Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 Evolução histórica do direito processual brasileiro Dispunham as Ordenações Afonsinas, de forma quase completa, sobre a administração pública. O processo civil foi regulado em seu livro III, composto por 128 capítulos, abrangendo os procedimentos de cognição, execução, bem como os recursos. A partir das Ordenações Manuelinas, promulgadas em 1521, poucas mudanças puderam ser verificadas em relação às Ordenações Afonsinas, tendo em vista que ambos os diplomas procuravam garantir o fortalecimento do Poder Real bem como os interesses da Nobreza. No entanto, a análise das Ordenações Manuelinas demonstra que não havia separação entre os processos de conhecimento e de execução (cf. SILVA GOMES, 1997, p. 28). Em 1603, foram promulgadas pelo rei de Portugal as Ordenações Filipinas, que permaneceram em vigor mesmo após a independência brasileira. De grande importância para o direito brasileiro e com uma estrutura bastante moderna, as Ordenações Filipinas eram compostas por 5 livros, dentre os quais o terceiro tratava da parte processual civil. Apesar da vigência das Ordenações Filipinas, o Brasil também era regido, nessa época, pelas Cartas dos donatários, dos governadores e ouvidores e, ainda, pelo poder dos senhores de engenho, que faziam sua própria justiça ou influenciavam a Justiça oficial, ora pelo prestígio que ostentavam, ora pelo parentesco com os magistrados. Foram sucedidas pela Lei de 18 de agosto de 1769. Com a proclamação da independência em 7 de setembro de 1822, tornou-se necessária uma reestruturação da ordem jurídica interna. O que foi alcançado por meio da Carta Constitucional de 1824, com a introdução em nosso ordenamento de 2 inovações e princípios fundamentais, principalmente no campo criminal, em que a necessidade de mudanças se fazia mais evidente, tais como a abolição da tortura e de todas as penas cruéis. Por outro lado, verificou-se a consagração da divisão dos poderes e o estabelecimento da harmonia destes com o Poder Moderador, buscando garantir os direitos ditados pela Carta Magna, assim como a composição e a independência do Poder Judiciário. Estipulou-se, ainda, a necessidade e a obrigatoriedade de um juízo conciliatório prévio. Todavia, apesar da nova ordem constitucional que surgiu nesse momento, as Ordenações Filipinas e demais normas jurídicas de origem portuguesa não perderam vigência. O Decreto de 20 de outubro de 1823, adotando-as como lei brasileira, determinou que só seriam revogadas as disposições contrárias à soberania nacional e ao regime brasileiro. Vamos relembrar os arts. 161 e 162 da Constituição do Império? Eles estabeleciam, respectivamente, a tentativa prévia de conciliação como pressuposto de constituição válida do processo e a atribuição de competência ao juiz de paz para tentar promovê-la. “Art. 161. Sem se fazer constar, que se tem intentado o meio da reconciliação, não se começará Processo algum. Art. 162. Para este fim haverá juízes de Paz, os quais serão eletivos pelo mesmo tempo, e maneira, por que se elegem os Vereadores das Câmaras. Suas atribuições, e Distritos serão regulados por Lei.” Saiba Mais 3 Assim, atendendo às exigências da Carta Constitucional, no campo processual penal, tivemos a promulgação do Código de Processo Criminal em 1832. Rompendo com a tradição portuguesa, inspirou-se nos modelos inglês (acusatório) e francês (inquisitório), fornecendo ao legislador brasileiro elementos para a elaboração de um sistema processual penal misto. Além disso, o novo Código também trazia, em um título único composto por 27 artigos, a “disposição provisória acerca da administração da Justiça civil”, simplificando o processo civil ainda regulado pelas Ordenações Filipinas. Em 3 de dezembro de 1841, no entanto, entrou em vigor a Lei n. 261, posteriormente regulamentada na parte processual civil pelo Decreto n. 143, de 15 de março de 1842. Ela modificou a disposição provisória do Código de Processo Criminal através do cancelamento de algumas reformas. Em 1850, logo após a edição do Código Comercial, entraram em vigor os Regulamentos n. 737 (considerado o primeiro diploma processual brasileiro) e 738, que disciplinavam, respectivamente, o processo das causas comerciais e o funcionamento dos tribunais e juízes do comércio. O direito processual civil, contudo, permaneceu regulado pelas disposições das Ordenações e suas posteriores modificações. Isso levou o governo a promover, em 1876, uma Consolidação das Leis do Processo Civil, com força de lei, que ficou conhecida como Consolidação Ribas, em virtude de sua elaboração a cargo do Conselheiro Antônio Joaquim Ribas. Proclamada a República, o Regulamento 737 foi estendido às causas cíveis, mantendo-se a aplicação das Ordenações e suas modificações aos casos de jurisdição voluntária e de processos especiais. Após o advento da Constituição de 1891, no entanto, conferiu-se aos Estados a 4 possibilidade de legislar sobre matéria processual, aumentando o espectro de competência antes pertencente somente à União Federal, após o que várias leis foram promulgadas, regulamentando as mais diversas questões processuais. Em 1º de janeiro de 1916, foi editado o Código Civil Brasileiro, tratando não só das questões de direito material, mas também de algumas processuais. No Rio de Janeiro, então Distrito Federal, veio à luz o Código Judiciário de 1919, promulgado pela Lei n. 1.580, de 20 de janeiro, seguido pelo Código de Processo Civil do Distrito Federal, de 31 de dezembro de 1924, e devidamente promulgado pelo Decreto n. 16.751. Finalmente, a Carta de 1934 consagrou a unificação processual, atribuindo novamente a competência para legislar em matéria processual exclusivamente à União, o que foi mantido pela Constituição de 1937, em seu art. 16, XVI, possibilitando, assim, a edição do Código Brasileiro de Processo Civil, através do Decreto n. 1.608, de 18 de setembro de 1939. Todas as Constituições que se seguiram mantiveram essa unificação, inclusive a de 1988, de acordo com seu art. 22, I. Todavia, nossa atual Constituição, no art. 24, X e XI, estabelece a competência concorrente da União, Estados e Distrito Federal para legislar sobre “criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas” e “procedimentos em matéria processual”, criando, assim, duas exceções à regra geral do art. 22, I. Saiba Mais 5 A unificação processual se justificava pela necessidade de uma normatização uniforme ante o grande número de leis existentes em cada Estado. Há muito, elas se faziam obsoletas e incapazes de satisfazer o objetivo primordial do processo civil, qual seja, o de tutelar efetivamente os direitos dos particulares. Não obstante, o art. 1º do Código deixou à apreciação de lei especial a regulamentação de algumas matérias específicas, tais como as desapropriações, as ações trabalhistas e os litígios entre empregados e empregadores. O Código de 1939 teve o mérito de se inspirar nas mais modernas doutrinas europeias da época. E introduziu importantes inovações em nosso ordenamento processual, como o princípio da oralidade e a combinação do princípio dispositivo e do princípio do juiz ativo, permitindo uma maior agilidade nos procedimentos. O diploma era composto por 1.052 artigos, dispostos em dez livros; foi modificado por diversasleis extravagantes e se manteve em vigor até o último dia do ano de 1973.
Compartilhar