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HSM Management 43 março-abril 2004 ESTRATÉGIA Cinco formas de crescer dois dígitos ao ano Em entrevista exclusiva, o especialista em estratégia Michael Treacy afirma, com base numa pesquisa, que a diferença entre as empresas cujo brilho se apaga rápido e as que se expandem de modo uniforme num ritmo superior a 10% reais anuais está em gerenciar as iniciativas de crescimento segundo cinco estratégias eu último livro, Double-Digit Growth, focaliza as empresas norte-americanas com cres- cimento anual estável de dois dígitos. O que as diferencia das demais? O mais significativo é que essas empresas têm diversas iniciativas de crescimento e Ao realizar uma extensa pesquisa com as empresas mais importantes dos Estados Unidos, o especialista em estratégia Michael Treacy descobriu que são poucas as companhias com expansão constante e superior a dois dígitos anuais. E mais: esse desempenho, segundo o levantamento, não tem nada a ver com os movimentos da economia e sim com a forma como as empresas gerenciam suas iniciativas de crescimento –como se estas fossem parte de uma carteira de investimentos. Em entrevista exclusiva a HSM Management, Treacy descreve as principais conclusões de sua pesquisa, trans- formada no livro Double-Digit Growth (ed. Portfolio Press), e analisa as cinco estratégias utilizadas pelas empresas Sinopse S as administram como parte de uma carteira de investimentos. Elas diversificam suas apostas, distribuindo assim o risco, e dão prioridade e apoio a cada uma conforme a conveniência da ocasião, adotando estratégias específicas para isso. Por exemplo, no setor de telefonia wireless norte-americano, no qual os usuários mudam de companhia telefônica com grande freqüência, a Nextel teve grande êxito. Por quê? Por- que decidiu concentrar seus esforços na estratégia de reter clientes. Já a Dell apresentou excelentes resultados porque apostou no crescimento rumo a áreas adjacentes à de micro- computadores. Essas são as duas principais estratégias das empresas com crescimento de dois dígitos anuais? Na verdade, minha pesquisa identificou cinco estratégias essenciais que essas empresas usam para gerenciar suas iniciativas de crescimento: manter a base de clientes; aumentar a que têm esse ritmo de expansão e suas respectivas táticas: manter a base de clientes; aumentar a participação no mercado; atuar nos segmentos que estão prestes a registrar crescimento mais acelerado; ingressar em mercados adjacentes; e investir em setores não relacionados com o negócio central. O especialista ainda relaciona os quatro principais riscos de uma iniciativa de crescimento, aponta a rentabilidade bruta como melhor indicador para medi-lo e ensina as cinco perguntas-chave a que os executivos devem saber responder se quiserem gerenciar o crescimento com mais eficácia. A entrevista é de Viviana Alonso. HSM Management 43 março-abril 2004 ESTRATÉGIA participação no mercado; atuar nos segmentos que estão prestes a entrar em rápido cresci- mento; ingressar em mercados adjacentes; e investir em setores não relacionados com o negócio central. A primeira estratégia para crescer Vamos falar, então, de cada uma dessas estratégias. Como as empresas pesquisadas retêm seus clientes? A maioria das companhias acha que a melhor forma de fazê-lo consiste em incentivar a fidelidade dos clientes, mas isso é um mito. Em minha opinião, os compradores nunca são fiéis às empresas, mas sim a si mesmos e ao que julgam ser um valor melhor. Cada vez que um cliente repete a compra de determinado produto ou serviço, faz isso porque acredita que a empresa lhe proporciona valor mais elevado do que os concorrentes. Ou seja, para reter clientes, é preciso oferecer-lhes uma proposta de valor superior à da concorrência. Existem pelo menos três caminhos possíveis para isso: ajustar o produto ou serviço aos critérios de valor dos clientes; aumentar os custos que esses clientes podem ter se mudarem de fornecedor; e limitar a quantidade de produtos concorrentes que permitem aos clientes fazer comparações. Quais seriam os exemplos práticos dessas três táticas? As empresas que já têm relacionamento com seus clientes devem identificar suas necessida- des, saber o que é importante para eles e conhecer sua forma de decidir a compra –tudo isso permite oferecer uma proposta de valor melhor do que a da concorrência. Um exemplo é o cassino norte-americano Harrah’s Entertainment, que se concentrou na fidelização dos gran- des apostadores e, graças a um avançado sistema de coleta de