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Peter Häberle. Os problemas da verdade

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p U T R O S L I V R O S DE NOSSA EDIÇÃO 
A M A R A L , Rafael Caiado (Advogado em Brasí l ia) 
^ Peter Hãberle e a Hermenêutica Const i tucional 
^ R A Ú J O , Cláud ia de R. M. (Profa. da U D F de Brasí l ia) 
• O Dire i to Const i tuc ional de Resistência 
^ A P P E L L E T T I , Mauro (Prof. da Univers. de Florença , Itália) 
^ O Controle Judic ia l de Constitucionalidade das Leis no D i r e i t o Comparado 
fcoNI, Luís Cláudio (Mestre em Direito) 
) A Internacionalização do Poder Constituinte 
£ U N H A , Paulo Ferreira da (Prof. da Faculdade de Direito do Porto - Portugal) 
^ Anti-Leviatã - D i r e i t o , Política e Sagrado 
p O D O Y ? Arnaldo Sampaio de Moraes (Doutor em Direito) 
• Direito Constitucional Comparado 
H Ã B E R L E , Peter (Prof. da Univers. de Augsburg - Alemanha) 
l Hermenêutica Consti tucional - a Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituição 
r í E S S E , Konrad (Prof. da Univers. de Freiburg. im Br.) 
} A Força Normat iva da Constituição 
• Elementos de Dire i to Constitucional da República Federal da Alemanha 
LOPES, Ana Maria D ' A v i l a (Dr. em Direito pela Univers. Federal de M G ) 
• Os Direitos Fundamentais como Limites ao Poder de Legis lar 
> 
MATTOS, Patr ícia Castro (Advogada em 3ras í l i a ) 
• As Visões de Weber e H a b e r m a s sobre Política e D i r e i t o 
^ A D I L H A , Norma Sueli (Doutora em Direito) 
I Colisão de Direitos M e t a i n d i v i d u a i s e Decisão Judic ia l 
ROTHENBURG, W. Claudius «'Procurador da Repúbl ica) 
• Princípios Consti tucionais 
SANTOS, Mar í l ia Lourido dos (Mestre em Direito e Magistrada) 
• Interpretação Const i tucional no Controle das Políticas Públicas 
SCHERZBERG, Arno (Prof. da Univers. de Erfurt/Alemanha) 
• Para Onde e de que F o r m a vai o Dire i to Público? 
SOUZA, Lu iz Eduardo de (Prof. da Univers. Federal do Pará) 
O Direi to à L i b e r d a d e : os Sentidos Positivos e Negativos 
ISBN 978-857525-462-2 
TEIXEIRA, Anderson Vichinkeski (Doutor em Filosofia do Direito) 
Estado de Nações - Hobbes e as Re lações Internacionais no Século X X I 
PETER HÄBERLE 
OS PROBLEMAS DA VERDADE 
NO ESTADO CONSTITUCIONAL 
Tradução de 
Urbano Carvelli 
1 
Sergio Antonio Fabris Editor 
OS PROBLEMAS DA VERDADE 
NO ESTADO CONSTITUCIONAL 
'Wahrheitsprobleme im 
Verfassungsstaat 
PETER HÄßERLE 
Prof. Dr. Dr. h.c. mulL 
Diretor do Instituto de Direito Europeu e 
Cultura Jurídica da Universidade de Bayreuth 
Diretor do Centro de Pesquisas para o Direito Constitucional 
Europeu da Universidade de Bayreuth 
OS PROBLEMAS DA VERDADE 
NO ESTADO CONSTITUCIONAL 
Wahrheitsprobleme im 
Verfassungsstaat 
Tradução: 
Urbano Carvelli 
Professor na Faculdade de Direito da 
Universidade de Colônia - Alemanha 
Sergio Antonio Fabris Editor 
Porto Alegre/2008 
©, 1995 Nomos Verlagsgesellschaft mbH &: Co. KG 
©, 2008 Peter Hãberle, Apêndice 
©, Sergio Antonio Fabris, da tradução e publicação, em língua portuguesa 
Título original: Wahrheitsprobleme im Verfassungsstaat 
Editoração Eletrônica: Formato Artes Gráficas 
CNPJ: 73.390.007/1000-30 
H I I 4 p Hãberle, Peter 
Os problemas da verdade no estado constitucional / Peter 
Hãberle; tradução: Urbano Carveili. - Porto Alegre : Sergio Antonio 
Fabris Ed. , 2008. 
142p. ; 15,5x22 cm. 
Tradução de: Wahrheitsprobleme im Verfassungsstaat. 
I S B N 978-857525-462-2 
1. Filosofia do Direito. 2. Teoria do Estado. 3. Direito Constitu-
cional. I. Título. 
C D U - 3 4 0 . 1 2 
Bibliotecária Responsável: Inês P.-.terle, CRB-10/631. 
Reservados todos os direitos de publicação, total ou parcial, a 
SERGIO ANTONIO FABRIS EDITOR 
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SUMÁRIO 
Prefácio à edição brasileira ... 
Prefácio à edição alemã de 1994 
Prólogo do tradutor 
Vida e obra de Peter Hãberle 
Abreviaturas alemãs . 
Equivalência das abreviaturas alemãs \ 
P r i m e i r a p a r t e 
P r o b l e m a , questões iniciais 
I. Atualidade 
I I . Primeiras indagações às teorias da verdade 
Segunda p a r t e 
Elementos de u m a aval iação 
I. O problema da verdade sob a ótica de textos jurídicos 
1. Textos constitucionais ... 
2. Textos da legislação ordinária ............. 
Excurso I: O Codex Iuris Canonici (1983) e a encíclica 
«veritatis splendor» (1993) Í238S 1 
Excurso I I : Direito Internacional (particularmente Hugo Grotius 
e a positivação de seus textos clássicos) ... 
) 
I I . O problema da verdade sob a ótica de textos clássicos 
) das ciências e das artes (uma seleção) „ 56 
j 1. Václav Havei 56 
2. Outros textos clássicos 58 
l 3. Poetas, pintores e músicos ! 69 
j 4. Em particular: sentenças de J. W. von Goethe a respeito 
do conceito da «verdade» 79 
\ 5. Em particular: aspectos da verdade («truth») na 
) obra de William Shakespeare 85 
Incurso I: O problema da verdade sobre a ótica da discussão 
V e da análise do passado na Alemanha Oriental) . 92 
) Incurso I I : Os novos caminhos e procedimentos da Europa 
: do Leste na questão da busca pluralista e aberta da verdade 99 
\ Terceira parte 
j Considerações-teórico-constitucionais 
} I. Princípios, vias e procedimentos do Estado constitucional 
como fórum para o pluralismo de idéias 105 
)- 1. Considerações gerais 105 
(; 2. As três liberdades culturais fundamentais 108 
3. As questões da verdade numa democracia pluralista 113 
DL A proibição constitucional da mentira 118 
1. Considerações gerais \\% 
2. Ficções jurídicas........ , 121 
m. Verdade como «conceito conexo» à liberdade, à eqüidade 
e ao bem comum no Estado Constitucional 123 
1. Considerações gerais . _ 123 
2. O debate «autônomo» sobre a verdade dos juristas '. 125 
Apêndice - Continuação do ano de 2001 
Os problemas da verdade no Estado constitucional - um balanço .... 129 
PREFÁCIO À 
EDIÇÃO BRASILEIRA 
I 
« 
Esse prefácio deve ser iniciado com uma dupla palavra de agra-
decimento - uma no sentido especial e outra no sentido geral. 
O agradecimento especial é endereçado a Editora Fabris e ao seu 
diretor Sergio Antonio Fabris pela iniciativa de publicação do livro 
"Wahrheitsprobleme im Verfassungsstaaf (1995 / 2001) na língua 
portuguesa - aliás, a mesma editora já publicou uma excelente tradu-
ção da obra "Offenen Gesellschaft der Verfassungsint°.rpreten" com o 
título "Hermenêutica Constitucional" realizada pelo Prof. Dr. Gilmar 
Ferreira Mendes (Brasília) no ano de 1997 e íepublicada no ano de 
2002. Além disso, o agradecimento também é devido ao já versado e 
meticuloso tradutor desta obra: Prof. Urbano Carvelli (Colônia), mes-
tre e doutorando em direito pela Universidade de Colônia e ainda de-
cente na Faculdade de Direito desta instituição, o qual já é notório 
tanto pelo profundo conhecimento do direito alemão quanto também 
através da tradução de outrns obras jurídicas. E uma grande sorte da 
editora ter encontrado esse jurista e tradutor tão sensível e soberano, o 
qual domina o idioma alemão como alguns poucos juristas brasileiros. 
O agradecimento geral é endereçado à comunidade científica 
brasileira que trata do Estado constitucional. A teoria do direito do 
Estado alemão já mantém há algum tempo um intercâmbio intensivo 
de temas e pesquisadores com essa comunidade. Assim, publicou-se 
no Jahrbuch des öffentlichen Rechts - revista da qual sou editor-chefe 
- uma tradução da interessante Constituição da República Federativa 
do Brasil de 19881 coordenada pelo Prof. Dr. Wolf Paul; a tradução do 
livro "Conversaciones Académicas con Peter Hãberle"2 coordenada 
pelo Prof Dr. Diego Valadés na língua portuguesa (graças ao empe-
nhodo Prof Dr. Gilmar Ferreira Mendes) também já está no prelo e 
há dois anos uma publicação sobre a dignidade da pessoa humana3 
coordenada pelo Prof Dr. Ingo Wolfgang Sarlet comportava um en-
saio de minha autoria e ainda outros ensaios de pesquisadores ale-
mães. Também gostaria de referenciar a entrevista publicada na re-
vista "Consulex"4, a qual foi gentilmente traduzida por Pedro de Mello 
Aleixo Schrerer e de agradecer a Marcos Augusto Maliska pela exce-
lente coordenação dos trabalhos da obra "Estado Constitucional Coo-
perativo" publicada no ano de 2007. Ademais, a reputação do Prof Paulo 
Bonavides no direito constitucional brasileiro é bem conhecida na Ale-
manha. Inesquecível também permanece a hospitalidade com a qual fui 
recebido durante a minha viagem ao Brasil pelas cidades de Fortaleza, 
Brasília, Porto Alegre, São Paulo e Florianópolis. 
Traduzir é exercer a "arte de servir". Entretanto, traduzir tam-
bém comporta algo de criador, pois exige tanto um elevado poder de 
compreensão dos idiomas quanto também das linguagens jurídi-
cas e científicas. Traduzir é, sem dúvida, uma atividade extenuan-
te - todavia não é uma atividade ingrata: o autor gostaria de agrade-
cer mais uma vez Prof Urbano Carvelli pelos extensos trabalhos de 
tradução dessa obra. 
1 JÕR38, 1989, p. 462 ff. 
2 D. VALADÉS (Hrsg.), Conversaciones Académicas con Peter Hãberle, Universi-
dãd Nacional Autônoma de México, 2006. 
3 I. WOLFGANG SARLET (Hrsg.), Dimensões da dignidade: ensaios de Filosofia 
do Direito e Direito Constitucional, 2005, p. 89 ff. 
4 P. DE M E L L O ALEIXO SCHRERER, Teoria constitucional jurídico-comparati-
va, in: Revista Consulex, Nr.. 232, 15 de setembro de 2006, p. 9 ff. 
