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Ensaio Criminologia - MINORITY REPORT

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MINORITY REPORT –
O CRIME FUTURO E O DELINQUENTE DO PASSADO
Leonardo Sousa dos Santos de Moura[1: Graduando em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia.]
Victor Rodrigues Nascimento Vieira[2: Graduando em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia.]
Sumário: 1.Introdução 2. A ciência como chave para a prevenção dos crimes 3.Ficção e vida real 4. Invasão de privacidade – vale tudo para prevenir crimes ?
5.Considerações Finais
RESUMO
Este ensaio examina o filme Minority Report, de Steven Spielberg, em conjunto com a obra de Cesare Lombroso, L’Uomo Delinquente, como pontos de partida para um debate de relevantes temas, no âmbito da Criminologia e do Direito Penal, de especial interesse aos que se sensibilizam com o equilíbrio entre a eficácia da prevenção do crime e as garantias do estado democrático de direito, em meio aos clamores sociais e políticos contemporâneos.
PALAVRAS CHAVES
Criminologia. Minority Report. Cesare Lombroso. Prevenção do crime. Controle Social. Fins da pena. Justiça criminal. Periculosidade. Prevenção. Neutralização. Garantias Individuais. Direito e cinema.
INTRODUÇÃO
No ano de 2054, surge uma divisão pré-crime no departamento de polícia da cidade de Washington, cujo principal objetivo é prever crimes e deter os criminosos antes que eles cometam o delito, poupando as possíveis vítimas de um trágico destino. Parece ficção, e realmente é, afinal essa é a premissa basilar do filme Minority Report, lançado em 2002, sendo estrelado por Tom Cruise e dirigido por Steven Spielberg. 
O filme foi um sucesso de público e crítica ao retratar a história de John Anderton, líder da divisão pré-crime da polícia, responsável por gerenciar a atividade dos precogs, paranormais que só trabalham em conjunto, e simbioticamente têm uma visão, e a partir dela os computadores cruzam os dados até chegarem ao nome da vítima eminente e do culpado em potencial, enquanto imagens do crime e a hora exata em que ele irá ocorrer surgem nos monitores da equipe de policiais de elite que atuam no setor, para que eles intervenham no destino dessas pessoas e garantam a paz social.
“Um mundo sem assassinatos”, seria o paraíso na Terra, mas a ficção científica nos leva à uma reflexão mais profunda: é justo punir um indivíduo por um crime que ele sequer cometeu? Em meio à computação gráfica, explosões, lutas coreografadas, rostos hollywoodianos e todas as praxes que um bom blockbuster norte-americano possui, o longa-metragem traz em sua essência a necessidade de encontrar o equilíbrio entre a eficácia da prevenção dos crimes e as garantias presentes em um Estado Democrático de Direito, e esse é o tema que será abordado ao longo desse texto.
No escopo do presente ensaio, serão abordadas as principais questões concernentes ao tema supracitado, tratando desde a busca histórica por uma solução lógico-científica dos crimes do século XIX, presente nas obras de autores como Cesare Lombroso, Rafaele Garofalo e Enrico Ferri, até a sua decadência nos inícios do século XX, passando também pelos novos dilemas contemporâneos como a tênue linha que separa vigilância e invasão de privacidade dos indivíduos, bem como qual é o perfil do criminoso contemporâneo, ou melhor, qual é a cara dos encarcerados brasileiros
A CIÊNCIA COMO CHAVE PARA A PREVENÇÃO DOS CRIMES 
O Direito Penal é um instrumento que está quase sempre atrasado em relação à proteção do bem jurídico tutelado, pois é acionado justamente quando esse é colocado em risco. a prevenção efetiva dos crimes é um dos maiores desafios desse ramo do Direito, pois ao mesmo tempo que faz-se necessária, precisa estar alinhada com uma série de princípios e regras, como por exemplo o princípio da lesividade e pela proibição de punição dos atos preparatórios. [3: Nesse sentido, Cristiano Rodrigues afirma que: O princípio da lesividade possui uma grande função prática, que se refere tanto à primeira ótica, abstrata e direcionada ao legislador, quanto à segunda ótica, mais concreta e direcionada ao aplicador da norma na avaliação das condutas humanas. Então, vamos analisá-la para poder delimitar suas consequências.Função decorrente do princípio da lesividade: Proibir a incriminação de fatos internos (sentimentos, emoções, vontades, desejos) e de condutas que não ultrapassem a esfera do próprio agente, ou seja, que não afetem bem jurídico de terceiro. Desta forma, o princípio da lesividade desempenha uma função essencial para a própria manutenção do Estado Democrático de Direito, pois impede que um crime seja criado com base apenas em interesses do Estado, ou de certas pessoas, evitando que, por meio do Direito Penal, haja qualquer tipo de perseguição ou discriminação. (RODRIGUES, pg.25, 2012).]
