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A greve, a resposta à greve e a (in)transição brasileira para o baixo carbono, por Larissa Basso

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May 25, 2018
This material is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 License - Este material está licenciado sob uma Licença Creative Commons
Attribution 4.0.
A greve, a resposta à greve e a (in)transição brasileira para o baixo
carbono, por Larissa Basso
mundorama.net/
No último 21 de maio teve início uma paralisação nacional de
caminhoneiros em protesto contra o aumento do preço do óleo
diesel. Os aumentos são resultado de uma nova política da
PETROBRAS – que passou a refletir nos preços dos produtos das
refinarias a oscilação do preço internacional do petróleo –, da alta
do preço do dólar e do aumento de tributos sobre combustíveis
ocorrido em 2017. A reação negativa contra a alta do preço dos
combustíveis é natural, visto que afeta os preços de toda a
economia e pesa no bolso de todos. Mas é importante resistir à
tentação de simplificar a explicação ao focar apenas no curto prazo.
Entender o contexto amplo é fundamental, em especial para
entender as consequências das medidas adotadas para a transição
brasileira a um futuro de baixo carbono.
O preço internacional do petróleo está em ascensão desde meados de 2017: o barril do petróleo West Texas
Intermediate passou de uma média de 45 dólares em julho de 2017 para mais de 70 dólares em maio de 2018, alta de
mais de 75% (NASDAQ, 2018a); o barril do petróleo Brent já beira os 80 dólares (NASDAQ, 2018b). Dois são os
principais fatores para essa alta: dinâmicas da economia global em geral, e do setor de óleo e gás em particular, e
geopolítica.
Algumas economias têm mantido taxas de crescimento importantes, destaque para Estados Unidos, China, Índia e
União Europeia, em menor grau. Esse desempenho aumentou a demanda por petróleo. A oferta, porém, se manteve
praticamente estável porque no final de 2016 países membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo, a
OPEP [1], e outros grandes produtores de petróleo [2] assinaram um acordo para limitar a produção (OPEP, 2016). O
acordo reverteu uma tendência anterior em que o preço global do insumo tinha diminuído porque a Arábia Saudita
aumentou sua produção, uma estratégia para conter o avanço do shale estadunidense (vide nosso artigo no v. 91
dessa revista). Em princípio com validade para 01 ano, o acordo foi renovado pelos participantes, e as cotas têm sido
respeitadas (OPEC, 2018).
Questões de geopolítica também influenciam a alta. No início do mês de maio, a administração Trump retirou os
Estados Unidos do acordo internacional para monitorar o programa nuclear iraniano, assinado em 2015 entre os 05
membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU [3], a Alemanha e o Irã (JCPOA, 2015). Trump ameaça
retomar as sanções dos Estados Unidos contra o país, o que poderia incluir o embargo à compra do petróleo iraniano.
Ainda não é claro o potencial impacto de uma retomada do embargo, uma vez que os demais membros do acordo
mantêm seu apoio e poderiam absorver a produção iraniana. Mas esses pronunciamentos aumentam a incerteza no
mercado e colaboram para manter os preços do petróleo elevados. A decisão dos Estados Unidos de transferirem sua
embaixada em Israel de Tel-Aviv para Jerusalém vai no mesmo sentido, porque aumenta a animosidade no Oriente
Médio. Um agravamento dos conflitos na região teria impacto real nos preços.
Outro fator importante para entender o aumento do preço do petróleo é a alta do dólar. Com a economia estadunidense
a pleno vapor, os juros aumentaram – medida para conter uma possível alta da inflação –, atraindo mais investimentos
para os Estados Unidos e elevando o custo de sua moeda para o resto do mundo. O impacto é maior em relação a
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moedas de países que estão com baixas taxas de crescimento da economia, como o Brasil: basta observar como a
quantidade necessária de reais para comprar um dólar aumentou expressivamente nos últimos meses. Como o preço
de commodities globais, como o petróleo, é definido em dólar, a tendência de aumento se intensifica.
O mundo todo é dependente de petróleo. Porém muitos países já iniciaram uma transformação de sua estrutura,
adotando práticas de eficiência energética, aumento da participação de fontes de energia de baixo carbono na matriz e
outras medidas para reduzir sua dependência em relação aos combustíveis fósseis. No setor de transportes de
passageiros, são iniciativas nesse sentido a expansão do transporte público e das ciclovias; o aumento da eficiência de
motores; e a eletrificação de veículos de uso particular ou coletivos. No setor de transporte de cargas, a diversificação
de modais é essencial. O transporte rodoviário é muito custoso e poluidor: no âmbito global, consome 75% da energia
gasta em transporte de cargas, mas responde por apenas 20% do total de toneladas transportadas por quilômetro (IEA,
2017). Para tornar o transporte de cargas mais eficiente, é essencial restringir o uso do modal rodoviário para
distribuição em pequenas distâncias. A China já se deu conta disso: em 2016 determinou que o investimento em
multimodais é prioridade estratégica até 2020 (CHINA, 2016).