Tendo em vista o "annus mirabilis" de 1989 na questão do Esta-
do constitucional, o qual foi quase dialeticamente impedido através do 
• "annus horribilis" de 2001, necessita-se de^um intercâmbio intensivo 
entre todas as comunidades científicas que tratam do protótipo do 
Estado constitucional. Hoje é possível observar recepções e produções 
em quase todo o mundo na forma do intercâmbio da tríade: textos 
constitucionais, teorias e praxis (sobretudo dos tribunais constitucio-
nais). No entanto, neste processo inexiste uma "via de mão única": a 
. "velha Europa" também pode aprender de Estados corstitucionais 
jovens como a Colômbia e o Brasil. As comissões da verdade tratadas 
nesta obra são um bom exemplo. 
O "projeto perpétuo" da "paz eterna" no sentido de /. Kant 
(1795) deve procurar e encontrar o seu ponto crucial na infindável luta 
pelo Estado constitucional e seus fundamentos. O direito internacio-
nal, na qualidade de direito constitucional da humanidade {Peter 
Hãberle), necessita do Estado constitucional como garantia e do espa-
ço público mundial como fórum. O catedrático nacional de direito do 
Estado consegue oferecer aqui apenas uma pequena contribuição - a 
qual certamente pode ser intensificada graças ao diálogo com outros 
catedráticos de direito do Estado doutros confins longínquos desse 
mundo. Porém, enquanto a América Latina não possuir uni "Alexan-
der von Humboldt das ciências jurídicas'*, devj-se avançar passo a 
passo. A monografia aqui publicada talvez contribua para esse fim. 
n 
A seguir comentarei, através de algumas palavras-chave, a per-
sistente atualidade temática dos "problemas da verdade no Estado 
constitucional". Tal persistência se deixa comprovai' em diversos cam- v 
pos da política, das ciências e da arte. Porém, tendo em vista as pre- -
tensões moderadas de um "prefácio", não poderei iniciar aqui uma 
ampla continuação desse tema. Assim, os novos e os velhos surpreen-
dentes âmbitos do problema deixar-se-ão delinear apenas de maneira 
fragmentar. Detalhadamente: como exemplos relevantes de "grande 
dimensão política" é interessante citar aqui a controvérsia na Europa 
em relação à resolução sobre a Armênia do Parlamento francês no ano 
9 
de 2001, na quai c extermínio em massa dos armênios em 1915 é de-
nominado como genocídio - pois aqui se trata de verdade ou mentira5. 
Também os apontamentos sobre "Katyrí1, ou seja, o extermínio em 
massa de poloneses pela União Soviética6. Digno de nota para e na 
Alemanha é a instituição que foi criada para administrar e analisar as 
injustiças cometidas pelo órgão de proteção do Estado da DDR e do 
SED - a "Stasi"7. 
Ademais, uma análise da história contemporânea nos leva até a 
Rússia. Perante o terror em Beslan (por parte dos guerrilheiros che-
chenos) as instituições russas emaranharam-se em mentiras notórias e 
minimizaram diversos atentados8. Enfim, o Marrocos também merece 
a nossa atenção. A bem aventurada invenção jurídico-constitucional 
da comissão da verdade, como uma nova instituição, frutificou por já 9 . 
A seguir mencionarei os âmbitos dos problemas nas ciências 
através de palavras-chave. A teologia - e ela não é uma "ciência" 
apenas na concepção alemã - tem proporcionado textos relevantes 
sobre esse tema. Isso vale por exemplo para a encíclica "Fides et Ra-
tio" proclamada pelo Papa João Paulo II no ano de 1998. Já no prelú-
dio (numa forma de preâmbulo) temos: "A fé e a razão (fides et ratio) 
constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se 
eleva para a contemplação da verdade". Nos capítulos e cifras tem-se 
a verdade como um aspecto central, como por exemplo, na cifra I: 
"(...) caminho que, ao longo dos séculos, levou a humanidade a en-
3 Da imprensa, por exemplo, C ÖZDEMIR, Lanier Gang am Bosporus - Was 
gegen eine Armenien-Resolution spricht, in: FAZ de Z c*e abril de 2001, p. 54. 
6 Vgl. S. KARNER, Katyn: Nur einen Teil zugeben - Zum Umgang mit der 
Wahrheit in der Sowjetunion, in: FAZ de 22 de outubro de 2001, p. 9. 
7 Sobre esse assunto vide: P. CARTENS, Der Organisator der Wahrheitsfindung 
nimmt Abschied von den Akten - Joachim Gauck verläßt seine Behörde, in: FAZ 
d e 3 0 d e setembro d e 2000, p . 4 . T " ' • 
8 Vgl . M. WEHNER, Eine Kette von Lügen im Sommer des Terrors -• Desinfor-
mationen aus Moskau, in: FAZ de 10 de setembro de 2004, p. 3. 
9 Vgl. L. WTELAND, Marokko steüt sich seinen "bleiernen Jahren" - Mohamed VL 
reagiert auf den Beruht einer "Wahrheitskommission" und setzt eine vorsichtige 
Liberalisierung fort, in: FAZ de 13 de fevereiro de 2006 - da literatura sobre a África 
do Sul: P. K. RAKATE, The Truth and Reconciliation Commission of South África 
Report: A Review Essay, in: Verfassung und Recht in Übersee 33, 2000, p. 371 ff. 
contrar-se progressivamente com a verdade (...)"; cifra 2: "diaconia da 
verdade"; cifra 25: "objeto próprio deste desejo é a verdade"; no sub-
título do capítulo Hl : "Os diferentes rostos da verdade do homem"; 
cifra 29: "A sede de verdade". O novo Papa Bento XVI, na ocasião de 
sua consagração como bispo na catedral de Munique em 1977, esco-
lheu o seguinte lema: "Mitarbeiter der Wahrheit (Colaborador da 
Verdade). 
No âmbito da ciência política, o renomado cientista dessa "matéria" 
em Sankt Gallen, Prof. Dr. Alois RiJdin, dedicou a sua aula de despedida 
no ano de 2001 ao tema "Wahrhaftigkeit in der Politik (Veracidade na 
Política). Certamente provocante também é um ensaio como o de Ulrich 
Greiner com o tema "Macht und Lüge sind unzertrennlich11 (Poder e 
Mentira são Inseparáveis)10. Na teoria do Estado, Dr. Siegbert Morscher, 
ex-membro da Corte Constitucional da Áustria, dedicou-se a um tema 
dentro da obra "Philosophie im Geiste Bolzanos1lU (Filosofia no Espírito 
de Bolzano), o qual é quase um "tema contemporâneo": "Zu einigen 
«ewigen Wahrheiten» der Staatsrechtslehre11 (Sobre Algumas «Verdades 
Eternas» da Teoria Jurídica do Estado). 
Este tema bncontrou especialmente na Alemanha um âmbito de 
atuação próprio na questão das sanções contra os comportamentos cientí-
ficos incorretos. A deutsche Hochschulverband (Associação dos Profes-
sores e Docentes das Universidadesalemãs) proferiu uma resolução a 
esse respeito no dia 5 de abril de 2000 e promoveu com êxito a imple-
mentação de comissões independentes em todas as universidades. Abo-
minada é a "desonestidade científica", por exemplo através da falsifica-
ção de dados, uso desautorizado da obra intelectual de outrem ou estorvo 
da atividade de pesquisa alheia12. O autor dessas linhas foi membro de 
uma tal comissão da Universidade de Bayreuth entre os anos de 2001 e 
2006. Em suma, trata-se de uma comissão da verdade especial dedicada 
apenas à ciência. Em Portngdl^Christina Queiroz tratou recentemente do 
U. GREINER, Macht und Lüge sind unzertrennlich, in: Die Zeit de 17 de fevereiro 
de 2000, p.4. 
J1 A. HIEKE / O. NEUMAIER (Hrsgs.), Philosophie im Geiste Bolzanos, p. 243 ff. 
1 2 Vgl . DEUTSCHE HOCHSCHULVERBAND, Zeitschrift Forschung und Lehre, 
Nr. 6, 2000, p. 292.' 
11 
tema "A Verdade e as Formas Jurídicas", numa publicação dedicada a 
Prof. Dra. Isabel de Magalhães Colloco13, 
Na ciência jurídica, o problema da verdade permanece na ordem 
do dia - especialmente na Alemanha e sobretudo em relação à punibi-
lidade da negação de Auschwitz14. Por fim, citemos publicações jurídi-
cas novas e antigas como "Recht und Wahrheif'15 (Direito e Verdade), 
"Recht und Lüge"16 (Direito e Mentira) e ainda uma publicação cole-
tiva do jornalista e jurista Robert Leicht com o título "In Wahrheit 
frei9 (Livre na Verdade)11. 
No âmbito europeu da União Européia,, a notícia dejque a Grécia. 
obteve a sua admissão na zona de implementação monetária do Euro 
de maneira "fraudulenta"18 - pois o seu déficit orçamentário entre 
1997 e 1999 estava acima do limite estabelecido de 3% do produto 
interno bruto - deveria estarrecer. Tranqüilizador, porém, e o fato de 
que o Bundesverfassungsgericht (Tribunal Constitucional Federal) 
estabeleceu em uma decisão recente19 a Gebot der Wahrheit und 
Vollständigkeit des Haushaltsplanes (máxima da verdade e da inte-
gralidade orçamentária)20. 
Ao rememorarmos o recente reconhecimento feito pelo consa-
grado poeta alemão Günter Grass de uma vida em mentira em relação 
a sua atuação nas fileiras das tropas SS da Alemanha nazista por um 
1 3 C. QUEIROZ, A Verdade e as Formas Jurídicas, in: R. M A N U E L DE MOURA 
RAMOS (Hrsg.), Estudes em homenagem à professora doutora Isabel de Maga-
lhães CoLlaço, 2006, Bd.II , p. 921 f f . . : 
14 Sobre esse tema consultar T. WANDRES, Die Strafbarkeit des Auschwitz-
Leugnens, 2000; veja também A. Koch, Zur Strafbarkeit der „Auschwitzlüge" im 
Internet: BGHSt 46, 212, in: JuS, 2002, p. 123 ff. . 
15 D. PATTERSON, Recht und Wahrheit, 1999. 
16 O. DEPENHEUER (Hrsg.), Recht u.zd Lüge^2X)Q5. 
1 7 R. LEICHT, In Wahrheit frei, 2006. 
18 W. MUSSLER, Griechenland erschwindelte Euro-Beitritt - Haushaltsdefizit lag 
zynischen 1997 und 1999 über 3 Prozent / Konsequenzen offen, in: FAZ de 16 de 
novembro de 2004, p. IL 
19 BVerfG, 2 BvF 1/04 de 9 de Julho de 2007. 
J. JAHN / M. SCHAFERS, Karlsruhe für Begrenzung der Staatsverschuldung 
Verfassungsgericht weist Klage der früheren Opposition zurück / "Pflicht zur 
Schätzgenauigkeit", in: FAZ de 10 de julho de 2007, p. 1. 
lado (uma vez que ele foi visto durante vários anos como a "consciên-
cia da Nação alemã", tão maior foi a decepção de seus leitores e admi-
radores há dois anos - dentre os quais figura também o autor) e o trato 
dos Estados Unidos da América para com a cultura indígena outrora 
destruída2" por outro lado, teremos então o seguinte resultado: a ver-
dade é um tema da humanidade e ao mesmo tempo um tema de toda e 
qualquer pessoa na totalidade de sua precária existência individual. 
Assim, a verdade permanece um tema para todas as ciências - sobre-
tudo para umà ciência da cultura compreendida como uma teoria 
constitucional com "weltbürgerlicher Absicht" (intuito cosmopolita), 
pela qual o autor luta desde 1982. 
