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ARTIGO DE REVISÃO Hidroterapia no tratamento de pacientes com fi bromialgia* Hydrotherapy to treat fibromyalgia patients Letizzia Dall´Agnol1, Miriam Martelete2 *Recebido do Hospital de Clínicas de Porto Alegre - Serviço de Tratamento da Dor e Medicina Paliativa (FAMED/UFRGS), Porto Alegre, RS. RESUMO JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O objetivo desse estudo foi avaliar, através de uma revisão bibliográfi ca, os resultados dos estudos existentes, nos últimos 10 anos, sobre hidroterapia no tratamento da fi bromialgia. CONTEÚDO: Os parâmetros analisados foram: número de trigger points (NTP), escala analógica visual da dor (EAV), inventário de depressão de Beck (BDI), ques- tionário de impacto da fi bromialgia (FIQ), força mus- cular, índice de qualidade do sono de Pittsburg (PSQI), SF-36 e o nível sorológico dos marcadores infl amatórios (IL1, PGE2, LTB4). CONCLUSÃO: A terapia aquática é um método efi - caz no tratamento do alívio dos sintomas da fi bromialgia. Ela apresenta resultados positivos, tanto nos aspectos físicos quanto em emocionais dos pacientes. Apesar deste recurso terapêutico apresentar custo elevado, ele proporciona resultados mais precoces e que se man- têm em longo prazo, quando comparado com exercí- cios de solo, estando assim indicado no tratamento da fi bromialgia. Descritores: Fibromialgia, hidroterapia, qualidade de vida. SUMMARY BACKGROUND AND OBJECTIVES: This study aimed at evaluating through literature review, results of studies in the last 10 years on hydrotherapy to treat fi - bromyalgia. CONTENTS: Parameters evaluated in the different studies were: number of trigger points (NTP), pain vi- sual analog scale (VAS), Beck’s depression inventory (BDI), fi bromyalgia impact questionnaire (FIQ), muscle strength, Pittsburgh’s sleep quality index (PSQI), SF- 36 and infl ammatory markers serum level (IL1, PGE2, LTB4). CONCLUSION: Water therapy is an effective method to relieve fi bromyalgia symptoms, with positive physical and emotional results. And, although being expensive, this therapeutic approach provides earlier results which are maintained in the long run, as compared to ground exercises, thus being indicated to treat fi bromyalgia. Keywords: Fibromyalgia, hydrotherapy, quality of life. INTRODUÇÃO A fi bromialgia é uma síndrome de dor generalizada crônica1, de etiologia indeterminada, e que afeta princi- palmente as mulheres. Frequentemente é acompanhada por sintomas inespecífi cos, como fadiga, distúrbios do sono e rigidez muscular, e se superpõe ou está associada a outros diagnósticos, como síndrome da fadiga crônica e transtorno do humor depressivo2,3. Segundo os critérios do Colégio Americano de Reumatologia4, desde 1990 foi adotado como padrão pela comunidade científi ca internacional especializada, o diagnóstico de fi bromial- gia, que exige pelo menos três meses consecutivos de dor generalizada e dor à palpação, com cerca de 4 kg de 1. Fisioterapeuta Especialista em Dor pelo Curso de Espe- cialização em Dor e Medicina Paliativa do Hospital de Clíni- cas de Porto Alegre (FAMED/UFRGS). 2. Livre Docente pela UFRGS. Professora Titular do Depar- tamento de Cirurgia da FAMED/UFRGS. Anestesiologista com Título de Atuação em Dor pela AMB. Responsável pela Criação e Coordenação do Serviço de DOR do HC de Porto Alegre e do Curso de Especialização em Dor e Medicina Pa- liativa (FAMED/UFRGS) até 2008. Endereço para correspondência: Letizzia Dall´Agnol Rua Miguel Tostes 370/303 – Rio Branco 90430-060 Porto Alegre, RS. Fones: (51) 3333-3086 (51) 9674-9601 E-mail: lecomz@hotmail.com Rev Dor, 2009; 10: 3: 250-254 250 Sociedade Brasileira para o Estudo da Dorc pressão pela ponta do dedo, em no mínimo 11 de 18 pon- tos pré-defi nidos (“pontos-gatilho” ou “trigger points”). Dor generalizada é defi nida como distribuída nos quatro quadrantes do corpo, bilateralmente, acima e abaixo da cintura, e se concentra axialmente5. A história clínica detalhada da Síndrome Fibromiálgica revela um gradual ou abrupto início dos sintomas, fre- quentemente subsequente a um estresse físico ou psi- cológico1. Outros sintomas que também ocorrem com frequência na fi bromialgia, são alodínia