Prévia do material em texto
83 CONTROLE DAS PLANTAS DANINHAS NA CULTURA DA CANA-DE-AÇÚCAR Flávio M. Garcia Blanco Instituto Biológico, Centro Experimental Central do Instituto Biológico, CP 70, CEP 13001-970, Campinas, SP, Brasil. E-mail: garciablanco@biologico. sp.gov.br Introdução Na implantação de uma área agrícola através de um sistema de cultivo, há sérias e significativas transformações nos subsistemas geomórfico, edáfico e biológico, tornando-os mais simples (agroecossistema), em comparação com o ecossistema, este, um sistema mais complexo. Está transformação resulta na diminuição drástica da capacidade de auto-regulação do sistema, tornando-o, assim, mais instável e susceptível a entradas de energia. Uma das principais conseqüências desta transformação é o aumento exagerado das populações de determinadas espécies de insetos, microrganismos, nematóides e plantas silvestres, de tal forma, a se tornarem pragas agrícolas; e assim, comprometendo de forma significativa à produção, e de modo geral, inviabilizando economicamente a unidade produtiva. Quando há aumento populacional exagerado das plantas silvestres, estás se tornam daninhas, que diferentemente de outras pragas agrícolas, têm por característica, estarem sempre presentes nos agroecossistemas e responsáveis diretas (competição, alelopatia etc.) ou indiretamente (reservatório de patógenos, atrativas para insetos-praga etc.) pela diminuição drástica na produção econômica das culturas. Interações entre a cultura da cana-de-açúcar e as plantas daninhas O primeiro corte ciclo na cultura da cana-de-açúcar, assim como, os períodos de interferência das plantas daninhas são influenciados pela época de plantio, relacionado principalmente com o regime pluviométrico e a temperatura do período. Para a região sudeste, podemos destacar: cana de ano, plantio nos meses do início das chuvas (final do inverno e primavera), e cana de ano e meio, o plantio se realiza no final das chuvas (verão e início do outono). Pesquisas realizadas por BLANCO et al. (1979), BLANCO et al. (1981) e BLANCO et al. (1982) concluíram que podem ocorrer perdas de até 85% no peso dos colmos; além disso, determinaram que o período crítico de interferência das plantas daninhas para a cana de ano, abrangendo o 15º dia a dois meses a contar da emergência da cana-de-açúcar. Quando o plantio foi para cana de ano e meio, as perdas máximas foram semelhantes, porém o período crítico de competição foi diferenciado, abrangendo desde o 30º dia a dois meses da emergência da cultura. 84 Muitos são os métodos descritos para o controle das plantas daninhas na cultura de cana-de-açúcar, porém, observa-se que, na prática o controle químico com a utilização dos herbicidas, é que mais predomina, quer seja por sua melhor operacionalidade, assim como, melhor eficiência de controle e menor custo. FUTINO & SILVEIRA (1991), determinaram em 8% a participação dos defensivos agrícolas, no custo operacional desta cultura. Na época da colheita a cana-de-açúcar pode ser queimada, ou colhida sem queima, neste caso, denominado de cana crua, o retorno desta forma de colheita esta sendo feito em função de exigência de lei. Controle das plantas daninhas Devido as suas características próprias de produção e manejo, as principais maneiras para o controle da plantas daninhas na cultura de cana-de-açúcar são: cultural quer seja na utilização de cultivares de crescimento mais rápido, ou na diminuição do espaçamento, permitindo um sombreamento precoce das entre linhas de cultivo, dificultando a germinação das plantas daninhas; capinas, com o uso de cultivadores e o químico através do uso de herbicidas. Na combinação das medidas de controle, diversos fatores devem ser considerados, de tal forma a maximizar o controle