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MEDIAÇÃO FAMILIAR Uma ferramenta útil para a Parentalidade Positiva «Há palavras que são setas que nos trespassam, há palavras que são sementes que se lançam e se acolhem esperando pelo fruto. No ar paira sempre uma pergunta: que fazer deste dia? E tudo pode depender de um secreto dom, do impulso e da motivação suscitados pelas palavras que recebemos.» Pe. Jesuíta Vasco Pinto Magalhães “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 1 Índice Introdução .................................................................................................................................. 2 O conceito de família, evoluções, transformações e redefinições ............................. 3 Consequências das transformações sociais e familiares no exercício da parentalidade ............................................................................................................................. 6 Modelos de parentalidade ....................................................................................................... 8 O cérebro da criança ............................................................................................................... 11 Intervir promovendo, prevenir protegendo: o superior interesse da criança ........ 14 Conclusão ................................................................................................................................ 18 Bibliografia ............................................................................................................................... 21 “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 2 Introdução Se é verdade que a família mudou, também continua a ser verdade que é nela que o individuo se constrói. A primeira e mais relevante relação que estabelecemos com o mundo, decorre do desenvolvimento de um vínculo emocional com as figuras que cuidam de nós, nos primeiros anos de vida. A forma como esta relação decorre é fundamental para o desenvolvimento de um sentimento de confiança e de segurança em si próprio, aumentando assim, as competências da criança para explorar o mundo. As maiores dificuldades geralmente relatadas por pais e professores, estão relacionadas com os comportamentos de agressividade, impulsividade e desinteresse dos filhos e/ou alunos, sendo difícil, por vezes encontrar estratégias para lidar com estes comportamentos e gerir estas situações. Adequar os estilos ou modelos de educação às novas realidades é um imperativo social em qualquer sociedade contemporânea, que pretende responder de forma eficiente à mudança. A minha experiência profissional vem me demonstrando que, se antigamente o maior numero de Crianças e Jovens que chegavam às casas de acolhimento e aos lares de Infância e juventude, era por questões derivadas de maus tratos e/ou abusos sexuais, nos últimos anos, chegam cada vez mais jovens com problemas de comportamento, em que os pais (na maioria das vezes divorciados) não sabem como lidar. O relatório CASA 2015 também demonstra que o perfil dos casos que entram nas CPCJs, está também a mudar. Já não são só as famílias carenciadas com processos nas Comissões de Proteção de Menores. São cada vez mais os filhos de pais separados, que se vêem no enredo dos conflitos conjugais e que apresentam problemas de comportamento, absentismo escolar, consumo de drogas, entre outros comportamentos desviantes. Com os contributos da neurociência, sabemos hoje, que a agressividade e impulsividade estão muitas vezes relacionadas com a maturação cerebral e que para que esta se desenvolva de forma correta e harmoniosa, a criança precisa de vínculos fortes e seguros e sobretudo de vivências positivas, que lhes permita desenvolver a consciência de si e do outro. Sabemos também hoje, que o quociente emocional de uma criança ou individuo é mais decisivo para o sucesso, que o quociente de inteligência, já que as nossas emoções e a capacidade que temos para as gerir de forma eficiente, é fundamental para a obtenção de sucesso, quer na escola, quer na vida em geral. Educar de forma positiva é desenvolver na criança a capacidade de se autorregular e se focar no que realmente interessa, permitindo-lhe um desenvolvimento emocional potenciador de aprendizagem continua, eficiente e integrada na sociedade. Ou seja, será caso para dizer, que hoje, mais importante que um bom casamento, é ter um bom divórcio. Livre de conflitos que se perpetuem no tempo e que permitam seguir o lema de “Pais Felizes, Crianças Felizes”. “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 3 O conceito de família, evoluções, transformações e redefinições A família, no sentido amplo do termo, é o que há de mais ancestral na história da humanidade, a mais estável mas também a que, actualmente, sofre modificações mais radicais, motivadas pelos novos contextos sociais, económicos, políticos, científicos, etc.. No chamado mundo ocidental, as formas de famílias são muitas no entanto, o modelo, ainda predominante, segundo vários estudos, continua a ser o nuclear conjugal.1 Ao longo dos tempos, independentemente da sua forma, a família desempenhou essencialmente a função reprodutora, educativa e económica. Actualmente a família desempenha também a importante função de espaço de construção de identidade. De acordo com Almeida, (1985:8), “as famílias deixaram de ser consideradas “tábua rasa” onde se vão inscrevendo, mecanicamente, as influências exteriores a ela e passa a ter o estatuto de actor capaz de intervir na sua própria dinâmica de vida e de relações inter e intra pessoais, gerindo de forma particular, todas as influências externas preservando, interpretando e reinventando estratégias. Desta forma posiciona-se relativamente ao exterior provocando situações de continuidade ou de mudança.” A família é originariamente o lugar onde o individuo está inserido por nascimento ou adopção e nela se desenvolve, através de experiencias vividas, desenvolvendo a sua personalidade e caracter, transmitindo posteriormente também as suas crenças e tradições, na família aprendidas e desenvolvidas A importância do papel dos pais na educação dos seus filhos, constitui um conceito indiscutível, cuja evidência não necessita ser reforçada, pois a família é o meio naturalmente mais adequado para que a interacção criança-adulto se faça de forma satisfatória e proporcionadora de um desenvolvimento saudável em todos os domínios da sua vida. Uma criança que cresce e interage num ambiente familiar agradável e estimulante, terá mais probabilidades de se sentir confiante e segura para os desafios que a vida lhe vai colocando. A família constitui uma unidade onde surgem muitas interacções e acontecimentos que afectam qualquer um dos membros da família e podem ter impacto em todos os seus membros. Se os pais são modelos desajustados, oscilando entre a passividade e a ameaça, e entre