Buscar

Cindy Gerard CAVALEIRO APRISIONADO

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 82 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 82 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 82 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Cavaleiro Aprisionado	 Cindy Gerard
Cavaleiro Aprisionado
Lone Star Prince
Série Clube de Vaqueiros
Cindy Gerard
Texas Cattleman’s Club
01 - TEXAS MILLIONAIRE - Dixie Browning (SD 1232)
02 - CINDERELLA’S TYCOON - Caroline Cross (SD 1238)
03 - BILLIONAIRE BRIDEGROOM - Peggy Moreland (SD 1244)
04 - SECRET AGENT DAD - Metsy Hingle (SD 1250)
05 - LONE STAR PRINCE - Cindy Gerard (SD 1256)
Resumo:
Ele saiu em uma missão de salvamento e encontrou o verdadeiro amor.
Gregory Hunt sempre se entregara com fervor as suas missões, fosse para esclarecer casos legais ou para socorrer damas em apuros. Mas a princesa Anna Von Oberland parecia perturbá-lo demais, tanto que o impedira de agir com discrição e imparcialidade. Gregory arriscaria tudo para salvá-la, até o próprio coração!
As belas feições da nobre Anna e seu porte aristocrático ocultavam profundos segredos, principalmente a forte atração que sentia por aquele vaqueiro. A revelação da verdade seria capaz de afastá-lo para sempre, mas a paixão que a unia a ele era incontrolável!
�
PRÓLOGO 
Cinco de setembro, duas horas da manhã. 
Em um ponto qualquer do Oceano Atlântico. 
Nem Hollywood poderia imaginar algo parecido. 
Um príncipe malvado, uma princesa linda em seu po​der e o resgate da nobre por um ex-fuzileiro e ex-amante. 
O problema é que não se tratava de uma cena de Hollywood mas sim da vida real. Greg Hunt, diante da janela do jato particular rumo aos Estados Unidos, fitava o fir​mamento sem saber ao certo seu papel naquele melo​drama. Não sabia ainda se lhe cabia ser o herói ou o bandido dessa história. 
A mulher com olhar perdido no horizonte estava exaus​ta, mas se mantinha composta, a postura ereta e o ar aristocrático. 
Quatro anos antes, quando Greg a vira pela primeira vez, ela era linda. E, sem sombra de dúvida, ela continuava linda. Mas agora a princesa Anna von Oberland, amada pelos paparazzi e pelo povo, tinha marcas arroxeadas em torno dos olhos, pintadas por anos de assombração e per​seguição, assim como linhas que marcavam seu raro sorriso, só reservado para o pequeno que dormia a seu lado. 
Sua voz doce, melodiosa e muitas vezes melancólica remetia a verões passados, sonhos frustrados e a ante​passados nobres de sua linhagem européia.
Movimentando-se com desconforto, Greg desviou sua atenção para a janela, mergulhando na escuridão que os doze mil metros de altitude conferiam ao firmamento. 
Ele tentava se livrar de seus pensamentos e da con​seqüente compulsão de envolver Anna em seus braços. Vê-la novamente trazia à tona uma gama de sentimentos que julgava mortos e sepultados. Sentia certo alívio por saber que ela o procurara em busca de socorro, e estava pronto para fazer jus a essa confiança, mas estava de​terminado a não permitir que nenhum sorriso dela ou do lindo filho que a acompanhava minassem a muralha que a duras penas conseguira erguer a sua volta. 
Contra todas suas resoluções e determinações, seu pen​samento insistia em retornar para a noite de verão em que a conhecera, quatro anos antes. 
Gregory era, então, um fuzileiro em última missão, com data marcada para retornar ao Texas e pronto. para assumir seu papel na dinastia Hunter. Deixava, no pe​queno principado europeu de Obersbourg, uma linda jo​vem de olhos verdes. Mal sabia ele que se tratava de uma princesa que aceitaria fugir da família e das obri​gações reais que estavam ligadas a sua posição só por causa do amor daquele fuzileiro. 
Parecia ter sido há uma centena de anos a primeira. vez em que seus olhares haviam se cruzado, estavam separados por uma praça, e, entre eles, casais valsavam. Um século parecia ter decorrido desde que atravessaram a multidão para caírem um nos braços do outro. Parecia um longo século desde que haviam valsado, apaixonado-se e feito amor. 
Quando a verdadeira identidade dela veio à tona, separaram -se. 
Greg rapidamente checou sua memória. Não havia dú​vida alguma, quatro anos se passaram desde que ele dei​xara tudo para trás. Mas, havia uma semana, ele recebera um telefonema e, ao ouvir a voz de Anna em pânico, tudo voltara, como se houvesse acontecido no dia anterior.
― Gregory, preciso de você. Por favor, venha. Por favor... venha. 