A prevenção de crimes não é uma busca recente da humanidade, diversos intelectuais ao longo dos séculos criaram teorias que objetivavam a preservação da paz social ao se evitar a consumação dos crimes, nesse contexto é que a Criminologia foi dando os seus primeiros passos, desde a antiguidade até chegar ao status quo contemporâneo. Nesse caminho, ainda que hoje seja bastante discutível e rechaçado, é preciso passar pelos trabalhos de Cesare Lombroso (1835-1909), que junto com Rafaele Garofalo (1852-1934), Enrico Ferri (1856-1929) e outros teóricos, tentaram construir uma abordagem mais científica do crime, num contexto onde a ciência era a protagonista de grandes mudanças e avanços globais, não parecia uma má ideia valer-se dela para o progresso também dos estudos criminais. [4: Marcos César Alvarez assevera que: “Para Lombroso, a antropologia criminal era um grande empreendimento intelectual, sendo seus próprios trabalhos apenas o início da construção desse ambicioso edifício científico. Entre os autores que compartilharam das ambições do pai da antropologia criminal, os nomes de Ferri e Garofalo são geralmente destacados. Desse modo, Lombroso, Garofalo e Ferri formam juntos os pilares intelectuais do movimento que ficou conhecido como "Escola Positiva", "Escola Determinista" ou "Escola Italiana" de direito penal10, e que consolidou a definição mais geral da criminologia11 como a ciência voltada para o estudo do homem delinqüente. (ALVAREZ, pg.2, 2002).]
Para isso, seria preciso uma ruptura em relação à Escola Clássica, em construção desde o século XVIII, pautado sobre os alicerces construídos por Cesare Beccaria (1738-1794) e Jeremy Bentham (1748-1832), para que emergisse assim uma Escola Positiva, que rejeitava uma visão puramente legal do crime, para pôr em voga o determinismo, e propor um tratamento científico do criminoso. Se em 2054, na ficção científica estrelada por Tom Cruise tem se uma mixórdia de tecnologia e atividades paranormais de videntes, Lombroso buscava na medicina, calcado em teorias evolucionistas, positivistas e materialistas, a chave para uma sociedade sem crimes: com muito estudo e observações em laboratório seria possível traçar o perfil de um “criminoso nato”, já que acreditava que o comportamento dos indivíduos eram biologicamente determinados, logo poder-se-ia prever quem seriam os futuros criminosos, era preciso apenas traçar um minucioso perfil desde ser nefasto. [5: Em sua obra, Lombroso afirma que existe uma força irresistível ao crime em alguns indivíduos: “Como tudo isso se encontra exatamente nos criminosos, já mostrei com as estatísticas na mão e com a observação de outros; e melhor teria podido, só recolhendo as confissões deles. Assim me disse um ladrão: ‘Nós temos o furto no sangue; se vejo uma agulha não posso fazer de menos de pegá-la, ainda que depois esteja disposto a restituí-la’. O gatuno Bruno me disse que tendo roubado desde os doze anos pela estrada, roubado no colégio, estava na impossibilidade de abster-se do furto, ainda que estivesse com o bolso cheio. Se não, era difícil dormir e à meia-noite é constrangido a roubar o primeiro objeto que lhe venha à mão. Deham confessava a Lauvergne uma paixão irresistível pelo furto. Dizia: ‘Não mais roubar seria pra mim como não mais viver.O furto é uma paixão que arde como o amor, e quando o sangue me sobe à cabeça e me vai aos dedos, creio que roubaria a mim mesmo, se pudesse” (LOMBROSO, pg.220, 2007).]
