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Apostila Liquens - Marcelli

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Prévia do material em texto

1 
 
FUNGOS LIQUENIZADOS1 
 
Marcelo P. Marcelli 
mpmarcelli@msn.com 
Instituto de Botânica, Núcleo de Pesquisa em Micologia 
Caixa Postal 68041, CEP 04045-972, São Paulo/SP, Brasil 
 
 
 
Aproximadamente 20% das espécies de fungos atualmente conhecidas são encontradas 
na natureza sempre simbioticamente associadas a algas ou cianobactérias. O processo de 
associação entre esses simbiontes é denominado liquenização, e a estrutura resultante recebe 
o nome de líquen (no plural a palavra não leva acento: liquens). 
Mais de 95% do volume do líquen é normalmente constituído pelo fungo liquenizado 
(micobionte), que abriga populações de algas ou cianobactérias (fotobionte) entre suas hifas. Os 
fotobiontes sintetizam açúcares, que são aproveitados pelos fungos. Durante muito tempo se 
acreditou e se divulgou, em livros e nas escolas, que os liquens constituíam exemplo notável de 
mutualismo, ou seja, uma associação obrigatória entre simbiontes, em que ambos os parceiros 
trocam vantagens recíprocas. 
Há muito tempo os especialistas vêm tentando definir o que é um líquen, e muitas 
definições podem ser encontradas na literatura. O próprio Dictionary of Fungi apresenta uma 
definição diferente a cada nova edição e, por vezes, as definições antigas agradam mais aos 
especialistas do que as novas apresentadas. Muito da problemática de se definir os liquens vem 
do fato de que dificilmente as pessoas conseguem afastar de suas mentes que essas estruturas 
biológicas não constituem um grupo taxonômico e, portanto, não podem ser definidos da 
maneira como se faz em Taxonomia. 
 A melhor e mais simples idéia que se pode apresentar para um líquen é simplesmente a 
de um fungo que cultiva fotobiontes entre as hifas de seu micélio. Trata-se de simbiose, mas 
não se pode afirmar de qual tipo. Na realidade, atualmente os especialistas concordam que o 
tipo varia desde o parasitismo até o mutualismo estrito, dependendo de quais grupos 
taxonômicos de fungos e de algas (ou cianobactérias) estejam envolvidos. Em associações 
simbióticas desse tipo, o organismo que contém o outro pode ser chamado de exhabitante e o 
que vive em seu interior de inhabitante. 
 A grande maioria dos liquens é constituída por ascomicetos, embora também existam 
basidiomicetos e deuteromicetos liquenizados. Além disso, algumas raras espécies de quase 
todos os grupos de fungos podem formar liquens. Portanto, a liquenização deve ser um 
processo altamente vantajoso para os fungos, e acredita-se que ela apareceu várias vezes, em 
momentos e em grupos taxonômicos diferentes, durante a história evolutiva do reino Fungi. 
 Os ascomicetos parecem realmente ser os fungos melhor equipados para esse tipo de 
associação. Espécies liquenizadas estão presentes em quase metade de suas ordens, o que 
corresponde a 46% das espécies conhecidas. Na realidade existem cinco grandes ordens 
(Graphidales, Gyalectales, Peltigerales, Pertusariales, Teloschistales) nas quais todas as espécies 
conhecidas são encontradas na natureza exclusivamente constituindo liquens, além de outras 
cinco onde a maioria das espécies é liquenizada. Isto faz com que a liquenização seja a principal 
estratégia nutricional dos ascomicetos, mais importante para o grupo que o parasitismo, o 
 
1
 Este texto, originalmente escrito em 1998 e divulgado como apostila em cursos de liquenologia, teve várias versões 
constantemente atualizadas. Em 2002 ele foi adaptado e sua publicação foi permitida pelo autor (sem cessão de direitos) e essa 
versão foi lançada em 2006 como o Capítulo 1 do livro Biologia de Liquens (eds L.Xavier Fo., M.E. Legaz, C.V. Cordoba & E.C. 
Pereira, p. 23-74), onde infelizmente apareceu com uma série de incorreções graves (falta de parte do texto e parte de figura 
que alteram o significado do texto) devidas a falhas de editoração. Esta versão de 2012 é uma errata que corrige esses erros e 
substitui as figuras de liquens por fotos digitais mais recentes. Este texto não atualiza o conhecimento desde 2006 e deve ser 
citado em bibliografia como parte do livro mencionado. 
 
 
2 
 
saprofitismo, ou qualquer outro modo de sobrevivência freqüentemente utilizado pelos fungos. 
Acredita-se que a liquenização surgiu independentemente em cada ordem, por vezes mais de 
uma vez e em épocas diferentes na mesma Ordem ou mesmo dentro de famílias ou gêneros; 
por isso o tipo de abordagem do fotobionte pelo micobionte varia de grupo para grupo, tanto 
morfológica quanto fisiologicamente. Por isso, é altamente discutível a velha crença, ainda 
amplamente difundida nos meios didáticos (e Internet), de que os liquens seriam exemplo 
típico de simbiose mutualista. Se o mutualismo realmente existir nas associações liquênicas, ele 
certamente estará restrito àqueles liquens anatômica e fisiologicamente mais complexos, onde 
o contato físico entre os simbiontes é menos agressivo e a indução da liberação dos produtos 
de fotossíntese da alga é quimicamente estimulada. A tendência atual é se acreditar que 
liquens são muito mais estruturas onde os fungos cultivam algas (ou cianobactérias) das quais 
se alimentam (ou obtêm seu alimento), do que casos de convivência “harmoniosa e pacífica” 
entre mutualistas. Muitas vezes esse relacionamento tem sido chamado de parasitismo 
controlado. Aliás, a idéia de que os fungos “escravizam as algas, como fazemos com o gado” foi 
inicialmente proposta por Schwendener, em 1867, quando descobriu que os liquens são 
associações de fungos e fotobionte. 
Os fotobiontes encontrados nos liquens pertencem a grupos continentais unicelulares 
ou filamentosos de algas verdes ou de cianobactérias, comuns sobre caules e folhas de plantas, 
no solo, rochas e poças d’água. Entre os mais de 20 gêneros de algas verdes presentes nos 
liquens, destacam-se Trentepohlia, filamentoso comum nos liquens tropicais, e os unicelulares 
Trebouxia e Pseudotrebouxia, presentes em pelo menos metade dos liquens e que ocorrem na 
natureza quase exclusivamente na forma liquenizada. As cianobactérias mais freqüentes nos 
liquens pertencem aos gêneros Nostoc e Scytonema, embora outros 11 gêneros sejam 
conhecidos. Cada espécie de fungo associa-se exclusivamente a uma determinada espécie de 
fotobionte (às vezes duas, veja o texto); entretanto, o oposto não é válido, pois um mesmo 
fotobionte pode ser encontrado associado a muitos fungos diferentes. Quando em associação 
liquênica, os fotobiontes não se reproduzem sexuadamente e sofrem uma série de alterações 
na forma, tamanho e estrutura de suas células; as formas filamentosas podem até mesmo ter 
suas células separadas e aparentarem ser unicelulares; tudo isso se deve ao estresse nutricional 
imposto pelo fungo. A identificação correta das espécies de fotobionte só pode ser realizada 
após sua cultura em separado do fungo, quando suas células readquirem suas características 
peculiares. 
Embora o fungo liquênico normalmente não seja encontrado na natureza sem a alga e 
não desenvolva talo liquênico complexo quando cultivado isolado em laboratório, a recíproca 
não é de todo verdadeira. Exceto por Trebouxia e Pseudotrebouxia, que são pouco freqüentes 
na forma livre, todos os fotobiontes são comumente encontrados livres e se desenvolvem 
melhor em cultura (por exemplo, produzem células normais em tamanho e forma, filamentos 
com ramificação normal, além de gametas) do que dentro do líquen. 
Umas poucas espécies de fungos liquenizados que compõem formas crostosas marinhas 
da região entre-marés, não existentes no Brasil, podem conter espécies de Rodophyta e 
Xanthophyta. 
Pouquíssimos liquens são aquáticos, a imensa maioria são formas de vida terrestres. 
Nesse ambiente, apenas as bactérias têm maior dispersão que os liquens. Eles podem ser 
encontrados desde o interior de rochas e cascas de árvores até as altas camadas da 
estratosfera (propágulos);em todos os substratos, climas, altitudes e latitudes; sob o gelo da 
Antártida e na beira de fontes termais. Estão ausentes apenas de ambientes constantemente 
úmidos e/ou sombreados, como o interior de matas tropicais mais densas, ou então de regiões 
cujo ar está poluído. Sua extrema sensibilidade a alterações ambientais os torna os melhores 
bioindicadores de poluição aérea. 
 
 
3 
 
SISTEMÁTICA 
 
 Nos meados do século 18, os liquens já foram considerados pertencentes às algas e às 
briófitas. O fato de viverem expostos à luz e possuírem coloração que muitas vezes inclui 
tonalidades de verde (principalmente quando umedecidos) fez com que durante muito tempo 
fossem considerados um tipo de vegetal. Além disso, a presença dos fotobiontes, em muitos 
casos dispostos de maneira organizada dentro do talo, parecia confirmar essa crença. Aqueles 
que consideravam os liquens como fungos, tinham como procedimento padrão colocá-los em 
um grupo taxonômico especialmente criado para eles. 
Entretanto, desde o século 19 já existiam autores como Edvard August Vainio, o Pai da 
Liquenologia Brasileira (fig. 1), que defendiam a idéia de que não havia motivos para considerar 
os liquens separadamente dos outros fungos (principalmente dos ascomicetos) em sistemas de 
classificação, pois a única diferença visível entre os liquens e os outros fungos era a presença 
dos fotobiontes, e vários grupos diferentes de fungos podem se liquenizar. Um grupo 
taxonômico que unificasse os fungos liquenizados seria obrigatoriamente polifilético e, 
portanto, inadmissível em um sistema natural de classificação. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 1 - Edvard August Vainio (5/8/1853 - 
14/5/1929), liquenólogo finlandês; uma de suas 
grandes obras foi seu trabalho de doutorado 
sobre os liquens do Brasil, um clássico da 
Liquenologia tropical e fundamental para os 
liquenólogos brasileiros; foi declarado Pai da 
Liquenologia Brasileira, em uma reunião da 
International Association for Lichenology (IAL) 
realizada em Minas Gerais, no Parque Natural do 
Caraça, em 18 de setembro de 1997. 
 