e hiperalgesia (percepção dolorosa frente a estímulos não dolorosos e exagero da percepção dolorosa), perturbações do sono, fadiga, parestesia, enxaqueca, síndrome de Raynaud e distúrbios psiquiátri- cos. A superposição com outros diagnósticos, especial- mente síndrome da fadiga crônica (21%-70%), síndrome do cólon irritável (32%-80%), sensibilidade química múltipla (33%-55%), transtornos psiquiátricos (75%) e outras doenças crônicas, torna frequentemente difícil o diagnóstico diferencial3. O impacto da fi bromialgia na qualidade de vida e na fun- ção física é substancial, quando comparado com outras doenças reumáticas. Mais de 30% dos pacientes com a doença são obrigados a trabalhar por períodos curtos ou ter um trabalho que tenha pouca demanda física6. Nos últimos anos, várias modalidades de tratamento in- cluindo terapia farmacológica (anti-infl amatórios não esteroides (AINES), analgésicos adjuvantes, antidepres- sivos tricíclicos, recaptadores seletivos da serotonina), intervenção psicológica, fi sioterapia, acupuntura, pro- gramas de exercícios e hidroterapia vêm sendo usados e avaliados7. Sabe-se que a hidroterapia tem sido uma alternativa de sucesso no tratamento da fi bromialgia. O termo hidrotera- pia é derivado das palavras gregas hydor- água e thera- pia-cura. Não existe evidência muito nítida sobre a data que a água foi utilizada pela primeira vez para fi nali- dades curativas, mas é sabido que Hipócrates (c. 460- 375 AC) empregava banhos no tratamento das doenças. Os efeitos fi siológicos da terapia na água combinam com os produzidos pela água quente da piscina e com aque- les dos exercícios, porém a extensão desses efeitos varia com a temperatura da água, a duração do tratamento e o tipo de intensidade dos exercícios. A temperatura mé- dia da água na piscina é de 35,5-36,6º C e o período de imersão para a maioria dos pacientes é de 20 minutos, embora alguns pacientes possam começar com 5 min e progredir para até 45 min de imersão8. Os efeitos terapêuticos dos exercícios na água são alívio da dor e do espasmo muscular, relaxamento, manuten- ção ou aumento da amplitude de movimentação das articulações, reeducação de músculos paralisados, for- talecimento dos músculos e desenvolvimento de sua força e resistência, melhora das atividades funcionais da marcha, aumento da circulação e melhora dos aspectos emocionais devido às atividades recreacionais. À me- dida que a dor é aliviada o paciente é capaz de mover- se com maior conforto e a amplitude de movimentação das articulações aumenta. Com o calor da água também dilata os vasos superfi ciais e aumenta o suprimento san- guíneo melhorando a circulação periférica e a atividade muscular8. Dessa forma o objetivo desse estudo foi avaliar, através de uma revisão bibliográfi ca, os resultados dos estudos existentes sobre hidroterapia no tratamento da fi bromialgia. Foram selecionados 15 estudos dos últimos 10 anos no banco de dados Pubmed que abordassem a aplicação da hidroterapia no tratamento da fi bromialgia. Dois estudos abordam somente a Síndrome Fibromiálgica; cinco estu- dos comparam efeitos de exercícios na água com exercí- cios de solo; um estudo compara efeitos de exercícios na água com banho sem exercícios; três estudos comparam efeitos do banho com grupo controle; um estudo com- para efeitos dos exercícios na água com grupo controle; um estudo faz revisão de oito estudos de exercícios na água nos últimos sete anos; um estudo compara exercí- cios na água da piscina com exercícios na água do mar; um estudo avalia o custo-benefício da terapia aquática. Os parâmetros analisados nos diversosestudos foram: número de trigger points (NTP), escala análoga visual da dor (EAV), inventário de depressão de Beck (BDI), ques- tionário de impacto da fi bromialgia (FIQ), força mus- cular, índice de qualidade do sono de Pittsburg (PSQI), SF-36 e o nível sorológico dos marcadores infl amatórios (IL1, PGE2, LTB4). Em todos os estudos percebeu-se melhora nos parâmetros avaliados, tanto em exercícios realizados em solo, como em exercícios realizados na água (hidroterapia) ou em terapias que ofereciam apenas imersão em água quente como método de tratamento (balneoterapia). Contudo, o nível de melhora foi mais signifi cativo nos grupos que realizavam hidroterapia e percebeu-se a prevalência da melhora dos aspectos emo- cionais sobre a melhora dos aspectos físicos. Levando em conta que no método de realização dos estu- dos houve uma fragmentação dos períodos de avaliações dos parâmetros, percebe-se que a melhora no grupo dos indivíduos que realizavam hidroterapia torna-se evidente em períodos iniciais do tratamento. Também se observa que a terapia aquática de exercícios apresenta resultados benéfi cos que se mantém em longo prazo (3 a 6 meses pós-tratamento). 