das plantas daninhas minimizando o efeito dos herbicidas no ambiente. a) Preparo do solo: é muito importante antes da aplicação de herbicidas em pré-emergência, que o solo esteja bem preparado e sem torrões, b) Reforma, plantio ou soqueira: Geralmente há mais sementes de plantas daninhas no solo, quando o plantio é realizado em uma área nova, ex. pastagens, neste caso, realizar o preparo de solo após as primeiras chuvas esperar o primeiro fluxo de emergência das plantas daninhas, para o preparo definitivo, eliminando este primeiro fluxo. Aplicar herbicidas pré-emergentes com maior espectro de ação, para soca aplicar após a tríplice operação, quando necessário. c) Período residual: quando o herbicida for aplicado para o plantio de cana de ano e meio, este deve ser maior, quando comparado com a cana de ano, pois atravessa um período de seca onde a cana-de-açúcar paralisa o seu crescimento, assim como as plantas daninhas, após alguns meses, no retorno da estação das chuvas, estás voltam a germinar, se o herbicida não tiver uma ação residual até está época. d) Grupo de plantas daninhas predominantes e a sua abundância: variam em função das condições climáticas por ocasião do plantio: cana de ano, período mais quente e chuvoso, o que favorece as gramíneas, por outro lado, para a cana de ano e meio, as condições são inversas, favorecendo as latifoliadas pela menor temperatura e umidade. e) Tipo de solo e teor de matéria orgânica: herbicidas pré-emergentes, devido a sua característica química, quer seja básica, neutra ou ácida é influenciado pela umidade do solo sofrendo processos de sorção (absorção e adsorção) aos colóides do solo (argila e matéria orgânica). Quando mais seco o solo, 85 maior é a sorção do herbicida. A exceção da trifluralina, por sofrer fotólise, os outros herbicidas devem ser aplicados quando o solo estiver com boa umidade. f) Uso de adjuvantes, quando indicado. g) Solubilidade: Nas aplicações em pré-emergência para cana de ano e meio utilizar herbicidas mais solúveis, pois, como há menos água no solo, serão mais efetivos do que o de baixa solubilidade. h) Nas aplicações em pré-emergência, sempre verificar a seletividade em relação a cultivar utilizada, e se for o caso, para as culturas em sucessão. i) Persistência: procurar saber a persistência no solo do herbicida, pois na ocorrência de uma reaplicação com o mesmo herbicida na soca, há o risco se ter uma concentração no solo maior do que a indicada (resíduo no solo + aplicação na soca). j) Rotação de herbicidas: sempre fazer rotação de herbicidas com modo de ação diferente, de tal forma, evitar o surgimento de plantas daninhas resistentes a determinados herbicidas. k) Na aplicação sempre utilizar EPI (equipamento de proteção individual), e equipamento com bicos em bom estado e corretos para o uso com herbicidas. l) Fazer uma correta limpeza do pulverizador após a aplicação, principalmente, no caso do uso com 2,4 D. As misturas dos herbicidas são utilizadas para aumentar o espectro de controle, por exemplo, na mistura do Diuron + hexazinone, ocorre um in- cremento no controle do Diuron, este de maior eficiência sobre as latifoliadas, agora na associação com o hexazinone, há também o controle das gramíneas. As misturas, também, em função das características próprias de cada herbicida, como a sua lipofilicidade e solubilidades, que influênciam na lixiviação, permitindo que o herbicida permaneça em uma faixa mais pro- funda do perfil do solo, e não apenas superficialmente, desta forma, propiciando um maior controle das sementes que estão neste perfil. Podemos citar, como exemplo, na mistura da ametrina + clomazone, para o controle de Brachiaria plantaginea (capim-marmelada). Controle das plantas daninhas – sistema cana-crua Na mudança