Bayreuth em agosto de 2007 
Peter Hãberle 
2 1 A esse respeito veja: H.-P. RIESE, Die große Lüge: Sie dürfen mitbestimmen und 
\ voll Nostalgie zurückblicken: Ein neues Museum für die Indianer Amerikas in 
Washington, in: FAZ de 5 de outubro de 2004, p. 36. 
13 
PREFÁCIO À 
EDIÇÃO ALEMÃ DE 1994 
A pequena monografia aqui publicada tem por base os trabalhos 
preparatórios, os quais foram possíveis no decorrer do tempo regala-
do ao autor no Colégio Científico em Berlim (1992/93). Agradece-se 
aqui novamente por esse ano. 
De volta a Bayreuth e, respectivamente, a Sankt Gallen foram 
feitos alguns aprimoramentos, os quais se refletem, por exemplo, no 
artigo sobre as «Perspektiven einer kulturwissenschaftlichen Trans-
formationsforschung» {perspectivas de uma pesquisa transformado-
ra científico-cuhural)\ O autor agradece aos colegas Michael Sto-
lleis e Hans Meyer bem como a Ingolf Pernice em Frankfurt am 
Main por algumas sugestões posteriores à ocasião do ensaio de uma 
versão reduzida, na forma de uma preleção, no dia 27 de outubro de 
1994 na Faculdade de Direito daquela cidade. Em homenagem a 
Werner võn Simson, o autor expôs no dia 24.de novembro de 1994 
uma variante no seminário de Direito Europeu de Jürgen Schwarze 
na cidade de Freiburg em Breisgau. Na discussão subseqüente che-
1 P. HABER 1 £, Perspektiven einer hdturwissenschaftlicben Transformationsforschung, 
in: Europäische Rechtskultur, 1994, p. 149; 161 ff.) 
15 
gou-se a conversas proveitosas com Werner von Simson, Konrad 
Hesse, Alexander Hollerbach, Jürgen Schwarze e Wolfgang Graf 
Vitzthum, aos quais também se agradece. 
Esse livro é dedicado a Faculdade de Direito da Universidade 
Aristóteles de Salônica na República Helénica, a qual conferiu ao 
autor o título de Doutor honoris causa (Dr. h. c ) . 
Bayreuth, em dezembro de 1994 
Peter Hãberle 
PRÓLOGO DO TRADUTOR 
O trato do direito pressupõe - ao menos - um domínio intelectual de 
sua ciência Porém, ao tratarmos do e cem o Direito em um sistema jurí-
dico alienígena também é necessário ter uma pequena noção de seus di-
tames, de sua funcionalidade e das condições gerais aonde aquilo que se 
lê maturou. Tais palavras são certamente repetitivas aos olhos do jurista 
contemporâneo, o qual já está ciente da necessidade de domínio e inser-
ção profissional em contextos supranacionais, tanto em relação às noções 
fundamentais sobre as ordens jurídicas alienígenas quanto em relação à 
capacidade de avaliação jurídica de assuntos pertinentes que excedam as 
fronteiras nacionais. Assim, nas próximas páginas, o leitor irá encontrar 
uma obra nata nas dependências alemãs de um ambiente europeu ime-
diatamente posterior à queda do muro de Berlim, o fim da cortina de ferro 
e à abertura do Leste Europeu. Todavia, se as variáveis da vivência euro-
péia e da perspectiva alemã faltam ao âmago do processo cognitivo no 
dia-a-dia de alguns de nós brasileiros, a dogmática não o faz necessaria-
mente. Já em 1997, a Editora Fabris lançava o trabalho do Prof Dr. Dr. 
h.c. mult. Peter Hãberle no mercado lusófono com o título uHermenêuti-
ca constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da constituição: 
contribuição para a interpretação pluralista e "procedimental" da cons-
tituição ". A tradução contou com a pena do Prof Dr. Gilmar Ferreira 
Mendes então Advogado-Geral da União e atualmente Ministro do Su-
premo Tribunal Federal. 
Hoje, alguns anos mais tarde, a Editora Fabris coloca mais uma ine-
xorável obra do Prof. Dr. Dr. Kc. mult. Peter Haberle a disposição do 
público lusófono: Oz problemas da verdade no Estado constitucional. 
Assim, este livro é uma tradução literal, com algumas poucas adaptações, 
da obra alemã do ano de 1994 publicada sob o título "Wahrheitsprobleme 
im Verfassungsstaaf pela Editora Nomos (Baden-Baden). Contudo, para 
o deleite da comunidade científica e dos leitores em geral, a obra aqui 
apresentada pela Editora Fabris apresenta um novum, um diferencialem 
relação àquela alemã: a continuidade temática se estende dos anos de 
1994 a 2007! Seguindo uma solicitação do autor,\acrcscentamos no apên-
dice um ensaio publicado no ano de 2001 \ no qual, como uma continua-
ção temática, são feitas novas reflexões e um balanço sobre os problemas 
da verdade no Estado constitucional da nossa atualidade. Ademais, a 
continuidade do trato temático dos problemas da verdade e, sobretudo, a 
atualidade temática e o ineditismo científico desta edição brasileira tam-
bém podem ser apreciados no Prefácio à Edição Brasileira, preparado 
especialmente para esta edição. Em nome de Sergio Antônio Fabris Edi-
tor gostaria de agradecer o Prof Dr. Dr. kc. mult. Peter Haberle por esta 
preciosa contribuição. Aliás, o leitor ainda encontrará adiante uma nota 
denominada "Vida e Obra de Peter Haberle", aonde figura uma apre-
sentação da pessoa e do cientista Peter Haberle. Tal apresentação tem, 
sobretudo, - sem que se sobressalte as dimensões de um prelúdio e se 
adquira o ca-áter de uma monografia própria - o modesto intuito de acla-
rar de antemão as linhas gerais do âmbito do pensamento háberliano a 
partir de uma perspectiva orbital geoestacionária, a fim de que o leitor 
brasileiro possa, posteriormente, degustar o espectro da genialidade, da 
magnitude e da complexidade deste mestre alemão ao se aproximar e ter 
contato com o teor de sua obra. Tenho certeza que tanto os mais versados 
quanto os aspirantes acadêmicos irão apreciar o resultado. Ademais, a 
atual importância da publicação dessa obra no Brasil é mais que evidente. 
Vinte anos após a reconquista da democracia, as instituições constitucio-
1 P. HÄBERLE, "Wahrheitsprobleme im Verfassungsstaat'.' - eine Zwischenbilanz, 
. in: J. BOHNERT / C. G R A M M / U. KINDHÄUSER /J . LEGE / A RINKEN / G. 
ROBBERS (Hrsgs.), Verfassung - Philosophie -Kirche: Festschrift für Alexander 
Hollerbach zum 70. Geburtstag, 2001, p. 15 ff. 
18 
nais, a classe política e a sociedade civil brasileiras passam por diversos 
problemas mediatos e imediatos conexos à (in)verdade no Estado consti-
tucional. Uma vez que o Estado laico liberal moderno está fundamentado 
em pressupostos, os quais ele mesmo não tem como garantir (Der 
freiheitliche, säkularisierte Staat lebt von Voraussetzungen, die er selbst 
nicht garantieren kann - Wolf gang Ersnt Böckenforde) nós, Brasileiros, 
em interesse da constitucionalidade do nosso Estado, deveríamos apro-
veitar o ensejo histórico e ponderar urgentemente sobre o quinhão míni-
mo de verdade que desejamos estabelecer como futuramente admissível 
em nosso Estado constitucional. Desta forma, tendo em vista a dimensão 
da problemática atual, tenho certeza de que este livro poderá proporcionar 
outros diversos pontos de discussão e reflexão que contribuam tanto para 
uma vida em verdade quanto para a veracidade do futuro da nossa demo-
cracia, do nosso Estado de direito e do nosso Estado constitucional. 
Por fim gostaria de ressaltar explicitamente os mais sinceros agrade-
cimentos ao Prof. Dr. Dr. h.c. mult. Peter Häberle pelo afetuoso convite, 
pela prazeirosa cordialidade e pela agradável estadia na cidade de 
Bayreuth e nas dependências de seu Instituto de Direito Europeu e Cultu-
ra Jurídica e do Centro de Pesquisas para o Direito Constitucional Euro-
peu, ambos alojados nas dependências científicas da Universidade de 
Bayreuth. Também gostaria de enaltecer o senhor Sergio Antônio Fabris 
pelo constante enriquecimento da cultura jurídica brasileira através da 
conseqüente e infatigável publicação da dogmática ultramarina e, espe-
cialmente, os clássicos da dogmática alemã. Reitero ainda os meus mais 
sinceros agradecimentos a senhora Sandra Scholl (Mestre em Ciência 
Política, História Moderna e Direito Internacional - Universidade de 
Bonn) pela ajuda no leitorado do manuscrito e a Daniel Loretti SantAnna 
pelo suporte técnico no Brasil. 
Köln / Bonn - São Paulo, em setembro de 2007 
Prof. Urbano Carvelli, LL.B., LL.M. 
Professor na Faculdade de Direito da Universidade de Colônia - Alemanha 
contato@urbano-carvelli.com 
19 
m 
VIDA E OBRA DE PETER HÃBERLE 
Tanto para os mais versados quanto para os aspirantes acadêmicos 
no mundo lusófono, o trato das questões fundamentais da ciência jurídi-
ca conduz a um manancial reservado, aonde a elevada abstração e a 
lógica meticulosa que repousam nos dogmas desta ciência saciam a 
sede dos diligentes que procuram a sapiência exclusiva daqueles poucos 
catedráticos de projeção nacional, regional e mundial. Dentre os deten-
tores de uma tal honra, o nome de Peter Hãberle figura como uma cons-
tante supranacional, a qual já pertence há mu t^o tempo ao exclusivo rol 
dos catedráticos alemães do Direito conhecidos e respeitados em todo o 
mundo. Seu trabalho une de uma forma harmônica alguns paradoxos: 
ele permanece internacionalmente presente e é, ao mesmo tempo, sím-
bolo da interioridade e da reclusão alemã, conecta o universal ao indivi-
dual, é periferia e centro. Nos diversos anos em que exerceu o magisté-
rio superior - o que no perímetro alemão comporta a Ciência e a Pes-
quisa na melhor "acepção das palavras Peter Hãberle sempre procurou 
proporcionar as várias gerações de estudantes, aquilo que infelizmente 
aparenta estar perdido nas fileiras de produção em massa da maioria das 
universidades modernas: unia noção da Ciência como vida e profissão 
no âmbito de uma pretensão universal. A prontidão edificante, a sapiên-
cia paternal e o carisma orientador de Peter Hãberle perante as novas 
gerações também são evidentes ao ponderarmos a escolha dos temas 
proferidos nas preleções de despedida das Universidades de Bayreuth e 
de Sankt Gallen: "Rechtswissenschaft als Lebensform" (Ciência Jurídi-
ca Como Forma de Vida) e "Der europäische Jurist" (O Jurista Euro-
peu) - os quais evidenciam a atemporalidade de sua cosmovisão. 
