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Produção de Celulose Bacteriana por Bactérias Acéticas Isoladas de Vinagres Utilizando Melaço de Soja Rodrigo José Gomes1, Paula C. S. Faria-Tischer2, Raúl J. Hernan Castro- Gómez1 e Wilma Aparecida Spinosa1 1Universidade Estadual de Londrina – Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos Caixa Postal 10.011 – CEP 86057-970 Londrina – Paraná - E-mail: rj.gomes25@gmail.com 2Universidade Estadual de Londrina – Departamento de Bioquímica e Biotecnologia Caixa Postal 10.011 – CEP 86057-970 Londrina – Paraná RESUMO O melaço de soja é um coproduto industrial, obtido durante o processamento da soja, especificamente após a produção do concentrado proteico a partir do farelo desengordurado. Neste trabalho teve-se como objetivo avaliar o potencial de síntese de celulose bacteriana por bactérias acéticas isoladas de indústria de vinagre, utilizando melaço de soja como substrato fermentativo. O melaço utilizado mostrou-se uma matéria-prima adequada para a biossíntese, aumentando a produção de celulose de 3,7 g L-1 obtido no meio de referência Hestrin-Schramm (HS) para 10,0 g L-1 no meio à base de melaço de soja. Além da diferença obtida na produtividade, a celulose produzida no melaço de soja apresentou maior taxa de reidratação, porém, menor capacidade de retenção de água do que a mesma celulose produzida no meio de referência, o que pode ser atribuído a diferenças na estrutura das membranas obtidas a partir de cada substrato. Palavras-chave: Bactérias acéticas. Fermentação. Melaço de soja. INTRODUÇÃO A celulose é um homopolímero linear, constituído de unidades repetidas de β-D- glicose, sintetizada por muitos organismos diferentes, incluindo plantas, algas e algumas bactérias. A produção microbiológica tem atraído interesse nos últimos anos devido às propriedades e características incomuns da celulose obtida. Embora possua a mesma fórmula química que a celulose vegetal, a celulose produzida por bactérias é descrita como uma fibra fina, de dimensões nanoméricas, cujo tamanho, pureza e cristalinidade dão a esta fibra propriedades distintas (DONINI et al., 2010). Diferentemente da celulose sintetizada por plantas, a qual é normalmente encontrada misturada com lignina e hemicelulose, a celulose obtida a partir de bactérias apresenta propriedades físico-químicas e mecânicas superiores, tais como: maior grau de pureza e índice de cristalinidade, maior grau de polimerização, melhor capacidade de absorção e retenção de água, maior resistência à tração, maior elasticidade e biocompatibilidade (MOHAMMADKAZEMI; AZIN; ASHORI, 2015). A celulose bacteriana representa uma alternativa promissora à celulose derivada de plantas e apresenta aplicações específicas na biomedicina, além de ser utilizada na indústria de alimentos, farmacêutica, de cosméticos entre outras (DONINI et al., 2010). A celulose bacteriana é excretada por vários gêneros e espécies de bactérias, Universidade Estadual de Londrina - Rodovia Celso Garcia Cid, Pr 445, Km 380 - Campus Universitário Caixa Postal 10.011 CEP 86057-970 Centro de Ciências Exatas - Departamento de Bioquímica e Biotecnologia Fone +55 (43) 3371.4270 - biq@uel.br porém, na maior parte dos estudos direcionados à produção utilizam-se as espécies do gênero Komagataeibacter devido à maior capacidade destas espécies em produzir celulose, em comparação com outras linhagens. Estas bactérias são estritamente aeróbias, Gram-negativas, catalase positivas e possuem a forma de bastonetes, podendo ocorrer de forma única, em pares ou em cadeias. São também microrganismos mesófilos e seu crescimento ótimo está situado entre 25 e 30 °C (SENGUN; KARABIYIKLI, 2011). O melaço de soja é um coproduto industrial, gerado durante o processamento da soja, especificamente após a extração do óleo e da produção do concentrado proteico de soja (CPS). Ele é obtido por concentração dos açúcares, utilizando uma solução extratora de etanol e contém cerca de 70% de sólidos solúveis. Estes sólidos, que consistem principalmente de carboidratos, são constituídos principalmente por sacarose, rafinose, estaquiose, glicose, frutose e galactose. O melaço de soja contém ainda