Lombroso aos poucos lançou as bases da sua teoria evolucionistas atávica, que seria reaparição em um descendente de caracteres de um ascendente remoto e que permaneceram latentes por várias gerações, sinais anatômicos determinariam quem seriam aqueles indivíduos destinados ao crime, logo detê-los e vigiá-los antes mesmo que apresentassem qualquer comportamento suspeito, pouparia a sociedade das mazelas criminais que até hoje assolam as sociedades. O crime estaria reduzido a praticamente um fenômeno natural.
Se hoje assusta o público em geral tais ideias, à época elas pareciam bastante razoáveis e bem fundamentadas, tanto que a publicação L’Uomo Delinquente, de Cesare Lombroso, publicada em 1876 foi um sucesso, sendo reeditada inúmeras vezes em solo italiano, além de ter sido traduzida para diversos países, sendo reverenciado por intelectuais de diversas nações, e a cada nova edição o autor trazia dados científicos que tornavam suas teorias ainda mais robustas. O autor vivia o seu auge.
Lombroso foi acompanhado em sua época por teóricos como; Rafaele Garofalo, magistrado, que tratou em sua obra sobre as reformas práticas da justiça criminal e das instituições legais, embaso sob os ditames do Darwinismo social, afirmando que fatores sociais possuíam papel secundário na etiologia criminal, a pena deveria se referenciar nas características particulares do criminoso. Enrico Ferrari, é o terceiro pilar dessa Escola Positivista, professor de Direito Penal, contrariava as ideias dos demais pois levava em consideração fatores sociais na etiologia do crime, mas nem por isso abandonava os fatores individuais e físicos presentes nas obras de seus pares, classificava os criminosos em: natos, passionais, ocasionais e habituais. [6: Segundo a classificação de Enrico Ferrari tem-se: “Criminoso Nato: Degenerado, com os estigmas de Lombroso, atrofia do senso moral (Macbeth, de Shakespeare); aliás, a expressão "criminoso nato" seria de autoria de Ferri e não de Lombroso, como erroneamente se pensava. Criminoso Louco: Além dos alienados, também os semiloucos ou fronteiriços (Hamlet, de Shakespeare). Criminoso Ocasional: Eventualmente comete crimes, "o delito procura o indivíduo". Criminoso Habitual: Reincidente na ação criminosa, faz do crime sua profissão, seria a grande maioria, a transição entre os demais tipos; começaria ocasionalmente até degenerar-se. Criminoso Passional: Age pelo ímpeto, comete o crime na mocidade; próximo do louco, tempestade psíquica (Otelo, de Shakespeare).” Ler mais em: http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,classificacao-dos-criminosos-na-criminologia,53236.html]
Por trás de todas essas teorias, o desejo de prever os crimes e identificar criminosos em potencial. Em Minority Report, tudo parecia estar indo bem, até que John vê através dos precogs que cometerá um assassinato em pouco menos de um dia e meio, esse acontecimento faz o protagonista perceber que esse sistema ultra tecnológico também poderia ter falhas, e a chave da sua inocência está na descoberta de um relatório menor (o tal Minority Report), um documento mostrando um estranho caso onde o sistema pré crime falhou, pois cada precog teve uma visão diferente. Se na ficção de 2054 essa confiança exacerbada na ciência não funcionou, nos fins do século XIX e início do século XX as obras de Lombroso passaram a sofrer duras críticas de seus contemporâneos. Muitos o acusavam de manipular suas observações para que elas corroborassem com seus pensamentos, forçando a ciência a se adequar com a sua própria mentalidade, logo seus experimentos foram impregnados de parcialidade e não deveriam ser levados em consideração, logo os pressupostos da antropologia criminal caíram por terra e junto com eles a reputação de seus defensores.[7: Paolo Marchetti observa a necessidade de se adaptar o desfecho original do livro homônimo que deu base ao filme, para não frustrar as plateias mundo afora: “Beyond the different plot of the movie and of the novel, one thing unites them: the consciousness that to foretell a human action, no matter how many means you have, is not such a foregone fact. By the way, in Dick’s novel, at the end, Capitan Anderton frustrates the scheme, but this will cost him exile from planet Earth. In Spielberg’s movie the heroic Tom Cruise, not only frustrates the scheme, but he is also able – after having contributed to demolish Precrime – to re-form his family and to have a second baby, after the first one disappeared, some time before, without trace. But what do you expect? Hollywood claims its own happy endings.” (MARCHETTI, pg.12, 2011).]
