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Dos crimes contra a propriedade intelectual

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O Código penal em seu título III contempla os crimes contra a propriedade imaterial, no qual em seu capítulo I dispõe acerca dos crimes contra a propriedade Intelectual.
Algumas considerações preliminares são cruciais, como a não confusão entre bens pessoais e bens imateriais. 
Edgard Magalhães Noronha sintetiza: “não se confundem os bens exclusivamente pessoais com os imateriais. Se os primeiros, como a honra, a liberdade etc., não se separam da pessoa humana e não possuem valor econômico, não há negar que o mesmo não sucede com os segundos, que se destacam do indivíduo, uma vez concretizados numa coisa ou nela projetados”. É o que, por exemplo, observa-se na criação de músicas, em que as melodias e letras representadas na consciência do autor são exteriorizadas, expressando uma obra artística, no qual o seu criador tem direito sobre a sua produção intelectual. É uma espécie de emanação da personalidade do autor.
Dessa forma, o artigo 184 do Código Penal trata da violação de direito autoral. Os Direitos autorais abrangem os direitos morais que não são suscetíveis de alienação, são imprescritíveis e irrenunciáveis e os direitos patrimoniais que são aqueles que dizem respeito a uma exploração econômica sobre uma obra literária, artística ou científica. 
Para Nélson Hungria, há de se ponderar que os crimes em questão, além da ofensa de interesses patrimoniais, acarretam prejuízo a um especial interesse moral, que, em certos casos, a lei julga merecedor, até mesmo por si só, da tutela jurídica. Daí decorre o motivo do crime não ser tratado no título II do CP, uma vez que os crimes contra o patrimônio ficaram restringidos aos fatos violadores a bens materiais ou perceptíveis pelos sentidos, enquanto que a violação ao direito autoral abrange a tutela da exteriorização de criação intelectual concretizada através de obras literárias, artísticas ou cientificas. 
Segundo Piola Caselli, considerar o direito de autor simplesmente como instituto de direito patrimonial, consiste na apreciação unilateral e inexata da natureza da obra intelectual. A obra do engenho, diz o autor, é, certamente, um bem e apresenta, como tal, uma “objetividade externa”. Mas este bem é essencialmente diverso de qualquer outra espécie de bens, sob duplo aspecto. Em primeiro lugar, porque permanece sempre, senão compreendido na esfera da personalidade de seu autor ou criador, pelo menos ligado de modo constante a essa esfera da personalidade, que determina o nascimento e a extensão da relação jurídica, de que esse bem constitui objeto. Em segundo lugar, esse bem, ao contrário de todos os outros bens patrimoniais, é representativo da personalidade do autor nas relações sociais. 
O art.184 do CP trata-se de uma norma penal em branco em sentido amplo ou homogênea que é complementado pela lei 9.610/98.
Diante de tais considerações preliminares há de se mencionar as classificações doutrinárias.
A propriedade intelectual é o bem juridicamente protegido pelo tipo penal do art. 184, no sentido de proteger o interesse moral e econômico do autor de obra literária, artística ou científica. A obra literária, artística ou científica é o objeto material do delito.
O crime de violação de direito autoral consiste no fato de o agente “violar direitos de autor e os que lhe são conexos” (CP, art. 184). Trata-se de norma penal em branco em sentido amplo, que deve ser complementada por outra norma de nível idêntico, qual seja: a Lei dos Direitos Autorais (Lei 9.610, de 19 de fevereiro de 1998). O direito autoral disciplina a atribuição de direitos relativos às obras literárias, científicas e artísticas, englobando o direito do autor e os chamados direitos conexos do direito de autor (direitos dos artistas, intérpretes ou executantes, dos produtores de fonogramas e dos organismos de radiodifusão) 
É um crime comum quanto ao sujeito ativo e próprio em relação ao sujeito passivo, pois somente o autor da obra literária, artística ou científica, seus herdeiros e sucessores ou o titular do direito sobre a produção de outrem podem figurar nessa condição; plurissubsistente (costuma se realizar por meio de vários atos), comissivo (decorre de uma atividade positiva do agente “violar”) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (quando o resultado deveria ser impedido pelos garantes – art. 13, § 2º, do CP), de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio de execução), formal (se consuma sem a produção do resultado naturalístico, embora ele possa ocorrer), instantâneo(a consumação não se prolonga no tempo), monossubjetivo (pode ser praticado por um único agente), simples (atinge um único bem jurídico, a propriedade imaterial da vítima). 
