido.
Nos Estados Unidos da América, onde os meios de subsistência
têm sido muito maiores, os costumes do povo mais puros e conseqüen-
temente os obstáculos aos casamentos precoces têm sido menores do
que em qualquer um dos modernos países da Europa, a população se
viu duplicada em 25 anos.
Nós tomamos como nosso modelo essa proporção de crescimento,
249
embora pequena em relação ao poder máximo da população, ainda que
como resultado da experiência atual, e afirmamos que a população,
quando não controlada, se duplica cada 25 anos ou cresce numa pro-
gressão geométrica.
Vamos agora tomar qualquer lugar da terra, esta Ilha por exem-
plo, e vejamos em que proporção podemos calcular o crescimento dos
meios de subsistência que ela fornece. Começaremos com o seu atual
estágio de cultivo.
Se admito que pela melhor política possível, arroteando mais a
terra e fornecendo grandes fomentos à agricultura, a produção desta
Ilha possa ser duplicada nos próximos 25 anos, penso que esta produção
estará fornecendo tanto quanto toda pessoa possa razoavelmente exigir.
Nos 25 anos seguintes, é impossível admitir que a produção possa
ser quadruplicada. Isto seria contrário a todo o nosso conhecimento
acerca da capacidade da terra. O máximo que podemos conceber é que
o aumento da produção nos 25 anos seguintes se iguale à atual pro-
dução. Vamos, então, tomar isso como nosso critério, embora, certa-
mente, muito distante da verdade, e admitir que, mediante um grande
esforço, o produto total da Ilha possa ser aumentado cada 25 anos
numa quantidade de meios de subsistência equivalente à que o país
produz atualmente. O calculista mais entusiasmado não pode admitir
um aumento maior do que este. Dentro de poucos séculos este aumento
tornaria cada acre de terra da Ilha semelhante a um jardim.
Entretanto, a progressão deste crescimento é, evidentemente,
aritmética.
Poder-se-ia afirmar claramente, por esse motivo, que os meios
de subsistência crescem numa progressão aritmética. Vamos agoraapresentar as conseqüências dessas duas progressões juntas.
Calcula-se que a população da Ilha esteja por volta de 7 milhões
e admitiremos que a atual produção corresponda ao sustento de tal
número. Nos primeiros 25 anos a população seria de 14 milhões e,
sendo também o alimento duplicado, os meios de subsistência se igua-
lariam a esse crescimento. Nos próximos 25 anos a população seria de
28 milhões e os meios de subsistência apenas se equiparariam ao sus-
tento de 21 milhões. No período seguinte a população seria de 56 mi-
lhões e os meios de subsistência apenas suficientes para a metade
desse número. E no término do primeiro século a população seria de
120 milhões e os meios de subsistência somente seriam equivalentes
ao sustento de 35 milhões, o que deixaria uma população de 77 milhões
totalmente sem recursos.
Uma grande emigração envolve necessariamente um ou outro tipo
de inconveniência para o país que foi abandonado. Poucas pessoas deixarão
suas famílias, suas relações, seus amigos e a terra natal para se estabelecer
em regiões estrangeiras, desconhecidas, sem que persistam fortes causas
OS ECONOMISTAS
250
de constrangimentos no país em que se encontram ou sem a esperança
de que haja grandes vantagens no lugar para onde estão indo.
Mas para apresentar o argumento mais geral, e menos prejudi-
cado pelas visões parciais da emigração, vamos abranger toda a Terra
em vez de um só lugar, e vamos supor que os limites ao crescimento
da população foram universalmente removidos. Se os meios de subsis-
tência que a terra fornece ao homem fossem acrescidos cada 25 anos
de uma quantidade igual à que atualmente o mundo todo produz, isto
permitiria que a capacidade de produção da Terra fosse totalmente
ilimitada e sua proporção de crescimento muito maior do que possamos
admitir que qualquer esforço possível da humanidade pudesse atingi-lo.