E ele fora. Com o apoio do bilionário texano Hank Langley e com a ajuda de Sterling Churchill e Forrest Cunningham, todos membros do Clube dos Vaqueiros do Texas, haviam resgatado a princesa e seu filho da guarda real de Obersbourg havia menos de três horas. 
Todos eram ex-militares, e haviam criado a equipe Alfa para darem cabo daquela missão de salvamento. 
Greg esfregou as mãos no queixo, o olhar perdido no breu da janela. Como conselheiro da corporação das In​dústrias Hunt e diretor presidente de muitas outras com​panhias do Grupo Hunt, seu tempo estava todo tomado pelo trabalho. Nada o faria imaginar que se renderia tão depressa a um apelo de Anna. Mas desta vez sabia que não haveria olhares furtivos nem beijos roubados. 
Ainda não estava completamente a par dos fatos, mas sabia que Sara, irmã querida de Anna, e seu amante es​tavam mortos, vítimas de um misterioso acidente de carro. 
Os gêmeos de Sara estavam sob custódia de Ivan Stris​ky, o príncipe playboy de Asterland, que os mantinha quase como reféns, parte de uma manobra política para forçar Anna a se casar com ele. 
Greg ouviu os sussurros de Sterling e Forrest que con​versavam atrás dele. Era uma felicidade poder contar com a ajuda de homens como aqueles. 
Aquele pequeno grupo tinha escrito um pedaço da his​tória da nobreza européia, e Greg gostaria de saber como reagiriam os reis de Obersbourg quando descobrissem que a princesa Anna desaparecera. 
Esticando as pernas à frente, Greg ponderava sobre isso e ansiava por conduzir Anna em segurança aos Es​tados Unidos. 
Daí em diante tinha certeza de que ela ficaria bem, pois era uma mulher bastante influente e não lhe falta​riam recursos. 
Depois disso precisava tentar esquecer,mais uma vez, aquela mulher que atormentava seus sentimentos. 
William estava mergulhado no sono. Anna usando o próprio corpo como escudo e cobertor para o pequeno, velava por ele. Mal o garoto se mexia, dormindo, e ela sobressaltada o trazia para mais perto de si. 
A reação era instintiva e, no momento, desnecessária. Ali não existiam complôs ou armadilhas, ali estavam em segurança. Estavam com Greg, portanto fora de perigo. Ao menos, fora de qualquer perigo físico. 
De qualquer forma, ainda estavam em uma situação delicada, e o futuro não podia ser mais incerto. Mesmo assim, era um alívio saber que, ao menos por hora, es​tavam fora do alcance de Ivan. 
E também livres dos reis que pareciam dispostos a sacri​ficar a própria filha e neto para Ivan em troca de um subs​tancial investimento nas finanças combalidas de Obersbourg. 
William choramingou, arrancando-a de seus devaneios. A vozinha ecoou no silêncio da aeronave, apavorada e em pânico. 
― Shhh, querido. Mamãe está aqui, calma... 
William era pequeno para sua idade, e, com freqüência, atribuíam-lhe menos que seus quase quatro anos. Afun​dando o rosto do menino contra seu peito, a princesa sussurrava: 
― Tudo bem, meu anjo, tudo bem... Mamãe está aqui com você. ― Anna embalava-o até que ele voltasse a dormir. 
― Ele está bem? ― A voz profunda de Gregory revelava laivos de preocupação genuína. 
Anna assentiu com um gesto de cabeça, tentando assim convencer não só a ele, mas a si mesma disso. Apertando-o mais contra si mesma, sentiu o reconfortante calor do corpinho querido antes de concluir: 
― Está bem, sim. Só um pouco assustado com tudo. 
Mesmo com o silêncio respeitoso de Greg, Anna podia sentir seu olhar cravado sobre ela, ou então sobre William. Podia adivinhar as perguntas não formuladas que teimavam dentro dele, e rezava para que suas respostas fossem satisfatórias, e que as mentiras que seria obrigada a contar fossem perdoadas. 
― Onde está o pai dele,Anna? Por que me chamou ao invés de chamá-lo? 
A pergunta era direta e objetiva. Anna estivera espe​rando por aquilo, era sua deixa para dizer a mentira tantas vezes ensaiada. 
― Ele nunca fez parte da vida de William. - respondeu ela, medindo as palavras, o sotaque e a exaustão para encurtar seu discurso. - O que o pai dele e eu partilhamos... - Propositadamente, Anna deixou a frase mor​rer no ar, incitando-o a tirar suas próprias conclusões. - Bem, eu... eu esperava por mais. 
― Ele a abandonou? - Cada palavra vinha revestida por uma raiva nociva. 
― Não. ― disse Anna rapidamente. ― Oh, não. Aban​dono não é a palavra certa. Não foi isso que aconteceu, não exatamente. Não era intenção dele. 