8. Consumação e tentativa A violação de direito autoral é crime formal (ou de consumação antecipada), cuja consumação não depende do resultado naturalístico, embora ele possa ocorrer. Consuma-se, portanto, em momentos distintos, de acordo com as seguintes modalidades de conduta: (1) Na hipótese prevista no caput, com a efetiva violação; (2) No caso do § 1º, com a reprodução total ou parcial da obra intelectual ou do fonograma; (3) Na hipótese do § 2º, quando o agente distribui, vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta ou tem em depósito a reprodução feita com violação de direito autoral; (4) No caso do § 3º, quando o agente oferece ao público a obra ou produção alheia, ainda que a mesma não seja aceita por ninguém. A tentativa é possível em todas as figuras. 
Elemento subjetivo: É o dolo, consistente na vontade livre e consciente de o sujeito violar o direito autoral praticando uma das condutas previstas no tipo penal (caput e §§). Nas figuras qualificadas (§§ 1º a 3º), exige-se, ainda, o especial fim de agir contido na expressão “com o intuído de lucro direito ou indireto”. O tipo penal é exclusivamente doloso, não admite a modalidade culposa. 
O art. 184, § 2º, do CP tipifica diversos comportamentos criminosos relativos à violação de direitos autorais cometida com intuito de lucro.
A prática desse crime é extremamente difundida, tanto que se multiplicaram as postulações para que sua atipicidade fosse reconhecida em virtude da aceitação social da conduta criminosa, utilizando como sustentação o princípio da adequação social ou que fosse reconhecido o princípio da insignificância, porém o STF não admitiu o reconhecimento desses princípios. STF HC 98898, julgado em 20/04/2010.
Consubstanciando tal endentimento o Ministro do STJ Rogério Schietti Cruz, no recurso especial nº 1.485.832 – MG não admitiu nem o princípio da insignificância, tampouco o princípio da adequação social. 
Já o Professor André Estefam explica: "Há quem sustente cuidar-se a venda por ambulantes de CDs ou DVDs 'piratas' de fato penalmente atípico, com base nos princípios da insignificância e adequação social. Ocorre, porém, que eventual leniência quanto ao comportamento assinalado não conduz à sua atipicidade. Além do mais, a bagatela da conduta somente pode ser reconhecida quando presentes os quatro vetores exigidos pela Suprema Corte: ausência de periculosidade social, reduzida reprovabilidade, mínima ofensividade e ínfima lesividade. De acordo com o Superior Tribunal de Justiça, ainda: 'Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no art. 184, §2º, do CP, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas' (Súmula n. 502)." 
Dessa forma, pacificou-se tal questão no STJ o que acabou resultando na edição da súmula nº 502 STJ, que ratifica a tipicidade.
Súmula 502 do STJ - Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no art. 184, § 2º, do CP, a conduta de expor à venda CDs e DVDs “piratas”.
Conforme explicações do Professor Rogério Sanches, normalmente, a apuração desse crime decorre de operações policiais realizadas nos locais onde se concentram os indivíduos que vendem CD’s e DVD’s reproduzidos irregularmente. Os produtos apreendidos, que constituem o corpo de delito, são examinados por peritos, que constatam se realmente
se trata de falsificação.
Ocorre que, não raras vezes, as autoridades policiais apreendem centenas ou milhares de exemplares com apenas um agente. Para agilizar a apuração do crime, normalmente os exames periciais são feitos por amostragem, ou seja, sobre parte dos produtos apreendidos, não sobre a totalidade.