Ao contemplarmos a ressonância de sua vida, o esplendor científíco 
de sua trajetória e o inigualável reluz de seus passos que já perfazem mais 
de 70 anos, encontramos diversos títulos de Doutor honoris, inúmeras 
oarticipações em comissões constitucionais e de estudo do Direito em 
todo o mundo e, evidentemente, centenas de ensaios mundialmente co-
nhecidos, cheios da fantasia e da genialidade que lhe são peculiares, pro-
fundos na essência dogmática e de uma digestão complexa, os quais são e 
foram referenciados, discutidos e traduzidos em todas, as línguas euro-
péias e também encontram uma crescente ressonância na dogmática das 
línguas científicas mundiais relevantes da nossa atualidade. Como orga-
nizador e editor de diversas revistas jurídicas, o dinamismo e o cientifi-
cismo de Peter Hãberle também são onipresentes. Com a meticulosidade 
e, sobretudo, a sobriedade científica característica da Alemanha, a mag-
nitude de seu trabalho é resultado da eterna busca de uma essência jurídi-
ca transfronteiras, do ânimo de uma pretensão universal. 
O brilhante percurso deste gênio alemão do Direito teve início no 
dia 13 de maio de 1934 na cidade de Göppingen. Anos mais tarde, 
freqüentava o curso de ciência jurídica nas universidades de Tübingen, 
Bonn, Freiburg e Montpellier (França). Na qualidade de discípulo do 
Prof. Dr. Dr. b.c. mult. Konrad Hesse e nctc acadêmico de Rudoif 
Smend (do qual Konrad Hesse foi aprendiz), Peter Hãberle obteve aos 
27 anos a possibilidade de demonstrar a sua elevada capacidade de 
dominar as mais complexas variáveis do pensamento científico-jurídi-
co. A ampla recepção dogmática da sua tese de doutorado publicada 
em 1962 sob o título "Die Wesensgehaltgarantie des Art. 19 Abs. 2 
Grundgesetz" (A garantia do conteúdo essencial do artigo 19 II da 
„ Lei Fundamental) e as discussões posteriores já evidenciavam a sua 
fecundidade dentro do frutífero ambiente acadêmico alemão. Um ou-
tro patamar digno de nota na vida acadêmica de Peter Hãberle é a 
publicaçãode sua tese de livre-docência (1969) no ano de 1970 sob o 
título "Öffentliches Interesse als juristisches Problem" (Interesse pú-
blico como problema jurídico). Em 1971, Peter Hãberle traçava com o 
seu estudo "Grundrechte im Leistungsstaat" (Direitos Fundamentais 
no Estado de Beneficio) as linhas do entendimento dos pressupostos 
22 
para a implementação cos direitos fundamentais (status activus pro-
cessualis). Ademais, a "interpretação cultural" do Estado e da Consti-
tuição é o denominador comum áureo da dogmática hãberliana desen-
volvida a partir dos anos setenta. Em seus sucessivos trabalhos de 
cunho teórico-constitucional, Peter Hãberle analisa os,pressupostos, os 
elementos e os efeitos culturais no Estado e desenvolve, por fim, a 
afamada obra "Verfassungslehre als Kulturwissenschaft" (Teoria da 
Constituição como Ciência da Cultura) publicada no ano de 1982 e 
reeditada - com uma farta ampliação - no ano de 1998. Ademais, o de-
senvolvimento subseqüente da "interpretação cultural" da constituição e 
dc Estado levou Peter Hãberle a desembocar no manancial do direito 
comparado e a aclarar a Terra incógnita de uma "interpretação gené-
tica" da constituição e do Estado. Nessa linha de pesquisa, seus estudos 
o levaram a publicar uma série de trabalhos. Entre tantos outros podemos 
citar aqui o ensaio intitulado "Gemeineuropäisches Verfassungsrechf 
(Direito Constitucional Comum Europeu) no ano de 1991, o iivro "Eu-
ropäische Rechtskultur" (Cultura Jurídica Européia) no ano de 1994 e 
o livro "Europäische Verfassungslehre" (Teoria Européia da Consti-
tuição) no ano 1999 (o qual já apresenta a 5a reedição). 
Por fim, aô comtemplarmos a totalidade dos trabalhos de Peter 
Hãberle é possível reconhecer, por um lado, a variável constante em-
butida no âmago de seu pensamento: os clássicos europeus, os quais 
deram substância ao movimento constitucional europeu e ainda impul-
sionaram e impulsionam o amplo desenvolvimento constitucional global. 
Por outro lado, podemos encontrar no ceme de sua proclamação o teor de 
uma teoria constitucional como ciência da cultura, a qual ectá profunda-
mente enraizada na sociedade e no ser humano e que, dentre tantas parti-
cularidades genéticas, difunde a premissa de uma constituição dinâmica 
que impede a acumulação do poder e enfatiza a livre execução tanto das 
liberdades quanto das igualdades inseridas na força jurídica dos (aplica-
ção imediata e vinculação das entidades públicas e privadas aos) direitos 
fundamentais responsáveis pelo aflorar cultural da sociedade e de todos 
os cidadãos, os quais em liberdade e igualdade podem se considerar os 
verdadeiros intérpretes da constituição. 
Köln / Bonn - São Paulo em agosto de 2007 
Prof. Urbano Carvelli, LLB., LL.M. 
Professor na Faculdade de Direito da Universidade de Colônia - Alemanha 
23 
ABREVIATURAS ALEMÃS 
AfP = Archiv für Presserecht 
AFP = Agence France-Presse 
AöR = Archiv des öffentlichen Rechts 
BAGE = Entscheidungen des Bundesarbeitsgerichts 
BayVBI. = Bayerische Verwaltungsblätter 
Bay VfGH = Bayerischer Verfassungsgerichtshof 
BayVGH = Bayerische Verwaltun^sgerichtshof 
BGB = Bürgerliches Gesetze i£h 
BGBl = Bundesgesetzblatt 
BGH = Bundesgerichtshof , 
BGHSt = Entscheidungen des Bundesgerichtshofes in Strafsache 
BRD = Bundesrepublik Deutschland 
BÜNDNIS 90 = BÜNDNIS 90 /Die Grünen 
BV = Bayerische Verfassung 
BVerfG = Bundesverfassungsgericht 
BVerfGE = Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts 
(amtliche Sammlung) 
B VerfGG = Bundesverfassungsgerichtgesetz 
BVerwGE = Entscheidungen des Bundesverwaltungsgerichts 
(amtliche Sammlung) 
CDU = Christlich Soziale Union 
DDR = Deutsche Demokratische Republik 
DFG = Deutsche Forschungsgemeinschaft 
DRiZ = Deutsche Richterzeitung 
EuGRZ = Europäische Grundrechte-Zeitschrift 
25 
\ 
f. 
FAZ 
ff. 
FGG 
FR 
FS 
G o 
HdBStR 
HGB 
Hrsg. 
Hrsgs. 
JöR 
Jura 
JUS 
JZ 
KJ 
KNA 
NJW 
NRW 
NZZ 
OLG 
Rdnr. 
RGBl. 
SED 
SPD 
Stasi 
StGB 
StPO 
SZ 
Vgl. 
VVDStRL 
ZaöRV 
ZfP 
ZParl. 
ZRP 
ZZP__ 
Folgende 
Frankfurter Allgemeine Zeitun? 
Fortfolgende 
Gesetz über die Angelegenheiten der freiwilligen 
Gerichtsbarkeit 
Frankfurter Rundschau 
Festschrift 
Grundgesetz 
Handbuch des Deutschen Staatsrechts 
Handelsgesetzbuch 
Herausgeber 
Herausgebern 
Jahrbuch des öffentlichen-Rechts der Gegenwart 
Juristische Ausbildung 
Juristische Schulung 
Juristenzeitung 
Zeitschrift Kritischer Justiz 
Katholische Nachrichten-Agentur 
Neue Juristische Wochenschrift 
Nordrhein-Westphalia -
Neue Zürcher Zeitung 
Oberlandesgericht 
Randnummer 
Reichsgesetzblatt 
Sozialistische Einheitspartei Deutschlands 
Sozialdemokratische Partei Deutschlands 
Ministerium für Staatssicherheit 
Strafgesetzbuch 
StPO Strafprozessordnung 
Süddeutsche Zeitung " :.' 1 
Vergleich 
Veröffentlichungen der Vereinigang der Deutschen 
Staatsrechtslehrer 
Zeitschrift für ausländisches öffentliches Recht und 
Völkerrecht 
Zeitschrift fur Politik 
Zeitschrift für Parlamentsfragen •> ' 
Zeitschrift für Rechtspolitik 
Zeitschrift für Zivilprozeß . 
26 
EQUIVALÊNCIA DAS 
ABREVIATURAS ALEMÃS 
AfP = Revista Arquivo para o Direito de Imprensa 
AFP - Agência France-Presse 
AöR es Revista Arquivo do Direito Público 
BAGE ' = Decisões do Tribunal Federal do Trabalho 
BayVBl. = Folhas da Administração da Baviera 
BayVfGH = Tribunal Constitucional da Baviera 
BayVGH = Tribunal Administrativoâda Baviera 
BGB = Código Civil 
BGBl = Diário (oficial) das Leis Federais 
BGH m Tribunal Federal 
BGHSt = Decisões dc Tribunal Federal em matéria criminal 
BRD = República Federal da Alemanha 
BÜNDNIS 90 = União 90 / Partido Verde 
BV « Constituição da Baviera 
BVerfG = Tribunal Constitucional Federal 
BVerfGE = Decisões do Tribunal Constitucional Federal 
(Coletânea Oficial) 
BVerfGG = Lei Orgânica do Tribunal Constitucional Federal 
BVerwGE = Decisões do Tribunal Administrativo Federal 
, (Coletânea Oficial) 
CDU = União Social-Cristã 
DDR = República Democrática Alemã (RDA) 
DFG ' ! — Fundação Alemã de Pesquisas 
DRiZ = Jornal dos Juízes Alemães 
EuGRZ = Revista dos Direitos Fundamentais Europeus 
f = Seguinte 
PA2 = Jornal Gerai de Frankfurt 
ff. = Seguintes 
PQÇJ = Lei Sobre os Assuntos da Jurisdição Voluntária 
PR = Jornal Panorama de Frankfurt 
PS = Publicação de Homenagem (a uma pessoa) 
QQ = Lei Fundamental (Constituição da República 
v da Alemanha) 
HdBStR = Manual do Direito do Estado Alemão 
HGB = Código Comercial 
Hrsg. = Editor 
Hrsgs. = Editores 
jõR = Anuário do Direito Público da Atualidade 
Jura = Revista de Instrução Jurídica 
JUS = Revista de Formação Jurídica 
JZ = Jornal dos Juristas 
KJ = Revista Justiça Crítica 
KNA = Agência Católica de Notícias 
NJW = Nova Revista Semanal Jurídica 
NRW = Renânia do Norte-Westphalia 
NZZ = Jornal Nova Zurique 
OLG = Tribunal do Estado 
Rdnr. = Número de margem 
RGB1. = Diário (oficial) das Leis Imperiais 
SED = Partido Socialista Unitário da Alemanha 
SPD = Partido Social-Democrata da Alemanha 
Stasi = Ministério para a Segurança do Estado 
StGB = Código Penal 
StPO = Código de Processo Penal 
SZ \ . = Jornal Sul-Alemão 
Vgi . = Confira / compare 
VVDStRL = Publicações da Associação dos Professores 
Alemães de Direito do Estado 
ZaÕRV = Revista para o Direito Público Estrangeiro 
e Direito Internacional 
ZfP = Revista para Política 
ZParL = Revista para Questões Parlamentares 
ZRR = Revista para Política Jurídica 
ZZP = Revista para o Processo Civil 
PRIMEIRA PARTE: 
PROBLEMA, QUESTÕES INICIAIS 
L Atualidade 
A atual incidência mundial do protótipo Estado constitucional, 
possível graças à queda dos Estados totalitários no bloco do leste e 
visível no processo de transição para democracias pluralistas dos paí-
ses em desenvolvimento, coloca um problema na ordem do dia da 
nossa ciênciaconstitucional, o qual recebeu muito pouca atenção até o 
momento: a questão da importância dos problemas da verdade. Tem o 
Estado constitucional competência sobre a verdade no âmbito geral ou 
parcial, talvez até mesmo pretensões de verdade quando, por exemplo, 
há necessidade de reforma? Ou apenas nega-se a ele ou, respectiva-
mente, aos seus representantes o dizer consciente da inverdade ou o 
agir fundado na inverdade? Tem o cidadão direito à verdade? Existe 
um direito humano à verdade? Fundamenta-se o Estado constitucional 
no plano teórico tão intensivamente sobre a verdade quanto ele é co-
nexamente obrigado à eqüidade e ao'bem-comum? Devemos talvez 
nos restringir também aqui à busca da verdade na tradição de um 
Gotthold Ephraim Lessingl Existem, eventualmente, verdades relati-
vas ou transitórias? Já prima facie é possível reconhecer uma gama de 
problemas, os quais, inicialmente, podem ser apenas esboçados. : -
Que a atual teoria (comparativa) da constituição (sit vénia verbo: 