Investimento em transporte público tem crescido na maioria dos países. O uso de trens de passageiros já é comum em
países europeus e também na Índia; a China tem expandido sua malha ferroviária em velocidade impressionante. Ali, a
eletrificação também está a todo vapor: a administração municipal de Guangzhou determinou que até o final de 2018
terá 200 mil ônibus elétricos circulando (WEF, 2018). Diversos países já anunciaram a intenção de banir a produção e a
venda de veículos com motor de combustão interna nas próximas décadas, entre eles o Reino Unido, os Países Baixos
e a Índia. Ainda que a viabilidade de cumprir esses prazos seja discutível, os projetos apontam na direção irreversível de
um mundo em que o petróleo terá um papel mais reduzido do que tem hoje.
Enquanto o mundo investe no transporte público, na eletrificação e no uso de multimodais, o Brasil discute diminuir
tributos e/ou voltar a controlar preços para manter o uso do petróleo e seus derivados em alta. Falta planejamento para
nossa transição ao baixo carbono: por que não utilizamos melhor o etanol e o biodiesel nos curto e médio prazos e
determinamos estratégias de longo prazo para transformar a estrutura econômica? Investir em ferrovias, hidrovias e
navegação de cabotagem – cuja participação é irrisória em um país de mais de 07 mil quilômetros de costa – no
transporte de cargas. Aumentar os padrões de eficiência de veículos. Ampliar e melhorar a qualidade do transporte
público. Assegurar a participação de novas fontes renováveis na matriz elétrica – essencial se quisermos manter
nossas emissões de carbono em cheque em um futuro de mais eletrificação. E investir pesadamente em educação,
para que nossa população deixe de depender de empregos de pouco valor agregado e possa desempenhar novos
papeis na economia. Se quisermos avançar na direção do baixo carbono, precisamos aprofundar o debate e combater a
corrupção e o corporativismo, que buscam priorizar interesses particulares em relação ao bem-estar coletivo.
Notas
[1] Atuais membros da OPEP: Angola, Arábia Saudita, Argélia, Emirados Árabes Unidos, Equador, Gabão, Guiné
Equatorial, Irã, Iraque, Kuwait, Líbia, Nigéria, Qatar e Venezuela.
[2] Azerbaijão, Bahrein, Brunei, Cazaquistão, Malásia, México, Omã, Rússia, Sudão e Sudão do Sul.
[3] Estados Unidos, Rússia, China, Inglaterra e França.
Referências
CHINA (2016): The 13th-five-year-plan for Economic and Social Development of the People’s Republic of China (2016-
2020). Disponível em <http://en.ndrc.gov.cn/newsrelease/201612/P020161207645765233498.pdf>, acesso 24 Mai
2018.
IEA (2017): The future of trucks: implications for energy and the environment. 2a ed. Disponível em
<https://www.iea.org/publications/freepublications/publication/TheFutureofTrucksImplicationsforEnergyandtheEnvironment.pdf>,
acesso 24 Mai 2018.
JCPOA (2015): Joint Comprehensive Planof Action. Disponível em <http://eeas.europa.eu/archives/docs/statements-
eeas/docs/iran_agreement/iran_joint-comprehensive-plan-of-action_en.pdf> (among other websites), acesso 24 Mai
2018.
NASDAQ (2018a): Crude Oil (WTI), 01 year trajectory. Disponível em <https://www.nasdaq.com/markets/crude-oil.aspx?
timeframe=1y>, acesso 24 Mai 2018.
NASDAQ (2018b): Crude Oil Brent Price, 01 year trajectory. Disponível em <https://www.nasdaq.com/markets/crude-oil-
brent.aspx?timeframe=1y>, acesso 24 Mai 2018.
2/3
OPEP (2016): Declaration of Cooperation, OPEC and non-OPEC, 10 December 2016 – 30 November 2017. Disponível
em
<http://www.opec.org/opec_web/static_files_project/media/downloads/publications/Declaration%20of%20Cooperation.pdf>,
acesso 24 Mai 2018.
OPEP (2018): Press Release n. 07/2018, 20 Apr 2018. Disponível em
<http://www.opec.org/opec_web/en/press_room/4963.htm>, acesso 24 Mai 2018.
WEF (2018): Electric vehicles for smarter cities: the future of energy and mobility. Disponível em
<http://www3.weforum.org/docs/WEF_2018_%20Electric_For_Smarter_Cities.pdf>, acesso 24 Mai 2018.
Sobre a autora
Larissa Basso é doutora em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (arissabasso@gmail.com).
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	A greve, a resposta à greve e a (in)transição brasileira para o baixo carbono, por Larissa Basso
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	Referências
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