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Resenha JURA

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Universidade Federal do Rio de Janeiro
Faculdade Nacional de Direito
Sociologia Geral; Professora Mariana Trotta
Aluno: Felipe Pereira dos Santos; Turma C
III Jornada Universitária em Defesa da Reforma Agrária 
A III Jornada Universitária em Defesa da Reforma Agrária (JURA) é um evento acadêmico realizado em múltiplas universidades do Brasil, tendo como objetivo abordar toda a problemática que concerne ao tema supracitado. Em seu terceiro ano, a Jornada pretende relembrar os 20 anos do Massacre de Eldorado dos Carajás. 
No dia 27/04/2016, o tema foi “20 Anos do Massacre de Eldorado dos Carajás: da Criminalização dos Movimentos à Lei Antiterrorismo” e participaram da mesa o professor de Direito da PUC Adriano Pilate, a advogada no Centro de Assessoria Popular Mariana Criola Fernanda Vieira, e o militante do MST/PA Ulisses. O professor Adriano Pilate distribuiu sua fala em dois momentos: a perspectiva legal e geográfica dos temas que perpassam a questão da reforma agrária e, depois, seguiu com uma análise crítica da obra penal construída pelo governo federal. Na primeira parte, Pilate destacou o intenso êxodo rural durante a ditadura, que promoveu a maior migração interna da história do país. Destacou, também, que o Direito brasileiro relativiza o direito à propriedade, consagrando-o na Constituição Federal como vinculado à existência de função social, nos termos da lei que dá as diretrizes. Em seguida, tratou da análise da lei 13.260/2016, que tipifica o crime de terrorismo. Criticou a sintaxe do texto da lei por considerá-lo tautológico e subjetivo. Ressaltou que as Nações Unidas não recomendam a redação de leis dessa natureza, por considerarem que são zonas cinzentas no Direito e que podem facilmente cercear garantias fundamentais. Em seguida, Fernanda Vieira em sua exposição aproveitou elementos da fala de Pilate para relacioná-los com questões estruturais. Nesse sentido, Vieira ressaltou a ligação do capitalismo financeiro com o recrudescimento do estado penal em todo mundo através de legislações restritivas de liberdades. Ela pontuou o 11 de setembro como marco mundial que impulsionou a criação de dispositivos legais que restringem garantias fundamentais sob o argumento da segurança da coletividade. O próximo convidado a se pronunciar foi Ulisses, que trouxe uma abordagem mais profunda sobre o Massacre de Eldorado dos Carajás. Pontuou que, diferente de outros acontecimentos do gênero, esse episódio foi notório pela extrema brutalidade e por conta da presença de câmeras de vídeo que registraram a arbitrariedade das forças policiais. Relatou, ainda, que apenas alguns policiais envolvidos foram submetidos a investigação e somente após repercussão na Corte Interamericana de Direitos Humanos. Também foi explicado por ele que a reforma agrária diz respeito ao campo e a cidade, pois a macrocefalia urbana é fruto de uma política fundiária excludente.
No dia 04/05/2016, o tema do encontro foi “Reforma Agrária e Poder Judiciário”. Da mesa participaram Maria Mota, superintendente substituta do INCRA/RJ; Paulo Alentejano, professor da Faculdade de Formação de Professores da UERJ; Sergio Brito, procurador da UFRJ e Cosme Henrique, militante do MST e morador do assentamento Terra Prometida. Maria Mota iniciou as falas destacando os 45 anos de história do INCRA. Pontuou que a reforma agrária tem como fim o combate à miséria e ao êxodo rural, contudo enfrenta sérias dificuldades no país com um dos maiores sistemas latifundiários do mundo, tendo o estado do Pará como líder absoluto em mortes por conflitos no campo. Segundo Mota, uma das principais travas ao trabalho do INCRA é a falta de recursos. Isso dificulta desapropriações e a implantação efetiva de uma política de reorganização fundiária pautada pela distribuição de terras e democratização dos serviços públicos, diminuindo a dependência do campo com relação à serviços de saúde pública e educação, por exemplo. Em seguida, Paulo Alentejano retomou a questão dos impedimentos da reforma agrária já enunciados por Mota, incluindo a defasagem dos indicadores de produtividade do INCRA, que, datados de 1975, atuam ao lado do papel ultraconservador do judiciário nesse sentido. Também criticou os caminhos historicamente tomados para o problema fundiário, sempre focados em colonizar áreas consideradas vazios demográficos, mas desrespeitando formas de organizações indígenas ali instaladas e sem tocar no grande latifúndio. Além disso, apontou a modernização conservadora que foi possibilitada pelo contraditório Estatuto da Terra, que desenvolveu a política agrícola do latifúndio, ao passo que nunca implementou a distribuição de terras como política agrária. Dessa forma, é possível traçar um paralelo com a fala de Sérgio Brito, que caracterizou a Constituição Federal de 1988 como a cristalização dos conflitos sociais da época em seu texto final. O procurador destacou as turbulências nos grupos de trabalho que trataram da questão da terra na constituinte e a participação ativa do hoje senador Ronaldo Caiado para barrar qualquer medida que prejudicasse o latifúndio. Logo após, Cosme Henrique relacionou a posse da terra com a concentração de poder, afirmando que o MST reivindica somente o cumprimento de algo legalmente previsto, mas sabotado, por se tratar, em outras palavras, de distribuição de poder.
É possível notar que existem barreiras distintas para a implementação da reforma agrária como prevê a Constituição, mas essas barreiras parecem ter origem comum: a opressão de classe em uma sociedade fundada em desigualdades, relações de patrimonialismo e superexploração do trabalho. Dessa maneira, a JURA cumpriu papel fundamental na tentativa de quebrar o ciclo de reprodução dessas relações, que também se refletem nos profissionais do Direito, embebidos em uma socialização dentro da faculdade que pode contribuir para a multiplicação de formas de pensar completamente antagônicas ao que se pretende o texto constitucional na efetivação do direito à terra. É válido destacar, ainda, o papel contra hegemônico que foi resguardado no evento, servindo de ponto de apoio para discussões mais fundamentadas em dados empíricos e no arcabouço normativo brasileiro. Parece importante evidenciar, também, a presença de militantes do MST em um evento que é acadêmico e, portanto, transmite a ideia de elitização e desqualificação das vozes não letradas nos costumes do meio acadêmico. As participações foram fundamentais para fazer ouvir aos que menos têm espaço nesse processo e reconhecer a importância da vivência dessas pessoas, colocando-as no mesmo patamar de prestígio dos diplomados, que estão acostumados a serem ouvidos.

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