os quais o conflito é permanente, a criança não desenvolve mecanismos de auto-regulação, nem estratégias de solução de problema. Já Augusto Conte no seu Traité de sociologie instituant la Religion de l’Humanité em 1851, referia que a socialização familiar transforma os indivíduos em seres sociais e não apenas em seres familiares. A vida familiar garante a “transição real dos instintos egoístas para as simpatias universais”.1 Agregados domésticos por tipos de composição - http://www.pordata.pt/DB/Portugal/Ambiente+de+Consulta/Tabela “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 4 As famílias, são por isso, como refere Ribeiro (1994,p58) “… uma comunidade que nasce, cresce, procria, decresce e morre, continuando ao longo das gerações e transmitindo a vida… “ Assim se percorre o ciclo de vida da família ao longo do tempo, sendo que cada estágio apresenta características e desafios aos quais a família terá de responder adequadamente. É inevitável que ao longo da vida das famílias os seus membros atravessem uma série de estágios previstos, separados por transições previsíveis e por vezes também imprevisíveis. Cada estágio será marcado por alguma mudança em algum membro da família (nascimento, morte, saída de casa etc) e estas mudanças acabam por ter impacto em todo o sistema familiar. O trabalho de Carter & McGoldrick, referido no artigo de Claudia Cacau Furia Cesar (p3), considera a existência de seis grandes estágios do ciclo de vida familiar, salientando que, por um lado, nem todos os membros tem obrigatoriamente de passar por todos eles, quer seja por impossibilidade ou opção própria e por outro lado, dado que a família é composta por diversos membros em diferentes fases de desenvolvimento, também pode acontecer que as fases se sobreponham. Seis grandes estágios do ciclo de vida familiar: 1. Adultos jovens – será a fase em que o jovem adulto se separa da família de origem. Esta fase requer alguns reajustes nas relações, já que não se pretende que rompa com relações. 2. O casal – o início da vida a dois não é fácil, pois exige uma aliança de valores, sobre as quias é necessário expressar e conciliar. 3. Família com filhos pequenos - Nesta fase, acrescem as discussões centralizadas na disposição e partilha das responsabilidades, cuidados com a criança, a divisão das tarefas domésticas etc. De acordo com alguns autores, esta é a fase do ciclo de vida familiar que possui o índice mais elevado de divórcio. 4. Família com filhos adolescentes - Neste estágio a forma de imposição de autoridade torna-se distinta, pois os adolescentes trazem para dentro da família novos valores e começam a estabelecer os seus próprios relacionamentos, tornando-se importante ajustes especiais entre pais, filhos e avós, para permitir e estimular estes novos relacionamentos. 5. Ninho vazio – A saída de casa de um filho é um grande desafio para o casal, que retorna o foco para ele próprio e não para a maternidade ou paternidade. Simultaneamente podem assistir ao nascimento de uma nova geração, mas podem acumular também a difícil tarefa de acompanhar o envelhecimento dos seus pais. A forma como se vive este estágio dependerá muito da forma como se desenvolveu o ciclo da família nos estágios anteriores. Se para uns é uma fase de libertação, para outros é uma fase de grande perda e depressão. 6. Família no estágio tardio da vida – nesta fase o individuo pode deparar-se com algum vazio existencial, principalmente se ocorre a morte do cônjuge. É uma fase onde a união e o apoio familiar são fundamentais. “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 5 Todavia, para além das transições previsíveis, o ciclo da vida da família vive cada vez mais momentos imprevisíveis que podem afectar profundamente a vida familiar, e para as quais dificilmente estamos preparados. É o caso do divórcio, da doença ou da morte precoce de um ente querido, desemprego, etc. A verdade é que as sociedades actuais parecem criar desafios cada vez mais exigentes à manutenção equilibrada da família e consciente dessa dificuldade, o direito e o legislador, tem sentido cada vez mais necessidade de adequar e regulamentar as questões familiares, como forma de prevenir ou resolver conflitos entre os membros da família. Se analisarmos a forma como Portugal vêm adequando a lei às necessidades reais das famílias de hoje, percebemos a vontade e a consciência do legislador relativamente à realidade actual das relações conjugais. Em Portugal, é visível no direito a importância que sempre foi dada à família, espelhado, por exemplo, na constituição da Republica Portuguesa (artº 36) e no Código civil (art.º 1576 e ss do CCiv). Desde a segunda metade do século XX assistiu-se a um conjunto de importantes transformações nas sociedades industrializadas. Em Portugal, essas mudanças fizeram-se sentir sobretudo nas últimas 4 décadas e tiveram grandes repercussões na composição socioprofissional da população portuguesa, com relevo para a crescente feminização da população activa e modos de organização da vida familiar. Para além da entrada da mulher no mercado de trabalho, surgem novos desafios à família e à conjugalidade. O ritmo de vida, a vontade de viver o hoje e o presente, a busca da felicidade e da satisfação do Eu, dão muitas vezes origem a pontos de vista divergentes, que geram conflito e vontade de dissolver o vínculo familiar do casamento. A admissibilidade do divórcio para quaisquer casamentos é consagrada na Constituição da Republica Portuguesa, no art. 36, com dupla intenção. O n.º2 consagra um verdadeiro direito ao divórcio dos cônjuges, inclusive o católico; e o n.º 3, consagra a igualdade de direitos e deveres dos cônjuges quanto à sua capacidade civil e política e à manutenção e educação dos filhos. Outros aspectos da lei são exemplificativos da necessidade de legislar de acordo com as realidades atuais, veja-se por exemplo, os cuidados que tem vindo a ser tidos em matéria de promoção e protecção de menores, tentando sempre adequar a lei e os procedimentos, aquilo que é o verdadeiro interesse da criança. Saliento o art. 36º/5 da CRP, com a atribuição aos pais do poder-dever de educação dos filhos; o art.º 36º/4 com a não discriminação dos filhos nascidos fora do casamento (deixa de haver a figura do filho ilegítimo); a protecção da adopção no art. 36º/7; e saliento também o CCiv, quando regulamenta a regulação do exercício das responsabilidades parentais, bem como a lei de Protecção de crianças e jovens em Perigo (Lei n.º 149/99 de 1 de Setembro, revista pela lei n.º 31/2003 de 22 de agosto e recentemente actualizada pela lei n.