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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA - UFBA FACULDADE DE DIREITO Ábila Bomfim Abu Tahum Pesquisar empiricamente o direito – Capítulo 6 Uma introdução à pesquisa documental SALVADOR 2018 ÁBILA BOMFIM ABU TAHUM Pesquisar empiricamente o direito – Capítulo 6 Fichamento apresentado à disciplina Metodologia da Pesquisa em Direito (DIRA75), do curso de Direito da UFBA – Universidade Federal da Bahia, como parte das avaliações para conclusão da disciplina. Orientadora: Sara Côrtes SALVADOR 2018 UMA INTRODUÇÃO À PESQUISA DOCUMENTAL Andréa Depieri de A. Reginato Maíra Rocha (Org.). Pesquisar empiricamente o direito. São Paulo: Rede de Estudos Empíricos em Direito, 2017. 428 p. Andréa Depieri de Almeida Reginato é professora do departamento de direito da UFS (Universidade Federal de Sergipe), além de professora colaboradora da Escola Judicial e coordenadora Adjunta do Instituto de Ciências Criminais (IBCCrim) de Sergipe. Possui graduação em Direito pela Universidade de São Paulo (1992), mestrado em Direito pela Universidade Federal do Ceará (2001) e doutorado em sociologia pela Universidade Federal de Sergipe (2014). Atuou como pesquisadora em seu estágio doutoral na University of Ottawa (2009-2011) e atuou na Comissão de Direitos Humanos da UFS. É membro do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Cidadania Exclusão e Direitos Humanos – GEPEC, desde 2000. Coordenou a revisão do status legal de adolescentes privados de liberdade em projeto de pesquisa e extensão, realizado em parceria com o Unicef. Recebeu título de Reconhecimento do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente e Título de Cidadã Sergipana pela Assembleia Legislativa. Foi nomeada para atuar como membro da Comissão da Verdade do estado de Sergipe. Tem experiência na área de direito com ênfase em criminologia, direito criminal, direitos humanos, direitos da criança e do adolescente e teoria geral do direito. O capítulo tem como finalidade debater, pontualmente, a conceituação de documento, bem como sobre o desenvolvimento de perspectivas teóricas para a pesquisa de cunho documental, mais especificamente direcionada ao campo do Direito. Suas principais obras de referência são pleiteadas por autores que discorrem diretamente sobre os documentos e seus métodos de pesquisa e validação, tal como defendem sua cientificidade, caracterizando-os como um campo de pesquisa que requer tratamento teórico especifico, em razão da sua distinção sobre outras fontes. [...] de uma forma geral, escassa é a literatura que trata da pesquisa documental em uma perspectiva teórica. Prior (2003, p.IX-X) levanta por hipótese que a falta de estudos científicos que destaquem métodos sistemáticos e rigorosos para lidar com documentos decorre do fato de que as pesquisas qualitativas e seu sofisticado aparato metodológico desenvolveram-se principalmente a partir de culturas orais, em sociedades não letradas, fazendo com que os registros escritos fossem relegados a um segundo plano, marginal e subsidiário. [2017, p. 192]. “Quanto mais o pesquisador tenha domínio do contexto particular das condições de produção de um determinado documento (Cellard, 2008, p.302), mais lhe será possível compreender a dinâmica e o sentido do documento sob sua análise.” (p.194) [...]Documentos são artefatos cuja principal característica é o registro intencional de um texto. O desenvolvimento da internet e do e-mail oportunizaram o surgimento de documentos virtuais, colocando na ordem do dia a necessidade de se pensar as implicações desse tipo de fonte na pesquisa documental. [2017, p.194]. “Atualmente, consideramos como documentos não apenas os registros escritos, manuscritos ou impressos em papel, mas toda a produção cultural consubstanciada em alguma forma material.” (p. 194/195) “Há diferentes classificações possíveis para pensar documentos. Normalmente as classificações giram em torno das seguintes categorias básicas: documentos públicos e documentos privados.” (p. 195) “Documentos públicos são