 
O maior problema ocorrido na sistemática dos fungos liquenizados foi o fato de, entre 
1921 e 1940, A. Zahlbruckner ter compilado um catálogo de todas as espécies de fungos 
liquenizados (Catalogus Lichenum Universalis, em 10 volumes) baseado nas idéias de W. 
Nylander. Embora Nylander tenha sido um dos maiores liquenólogos da história, ele não 
acreditava nas idéias de Schwendener (cujo forte impacto que no século 19 acabaram criando 
uma escola de pensamento chamada schwenderianismo), nem na Teoria da Evolução, e 
considerava os liquens como um grupo independente, num sistema de classificação totalmente 
artificial. O Catalogus foi uma imensa obra de compilação e serviu de base para todas as 
 
 
4 
 
pesquisas da primeira metade do século 20, que foi época de pouquíssima atividade 
liquenológica (entre a Grande Depressão e o final da recuperação pós Segunda Guerra 
Mundial). 
Embora declaradamente descontentes com a sistemática utilizada, a maioria dos 
liquenólogos dessa época adotou, por comodidade e insuficiência de dados, a classificação 
oferecida no “Catalogus”. Essa linha de procedimento foi seguida pelos livros de texto, adotada 
e divulgada no meio universitário. 
Exceções a esse tipo de procedimento foram Nannfeldt, em 1932, e Luttrell, em 1951, 
que incluíram cuidadosamente os fungos liquênicos em seus sistemas de classificação, muito 
melhorados em relação aos de suas épocas, devido às descobertas dos tipos de ascos, 
paráfises, modos de dispersão dos esporos, e dos casos de convergência morfológica dos 
ascomas. 
A partir de 1950 o Código Internacional de Nomenclatura Botânica (CINB), que rege 
também a taxonomia dos fungos, passou a declarar que “o nome atribuído a um líquen deve ser 
entendido como aplicado a seu fungo”, tendo o fotobionte taxonomia particular dentro de seu 
próprio grupo. Portanto, um líquen não tem realmente um nome científico de espécie. Quando 
nos referimos a uma espécie de líquen, estamos nos referindo na realidade ao nome de seu 
fungo. Por exemplo, a expressão “este líquen é Cladonia brasiliensis” deve ser tecnicamente 
entendida como “o fungo que participa desta associação liquênica é Cladonia brasiliensis”. Por 
questão de tradição, para facilidade de linguagem, e pela falta de nome popular pelo qual 
chamar os liquens, frases como a primeira são amplamente utilizadas, tanto de forma oral 
como escrita. Entretanto, seu significado real deve estar sempre em mente para que se evite 
sérios erros de raciocínio e armadilhas de lógica. A literatura científica atual praticamente já 
estabilizou o uso da expressão “fungo liquenizado” quando se trata de abordagem taxonômica, 
ou que tenha o fungo como ponto central. O termo líquen deve ser utilizado apenas quando se 
aborda a associação como um todo, como ocorre em certos experimentos fisiológicos com o 
talo inteiro, ou estudos ecológicos, por exemplo. 
Em 1981, o grupo Lichenes foi oficialmente eliminado pelo CINB. 
 A unificação de fungos liquenizados e não liquenizados em um mesmo sistema 
taxonômico é um dos grandes problemas da Micologia, que ainda deve demorar a ser 
satisfatoriamente resolvido, mesmo em relação a alguns aspectos e problemas básicos. Vários 
dos principais aspectos problemáticos que necessitam de solução originaram-se do fato de que 
os fungos liquenizados foram durante muito tempo renegados pela maioria dos estudiosos dos 
fungos não liquenizados, que desenvolveram os principais sistemas de classificação dos fungos. 
Quando consideravam os fungos liquenizados, a maioria sistemas taxonômicos tentava 
simplesmente incluir os fungos liquenizados em esquemas preexistentes. Entretanto, para os 
ascomicetos, os fungos liquenizados constituem quase metade das espécies conhecidas, o que 
significa uma enorme adaptação para qualquer esquema. Também, muitos fungos liquenizados 
apresentam talos complexos, com estruturas morfológicas e anatômicas de importância 
taxonômica reconhecida, que não estão presentes nas espécies não liquenizadas de seu grupo, 
nas quais o micélio é constituído por hifas desorganizadamente dispostas. Por outro lado, 
muitos fungos, quando liquenizados, produzem substâncias características conhecidas como 
“substâncias liquênicas” ou “ácidos liquênicos”, de alta importância taxonômica 
(quimiotaxonomia), amplamente utilizadas na Liquenologia, e que estão ausentes dos fungos 
não liquenizados. Na realidade, os liquens são as entidades biológicas mais estudadas do ponto 
de vista da produção de metabólitos secundários, e os fungos liquenizados constituem o grupo 
onde a quimiotaxonomia tem maior importância, entre todos os conhecidos. Até o momento, 
cerca de 700 dessas substâncias foram identificadas. 
 
 
5 
 
 Por todas essas razões, é extremamente problemático listar e descrever as ordens e 
famílias a que pertencem os fungos liquenizados. Ainda mais, com o avanço das pesquisas, 
todos os anos famílias novas são criadas, ou então transferidas de ordem para ordem, ou então 
são simplesmente desfeitas, com seus gêneros transferidos para grupos diferentes. Todos os 
anos gêneros têm suas circunscrições redefinidas e são mudados de famílias. Além disso, existe 
um enorme número de gêneros e espécies tropicais, dos quais quase nada se conhece além das 
descrições originais, anteriores ao século 20, e muito menos da sua posição adequada em 
sistemas taxonômicos. Isto ainda sem contar o grande número de espécies tropicais ainda não 
descritas, esperando para ser encontradas na natureza. Levantamentos de espécies de fungos 
liquenizados de regiões brasileiras e das Guianas, por exemplo, têm demonstrado que entre 10 
e 20% das espécies encontradas são novas para a Ciência. 
 Esse estado de coisas se reflete até mesmo nos herbáriosliquenológicos, onde se 
prefere organizar os fungos liquenizados simplesmente por ordem alfabética de gêneros e 
espécies, a tentar a vã tarefa de organizá-los por ordens e famílias, cuja definição é ainda vaga. 
 Apesar disso, para que se tenha uma idéia de como as separações dos grupos são 
normalmente feitas e do que existe no Brasil, no final deste capítulo se apresenta um sistema 
organizado, com uma descrição sucinta daquelas ordens de ascomicetes que incluem formas 
liquenizadas, mencionando os gêneros já encontrados no Brasil. 
 
CARACTERÍSTICAS DE VALOR TAXONÔMICO 
 
As características mais utilizadas em que se baseia a sistemática dos fungos liquenizados 
são: (a) características morfológicas e anatômicas do talo; (b) características de estruturas 
reprodutivas da associação (propágulos que possuem micobionte e fotobionte); (c) 
características morfológicas e anatômicas das estruturas reprodutoras do micobionte; (d) 
constituição química em compostos liquênicos (quimiotaxonomia); (e) distribuição ecológica e 
geográfica. 
 
MORFOLOGIA E ANATOMIA 
 
 Pelo fato de que, morfologicamente, os liquens se assemelham a alguns tipos de 
vegetais, e pela própria história da Sistemática Botânica, o corpo do líquen, ou seja, o conjunto 
de fungo e alga, é tradicionalmente denominado talo. 
Quando portadores de algas verdes, a maioria dos talos liquênicos tem coloração entre 
o branco e o cinza, com um toque de verde dado pela clorofila. Quando o talo é umedecido, as 
células do fungo ficam intumescidas e mais translúcidas; então, a cor verde dos fotobiontes 
torna-se bastante salientada e o talo adquire uma coloração viva, clara ou escura. Esse é o 
motivo pelo qual os liquens são muito mais visíveis e bonitos após as chuvas. 
 As outras cores básicas dos liquens são variações do preto, marrom e cinza-chumbo, que 
ocorrem naqueles portadores de cianobactérias (fig. 2). 
 Por outro lado, alguns fungos liquênicos produzem substâncias coloridas, normalmente 
interpretada como defesa contra o excesso de iluminação dos ambientes expostos em que 
vivem, que poderia causar degradação da clorofila. Nesses casos, todo o talo, ou partes dele, 
pode adquirir cores como amarelo, laranja, e mesmo vermelho (fig. 3). 
 
 
 
 
6 
 
 
 
 
Figura 2 - Embora a maior 
parte das cores 
apresentadas pelos liquens 
seja devida a substâncias 
produzidas pelo fungo, o 
tipo de fotobionte tem 
influência decisiva na cor 
do talo. Dentro do mesmo 
gênero folhoso, Sticta 
tomentosa (verde) porta 
algas verdes e Sticta 
ambavillaria (marrom) 
porta cianobactérias. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 3 - Herpothallon rubrocinctum, fungo 
liquenizado crostoso, pantropical e muito 
freqüente em ambientes mésicos no Brasil; os 
sorédios e medula apresentam coloração vermelho 
viva. 
 
 
 
 
 
 
 Existem várias maneiras de associação e vários níveis de intimidade entre as células das 
algas e as hifas dos fungos nos liquens, o que determina uma ampla variação da anatomia e da 
morfologia. As associações mais simples constituem-se apenas de um conjunto de hifas não 
organizadas que crescem por entre colônias de células de algas. A aparência geral desse talo é a 
de uma simples mancha pulverulenta, normalmente branca a ligeiramente acinzentada ou 
esverdeada. As associações mais complexas apresentam talos foliáceos (liquens foliosos), 
ereto-ramificados (liquens fruticosos arbustivos) ou penduloso-ramificados (liquens fruticosos 
pendulosos), com uma grande diversidade de estruturas reprodutivas e vegetativas, além da 
diferenciação interna em vários tipos de tecidos de funções bem definidas. 
 
 
7 
 
 A maior parte dos talos liquênicos pode ser medida em centímetros, sendo comuns 
exemplares crostosos com 1 até 30 centímetros de diâmetro. Entretanto, existem talos adultos 
de poucos milímetros, que crescem em frestas de troncos ou de rochas, bem como enormes 
formas foliosas, e mesmo crostosas, com mais de um metro de diâmetro, sobre rochas em 
campos rupestres, e longas barbas-de-velho de até quatro metros de comprimento, balançando 
nos galhos de árvores das matas de neblina da Serra da Mantiqueira. 
 