FICÇÃO E VIDA REAL
A história já provou, por um lado, que a teoria de Lombroso não tinha sustentação científica suficiente para ser levada a sério ao se elaborarem políticas criminais e, por outro lado, a ciência ainda não nos deu sinais de que será possível prever o futuro - e os crimes com os precogs - tão cedo.
Pois bem, já relembramos o passado levando em conta a obra de Lombroso e também já fizemos considerações a respeito do futuro, analisando o filme Minority Report. E quanto ao presente, podemos dizer que no Brasil existe uma focalização do encarceramento sobre grupos sociais específicos? Podemos dizer que o Brasil tem um perfil de criminoso já traçado? Podemos prever a constituição dos gráficos de encarceramento para daqui alguns anos? Acreditamos que a resposta para todas as indagações é sim e é a respeito destas questões que queremos fazer breves comentários a partir de então.
Entretanto, antes de iniciar a discussão mencionada acima, é necessário que se coloque luzes sobre algumas questões que envolvem o Brasil, que será o foco da discussão sobre ficção e vida real. Segundo dados publicados em 2015, do Sistema Integrado de Informação Penitenciária (InfoPen), em 2012 60,8% da população prisional era negra e quanto mais cresce a população prisional no país, mais cresce o número de negros encarcerados. Ainda segundo o InfoPen, os presos do sistema penitenciário brasileiro são majoritariamente jovens, pobres e de baixa escolaridade.[8: Segundo dados do Sistema Integrado de Informação Penitenciária (InfoPen), os jovens representam 54,8% da população carcerária brasileira. Em relação aos dados sobre cor/raça verifica-se que, em todo o período analisado (2005 a 2012), existiram mais negros presos no Brasil do que brancos. Em números absolutos: em 2005 havia 92.052 negros presos e 62.569 brancos, ou seja, considerando-se a parcela da população carcerária para a qual havia informação sobre cor disponível, 58,4% era negra. Já em 2012 havia 292.242 negros presos e 175.536 brancos, ou seja, 60,8% da população prisional era negra. Constata-se, assim, que quanto mais cresce a população prisional no país, mais cresce o número de negros encarcerados.][9: O número de jovens no sistema prisional supera a proporção de jovens da população brasileira: enquanto os jovens representam 56% da população prisional, as pessoas dessa faixa etária compõem 21,5% da população total. (ESTADO, 2015)][10: O levantamento também constatou que é muito baixo o grau de escolaridade da população prisional brasileira: cerca de 53% dos presos possuem ensino fundamental incompleto. (ESTADO, 2015)]
De posse desses dados e residindo no Brasil, provavelmente Lombroso chegaria, sem muito esforço, a conclusão de que o perfil do criminoso no país está traçado e é o jovem, de pele negra, pobre e com baixo nível de instrução formal. Com a construção desse perfil John Anderton, líder da divisão pré-crime nem necessitaria de precogs para evitar os crimes, bastaria convocar uma força tarefa para fazer uma visita às favelas e periferias das cidades.
Mas antes que Lombroso e Anderton façam uma força tarefa de homens de bem e saiam por ai caçando os marginais, é preciso relembrar sobre que estrutura o Brasil foi construído. Para isso, não precisamosir longe e podemos citar que o nosso país se sustenta sobre 300 anos de escravidão, que somos um dos países com a maior desigualdade social do mundo, que as ditas elites de hoje são resquícios das mesmas famílias que outrora eram a aristocracia e os detentores de terras dos tempos coloniais e que o perfil dos nossos governantes é de um homem, branco, na faixa dos 50 anos, com formação superior e patrimônio declarado acima de R$ 1 milhão. Ora, olhando a partir dessa perspectiva, não é novidade nenhuma que temos a criminalização de grupos como o de negros, pobres e jovens e que estes são o foco do encarceramento no país. [11: SARDINHA, Edson. A face e os números do novo Parlamento. 2015. Disponível em: <http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/a-face-e-os-numeros-do-novo-congresso/>. Acesso em: 29 set. 2016.]