tipicamente aqueles que foram publicados, apresentados publicamente ou ainda aqueles organizados e classificados em arquivos públicos e sobre os quais geralmente recai, observadas regras específicas, o dever de publicidade.” (p.195) “Os documentos privados, por sua vez, podem estar relacionados a uma organização de natureza jurídica privada e por essa razão estarem ordenados e classificados também em arquivos.” (p. 195/196) “Outra classificação importante é aquela que distingue um documento como sendo uma “fonte primária” ou uma “fonte secundária””. (p. 196) “São consideradas fontes primárias as evidências básicas, cruas e imperfeitas, produzidas temporalmente dentro do contexto estudado, normalmente fragmentadas e de difícil uso, mais significativas para o historiador do que para o público em geral.” (p. 196) “As fontes secundárias, por outro lado, seriam produzidas em um momento posterior e corresponderiam à produção dos historiadores, como dissertações, artigos e livros.” (p. 196) [...]Na elaboração de uma pesquisa que mobilize documentos é esperado que o pesquisador adote uma postura completamente diferente daquela que adota quando lê o seu jornal todos os dias. Igualmente, mobilizar um documento para uma pesquisa empírica em direito não é a mesma coisa do que selecionar oportunamente a jurisprudência mais adequada como argumento de autoridade para uma determinada peça processual. [2017, p. 200]. “O que distingue a posição do pesquisador das demais pessoas na condução das suas atividades diárias é que o pesquisador sabe que os dados são constituídos a partir de objetivos definidos, científica e teoricamente.” (p. 200) [...] Para Scott (1990, p.6) verificar a qualidade da evidência é fundamental em qualquer pesquisa social. Partindo dessa constatação ele propõe um conjunto de critérios, traduzidos em perguntas, que podem ser utilizados para a avaliação de quaisquer evidências, incluindo os documentos. São eles: a. Autenticidade: a evidência é genuína e sua origem inquestionável? b. Credibilidade: a evidência está livre de erros e distorções? c. Representatividade: trata-se de uma evidência típica da sua espécie e, se não, a extensão da sua atipicidade é conhecida? d. Sentido: a evidência é claramente compreensível? (Scott,1990, p.6, tradução da autora) [2017, p. 200]. “Evidentemente que, quanto maior o acúmulo teórico do pesquisador, maior sua capacidade de avaliar a autenticidade, credibilidade, representatividade e sentido de um documento.” (p. 207) [...] Por essa razão, McCullogh (2004, p. 39-41), além desses quatro critérios, destaca um quinto, a teorização. No seu entender é fundamental para análise documental a existência de alguma base teórica antecipada, um quadro de referência teórica que permita ao pesquisador, de antemão, interpretar o material. Sem um mínimo de teorização o sentido de um documento pode não ser minimamente compreendido, mas mais que isso, problemas relativos à sua autenticidade, credibilidade e representatividade podem ser invisibilizados. [2017, p.207] [...] Como o objetivo deste texto é avançar nas discussões acerca dos problemas e dificuldades concernentes à utilização de documentos como fonte para a pesquisa empírica em Direito, entendo importante apresentar também as discussões em torno do uso contemporâneo da chamada análise Diplomática. [2017. p.208]. “A Diplomática, bem como a paleografia e a sigilografia nasceram da necessidade de se distinguircriticamente documentos autênticos daqueles suspeitos de falsificação.” (p. 208/209) [...] A Diplomática se desenvolveu especialmente a partir da análise de documentos administrativos e jurídicos, documentos de arquivo, resultantes de atividades administrativas práticas, não se aplicando adequadamente aos documentos de ordem pessoal, como cartas ou diários. Essa identidade entre documentos de arquivo e documentos diplomáticos é estabelecida em 1991, por Baltier, que define como novo objeto da crítica diplomática todas as peças de arquivo (Tognolli e Guimarães, 2009, p. 28). [2017, p. 210]. “Os três requisitos fundamentais