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Teoria do Ordenamento Jurídico de Bobbio

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Priscilla Batista da Silva
2012.1
FICHAMENTO: Teoria do ordenamento jurídico (Bobbio) – A partir do questionário
Capítulo 1 – Da norma ao ordenamento
Para Bobbio não foi possível dar uma definição do Direito do ponto de vista de uma norma jurídica considerada isoladamente, mas foi preciso alargar o horizonte para a consideração do modo pelo qual uma determinada norma se torna eficaz a partir de uma complexa organização que determina a natureza e a entidade das sanções, as pessoas que devam exercê-las e a sua execução. Essa organização complexa é produto de um ordenamento jurídico. Significa, portanto, que uma definição satisfatória do Direito só é possível se nos colocarmos do ponto de vista do ordenamento jurídico. Na mais comum acepção de direito objetivo, Direito é norma. Contudo, o que comumente chamamos de direito é mais uma característica de certos ordenamentos do que de certas normas.
Em um ordernamento jurídico encontramos normas de conduta (prescrevem a conduta que se deve ou não ter) e as normas de estrutura (prescrevem as condições e os procedimentos através dos quais emanam as normas de conduta válidas). Como já foi dito, o ordenamento jurídico é um conjunto de normas, ou seja, devem haver pelo menos duas. 
Um ordenamento formado por uma única regra de conduta não é possível. Isso, porque é inconcebível um ordenamento que regule todas as ações humanas possíveis com uma única modalidade normativa. Um ordenamento formado por uma única regra de estrutura, por sua vez, é concebível; monarquias absolutas podem exemplificar esse caso.
Os principais problemas relativos à existência de um Ordenamento jurídico são: o da unidade (deve-se discutir a hierarquia das normas); o da coerência (discute-se as antinomias jurídicas); o da completude (discute as lacunas do Direito) e o das relações entre os vários ordenamentos (trata do reenvio de um ordenamento a outro).
Capítulo 2 – A unidade do ordenamento jurídico
Em cada ordenamento o ponto de referência último de todas as normas é o PODER ORIGINÁRIO, quer dizer, o poder além do qual não existe outro que possa, por meio de si, justificar o ordenamento jurídico. Esse ponto de referência é necessário, além de tudo, para fundar a unidade do ordanamento: é a fonte das fontes.
A complexidade (diversidade de fontes) do ordenamento depende historicamente de duas razões fundamentais:	
1) Um ordenamento não nasce num deserto, ou seja, a sociedade civil sobre a qual se forma um ordenamento é uma sociedade na qual vigem normas de vários gêneros. O novo ordenamento surge limitado por ordenamentos precedentes (limitação externa).
2) O poder originário cria novas centrais de produção jurídica para satisfazer a necessidade de uma normatização sempre atualizada. É uma autolimitação.
Fontes do Direito são aqueles fatos ou atos dos quais o ordenamento jurídico faz depender a produção das normas jurídicas. (falta uma informação aqui; ela seria referente à questão 11)
A teoria da construção escalonada do ordenamento jurídico, de Kelsen, serve para dar uma explicação da unidade de um ordenamento jurídico complexo. Seu núcleo é que as normas de um ordenamento não estão todas num mesmo plano. Há normas superiores e normas inferiores, sendo que as inferiores dependem das superiores. Temos, com isso, que as normas de um ordenamento são dispostas em ordem hierárquica.
Chamamos de “ato executivo” o ato de alguém que executa uma obrigação. Quanto à produção jurídica, podemos defini-la como a expressão de um poder. Poder e dever são dois conceitos correlacionados. Numa estrutura hierárquica os termos “produção” e “execução” são relativos porque uma norma pode ser, ao mesmo tempo, executiva e produtiva. Na “pirâmide” do ordenamento jurídico o vértice é ocupado pela norma fundamental e a base pelos atos executivos. Se a olharmos de cima apra baixo, vemos uma série de atos de processos de produção jurídica; se olharmos de baixo para cima, uma série de processos de execução jurídica.