Entre as sombras, Anna viu o olhar de Gregory sobre William, observando com cuidado os cabelos escuros do garoto, caídos pelo rostinho, imaginando quem sabe, os olhos azuis da cor do Mediterrâneo. 
― Eu sinto muito tê-lo envolvido nisto, Gregory. ― ​desculpou-se ela, tentando desviar a atenção para longe do garoto. – Eu... eu não sabia a quem recorrer. 
― Eu lhe disse... ― Embora seus olhos continuassem duros, a voz era suave ao dizer: ― Eu lhe disse que se precisasse de mim, sempre estaria pronto para ajudá-la. 
Sim. Sim, havia dito, e mesmo depois de passados qua​tro anos, ela sabia que podia contar com ele. Afinal, fora essa mesma firmeza que a encantara desde o princípio, sua firmeza de caráter, seu realismo e charme de classe média. Durante muito tempo pensara que ele era apenas um fuzileiro, um trabalhador do governo. Apenas no úl​timo ano é que ficara sabendo, através de um artigo em uma revista, que Greg estava à frente das Indústrias Hunt, e que, na América, ele era o equivalente a um nobre europeu. Uma ironia bastante cruel do destino. 
Ela sentira o peso de sua posição, de séculos de história e tradição, a cobrança das obrigações familiares durante aquele fatídico verão. Em um de seus raros atos de re​beldia, disfarçara-se em trajes de camponesa e fugira de tudo por algumas horas, perdida na algazarra da mul​tidão que brincava nas ruas durante o festival de verão. 
Essas poucas horas se transformaram em quatro dias e noites gloriosos de paixão ao lado de Gregory. 
Assim que o vira se apaixonara perdida e loucamente pelo excitante e divertido americano que, além de lhe mostrar o que era a liberdade, também a iniciara naquela que viria a ser a única paixão de sua vida. 
Ele era tão, tão... americano. Forte. Vital. Tão abso​lutamente arrogante em sua autoconfiança, tão charmoso e cheio de si. E tão lindo. 
Os cabelos muito curtos, à maneira militar, a farda ver​de-oliva ressaltando o homem sob o uniforme, viril o bastante para fazê-la se apaixonar de imediato. O que ele nunca sa​beria é que ela se manteria apaixonada por toda a vida. 
A lembrança vívida do dia em que eles haviam se se​parado a perseguia. Cada batida triste de seu coração estava presente em sua memória, torturando-a, desde o momento em que revelara sua verdadeira identidade e a razão pela qual não podiam ficar juntos. Irado, Greg escrevera o número de seu telefone em uma nota de um dólar e a colocara em sua mão. Seus olhos azuis turvados pela tormenta de sua alma, os maxilares cerrados de raiva e orgulho ferido. 
― Se precisar de qualquer coisa, a qualquer momento, ligue para este telefone. 
Na luz difusa da cabina, Anna procurou nos olhos dele algum sinal da paixão de outrora. Encontrou apenas o senso de dever, um olhar de fria indiferença. Mesmo assim ele cumprira sua promessa e viera em seu socorro. Lágrimas toldaram-lhe a visão, fecharam-lhe a garganta. Se ao menos alguém pudesse ter ido a socorro de Sara. 
Sara agora estava morta, e Anna perdera seus sobri​nhos gêmeos. 
― Os bebês de Sara. - murmurou, tomada pela ava​lanche de sentimentos, vencida por uma súbita onda de covardia e desespero, seu medo apenas igualado à sensação de fracasso. - Eu não devia ter fugido sem eles. 
― Anna... não havia modo de trazê-los conosco nesta viagem. Mas eu prometo, a equipe Alfa tem um plano para que meu irmão Blake possa resgatá-los. 
Ela piscou os longos cílios molhados, sabendo que es​tava fraca demais para acreditar. 
― Você confiou em mim para vir em seu socorro. ― ​Seu tom de voz a forçou encará-la, e quando o fez, seus olhos exigiam uma resposta. 
Ela assentiu, era verdade. Confiara nele. 
― Pois confie em mim mais uma vez. Blake os trará de volta para você em segurança. 
Agarrando-se na convicção de suas palavras, Anna dei​xou pender a cabeça no respaldar da poltrona, a respi​ração mais calma e compassada. 
Acariciando os cabelos finos de William, Anna distan​ciou-se do temor pelos gêmeos. 
― Como poderei agradecer o que está fazendo? 
― Confie em mim. ― disse Greg. ― Conte-me tudo... Tudo para que eu possa ajudá-la a sair dessa confusão. 
Tudo. Anna desviou o olhar. Greg merecia saber de tudo, mas ela não podia dar o que ele merecia, não agora. Abraçou William com mais força. Para escapar das garras de Ivan precisava da ajuda de Greg, e para tanto, tinha que lhe dar informações. Pelo menos o suficiente para deixar William a salvo de ter a mãe casada com Ivan... 