para um estudo diplomático são “as circunstâncias da escrita, a natureza jurídica do fato comunicado e a forma da compilação” (p. 210) [...]Para a Diplomática a forma do documento é definida por um conjunto de regras de representação utilizadas na transmissão de uma mensagem. A forma de um documento é tanto física quanto intelectual. A primeira se refere aos aspectos externos do documento e os elementos identificados a partir deste critério são chamados de elementos extrínsecos do documento, enquanto a segunda diz respeito à articulação interna desse mesmo documento e os elementos dessa natureza são chamados de elementos internos ou intrínsecos da forma documental (Duranti, 1991, p. 6) [2017, p.210/211]. “A autenticidade da documentação obtida através de meios virtuais como a internet ou correio eletrônico é uma grande questão para a pesquisa científica, por razões óbvias. Em uma rede alimentada por todos é possível criar e falsificar informações e documentos” (p. 215) “A preocupação relativa à certificação, autenticação e preservação dos documentos digitais deu origem à International Research on Permanent Autentic Records, conhecida como Projeto InterPARES”. (p. 216) “No curso do Projeto ficou claro aos pesquisadores que nem mesmo soluções a longo prazo para a preservação de registros administrativos e legais serão suficientes para garantir a autenticidade dos registros”. (p. 216) [...] A questão da autenticidade, confiabilidade e permanência dos documentos assentados em meio digital ainda não está pacificada, todavia, do ponto de vista acadêmico, os documentos captados virtualmente são aceitos como fonte válida de pesquisa. A internet disponibiliza, facilmente, fontes documentais de todos os tipos, mas reivindica alguns cuidados relativamente à checagem e à idoneidade fonte. [2016, p. 216]. “Em uma pesquisa documental questões éticas e jurídicas podem se constituir em uma dificuldade à parte. As principais questões jurídicas gravitam em torno dos direitos autorais, da liberdade de informação e da proteção dos dados sensíveis das pessoas.” (p. 222) “Aqui no Brasil, a lei de acesso à informação (Lei 12.527/2011) é um marco na disciplina das questões jurídicas afetas ao acesso a informações e documentos públicos. Sob a égide dessa lei, várias questões são de pronto resolvidas.” (p. 222) [...] A grande desvantagem da pesquisa documental reside no fato de que todo o trabalho de verificação quanto a autenticidade, credibilidade, representatividade e sentido do documento, ou ainda a análise dos seus elementos extrínsecos e intrínsecos para realização da crítica diplomática, podem não ser suficientes diante da complexidade de determinados problemas de pesquisa. Nesse sentido a coleta e seleção da fonte documental, que inclui checar sua procedência e tudo mais, passa a ser uma fase preliminar da pesquisa, que se desenvolverá a partir de um outro método de pesquisa escolhido para tratamento dos dados obtidos através dos documentos. [2017, p 222]. [O ensinamento de Andréa Depieri de A. Reginato , tal como dos outros autores citados no texto sobre a pesquisa documental em Direito é, sobretudo, um alerta quanto á percepção e a utilização dos documentos para os pesquisadores – sejam iniciantes ou especialistas – que devem ter em vista a forte importância desse método. As classificações e os critérios de autenticidade devem ser precisamente reiterados, a fim de garantir uma maior confiabilidade à pesquisa e aos seus resultados. A autora aborda uma lição pertinente para todos os métodos científicos: checar, detalhadamente, a confiabilidade das informações que são postas. Esse fato exige, à priori, um embasamento referencial, que imprescindivelmente deve ser aliado a lucidez de discernir a finalidade da fonte. O pesquisador necessita ser cautelosamente capaz de explorar, mas, sob nenhuma circunstância, produzir documentos em prol da confirmação dos seus interesses pessoais, configurados, acima de tudo, nos resultados almejados pelo proposito cientifico.]
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