Os tipos de talo dos liquens (HÁBITOS) 
 
 Os talos liquênicos se apresentam sob muitos aspectos (hábitos) que, embora não 
caracterizem grupos taxonômicos como famílias ou ordens (às vezes nem mesmo o gênero), 
são típicos para cada espécie, e amplamente utilizados em descrições e chaves de identificação. 
Esses hábitos separam os liquens em "tipos" ou "formas". 
Os principais são: 
 
1. Crostoso ou crustáceo 
 
 São as formas mais aderidas ao substrato (fig. 4). Este tipo de líquen se apresenta preso 
ao substrato por todas as células de seu lado inferior que estão em contato com ele. Menos 
comumente, o talo pode se encontrar totalmente imerso no substrato. Pode-se dizer que 
tipicamente os liquens crostosos são desprovidos de córtex inferior e aderem ao substrato por 
toda a sua medula. Alguns dos principais tipos crostosos são: 
 endofloidal, aquele que cresce imerso no córtex de hospedeiros (forófitas) 
lenhosos. 
 endolítico; análogos aos endofloidais, crescem internamente às rochas. 
 leproso, são as crostas anatomicamente desestruturadas, constituídas apenas 
de hifas e células de algas desorganizadamente associadas. Sua aparência é a 
de uma mancha pulverulenta, com aspecto de um veludo, fino ou espesso. 
Crescem preferencialmente sobre o solo e rochas em locais sombreados e 
úmidos. 
 contínuo, são aqueles mais estruturados, normalmente corticados e muitas 
vezes heterômeros, que apresentam a aparência de uma crosta normalmente 
bem delimitada e sem interrupções a não ser aquelas impostas pelo relevo do 
substrato. Constituem a maioria das espécies crostosas existentes no Brasil e 
são abundantes sobre todos os tipos de substrato. É a este tipo que os 
livros-texto normalmente se referem quando mencionam o hábito crostoso. 
 rimoso, são aqueles que se apresentam naturalmente fraturados, gretados. À 
lupa lembram um solo argiloso ressecado e com a superfície toda quebrada 
que, entretanto, não é separada em placas. As fendas do talo surgem 
posteriormente a seu crescimento, de modo que sua margem é normalmente 
contínua. 
 areolado, são aqueles compostos por placas, como se fosse um revestimento 
de ladrilhos poligonais ou meio arredondados, denominadas aréolas, 
irregularmente colocadas lado a lado. O talo areolado possui aréolas desde a 
margem, onde elas se formam. Em alguns casos, a margem do talo areolado é 
composta de placas um pouco alongadas parecidas com pequenos lobos; esse 
tipo de margem é chamada de efigurada. 
 
 
8 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 4 - Liquens 
crostosos típicos dos 
cerrados, cobrindo 
totalmente trecho de 
casca de árvore; 
quando não queimados 
por mais de 20 anos, os 
cerrados apresentam 
abundante cobertura 
liquênica nos troncos. 
 
 
 
2. Placodióide 
 
 Este tipo de talo apresenta a forma típica de roseta, isto é com uma parte central tida 
como crostosa, mas com a aparência geral de um pequenino talo folioso, devido ao fato do talo 
ser plicado no sentido radial, ou constituído de escamas convexas, alongadas no sentido radial 
e imbricadas como telhas. Vários autores utilizam, erroneamente, o termo “placóide”. 
 
3. Esquamuloso 
 
 É o talo composto por uma enorme quantidade de pequeninas escamas (esquâmulas), 
normalmente menores que um milímetro cada uma (embora em algumas poucas espécies 
possam ter mais de um centímetro), mas que crescem agregadas, muitas vezes formando 
manchas de vários centímetros de diâmetro. Cada esquâmula tem uma parte aderida ao 
substrato da mesma maneira que um líquen crostoso e uma parte ascendente, dirigida para 
cima. 
 
4. Folioso ou Foliáceo 
 
 Sob esta designaçãoestão reunidas aquelas formas (Figs. 2, 5 e 6) cujo talo é de 
estrutura laminar e dorsiventral (possuem lado de baixo e lado de cima) e não se prendem ao 
substrato por sua medula. Em muitos casos possuem um córtex inferior (ver adiante) que os 
diferencia prontamente dos liquens crostosos. É comum que eles se prendam ao substrato por 
projeções ou partes especializadas do córtex inferior. 
 O talo folioso normalmente adere ao substrato por muitos pontos de seu lado inferior. 
Entretanto, em algumas espécies o talo é tipicamente preso por um único apressório central; 
nesse caso o apressório pode ser chamado de umbigo e o talo é dito umbilicado (bastante raro 
no Brasil). Outras vezes, os talos são presos por um único apressório lateral, que pode ser 
chamado de pedúnculo, e o talo de pedunculado. 
Os recortes dos talos foliosos recebem o nome de lobos. Porém, muitos autores fazem 
distinção entre aqueles lobos de contorno arredondado e aqueles alongados e de lados 
 
 
9 
 
paralelos (em forma de fita) a que chamam de lacínios. Para esses autores, portanto, os liquens 
foliosos também podem ser divididos em lobados (fig. 5) e laciniados (fig. 6). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 5 - Talo folioso lobado 
de Parmotrema tinctorum, 
espécie de Parmeliaceae 
freqüentemente encontrada 
sobre troncos de árvores no 
Brasil. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 6 - Talo folhoso 
laciniado de 
Hypotrachyna brasiliana, 
espécie de Parmeliaceae 
freqüente em rochas de 
altitudes superiores a 
1000 metros no sudeste 
brasileiro. 
 
 
 
 
 
 A forma, tamanho, recorte, dobradura e ramificação dos lobos a lacínios são específicos 
para gêneros e espécies. 
Muitos livros e cursos (e Internet) ensinam que a diferença entre liquens crostosos e 
foliosos é que os primeiros não podem ser coletados sem o substrato, ao contrário dos foliosos. 
Esse tipo de abordagem é TOTALMENTE ERRADA, pois existem muitos liquens foliosos tão 
pequenos e/ou aderidos ao substrato, que não podem ser coletados sem ele. Liquens foliosos 
têm sempre a aparência de uma lâmina enrugada e recortada colocada sobre o substrato, 
mesmo que se necessite de lupa para verificar esse fato. No caso da dúvida permanecer, a 
 
 
10 
 
presença de um córtex inferior coloca o líquen entre as formas foliosas, pois esse córtex 
sempre está presente nos foliosos muito aderidos. 
 
5. Fruticoso 
 
Este é aquele talo cilíndrico ou achatado, muitas vezes bastante ramificado, que lembra 
pequenos arbustos com centímetros de altura, crescendo eretos, perpendiculares ao substrato 
(fruticoso arbustivo, fig. 7), ou que cresce pendente de rochas, troncos e galhos de árvores 
(fruticoso penduloso, fig. 8). Podem medir desde alguns centímetros até mais de quatro 
metros de comprimento (as barbas-de-velho verdadeiras, espécies dos gêneros Usnea e 
Ramalina), como ocorre nas partes altas da Serra da Mantiqueira. A sua estrutura interna 
apresenta simetria radial, facilmente percebida nas formas cilíndricas. Note-se que existe uma 
espécie de vegetal da família Bromeliaceae, Tillandsia usneoides, que, vista de longe, pendulosa 
nos galhos das árvores, assemelha-se muito a espécies de Ramalina (o autor do nome dessa 
espécie certamente não conhecia bem os liquens, pois cunhou um nome que significa 
"semelhante a Usnea", um outro gênero de fungos liquenizados fruticosos). Essa bromélia é 
conhecida como "falsa-barba-de-velho". Na realidade, seu aspecto é comumente bem mais 
acinzentado que o de Ramalina, que apresenta cor verde bem clara. 
 
 
 
 
Figura 7 - O talo 
fruticoso arbustivo 
cresce 
perpendicular ao 
substrato, 
lembrando 
realmente um 
pequeno arbusto 
como o desta 
espécie de Usnea. 
 
 
 
 
 
 
 
 Liquens fruticosos podem se prender ao substrato simplesmente se enroscando a ele ou 
por um apressório. A morfologia do apressório e a maneira de se aderir ao substrato são 
caracteres taxonômicos importantes, razão pela qual os espécimes para identificação devem 
ser sempre coletados com eles. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 8 - Fungos liquenizados fruticosos 
pendulosos, como os exemplares desta Usnea 
angulata, crescem pendentes, formando as 
barbas-de-velho, que podem chegar a vários 
metros de comprimento. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
6. Filamentoso 
 
 É o talo constituído de fios muito finos, perceptíveis a olho nu. Muitas vezes a textura 
desse tipo de talo é visualmente semelhante à de um feltro e aveludado ao tato (fig. 9). Na 
maioria dos casos esse tipo de talo é constituído principalmente por algas filamentosas que 
determinam a aparência final da associação. Esse caso é, portanto, uma exceção aos talos 
liquênicos, que em geral são 
constituídos principalmente 
por fungo e têm a sua forma e 
estrutura finais determinadas 
por eles. Nesses liquens as 
hifas dos fungos envolvem um 
a um os filamentos dos 
fotobiontes. 
 
 
Figura 9 - Nos liquens filamentosos, 
os delicados filamentos observados, 
com a textura de fios de algodão, são 
constituídos principalmente pelo 
fotobionte, que no caso deste 
Coenogonium leprieurii, é uma 
espécie de Trentepohlia (alga verde). 
 
 
12 
 
7. Composto ou dimórfico 
 
 É o talo formado pela combinação dos tipos de talo descritos acima. Nesse caso, o que 
normalmente acontece é que o líquen começa seu desenvolvimento com um tipo de talo e 
depois assume outra forma; o primeiro talo, comumente chamado de talo primário, pode ou 
não permanecer no líquen adulto. Com a idade, o talo primário pode morrer e desaparecer, 
restando apenas talo secundário, e o líquen restante tem aspecto fruticoso. 
 As combinações mais freqüentes entre tipos diferentes de talos são crostoso-fruticoso e 
esquamuloso-fruticoso, com o fruticoso sempre como talo secundário; eles são característicos 
da família Cladoniaceae e, pela importância dessa família, têm recebido o nome de talo 
cladoniforme (fig. 10). Nesse talo, a parte fruticosa originada de esquâmulas basais recebe o 
nome de podécio e se origina pelo crescimento do estipe do apotécio (fig. 21). 
 