º 23/2017 de 23 de maio, que alarga o período de protecção até aos 25 anos). “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 6 A evolução das sociedades deu também origem a novas formas de conjugalidade e neste sentido, o legislador, teve também necessidade de regulamentar. É o caso da união de facto e do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Sendo a questão dos direitos e deveres da família, tão complexos, afigura-se hoje, cada vez mais a necessidade de trabalhar as situações de conflito na família, nomeadamente na conjugalidade e na parentalidade, de forma mais humanista e holística. Sendo as relações familiares, pontos de equilíbrio do individuo, que lhe permitem ou não desenvolver o seu potencial de forma harmoniosa, que interferem com sentimentos, emoções, estados de consciência, convocam por isso, abordagens diferenciadoras e conciliadoras, que lhes permita ver as coisas e a realidade de forma clara e não turva, por um turbilhão de emoções. Sendo a família sinonimo de emoções e sentimentos, o conflito, implica na maioria das vezes dor, sentimentos contraditórios, pouco claros e na maioria das vezes dificuldades de comunicação. Neste sentido, a mediação familiar afigura-se como a forma mais humanista de lidar com os conflitosfamiliares, permitindo encontrar consensos e reformular relações, que se coadunem com as vivências cada vez mais individualistas das sociedades contemporâneas. Do divórcio surgem muitas vezes novas famílias, ou famílias recompostas e assim, novos membros para a família, que antes pouco faziam parte do nosso quotidiano. É o caso da madrasta, do padrasto, do irmanastro ou da avónastra. Estes últimos, nomes por mim inventados, mas que considero que a curto ou médio prazo, com esta ou outra nomenclatura, farão parte do nosso léxico. Também a parentalidade sofreu mutações e não se esgota na sua esfera quotidiana e domestica. Pelo contrário, a família funciona também, como parte dos sistemas mais complexos na qual está integrada e por isso, é também natural que se coloquem novos desafios à parentalidade. Consequências das transformações sociais e familiares no exercício da parentalidade “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 7 Os objectivos gerais da educação parental, que se perpetuam ao longo dos tempos, são o desejo que os nossos filhos sejam felizes, respeitando as regras e os limites. O que muda é a forma como queremos lá chegar. Se em termos sociais, temos dificuldade em entender as ditaduras, perpetivando a necessidade de autoridades mais democráticas, que respeitem o outro, o mesmo acontece no seio da família. As relações de poder esbatem-se e promove-se o igual valor. Entre marido e mulher e também entre pais e filhos. A primeira e mais relevante relação que estabelecemos com o mundo, decorre do desenvolvimento de um vínculo emocional com as figuras que cuidam de nós, nos primeiros anos de vida. A forma como esta relação decorre é fundamental para o desenvolvimento de um sentimento de confiança e de segurança em si próprio, aumentando assim, as competências da criança para explorar o mundo. As transformações do papel da mulher no seio da família, trouxeram também consequências na forma como se exerce hoje a parentalidade, começando mesmo a falar-se de coparentalidade. De acordo com o artigo 1878º do CCiv, n.º 1, “compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, promover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros e administrar os seus bens”. Embora o termo, coparentalidade, seja bastante recente, a bibliografia sugere que este tenha surgido, não pela partilha das responsabilidades parentais em ambiente conjugal, mas parece mesmo ter surgido no contexto de famílias divorciadas, possivelmente porque quando os pais se separam, a relação coparental mantem-se e para sempre. No entanto, este termo não surge na legislação portuguesa, nem quando a Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro, introduziu importantes alterações às regras que estabelecem o exercício das responsabilidades parentais dos filhos menores em caso de dissociação familiar. “A primeira alteração consistiu na substituição da expressão “poder paternal” por “responsabilidades parentais” (artigo 3.º da Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro), em consonância com a ideia de que aquela expressão se mostrava pouco adequada a refletir a realidade jurídica subjacente e a exprimir, com rigor, a natureza e conteúdo dos direitos e deveres inerentes designadamente: a) a criança como sujeito de direitos; b) a criança como titular de uma autonomia progressiva, reconhecida em função do desenvolvimento das suas capacidades, da sua idade e da sua maturidade (artigos 5.º, 12.º e 14.º, n.º 2 da Convenção sobre os Direitos da Criança); c) a funcionalidade dos poderes que integram as responsabilidades parentais; d) a vinculação do seu exercício ao interesse do menor; e) a igualdade de direitos e de deveres de ambos os pais relativamente à pessoa e ao património dos filhos menores; f) a corresponsabilidade de ambos os pais pela sua educação, desenvolvimento e bem estar.” (Guia pratico Divórcio e Responsabilidades Parentais, 2013) Contudo, importa referir que a coparentalidade no seio da relação conjugal é também um factor de extrema importância para o desenvolvimento emocional harmonioso de “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 8 qualquer criança. A partilha de valores comuns na educação das crianças, cria um ambiente coerente e seguro, fundamental para o seu desenvolvimento. Por outro lado, em caso de separação ou divórcio, quanto mais pacífica e conciliadora for a forma de educar em conjunto, mas fácil vai ser reorganizar os sistemas familiares em separado. Modelos de Parentalidade Grande parte da literatura tem vindo a categorizar ou tipificar os diferentes estilos parentais, procurando avaliar o impacto das práticas parentais em diversas dimensões da vida das crianças. (Baumrind, 1966, 1968; Maccoby e Martin,1983; Feinberg,2003; Dias, 2015; COHEN, 2010 e outros) A educação autoritária, caracteriza-se pela imposição da obediência e do respeito pela autoridade. Os pais autoritários são exigentes, pouco tolerantes e pouco compreensivos, dando origem a filhos submissos de aparente conformismo. Estas práticas podem provocar emoções intensas, como hostilidade, medo e ansiedade, revolta interferindo na capacidade de a criança ajustar o seu comportamento às situações com que é confrontada. As necessidades da criança não são tidas em conta. O que importa é que a criança obedeça sem questionar, desencorajando-se assim, o diálogo, anulando-se qualquer tentativa por parte da criança para contestar ou discutir as regras impostas que não resultam de qualquer consenso prévio. O ambiente assemelha-se ao de uma ditadura ou de um regime militar. A educação permissiva é o oposto da anterior. Muitos pais, não se revendo no modelo autoritário de educação acabam por cair no modelo da permissividade, que promove ainda mais a insegurança da criança, já que todos precisamos de regras, limites e rotinas. Os pais permissivos são compreensivos, tolerantes e afectuosos. Utilizam pouco a punição e