informações, fornece uma exce- lente combinação de espetáculos, hospedagem e lazer de acordo com o perfil de cada cliente. Entre as companhias que empregam a tática de aumentar os custos decorrentes da troca de fornecedor está a GE Medical Services, fabricante de equipamentos médicos de alta tec- nologia que gerencia todo o ciclo de vida de seus produtos. A empresa disponibiliza financi- amento aos compradores, supervisiona o desempenho dos aparelhos nas instalações do cli- ente, presta assistência técnica e até se encarrega de retirar as máquinas que caem em desu- so. Isso tudo sem falar nos serviços de consultoria em 6-Sigma que ela também oferece aos clientes. Assim, os hospitais que adquirem os produtos da GE Medical Services dificilmente mudam de fornecedor, pois a decisão acarretaria um gasto muito elevado. O terceiro caminho se baseia em uma proposta de valor diferenciada: limitar a quanti- dade de produtos passíveis de comparação. Alguns exemplos são a Starbucks, a Harley- Davidson e a Apple, empresas que se diferenciam da concorrência porque conseguem estabelecer um vínculo emocional com seus clientes. Treacy escreveu o best seller A Disciplina dos Líderes de Mercado Saiba mais Além de sua experiência como consultor e palestrante reconhecido mundialmente e de mais de 25 anos orientando empresas a atingir a lide- rança do mercado, Michael Treacy é co-fundador da GEN3 Partners, firma de consultoria dedicada à criação de produtos inovadores para ampla variedade de clientes, com sede em Boston, nos Estados Unidos, e uma filial em São Petersburgo, na Rússia. Treacy, que mora em Needham, no Estado norte-americano de Mas- sachusetts, foi professor de adminis- tração do Massachusetts Institute of Technology (MIT). No livro A Discipli- na dos Líderes de Mercado (ed. Roc- co), ele e Fred Wiersema explicam como dominar mercados por meio da oferta de propostas de valor mais elevadas. O livro mais recente do es- pecialista é Double-Digit Growth, editado nos Estados Unidos em se- tembro de 2003 (ed. Portfolio). A segunda estratégia Agora, passemos à segunda estratégia: qual é o melhor caminho para aumentar a participação de uma empresa em de- terminado mercado? Em minha opinião, apenas uma táti- ca dá resultado: oferecer um valor supe- rior. A Ryanair e a EasyJet conseguiram “roubar” clientes de outras companhias aéreas porque adotaram uma política de preços bastante atraente. Um fenômeno similar ocorre no se- tor de varejo, com Carrefour e Wal-Mart. E, nos últimos anos, as empresas farma- cêuticas que conquistaram maior presen- ça no mercado, quase sem exceção, de- HSM Management 43 março-abril 2004 ESTRATÉGIA vem seu sucesso ao lançamento de medicamentos significativamente superiores aos existentes no mercado. A terceira estratégia A terceira estratégia é entrar em segmentos que estão prestes a crescer… Sim; outro caminho que leva ao crescimento rápido é conquistar um lugar em um seg- mento prestes a se expandir e, assim, “pegar uma carona” na onda de ascensão. Em meados da década de 1990, a Chrysler, a Ford e a General Motors perderam posição em quase todos os mercados de automóveis nos quais atuavam, mas conseguiram crescer graças às elevadas vendas de caminhonetes, setor que passava por uma expansão incipiente. Esse caminho, portanto, consiste em identificaras áreas mais promissoras e ingressar nelas antes que a concorrência o faça. Como identificar essas áreas? Existem três indicadores importantes. O primeiro é a mudança no critério de valor dos clientes, como acontece com os mercados nos quais os consumidores deixam de tomar deci- sões de compra de acordo com as características do produto e baseiam suas escolhas no preço. Um exemplo desse fenômeno ocorreu no mercado de computadores pessoais –a Dell Computer se deu bem porque identificou a tendência dos compradores de não se preocu- par com a diferenciação. O segundo indicador é o salto no valor para o cliente –decorrente, em muitos casos, dos avanços tecnológicos. O lançamento de telefones celulares mais baratos, leves e funcionais a cada seis meses impulsiona o rápido crescimento da telefonia wireless. O mesmo processo ocorre no setor farmacêutico, com o desenvolvimento de novos tratamentos ou de medica- mentos mais eficientes, como o Viagra, que melhora o desempenho sexual masculino, e o Minoxidil, usado para conter a queda de cabelos. O terceiro indicador surge das tendências demográficas e fica evidente quando um gran- de grupo de pessoas atravessa importantes mudanças. À medida que os integrantes da gera- ção dos baby-boomers [crianças nascidas nos Estados Unidos no período posterior à Segunda Guerra Mundial] mudam de etapas da vida, observam-se aumentos nos segmentos de mer- cado nos quais ingressam e retrações naqueles que abandonam. A quarta estratégia E quando se deve adotar a quarta estratégia –ingressar em um mercado adjacente? Três situações indicam que é hora de fazer esse movimento: quando o mercado adjacen- te ao da empresa promete oportunidades significativas para o crescimento e a rentabilidade no longo prazo; quando a companhia conta com uma vantagem competitiva importante que lhe permite ganhos no novo terreno; e quando ela está preparada para enfrentar os concorrentes. Michael Dell, por exemplo, aproveitou seu bem-sucedido modelo de negócio de venda de computadores pessoais para ampliar suas operações na área de redes de informática, de produtos de armazenamento de dados e de serviços em áreas afins. Qual é o erro que as empresas mais cometem quando ingressam em áreas adjacentes? Um erro é apoiar-se em uma vantagem tecnológica inquestionável sem, no entanto, aten- der às exigências mínimas para competir no mercado adjacente. Não é raro encontrar em- presas dos setores aeroespacial ou de defesa com uma tecnologia maravilhosa, mas sem as capacidades mínimas para comercializá-la, como canais de distribuição adequados, baixos custos de produção, serviço de pós-venda e marca reconhecida. Até companhias como a Microsoft cometem deslizes como esses. Em 2001, quando a em- presa de Bill Gates entrou no mercado de videogames, achou que suas credenciais como produ- tora líder de softwares, sua atuação na Internet e seu poderoso capital bastariam –só que ela não tinha experiência na fabricação e distribuição de videogames e delegou essas operações a tercei- ros. A Sony, por outro lado, era especialista na produção de aparelhos eletrônicos e partiu para “Outro caminho que leva ao crescimento rápido é conquistar um lugar em um segmento prestes a se expandir e ‘pegar uma caro- na’ na onda de ascensão” HSM Management 43 março-abril 2004 ESTRATÉGIA a guerra: reduziu os preços dos videogames de US$ 300 para US$ 100, valor inferior ao custo de fabricação da Microsoft –que acabou com um prejuízo de US$ 3 bilhões. A quinta estratégia Em quais casos deve-se adotar a estratégia de investir em setores não relacionados com o negócio central da empresa? Quando a direção da empresa escolhe, de maneira inteligente, os segmentos nos quais pretende investir. Por exemplo, Warren Buffet, presidente da Berkshire Hathaway, é um investidor de grande talento: mantém negócios nos setores de móveis residenciais, de gulo- seimas e de seguros, entre outros, e raramente se engana. Já executivos geralmente não são muito bons na hora de investir fora de seus mercados e costumam “apaixonar-se” por um negócio a ponto de pagar um preço superior ao oferecido por um investidor “profissional”. A doença do crescimento Entre 1997 e 2002, 30 empresas que faziam parte do índice Dow Jones cresceram a índices anuais de 4,9% em faturamento, 4% em lucros brutos e 0,5% em lucros líquidos. Excluindo as que apresentaram melhores resultados –Home Depot, Merck, Microsoft, Wal-Mart e Citigroup– , as 25 restantes tiveram um crescimento anual de 2,3% em faturamento e 1,6% em lucros brutos. Por que tantas empresas aparentemente sólidas apresentam crescimento tímido? Um tipo de “doença do crescimento” atinge diversas corporações, suga as energias e reduz as expectativas de vida. Muitas empresas grandes enfrentam problemas porque seus administradores perseguem ilusões vãs e adotam práticas pouco inteligentes. Veja o que aconteceu com a Motorola. Durante três gerações, a família Galvin manteve-se no comando e transformou uma pequena empresa de transformadores elétricos em uma cor- poração multimilionária. A partir de 1997, no entanto, os preços de suas ações tiveram uma queda de 85% e as vendas diminuíram em média 2,5% por ano. A causa dessa baixa não estava nas alterações que atingiam o mundo da alta tecnologia, mas no fato de que, ao mesmo tempo A pesquisa identificou 80 empresas nos EUA com crescimento anual superior a 10% Saiba mais Michael Treacy realizou uma pesquisa com as mil maiores com- panhias norte-americanas que nego- ciam ações na bolsa de valores, com- parando seus resultados entre 1997 e 2002. Ele identificou 80 empresas com crescimento anual superior a 10% nesse período ou com expansão de mais de dois dígitos em quatro desses cinco anos e crescimento mé- dio acima de 12%. Então, avaliou essas empresas e comparou-as com um grupo