Os limites com que o poder superior restringe e regula o poder inferior são de dois tipos diferentes:	
a) Relativos ao conteúdo: refere-se ao conteúdo da norma que o inferior está autorizado a emanar. Os limites de conteúdo (limites materiais), podem ser positivos ou negativos, conforme a Constituição imponha ao legislador ordinário estabelecer normas numa determinada matéria ou lhe proíba estabelecê-las.	
b) Relativos à forma: refere-se à forma, isto é, ao modo ou ao processo pelo qual a norma inferior deve ser emanada. São limites formais constituídos por todas aquelas normas Constitucionais que prescrevem o funcionamento dos órgãos legislativos.
Chamam-se “juízos de equidade” aqueles em que o juiz está autorizado a resolver uma controvérsia sem recorrer a uma norma legal preestabelecida. Pode ser definido como autorização, ao juiz, de produzir Direito fora de cada limite material imposto pelas normas superiores.
Norma significa imposição de obrigações (imperativo, comando, prescrição, etc). Poder Constituinte é o poder de onde derivam as normas constitucionais. É o poder último (supremo, originário) num ordenamento jurídico. Por sua vez, norma fundamental é aquela que atribui ao poder constituinte a faculdade de produzir normas jurídicas. Também impõe, a todos aqueles aos quais se refere as normas constituicionais, o dever de obedecê-las. Ela não expressa; somente a pressupomos para fundar o sistema normativo.
A pertinência de uma norma é aquilo que se chama de VALIDADE. Uma norma existe como norma jurídica enquanto pertence a um ordenamento, e dizer que ela é válida significa dizer que é obrigatório conforma-se a ela; além disso, ela deve vir de uma autoridade com poder legítimo de estabelecer normas jurídicas. Por fim, a pertinência de uma norma a um ordenamento pode ser estabelecida remontando-a, de grau em grau, de poder em poder, até a norma fundamental. Porque o fato de pertencer a um ordenamento significa validade podemos concluir que uma norma é válida quando puder ser reinserida na norma fundamental.
Os postulados são aquelas proposições primitivas das quais se deduzem outras, mas que, por sua vez, não são dedutíveis. A norma fundamental não tem fundamento, porque se tivesse não seria mais a norma fundamental, mas haveria outra norma superior, da qual ela dependeria. O problema do fundamento da nova norma seria mantido.
Poder originário é o conjunto de forças políticas que num determinado momento histórico tomaram o domínio e instauraram um novo ordenamento jurídico. Quando a norma fundamental diz que se deve obedecer ao poder originário não deve, absolutamente, ser interpretada no sentido de que devemos nos submeter à violência, mas que devemos nos submeter àqueles que têm o poder coercitivo.
A força é necessária para exercer o poder, mas não para justificá-lo. Os detentores do poder são aqueles que têm a força para fazer respeitar as normas que deles emanam. O ordenamento jurídico é impensável sem o exercício da força, isto é, sem poder; a força é necessária para a realização do Direito. Isso confirma que o Direito é um ordenamento com eficácia reforçada. Não podemos reduzir o Direito à força, mas, o ordenamento jurídico só existe se for eficaz e, para que se realize o Direito, é necessária a força.
A norma fundamental é o fundamento do direito que É. Ela autoriza aqueles que detêm o poder a exercer a força, mas não diz que o uso da força é justo só pelo fato de ser vontade do poder originário. O direito, como ele é, é a expressão dos mais fortes, não dos mais justos. Tanto melhor, então, se os mais fortes forem também os mais justos.
Bobbio defende que a FORÇA é um instrumento para a realização do direito. A teoria enunciada por Kelsen, ao contrário, sustenta que a força é objeto da regulamentação jurídica, isto é, que por Direito deve-se entender não um conjunto de normas que se tornam válidas através da força, mas um conjunto de normas que regulam o exercício da força numa determinada sociedade.	
Capítulo 3 – A coerência do ordenamentojurídico
Se se quiser falar de sistema normativo em relação ao Direito, cumpre precisar em qual sentido, em quais condições e dentro de quais limites se pode falar dele. Kelsen distingue entre os ordenamentos normativos dois tipos de sistemas: o estático e o dinâmico. O sistema estático é aquele no qual as normas derivam umas das outras partindo de uma ou mais normas originárias de caráter geral. Num sistema desse gênero as normas estão relacionadas entre si no que se refere ao seu conteúdo. Sistema dinâmico é aquele no qual as normas que o compõem derivam umas das outras através de sucessivas delegações de poder (não através de conteúdo, mas autoridade). A relação entre as normas nesse tipo de ordenamento é formal, não material. Os ordenamentos jurídicos são sistemas dinâmicos. Sistemas estáticos seriam os ordenamentos morais.