Incapaz de raciocinar, Anna olhou para Gregory que ainda falava com ela. 
― Por que não tenta descansar, Anna? Você está exausta, durma um pouco. Falaremos depois sobre esse assunto. 
Aliviada pela compreensão que encontrava nele, nada mais lhe restava fazer senão agradecer novamente. E fazer-lhe a inevitável pergunta: 
― Para onde estamos indo? 
Pela primeira vez desde que haviam raptado Anna e Wil​liam da ala norte do palácio de Obersbourg, Gregory sorriu. 
― Para casa, doçura. ― E com um deliberado acento texano frisou as palavras: ― Para minha casa, o oeste do Texas. 
Texas. Planícies áridas, amplos espaços descampados. Vaqueiros. Ela se recordou daquele verão em que ele falara de seu lar com orgulho indisfarçado. Milhas e mi​lhas de nada além de céu aberto. E torres de petróleo, muitas torres de petróleo. 
Parecia um bom lugar para se esconder. Um bom lugar para se viver. Cuidadosamente ela lhe sorriu. 
― Eu sempre quis ver um caubói de verdade. 
Os olhos de Greg por uma fração de segundo se suavizaram: 
― Conheço uma porção deles que vão ficar felizes em vê-la também. 
Embora as palavras dele tivessem como intuito desa​nuviar a tensão, tiveram o efeito inverso. 
― Não se preocupe, Anna. 
Ela fitou-o nos olhos, e percebeu que sua preocupação fora notada por ele. 
― Ninguém na cidade saberá quem você é, muito me​nos a reconhecerá. Cuidaremos disso. 
Greg parecia satisfeito e seguro, provavelmente por alguma perspectiva que resolveu não dividir com ela. 
Anna achou justo. Ela tinha seu segredo, tinha que deixá-lo ter os seus. Por ora era suficiente saber-se livre de Ivan. Por hora era tudo que importava. 
Tinha de ser assim. Precisava de tempo para pensar em uma maneira de salvar seu país sem que para isso tivesse que sacrificar seu filho ou seus sobrinhos. 
Exausta, finalmente deixou que a fatiga a vencesse. Com William seguro em seus braços, deixou que meses de tensão acumulada cedessem ao sono. 
Greg sentia a tensão e o nervosismo de Anna enquanto a observava dormindo enlaçada ao filho. 
Ainda não sabia por que ela recorrera a ele tantos anos depois. Só sabia que não podia permitir que ela derrubasse suas defesas, não permitiria que a história daquele verão se repetisse. 
Admirava a beleza adormecida a seu lado. A complei​ção de porcelana, os longos cabelos louros, as sobrance​lhas bem desenhadas, os magníficos olhos, as faces esculpidas, tudo fez crescer um nó em sua garganta. 
Obviamente ela não perdera tempo após sua partida. A criança em seu regaço era a prova viva de que Anna não perdera tempo em mudar de cama e de parceiro. 
Uma parte de Greg queria odiá-la por isso, mas ódio não fazia parte de sua natureza. Também não tinha mais amor para dar a ela. Não de novo. Mesmo em face do perigo a que ela estava exposta.Mesmo em face de ten​tação tamanha. 
Greg olhou para longe. Pela última vez, não havia ra​zão para se aproximar. 
Ela estava fora de seu alcance, como estivera antes. Por sorte, agora ele era esperto suficiente para saber como e quando recuar. 
Mais importante ainda, tudo estava terminado entre eles. Afinal de contas, ela era uma princesa, e, do mesmo modo que há quatro anos, ele não era um príncipe. 
�
CAPÍTULO I
Quatro meses depois. Royal Diner, Royal, Texas. 
Preparando-se para o movimento do café da manhã, Anna abasteceu a geladeira com suco de laranja fresco. Verificou a cafeteira enquanto pensava em sua louca fuga de Obersbourg, quatro meses antes. 
Tanta coisa acontecera desde o arriscado resgate e sua atual segurança longe da caçada que o príncipe Ivan empreendera após sua fuga. E ainda existia o temor constante pelo bem-estar de seus sobrinhos, os filhos de Sara que Blake, irmão de Gregory, fora salvar.
A despeito de toda essa abominável realidade, um sorriso aflorou nos lábios de Anna com a recordação da frase que ouvira de Gregory na noite da fuga.
― Não se preocupe, Anna. Ninguém na cidade saberá quem você é ou a reconhecerá.
Na ocasião ela não compreendera o significado das pa​lavras. Dois dias depois ele apareceu com um uniforme de poliéster cor-de-rosa e instruções para que se apresentasse para um emprego de garçonete no Royal Diner como parte de seu disfarce.