de outras 50 bastante co- nhecidas que haviam apresentado índice de crescimento menor. Em seu estudo, tomou como base dados fi- nanceiros, informações públicas e entrevistas com o objetivo de com- preender as diferenças entre as em- presas de crescimento rápido e as de expansão mais lenta. Tudo isso foi transformado em 2003 no livro Dou- ble-Digit Growth. Alguns resultados curiosos da pesquisa estão descritos em forma de perguntas e respostas no início do livro. Por exemplo, o que cresceu mais a partir de 1997: a Intel ou a inflação? Resposta: a inflação. Depois de investir US$ 100 milhões em aqui- sições por cinco anos, a AT&T tornou- se mais ou menos lucrativa? Respos- ta: menos lucrativa. Em 1997, a Proc- ter & Gamble se comprometeu a duplicar seu negócio em sete anos. Se a empresa mantiver o ritmo de crescimento que tem apresentado desde então, quanto tempo lhe será necessário para atingir tal objetivo: 2, 12 ou 25 anos? Resposta: 25 anos. que os lucros da Motorola caíam, a Nokia, seu concorrente mais próximo, aumenta- va seus ganhos em 17% por ano. Os executivos da Motorola foram víti- mas da própria fama e acharam que a tec- nologia de ponta permitiria manter os ele- vados preços de seus telefones celulares, porém a Nokia provou que eles estavam errados. O principal deslize da Motorola foi a demora em mudar da tecnologia ana- lógica para a digital: a Nokia e a Ericsson agiram com rapidez e conquistaram gran- des fatias do mercado. Em 1998, as vendas de telefones digitais superavam ampla- mente as de aparelhos analógicos, mas, en- quanto a Motorola controlava 11,5% do mercado de dispositivos digitais, a Nokia já contava com 40% e a Ericsson com 20%. Os executivos preparados Como saber se os executivos que dirigem uma empresa reúnem as condições para administrar o crescimento como uma car- teira de investimentos? É muito simples. A direção precisa estar apta a responder às seguintes per- HSM Management 43 março-abril 2004 ESTRATÉGIA guntas: 1) Que impacto a perda de clientes em umano terá sobre o crescimento do ano seguinte? 2) Que proporção de uma fatia do mercado ganha é atribuída às vendas a clientes que antes compravam da concorrência? 3) Se a empresa se posicionasse apenas nos segmen- tos de crescimento mais rápido, qual seria sua velocidade adicional de expansão? 4) Quais os três mercados adjacentes de expansão mais rápida e quanto a empresa cresceu em cada um deles? 5) Que proporção do crescimento corresponde a novos mercados nos quais a empre- sa ingressou nos últimos cinco anos? Caso os executivos consigam responder a essas perguntas, é provável que sejam capazes de gerir o crescimento de forma disciplinada. Os riscos Quais riscos precisam ser avaliados antes de lançar uma iniciativa de crescimento? Vários, principalmente quatro. Em primeiro lugar está o risco da demanda, uma vez que mudanças inesperadas nas preferências dos consumidores podem arruinar até os projetos mais minuciosos. Algumas áreas apresentam riscos mais elevados do que outras. O setor de moda é um caso típico: como os clientes são muito exigentes, as empresas têm de fazer grande esforço para conseguir conservá-los. Em segundo lugar, é preciso saber avaliar a reação da concorrência, que costuma reagir com ferocidade quando uma empresa nova tenta entrar em seu território. Existe ainda o risco associado à implementação: é muito comum que as companhias detectem com precisão as demandas do mercado e antecipem as reações dos concorrentes, mas ainda assim enfrentem dificuldades na hora de pôr os projetos em prática. Em minha opinião, é na implementação que reside o maior dos riscos. Finalmente, há o risco relacionado com o aspecto operacional: falhas e imperfeições inesperadas que afetam a competitividade, como os erros de logística, que podem provocar desabastecimentos, ou ainda problemas de fabricação, que comprometem a qualidade. Em medidas diferentes, todas as iniciativas de crescimento envolvem esses quatro riscos. Um projeto bem elaborado deve levá-los em conta e pensar em cada iniciativa com muito cuidado, como se fosse uma carteira de investimentos. O melhor indicador Para encerrar nossa entrevista: as vendas são um bom indicador de crescimento? Em minha opinião, a medida mais importante em se tratando de crescimento é o aumen- to da rentabilidade bruta, porque mede o valor que a empresa agregou para o cliente. “Em medidas diferentes, todas as iniciativas de crescimento envolvem quatro riscos. Um projeto bem elaborado deve levá-los em conta”
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