evitam sempre que possível o exercício da autoridade ou a imposição de regras e restrições. No entanto, não conseguem estabelecer limites, permitindo comportamentos desadequados causadores de problemas. Não exigem um comportamento maduro, respeitador e adequado, permitindo às crianças que elas regulem o seu próprio comportamento, tomem as suas próprias decisões e utilizem poucas regras na gestão do dia-a-dia (horas de deitar, refeições, tempo para ver televisão, etc.) Evitando a todo o custo a punição, mostram-se totalmente disponíveis e receptivos aos desejos e “caprichos” da criança, acabando por ser vistos por estas como um recurso para a realização dos seus desejos e não como um modelo, nem como uma figura de referência, responsável por moldar ou direccionar o seu comportamento. A educação negligente, ao contrário do que acontecia há uns anos, não é um apanágio de uma classe social com dificuldades económicas ou baixa literacia. É hoje transversal a todas as classes, encontrar adultos, que embora sejam pais, não assumiram a 100% o papel de educadores. Pais negligentes não são nem afectuosos, nem exigentes, nem compreensivos. Tendem a manter os seus filhos à distância, respondendo somente às suas “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 9 necessidades básicas. Não conseguem organizar-se de modo a fornecerem cuidados e apoio continuados aos seus filhos. Ora estão, ora não estão. Demonstram pouco envolvimento, no dia-a-dia e na socialização dacriança, não supervisionando o seu comportamento, pois estão apenas centrados em si próprios. A ausência de contenção e de orientação vai ter como consequência uma manipulação do mundo exterior por parte das crianças, pois esse é o padrão relacional a que se habituaram no seu dia-a- dia. A meu ver, é essencialmente sobre este tipo de parentalidade que recai a alienação parental. Os filhos são vistos como instrumento, para alcançar os seus próprios objectivos. A educação Democrática, tem vindo a ser defendida como a mais equilibrada, pois traduz-se num ambiente familiar com poucas tensões, traduzindo-se em pessoas mais relaxadas, mais aptas a lidar com problemas (de forma optimista) e a sobreviver socialmente. Parece também o estilo educativo que mais vai de encontro aos direitos da criança, uma vez que parece salvaguardar o nº2 do artigo 1878º do CCiv, segundo o qual “os filhos devem obediência aos pais; estes, porém, de acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a sua opinião nos assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida.” Nos últimos anos, com o surgimento da psicologia positiva e muito por influência dos contributos da neurociência, este estilo de educação democrático tem sido estudado, aprofundado e apelidado de Educação Positiva. A parentalidade positiva caracteriza-se por um tipo de parentalidade que embora mais tolerante é também exigente em relação aos filhos, mas numa lógica de reciprocidade. Os filhos devem responder às exigências dos pais, mas os pais também aceitam a responsabilidade de responderem, quanto possível, aos pontos de vista e razoáveis exigências dos filhos. Encorajam-lhes a autonomia, ouvem-lhe as opiniões, mas não hesitam no caminho a seguir e não descuram o cumprimento de regras. A negociação e o compromisso são possíveis. Trabalha-se a empatia, ou seja, a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro. Estimulam a discussão e partilham pontos de vista e as regras são na maioria das vezes discutidas em conjunto. Também aqui, creio que o direito e o legislador têm tentado ir de encontro a esta perspetiva, nomeadamente com a introdução da possibilidade de audição de crianças e jovens, no caso de separação e divórcio dos progenitores e regulação das responsabilidades parentais, (quando assim se justifique) entendendo as crianças como “sujeitos de direitos”, que devem ser ouvidos sobre todas as matérias que lhes dizem directamente respeito, conforme o artigo 12º da Convenção dos Direitos da Criança (CDC) acolhida na ordem jurídica nacional pela Resolução da Assembleia da República n.º 20/90, de 8 de Junho de 1990, e pelo Decreto do Presidente da República n.º 49/90, de 12 de Setembro, que estabelece que: “Os Estados Partes garantem à criança com capacidade de discernimento o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhe respeitem, sendo devidamente tomadas em consideração as opiniões da criança, de acordo com a sua idade e maturidade. Para este fim, é assegurada à criança a oportunidade de ser ouvida nos processos judiciais e administrativos que lhe respeitem, seja directamente, seja através de representante ou de organismo adequado, segundo as modalidades previstas pelas regras de processo da legislação nacional.” “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 10 Contudo, entre psicólogos, esta participação e audição de crianças não é pacífica, sendo que muitos alertam para o facto de esta participação poder agravar a já debilitada estabilidade emocional dos filhos perante o conflito parental, por força das vivências negativas, associadas à iminente separação dos progenitores. Neste sentido, a Lei Tutelar Educativa (Lei n.º 166/99, de 14 de Setembro) fornece um precioso contributo para a determinação das regras de audição do menor, ao definir no seu artigo 47.º (Audição do menor) que: “A audição do menor é sempre realizada pela autoridade judiciária. A autoridade judiciária pode designar um técnico de serviço social ou outra pessoa especialmente habilitada para acompanhar o menor em acto processual e, se for caso disso, proporcionar ao menor o apoio psicológico necessário por técnico especializado”. No seu artigo 96.º (Local da audiência e trajo profissional) é ainda consignado que: “Oficiosamente ou a requerimento, o juiz pode determinar que a audiência preliminar decorra fora das instalações do tribunal, tendo em conta, nomeadamente, a natureza e gravidade dos factos e a idade, personalidade e condições físicas e psicológicas do menor. Os magistrados, os advogados e os funcionários de justiça usam trajo profissional na audiência preliminar, salvo quando o juiz, oficiosamente ou a requerimento, considerar que não é aconselhado pela natureza ou gravidade dos factos, pela personalidade do menor ou pela finalidade da intervenção tutelar”. Muito se tem falado das audições técnicas especializadas de menores e a meu ver muito ainda há a fazer, já que mais do que reconhecer a criança como sujeito de direitos, a educação positiva centra-se na forma como a criança apreende a realidade, a transforma e a reproduz. Ou seja, na forma como determinados acontecimentos interferem no desenvolvimento das suas emoções, ou seja, na sua inteligência emocional. Para educar de forma positiva e empática, precisamos perceber como funciona o outro, neste caso, como funciona a cabeça dos nossos filhos. Precisamos perceber os diferentes estágios de