Tomando a população do mundo como qualquer número, 1 bilhão,
por exemplo, a espécie humana cresceria na progressão de 1, 2, 4, 8,
16, 32, 64, 128, 256, 512 etc. e os meios de subsistência na progressão
de 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 etc. Em dois séculos e um quarto a
população estaria, para os meios de subsistência, na proporção de 512
para 10; em três séculos, de 4096 para 13; em 2 mil anos a diferença
seria quase incalculável, embora a produção nesse período tivesse cres-
cido em larga medida.
Nenhum limite se coloca para a produção da terra; ela pode cres-
cer incessantemente e ser maior do que qualquer quantidade deter-
minável; entretanto, ainda que o poder da população seja um poder
de uma ordem superior, o crescimento da espécie humana só pode ser
mantido proporcional ao crescimento dos meios de subsistência por
meio de uma permanente atuação da rigorosa lei da necessidade, que
funciona como um obstáculo a um poder maior.
Os efeitos deste obstáculo passam a ser considerados em seguida.
Entre as plantas e os animais, a observação do problema é sim-
ples. Todos eles são impelidos, por um poderoso instinto, a multiplicar
suas espécies, e este instinto não se perturba por nenhum argumento
ou dúvida quanto a garantir a subsistência de sua prole. Por essa
razão, em qualquer parte, existe a liberdade, o poder de crescimento
se exerce e os efeitos do excesso são reprimidos pela falta de espaço
e alimento, comum a animais e plantas, e, entre os animais, pelo fato
de se tornar presa de outros.
As conseqüências deste obstáculo no homem são mais complexas.
Impelido ao crescimento de sua espécie por um instinto igualmente
poderoso, a razão interrompe seu curso vital e questiona se ele não
deve trazer seres ao mundo, porque não pode prover os meios de sub-
sistência. Num estágio de igualdade isso seria uma simples questão.
No atual estágio da sociedade ocorrem outras questões. O homem não
baixará seu padrão de vida social? Não se sujeitará a maiores dificul-
dades do que as que ele atualmente passa? Não será obrigado a tra-
balhar mais penosamente? E se o homem possui uma família numerosa,
seus maiores esforços o capacitarão a sustentá-la? Não pode o homem
MALTHUS
251
ver sua prole em andrajos e na miséria, chamando pelo pão que ele
não lhe pode dar? Não pode o homem ser forçado à desagradável con-
dição de ser privado de sua independência e ser favorecido pela avarenta
mão da caridade para poder se sustentar?
Essas considerações são destinadas a impedir — e certamente o
farão — um vasto número de pessoas de todas as nações civilizadas
de seguir o ditame da natureza de uma ligação precoce a uma única
mulher. E essa restrição, quase necessariamente, embora não absolu-
tamente, gera o vício. Entretanto, em todas as sociedades, mesmo na-
quelas que são mais corruptas, a tendência a uma ligação virtuosa é
tão forte que há um constante esforço para o crescimento da população.
Este constante esforço tende a subjugar as classes mais baixas da
sociedade à miséria e a impedir qualquer grande e permanente melhora
de sua condição.
O modo pelo qual estas conseqüências se produzem parece ser este.
Admitamos que os meios de subsistência em algum país correspon-
dam exatamente a um tranqüilo sustento de seus habitantes. O constante
esforço para o crescimento da população, que se constata existir mesmo
nas sociedades mais corruptas, aumenta o número de pessoas antes que
cresçam os meios de subsistência. Por esse motivo, o alimento que antes
sustentava 7 milhões deve agora ser dividido entre 7,5 ou 8 milhões.
Conseqüentemente, os pobres têm que viver em muito piores condições,
muitos deles submetidos a cruéis sofrimentos.
O valor do trabalho tende a decrescer, enquanto o preço dos man-
timentos, por outro lado, tende a subir, estando o número de traba-
lhadores também acima da capacidade de trabalho do mercado. Por
essa razão o trabalhador deve trabalhar mais arduamente para ganhar
o mesmo que ganhava antes. Durante este período de miséria, os de-
sestímulos ao casamento e a dificuldade de sustento da família são
tão grandes que a população fica perplexa. Neste ínterim, o aviltamento
do trabalho, a grande quantidade de trabalhadores e a necessidade de
uma crescente atividade entre eles, anima os agricultores a aplicar
mais trabalho em suas terras, a preparar novas glebas, a adubar e
cultivar melhor o que já existe na lavoura, até que finalmente os meios
de subsistência fiquem na mesma proporção que a população, como no
período de que nós tratamos. Estando novamente a situação dos tra-
balhadores regularmente satisfatória, as restrições ao povoamento são,
em certa medida, afrouxadas e se repetem os mesmos movimentos,
retrógrados ou progressistas, com relação à prosperidade.