Anna de imediato aceitou a brilhante idéia. Afinal, quem poderia imaginar que Arma Von Oberland, cujas origens reais remontavam a mais de sete séculos, que havia sido educada pelos tutores mais prestigiados da Europa, graduada na mais exclusiva escola suíça de economia e ad​ministração, sucessora natural do trono, futura Sua Ma​jestade Sereníssima, Alteza Real, princesa de Obersbourg, poderia estar oculta por trás de um avental servindo mesas, com o nome de Annie Grace bordado na lapela? 
O inimaginável não terminara ali. Nem as surpresas tampouco. Nos meses passados desde que se disfarçara em Annie Grace, Anna não apenas fizera o papel da gar​çonete, como também se apossara da personalidade fictícia, vivendo sua vida. 
Uma das razões de todo aquele divertimento sorria para ela diante da chapa, cotovelos fincados no balcão da cozinha. 
Um par de olhos negros fitou-a, faiscante. 
― Quer algo, Annie? 
― Que tal um especial com dois ovos mal passados, bacon à parte e torradas sem manteiga, por favor, Manny? 
― No capricho, Annie querida, meu doce. Algo mais que eu possa fazer enquanto meu fogo arde?
Anna tentou, sem sucesso, reprimir o sorriso. Mesmo que não tivesse notado os olhares lânguidos de Manny Reno em sua direção, ela já devia saber que o fogo a que ele se referia não era o da chapa. 
Manny, um belo mexicano de corpo musculoso e cozi​nheiro meio-expediente, era um incorrigível paquerador. E como a maioria dos texanos que ela conhecera desde que Greg a trouxera para Royal era tão perigoso quanto um pedaço de torta de limão. 
Sorrindo, Anna pendurou o pedido no gancho sobre o balcão e foi buscar a cafeteira. 
― Calma, Manny. São seis horas da manhã e hoje é segunda-feira. Ainda não estou esperta o bastante para você. 
― Bem, moça linda... ― Os olhos negros e amen​doados de Manny brilhavam. ―... isso faz parte de mi​nha estratégia. Atacar enquanto você ainda não está acordada o suficiente para brigar com a irresistível atra​ção que sente por mim. 
― Ah, então é isso... Oh... por um minuto quase perdi a cabeça por você. Puxa, que pena, já passou. Desculpe, Manny, fica para a próxima. 
― Droga! ― gemeu Manny, exagerando nos gestos teatrais. ― Você está partindo meu coração! 
Sheila Foster se aproximou para pendurar outro pedido e, depois de dar uma piscadela conspiratória para Anna, retrucou para Manny: 
― Querido, só tem o coração partido quem possui um coração. 
Sheila estava solteira no momento, depois de dois di​vórcios e uma luta constante com seu manequim quarenta e seis. Anna não ignorava que Sheila tinha uma forte paixão por Manny.
Manny, mesmo sabendo disso havia meses, ainda não tomara nenhuma iniciativa. 
Rindo com o bom humor no ambiente, Anna se dirigiu para onde Homer Gaffney se sentara. 
Homer sorriu ao vê-la se aproximar, e o sorriso pro​duziu ainda mais vincos no rosto velho e castigado pelo sol do Texas. 
― Aqui está seu suco, Homer. Vai tomar café normal, não o descafeínado esta manhã, certo? 
― Garota, pode botar um café bem forte. Annie, tenho um dia e tanto pela frente, com o rebanho para tocar e essa tempestade de areia que vem por aí, vou precisar de toda cafeína que puder tomar. 
Ao encher a xícara de Homer, Anna sentiu um arrepio percorrer sua espinha, um calafrio que sempre a assolava quando alguém olhava com insistência para ela. 
― Não consigo deixar de pensar como você se parece com aquela princesa chique, como é mesmo o nome dela?
― Diana? ― sugeriu ela, forçando uma naturalidade que estava longe de ser real. 
― Não, não. Falo daquela outra, a do país longínquo. Tem certeza de que você não tem uma irmã gêmea per​dida por aí? 
― Homer, Homer. ― Anna usou um tom jocoso pro​positadamente. ― A semana passada você disse que eu parecia uma artista de cinema, agora quer fazer de mim uma princesa. Estou começando a achar que você quer ser meu príncipe. 
Homer riu, corando debaixo do chapéu. 
― Estou mais para sapo que para príncipe, e não acho que minha Marta gostaria de me ver flertando com uma moça tão linda quanto você. 
― Pode apostar. ― retrucou Anna, batendo de leve no ombro dele. 
Felizmente não era muito comum algo desse tipo acon​tecer. Quase ninguém estranhava os modos e o ar aris​tocrático da garçonete Annie Grace. Era um alívio estar em um lugar como aquele, onde ninguém a reconheceria. Claro que essa possibilidade existia, mas com sorte não chegaria a acontecer. 
Recusando-se a pensar nisso, respondeu ao chamado de Manny que com a sineta avisava que seu pedido estava pronto. Rapidamente serviu o prato, limpou duas mesas e recolheu sua gorjeta de dois dólares e alguns centavos. 