quantidades significativas de proteínas, lipídeos, fibras e minerais (LONG; GIBBONS, 2013). Em função da sua composição, o melaço de soja pode ser reaproveitado na forma de meio de cultura para o cultivo de microrganismos, para obtenção de metabólitos de interesse industrial. Baseado nisto, o presente trabalho objetivou avaliar a capacidade de síntese de celulose bacteriana, por bactérias acéticas isoladas de indústria de vinagres, a partir de melaço de soja. MATERIAL E MÉTODOS O melaço de soja foi fornecido na forma concentrada (65–70 ºBrix) pela indústria produtora Selecta (Araguari – MG). As linhagens de bactérias acéticas utilizadas foram isoladas a partir de mostos de vinagres obtidos junto à empresa Tecnologia em Saúde Indústria de Alimentos (Assis – SP). A partir das linhagens produtoras de celulose obtidas nas etapas de isolamento e purificação, seguido de caracterização bioquímica, foram realizados testes de produção de celulose em meio à base de melaço de soja. Para isso, 10% de inóculo foram transferidos para frascos Erlenmeyers de 500 mL, contendo melaço de soja estéril, diluído a 20 ºBrix, e 2% de etanol de soja, esterilizado previamente em filtro de membrana PVDF 0,22 μm, totalizando o volume final de fermentação de 100 mL. Os frascos contendo o meio descrito e o inóculo foram incubados em estufa bacteriológica por 14 dias a 30±0,5 ºC, em condições estáticas. A produção de celulose no meio padrão ocorreu da mesma forma, transferindo-se 10% do inóculo para frascos Erlenmeyers contendo caldo Hestrin–Schramm (HS) estéril. As películas de celulose produzidas na superfície de cada meio foram recolhidas e aquecidas numa solução de NaOH 1M à 80 ºC por 30 minutos e lavadas em seguida com água destilada até o pH neutro para remoção da solução alcalina. As películas obtidas após o tratamento foram secas em estufa a 105 ºC até obtenção de peso constante, para determinação dos respectivos rendimentos, em peso seco. Para determinação da capacidade de retenção de água (CRA) das membranas, as amostras úmidas foram retiradas do recipiente de armazenamento e pesadas (PCBúmida). Em seguida, as amostras foram secas, a 60 ºC, durante 24 horas, até a remoção completa da água e pesadas novamente (PCBseca). A CRA foi obtida conforme equação abaixo: CRA = (PCBúmida - PCBseca) ÷ (PCBseca) Universidade Estadual de Londrina - Rodovia Celso Garcia Cid, Pr 445, Km 380 - Campus Universitário Caixa Postal 10.011 CEP 86057-970 Centro de Ciências Exatas - Departamento de Bioquímica e Biotecnologia Fone +55 (43) 3371.4270 - biq@uel.br Para determinação da taxa de reidratação, que representa o grau em que a água removida é restituída, as membranas secas anteriormente foram imersas novamente em água destilada até não haver mais aumento do peso das amostras reidratadas (PCBreidratada), sendo calculada conforme segue: TR (%) = ((PCBreidratada - PCBseca) ÷ (PCBúmida - PCBseca)) x 100 Os resultados de rendimento máximo de celulose bacteriana, CRA e TR das amostras produzidas foram comparados estatisticamente entre os substratos utilizados nas fermentações, por meio de análise de variância (ANOVA). Para isso, realizou-se o teste de Tukey, em nível de 5% de significância, utilizando o software estatístico R®. RESULTADOS E DISCUSSÃO Foram obtidas 5 linhagens de microrganismos produtores de celulose, classificados como bactérias acéticas com referência à dados constados na literatura (SIEVERS; SWINGS, 2005) após isolamento e caracterizaçãobioquímica. Conforme observado na Figura 1 e Tabela 1, o melaço de soja influenciou de forma significativa na produção de celulose para as cepas V03, V04 e V05, sendo esta última a que a apresentou a melhor produção de celulose (10 g L-1) e o aumento mais acentuado na produção em relação ao meio padrão (2,7 vezes). Em relação às características hidrofílicas, o uso do melaço de soja influenciou de forma significativa na capacidade de retenção de água das membranas produzidas pelas cepas V01, V04 e V05, e na taxa de reidratação das membranas V05 (Tabela 1). Conforme observado na Figura 2, as membranas de celulose produzidas no meio à base de melaço de soja pela cepa V05 foi a que apresentou a menor