Esse tipo de oscilação não será percebido por observadores su-
perficiais e pode ser difícil, mesmo para as mentes mais perspicazes,
precisar seus períodos. Entretanto, porque em todos os países antigos
existiram algumas dessas oscilações, embora a partir de causas indi-
retas de uma forma muito menos acentuada e muito mais irregular
OS ECONOMISTAS
252
do que descrevi, nenhum homem ponderado que reflita profundamente
no assunto pode certamente duvidar.
Há muitas razões pelas quais essa oscilação tenha sido menos
óbvia e menos resolutamente confirmada pela experiência do que na-
turalmente se poderia esperar.
A principal razão é que os estudos sobre a história da humanidade
que nós possuímos são referentes às classes mais altas. Entretanto,
nós temos bem poucas explicações que podem ser certas quanto aos
hábitos e costumes desta parcela da humanidade em que, de modo
especial, se deram esses movimentos retrógrados e progressistas. Uma
história razoável desta classe, de um povo e de uma época exigiria
uma atenção constante e detalhada de um espíritoobservador, durante
uma longa vida. Alguns objetivos da pesquisa seriam: em que proporção
estava o número de casamentos em relação ao número de adultos; em
que medida os costumes corruptos predominavam em conseqüência
das restrições ao casamento; qual era a mortalidade comparativa, entre
as crianças da parcela mais pobre da comunidade e aquelas que viviam
em maior bem-estar; quais eram as flutuações do preço real do trabalho
e quais eram as diferenças observáveis na situação das classes mais
baixas da sociedade com relação ao bem-estar e à prosperidade, nos
diferentes momentos de uma determinada época.
Semelhante história contribui enormemente para elucidar a ma-
neira pela qual o constante obstáculo atua sobre a população e prova-
velmente demonstraria a existência dos movimentos retrógrados e pro-
gressistas que foram mencionados, embora o tempo de sua oscilação
deva necessariamente ter se tornado irregular conforme a atuação de
muitas causas perturbadoras, tais como a criação ou o declínio de certas
manufaturas, uma maior ou menor tendência predominante de em-
preendimento agrícola, anos de abundância ou de escassez, guerras e
pestes, leis dos pobres, invenção de processos para reduzir o trabalho
sem a correspondente ampliação do mercado para os produtos e, par-
ticularmente, a diferença entre o preço nominal e real do trabalho,
circunstância que tem contribuído talvez muito mais do que qualquer
outra, para ocultar, da observação comum, essa oscilação.
Acontece muito raramente que cai o preço nominal do trabalho
geral, mas bem sabemos que ele freqüentemente permanece o mesmo,
enquanto o preço nominal das provisões vai gradativamente aumen-
tando. Essa é, com efeito, uma queda real do preço do trabalho, e
durante esse período a situação das classes mais baixas da comunidade
deve gradualmente piorar cada vez mais. Mas os agricultores e os
capitalistas se tornam mais ricos por causa do aviltamento real do
trabalho. Seus capitais aumentados os tornam capazes de empregar
um maior número de pessoas. Por esse motivo o trabalho poderia ser
abundante e o seu preço, conseqüentemente, se elevaria. Mas a falta
de liberdade no mercado de trabalho, o que ocorre mais ou menos em
MALTHUS
253
todas as comunidades, seja por causa das leis dos pobres, seja pela
causa mais geral — a facilidade de associação entre os ricos e a sua
dificuldade entre os pobres — atua de modo a impedir a elevação do
preço do trabalho no período normal e o mantém baixo por um tempo
mais longo — talvez até por um ano de escassez, quando os protestos
são bastante fortes e a necessidade por demais acentuada para ser
suportada.