desenvolvimento, para acolher, reconhecer, compreender e direccionar o comportamento da criança. Torna-se por isso de extrema importância que técnicos e progenitores, conheçam os diversos estágios de desenvolvimento da criança e adquiram competências para acolher, reconhecer e apoiar a criança na organização dos seus sentimentos e emoções, não esquecendo que, a vinculação que se estabelece entre pais e filhos é o segredo da auto-estima. Os primeiros estudos sobre a importância do vínculo, foram feitos por Harry Harlow, com o objectivo de compreender melhor os processos de aprendizagem na infância. Efectuou diversas experiencias interessantes com macacos, chegando à conclusão, de que aqueles que eram privados do contacto materno desenvolviam comportamentos psicológicos graves, como apatia, tristeza ou mesmo agressividade.2 Estando inicialmente em desvantagem, no início da relação parental, (já que não carregou no ventre, não amamentou) o pai, consegue com carinho, amor e dedicação, 2 Vídeo experiência Harry Harlow com macacos - https://www.youtube.com/watch?v=_O60TYAIgC4 “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 11 alcançar uma vinculação tão importante, quanto a da mãe. Basta haver, presença, toque, cumplicidade e amor, principalmente nos primeiros anos de vida. “Quando uma criança se sente segura e incondicionalmente querida, cresce a sentir- se uma pessoa importante e que merece sentir-se bem. Ajudar o seu filho a ter uma boa auto-estima é dar-lhes a possibilidade de uma vida feliz. Pense bem, o mundo está cheio de pessoas que têm tudo e que, no entanto, se sentem desgraçadas.” (Bilbao 2016) O Cérebro da Criança Para perceber a importância e as vantagens de educar de forma positiva, fortalecida nas emoções e reforce o vínculo, precisamos portanto, conhecer a forma como se desenvolve o cérebro de uma criança. O cérebro é composto pelo hemisfério esquerdo e direito, sendo que o direito é mais imaginativo e o esquerdo mais racional, contudo, nas crianças esteestá em evolução, considerando-se que só fica formado, por volta dos 23 anos. (Siegel, 2015) O seu desenvolvimento depende do tempo e da idade, mas também das experiencias vividas e a forma como a criança as interpreta. Ao falarmos de forma empática, ou seja, reconhecendo as necessidades do outro, com o lado direito do cérebro dos nossos filhos, o lado dos sentimentos, estamos também a desenvolver o lado esquerdo, o lado da compreensão e da razão. Quando as crianças estão agitadas, pressionadas ou sobre stress, o cérebro delas não tem capacidade de reter nada. Ninguém está aberto à aprendizagem ou à compreensão nos momentos de stress, muito menos uma criança. Para entender isso, é preciso dividir o cérebro em dois estados: o receptivo e o reativo. Quando nós nos conectamos às emoções da criança, tiramo-la do estado de reação e a levamo-la a um estado receptivo, em que está disposta a ouvir e aprender. Só vamos conseguir atingir esse ponto se pararmos para pensar, porque é que a criança está a agir dessa forma, o que desencadeou aquela reação brusca ou que emoção está por trás daquele comportamento. Quando queremos conectar-nos com as crianças, é necessário mais do que as palavras certas, o acolhimento e reconhecimento das emoções. Conseguirmos colocarmo-nos no lugar dela e demonstrar que estamos a perceber o que está a sentir. O nosso grande objectivo é que a criança sinta, de fato, que sabemos o que é que ela sente e que estamos ali para orientar, se for preciso. Importa acolher os sentimentos, sem julgar; tocar na criança e “liga-la à terra”; falar primeiro para o lado direito do cérebro, para sermos escutados; falar depois para o lado esquerdo para encontrar estratégias de solução. (Dias, 2015) Por outro lado, Daniel Siegel (2015) baseando-se na análise do cérebro triuno, divide também o cérebro da criança em andar de baixo e andar de cima, sendo que o de baixo é apelidado de primitivo, pois é ele que comanda as funções mais básicas. O andar de cima é onde está o juízo e o controlo das emoções. “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 12 As birras e os impulsos estão no andar de baixo e à medida que o cérebro se vai desenvolvendo o andar de cima vai começando a funcionar como filtro das emoções e reacções. Por isso, é importante reconhecermos os impulsos do andar de baixo de forma empática e com “humor” de forma a darmos ferramentas para que o andar de cima se desenvolva. O andar de cima é a área do cérebro mais refinada, mais elaborada. É nela que se desenvolve a noção de moral, onde nasce a empatia e é esta área que nos ajuda a planear e a tomar decisões. É uma espécie de filtro das emoções e onde se decide o comportamento a adoptar. No entanto, é no andar de baixo que se encontra o sistema límbico. É a área que responde por impulso, mas é também a área onde se arquivam as memórias sensoriais e vivem as emoções. Para um correto desenvolvimento desta área do cérebro na primeira infância, o maior contributo é do vínculo parental seguro. Quando agimos sem pensar a responsabilidade é toda desta área. Conhecida por cérebro primitivo. Integrar os dois andares permite-nos realizar tarefas complexas, como parar para pensar, antes de decidirmos, reconhecer os sentimentos dos outros, fazer julgamentos éticos e morais. Dai a expressão “saltou-me a tampa”. O andar de baixo, “empurrou” (a tampa) o andar de cima. Agimos por impulso, sem pensar. Se o andar de cima apenas fica fechado, por volta dos 23 anos e se são necessárias experiencias boas o suficiente para o estimular, assim como, paciência e serenidade, a brincadeira, para que possamos saber que cada coisa tem o seu momento, não podemos esperar que um adolescente tenha um controlo tão refinado e elaborado como tem um adulto. Ou seja, numa situação de conflito, medo, perda ou de comportamento menos adequados, é fundamental que possamos integrar todas as áreas do cérebro e falar com aquelas que nos irão ajudar a “normalizar” e “serenar” o que a criança está a sentir. Importa ainda falar de outros componentes do sistema límbico, pois é este que comanda certos comportamentos necessários à sobrevivência, mas também ajuda a decidir o que nos agrada ou não. É também ele o responsável por desenvolver as funções afectivas, dependente portanto também, da vinculação parental. É também aqui que têm origem sentimentos como amor, ódio, tristeza, raiva. É constituído pela amigdala que identifica o perigo, gerando medo e ansiedade. Está directamente ligada às sensações de medo e raiva, e também é graças a ela que fazemos o reconhecimento das expressões faciais como o medo e reparamos nas expressões de ameaça e perigo. O Hipocampo lida com a memória, sobretudo de longa duração. Quando esta é atingida, deixamos de conseguir memorizar as informações que nos são dadas. As lesões do hipocampo impedem a pessoa de construir novas memórias e a pessoa tem a