 
 
 
Figura 10 - Talo 
composto do tipo 
cladoniforme, de 
Cladonia ramulosa; 
podem ser observadas 
as esquâmulas basais 
(talo primário) 
espalhadas sobre o 
substrato (neste caso 
solo), a partir das 
quais cresce 
verticalmente o 
podécio (talo 
secundário), que tem 
a função de elevar o 
disco himenial 
(marrom claro nesta 
espécie). 
 
 
 Na grande maioria das vezes os podécios são ocos, e essa é uma característica fácil de se 
observar sob a lupa ou mesmo a olho nu, sempre que é necessário distinguí-los dos 
pseudopodécios (não do gênero Cladonia), que se originam do crescimento de partes do talo 
primário, e não de partes do apotécio. 
 
ANATOMIA E MORFOLOGIA DO TALO LIQUÊNICO 
 
Diferente dos fungos não liquenizados, os talos liquênicos podem apresentar muitos 
tipos de tecidos plectenquimáticos, com arranjos celulares diferentes, característicos de certas 
estruturas e de grupos taxonômicos. Além disso, o talo pode ser internamente organizado em 
camadas compostas por um ou mais tipos de tecidos. 
 Neste ponto é importante lembrar que parênquimas verdadeiros estão quase 
totalmente ausentes do Reino Fungi. A única exceção existente será comentada mais adiante 
(esporo muriforme). 
 Por definição e para qualquer tipo de organismo, parênquima é o tecido originado pela 
divisão de células em todas as direções do espaço. Esse processo origina uma estrutura maciça 
onde as células que estão reunidas em um dado local num tecido são sempre “parentes” 
 
 
13 
 
próximas, isto é, originadas a partir das últimas divisões de uma célula que se encontrava 
naquele local do tecido. Por outro lado é importante lembrar que o termo “parênquima”também é utilizado pela Anatomia Vegetal para descrever aqueles parênquimas com células de 
paredes finas, muitas vezes grandes, arredondadas e com funções de preenchimento ou 
reserva, entre outras. 
 Nos fungos, as estruturas maciças são obtidas por um método diferente. Como todo o 
talo (micélio) dos fungos é de natureza filamentosa, ou seja, constituído por hifas, as suas 
partes mais complexas como por exemplo os ascomas, basidiomas e os tecidos dos talos 
liquênicos, são obtidos pela compactação das hifas, que cria uma estrutura anatomicamente 
muito semelhante, em aparência, ao parênquima vegetal. Esse tipo de tecido é conhecido 
como plectênquima ou falso parênquima. Nele, as células vizinhas não são necessariamente 
parentes, já que podem ser células de pontos muito distantes nos filamentos que o compõem. 
 Para se referir a essas estruturas, normalmente se lança mão de prefixos que chamam a 
atenção para a semelhança morfológica entre esses tecidos. Assim, o termo paraplectênquima 
se refere a plectênquimas que parecem parênquimas vegetais ao microscópio (células de 
paredes finas) e prosoplectênquima se refere àqueles que se assemelham a colênquimas ou 
esclerênquimas (paredes espessas a muito espessas). 
 Aqui cabem duas observações: (1) alguns autores confundem o conceito clássico de 
"tecido" (células de mesma aparência reunidas em determinado local para desempenhar uma 
função específica) com o de parênquima; para esses autores, e somente para eles (que 
normalmente também desconhecem a complexidade anatômica que os fungos liquenizados 
podem apresentar), os fungos em geral não apresentariam tecidos; (2) outros autores chamam 
de plectênquima o arranjo frouxo das hifas em certas partes do talo (que não constituem um 
tecido, como a medula dos liquens); esse termo deve ser reservado para aquelas partes onde as 
hifas estão compactadas e, em corte anatômico, apresentam a aparência de parênquima 
vegetal. 
 Talos que não possuem diferenciação de camadas internas são chamados de 
homômeros (fig. 11), ao contrário dos heterômeros (fig. 12), que anatomicamente possuem 
pelo menos dois estratos internos: a camada de algas e a medula. 
Externamente, o talo é revestido pelo córtex, constituído por uma a várias camadas de 
células. Tipos de células, número de camadas e espessura variam de espécie para espécie. O 
córtex normalmente é transparente, mas certos grupos podem apresentá-lo impregnado com 
pigmentos de cores vivas, que são interpretadas como proteção contra excesso de iluminação e 
que realmente aparecem com maior freqüência em espécies de locais muito expostos, como 
por exemplo os campos rupestres. 
Exceto obviamente pela camada de algas, todas as estruturas aqui mencionadas podem 
estar ausentes, dependendo da espécie do fungo liquenizado. 
 O córtex pode estar totalmente ausente, mesmo de alguns liquens mais complexos, 
como nos gêneros Collema (folioso) e Cladina (fruticoso), ou parcialmente ausente em várias 
estruturas do talo. É comum que espécies de talo folioso sejam desprovidas de córtex inferior. 
Por outro lado, em certos gêneros fruticosos, de medula oca ou pouco densa, o córtex pode 
funcionar como estrutura de sustentação. 
 Em certos gêneros ou espécies, existem falhas na continuidade do córtex, que aparecem 
como pequenos pontos, normalmente visíveis a olho nu ou com o auxílio de uma lupa de mão, 
por onde a medula pode ser vista e chega mesmo, em alguns casos, a extravasar. Esses 
pequenos poros são denominados pseudocifelas. Sua presença, forma e localização são 
importantes caracteres para determinação de gêneros e espécies. Por exemplo, o gênero 
Punctelia apresenta pseudocifelas puntiformes no córtex superior, enquanto Pseudocyphellaria 
apresenta pseudocifelas no córtex inferior. 
 
 
14 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 11 - Talo homômero. 
Corte transversal do talo de 
uma espécie de Leptogium, 
onde se observa somente a 
presença dos córtices 
uniestratificados envolvendo 
um emaranhado de hifas e 
fotobiontes (células verdes) 
não arranjados em camadas. 
 
 
 
 
 
 
Figura 12 - Talo heterômero. 
Corte transversal do talo de 
uma espécie de 
Hypotrachyna; aqui é 
possível observar, além do 
córtex superior com várias 
camadas de células (incolor a 
levemente amarelado) e do 
córtex inferior (enegrecido), 
a nítida organização interna 
em duas camadas 
(estratificação): a camada de 
algas, verde, e a medula, 
incolor. A estrutura negra se 
projetando (fora de foco) do 
córtex inferior é a base de 
uma rizina. 
 
 
 Diferente das pseudocifelas, as cifelas (fig. 13) ocorrem apenas no córtex inferior e 
estão restritas ao gênero Sticta, onde ocorrem em todas as espécies. As cifelas, embora se 
apresentem nitidamente côncavas, com a aparência de poros, na realidade não são 
perfurações, pois sua superfície é revestida por um córtex especial. 
A camada de algas está, na grande maioria dos casos, localizada logo abaixo do córtex 
superior, e é constituída por hifas muito frouxamente arranjadas, entre as quais estão 
instaladas as células dos fotobiontes. A parede celular do fungo é fina, para facilitar a troca de 
substâncias com a alga, e incrustada com cristais hidrofóbicos de ácidos liquênicos, para manter 
a água afastada da camada de algas mesmo quando o talo está encharcado, a fim de facilitar as 
trocas gasosas necessárias ao processo de fotossíntese dos fotobiontes. 
 
 
15 
 
 
 
Figura 13 - Cifelas 
podem ser 
facilmente 
observadas na face 
inferior de Sticta 
tomentosa, bem 
como em todas as 
espécies do gênero; a 
cobertura marrom 
aveludada cobrindo o 
espaço entre as 
cifelas, é o tomento. 
As cifelas são 
internamente 
revestidas por um 
córtex especial, o que 
não ocorre com as 
pseudocifelas. 
 
 
 
Dificilmente os fotobiontes constituem um estrato absolutamente contínuo dentro do 
talo. O mais comum é que o fungo restrinja sua distribuição a pequenos espaços contendo 
grupos de células denominados glomérulos. Quando o espaço entre os glomérulos supera um 
certo tamanho, ocorrem manchas claras (da cor da medula) na superfície do talo, 
correspondentes a esse espaço e denominadas máculas. As máculas são, portanto, reflexos 
morfológicos de uma anatomia específica, são visíveis na lupa ou a olho nu, e variam em forma 
e tamanho de acordo com a espécie de fungo liquenizado. 
A medula é a camada localizada logo abaixo da camada de algas, o que corresponde à 
posição central nos liquens fruticosos. A medula é composta por hifas entrelaçadas, de paredes 
mais espessas que as da camada de algas; é o local de armazenamento de água e reservas do 
fungo e constitui a maior parte do talo. Substâncias liquênicas específicas são nela 
armazenadas, extracelularmente. Normalmente branca, em certas espécies pode apresentar-se 
pigmentada desde o amarelo ou creme claro até o amarelo forte, laranja, salmão, rosa, 
vermelho e outros. Em muitos liquens fruticosos, a medula apresenta-se toda ou em parte 
diferenciada num tecido de sustentação do talo. No gênero Usnea, a parte central de medula 
apresenta-se diferenciada num tecido condróide, denominado eixo, facilmente reconhecível, e 
que dá ao talo alguma resistência à tração. Em outros casos a medula é oca, quase oca ou 
gelatinosa, e a sustentação pode ser dada tanto pelo córtex quanto pela parte mais externa da 
medula (e.g. espécies de Ramalina). 
 
Outras estruturas vegetativas 
 
Lóbulos e lacínulos 
 
Regularmente ou casualmente, boa quantidade de espécies foliosas desenvolve 
projeções vegetativas nas margens de lobos e de lacínios, que recebem o nome de lóbulos 
quando são arredondados, e lacínulos (também é usada a forma feminina lacínula), quando 
têm a forma de fita (os lados são paralelos). Talos que passaram por período muito 
desfavorável de crescimento, às vezes por parasitose, às vezes por poluição do ar,às vezes por 
 
 
16 
 
alteração microclimática, etc., e que ganham novamente condições favoráveis, podem 
desenvolver rapidamente lóbulos jovens, que podem diferir em cor, textura e vigor das partes 
antigas. Esses lóbulos adventícios e eventuais também podem ser inicialmente confundidos 
com lóbulos normais, mas sua tendência real é crescer para assumir a forma e o tamanho 
típicos dos lobos ou lacínios da espécie. 
 