no sistema de produção foi introduzida uma nova realidade no cultivo da cana-de-açúcar, principalmente, em função da permanência de 10 a 15 t/ha de palha, antes, queimada após o corte da cana. Este fator, agora no sistema, fatalmente acarretará em mudanças drásticas na comunidade de organismos, hoje considerados pragas, quer sejam, as doenças, os insetos ou as plantas daninhas.Na introdução do sistema de plantio direto na cultura da soja no inicio da década de 70 houve uma grande mudança em relação às pragas, principalmente nas comunidades de plantas daninhas passando por significativas transformações fitossociológicas, plantas antes com baixo índice populacional, tornaram-se pragas, como exemplo o amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla). Guardando as devidas proporções entre os dois agroecossistemas, é de se esperar que na cultura de cana-de-açúcar, também haverá mudanças significativas nas relações com as plantas daninhas. 86 Ta be la 1 - H er bi ci da s ut ili za do s pa ra o c on tr ol e da s pl an ta s da ni nh as n a cu ltu ra d a ca na -d e- aç úc ar u til iz an do o m an ej o tr ad ic io na l d e qu ei m a pa ra a c ol he ita (B LA N C O , 2 00 3) . pr in ci pi oa tiv o no m ec om er ci al D os e i.a ./ M od o de G ru po c on tr ol ad o O bs er va çõ es ha (k g) ap lic aç ão 1 2, 4 D U 46 D fl ui d 0, 40 a 0 ,7 2 PÓ S la tif ol ia da s A ce to ch lo r Fi st 1, 80 -3 ,6 0 PR É gr am ín ea s e la tif ol ia da s an ua is A m et ri na G es ap ax 2, 00 a 4 ,0 0 PR É gr am ín ea s e la tif ol ia da s an ua is A m et ri na + 2 ,4 D G es ap ax + U 46 D fl ui d 0, 21 + 0 ,2 9 PÓ S, P RÉ gr am ín ea s e la tif ol ia da s an ua is co nt ro le e fe tiv o em pó s- em er ge nt e ap en as so br e as la tif ol ia da s A m et ri na + C lo m az on e Si ne rg e 2, 50 a 3 ,0 0 PR É gr am ín ea s e la tif ol ia da s an ua is A m et ri na + D iu ro n A m et ro n (0 ,6 2- 1, 24 4) + PR É gr am ín ea s e la tif ol ia da s an ua is (0 ,9 6- 1, 92 ) C lo m az on e G am it 0, 50 PR É G ra m ín ea s e la tif ol ia da s an ua is D iu ro n K ar m ex 1, 60 a 3 ,2 PR É gr am ín ea s e la tif ol ia da s an ua is co nt ro le m ai s pr on un - ci ad o na s la tif ol ia da s D iu ro n + he xa zi no ne V el pa r K 0, 48 8 + 0, 14 2 PR É La tif ol ia da s e gr am ín ea s an ua is A dv an ce 0, 53 3 + 0, 06 7 PR É D iu ro n + M SM A Fo rt ex 0, 14 0 + 0, 36 0 PÓ S G ra m ín ea s e la tif ol ia da s an ua is D iu ro n + Te rb ut iu ro n Bi m at e 2, 10 a 2 ,8 PR É G ra m ín ea s e la tif ol ia da s an ua is G ly ph os at e Ro un du p 0, 18 a 2 ,1 6 PÓ S G ra m ín ea s e la tif ol ia da s an ua is ut ili za do p ar a re no va - çã o de ca na vi ai s o u pa ra ap lic aç õe s di ri gi da s. M et ol ac hl or D ua l 2, 88 -3 ,8 4 PR É gr am ín ea s e la tif ol ia da s an ua is M et ri bu zi m Se nc or 0, 72 PR É La tif ol ia da s 1 m od o pr ef er ên ci a de a pl ic aç ão o nd e o co nt ro le é m ai s ef et iv o 87 Ta be la 1 - C on tin ua çã o. pr in ci pi o at iv o no m e co m er ci al D os e i.a ./ M od o de G ru po co nt ro la do O bs er va çõ es ha (k g) ap lic aç ão 2 H al os ul fu ro n Se m pr a 0, 75 PÓ S C yp er ac ea s a cy pe ra ce a te m q ue es - ta r n o es tá di o de p ré fl o- ra çã o no m om en to d a ap lic aç ão Im az ap yr A rs en al 0, 25 0 PR É G ra m ín ea s e la tif ol ia da s e cy pe ra ce as Is ox af lu to le Pr ov en ce 0, 75 0 PR É G ra m ín ea s e la tif ol ia da s an ua is O xy flu or fe n G oa l 0, 24 0 PR É G ra m ín ea s e la tif ol ia da s an ua is Su lfo sa te Za pp 0, 48 0 PÓ S G ra m ín ea s e la tif ol ia da s an ua is ut ili za do p ar a re no va - çã o de ca na vi ai s o u pa ra ap lic aç õe s di ri gi da s. Su lfe nt ra zo ne Bo ra l 1, 20 a 1 ,6 0 PR É G ra m ín ea