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1951, a Fundação Ford, antes de cumprir o intuito de destinar fundos à UNESCO, encomendara, também a Irving Solomon, uma enquete sobre a instituição. Cf. ARCHIBALDI, 1993, p. 232. 33 O diretor-geral não reconduziu aos postos do Secretariado os funcionários originários dos EUA considerados desleais ao governo de seu país, por terem se recusado a cooperar com a comissão que procedia às investigações, cuja realização fora determinada pelo Decreto Presidencial n. 10422, de 9.01.1953. Cf. Être Americain à lUNESCO. In: ARCHIBALDI, 1993, p.169-184. 41 Além disso, a UNESCO já passara pela experiência de, medi- ante uma única atividade, falhar no atendimento das expectativas dos seus mantenedores dos dois lados domundo bipolarizado. Assim foi, por exemplo, sua atuação por ocasião da Guerra da Coréia. O serviço de informação à população coreana sobre as ações das Na- ções Unidas iniciado em 1952, além de acanhado e pouco ágil, aos olhos dos EUA, incluía as declarações sobre questões de raça, das quais a UNESCO já então se ocupava. Esse julgamento contribuiu para o agravamento de uma já crescente insatisfação dos governan- tes dos EUA em relação à organização. Essa insatisfação é compreensível se considerarmos as reper- cussões, nesse país, das lutas coloniais, explicitadas pelos movimen- tos aí organizados contra o racismo, críticos da incongruência entre o interesse dos EUA na libertação dos povos coloniais e sua política interna de segregação racial. Acrescente-se ainda a reverberação dessas lutas, na Conferência Geral, nas discussões e conflitos entre os representantes dos dois blocos que então dividiam o mundo. Por outro lado, a aprovação pelo Conselho Executivo de resolução con- denando a invasão norte-coreana, somada ao apoio da UNESCO à intervenção dos EUA na Coréia através da ONU, motivou a retirada da Hungria, Polônia e Tchecoslováquia da organização. Nesses primeiros anos de atuação, a UNESCO também já contabilizara, em meio às dificuldades de várias ordens, os sucessos e fracassos na execução de seus projetos modernizantes na área de educação de base,34 cuja realização apontou para a necessidade de 34 Cf. UNESCO. Léducation de base. Description et programme. Monographies sur léducation de base. Paris: UNESCO/Imprimerie Firmin-Didot, 1950. Dos projetos de educação de base aprovados na 1a CG-1946, três foram interrompidos, devido à complexidade da situação que alia projetos de desenvolvimento rural às condições políticas locais: África britânica, Peru e China. Cf. BEKRI, 1991, p. 168. O quarto projeto, financiado pela Fundação Rockfeller para a pesquisa antropológica coordenada por Alfred Métraux, foi realizado. Cf. UNESCO. El proyecto piloto de Haiti. Primera etapa 1948-1949. Serie Monografias sobre educación fundamental. Paris: Bellenand, 1951b; Cf. UNESCO. LÉducation des communautés à Porto Rico: rapport établi par la Division des Communautés du Département de lÉducation sur loeuvre accomplie à Porto Rico entre le 1er juillet et le 15 octobre 1951. Paris: UNESCO, 1952c. Na China, uma das áreas prioritárias, o projeto foi interrompido com a vitória de Mao Tse Tung no final 42 mudanças conceituais posteriores nesse campo de atuação. Do aprofundamento da perspectiva originária de educação de base, definida como fundo comum da humanidade, a UNESCO formula os conceitos de alfabetização funcional e educação permanente, que se desdobrarão, no futuro, nas distinções entre educação formal e não-formal e no aprimoramento da noção de educação como técnica social em suas relações com a sociedade.35 Assim, processar-se-á a construção de uma perspectiva de educação tecnificada, a ser enriquecida permanentemente pelos desenvolvimentos da ciência e da tecnologia. A noção de uma educação capaz de, adequando-se aos progressos técnicos da civili- zação, à medida que eles se concretizem, responder às exigências do progresso técnico e da produção