com «intuito cosmopolita») necessita se ocupar do problema da ver-
29 
dade, não é certamente sua própria culpa. O desmoronamento do sis-
tema stalinista na Europa Oriental, como um exemplo do totalitaris-
mo, proporciona ao questionamento da verdade uma dimensão de 
profundidade constitucional e uma urgência política diária. Ao presi-
dente Vácíav Havei o qual de prisioneiro político da República So-
cialista da Checoslováquia chegou ao cargo de presidente da Repúbli-
ca Federativa Tcheca e Eslováquia, deve-se agradecer pela atualidade 
da temática. Até aonde é perceptível, Havei foi o primeiro a exigir um 
«direito à verdade». Sensibilizados por Havei também nos deparamos 
nas democracias ocidentais com o problema da verdade já nos aconte-
cimentos políticos diários 1: em agosto de 1991, a Itália se utilizou de 
1 No publicismo diário, o tema da verdade está em conjuntura, como por exemplo: J. 
HABERMAS, Die zweite Lebenslüge der Bundesrepublik: Wir sind wieder ganz 
«normal» geworden, in: Die Zeit Nr. 51 de 11 de dezembro de 1992, p. 48; P. 
RÜHMKORF, Deutschland - ein Lügenmärchen, in: Die Zeit Nr. 43 de 22 de 
outubro de 1993, p. 67 f. - discurso na ocasião da entrega do Prêmio Büchner, G. 
NONNENMACHER, Unklarheiten, Halbwahrheiten über die desaströse UN-
Mission in Somalia, in: FAZ de 14 de julho de 1993, p. 1; P. GLOTZ, Der 
Wahrheit eine Waffe, in: Die Zeit Nr. 37 de 10 de setembro de 1993, p. 57; A. 
JABLOKOW, Wir wollen nicht länger lügen - entrevista com o conselheiro 
' ambiental de Boris Jelzin, in: Die Zeit Nr. 45 de 5 de novembro de 1993, p. 33; H. 
SCHUELER, Nur die Wahrheit, Die Schüsse von Bad Kleinen, in: Die Zeit Nr. 28 
de 9 de julho de 1993, p. 1; D. WENZ, Moderne Wahrheit, Tradition-, Kirchen-
und Kulturstreit in der Nordwestschweiz, in: FAZ de 28 de setembro de 1993, p. 7; 
G. BERTRAM / R. LEICHT, Die Flucht vor der Verantwortung / Die Flucht vor 
der Wahrheit (em relação ao fracasso europeu nos Balcãs), in: Die Zeit Nr. 49 de 2 
de dezembro de 1994, p. I; J. REQUATE, Der Redakteur als Wahrheilssöldner, 
Die Kommerzialisierung des Zeitungswesens setzte Nachricht und Reportage 
gegen parteipolitische "Gesinnungsfestigkeit", in: FAZ de 7 de dezembro de 1994, 
p. N 6; P. KONDYLIS, Ohne Wahrheitsanspruch keine Toleranz, in: FAZ de 21 
de dezembro de 1994, p. N 5; M. T H U M A N N , Lügen für Belgrad, in: Die Zeit Nr. 
2 de 6 de Janeiro 1995, p. 43; Idem, Wenn Verteidigungsminister lügen, in: FAZ de 
13 de Janeiro de 1995, p. 4 (em relação à guerra conduzida por Moscou na 
Chechênia ); A expressão a verdade é «a primeira vítima de toda guerra» já se 
tomou quase «proverbial» (Vgl. M. RÜB, Soldatenfreundschaft und Neutralität -
Rose geht, Smith kommt/Die Unprofor-Kommandeure haben wenig Spielraum, in: 
FAZ de 25 de janeiro de 1995, p. 3). Dolorosamente nova é a «morte pela verda-
de» dos jornalistas - como no caso do repórter J. Piest em Grosny. Sobre esse epi-
sódio consultar, por exemplo, J. BUCHSTEINER, Erschossen, in: Die Zeit Nr. 4 
de 20 de janeiro de 1995, p. 9. 
uma mentira maquiavélica. O seu governo ludibriou algumas centenas 
de albaneses refugiados na cidade de Bari, ao lhes prometer, ilusoria-
mente, asilo ou acolhimento temporário, trunsportando-os, porém, 
após uma manobra de engodo, em aviões de volta ao seu país de ori-
gem, aonde pesadas penas os aguardavam. Para o. Estado constitucio-
nal europeu, mais especificamente para o protótipo Estado constitu-
cional na Europa e para os seus povos, um tal procedimento estatal, 
esse trato cínico com a inverdade, deveria ser uma provocação - os 
periódicos noticiaram sobre a «traição à italiana»; o filme «divórcio à 
italiana» nos é certamente preferível2! Pode o Estado constitucional 
ocidental, o qual, sob condições dramáticas, ludibriou_Nos albaneses 
que queriam ^retornar» à Europa com um tratamento indigno à pessoa 
humana no estádio de Bari, exigir fidedignamente dos Estados da Eu-
ropa Oriental que estes digam a verdade sobre a realidade histórica aos 
seus povos e que, por exemplo, reanalisem a história da injustiça stali-
nista na antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas? Ou cons-
tituir o Estado sobre a verdade permanece um belo sonho? Apenas ao 
cínico recai a reposta facilmente. Depende a sociedade aberta do Esta-
do constitucional de «ensaio e erro» porque a própria pessoa humana é 
um ser enganador? Certamente: todavia, não se fundamenta o Estado 
constitucional sobre um mínimo de verdades; o que permite a inter-
pretação de que a sua tolerância tem certos limites máximos, pois sem 
uma pretensão de verdade também não há tolerância? 
II. Primeiras indagações às teorias da verdade 
E a verdade, por exemplo, uma declaração filosófica a qual pode 
ser verificada através de critérios lógicos, crítico-lingüísticos, empíri-
cos ou outros quaisquer? Denomina-se verdade a conformidade das 
declarações com o mundo exterior ou interessa o significado (declara-
ções como ações compreensíveis), como, por exemplo, na forma das 
Digno de nota é a insinuação do chefe le Estado italiano Oscar Luigi Scalfaro. de 
que as mídias invertem a verdade: «Ai de nós» se a crônica jornalística perder o 
respeito para com a verdade; pois aí se fundamenta a liberdade (H.-J. FISCHER, 
Achtung der Wahrheit gefordert, in: FAZ de 5 de dezembro de 1994, p. 6). 
31 
''posições extremas do positivismo do Círculo de Viena (primado da 
verdade) ou da teoria dos jogos de linguagem de Ludwig Wittgenstein 
(primado do significado)? Deve-se pesquisar diferentemente sobre a 
verdade de acordo com a especialidade da disciplina científica3? A 
teologia, uma ciência, questiona de acordo com a confissão diferente-
mente sobre a verdade em Deus. E, por fim: não existe junto à verdade 
\ 
3 Atualmente, a reflexão sobre a verdade renasce em diversos ramos das ciências 
sem que, até onde se pode perceber, exista, até o momento, um projeto sistemático. 
Consultar, por exemplo, E. JÜNGEL. Wertlose Wahrheit, 1990; P. KEMPER 
(Hrsg.), Opfer der Macht, Müssen Politiker ehrlich sein?, 1993; K. BITTER-
M A N N (Hrsg.), Serbien muß sterbien, Wahrheit und Lüge im jugoslawischen 
Bürgerkrieg, 1994; K. HÜBNER, Die Wahrheit des Mythos, 1985, por exemplo: 
p. 61 ff., 250 ff., 364 ff.; R. SAFRANSKI, Wie viel Wahrheit braucht der 
Mensch?, 1993; G. BRENNAN / J. M. B U C H A N A N , Die Begründung von 
Regeln, Konstitutionelle Politische Ökonomie, 1993, p. 50 ff. («ciência, verdade e-
política»); U. K. PREUß, Politische Ordnung und wahrscheinliches Wissen, in; 
WISSENSCHAFTS KOLLEG JAHRBUCH 1989/90, Die moralische Konstruktion 
von Wahrheit, Gewissen und Verantwortung, 1991, p. 243 (253 ff .) ; G. MÜLLER, 
Der Plausibilitätsgedanke in der Rechtsprechung, in: J. HENGSTSCHLÄGER., 
Für Staat und Recht: Festschrift für Herbert Schambeck, 1994, p. 61 (63 ff . ) ; J. 
NEEDELMAN, Vom Sinn des Kosmos, Moderne Wissenschaften und alte 
Wahrheiten,1993; M. FOUCAULT, Sexualität und Wahrheit, 1976; veja também 
a caracterização do testemunho da vida científica do autor R. HILBERG, 
Unerbetene Erinnerung, 1994, e ainda E. JÄCKEL, Kampf um die Wahrheit, in: 
Die Zeit Nr. 41 de 7 outubro de 1994, p. 30; W. BADER (Hrsg.), Und die 
Wahrheit wurde hinweggefegt: Daniel 8 linguistisch interpretiert, 1994; LOUIS 
BEGLEY, Lügen in Zeiten des Krieges, 1994; E. EPPLER, Als Wahrheit verordnet 
wurde, Briefe an meine Enkelin, 1994; M. VARGAS LLOSA, Die Wahrheit der 
Lügen, 1994; D. NYBERG, Lob der Halbwahrheit, 1994; J. A. BARNES, A Pack 
oflies, 1994; S. SHAPIN, A Social History ofTruth, Civiliy and Science..,, 1994; 
HEINRICH SEUSE, Das Buch der Wahrheit (1330), Veritati et Vitae, Eichstätter 
Festschrift, Vol . I I , 1993 - uma escritura de defesa do padre dominicano do início 
da Idade Média a favor de seu mestre Eckhart perseguido pela inquisição; JOSEPH 
K A R D I N A L RATZINGER, Wahrheit, Werte, Macht, Prüfsteine der pluralis- , 
^tischen Gesellschaft, 1993. No entanto, até agora, tanto no direito constitucional 
quanto no direito do Estado, ainda não se questionou em nenhum lugar sobre o 
problema da verdade (Vgl. , por exejnplo, R. ZIPPELIUS, Im Irrgarten der Ge-
rechtigkeit, 1994, p. 17: «em suma, independente da "questão da verdade", o con-
senso da maioria pode bastar para que se ofereça uma legitimação prática das nor-
mas jurídicas em questões de eqüidade»). 