Em razão disso, multiplicaram-se as postulações para afastar a caracterização do crime nas situações em que a perícia não tivesse sido feita sobre todos os produtos, pois, segundo argumentavam, isso contrariava o art. 158 do Código de Processo Penal. A Defensoria Pública questionou a validade dessa perícia, afirmando que o art. 530-D do CPP exige que a perícia seja feita sobre TODOS os bens apreendidos, não podendo ser realizada por amostragem;
A tese, no entanto, não prosperou. O STJ decidia reiteradamente que a materialidade delitiva do art. 184, § 2º, do CP poderia ser determinada apenas por meio do exame pericial por amostragem. Entender de forma diversa apenas dificultaria a apuração do delito e retardaria o término do processo judicial, em inobservância ao princípio constitucional da razoável duração do processo. Para sedimentar esta orientação, o tribunal editou a súmula nº 574.
Súmula 574 do STJ: Para a configuração do delito de violação de direito autoral e a comprovação de sua materialidade, é suficiente a perícia realizada por amostragem do produto apreendido, nos aspectos externos do material, e é desnecessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados ou daqueles que os representem.
Assim, a exigência do legislador de que a perícia seja realizada sobre todos os bens apreendidos se presta, na verdade, não para fins de comprovação da materialidade delitiva, mas para fins de dosimetria da pena, mais especificamente para a exasperação da reprimenda-base, uma vez que se mostra mais acentuada a reprovabilidade do agente que reproduz, por exemplo, com intuito de lucro, 500 obras intelectuais do que aquele que, nas mesmas condições reproduz apenas 20.
Dissertando sobre o § 3º do art. 184, Guilherme de Souza Nucci, com precisão, assevera: “É perfeitamente possível a violação do direito de autor através da internet, por exemplo, valendo-se o agente do crime do oferecimento ao público, com intuito de lucro, de música, filmes, livros e outras obras, proporcionando ao usuário que as retire da rede, pela via de cabo ou fibra ótica, conforme o caso, instalando-as em seu computador. O destinatário da obra (lembremos que há livros inteiros que podem ser captados na internet, instalando-os no disco rígido do computador para leitura) paga pelo produto, mas o valor jamais chega ao autor. Assim, o fornecedor não promove a venda direta ao consumidor do produto (que seria figura do parágrafo anterior), mas coloca em seu site, à disposição de quem desejar, para download as obras que o autor não autorizou expressamente que fossem por esse meio utilizadas ou comercializadas.”
No que diz respeito ao § 4º do art. 184, salienta Nucci: “Observa-se que o legislador pretendeu autorizar a cópia de obra intelectual ou fonograma, quando feita em um só exemplar, para uso privado do copista, desde que não haja intuito de lucro. Ora, todos os tipos incriminadores previstos nos §§ 1º, 2º e 3º, para tornarem-se aplicáveis a fatos concretos, exigem a presença do intuito de lucro direto ou indireto. Logo, não havendo o elemento subjetivo específico, o fato é atípico. Por isso, o disposto no § 4º deste artigo é desnecessário.” 
Nos termos do art. 186 do diploma repressivo, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 10.695, de 1º de julho de 2003, procede-se mediante: I – queixa, nos crimes previstos no caput do art. 184; II – ação penal pública incondicionada, nos crimes previstos nos §§ 1º e 2º do art. 184; III – ação penal pública incondicionada, nos crimes cometidos em desfavor de entidades de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder Público; IV – ação penal pública condicionada à representação, nos crimes previstos no § 3º do art. 184. Para a hipótese constante do caput do art. 184 do Código Penal, será competente, inicialmente, o Juizado Especial Criminal, haja vista tratar-se, in casu, de infração penal de menor potencial ofensivo, podendo-se levar a efeito, ainda, proposta de suspensão condicional do processo.

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