O primeiro significado da palavra sistema é que um dado ordenamento é um sistema enquanto todas as normas jurídicas daquele ordenamento são deriváveis de alguns princípios gerais. Foi referida ao ordenamento do Direito natural. O segundo significado de sistema nos remete à ciência do Direito moderno. O termo sistema é usado para indicar o ordenamento da matéria, realizado através do processo indutivo, isto é, partindo do conteúdo das simples normas com a finalidade de construir conceitos cada vez mais gerais e classificações ou divisões da matéria inteira. O terceiro significado de sistema jurídico é aquele que afirma afirma que o ordenamento jurídico constitui um sistema porque nele não podem coexistir normas incompatíveis. As normas de um ordenamento relacionam-se entrei si pela compatibilidade.
A situação de normas incompatíveis entrei si é denominada antinomia. Para que se possa ocorrer uma antinomia são necessárias duas condições: as duas normas devem pertencer ao mesmo ordenamento e possuir o mesmo âmbito de validade. 
Os três tipos de antinomia são:	
total-total: duas normas incompatíveis têm igual âmbito de validade (em nenhum caso uma das duas normas pode ser aplicada sem entrar em conflito com a outra).
parcial-parcial: duas normas incompatíveis têm âmbito de validade em parte igual e a antinomia subsiste apenas à parte comum.	
total-parcial: duas normas incompatíveis nas quais uma tem o âmbito de validade igual ao da outra, porém mais restrito.	
Chamamos antinomias solúveis de aparentes e de insolúveis as reais. As regras fundamentais para a solução de antinomias são:	
O critério cronológico: aquele com base no qual, entre duas normas incompatíveis, prevalece a norma posterior.	
O critério hierárquico: aquele pelo qual, entre duas normas incompatíveis, prevalece a hierarquicamente superior.	
O critério da especialidade: aquele pelo qual entre duas normas incompatíveis, uma geral e uma especial, prevalece a segunda. Lei especial é aquela que anula uma lei mais geral, ou que subtrai de uma norma uma parte de sua matéria para submetê-la a uma regulamentação diferente.
No caso de conflito ao qual não se possa aplicar nenhum dos 3 critérios, a solução do conlfito é confiada à liberdade do intérprete, o qual tem à sua frente três possibilidades: eliminar uma norma; eliminar as duas; conservar ambas. Por mais desconexo que pareça, a solução de conservar duas normas incompatíveis é possível sob a condição de demonstrar que não são incompatíveis, que a incompatibilidade é puramente aparente e essa suposta incompatibilidade deriva de uma interpretação ruim, unilateral, incompleta ou errada de uma das normas ou de ambas. Às vezes, para chegar ao objetivo, introduz alguma leve ou parcial modificação do texto; chama-se INTERPRETAÇÃO CORRETIVA.
Antinomia de segundo grau é aquela na qual há conflito dos critérios para solucionar antinomias (as de primeiro grau). Ou seja, trata-se da incompatibilidade entre os critérios válidos para a solução da incompatibilidade entre as normas. No conflito entre o critério hierárquico e o cronológico, prevalece o hierárquico. No conflito entre o critério da especialidade e o cronológico, prevalece o critério da especialidade; Quando o conflito se dá entre os critérios hierárquico e o de especialidade, é impossível que se dê uma resposta segura. A gravidade do conflito deriva do fato de que estão em jogo dois valores fundamentais do ordenamento jurídico –o do respeito à ordem e o da justiça-. Onde existem duas normas antinômicas, ambas válidas, e, portanto, ambas aplicáveis, o ordenamento jurídico não consegue garantir nem a certeza, nem a justiça.