32 
das ciências uma outra «possibilidade de verdade» (Hans-Georg Ga-
damer) como a poesia ou a arte em geral? 
Com outras palavras: como definimos .«verdade»? Como uma 
velha escola através da «cognitio est similitudo rei»4 ou de modo 
completamente diferente como Arthur Schopenhauer: «O mundo (...) 
é a minha noção; (...) nenhuma verdade é, portanto, mais certa, so-
bretudo mais independente de outras e necessita menos de uma prova 
do que essa, para a qual tudo aquilo que existe para o conhecimento, 
ou seja, o mundo inteiro, é somente um objeto em relação ao sujeito; 
opinião do opinante» 5. Para uma compreensão inicial, nós apontamos 
aqui para a «teoria da coerência» (sobretudo no positivismo lógico)6, 
ou seja, verdade como a inserção infrangívei de uma sentença no 
contexto geral das declarações científicas, assim como a «teoria do 
consenso» de Jürgen Habermas. Ele compreende verdade como a 
conformidade de uma alegação ou, respectivamente, como a capaci-
dade de consenso no discurso dos participantes, o qual, entretanto, 
está sob a idéia orientadora de um «diálogo livre» e «universal» 7. 
4 A esse respeito, por exemplo, J. DONAT, Die Freiheit der Wissenschaft, 2 a Ed., 
1912, p. 37 f. 
5 A. SCHOPENHAUER, Die Welt als Wille und Vorstellung, Vol. I, §§1 e 2, apud 
Haffmans Taschenbuch, 1991, p. 3 1 f f . 
6 M. MÜLLER / A. HALDER, Philosophisches V/orterbuch, H'88, p. 339. Sobre as 
definições de verdade e sobre a «diversidade de significados» do conceito de «ver-
dade» com referências bibliográficas consultar: W. BRUGGER (Hrsg.), Philoso-
phisches Wörterbuch, 1985, especialmente os termos «verdade» (PUNTEL) e 
«critério da verdade» (SANTELER). Veja também a exposição das teorias da ver-
dade de W. STEGMÜLLER, Hauptströmungen der Gegenwartsphilosophie, Vol. 
I, 6 a Ed., 1978, por exemplo, F. BRENTANO (p. 6 f f ) , K. JASPERS (p. 222 
ff,) , M. S C H U C K (p. 365 f.), L. WITTGENSTEIN (p. 551 ff .) . Sobre a deriva-
ção terminológica: «Staatslexikon der Görresgesellschaft», Voi. V, 7 a Ed., 1981, 
p. 850: «Hebräisch: ermeth^ fest, gültig, verbindlich; spezifische Qualität 
des Schöpfergottes Jahwe». Adiante, na página 851: «Griechisch: alétheia: 
Unverborgenheit». 
7 J. HABERMAS, Theorie des kommunikativen Handelns, Vol. I e I I , 1981; Idem, 
Vorstudien und Ergänzungen zur Theorie des kommunikativen Hcndelns, 1984; 
veja também A. K A U F M A N N , Rechtsphilosophie in der Nach-Neuzeit, 1990, p. 
22, 30 f., 35 ff.; ainda a esse respeito consultar M . MÜLLER / A. H A L D ER, 
Philosophisches Wörterbuch, 1988, p. 339. Veja também G. C. LICHTENBERG 
em G. C. LICHTENBERG / P. PLETT (Hrsgs.), Werke, 1967, p. 96: «Enunciados, 
Werner von Simson é provavelmente o único alemão estudioso 
do direito do Estado ainda vivo, o qual sempre retoma a questão da 
/erdade para a sua «matéria», mesmo que em um patamar altamente 
abstrato. Na obra «Die Verteidigung des Friedens» (A Defesa da 
Liberdade) encontramos o seguinte enunciado: «A relação do Estado 
para com a verdade, a qual ele necessita, mas, no entanto, perma-
nece constantemente irrevelável com os métodos científicos neu-
tros de averiguação da verdade, é, por conseguinte, o autêntico 
critério filosófico da teoria do Estado» 8 . Von Simson diferencia entre 
«verdade objetiva» e «verdade coletiva» - esta é «a verdade neces-
sitada pelo coletivo na sua respectiva forma de manifestação» 9. E 
com relação aos sistemas socialistas, ele afirma: «Isso explica a menti-
ra, a qual todo ser humano que queira governar o mundo em nome da 
verdade necessita» 1 0. Na publicação comemorativa para Werner 
Marxn se tratou, conforme as próprias palavras tardias ce Von Si-
mson12, do «conceito seguramente suspeito no piano filosófico» da 
«verdade proveitosa». No apontamento autobiográfico «Der Staat als 
Erlebnis» (O Estado Como Experiência)12 fala-se sobre «verdades da 
Revolução Francesa», as quais, primeiramente, resultaram no seu 
oposto e tiveram que esperar «até que o seu Estado encontrou um 
terreno frutífero nas progressivas transformações das relações so-
sobre os quais as pessoas concordam, são verdadeiros; se eles não são verdadeiros 
nós não temos uma verdade». Em contraposição C. A. EMGE, Über das Grund-
dogma des rechtsphiLoscphisch.cn Relativismus, 192 5, p. 42: «Mesmo quando to-
dos têm uma opinião, isso também ainda pode ser enado». Crítico sobre as três 
teorias populares na questão da verdade, as teorias da coerência, da evidência e a 
pragmática ou instrumental: K. POPPER, Vermutungen und Widerlegungen, Das 
Wachstum der wissenschaftlichen Erkenntnis, Vol. I . , 1963 / 1994, p. 327 f. 
Popper clama por uma teoria da verdade objetiva perante as «teorias subjetivas da 
verdade». Ibidem, p. 323 ff. e, em especial, p. 328 ff. 
8 W. VON SIMSON, Die Verteidigung des Friedens, 1975, p. 21. 
9 Ibidem, p. 25. •• ; 
1 0-Ibidem, p. 27. 
1 1 U. GUZZONI / B. RANG / L. SIEP, Der Idealismus und seine Gegenwart, in: U. 
GUZZONI, Festschrift für Werner Marx zum 65. Geburtstag, 1975, p. 412 ff. '£ 
12 W. VON SIMSON, Der Staat als Teil und als Ganzes, 1993, p. 20. 
13 Idem, Der Staat als Erlebnis, in: JöR 32, 1983, p. 31, 40 f. 
34 
ciais». Na obra «Der Staat ais Teil und ais Ganzes» (O Estado Como 
Parte e Como Todo)14, uma obra - pode-se dizer? - «tardia», encon-
tramos o conhecimento, o qual é uma verdade unicamente absoluta 
para o Estado liberal, de «que ninguém tem a posse daquela verdade 
única que determina o todo». No seu debate com Carl Schmitt15, ele 
critica os intelectuais anglo-saxões e contemporâneos afirmando que 
lhes falta a «sensibilidade para as verdades reconhecidamente eter-
nas». Aqui também encontramos as sentenças dialéticas «hoje, a única 
verdade absolta é que a compreensão da verdade deve ser relativa» 1 6 
e «toda época tem as suas verdades» 1 7. 
Vamos buscar de antemão exortações filosóficas adicionais: a 
filosofia da verdade de maior abrangência na nossa atualidade foi 
apresentada por Gadamer]S. Seu objetivo é buscar a «experiência da 
verdade que supere a área de controle do método científico por toda 
a parte, aonde quer que ela esteja, e questionar a sua própria legi-
timação. Assim, as ciências humanas avizinham-se àqueles tipos de 
experiências, as quais estão fora da ciência: como as experiências 
da filosofia, das artes e da própria história» 1 9. Neste contexto sur-
gem expressões «como: «a reconquista da questão da verdade da 
arte» 2 0 , a qual não se «medecom a verdade do conhecimento de Im-
manuel Kant perante o conceito de conhecimento da ciência e o con-
ceito de realidade das ciências naturais», mas sim, que o ultrapassa, ou 
seja, compreende o conceito de experiência em sentido amplo21. Dessa 
forma, Gadamer também pode postular a «diversidade da pretensão de 
verdade», a qual é intencionada por diversos textos literários, como 
por exemplo, por prosas poéticas e científicas2 2. Assim, ele pode cha-
mar a atenção para a «possibilidade peculiar da língua de promulgar 
14 W. VON SIMSON, Der Staat ais Teil und als Ganzes, 1993, p. 28. 
15 Idem, Carl Schmitt und der Staat unserer Tage, in: AöR 114, 1989, p. 185, 193. 
1 6 Ibidem, p. 185,211. 
1 7 Ibidem, p. 185,216. 
1 8 H.-G. GADAMER, Wahrheit und Methode, I a Ed., 1960,4 a Ed., 1975. 
1 9 Ibidem, p. 27 f. 
2 0 Ibidem, p. 77 ff. 
2 1 Ibidem, p. 93. 
2 2 Ibidem, p. 155. 
35 
o certo e o verdadeiro» , podendo falar então do «significado 
exemplar da hermenêutica jurídica» 2 4 , a qual figura na segunda parte 
de sua obra como parágrafo: «Ausweitung der Wahrheitsfrage auf 
das Verstehen in den Geisteswissenschaften» {extensão da questão 
da verdade sobre a compreensão nas ciências humanas)25. Como 
crítica a Karl Raimund Popper pode valer a tese de que «a hermenêu-
tica também tem relevância teórico-científica desde que desvende, 
através da reflexão hermenêutica, condições da verdade dentro das 
ciências, as quais não repousam sobre a lógica da investigação e 
sim que a precedam» 2 6 . 
Através disso tudo, o jurista pode se sentir encorajado peio seu 
intelecto a atuar de maneira extensiva, ou seja, incluindo também no 
seu horizonte de pesquisa os textos t contextos do problema da verda-
de que transgridam a sua «matéria» aparentemente ou realmente. Ten-
do em vista o problema da verdade no Estado constitucional, a com-
preensão da ciência jurídica como «ciência cultural» é particularmente 
necessária 2 7. 
2 3 Ibidem, p. 389. 
2 4 Ibidem, p. 307 ff. 
25 Veja também a crítica de Gadamer ao «positivismo legislativo» e a sua rejeição de 
uma «dogmática ideal», a qual «compreenderia, p^.lo menos, todas as verdades j u -
rídicas possíveis em um sistema coerente» (Ibidem„ p. 489). 
2 6 Ibidem, p. 514. 
2 7 A esse respeito: P. HÄBERLE, Verfassungslehre als Kulturwissenschaft, 1982, e 
os estudos sucessivos; por último: P. HÄBERLE, Europäische RechtsfcUtur, 1994. 
Uma tentativa de enriquecer o «racionalismo crítico» (Popper) das artes e da cultu-
ara ou, respectivamente, das suas tradições no estudo n. HÄBERLE, Die Freiheit 
der Kunst, 1985; atualmente: P. HÄBERLE, Rechtsvergleichung im Kraftfeld des 
Verfassungsstaates, 1992, p. 441 (458 ff.). Vicinal à pretensão da verdade é D. T. 
TSATSOS, Von der Würde des Staates zur Glaubwürdigkeit der Politik, 1989, 
p. 41 f.: «sobre o conceito de verossimilidade». 