Anna estava totalmente imersa nas tarefas do coti​diano, como se nunca houvesse vivido outra vida. 
O Royal Diner era basicamente um local simples, onde as pessoas de Royal vinham para comer e encontrar umas com as outras. Servia refeições baratas e honestas, e estava aberto desde cedo até a meia-noite. 
Anna tinha especial afeição por aquele lugar. O Royal Diner era seu refúgio e abrigo, e ela amava cada peda​cinho dele, desde o piso de linóleo gasto até os assentos de plástico vermelho ao redor do balcão. 
Amava o calor e o cheiro dali. Os hambúrgueres su​culentos que saíam da chapa de Manny, os decadentes maltados que aprendera a tirar da velha máquina. Ama​va até a grossa camada de gordura que recobria os vidros das janelas, que Hazel, o dono, tentava disfarçar detrás das cortinas de musselina. 
Ela sabia que não tinha que trabalhar daquele jeito. Sabia que Gregory armara as coisas para que· tivesse um disfarce, e que facilmente ela aceitaria viver como uma operária. Era seu modo de fazê-la pagar pelo que lhe fizera anos atrás. 
Anna entendia seus motivos e lhe perdoava. Sabia que se ela não aceitasse o emprego seria difícil desviar a atenção geral, como explicar uma jovem reclusa com um filhinho vivendo no Royal Court Complex, apartamento 3b? 
O que Gregory não compreendia era que, se a princípio ela ficara apreensiva, era por temer sua própria incapa​cidade em desempenhar as tarefas. Enquanto as moças normalmente sonhavam com castelos, serviçais e cava​leiros valentes em armaduras brilhantes, Anna sonhava com seus pés descalços caminhando sobre a relva, com brincadeiras de esconde-esconde com as crianças da vila e coma amizade de uma amiga para dividir segredos. 
Ela sempre desejara fazer parte do mundo como todas as outras pessoas, não como parte da elite. Nada podia ser mais solitário que estar cercada por obras de arte, espelhos dourados e exércitos de empregados. Dormircom dosséis e lençóis de cetim. 
Agora, como Annie Grace, a garçonete, ela encontrara seu sonho, no austero apartamento de dois quartos e, principalmente, com seu despertador barato. Anna ama​va aquele objeto prosaico. Como William, aquilo empres​tava um sentido a sua existência, dava·lhe uma razão para acordar todos os dias. 
Ali, em Royal, ela era uma pequena parte do todo, uma pecinha da grande engrenagem. Uma mãe de família, trabalhando para viver, e pela primeira vez na vida sentia-se útil. Ironia ou não, Anna nunca se sentira tão viva quanto naqueles poucos meses como Annie Grace, a garçonete pobre e batalhadora. 
Melhor ainda, desde que chegara em Royal, Anna vinha percebendo em William coisas inusitadas. Embora conti​nuasse quieto e reservado, o menino estava mais sorridente. Até mesmo ria alto, sem medo de ser censurado por isso. 
Harriet Sherman, sua vizinha e babá eventual de Wil​liam tinha muita responsabilidade nessas mudanças. 
A sineta de Manny soou novamente, avisando que era hora de voltar à realidade. Enquanto servia mais um especial do dia, Anna recordava o primeiro dia que William ficara com Harriet. Mesmo com Gregory asseguran​do que Harriet era sua funcionária, e que não era por coincidência que morava ao lado, mas sim para tomar conta dela e de seu filho, fora muito difícil deixar William com uma estranha. 
Agora era mais difícil ainda imaginar como seria tirá-la dali, de perto de Harriet e de seu carinho, de seus abraços amorosos e dos biscoitos de aveia e mel. 
Mas Anna tinha consciência que, cedo ou tarde deveria retomar para Obersbourg e encarar suas obrigações. 
Deu de ombros e suspirou fundo. Ivan não recolhera seus cães de guarda, não desistiria facilmente daquele casamento de conveniência. E por mais que lhe doesse a verdade, tinha que reconhecer que seus pais ainda a estavam oferecendo como prêmio para que Ivan salvasse o reino de Obersbourg. 
Anna sabia que precisava voltar. Obersbourg era a sua pátria, seu legado, seu dever. 
Com sorte, pensaria em uma solução para seu dilema que não fosse casar-se com Ivan, de quem desconfiava ter participação no acidente com sua irmã. 
Por todas essas razões, a idéia de deixar Royal ater​rorizava Anna. Logo, esperava ela, teria uma razão a menos para querer ficar ali. No domingo seguinte mais uma etapa de sua missão seria vencida. 
Blake, irmão de Gregory, estaria de volta à cidade e com ele viriam seus sobrinhos, a última e mais preciosa recordação que sua irmã lhe deixara. 