capacidade de retenção de água e maior taxa de reidratação. Esse resultado demonstra uma menor capacidade de adsorção de água pelas redes de celulose formadas durante a fermentação. Por outro lado, o aumento na taxa de reidratação destas fibras demonstra uma maior facilidade em recuperar a água removida no processo de secagem. Figura 1. Produção máxima de celulose bacteriana pelos microrganismos estudados. Universidade Estadual de Londrina - Rodovia Celso Garcia Cid, Pr 445, Km 380 - Campus Universitário Caixa Postal 10.011 CEP 86057-970 Centro de Ciências Exatas - Departamento de Bioquímica e Biotecnologia Fone +55 (43) 3371.4270 - biq@uel.br Figura 2. Capacidade de retenção de água (a) e taxa de reidratação (b) das membranas de celulose produzidas. Tabela 1. Teste de Tukey para os valores médios das características das membranas entre os substratos utilizados pelos microrganismos (melaço de soja e HS padrão). Universidade Estadual de Londrina - Rodovia Celso Garcia Cid, Pr 445, Km 380 - Campus Universitário Caixa Postal 10.011 CEP 86057-970 Centro de Ciências Exatas - Departamento de Bioquímica e Biotecnologia Fone +55 (43) 3371.4270 - biq@uel.br Microrganis mo Substrat o Máx. Produção (g L- 1)* C.R.A.1,* T.R.2,* V01 Melaço 2,2a ± 0,1 229,0a ± 47,3 2,0a ± 0,8 Padrão 2,2a ± 0,1 174,2b ± 26,6 2,4a ± 0,3 V02 Melaço 1,8a ± 0,2 233,8a ± 8,5 2,4a ± 0,7 Padrão 1,9a ± 0,1 210,5a ± 34,0 3,2a ± 1,5 V03 Melaço 3,0a ± 0,0 173,2a ± 16,4 1,9a ± 0,6 Padrão 2,4b ± 0,3 198,1a ± 10,1 1,2a ± 0,2 V04 Melaço 2,5a ± 0,1 155,6b ± 10,1 1,8a ± 0,4 Padrão 1,9b ± 0,3 261,6a ± 27,4 2,0a ± 0,4 V05 Melaço 10,0 a ± 0,5 57,5b ± 1,4 4,4a ± 0,2 Padrão 3,7b ± 0,2 162,1a ± 1,7 1,2b ± 0,1 A B * médias na mesma coluna seguidas de letras iguais, dentro de cada subdivisão, não diferem significativamente (p ≤ 0,05). 1 Capacidade de retenção de água. 2 Taxa de reidratação (%). CONCLUSÕES O melaço de soja utilizado como substrato fermentativo mostrou-se adequado para a produção de celulose bacteriana. Por ser um meio complexo, contendo quantidades significativas de carboidratos e proteínas, além de minerais, o melaço de soja pode ser uma matéria-prima atraente, com possibilidade de fornecer maiores rendimentos de fermentação, comparado ao meio padrão de produção. Os microrganismos estudados mostraram variação na capacidade de síntese de celulose e nas propriedades das membranas de celulose produzidas, demostrando que essas características podem variar de uma espécie para outra. A cepa V05 apresentou alto rendimento na produção de celulose a partir de melaço de soja, mas as mesmas apresentaram menor capacidade de retenção de água e maior taxa de reidratação, demonstrando que o tipo de substrato influencia na estrutura e propriedades das membranas. Agências de Fomento: CNPq REFERÊNCIAS DONINI, I. A. N.; DE SALVI, D. T. B.; FUKUMOTO, F. K.; LUSTRI, W. R.; BARUD, H. S.; MARCHETTO, R.; MESSADDEQ, Y.; RIBEIRO, S. J. L. Biossíntese e recentes avanços na produção de celulose bacteriana. Eclética Química, São Paulo, v. 35, n. 4, p. 165-178, 2010. LONG, C. C.; GIBBONS, W. R. Conversion of soy molasses, soy solubles, and dried soybean carbohydrates into ethanol. International Journal of Agricultural and Biological Engineering, v. 6, n. 1, p. 62-68, mar. 2013. MOHAMMADKAZEMI, F.; AZIN, M.; ASHORI, A. Production of bacterial cellulose using different carbon sources and culture media. Carbohydrate Polymers, v. 117, p. 518-523, mar. 2015. SENGUN, I. Y.; KARABIYIKLI, S. Importance of acetic acid bacteria in food industry. Food Control, v. 22, n. 5, p. 647-656, maio 2011. SIEVERS, M.; SWINGS, J. Family II. Acetobacteraceae. In: BRENNER, D. J.; KRIEG, N. R.; STALEY, J. T.; GARRITY, G. M. Bergey’s Manual of Systematic Bacteriology: The Alpha-, Beta-, Delta-, and Epsilonproteobacteria. 2nd. ed. New York: Springer, 2005. v. 2. Universidade Estadual de Londrina - Rodovia Celso Garcia Cid, Pr 445, Km 380 - Campus Universitário Caixa Postal 10.011 CEP 86057-970 Centro de Ciências Exatas - Departamento de Bioquímica e Biotecnologia Fone +55 (43) 3371.4270 - biq@uel.br Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)
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