 
Estruturas de Fixação 
 
 Em alguns gêneros, hifas rizoidais se projetam do córtex e se enroscam em partículas do 
substrato; em outros, o que é mais comum, o córtex pode possuir projeções especializadas 
denominadas rizinas e hápteros. 
 Uma rizina é um feixe de hifas que crescem aglutinadas e paralelas a partir do córtex 
inferior dos liquens foliosos e cuja função é apenas de fixação. Um talo pode ter de algumas 
dezenas a muitas centenas de rizinas. Elas podem ser simples ou ramificadas de modo 
dicotômico, esquarroso ou irregular; podem ter o ápice agudo ou penicilado. Normalmente, um 
talo liquênico possui rizinas de um único tipo, mas determinados gêneros, como por exemplo 
Rimeliella, possuem rizinas de tipos diferentes num único talo. 
 Em algumas espécies, principalmente nos gêneros Leptogium e Collema, conjuntos de 
hifas rizoidais ou de rizinas densamente agregadas crescem em regiões bem delimitadas em 
poucos locais do córtex, fixando o talo por poucos pontos, como se fossem “botões de 
pressão”. Essas regiões de aderência especializadas são denominadas hápteros. O mesmo 
termo é utilizado para designar ramos laterais dos liquens fruticosos que funcionam como 
pontos secundários de fixação. 
 A presença, ramificação, distribuição e coloração dessas estruturas são caracteres de 
grande importância taxonômica no nível de gênero e espécie, de modo que muito cuidado deve 
ser tomado durante a coleta para que o lado de baixo do líquen não seja danificado. 
 
Cílios e fibrilas 
 
 A diferença básica entre cílios (fig. 14) e rizinas é o fato dos cílios crescerem 
horizontalmente a partir da margem do talo, ou então a partir do córtex superior. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 14 - Neste exemplar de 
Parmotrema sp., podem ser 
observados cílios curtos na 
margem dos lobos. 
 
 
 
 
17 
 
 A função dos cílios é totalmente desconhecida, mas a sua importância taxonômica, que 
até pouco tempo era negada por muitos especialistas, vem sendo cada vez mais reconhecida, e 
muitos gêneros são separados com base na presença ou ausência de cílios, entre outros 
caracteres. 
 No gênero Usnea, muitas vezes a borda do apotécio e a própria superfície do talo pode 
conter filamentos longos e flexíveis; esses filamentos são liquenizados, ou seja, não são 
compostos apenas por fungo; eles têm a mesma estrutura interna do talo e são mais 
corretamente chamados fibrilas (fig. 15). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 15 – Fibrilas 
ao redor da margem 
de apotécios de 
Usnea sp. 
 
 
 
Pústulas 
 
 Pústulas são inchações que aparecem em pontos determinados do talo de certas 
espécies. Elas parecem surgir pelo crescimento do córtex, camada de algas e parte da medula, 
não acompanhado pela parte inferior da medula e córtex inferior. Por serem ocas, elas são 
muito delicadas ao toque. Podem se desenvolver com a aparência de grânulos lisos, grânulos 
cerebróides, rugas isoladas, rugas paralelas, ou pequenos dedos verticais. Neste último caso, as 
pústulas são muitas vezes chamadas dáctilos, para diferenciá-las dos isídios. 
 Freqüentemente a erupção das pústulas (que ocorre ou não dependendo da espécie) 
origina sorédios (ver adiante) que se formaram sob elas e/ou pela desagregação de suas 
paredes. 
 As pústulas podem se desenvolver laminais ou marginais em lobos e lacínias, às vezes 
restritas às cristas das dobras do talo, às vezes presentes nas margens dos apotécios, às vezes 
ocorrendo nos isídios, caso em que é difícil saber se são isídios pustulados ou dáctilos. 
 Relativamente aos países temperados e frios, o Brasil apresenta uma grande quantidade 
de espécies pustuladas. 
 Existe uma boa quantidade de estruturas presentes em espécies brasileiras que se 
parecem superficialmente com pústulas, são bastante confundidas com elas na literatura e 
ainda não têm nome. 
 
 
 
18 
 
Cefalódios e associações quimeróides 
 
 Um fungo normalmente se associa a apenas uma espécie de fotobionte. Entretanto, em 
alguns grupos taxonômicos, o fungo pode (facultativa ou obrigatoriamente) se ligar a uma alga 
verde e uma cianobactéria. Nesses casos, os fotobiontes nunca compartilham o mesmo espaço 
no interior do talo. É comum que as algas verdes estejam localizadas na camada de algas e as 
cianobactérias restritas e grumos ou estruturas especiais localizadas dentro ou na superfície do 
talo, que são denominados cefalódios, importantes na fixação do nitrogênio. Nesses liquens o 
talo é verde, e os cefalódios cinzas a negros. 
 No gênero fruticoso Stereocaulon, que no Brasil pode facilmente ser encontrado sobre 
rochas em altitudes superiores a 1000m, todas as espécies apresentam cefalódios azulados 
externos, de aparência cerebróide, cuja forma pode identificar a espécie. 
Certas espécies dos gêneros Sticta, Lobaria e outros podem alternativamente se 
associar a uma certa espécie de alga verde ou de cianobactéria, o que dá ao talo inteiro a cor 
verde (com algas verdes) ou cinza a marrom (com cianobactéria), mas esse é um fato pouco 
comum e restrito a pouquíssimos grupos. De fato, em alguns locais do Brasil, principalmente 
em locais altos da Serra do Mar e Serra da Mantiqueira, às vezes podem ser encontrados talos 
(principalmente de espécies de Sticta) cujo fungo trocou de fotobionte, ou seja, parte do talo 
tem cor verde e parte cor marrom ou enegrecida; esse tipo de estrutura pode ser chamado de 
quimera ou associação quimeróide, mas há um grande número de termos alternativos na 
literatura. 
O mais comum é que não exista diferença morfológica significativa entre as partes dos 
talos com tipos diferentes de fotobiontes (embora tenham sido descritos como espécies 
diferentes). Entretanto existem casos (Lobaria, no Brasil) em que o talo é folioso quando o 
fungo se associa à alga verde e , torna-se fruticoso quando o fungo troca para a cianobactéria. 
Esse forma fruticosa, encontrada no mundo inteiro, foi originalmente descrita como o gênero 
Dendriscocaulon, quando na realidade se trata de uma única espécie. Esse fato causa polêmica 
dentro da Liquenologia e suas implicações taxonômicas não estão satisfatoriamente resolvidas. 
O mais comum é que os especialistas se refiram às diversas formas como fototipos, mas 
mantenham o uso dos nomes originais em que as espécies foram descritas até que o problema 
esteja solucionado. 
 
REPRODUÇÃO DO TALO LIQUÊNICO 
 
 Obviamente, não se pode falar de reprodução sexuada de uma estrutura composta de 
dois organismos diferentes, como os liquens. Entretanto, a intimidade morfológica e anatômica 
entre os simbiontes liquênicos é tanta, que existem estruturas que garantem a disseminação da 
associação como um todo, por conterem tanto hifas de fungos como células de algas ou de 
cianobactérias. Por isso, embora o líquen não seja um organismo e sim uma associação de 
organismos, por questão de tradição, essas estruturas são inadequadamente conhecidas na 
literatura como de “reprodução assexuada do líquen”. Por outro lado, independente dos 
fotobiontes, os fungos podem se reproduzir assexuadamente por meio de produção de 
esporos, que deverão encontrar o fotobionte específico na natureza, a fim de recompor a 
associação. 
 Também tradicionalmente, quando se diz que o líquen está se reproduzindo 
sexuadamente, na realidade se está querendo dizer que o fungo se reproduziu sexuadamente. 
Paralelamente, quando se diz que o líquen está fértil, na realidade se está querendodizer que o 
fungo está produzindo ascomas (que são estruturas produtoras de esporos). 
 
 
19 
 
 Portanto, adequando melhor a terminologia, pode-se dizer que uma simbiose liquênica 
pode ser reproduzida na natureza por dois métodos básicos: DIRETO, que ocorre através da 
produção de estruturas que contêm tanto o micobionte quanto o fotobionte, comumente 
denominada, de modo errôneo, como reprodução assexuada; e INDIRETO, através da produção 
e liberação de esporos pelo micobionte, com ou sem sua reprodução sexuada. Esses esporos 
necessitam encontrar na natureza células da espécie adequada de fotobionte e se associar a 
elas num processo de liquenização (fig. 16). 
 
REPRODUÇÃO DIRETA 
 
 Nem todos os liquens se reproduzem diretamente. Na realidade, existe grande número 
de espécies cujo único modo de reprodução conhecido (ou suposto) é indireto. 
Uma das estruturas de reprodução direta mais freqüentes é o sorédio (fig. 17), uma 
diminuta (25 a 100 µm) massa granular composta apenas de algumas hifas envolvendo algumas 
células do fotobionte; são anatomicamente desestruturados, ou seja, não apresentam qualquer 
sinal de desenvolvimento de tecidos ou camadas internas. A olho nu, o tamanho de um sorédio 
varia entre o de um grão de farinha de trigo e um de açúcar refinado. A produção de sorédios 
pode ocorrer sobre todo o talo, tanto na face superior quanto na inferior, ou estar restrita a 
regiões como o ápice de lobos e lacínios, cristas de dobras, margens dos apotécios, ou ainda a 
áreas especializadas bem delimitadas denominadas sorais (fig. 18). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 16 - Modos possíveis de reprodução de um talo liquênico: DIRETO e INDIRETO. Observe que o conídio pode 
tanto atuar na reprodução indireta do talo, através de liquenização, como servir de célula sexual masculina na 
reprodução sexuada do fungo, que não está representada no esquema. 
 