O bom humor que a inundava minutos antes desapa​recera como o sol escondido por trás das nuvens de poeira trazidas pelo vento. A realidade se impusera no mundo de fantasia de Annie Grace. Anna Von Oberland estava de volta, encarando suas pesadas obrigações reais.
�
CAPÍTULO II
Ela estava correndo pelas planícies sem fim. Longas mãos se atiravam em sua direção. Estava tão cansada... Suas pernas já não agüentavam o peso de seu próprio corpo. 
Ela tropeçava, procurando desesperadamente por uma luz que nunca aparecia, por uma saída que não surgia. De repente foi capturada e centenas de mãos caíram sobre ela. 
Com o coração disparado, Anna pulou da cama assus​tada, os lençóis molhados de suor. Tateando, caminhou até a janela, abrindo-a de par em par, com um grito sufocado na garganta. Mesmo nos pesadelos noturnos, sua preocupação era William. 
Uma lufada revigorante do árido ar do Texas soprou em seu rosto, e Anna encheu os pulmões, até sentir-se totalmente desperta. 
Queria certificar-se de que o pesadelo terminara, ficara para trás, e que sua realidade era outra. 
Mesmo depois de tantos meses assombrada por pesa​delos, sempre que eles retornavam ainda tomavam Anna de surpresa, e naquela noite ainda fora pior, sentira-se agarrada pela garganta até quase sufocar. 
Mais calma, Anna abriu os olhos, sentindo a brisa res​friando seu rosto gotejado de suor. Fez uma recapitulação mental dos últimos quatro meses para ter total certeza que o passado ficara mesmo para trás. 
Ela e William estavam à salvo. 
Os gêmeos estavam seguros com Josie e Blake. 
E Ivan estava morto. 
lvan estava morto. 
Anna estremeceu e se afastou da janela com a lem​brança do suicídio que, combinada com a friagem de de​zembro, deixaram-na com a pele toda arrepiada. 
Enfiando as mãos por entre os cabelos louros, Anna voltou para a cama, puxando as cobertas até o queixo, tiritando de frio e medo. 
Nessas horas é que ela desejaria beber como um dos rudes texanos que aprendera a conhecer e gostar ali em Royal. Um trago largo e puro de Bourbon talvez pudesse afastar os demônios que estavam a roubar mais aquela noite de seu sono. 
― Encare-os. ― murmurou Anna para si mesma, na escuridão. 
Não há mais o que temer. Recordou ela tentando con​trolar o tremor suave que ainda restava em suas mãos. Não havia mais temores, pensou ela, apenas decisões a serem tomadas. Tantas decisões... 
De súbito, batidas na porta fizeram seu coração disparar novamente. Pôs-se de pé. 
― Anna, Anna, você está bem? 
Gregory. 
Aliviada, Anna correu para a porta o mais depressa que pôde, tentando evitar que William acordasse com o barulho. 
Ao alcançar o exíguo vestíbulo, Anna abriu a pesada porta de ferro e encontrou olhos muito azuis e aflitos debaixo da aba do chapéu Stetson. 
Desde os primeiros dias em que a instalara no pequeno apartamento, Gregory nunca mais cruzara a soleira da​quela porta. Não passara desapercebida a mensagem con​tida nas entrelinhas. Gregory fora em seu socorro quando fora chamado por ela, mas que ficasse claro como o céu do Texas que ele não queria fazer parte de sua vida. Portanto, encontrá-lo ali, naquele momento, logo depois de seu pesadelo estava além de sua compreensão. 
― O que ... o que está fazendo aqui? 
Gregory trazia no semblante uma expressão sombria, seus olhos gelados e cortantes como gelo. 
― Estava voltando para casa, vindo do clube, quando as luzes do alarme começaram a piscar como uma árvore de Natal no painel de meu carro. 
Anna avançou pela porta, ajeitando as madeixas desa​linhadas. Entendia agora a razão da visita extemporânea. 
Na primeira vez que ele lhe mostrara o apartamento, fizera toda uma minuciosa explanação sobre o sistema de alarme silencioso ali instalado. Todas as portas e ja​nelas tinham um dispositivo para o caso de Ivan vir a saber de seu paradeiro e de William. O alarme estava diretamente conectado com o Clube dos Vaqueiros do Texas, com as residências e veículos de seus membros. 
― Eu não pensei nisso. Eu ... eu tive um pesadelo ​confessou com certa relutância. ― Precisei tomar um pouco de ar e abri a janela. Desculpe-me, esqueci com​pletamente do alarme. 
Greg encarou a mulher que causara em sua vida tal desordem que, por pouco não acabara em uma revolução fatal. Sabia que ao responder seu pedido de socorro em agosto último, estava correndo o mesmo risco que Pandora ao abrir a caixa. Só problemas poderiam advir desse ato. 