Capítulo 4 – A completude do ordenamento jurídico
Por completude entende-se a propriedade pela qual um ordenamento jurídico tem uma norma para regular qualquer caso. Uma vez que a falta de uma norma se chama, geralmente, “lacuna”, completude significa falta de lacunas. O nexo entre coerência e completude do ordenamento jurídico está em que a coerência significa a exclusão de toda a situação na qual pertençam ao sistema ambas as normas que se contradizem; a completude significa a exclusão de toda a situação na qual não pertençam ao sistema nenhuma das duas normas que se contradizem.
O dogma da completude é o princípio de que o ordenamento jurídico é completo e capaz de fornecer ao juiz, em cada caso, uma solução sem recorrer à equidade. Nos tempos modernos, tornou-se parte integrante da concepção estatal do direito: o ordenamento é onipotente assim como o Estado que o emana. O conceito de fetichismo da lei está, em vários aspectos, relacionado a esse dogma. Trata-se da tendência que se desenvolveu entre juízes e juristas de ater-se escrupulosamente aos códigos.
A escola que pela primeira vez criticou o dogma da completude foi a Escola do Direito Livre. Sua batalha foi pelo reconhecimento da existência de lacunas. As razões pelas quais esse movimento surgiu e se desenvolveu rapidamente são várias, dentre elas, destaca-se: à medida que a codificação envelhecia, descobriam-se as insuficiências; a rápida e profunda trasnformação da sociedade acelerou esse envelhecimento natural.
O conceito de espaço jurídico vazio é mais ou menos o seguinte: toda norma jurídica representa uma limitação à livre atividade humana; fora da esfera regulada pelo Direito o homem é livre para fazer o que quiser. Ou há o vínculo jurídico ou há a absoluta liberdade. Essa absoluta liberdade é o que se chama Espaço jurídico vazio.
A norma geral exclusiva é aquela regra que exclui (por isso é exclusiva) todos os comportamentos (por isso é geral) que não sejam aqueles previstos pela norma particular. Isso porque uma norma que regula um comportamento não só limita a regulamentação, mas, ao mesmo tempo, exclui daquela regulamentação todos os outros comportamentos. Quanto à norma geral inclusiva, pode-se dizer que é aquela que se caracteriza por regular os casos não compreendidos na norma particular, mas semelhantes a eles, de maneira idêntica.
Existem diversos tipos de lacunas, os mais recorrentes são:	
1- Lacunas próprias: lacuna do sistema ou dentro do sistema.	
2- Lacunas impróprias: deriva da comparação do sistema real com um sistema ideal.
Com relação aos motivos que as provocam podem ser:	
1- Lacunas subjetivas: dependem de algum motivo imputável ao legislador.
1.1- Lacunas subjetivas voluntárias: o próprio legislador deixa de propósito quando a matéria é muito complexa e não pode ser regulada por regras muito miúdas.	
1.2- Lacunas subjetivas involuntárias: dependem de um descuido do legislador.	
2- Lacunas objetivas: Aquelas que dependem de todas as causas que provocam o envelhecimento dos textos legislativos; independentes da vontade do legislador.
Outra distinção:	
1- Lacunas praeter legem: quando as regras expressas para serem muito particulares não compreendem todos os casos que podem apresentar-se a nível dessa particularidade.
2- Lacunas intra legem: quando as normas são muito gerais e revelam, no interior das disposições dadas, regras ou buracos que caberá ao intérprete preencher.
O método da Heterointegração consiste na integração operada através do:
a) recurso a ordenamentosdiversos.	
b) recurso a fontes diversas daquela que é dominante.	
A heterointegração assume três formas: o recurso ao costume como fonte da lei; o recurso, em caso de lacuna da lei, ao poder criativo do juiz –o Direito judiciário-; o recurso às opiniões dos juristas –Direito científico-.
O método da autointegração consiste na integração cumprida através do mesmo ordenamento, no âmbito da mesma fonte dominante (recorrendo minimamente a fontes diversas). Os métodos da autointegração são:	
a) a analogia: procedimento pelo qual se atribui a um caso não regulamentado a mesma disciplina que a um caso semelhante que é regulamentado, desde que se trate de uma semelhança relevante (“Onde houver o mesmo motivo há, também, a mesma disposição de Direito”).	
b) os princípios gerais do Direito: são normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. São normas porque são normas aquelas das quais eles (os princípios gerais) são extraídos e porque sua função é a de regular um caso.

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