sensação de viver num lugar estranho, onde tudo o que experimenta simplesmente se dissipa. O Tâlamo está ligado as alterações das emoções. A Área pré-frontal, embora não faça parte do sistema límbico, lida directamente com ele e dai ser tão “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 13 importante. Por exemplo, numa situação em que a amígdala dá o alerta de medo, o lobo pré-frontal, será quem vai ajudar a vencer esse medo. Quando de alguma forma não se desenvolve ou é lesionado, o individuo fica incapaz de tomar responsabilidades sociais, de se concentrar, sentir empatia. Esta área é fundamental para potenciar os afetos. Mas porquê falar do cérebro, quando falamos de mediação familiar e parentalidade positiva? Porque, se para o correto desenvolvimento do sistema límbico, a criança necessita de vínculo. Se é este que lhe trás segurança, e se quanto mais segura e serena ela se encontra, maior a sua capacidade de se desenvolver, aprender e crescer de forma saudável, então o conflito e a desvinculação parental são os maiores inimigos de um correto e saudável desenvolvimento cerebral. Sabendo isto, a mediação familiar pode assumir um papel de extrema importância na manutenção do equilíbrio infantil perante o conflito. Quando a criança se sente ligada/ vinculada, o cérebro funciona a todo o vapor e ela está disponível e atenta. O sistema límico sabe interpretar a linguagem não-verbal e perceber se deve ou não sentir-se ameaçada, se deve ou não ligar o estado de alerta. Se o ambiente está tranquilo, a criança consegue gerir o impulso, a memória é realizada e consegue pensar, sentir empatia e tomar melhores decisões. Ou seja, quanto mais positiva for a relação que a criança desenvolve com os adultos, mais segura, física e emocionalmente, ela se sentirá. É a qualidade desta relação que irá ajudar a criança a formar a inteligência. Quando a criança vive no meio do conflito, ou quando ralhamos de forma stressada, a criança que está em busca de vínculo, não o encontra e o cérebro dela não consegue escutar. Não compreende totalmente. A verdadeira união de uma família não se cria pelos laços de sangue, mas sim através do carinho e do respeito mútuo. De acordo com Teicher (s/d) (psiquiatria, professor na Universidade de Harvard), os maus tratos, a negligência e a falta de vinculação parental na infância não provocam apenas traumas psicológicos reversíveis. Mas também danos permanentes no desenvolvimento e funções cerebrais. Os hemisférios esquerdos de pessoas vitimadas pela violência desenvolvem-se significativamente menos do que deveriam. O efeito do abuso infantilpode manifestar-se de várias formas, em qualquer idade. Internamente pode aparecer como depressão, ansiedade, pensamentos suicidas ou stress pós-traumático, mas pode também expressar-se externamente como agressão, impulsividade, delinquência, hiperactividade ou abuso de substâncias. Em termos cerebrais, os estudos demonstram que, os maus tratos na infância podem estimular as amígdalas a um estado de irritabilidade eléctrica elevada ou danificar o hipocampo em desenvolvimento por meio de uma exposição excessiva stress. Pode também ocorrer uma redução da amígdala (principalmente a esquerda) que se correlacionava com sentimentos de depressão, irritabilidade ou hostilidade. Os estudos demonstram também, que os hemisférios direitos de pacientes que sofreram abusos desenvolveram-se tanto quanto os dos do grupo de controle, mas seus hemisférios esquerdos ficaram substancialmente para trás. (Teicher, s/d) Joaquim Silva, conhecido pelo “juiz que defende os filhos de pais em guerra”, tem utilizado muitos destes estudos para alertar pais, advogados, técnicos de acção social “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 14 e comunidade em geral, para as consequências nefastas do conflito parental, no desenvolvimento infantil. De acordo com o próprio, na maioria das vezes, os pais, quando alertados para as consequências do conflito no desenvolvimento dos filhos, tendem a procurar o acordo e a resolver o conflito, evitando que o processo siga a via judicial.3 Intervir promovendo, prevenir protegendo: o superior interesse da criança De acordo com os dados do PORDATA 2013, por cada 100 casamentos, há 70 divórcios. Muito haveria a dizer sobre estes dados, mas ficarei apenas por uma pequena reflexão sobre a conjugalidade da sociedade contemporânea. Creio que o que acontece é que 3 http://visao.sapo.pt/actualidade/sociedade/2016-01-30-O-juiz-que-defende-os-filhos-de-pais-em-guerra “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 15 a constituição e a manutenção da vida em conjunto, da coabitação, são muito influenciadas pelos valores do individualismo. Os ideais contemporâneos da relação conjugal enfatizam mais a autonomia e a satisfação de cada cônjuge do que os laços de dependência entre eles, deixando praticamente de existir uma identidade conjugal. Assim, o natural será que a relação conjugal se mantenha enquanto der prazer, enquanto preencher totalmente os ideais do indivíduo. Há um aumento das expectativas, uma extrema idealização do outro e ao mesmo tempo uma exigência de si mesmo, o que provoca tensões e conflitos na relação podendo levar à separação. A ideia do casamento para sempre e único não prevalecem na conjugalidade contemporânea. Giddens (2001) denomina de “amor confluente” aquele que presume a igualdade no dar e receber o afecto, desenvolvendo-se na intimidade do casal, mas este laço conjugal só se poderá manter se for capaz de proporcionar satisfação a ambos os parceiros. Ao analisar as “transformações da intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas”, Giddens (2001), salienta que os ideais do amor romântico, relacionados à liberdade individual e ao auto realização, desligam ou afastam os indivíduos das relações sociais e familiares mais amplas, demarcando com mais clareza a esfera do relacionamento conjugal, que passa a ser mais valorizada. O indivíduo tem tendência para viver intensamente a paixão, para desejar o outro por inteiro, acreditando que essa sensação de preenchimento jamais terminará. Todavia, na vida a dois e no dia a dia das sociedades modernas, esta identificação permanente e constante não é possível. A dada altura o indivíduo tem necessidade de ser ele próprio enquanto indivíduo “só” e não um indivíduo “com” de forma constante e permanente. De acordo com esta análise poderemos dizer que se hoje existem mais divórcios e separações talvez não seja apenas porque os indivíduos dão menos importância ao casamento ou à conjugalidade, mas talvez porque lhe dêem demasiada importância no sentido em que não aceitam que este não corresponda às suas expectativas, caso contrário seria difícil explicar que muitos dos indivíduos que se separam, procurem novos relacionamentos. Aqui poderá residir também a gravidade e a violência dos conflitos conjugais. O ideal de felicidade