por ele possibilitada. Essa noção de educação fundamenta desde então e com os aportes das teorias da modernização, dos anos 60 e a sofisticação da teoria sistêmica e da cibernética a partir dos anos 60 e 70 ainda hoje, era da informação satelitizada e informatizada, as ações e reflexões da UNESCO nes- se campo de atuação. Finalmente, a admissão de novos Estados-membros iniciara uma mudança na composição da UNESCO, uma instituição cuja Conferência Geral, na qual cada membro tem um voto, começa a registrar o questionamento da supremacia de seus principais ideali- zadores, também seus maiores financiadores. Em 1954, quando a URSS, após ter alcançado os EUA no poder nuclear, ingressa na UNESCO, ela traz consigo novos membros do Leste Europeu a Ucrânia e a Belarrus assim como obtém o retorno da Hungria, Polônia e Tchecoslováquia. Dois anos depois, também a Romênia e a Bulgária tornam-se membros da UNESCO. de 1949. Cf. UNESCO. La salud en la aldea. Una experiencia de educación visual en China. Serie Monografias sobre educación fundamental. vol. V. Paris: UNESCO, 1952d. 35 A noção de técnica social, assim como a de planejamento democrático teorizadas por Mannheim informam as ações da UNESCO, diante de uma realidade em transformação e crise. Cf. MANNHEIM, Karl. O homem e a sociedade. Rio de Janeiro: Zahar, 1962; e ainda Liberdade, poder e planificação democrática. São Paulo: Mestre Jou, 1972. 43 Este constitui apenas um aspecto da mudança da composição política e sociocultural da UNESCO uma instituição que, buscando a universalidade, vai, daí em diante, tornando-se cada vez mais mul- ticultural e multiétnica e cada vez menos bipolarizada, com a entrada maciça dos países constituídos pelo processo de descolonização. Para se ter uma idéia dessa mudança, de 1954 a 1965, 31 novos Estados-membros do continente africano e cinco países da Ásia e do Oriente Médio ingressam na UNESCO. Nos dez anos seguintes, outros cinco países africanos e seis asiáticos se agregam à organização. Nesses dois períodos observam-se momentos qualitativamen- te diversos do período anterior, tanto no que se refere à realidade mundial, como à realidade interna da UNESCO. Acontecimentos que resultam emmomentos de distensão entre os dois blocos mundi- ais, mas também em momentos de grande tensão,36 que expressam os desdobramentos, nos mais diferentes rincões de ummundo plural, das contradições geradas no processo de desenvolvimento desigual e combinado do modo de produção capitalista. 36 A URSS se antecipa na exploração do espaço e, desde 1958, questiona o estatuto de Berlim acertado no pós-guerra; em resposta à proposta de unificação alemã proposta pela Europa Ocidental, constrói, em 1961, o Muro de Berlim, materializando a separação dos lados ocidental e oriental da cidade. Em 1962 ocorre o embate URSSEUA na denominada Crise dos Mísseis em Cuba. O impasse é resolvido com a retirada dos mísseis soviéticos da ilha em troca da inviolabilidade de seu regime político. Os referidos mísseis, porém, não influenciavam o equilíbrio estratégico mantido pelas duas superpotências. Cf. HOBSBAWM, E. J. Era dos extremos: o breve século XX: 1919-1991.Trad. de Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras,1996, p. 227 e 240. Segue- se a esse incidente a instalação do telefone vermelho, o qual, ligando oKremlim à Casa Branca, simboliza o acordo tácito entre EUAURSS, em face dos riscos de desestabilização do sistema internacional pela constante ameaça de guerra nuclear. Emmaio de 1963, é assinado acordo americano-soviético de cooperação na utilização pacífica da energia nuclear, pelo qual ficamproibidas provas nucleares na atmosfera, ampliando os acordos de cooperação entre as duas potências nucleares, iniciados desde o final da década anterior pelos campos educacional, científico, cultural e econômico. 44 Nova composição da UNESCO e caminhos possíveis do progresso da humanidade Os reordenamentos econômico-políticos e os avanços