251 Rev Dor, 2009; 10: 3: 250-254Dall´Agnol, Martelete EXERCÍCIOS AERÓBICOS Fibromialgia é principalmente associada com dor difusa e o interesse por intervenções não farmacológicas tem aumentado nos últimos anos. Os estudos investigam a importância de exercícios regulares e programas de ativi- dades físicas para o tratamento da síndrome. Programas de exercícios incluem treino de força, fl exibilidade e téc- nicas de relaxamento5. Na fi bromialgia há uma anormal modulação da dor bem como isquemia muscular que causam dores difusas. Muitos estudos mostram que programas de exercícios aeróbicos de baixa a moderada intensidade tem efeito positivo no alívio dos sintomas da fi bromialgia. Martin e col.9 observaram melhora nos parâmetros tais como forma física, número de tender points e escores miálgi- cos em indivíduos que realizavam programas de exercí- cios aeróbicos em longo prazo. Sugeriram que a realiza- ção de atividade física por mais de 12 semanas acarreta efeitos positivos nos aspectos físicos e no bem-estar dos pacientes com fi bromialgia. O mecanismo responsável pelos efeitos analgésicos ain- da não está claro, mas estudos mostram que atividade física aeróbica acarreta consistente ativação do sistema opioide endógeno que, por sua vez, ocasiona um aumen- to no limiar de dor e sua tolerância, resultando numa resposta analgésica. Outros estudos também sugerem que sistemas com mecanismos não opioides media- dos por substâncias como o hormônio do crescimento e corticotropina também estão incluídos no mecanismo analgésico. Outra contribuição da atividade física na di- minuição da dor está relacionada com a quebra do ciclo vicioso dor – imobilidade – dor, que proporciona ao pa- ciente encorajamento para retornar as atividades diárias. Os exercícios físicos apresentam benefícios na capaci- dade física, cardiovascular, melhoram os parâmetros emocionais, diminuem os níveis de depressão, melhoram a qualidade do sono e o humor além de prevenir e cor- rigir a hipóxia muscular10-12. Alguns autores alegam que tratamento para fi bromialgia com exercícios de solo tem baixo custo e podem ser boa alternativa no tratamento da fi bromialgia5. EXERCÍCIOS NA ÁGUA MORNA E BALNEOTERAPIA Terapia aquática de exercícios tem sido recomendada no tratamento de dor muscular crônica difusa13, contudo não tem sido muito estudada. Gusie col.14 avaliaram em curto e em longo prazo a efi cácia de exercícios na água e observaram alivio da dor, melhora na qualidade de vida e na força muscular e os efeitos foram mantidos em longo prazo. Manekorpi e col.15 mostraram efeitos benéfi cos de seis meses combinando exercícios na piscina com progra- ma de educação, melhorando a dor, função física, força, função social, estresse psicológico e qualidade de vida em pacientes com fi bromialgia. Altan e col.16, mostraram em estudo, consistentes melhoras na fadiga, número de tender points, rigidez, qualidade do sono, depressão e bem estar geral em pacientes portadores de fi bromialgia que foram submetidos a tratamento com exercícios em água morna. A balneoterapia causa relaxamento nos músculos e nos ligamentos. O calor produz analgesia no sistema nervo- so, pois aumenta o limiar de dor17 e proporciona alivio do espasmo muscular, ativando o sistema inibitório de- scendente. A superfície corporal é estimulada pelo calor e pela pressão hidrostática da água e este estimulo di- minui a sensação de dor16. Nas articulações e tecidos conectivos aumenta a fl exibili- dade e causa dilatação periférica que também contribui com a analgesia. Ativa o sistema parassimpático que por sua vez, aumenta o acúmulo de acetilcolina no SNC que é responsável pelo efeito