 
Os sorédios podem ser caducos, caindo assim que produzidos, ou permanecer presos ao 
líquen à espera de serem levados pela água, vento ou animais. Nesses casos eles normalmente 
isídios 
TALO 
ascoma 
picnídio 
ascosporo 
conídio 
FOTOBIONTE 
 - livre ou de 
 um líquen 
micélio liquenizado 
LIQUENIZAÇÃO 
 sorédios 
filídios, etc. 
REPRODUÇÃO INDIRETA 
REPRODUÇÃO 
DIRETA 
LÍQUEN 
reprodução sexuada do fungo 
 
 
20 
 
permanecem inalterados. Entretanto, em algumas espécies, eles podem crescer e até mesmo 
ficar parcial ou totalmente corticados, quando então deixam de ser chamados de sorédios e 
passam a receber a denominação de grânulos. 
Sorédios, às vezes, ocorrem em espécies normalmente não sorediadas, em talos muito 
velhos ou que estão quase morrendo, ou ainda em casos em que a associação simbiótica esteja 
se desfazendo por motivos ambientais, como a mudança do ambiente para condição de 
umidade constantemente alta. Porém, nesses casos, é normalmente evidente a condição geral 
anormal do talo através da presença de manchas, deformações, esterilidade do fungo e outros 
indicadores. 
 
 
 
 
 
Figura 17 - Produção 
de sorédios em soral 
de Hypotrachyna sp. 
As hifas da camada 
de algas se 
fragmentam 
formando pequenos 
grumos compostos 
de poucas hifas e 
algumas células de 
fotobionte (neste 
caso a alga verde 
Trebouxia), que são 
liberados ou 
carregados. 
 
 
 
 Presença, tipo e localização de sorédios e sorais têm alto valor taxonômico a nível 
específico. Os principais tipos de sorais são: 
 maculiformes: aqueles que formam manchas redondas ou oblongas bem delimitadas 
na superfície ou na margem do talo. 
 rimiformes: aqueles alongados, simples ou ramificados, que se desenvolvem 
acompanhando fissuras do córtex. 
 convexos-globulares: aqueles que formam bolas muito evidentes na superfície do talo, 
como em várias espécies de Dirinaria. 
 capitados: aqueles esféricos que ocorrem no ápice de lobos e lacínias, como em 
Parmotrema chinense. 
 labriformes: aqueles formados próximo da ponta, no lado inferior do lobos que se 
viram para cima, com a aparência de lábios, como muitas espécies de Parmelia s.l. e 
Heterodermia. 
 marginais: aqueles que se desenvolvem continuamente ao longo da margem de liquens 
foliosos, como em Parmotrema austrosinense e Pseudocyphellaria aurata. 
 
 
21 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 18 - Nas 
espécies que 
produzem sorédios, a 
posição dos sorais no 
talo é característica 
para cada espécie. 
Neste Parmotrema 
praesorediosum os 
sorais se 
desenvolvem nas 
margens dos lobos. 
 
 
 
 
A reprodução indireta também pode ser efetivada através de isídios (fig. 19), pequenas 
projeções com a mesma organização anatômica do talo, ou seja, caso se originem de um líquen 
heterômero, possuem córtex, camada de algas e medula. Sua forma básica é cilíndrica, embora 
em algumas espécies eles possam ser achatados ou de tendência esférica, podendo ser simples 
ou ramificados, retos ou contorcidos, eretos ou procumbentes. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 19 - Os 
isídios não têm a 
aparência 
pulverulenta dos 
sorédios; eles 
aparecem a olho 
nu como 
pequenos grãos. 
Em Parmotrema 
tinctorum eles são 
laminais, ou seja, 
crescem sobre 
toda a parte 
superior do talo. 
 
 
Cerca de 25 a 30% dos liquens foliosos e fruticosos são isidiados. Ao olho nu o conjunto 
de isídios dá ao talo a aparência de uma lixa, e ao tato é geralmente possível percebê-los como 
grãos quando friccionados entre os dedos. Pode-se, grosso modo, dizer que os menores isídios 
 
 
22 
 
são do tamanho aproximado dos maiores sorédios. O mais comum é que eles variem entre 0,1 
e 3,0 milímetros de altura, entre 0,05 e 0,2 milímetro de diâmetro. Os isídios são constritos na 
base para facilitar sua liberação. 
Os isídios podem se desenvolver sobre toda a superfície do talo (muito raramente no 
lado de baixo) ou estarem restritos a regiões como as margens do talo, ápice de dobras ou 
margens dos apotécios. 
 Presença, forma, forma, cor, modificações e distribuição dos isídios são importantes 
características taxonômicas no nível específico. 
Filídios se diferenciam dos isídios pelo fato de serem dorsiventrais, e dos lóbulos por 
não terem o lado de baixo corticado. Os filídios estão restritos aos liquens foliosos. 
 
Outras estruturas de reprodução direta 
 
Existe um grande número de outras estruturas de reprodução direta, a grande maioria 
delas restrita a pequenos grupos ou mesmo a uma única espécie conhecida. Por exemplo, os 
blastídios são formados por uma seqüência de segmentos do próprio talo (moniliformes). 
Lacínias com blastídios aparecem com vários estrangulamentos consecutivos, que são pontos 
de fragmentação do talo, nas proximidades do ápice. 
Os goniocistângios, que aparecem em liquens epífilos, produzem estruturas formadas 
por uma única célula de alga mais suas células filhas, envolvidas por hifas de uma maneira 
diferente do que ocorre nos sorédios. 
Os hormocistângios são estruturas esféricas que aparecem no gênero Lempholemma, 
dentro das quais são produzidos os hormocistos, cadeias de células da cianobactéria Nostoc 
com sua típica bainha de mucilagem, dentro da qual algumas hifas do fungo se introduzem. 
 
Fragmentação 
 
A fragmentação normalmente é reconhecida como um processo regular de reprodução 
quando existem estruturas e estratégias que facilitem o processo e o tornem um fato comum 
para a espécie. Alguns especialistas são da opinião de que esse processo pode ser considerado 
regular pelo menos para os liquens fruticosos muito ramificados ou longos, que quando secos 
são normalmente muito delicados e têm grande risco de serem atritados contra galhos e rochas 
ou de serem pisados por animais. Além disso, certas espécies apresentam regiõesde 
fragmentação, mais estreitas e sem algas, que são pontos específicos onde o talo pode ser 
facilmente quebrado. 
 
Morte das partes velhas 
 
Este é um modo de reprodução bastante óbvio, mas em geral esquecido. 
Como a maioria dos seres vivos, os fungos liquênicos, e conseqüentemente os talos 
liquênicos que eles formam, apresentam crescimento apical, ou seja, crescem pela aposição de 
novas células às suas extremidades. Como conseqüência, o centro das formas foliosas e 
crostosas, bem como a parte basal das fruticosas, são mais velhos que as extremidades. Com o 
passar do tempo, essas partes velhas acabam morrendo e normalmente se destacam e caem ou 
então se desfazem. Quando esse processo de desagregação por morte chega a destruir a base 
de uma ramificação, obviamente o talo é dividido em partes que crescerão como indivíduos 
independentes, o que caracteriza uma reprodução direta. Esse processo é facilmente percebido 
em grandes espécies de liquens foliosos que crescem sobre rochas, com o talo tipicamente em 
 
 
23 
 
forma de anel pela morte do centro, bem como nas espécies de grandes Cladonia fruticosas 
que crescem no chão e que possuem as partes basais sempre mortas e decompostas. 
 
Conidiomas 
 
 Em algumas espécies, massas de conídios produzidos em hifóforos podem ser 
dispersadas juntamente com células de algas, o que caracteriza uma reprodução direta. 
 
Os “pares específicos” 
 
 Em geral, uma determinada espécie apresenta apenas um tipo de estrutura de 
reprodução direta, e, tradicionalmente, espécies são separadas pelo modo de reprodução, 
mesmo que o restante da morfologia, anatomia, química e distribuição geográfica sejam 
semelhantes. 
 Esse procedimento é hoje em dia geralmente justificado pela Teoria dos Pares 
Específicos (em alemão: Artenpaare), aceita e aprimorada pelo grande liquenólogo austríaco 
Josef Poelt, segundo a qual uma espécie cuja reprodução é exclusivamente indireta (por 
esporos), produtora de ascomas, chamada espécie primária, pode originar evolutivamente uma 
forma com reprodução exclusivamente direta, chamada de espécie secundária. Por não 
manterem fluxo gênico entre si, as duas formas podem ser consideradas espécies diferentes e 
são tratadas como pares específicos, ou seja, espécies que diferem apenas e tão somente pelo 
modo de reprodução. É comum a existência de várias espécies secundárias (por exemplo: uma 
com sorédios, outra isidiada, outra produzindo pústulas) originadas de uma única primária; 
nesses casos os pares específicos são compostos na realidade por três ou mais espécies e, 
apesar de serem tratados como "pares" pela literatura, seriam mais bem denominados grupos 
específicos. 
 É bastante comum que a forma (espécie) parental, produtora de ascomas, tenha uma 
distribuição geográfica mais restrita que aquelas produtoras de estruturas de reprodução 
direta. Também, as condições ambientais necessárias à produção dos ascomas são muito mais 
restritas que aquelas necessárias à produção de sorédios ou isídios, por exemplo. Esse é um dos 
aspectos que torna a reprodução direta muito mais eficiente que a indireta. 
 Existem também muitos casos em que a espécie parental foi extinta ao longo da 
evolução. 
 
REPRODUÇÃO INDIRETA 
 
 Muitos liquens se reproduzem apenas indiretamente, ou seja, o fungo liquênico produz 
propágulos, normalmente células de reprodução assexuada (esporos) que, ao serem dispersas 
no ambiente, dependem do acaso para encontrar a espécie adequada de alga ou cianobactéria 
e promover o processo de liquenização, a fim de reconstituir um talo semelhante àquele que 
originou a unidade de dispersão. 
É bastante óbvio que, pela dificuldade de encontrar a alga, esse processo é já de início 
mais difícil que a reprodução direta. Algumas das algas que participam dos liquens são raras na 
natureza como formas livres, e o exemplo mais citado é o da clorófita unicelular Trebouxia, que 
participa em mais da metade dos liquens. 
Sabe-se que alguns esporos necessitam germinar sobre talos de liquens que contenham 
a alga necessária à sua liquenização. As primeiras hifas são lançadas dentro do talo-suporte e 
literalmente capturam células de algas com as quais se liquenizam. Entretanto, este é um caso 
 
 
24 
 
apenas. Na maior parte das vezes é totalmente desconhecida a maneira e o real grau de 
dificuldade que os fungos têm para realizar a liquenização na natureza. 
 Nos ascomicetos liquênicos ocorrem dois tipos básicos de esporos: conídio e ascosporo. 
 Tipos e estrutura de esporos, conidiomas e ascomas são caracteres importantíssimos na 
classificação dos ascomicetos desde o nível de espécie até o de ordem. 
 Ascomas podem conter vários tipos de tecidos organizados de muitas maneiras 
diferentes de acordo com o grupo taxonômico. Pode também apresentar diferentes tipos de 
hifas, especialmente arranjadas e ramificadas, além de vários tipos de inclusões, que vão desde 
porções de substrato até depósitos de cristais e óleos. Ainda, o aparelho apical dos ascos vem, 
dia a dia, se tornando mais importante na classificação. 
 Até algum tempo atrás, os conídios eram simplesmente desconsiderados na taxonomia 
dos ascomicetos liquenizados. Atualmente, além dos conídios serem importantes na 
caracterização gêneros e espécies, os tipos de conidiomas onde são produzidos podem 
caracterizar gêneros e famílias. 
 