foi depositado no outro, que de alguma forma de fraldou as expectativas. Atribuem-se culpas, procuram-se culpados a quem punir e castigar, por uma infelicidade, que não é culpa de ninguém. “Se queremos encontrar a felicidade, devemos empenhar-nos em trabalhar mais arduamente para a encontrar, porque, apesar de existir um passo fácil para a infelicidade – não fazer nada – não existem passos fáceis para a felicidade”. Devemos contudo, permitirmo-nos viver o presente, retirando dele o melhor partido, em vez de sermos escravos do passado ou do futuro, já que uma das barreiras mais comuns à felicidade é a falsa expectativa de algo. (Bem-Shahar, 2009) Na tentativa de punir o outro, o individualismo extremo, leva-nos a uma nova realidade, que afecta a relação entre pais e filhos, ocorrendo principalmente no momento em que um casal se separa, seja no período do divórcio ou pós-divórcio, podendo, no entanto, também verificar-se quando o casal ainda está junto. Falamos de Alienação Parental quando um dos pais da criança manipula o seu filho de forma a que a criança fique com uma imagem distorcida do outro progenitor, levando- “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 16 a, inclusivamente, a romper os laços afetivos. A intenção do progenitor que manipula a criança é de a predispor contra o outro progenitor. A Alienação Parental, tem sido entendida como criação de uma relação de carácter exclusivo entre a criança e um dos progenitores com o objectivo de excluir o outro. Trata-se de um distúrbio que se traduz num conjunto de “sintomas resultantes do processo pelo qual um progenitor transforma a consciência dos seus filhos, mediante diferentes estratégias, com o objectivo de impedir, obstaculizar ou destruir os seus vínculos com o outro progenitor” (Aguilar, 2008). Este fenómeno conhecido pelos especialistas como Síndrome de Alienação Parental (SAP) tem sido um dos grandes desafios dos Tribunais de Família, pois acarreta danos, muitas vezes irreversíveis para os menores. O desafio de advogados e mediadores familiares, passa, na maioria das vezes, por tentar consciencializar pais e familiares para o facto de que o fim da relação conjugal, não pode ou não deve implicar, o fim da relação parental e que toda a criança deve ter o direito e a oportunidade de ela própria construir a imagem dos seus progenitores, libertando-se dos olhares conflituosos, amargurados e distorcidos, que muitas vezes, o fim do casamento acarreta, tal como está consagrado no artigo 24º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2000), “todas as crianças têm o direito de manter regularmente relações pessoais e contactos diretos com ambos os progenitores, exceto se isso for contrário aos seus interesses”. A ciência psicológica demonstra que existe uma clara vantagem de um exercício conjunto da parentalidade, que promova o vínculo afetivo com ambos os progenitores, permitindo o aumento da rede de suporte emocionale social da criança. Estudos revelam também que não é o divórcio em si, que causa traumas na criança, mas sim a vivência do conflito. Se o divórcio for gerido de forma equilibrada e os vínculos parentais não forem quebrados é possível à criança passar pelos vários estágios de forma natural. Ou seja, é natural que inicialmente a criança viva a fase da negação; posteriormente a fase da raiva (porque é que eles me fizeram isto); a fase da culpa e negociação (se eu me portar bem e não fizer mais birras vocês voltam a ficar juntos?); a fase da depressão (pela dúvida de como vai ser dali para a frente. Será que vão continuar a gostar de mim?); a fase da aceitação (até é bom ter duas casas) e a fase da cura (a criança percebe que continua a ter uma família que a ama, só vivem em espaços separados). Contudo, não raras vezes, as situações de conflito no divórcio, acabam por tomar graves proporções, envolvendo, as E.M.A.T. (Equipa Multidisciplinar de Assessoria aos Tribunais), as C.P.C.J., (Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Risco) constituídas por técnicos de áreas diversas que acompanham e avaliam os casos que envolvem menores, e que são referenciados para tribunal, dando conhecimento da evolução das situações aos juízes responsáveis pelos casos. Infelizmente são escassos os técnicos nestas equipas, para os milhares de processos existentes e por outro lado, são também escassos os técnicos com conhecimentos na área da mediação familiar e educação e parentalidade positiva. Só assim se explica que os sucessivos relatórios C.A.S.A. (Caracterização Anual da Situação de Acolhimento das Crianças e Jovens) apresentem resultados negativos “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 17 relativamente à primeira medida de promoção e protecção definida na lei n.º 147/99, ou seja, medidas a executar no meio natural de vida. “1 - As medidas de promoção e protecção são as seguintes: a) Apoio junto dos pais; b) Apoio junto de outro familiar; c) Confiança a pessoa idónea; d) Apoio para a autonomia de vida; e) Acolhimento familiar; f) Acolhimento em instituição; g) Confiança a pessoa seleccionada para a adopção ou a instituição com vista a futura adopção. 2 - As medidas de promoção e de protecção são executadas no meio natural de vida ou em regime de colocação, consoante a sua natureza, e podem ser decididas a título provisório. 3 - Consideram-se medidas a executar no meio natural de vida as previstas nas alíneas a), b), c) e d) do n.º 1 e medidas de colocação as previstas nas alíneas e) e f); a medida prevista na alínea g) é considerada a executar no meio natural de vida no primeiro caso e de colocação no segundo.” Se analisarmos o relatório CASA 2015, verificamos que 60% das crianças que foram institucionalizadas, a causa foi a falta de supervisão e acompanhamento, seguida de exposição a modelos parentais desviantes (33,3%) e muito próximo a negligencia ao nível da educação (32,3%). A idade com que os jovens são institucionalizados, também tem vindo a aumentar. Aqui deveríamos reflectir sobre as políticas de educação. O alargamento da escolaridade obrigatória até ao 12º ano e o pouco investimento no ensino profissional, também dão origem a novos conflitos familiares, com jovens desmotivados para a escola e impedidos de ingressar no mercado de trabalho, que acabam por também engrossar o número de casos sinalizados nas CPCJs. Outro dado relevante é o facto de que dos jovens institucionalizados, o número dos que foi identificado como tendo problemas de comportamento, de saúde mental, de debilidade mental, de consumo de substâncias ou de algum tipo de deficiência física “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 18 ou mental aumentou 38%, num só ano. Se pensarmos que a vinculação parental e as vivências positivas na infância, são um factor fundamental para o correto desenvolvimento do cérebro e adequação comportamental, estes dados não são de estranhar. O próprio relatório admite que se “Poderão levantar-se questões sobre a eficácia das medidas em meio natural de vida, e sobre o real investimento que nelas é efectuado, quer sob o ponto de vista do acompanhamento técnico, quer na intervenção desenvolvida” (CASA, 2015), apontando a necessidade de investimento de novas politicas ao nível da mediação familiar e da formação parental, apelando ao alargamento dos CAFAPs (Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental), já regulamentados pela Portaria n.