SEGUNDA PARTE: 
ELEMENTOS DE UMA AVALIAÇÃO 
I. O problema da verdade sob a ótica de textos jurídicos 
Antes de toda aproximação «especulativa» do problema da ver-
dade, necessitamos «examinar» os textos jurídicos. Essa aparente 
abordagem «positivista», como um primeiro passo de uma avaliação, 
é tão importante quanto o fato de que as tradições do pensamento filo-
sófico do tema podem seduzir a ignorar que o protótipo «Estado cons-
titucional» repousa especificamente sobre textos positivos escritos e 
ineceritos, os quais demandam um «entendimento». Dessa maneira 
devemos presumir que aspectos relevantes sobre o problema da ver-
dade já figuram nestes textos (interpretados simultaneamente nos seus 
contextos culturaÍ3). 
1. TEXTOS CONSTITUCIONAIS 
O texto clássico sobre a verdade, talvez o mais antigo e primigê-
nio na história constitucional, poderia ser o grande enunciado da de-
claração de independência norte-americana de 1776: «We hold these 
truths to be self-evident (...)». 
Entre os textos constitucionais mais importantes com conteúdos 
diretamente relacionados à verdade figuram os catálogos dos objetivos 
educacionais na República Federal da Alemanha. Tais objetivos, es-
sências das constituições do Estado constitucional, fixam os valores 
básicos na profundidade28 e representam, como «soft law», elementos 
teóricos consensuais. Eles não normatizam apenas os temas clássicos 
como «tolerância», «respeito perante a dignidade da pessoa humana» 
e, recentemente, o «senso de responsabilidade para com a natureza e o 
meio ambiente», mas também o tema da verdade. Art. 131 II da 
Constituição da Baviera de 1946 menciona como «objetivos educa-
cionais supremos», entre outros, a «abertura para todo o verdadeiro, 
bom e belo»; art. 26 Nr. 3 da Constituição de Bremen de 1947 exige 
«a educação para um pensamento autônomo, para o respeito perante a 
verdade, para a coragem de reconhecer a verdade e fazer aquilo que 
tenha sido reconhecido como certo e necessário»; art. 56 IV da Cons-
tituição de Hesse de 1946 formula o objetivo educacional «servir ao 
povo e à humanidade através de mesura e caridade, respeito e tolerân-
cia, legalidade e veracidade» e o art. 131 da Constituição da Renânia-
Palatinado de 1947 determina os objetivos educacionais «temor a 
Deus e caridade, respeito e tolerância, legalidade e veracidade». O 
amor à verdade ou, respectivamente, à veracidade figura aqui como 
elemento da imagem da pessoa humana no Estado constitucional.29 Já 
agora podemos supor que estes objetivos educacionais (humanistas) 
para os jovens estãc em relação interna com a obrigação para com a 
verdade das testemunhas ou dos juramentados e nos outros campos 
problemáticos nos quais se apresenta a questão da verdade para o Es-
tado constitucional-50, como, por exemplo, em relação à tarefa da im-
A esse respeito consultar P. HÄBERLE, Erziehungsziele und Orientierungswerte 
im Verfassungsstaat, 1981. Veja também as palestras de M. Bothe• e A. Dittmann 
em M. BOTHE I A. D I T T M A N N / W r - M A N T L / Y. HANGARTNER, 
Erziehungsauftrag und Erziehungsmaßstab der Schule im freiheitlichen 
Verfassungsstaat, in: VVDStRL 54, 1995. 
A esse respeito vide P. HÄBERLE, Das Menschenbild im Verfassungsstaat, 1988. 
O art. 98 II da Constituição de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental de 1947 exige 
«educação no espírito de uma democracia autêntica para o humanitarismo verda-
deiro»; art. 72 II da Constituição da Turingia de 1946 fala, de forma análoga, da 
«humanidade verdadeira». 
prensa de «informar a serviço do pensamento democrático sobre 
acontecimentos- condições, instituições e personalidades da vida pú-
blica de acordo com a verdade» 3 1. Por fim, devemos mencionar o art. 
42 IH da Lei Fundamental, importante no seu aspecto teórico-
democrático: «os relatos verídicos spbre as sessões públicas do Parla-
mento Federal e das suas comissões permanecem livres de toda e 
qualquer responsabilidade» 3 2. 
Desta forma, o princípio da democracia é fartamente citado, pois 
a democracia pluralista é a forma de Estado das «verdades relativas». 
Isso a diferencia toto coelo do protótipo do Estado totalitário. Assim 
não é nenhuma coincidência que os objetivos educacionais das jovens 
constituições estaduais alemãs após 1945 acolheram sucintamente a 
democracia nos seus cânones pedagógicos. Dessa forma, o art. 131 I I I 
da Constituição da Baviera de 1946 requer que os alunos «sejam edu-
Vgl. art. 11 I 1 da Constituição da Baviera de 1946. Interessante é o antigo 
projeto constitucional da Saxonia de 1990 (apud S. HEITMANN / A. VAATZ, 
Verfassung dzs Landes Sachsen {Gohrischer Entwurf), in: JöR 39, 1990, p. 439 
ff.), art. 19 I I I ß: «Ela (silicet, a radiodifusão) deve noticiar de acordo com a ver-
dade e de maneira adequada e exprimir a multiplicidade de opiniões de forma 
inalterada e apropriada». 
Vide a controvérsia sobre o conceito de «verdade» no Conselho Parlamen'war em 
K.~B. VON DOEMM-NG / R. W. FÜSSLEIN / W. MATZ, Entstehungsgeschichte 
der Artikel des Grundgesetzes,in: JöR 1, 1951, p. 365: verdade como conceito 
«relativo» ou «subjetivo» (deputados A. SCHÖNFELDER e H. RENNER) 
ou «objetivo» (deputado DR. C. SCHMID). Ademais, da literatura: H.-P. 
SCHNEIDER, in: Alternative Kommentar zum Grundgesetz für die 
Bundesrepublik Deutschland, 2" Ed., 1989, art. 42 Rdnr. 17; T. MA'JNZ, in: T. 
M A U N Z / G. DÜRIG / R. HERZOG, Grundgesetz Kommentar, Vol. I I , 4 a Ed., 
1960, art. 42, Rdnr. 33: «portanto, art. 42 I I I utiliza o conceito de verdade em sen-
tido objetivo». Clássico é o comentário do art. 30 do projeto da constituição de 
Weimar através de G. ANSCHÜTZ, Die Verfassung des Deutschen Reiches, 14a 
Ed., 1933, art. 30 Nr. 3: «conceitualmente importante é, sobretudo, a rigorosa 
materialidade, a objetividade»; art. 30 Nr. 4: «a crônica é fidedigna à verdade 
quando reproduz os debates de modo correto e integral». Outras referências: N. 
ACHTERBERG / M. SCHULTE, in: H. VON MANGOLDT / F. KLEIN, 
Grundgesetz, Alternativ-Kommentar, ?a Ed., 1991, art. 42 Rdnr. 55: Art. 42 Ol 
como «privilégio parlamentar», dedutível do «principio da publicidade dos debates 
parlamentares» do art. 42 I. Da praxis, por exemplo: Hanseatisches OLG Ham-
burg, in: AfP, 1977, p. 397 ff. 
39 
cados no espírito da democracia (...) e no sentido da reconciliação 
entre os povos»; c art. 56 IV da Constituição de Hesse de 1946 requer 
que as pessoas jovens sejam preparadas para «responsabilidade políti-
ca»; o art. 33 da Constituição da Renânia-Palatinado de 1947 fixa o 
objetivo educacional «livre convicção democrática no espírito da 
reconciliação entre os povos» e o art. 30 da Constituição do Sarre de 
1947 trata do «espírito liberal democrático». O desaparecimento do 
\ segundo Estado totalitário na Alemanha, da ditadura do Partido So-
cialista Unitário da Alemanha - SED e as juas «pretensões de ver-
dade», também se deixa espelhar perfeitamente nos objetivos edu-
cacionais das novas constituições estaduais da Alemanha Oriental. 
Como um objetivo educacional figura no art. 101 da Constituição da 
Saxônia de 1992 a «postura liberal democrática»; no art. 28 da 
Constituição de Brandemburgo de 1992 o «reconhecimento da de-
mocracia e da liberdade». Por fim, o art. 27 da Constituição da Tu-
ríngia de 1993 exige uma «apresentação verdadeira do passado» no 
ensino da história. 
As cláusulas de verdade também alcançam as «camadas mais 
.profundas» do Estado constitucional através das fórmulas de jura-
mento. Conhecida é a afirmação religiosa: «Tanto é verdade que Deus 
me ajude» (por exemplo, no juramento aos cargos de Primeiro-
Ministro e de Ministro 3 3). Ap contemplarmos o grau hierárquico infe-
rior das leis ordinárias, o espírito do Estado constitucional inspira o 
art. 7 I da Lei Orgânica da Corte Constitucional do Estado da Baviera 
de 1962 / 1990, o qual determina como fórmula de juramento para os 
membros deste corte: «Eu juro, (...) julgar com o melhor conheci-
mento e consciência, sem consideração da pessoa e servir apenas à 
verdade e à eqüidade, tanto é verdade que Deus me ajude». Um exem-
plo particular de um texto «vicinal à verdade» está presente, atual-
mente, na fórmula de juramento do juiz constitucional na República 
Tcheca. A sua nova constituição de 1992 determina: «Eu presto jura-
mento perante a minha honra e a minha consciência de que irei prote-
ger a inviolabilidade dos direitos humanos inatos e dos direitos fun-
Vgl. art. 100 da Cons t i tu ição da Renân ia -Pa la t inado de 1947, art. 89 da 
Cons t i tu ição do Sarre de 1947. 
damentais do cidadão (...) e decidirei de modo independente e impar-
cial de acordo com a minha melhor convicção» 3 4. 
De outros textos constitucionais sobre questões Eelativas à verdade 
são mencionáveis, a partir do direito parlamentar dos Estados-membros 
alemães, por exemplo, o art 15 II da Constituição da Schleswig-Holstein 
de 1990: «Ninguém deve ser chamado a responder pelos relatos verídicos 
sobre as sessões públicas do parlamento estadual ou de suas comissões». 
Art. 64 m da Constituição de Brandemburgo de 1992: «os relatos verídicos 
sobre as sessões públicas do parlamento estadual e as suas comissões per-
manecem livres de toda e qualquer responsabilidade». 
Semelhante também é o enunciado do art. 48 IV da Constituição 
da Saxônia de 1992. Esse princípio já se encontra no art. 22 II da 
Constituição da Baviera de 1946 e também no art. 90 da Constituição 
de Hesse de 1946. Trata-se aqui de um princípio comum ao direito 
parlamentar alemão, o qual tem a função de manter o processo de 
formação da vontade da democracia parlamentar livre e aberto35. 
Um acontecimento notável ocorreu em San Salvador no ano de 
1992. Lá, a «comissão da verdade», criada pelo Secretário-Geral das 
Nações Unidas com base no acordo de paz entre os partidos salvado-
rianos envolvidos na guerra civil, iniciou as suas atividades no verão 
de 199236. A essa comissão pertencem três notáveis estrangeiros, 
3 4 Vgl. art. 85 II da Cons t i tu ição da Repúbl ica Tcheca de 1992. 
3 5 i Da literatura: N. ACHTERBERG, Parlamentsrecht, 1984, p. 240 f.; H. K. KLEIN, 
Indemnität und Immunität, in: H.-P. SCHNEIDER / W. ZEH (Hrsgs.), 
Parlamentsrecht und Parlamentspraxis, 1989, p. 555 f f ; T. MEDER, Die 
Verfassung des Freistaates Bayern, 4* Ed., 1992, p. 133 e nota 4. No direito orça-
mentário vale o princípio da «transparência e verdade». A esse respeito: G. KISKER, 
Staatshaushalt, in: HdBStR, Vol. IV, 1990, p, 235, 266. Exatamente por causa dessa 
pretensão da verdade ou, respectivamente, de sua função, o Tribunal de Contas da Uni- \ 
ão tem, conseqüentemente, uma independência de seus juízes. Na opinião do autor, a 
máxima da verdade orçamentária está ancorada a nível constitucional. 