Reprodução por conídios 
 
 Cerca de 8.000 (59%) das 13.500 espécies aceitas de fungos liquenizados produzem 
conídios. Entretanto, pouco se sabe sobre os tipos de conidiomas que elas produzem. A forma e 
ramificação dos conidióforos e das células conidiogênicas varia entre as espécies e os gêneros. 
 Sendo haplóide como o micélio adulto, um conídio pode tanto atuar na reprodução 
direta, associando-se a um fotobionte, como na reprodução indireta, atuando como célula 
sexual masculina. Trata-se, portanto, de uma célula de função dupla, ora atuando como 
gameta, ora como esporo, de acordo com a oportunidade. 
 Algumas espécies produzem conídios de dois tamanhos diferentes, macroconídios e 
microconídios. Alguns pesquisadores opinam que pelo menos nesses casos, aqueles conídios 
maiores, que apresentam maior quantidade de substâncias de reserva e paredes espessas, 
atuam como esporos; aqueles pequenos (0,5-1,5 µm), baciliformes ou globosos, com pouco 
citoplasma e de paredes finas, funcionam como células masculinas. 
 A forma e ramificação dos conidióforos e das células conidiogênicas varia entre as 
espécies e gêneros. 
 Os fungos liquenizados podem apresentar vários tipos de conidiomas: 
 o picnídio ou conidioma picnidial é de longe o tipo mais comum. Trata-se de uma estrutura 
globosa ou piriforme que se abre por um poro. Nos liquens foliosos os picnídios são 
normalmente imersos no talo, deixando visível apenas seu ápice preto, marrom ou branco. 
Nos talos crostosos eles são emersos e totalmente negros. Os especialistas identificaram até 
o momento vários tipos diferentes de conidiomas picnidiais, típicos de gêneros e famílias. 
Certamente os tipos mais comuns no Brasil são o “tipo Umbilicaria”, que ocorre também em 
Parmelia s.l., e o “tipo Lobaria”, que ocorre nas Lobariaceae. 
 o conidioma acervulóide se parece um pouco com o picnídio, mas não tem a forma fechada. 
Trata-se de um agrupamento de conidióforos em depressões regulares e ampuliformes do 
talo. 
 campilídio é o tipo de conidioma que ocorre em Calopadia, Badimia, e outros gêneros, 
comumente encontrados sobre folhas em matas úmidas e claras, mas às vezes crescendo 
também sobre troncos. Os campilídios são estruturas emersas, na forma de pequenas 
orelhas, com os conídios se desenvolvendo em sua face interna. Em um talo essas “orelhas” 
normalmente se desenvolvem todas voltadas para um mesmo lado. Ainda há pouco tempo 
 
 
25 
 
atrás os campilídios eram interpretados como um fungo liquenícola (quecresce sobre o 
líquen) ao qual se atribuiu o nome de Pyrenotrichum. 
 hifóforo é o conidioma típico da família Gomphillaceae. Os hifóforos apresentam uma 
estrutura sinemática, ou seja, são formados por um feixe de hifas paralelas e aglutinadas 
que crescem perpendicularmente ao talo. O ápice do hifóforo é dilatado e dele pendem 
muitos conidióforos variadamente ramificados, que produzem cadeias de conídios. 
Durante a atividade de coleta, é bastante comum encontrar talos portadores 
unicamente de conidiomas. No jargão técnico esses espécimes são ditos estéreis (a palavra 
fértil é reservada aos talos produtores de ascomas ou basidiomas) e nem sequer devem ser 
coletados se pertencerem a formas crostosas, pois na imensa maioria dos casos não poderão 
ser identificados. 
 O Código Internacional de Nomenclatura Botânica permite a aplicação de nomes 
diferentes para os estádios teleomorfo (produtor de ascomas, também chamado de estado 
perfeito) e anamorfo (produtor apenas de conídios) de uma mesma espécie de fungo. 
Entretanto, esse procedimento NÃO É PERMITIDO PARA OS FUNGOS LIQUENIZADOS, para os 
quais se aceita apenas um nome. 
 Normalmente, um mesmo talo pode produzir tanto conidiomas quanto ascomas. 
 
Reprodução sexuada dos ascomicetos liquênicos 
 
 Nos próximos parágrafos serão abordados apenas alguns aspectos de reprodução 
sexuada do fungo, essenciais ao entendimento das estruturas de importância taxonômica dos 
ascomicetos liquênicos. O processo é obviamente idêntico ao da maioria dos ascomicetos não 
liquênicos. Aliás, a maior parte do que se ensina a respeito da reprodução dos ascomicetos 
provém de estudos realizados em fungos liquenizados, fato normalmente omitido na literatura. 
 Todos os ascomicetos liquênicos de reprodução sexuada já estudada produzem um 
órgão feminino, o ascogônio, constituído por um conjunto de hifas enoveladas no interior do 
talo haplóide, do qual emerge uma hifa denominada tricógine, cujo ápice se projeta para fora 
do talo a fim de receber a célula masculina. 
 A célula masculina, um conídio, adere à tricógine. Ocorre, então, a plasmogamia, e o 
núcleo masculino migra pela tricógine, passando de célula para célula até o interior do 
ascogônio, onde se pareia, sem se fundir, ao núcleo da célula feminina, formando o dicário. A 
partir daí se inicia o processo típico de divisão do dicário dos fungos superiores, sendo que a 
cada divisão, uma célula especial, o asco, é produzida. 
 O asco é uma célula que cresce muito, assumindo uma forma que vai de esférico a 
clavado ou cilíndrico (de acordo com o grupo taxonômico do fungo), dentro da qual a 
cariogamia finalmente ocorre (final de fecundação) para formar um núcleo diplóide (um 
zigoto), que imediatamente sofre uma divisão meiótica seguida por uma mitose e originando, 
conseqüentemente, oito núcleos. Cada núcleo tem delimitada em torno de si uma parede 
celular, originando, então, oito ascosporos, cada um tendo a potencialidade de originar novo 
micélio. 
 Logo após a chegada do núcleo masculino ao interior do ascogônio, as hifas unicarióticas 
do micélio ao redor começam a se organizar para formar o ascoma. Os ascos ocupam, no 
ascoma, uma camada diferenciada denominada himênio. A parte geradora de ascos do ascoma, 
que é derivada do dicário inicial, pode produzir muitos ascos, funcionar por muitos anos e se 
localiza imediatamente abaixo do himênio, sendo chamada sub-himênio. 
Entre os fungos liquênicos que apresentam reprodução sexuada, são poucos os que não 
produzem ascomas. Nesses casos, como no gênero Cryptothecia, os ascos são produzidos 
 
 
26 
 
dispersos por toda a superfícies do talo, ou então simplesmente agrupados em certas regiões, 
que aparecem como pequenas manchas, o que se considera característica extremamente 
primitiva. 
 Entretanto, na grande maioria dos casos, os ascos surgem dentro de estruturas que 
variam de simples agregações de ascos dotadas de poucas hifas acessórias (e.g., Arthoniales), 
até bastante complexas, com um himênio bem estruturado e várias partes diferenciadas (fig. 
20). Entretanto, qualquer que seja sua complexidade, essas estruturas se constituem numa 
agregação de tecidos e grupos de hifas especialmente desenvolvidos para agregar os ascos: são 
os ascomas, anteriormente chamados de ascocarpos ou corpos de frutificação. 
Figura 20 - Corte diametral de apotécio de Haematomma sp. Neste ascoma em forma de disco, o himênio incolor é 
coberto por um epitécio avermelhado e repousa sobre um subhimênio (camada geradora de ascos) incolor, que se 
liga ao talo por um estipe central de que participam células da casca de árvore (marrons claras), e é ladeado por 
uma margem verde escura em que estão incluídas células de fotobiontes (margem talina). Entre a margem e a 
estipe pode ser observada a deposição de cristais característicos. 
 
Ascomas 
 
 Existem vários tipos diferentes de ascomas, que normalmente são descritos nos livros 
textos relativos aos ascomicetos: apotécio, peritécio (fig. 24) e cleistotécio. Cleistotécios não 
aparecem em fungos liquenizados. Entretanto, os fungos liquenizados apresentam vários 
outros tipos de ascomas, que normalmente não são mencionados nem de passagem naqueles 
mesmos textos, o que demonstra a flagrante distância que ainda existe entre os especialistas 
em ascomicetos liquenizados e não liquenizados. Entre eles estão o mazédio (ordem Caliciales, 
com espécies liquenizadas e não liquenizadas, mas tradicionalmente estudada por 
liquenólogos), a lirela (ordem Graphidales, fig. 25), a pseudolirela (ordem Opegraphales), que 
aparecem em grandes grupos de fungos, e são tão importantes quanto os outros ascomas. 
 Os ascomas podem ser constituídos apenas por estruturas fúngicas ou, dependendo do 
gênero ou espécie, contar também com a participação dos fotobiontes do talo liquênico. 
 É comum que certos tipos de ascoma apresentem, ao redor de sua estrutura, em vista 
superficial e/ou em corte anatômico, uma margem denominada excípulo. Quando essa 
margem é constituída apenas pelas hifas do fungo ela é dita margem própria, e quando é 
constituída por ambos, fungo e fotobionte, é denominada margem talina (Figs. 21, 22 e 23). 
Determinada espécie pode apresentar uma ou ambas dessas margens, que normalmente 
 
 
27 
 
permanecem durante toda a existência do ascoma. A margem talina é sempre externa em 
relação à própria. Entretanto, em algumas espécies de certos gêneros (por exemplo Pyxine, que 
produz apotécios), o ascoma pode apresentar as duas margens quando jovem, e perder a 
margem talina durante seu desenvolvimento. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 22 - Apotécios 
lecanorinos de Tephromela sp., 
onde pode ser observada a 
margem talina contornando o 
disco (o epitécio visto de cima), 
que neste gênero é sempre 
negro. 
 