A verdadeira causa da elevação do preço do trabalho é então
ocultada e o rico finge outorgar o preço do trabalho como um ato de
compaixão e favor para com o pobre, em vista de um ano de escassez;
e, quando volta a abundância, os ricos se entregam ao mais insensato
de todos os lamentos para que o preço não caia de novo, quando uma
pequena reflexão lhes mostraria que o preço deve ter aumentado muito
tempo antes, mas por causa de uma injusta conspiração deles próprios.
Mas, embora os ricos através de desonestos conluios contribuam
freqüentemente para prolongar o período de miséria entre os pobres,
até agora nenhuma forma aceitável de sociedade pôde impedir a quase
permanente atuação da miséria sobre uma grande parcela da popula-
ção, embora num estágio de desigualdade e, sobretudo, ainda que todos
fossem iguais.
A teoria sobre a qual a verdade dessa posição se apóia me parece
tão manifestamente clara que me sinto embaraçado para julgar que
parte dela pode ser negada.
Que a população não possa crescer sem os meios de subsistência é
uma proposição tão evidente que não necessita de nenhuma explanação.
Que a população cresce invariavelmente onde existem os meios
de subsistência, é provado fartamente pela história de cada povo que
tenha existido em qualquer época.
E que o poder superior de crescimento da população não pode
ser reprimido sem gerar a miséria ou o vício, é persuasivamente com-
provado pela maior parte dos elementos tão amargos que compõem a
sorte da vida humana e a continuação das causas físicas que parecem
tê-los produzido.
Mas, a fim de verificar mais completamente a validade dessas
três proposições, vamos examinar os diferentes estágios em que se tem
conhecimento de que a humanidade existe. Penso que mesmo um apres-
sado retrospecto será suficiente para nos convencer de que essas pro-
posições são verdades incontestáveis.
OS ECONOMISTAS
254
CAPÍTULO III
No estágio mais primitivo da humanidade, em que a caça era
a principal ocupação e a única maneira de se obter alimentos, estando
os meios de subsistência espalhados numa larga extensão do território,
a população deveria, necessariamente, ser escassa. Afirma-se que a
paixão entre os sexos é menos ardente entre os índios norte-americanos
do que em qualquer outra raça humana. Entretanto, não obstante essa
apatia, o aumento da população, mesmo nesse povo, parece ser sempre
maior do que os meios de subsistência para sustentá-la. Isto se ma-
nifesta pelo povoamento comparativamente rápido que ocorreu todas
as vezes que uma tribo se estabeleceu em algum lugar fértil e tirou
o seu alimento de fontes mais produtivas do que da caça. E observou-se
freqüentemente que, quando uma família indígena erguia sua moradia
perto de qualquer núcleo colonial europeu e adotava um modo de vida
mais cômodo e civilizado, uma mulher chegava a criar cinco, seis ou
mais filhos, embora, no estado selvagem, raramente acontecia que
numa família um ou dois atingissem a maturidade. A mesma obser-
vação foi feita com relação aos Hotentotes, da região do Cabo. Esses
fatos mostram o poder superior da população em relação aos meios de
subsistência das nações de caçadores, e que esse poder sempre se ma-
nifestou no momento em que lhe foi permitido agir com liberdade.
Resta investigar se esse poder pode ser contido e os seus efeitos
mantidos iguais aos meios de subsistência, sem que haja vício ou miséria.
Os índios norte-americanos, considerados como um povo, não po-
dem propriamente ser chamados de livres e iguais. Em todos os relatos
que nós temos deles e, na verdade, da maioria das nações indígenas,
as mulheres se apresentam num estado de escravidão em relação ao
homem muito mais completo do que os pobres em relação aos ricos
nos países civilizados. Uma metade da nação, como os hilotas, parece
produzir para a outra metade, e a miséria que controla a população
incide principalmente, como sempre deve ocorrer, nessa parcela cuja
condição é a mais baixa na escala social. A infância do homem, no seu
estado mais natural, requer considerável atenção, mas essa atenção
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