Podemos depreender disso tudo que o encarceramento em massa provavelmente continuará, tendo em vista o retrocesso em matéria legislativa que o país vem sofrendo, com o Congresso mais corrupto e conservador da história, bem como o percentual de jovens, negros, pobres e pessoas de baixa escolaridade só tende a crescer devido à seletividade penal e à conduta dos mecanismos de controle social formal como a polícia, o Ministério Público e o Sistema de Segurança Pública.[12: Sabe-se que a aplicação desigual de regras e procedimentos judiciais a indivíduos de diferentes grupos sociais é, desde a década de 1980, tema recorrente em vários estudos das ciências sociais brasileiras. No que se refere ao campo da justiça criminal, destacam-se os estudos pioneiros de Edmundo Campos Coelho (1987), Ribeiro (1995), Sam Adamo (1983) e Boris Fausto (1984). As conclusões destes autores apontaram que, em relação à seletividade racial, nos períodos analisados, aos negros eram aplicadas penas mais severas comparativamente aos brancos. (REPÚBLICA; JUVENTUDE, 2015)]
INVASÃO DE PRIVACIDADE – VALE TUDO PARA PREVENIR CRIMES ?
Outra questão que nos chama a atenção no filme, diz respeito aos limites (ou a falta deles) que se impõe quando se busca prevenir os crimes. Em uma das cenas iniciais do longa, o Detetive Ed Witwer questiona o Detetive John Anderton se a divisão pré-crime prendia as pessoas mesmo sem elas terem cometido crimes e ainda pergunta se os agentes têm a certeza de que os supostos criminosos cometeriam algum delito. O Detetive John Anderton responde afirmativamente às duas perguntas, entretanto o Oficial Fletcher faz uma ressalva e complementa dizendo que as pessoas já haviam cometido o crime, porém, metafisicamente.
As cenas do escaneamento dos olhos das pessoas que circulam pelas imediações das cidades e a das aranhas-robô que invadem várias residências para procurar um suposto assassino também suscitam a questão dos limites. Assim, ao nos depararmos com essas cenas é fácil lembrar sobre a nossa realidade em que temos câmeras de circuito fechado de TV nas cidades e shopping centers; sobre a tomada e arquivamento de impressões digitais de suspeitos bem como daqueles que são condenados por crimes e, também, sobre a construção de bancos de dados de pessoas a partir de informações coletados na internet.
Neste sentido, o filme e a nossa realidade - que se mostra sempre vigiada e conectada - nos levam a refletir até que ponto algumas medidas de segurança são aceitáveis, mesmo que supostamente eficazes na prevenção de crimes. Para ilustrar essa questão resolvemos abordar um caso que aconteceu recentemente no Brasil em que o Exército assumiu realizar “operações de inteligência” permanentes em “manifestações de rua”.[13: Apontado como infiltrado num grupo de manifestantes anti-Temer que acabou preso em controversa ação da polícia no domingo, Willian Pina Botelho, que se apresentava nas redes com o nome de Balta Nunes, é capitão do Exército. (FERNANDES, Marina Rossi. Apontado como infiltrado por manifestantes é capitão do Exército. 2016. Disponível em: http://brasil.elpais.com/brasil/2016/09/09/politica/1473452777_631937.html. Acesso em: 29 set. 2016.)]
Neste caso, Willian Botelho, que é militar da área de inteligência, se apresentava no Tinder e no Facebook como Balta Nunes para preparar emboscadas e tentar prender jovens que combinavam manifestações políticas pelas redes sociais. A primeira pergunta que vem à tona é se uma operação dessas é legal do ponto de vista jurídico. Podemos questionar ainda as suas verdadeiras intenções, se são realmente aplacar manifestações violentas ou criminalizar os movimentos estudantis, criando uma atmosfera de desconfiança entre as instituições polícia/exército em relação aos protestantes e também um clima hostil que pode desencadear violência contra os manifestantes. 