s an ua is e p er en es e ap re se nt a co nt ro le e fe - cy pe ra ce as tiv o so br e tir ir ic a (C yp er us ro tu nd us ) Te rb ut iu ro n C om bi ne 0, 50 a 0 ,8 0 PR É G ra m ín ea s e la tif ol ia da s an ua is 2 m od o pr ef er ên ci a de a pl ic aç ão o nd e o co nt ro le é m ai s ef et iv o 88 VELINI & NEGRISOLI (2000), citando EGLEY & DUKE, relatam que a amplitude térmica influência de forma significativa à germinação das plantas daninhas, VELINI et. al. (1998) e MARTINS et al. (1999), estudaram o efeito quantitativo da palhada sobre a germinação de diversas espécies de plantas daninhas, concluíram que, na maioria das espécies estudadas, quanto maior a quantidade de palha, há uma supressão na germinação, para outras, como o amendoim-bravo a palhada não influenciou a germinação da espécie, confirmando os dados de LORENZI (1983). Estes trabalhos indicam que haverá uma mudança no banco de sementes nos solos nos agroecossistemas de cana-de-açúcar, na mudança no sistema de colheita. Atualmente, o controle das plantas daninhas, após o corte tem sido feito pelo método de catação utilizando herbicidas não seletivos de ação total, como glyfosate, sulfosate ou seletivos para latifoliadas (2,4 D), aplicado logo após o corte monitorando as áreas infestadas até o fechamento da cultura. Vários aspectos ainda precisam ser estudados, na aplicação de pré- emergentes em condição de colheita da cana crua: efeito da palhada sobre a microflora influenciando na persistência do herbicida, influencia da palhada na dissipação dos herbicidas, novos equipamentos de aplicação. Concluindo, a condição de colheita da cana-de-açúcar sem queima e como se fosse a introdução de uma nova cultura onde, no momento atual muitas perguntas ainda não têm respostas. Agradecimentos Projeto financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP. Referências Bibliográficas BLANCO, H.G.; BARBOSA, J.C.; OLIVEIRA, D.A. Competição de uma comunidade natu- ral de mato em cultura de cana-de-açúcar (Saccharum sp.), de ano e meio. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HERBICIDAS E ERVAS DANINHAS, 14.; CON- GRESSO DE LA ASOCIACION LATINOAMERICANA DE MALEZAS,6., 1982, Campinas. Resumos . Campinas: 1982. p.30-31. BLANCO, H.G.; OLIVEIRA, D.A.; ARAÚJO, J.B.M. Competição entre plantas daninhas e a cultura da cana-de-açúcar. I. Período crítico de competição produzido por uma comunidade natural de dicotiledôneas em culturas de ano. Biológico, São Paulo, v.45, p.131-140, 1979. BLANCO, H.G.; OLIVEIRA, D.A.; COLETI, J.T. Competição entre plantas daninhas e a cultura da cana-de-açúcar. II. Período de competição produzido por uma co- munidade natural de mato, com predomínio de gramíneas, em culturas de ano. III. Influência da competição na nutrição da cana-de-açúcar. Biológico, São Paulo, v.47, p.77-88, 1981. 89 FUTINO, A.M. & SILVEIRA, J.M.J. A indústria de defensivos agrícolas no Brasil. In: AGRICULTURA EM SÃO PAULO, 1991, São Paulo, Anais, São Paulo: 1991. p. 1-43. 38 (T. Esp.). LORENZI , H. Efeito da palha da cana no controle das plantas daninhas. In: CON- GRESSO BRASILEIRO DE HERBICIDAS E PLANTAS DANINHAS, 19., 1993 Londrina. Anais. Londrina: 1993. p.28-29 MARTINS, D.; VELINI, E.D.; MARTINS, C.C.; SOUZA, L.S. Emergência em campo de dico- tiledôneas infestantes em solo coberto com palha de cana-de-açúcar. Planta Daninha, v.17, n.1, p.151-161, 1999 VELINI , E. D. & MARTINS, D. Efeito da palha de cana-de-açúcar sobre a germinação das principais espécies de plantas daninhas desta cultura. Botucatu: FCA/UNESP, 1998. 26p. (Relatório Técnico). VELINI, E.D. & NEGRISOLI, E. Controle de plantas daninhas em cana crua. CON- GRESSO BRASILEIRO DA CIÊNCIA DAS PLANTAS DANINHAS, 22., 2000, Foz do Iguaçu. Anais. Foz do Iguaçu, 2000. p.148-164.