º 139/2013 de 2 de abril, mas quase inexistentes em todo o pais. Sendo a institucionalização uma medida de fim de linha, será que estamos a salvaguardar o superior interesse da Criança? Conclusão Não há dúvida de que com a lei 61/2008, de 31 de outubro, foram introduzidas importantes alterações ao regime jurídico do divórcio, às suas consequências e ao exercício das responsabilidades parentais dos filhos menores. A ideia foi de alguma forma flexibilizar o processo, entendendo-se que o fim do casamento é um processo natural e legitimo da vontade das partes, sendo apenas necessário regular situações como, o exercício das responsabilidades parentais, a atribuição da morada de família, a fixação da pensão de alimentos e a partilha dos bens do casal. “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 19 Este processo de divórcio, por mútuo consentimento, passou a poder ser instaurado na conservatória do registo civil, sendo que no caso dos menores, o Ministério Publico, terá à posteriori de se pronunciar. O artigo 1774.º do CC passou a consagrar a possibilidade de os cônjuges, em processo de divórcio, recorrerem aos serviços de Mediação Familiar. Antes do início do processo de divórcio, as Conservatórias do Registo Civil e os Tribunais têm o dever de informar os cônjuges sobre a existência dos serviços de Mediação Familiar e os seus objetivos. Contudo, embora esteja previsto, o dever de informação aos cônjuges, por parte dos tribunais e das conservatórias do registo civil, sobre a existência e os objectivos da mediação familiar, o facto é que tal, nem sempre acontece. Diversos estudos demonstram que, em caso de conflito, os acordos alcançados em sede de mediação são mais duradouros, que os acordos feitos por imposição de um juiz, já que de alguma forma as partes se sentem vinculadas à solução encontrada. Por outro lado, trata-se de uma forma mais humanista de lidar com conflitos tão delicados como o vínculo familiar, que envolve sentimentos e emoções, que fragiliza as partes e lhes exige tempo e calma para reflexão. A Lei n.º 29/2013, de 19 de abril, apesar de não regular especificamente a Mediação Familiar, estabelece os princípios gerais aplicáveis à mediação realizada em Portugal, bem como os regimes jurídicos da mediação civil e comercial, dos mediadores e da mediação pública. Tratando-se os conflitos familiares, tão específicos e de contornos tão diferentes dos demais, a meu ver, mereciam uma legislação própria que a regulamentasse, não devendo estar equiparados aos demais, admitindo-se apenas algumas especificidades. Desde já porque a referida lei, considera que o processo de mediação familiar, tal como a mediação dos outros conflitos civis ou comerciais, pressupõe que as duas ou mais partes em conflito, pretendam voluntariamente, a assistência de uma terceira pessoa, imparcial, independente e desprovida de poderes de imposição, o apoio para o entendimento das partes e assima resolução de um conflito existente. O princípio da voluntariedade, está consagrado no art. 4, da referida lei. Embora compreenda a intenção do legislador, não me parece, que em matéria de conflitos conjugais que se estendem a conflitos parentais, este princípio deva existir, ou ser salvaguardado. Ou seja, tal como acontece já em outros países, nomeadamente Brasil, Estados Unidos, Canadá, quando o conflito inclui crianças e jovens a mediação familiar, não só é obrigatória, como em alguns estados se completa com a existência de oficinas de parentalidade, ou seja, oficinas para pais e filhos. A experiencia destes países têm demonstrado o sucesso destas oficinas, quer para o casal, quer para os filhos envolvidos no conflito. As oficinas com pais, podem cumprir um duplo objectivo. Por um lado, alertar e responsabilizar os pais pela vida dos filhos e pelas consequências do conflito no seu desenvolvimento, e por outro, criar algum "Empowerment" Parental. “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 20 Para os filhos podem significar um apoio, para ultrapassar este ciclo familiar de forma minimamente harmoniosa e equilibrada. No caso dos pais, estas oficinas poderiam ser divididas em três momentos ou tipo de conteúdos: 1. Os efeitos do conflito nos filhos 2. Boas práticas parentais – Parentalidade positiva 3. Questões jurídicas – Tipos de guarda; pensão de alimentos, etc. As oficinas com filhos, deveriam ser divididas por idades. Ou seja, entre crianças e adolescentes e teriam como objectivo: 1. Explicar aos filhos que o fim da relação conjugal não implica o fim da relação parental. 2. Acolher e reconhecer os seus sentimentos, demonstrando-lhes, que é normal que se sintam tristes com a separação e explicando-lhes os diferentes passos da reorganização familiar. 3. Os seus direitos – por ex. não presenciar brigas, não servir de mensageiro, não ouvir dizer mal do outro, etc. A mediação familiar afigura-se neste momento, como a melhor e única estratégia, para apoiar casais com filhos, na redefinição dos laços familiares, com vista à promoção de uma parentalidade positiva, que tenha em linha de conta as reais necessidades de desenvolvimento dos menores, libertando-os das consequências nefastas, do conflito, permitindo-lhes manter e assegurar um vinculo parental seguro e pleno de afeto. Só assim, o estado e as instituições, estarão realmente a salvaguardar o superior interesse da criança. Sofia Cid – Socióloga – Pós-graduada em Sociologia da Família; Mediação Familiar e Educação e Parentalidade Positiva. Formações complementares nas áreas da Neuropsicologia infantil e Mindfulness para Crianças. email: saltercid.sofia@gmail.com “Mediação familiar: uma ferramenta útil para a parentalidade positiva” Sofia Salter Cid 21 Bibliografia ALARCÃO, M. , 2002, (des) Equilíbrios familiares: Uma visão sistémica. 2ª Ed., Coimbra: Quarteto Editora. ALMEIDA, Ana Nunes, 1985, “Trabalho feminino e estratégias familiares”, in Análise Social, vol. XXI (85) pp. 7-44 AGUILAR, José Manuel, 2008, “Síndrome de Alienação Parental”, edição: Caleidoscópio BEN-SHAHAR, Tal, 2009, “Aprenda a ser Feliz”, Lisboa, Ed. Lua de Papel BERGER, Maurice, 1998, “A Criança e o Sofrimento da separação”, CLIMEPSI, Lisboa. BILBAO, Alvaro, 2016, “O Cérebro da Criança Explicado aos Pais”, Lisboa, Edições Planeta. CARDOZO, R. (s/d), “Os conflitos familiares e as escolas de Mediação”. 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