sedativo. Além disso, durante a balneoterapia alterações na liberação de betaendorfi nas, citocinas, interleucinas 1 e 6, fator alfa de necrose tu- moral e interferon gama também podem apresentar res- postas humorais benéfi cas no alivio da dor18-20. EXERCÍCIOS NA ÁGUA MORNA VERSUS EXER- CÍCIOS DE SOLO VERSUS BALNEOTERAPIA Em estudos recentes5 que comparam a efi cácia da hidrotera- pia com exercícios de solo observaram-se ganhos clíni- cos no alivio da dor, capacidade funcional, qualidade de vida e melhora da depressão em ambos os grupos. Porém, resultados de melhora de dor em longo prazo (24 semanas) foram encontrados apenas em exercícios aquáticos. Há poucos estudos comparando estas duas modalidades de exercícios no tratamento da fi bromialgia. Contudo, Jentoft, Kvalvik e Mengshoel21 mostraram signifi cati- vas melhoras na capacidade cardiorrespiratória, tempo de caminhada e níveis de fadiga diária depois de trata- mento, tanto com programa de exercícios aquáticos, quanto com exercícios de solo. Porém, melhora na dor, depressão, ansiedade, número de dias com bem-estar foi observado somente no grupo de indivíduos que realiza- vam hidroterapia. Da mesma forma, Assis e col.22 tam- bém realizaram estudo com comparação semelhante e evidenciou que os ganhos nos aspectos emocionais são mais pronunciados nos indivíduos que realizam terapia aquática. Outro estudo de Gowans e col.23 mostrou que 252 Hidroterapia no tratamento de pacientes com fi bromialgia Rev Dor, 2009; 10: 3: 250-254 melhoras no humor foram exclusivas dos indivíduos que participavam do grupo da terapia aquática. É possível que estas melhoras no aspecto emocional seja devido aos pacientes terem a oportunidade de encontrar outros com problemas semelhantes16. Os indivíduos re- latam que fi car por um período de tempo com outros na mesma situação serve como forma de terapia de grupo. De acordo com Yalom24, este tipo de situação promove a normalização dos sintomas, melhora a vida social, bem como o autoconhecimento que permite aos portadores de doenças lidarem com o quadro de maneira a melhorar o bem-estar7. Estudos atuais de Ardiç e col.25 mostraram que os níveis dos marcadores infl amatórios como PGE2 , IL1 e LTB4 diminuíram apenas no grupo que recebeu balneoterapia, servindo como mais uma evidência para mostrar a efi cá- cia do tratamento com água morna no alivio dos sin- tomas da fi bromialgia. Hedenberg-Magnusson e col.26 demonstraram relação entre os níveis sorológicos de PGE2 e dor muscular em pacientes com fi bromialgia. Eles concluíram que o mús- culo masseter parece ser em parte a origem da “infl ama- ção periférica” na fi bromialgia. Em outro estudo ele ob- teve que a redução de níveis séricos de PGE2 no masseter depois da administração de glicocorticoide pode ser as- sociada com diminuição da dor em indivíduos fi bromiál- gicos. Concluiu-se então que a diminuição de PGE2 e o alívio da dor após balneoterapia podemser refl exos dos efeitos anti-infl amatórios da terapia aquática. CONCLUSÃO A terapia aquática é um método efi caz no tratamento do alívio dos sintomas da fi bromialgia. Ela apresenta resultados positivos, tanto em aspectos físicos quanto emocionais dos pacientes. Desta forma pode-se afi r- mar que apesar deste recurso terapêutico apresentar custo elevado, ele proporciona resultados mais pre- coces e que se mantêm em longo prazo, quando com- parado com exercícios de solo, estando assim indi- cado no tratamento da fi bromialgia. REFERÊNCIAS 1. Abeles M, Solitar BM, Pillinger MH, et al. Update on fi bromyalgia therapy. Am J Med, 2008;121:555-561. 2. Turk DC, Okifuji A. Fibromyalgia syndrome: prevalent and perplexing pain. Pain Clinical Updates, 2003;11:1-4. 3. Burkham J, Harris JRDH. Fibromyalgia: a Chronic Pain Syndrome. In: Kelley’s HJ. Textbook of Rheuma- tology. 7th Ed, Philadelphia: Elsevier, 2005;3. 4. Wolfe F. Smythe HA, Yunus MB, et al. The American College of Rheumatology 1990 Criteria for the Classifi - cation of Fibromyalgia. 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Hidroterapia no tratamento de pacientes com fi bromialgia Apresentado em 14 de agosto de 2009. Aceito para publicação em 29 de setembro de 2009.
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