 
 
 
 
Figura 23 - Nos apotécios 
lecideinos não existe 
margem talina, como por 
ser verificado nesta 
Pyrrhospora russula, 
espécie de fungo 
liquenizado muito 
abundante no Brasil. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 24 - Peritécios negros 
em Strigula sp.; este é um 
gênero epífilo cujos 
exemplares 
caracteristicamente se 
desenvolvem entre a cutícula 
e a epiderme das folhas sem, 
entretanto, serem parasitas. 
 
 
 
28 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 25 - As lirelas 
negras e sinuosas de 
Graphis pavoniana. O 
nome do gênero faz 
alusão ao fato de que 
os ascomas lembram 
um tipo de escrita. 
 
 
 
 
 
 Quando um apotécio possui apenas a margem própria ele é genericamente chamado de 
lecideíno (do gênero Lecidea, que possui apotécios desse tipo) em muitos textos e chaves de 
identificação. Entretanto, muitos textos fazem a distinção entre aqueles cuja margem é de 
textura macia, normalmente clara e constituída por um paraplectênquima (tipo biatorino) e 
aqueles que apresentam margem mais rígida, normalmente negra, de constituiçãoprosoplectenquimática (tipo lecideíno senso stricto). 
 O apotécio que possui margem talina é genericamente denominado lecanorino (a partir 
de Lecanora), mas também apresenta dois subtipos: o zeorino, que apresenta tanto a margem 
própria quanto a talina, o e lecanorino senso stricto, em que a margem própria é ausente ou 
vestigial. 
Note-se que, embora outros tipos de ascoma possam também possuir ou não uma 
cobertura talina, os termos lecideíno e lecanorino são reservados apenas para os apotécios. 
 
Ascosporos 
 
 Em alguns casos, mitoses suplementares ou “aborto” no desenvolvimento podem 
provocar a variação do número oito básico para desde um até centenas de ascosporos dentro 
de um asco, mas isso não ocorre casualmente, é característica de famílias (e.g., 
Acarosporaceae) ou espécies. 
Os ascosporos variam de forma desde esféricos até filiformes, passando por um grande 
número de formas intermediárias características de famílias, gêneros e espécies. 
O tamanho dos ascosporos é uma característica específica de grande importância, e 
cada espécie apresenta uma faixa de variação bastante típica. Os ascosporos variam desde 1-2 
até mais de 100 µm, e neste caso podem ser visto a olho nu com alguma dificuldade e na lupa 
com facilidade. Entretanto, os esporos da maioria das espécies varia entre 5 e 50 µm. 
 
 
 
29 
 
SUBSTRATO 
MEDULA 
CAMADA DE ALGAS 
Asco (com 
esporos) 
PARÁFISES 
MARGEM 
PRÓPRIA 
HIMÊNIO 
ESTIPE 
SUBHIMÊNIO 
DISCO: EPITÉCIO VISTO 
DE CIMA 
EPITÉCIO 
MARGEM 
TALINA 
HIPOTÉCIO 
APOTÉCIO 
LECIDEINO 
SENSO LATO 
APOTÉCIO 
LECANORINO 
SENSO LATO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 21 - Partes dos apotécios lecideíno e lecanorino. Nesta figura se encontram os termos mais comuns da 
morfologia e anatomia dos apotécios, normalmente utilizados nas chaves de identificação; alguns deles não são 
mencionados no texto e devem ser procurados no Glossário. 
 
 
Por definição, esporos são células de reprodução assexuada e, portanto, são 
obrigatoriamente unicelulares. Entretanto, nos fungos liquênicos, as células formadas dentro 
dos ascos costumam sofrer divisões antes de sua liberação no ambiente e, por tradição 
micológica, essas estruturas ainda são chamadas de esporos (o mesmo fato ocorre com certos 
conídios). Esse comportamento corresponde à liberação de um talo em início de 
desenvolvimento. Quando no ambiente, as várias células germinam independentemente, 
emitindo hifas em várias direções, aumentando assim a probabilidade de encontrar células do 
fotobionte adequado. 
 Entretanto, as divisões sofridas dentro do asco não são aleatórias; elas são altamente 
específicas de acordo com a espécie do fungo. Assim, os ditos ascosporos dos ascomicetes 
podem ser unicelulares, bicelulares, e multicelulares, com números de células que podem 
chegar às dezenas. Em geral, ascosporos com poucas células apresentam um número fixo delas 
para a espécie ou gênero, enquanto que os esporos com mais células apresentam uma certa 
variação dentro de um mesmo indivíduo; mas essa variação é fixa e característica para a 
espécie. 
 Ascosporos de certos grupos taxonômicos podem apresentar durante o seu 
desenvolvimento, divisões longitudinais das células, após a ocorrência das transversais. Como 
isso termina por gerar um tecido a partir de uma única célula, a estrutura resultante (o esporo) 
é um parênquima verdadeiro. Devido à aparência de “parede de tijolos” que apresentam, 
 
 
30 
 
esporos desse tipo são denominados muriformes e se constituem no único caso de parênquima 
verdadeiro existente em fungos. 
Na ordem Teloschistales ocorrem esporos transversalmente septados, bi ou 
tetracelulares cujas paredes intercelulares são muito mais espessas que as laterais. Essas 
paredes podem, segundo a espécie, ser tão espessas que os lumens celulares ficam reduzidos a 
pequenos pontos nos pólos do ascosporo. Essas células são sempre ligadas por um canal fino 
mas bem visível ao microscópio. Esse tipo de esporo recebe o nome de polarilocular. 
 Um pouco parecidos aos polariloculares (e assim tratados na literatura antiga) são os 
esporos miscoblastiomórficos, comuns na família Pyxinaceae, que também possuem duas ou 
quatro células que parecem ligadas por um canal. Mas neste tipo de ascosporo, o canal entre as 
células é sempre de forma bastante irregular e curto e as paredes laterais são muito espessas. 
 A forma das células dos esporos é extremamente importante na taxonomia, e passo 
importante na identificação dos gêneros. As células podem ser de tendência geral arredondada 
ou serem angulares, mas variam bastante de acordo com o gênero e espécie. 
 
Os Grupos de ascomicetos liquenizados brasileiros 
 
O esquema abaixo foi baseado principalmente em Tehler (veja em Nash III 1996, 
p. 217-239), que por sua vez utilizou o esquema de ordens proposto por Haffelner em 1993 e 
de famílias e gêneros proposto por Eriksson e Hawksworth em 1991 e 1993; o esquema foi 
simplificado por Tehler por motivos didáticos, e por essa razão também é utilizado aqui. Muitos 
dados foram retirados do Dictyonary of Fungi (8ª edição). São mencionados apenas os gêneros 
presentes no Brasil. Essa apresentação tem a única finalidade de expor os grupos de liquens 
brasileiros de uma forma organizada, e os dados mostrados não poderão ser utilizados com 
finalidade de identificação, que é um procedimento muito mais complexo e que exige muito 
maior número de detalhes. 
Encontra-se na Internet uma Checklist para os 3200 nomes (ca. 2800 espécies) de 
fungos liquenizados mencionados para o Brasil (Marcelli 2002). 
 
FUNGOS QUITINOSOS 
 
SUBDIVISÃO DICARIOMYCOTINA 
 
CLASSE ASCOMYCETES 
 
SUBCLASSE EUASCOMYCETIDAE 
 
 
ASCOHIMENIAIS PROTOTUNICADOS [grupo artificial reconhecido pela presença de ascos 
unitunicados evanescentes e a presença de paráfises] 
 
ORDEM "CALICIALES" 
Esta é uma ordem artificialmente montada e utilizada por muitos autores apenas 
pela facilidade de reconhecimento dos componentes de seu grupo, todos eles 
portadores de ascoma do tipo mazédio, em que as paráfises e ascos transformam-se 
numa massa pulverulenta quando os ascosporos estão maduros. Segundo Leif Tibell, o 
maior especialista no grupo, este tipo de ascoma apareceu independentemente um 
muitos grupos bastante distintos de ascomicetes. Ela é composta sete famílias, 31 
gêneros e cerca de 202 espécies. O talo varia de crostoso a fruticoso, o fotobionte é 
 
 
31 
 
sempre uma clorofícea (na maior parte das vezes unicelular), e algumas espécies não são 
liquenizadas. Os ascosporos são comumente septados e ornamentados. 
Gêneros conhecidos no Brasil: Calicium, Chaenotheca, Heterocyphelium, 
Sphaerophorus, Pyrgidium, Pyrgillus, Tylophorella, Tylophoron. 
 
 
ORDEM LICHINALES 
 Talo crostoso, folioso, subfruticoso ou filamentoso, com aparência caracteristicamente 
gelatinosa. Ascoma lecanorino ou lecideino, às vezes com aparência de peritécios. Os 
esporos, geralmente hialinos e unicelulares, são libertados pela desintegração do asco e 
passivamente dispersos. O fotobionte é sempre uma cianobactéria e todas as espécies 
são liquenizadas. Existem na ordem três famílias, 44 gêneros e 281 espécies. 
Gêneros conhecidos no Brasil: Calotrichopsis, Ephebe, Heppia, Lempholemma, 
Lichinella, Neoheppia, Peccania, Phylliscidium, Pterygiopsis, Pyrenopsis. 
 
 
 
 
ASCOHIMENIAIS UNITUNICADOS [grupo artificial reconhecido pela presença de ascos 
unitunicados com aparelho apical poriforme e hamatécio com paráfises] 
 
 
ORDEM OSTROPALES (incluindo GRAPHIDALES) 
 
Talo crostoso. O ascoma pode ser lireliforme ou circular (não apotécio), muitas 
vezes imerso no talo e poriformes (aparência de peritécio, mas o ostíolo pode ser visível 
a olho nu). Os esporos, hialinos ou marrons, variam

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