36 NZZ de 18 - 19 de Julho de 1992, p. 3. Ademais, a resolução do Parlamento Euro-
peu de 22 de abril de 1993 em relação ao relatório da comissão da verdade sobre as 
violações dos direitos humanos em El Salvador: EUROPÄISCHES PARLA-
MENT, Zum Bericht der Wahrheitskommir.sion über Meschenrechtsv er letzungen 
in El Salvador, in: EuGRZ, 1993, p. 227 f. Aqui também pertence a tese de M. 
GESTER, Die Frage nach der Wahrheit ist in Chile noch nicht beantwortet, behut-
sam sucht Aylwin den Ausgleich mit dem Militär, in: FAZ de 12 de agosto de 1993, 
como, por exemplo, um ex-presidente colombiano e o ex-presidente 
da Corte Interamericana de Direitos Humanos - Thomas Buergenthal 
(Estados Unidos da América). A comissão deve investigar os graves 
crimes contra a humanidade ocorridos durante a guerra civil. A lei de 
anistia promulgada anteriormente não abrange aquelas pessoas, as quais 
tenham participado de graves atos de violência, «dos quais as feridas na 
sociedade clamam rapidamente pelo conhecimento público da verdade». 
Com isso, San Salvador constituiu uma espécie de «comissão da verda-
de», a qual, com a ajuda de uma anistia, procura coordenar a transição da 
guerra civil e da ditadura para um Estado constitucional - taivez-também 
pelo fato de que os tribunais nacionais (ainda) estavam sobrecarregados. 
O caráter modelar para a Europa Oriental é evidente - desde que a comis-
são comprove a sua competência nos resultados práticos. 
Na história constitucional textual do direito parlamentar de in-
quérito, o conceito de «investigação ca verdade», até aonde podemos 
constatar, não figura literalmente a nível imperial ou, respectivamente, 
federal. Conforme a construção textual, o art 34 da Constituição de 
Weimar e c art. 44 da Lei Fundamental tratam das investigações, do 
levantamento de provas e etecetera37. Apenas em alguns poucos textos 
constitucionais dos Estados-Membros, o legislador constitucional se 
p, 3. A República da Africa do Sul também instalou uma «comissão da verdade» 
no verão de 1994, a qual deveria tratar de superar o passado e esclarecer os crimes 
da era do apartheid (Vgl. SZ de 8 de junho de 1994, p. 9); veja também:R. V O N 
LUCIUS, Mandela wül einen "Wahrheitsausschufi'\ in: FAZ de 19 de agosto de 
Í994, p. 6. Essa comissão deve controlar o processo de anistia para crimes políti-
cos nos anos do apartheid e da resistência armada, desde que os autures tenham 
relatados os seus atos anteriormente. A comisão ainda deve contribuir para que a 
dignidade das vítimas seja reestabelecida e para que elas recebam um certo ressar-
cimento. Na Guatemala também se planeja uma «comissão da verdade» (E.-M. 
BADER, Hoffhung fur Guatemala, in: FAZ de 31 de março de 1994, p. 14). Ela 
deve se empenhar no esclarecimento dos crimes. Enfim, uma «comissão da verda-
de» também foi instituída no Haiti (AFP, "Wahrheitsausschufl" in Haiti eingesetzt, 
in: FAZ de 22 de dezembro de 1994, p. 4). 
37 Comparável é a situação nas constituições estrangeiras: §51 da Constituição da 
Dinamarca de 1953: «insvestigação d.is situações de importância geral», art. 82 I 
da Constituição da Itália de 1947, art. 70 da Constituição da Holanda de 1983: «di-
reito de inquirição», art. 76 I da Constituição da Espanha de 19 78: «Comisior.es de 
investigación sobre cualquier asunto de interés público». 
42 
aproxima da instrução de regulamentar o descobrimento da verdade 
graças ao conceito de «fiabilidade»38. Esse cuidado não é nenhum 
acaso. Embora os legisladores constitucionais se esforcem em trazer 
as comissões de inquérito aos arredores do levantamento de provas 
judicial 3 9 , eles deixam reconhecer textualmente que a força de investi-
gação das comissões não é comparável às forças dos tribunais inde-
pendentes40. As comissões parlamentares de inquérito permanecem na 
composição e na função como parte do primeiro poder. O fato de que 
elas consideram os acontecimentos apreciados como «carentes de 
esclarecimento» 4 1, propõem-se ao «esclarecimento da situação»4 2 
prestam ao «escurecimento dos acontecimentos ocorridos dentro do âm-
bito de responsabilidade do governo, os quais indicam irregularidades»43, 
não deve iludir quanto ao seu dilema: são elas o «fórum da apuração da 
verdade ou da luta política»4 4? 
38 Assim afirma o §38 II da Constituição de Baden de 1919: «O Parlamento Estadual 
tem o Direito (. . .) de criar comissões para a investigação de fatos, quando a legali-
dade e a fiabilidade dos atos do governo sejam questionados». A formulação «le-
galidade ou fiabilidade» dos atos oficiais também pode ser encontrada no §46 II da 
Constituição de Oldenburgo de 1919, §23 I da Constituição da Turingia de 1921 e 
no art. 19 ü da Constituição de Danzig de 1922,tepud O. RUTHENBERG (Hrsg.), 
Verfassungsgesetze des deutschen Reichs und der deutschen Länder, 1926. 
39 Vgl. art. 41 II da Lei Fundamental, art. 82 II 2 da Constituição da Itália, art. 181 V 
da Constituição de Portugal. 
40 Por exemplo, art. 76 I 2 da Constituição da Espanha: «Sus conclusiones no serán 
, vineulantes para los Tribunales»; art. 44 IV GG. 
..y* Vgl. BVerfGE 49, 70, 85. 
4 2 Vgl. BVerfGE 76, 363, 384. 
4 3 Vgl. BVerfGE 77, 1,43. 
44 Vgl. R. KTPKE, Die Untersuchungsausschusse des deutschen Bundestages, 1985, 
p. 82 ff.; Ibidem, p. 89 com referências de que na prática do Parlamento Federal, as 
mais importantes inquirições estavam tão arraigadas aos interesses políticos dos 
partidos que acabam agindo «constantemente contra a pretenção da investigação 
objetiva da verdade». Veja também F. SCHÄFER, Parlamentarische Untersu-
chungs-ausschüsse - Eine Zwischenbilanz nach den Erfahrungen des „Steiner-
Ausschusses": Der Untersuchungs-ausschuß (I): Kampfstätte oder Gericht?, in: 
ZParl 4, 1974, p. 497 ff., e a discusão sobre o conceito «aura da semelhança juris-
dicional» de F. VOGEL (p. 510) assim como a questão se as comissões deveriam 
ser integradas por uma «facção neutra» (p. 519 f f ) . 
43 
Direito e praxis das comissões parlamentares de inquérito fonnam 
assim um campo temático, sobre o qual a questão da verdade sempre é 
juridicamente reexaminada. A possibilidade de votos especiais já de-
monstra certamente o quão difícil isso também e exatamente é para as 
comissões de inquérito: inspirada na busca da verdade, pesquisar a «ver-
dade material» com os meios do direito processual penal45. Recentemente 
os direitos das minorias estão sendo conscientemente reforçados nas co-
missões de inquérito - isso sobretudo nas novas constituições no leste da 
Alemanha46. No entanto, na praxis federal alemã, muitas comissões par-
lamentares de inquérito comprovaram-se menos como «comissões da 
verdade» do que meio da luta política4 7. Uma verdade forçada com a 
maioria certamente não é sempre a verdade «final». E, freqüentemente, as 
comissões de inquérito estão e permanecem («atoladas») sobre um cami-
nho muito longo na busca da verdade48. 
Recentemente se chegou na Alemanha a uma vitória espetacular do 
pensamento da verdade no âmbito parlamentar. Ern maio de 1993, o pre-
sidente do Partido Social-Democrata da Alemanha - SPD e candidato ao 
cargo de Primeiro-Ministro Björn Engholm foi obrigado a renunciar, 
porque ele, anos atrás (1987), tinha omitido conscientemente a verdade 
perante uma comissão parlamentar de inquérito em Schleswig-Holstein 
no escândalo Barschel-Pfeifer. Essa vitória da verdade em um caso isola-
do pode ser qualificada como um esperançoso êxito dc Estado constitu-
cional e de seus procedimentos obrigados à verdade na esfera pública. 
Que a mentira de Engholm (como outrora Franz Josef Strauß no escân-
dalo Spiegel de 1962) perante o parlamente tenha sido qualificada como 
uma falta especialmente grave de um político, honorifica a Alemanha 
4 5 Vgl. art. 44 I I GG. \ : ; r 
46 Vgl. art. 73 da Constiturçãcfde Brandemburgo de 1992; art. 54 da Constituição da 
Saxonia de 1992. 
4 7 Da literatura a esse respeito: N. ACHTERBERG, Parlamentsrecht, 1984, p. 455 ff. 
__e p. 697 
48 Característico sobre o trabalho das comissões de investigação: C. RICHTER, Eine 
I Wahrheit entsprechend dem Fraktionsverhältnis?', in: FA2 de 13 de junho de 
I 1994, p. 5; V. ZUSTROW, Mit der Wahrheit kämpft in Kiel ein jeglicher nach 
I seiner Art. N. Gansei enthüllt vor dem Untersuchungsausschuß, warum Enghalm 
gehen mußte, in: FAZ de 29 de setembro de 1993, p. 5. 
44 
unifi^da. O parlamento representa o povo. Considerando a inexistência 
de sanções jurídicas nesses casos, a renúncia política é indispensável49. 
Nos Estados Unidos da América o escândalo «Watergate» levou o presi-
dente Richard Nixon a renunciar em 1974 e fez com que um processo de 
«impeachment» fosse desnecessário. 
A nível internacional, um exame de direito comparado de outros 
textos que tratam da verdade conduz ao §16 da antiga Constitmção da 
Suécia (1809 - 197150): «O Rei deve salvaguardar e promover eqüidade e 
verdade assim como impedir e proibir coerção e injustiça (...)». O art 39 
da Constituição da Turquia de 198251 estabelece um «direito a prova da 
verdade»: «Nos processos dos crimes contra a honra, nos quais as decla-, 
rações se referem ao exercício das tarefas e dos serviços daquelas pessoas 
encarregadas de tarefas e serviços públicos, o réu tem o direito de apre-
sentar a comprovação da verdade para as suas declarações. Em todos os 
outros casos, a prova da verdade só é admissível, quando existir um inte-
resse público se o fato declarado é verdade ou inverdade (,..)»52. 
49 Recentemente,*Bärbel Bohley, ex-militante dos direitos civis na antiga República 
Democrática Alemã, exigiu uma verificação dos trabalhos da comissão de investi-
gação sobre o passado do ministro Stolpe em Brandemburgo, tendo em vista a par-
ticipação da proeminente senhora Fuchs e o seuj envolvimento em diversos escân-
dalos. A ex-militante expressou a sua satisfação ao afirmar «que em Brandemburgo, a 
mentira não vence sobre toda a verdade» (3. BOHLEY, "Lüge in Brandenburg", in: 
/ FAZ de 16 de Junho de 1993, p. 2). Veja também a crítica persistente ao relatório da 
maioria

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