Assim, seguindo a linha da cena que narramos no início do tópico, fazemos as vezes do Detetive Ed Witwer e questionamos ao capitão do Exército Willian Botelho se aqueles jovens realmente iriam cometer algum crime. Acredito que ele titubearia ao responder. Porém, se perguntássemos à Lombroso se esse poderia ser mais um perfil de criminoso, provavelmente ele diria que sim e daria o nome de criminosos habituais das manifestações políticas.
Bom, o que podemos observar é que o governo dispõe de tecnologia e informação para usar na prevenção de crimes, mas por outro lado, esses mesmos aparatos estatais podem ser utilizados com fins duvidosos e podem acabar extrapolando os limites da privacidade dos cidadãos. Neste sentido é necessário sopesar se a eficácia de tais métodos é tão preponderante que, quando colocada em contraposição com os limites éticos que devem ser defendidos como fundamentais ao estado de direito, deve prevalecer como princípio absoluto.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, compreende-se que o dilema existente entre a eficácia da prevenção criminal e a preservação das garantias dos indivíduos deve ser cada vez mais debatido entre os juristas, pois em tempos onde a violência vem aumentando em diversos lugares do mundo, soluções imediatistas tendem a surgir como medidas de emergência, mas a longo prazo acabam por ruir uma série de direitos e garantias historicamente conquistados pela humanidade, mas que em nome de uma pretensa segurança acabam sendo ameaçados. 
Conforme visto ao longo desse ensaio, as tentativas de alinhar as ciências e suas tecnologias aos estudos de Criminologia não são recentes, desde o século XIX diversos intelectuais tentaram uma solução científica para as mazelas da violência, se hoje teorias como as de Lombroso são risíveis e estapafúrdias, durante alguns anos acreditou-se que elas eram plenamente viáveis, na verdade, se fizermos uma análise geral, percebemos que critérios raciais e de classe continuam a reger veladamente as decisões dos tribunais no Brasil. A privacidade também vem sendo colocada em voga, pois na Era da Internet, onde muitos crimes podem ser planejados em rede, governos de várias partes do mundo tendem devassar a privacidade de seus cidadãos, em busca de pistas e provas para possíveis crimes, o que coloca os indivíduos num constante estado de vigilância.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVAREZ, Marcos César. A criminologia no Brasil ou como tratar desigualmente os desiguais. In: Dados, Rio de Janeiro, v. 45, n. 4 (2002). 
CIDADANIA, Ministério da Justiça e. Mapa do Encarceramento aponta:: maioria da população carcerária é negra. 2015. Disponível em: <http://www.seppir.gov.br/central-de-conteudos/noticias/junho/mapa-do-encarceramento-aponta-maioria-da-populacao-carceraria-e-negra-1>. Acesso em: 29 set. 2016.
ESTADO, Agência. Levantamento aponta que maioria dos presos no Brasil são jovens, negros e pobres. 2015. Disponível em: <http://www.em.com.br/app/noticia/nacional/2015/06/23/interna_nacional,661171/levantamento-aponta-que-maioria-dos-presos-no-brasil-sao-jovens-negro.shtml>. Acesso em: 29 set. 2016.
FERNANDES, Marina Rossi. Apontado como infiltrado por manifestantes é capitão do Exército. 2016. Disponível em: <http://brasil.elpais.com/brasil/2016/09/09/politica/1473452777_631937.html>.Acesso em: 29 set. 2016.
LOMBROSO, Cesare. O Homem Delinquente. São Paulo: Ícone, 2007;
MARCHETTI, Paolo. The mark of Cain: the search of the criminalman between medicine and law. In: Giornale di storia costituzionale, n. 21, v. I (2011);
REPÚBLICA, Secretaria-geral da Presidência da; JUVENTUDE, Secretaria Nacional de. MAPA DO ENCARCERAMENTO: Os jovens do Brasil. Brasília: Presidência da República, 2015.
RODRIGUES, Cristiano Soares. Direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2012. – (Coleção saberes do direito
SARDINHA, Edson. A face e os números do novo Parlamento. 2015. Disponível em: <http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/a-face-e-os-numeros-do-novo-congresso/>. Acesso em: 29 set. 2016.

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