Estava preparado para investir seu tempo, táticas e diplomacia. Isso Gregory tinha de sobra, visto que con​seguira tirar Anna e William da Europa e conservá-los em segurança ali, no Texas, até a morte de Ivan semanas antes de sua visita aos Estados Unidos. 
Agora estava envolvido nos trâmites da adoção e nos meandros do caso da morte de Sara e do envolvimento de Strisky, tratando diretamente com o advogado de Mar​cus Dumond. Além de abafar o suicídio do príncipe Ivan Strisky, tivera de cuidar para que o translado do corpo fosse feito com sigilo, via embaixada, lidando para que nenhum incidente diplomático maior ocorresse. 
Gregory não podia negar que estava feliz em saber que esse problema agora cabia totalmente ao governo de Asterland. 
Porém, no momento, nada daquilo o incomodava. Es​tava preocupado com seu bem-estar emocional e por isso mantivera distância de Anna. Mantivera distância até de Royal, voando para Dallas, Houston e muitas vezes para a Geórgia, usando o jatinho das empresas Hunt. 
― Sente-se.― ordenou Gregory, guiando-a até a ca​deira mais próxima. ― Quão freqüentemente você tem esses pesadelos? 
Anna, imóvel como um bloco de madeira, as mãos cru​zadas sobre o colo, respondeu: 
― Bem ... quase nunca. 
Ele podia apostar sua carreira que ela os tinha todas as noites. Jurando não se deixar seduzir pela onda de simpatia ou pela reação física provocada pela visão dos seios de Anna, despontando sob a camisola de seda azul clara, Greg virou de costas e encheu a chaleira de água. 
Só depois de pô-la para ferver e se ajeitar novamente é que voltou a olhar para ela. De costas para o balcão, braços cruzados sobre o peito, manteve as mãos debaixo dos braços, onde não causariam maiores problemas. 
― Vossa Alteza Real é uma péssima mentirosa.
Imediatamente arrependido de ter deixado escapar sua raiva no tom de voz, Gregory tratou de suavizar, perguntando: 
― Quer falar sobre isso? 
Olhos baixos, Anna fez um sinal negativo com a cabeça. Lutando contra a percepção da enorme vulnerabilidade de Anna, Greg demorou um pouco antes de falar alguma coisa. 
― Você tem passado por maus bocados, Anna. Talvez fosse o caso de procurar ajuda médica, quem sabe ... 
― Não preciso de médico. ― ela retrucou, erguendo o queixo e dirigindo-lhe um gracioso e aristocrático sorriso. ― Uma Von Oberland fazendo terapia? Não, está fora de cogitação. As aparências estão acima de tudo. O mundo não gostaria de saber que nem tudo são flores para quem tem sangue azul. 
Gregory olhou-a com dureza, estudando-a longamente. 
Caía-lhe bem um pouco de empáfia. Era sinal de que ela continuava lutando. De repente sentiu-se mal pelo modo como a tratara. A verdade era que, bem ou mal, havia muita raiva dentro dele quando o assunto era a princesa Anna. 
Durante quatro anos havia conseguido manter isso sob controle, mas desde que ela chegara à Royal esse senti​mento só aumentara. 
Pareciam anos os poucos meses desde que perdera a luta contra os sentimentos que relutava em admitir e pelos quais culpava Anna. 
Afinal ele cumprira seu dever. Tirara-a de Obersbourg, levara-a para longe e cuidara para que estivesse à salvo. Acomodara Anna naquele apartamento cujo prédio ele mesmo construíra, apresentara-a na comunidade como Annie Grace, uma prima distante de seu pai, vinda de uma cidadezinha longe o bastante para não despertar curiosidade. 
Até mesmo servir mesas engorduradas, com o uniforme cor-de-rosa de garçonete e os cabelos presos em um rabo​-de-cavalo tinham sido idéias dele. 
Ele secretamente esperava que Anna, diante da difícil realidade, desejasse voltar correndo ao trono de sua pátria. 
Em retrospectiva, porém, Greg não se sentia orgulhoso de ter ido tão longe na tentativa de humilhá-la. Mesmo por que o plano não funcionara, ela não agira como ele esperava. Ao contrário, apenas se ajustara a nova rea​lidade. Sem comentários nem reclamações. 
Portava-se no emprego como se houvesse nascido para ser garçonete. Servia as mesas, ria com os fregueses, como se estivesse adorando cada minuto. 
Comportava-se, ou melhor, representava o papel de simples plebéia, afinal não podia se esquecer que repre​sentar era a palavra chave deste enigma, uma vez que Anna era uma excelente atriz, capaz de fazê-lo se apai​xonar por ela uma vez. 
― Estou bem agora. ― disse ela, depois de levar a xícara de chá aos lábios. ― Você não precisa se preocupar. Pessoas tem pesadelos, não é nada demais. 
― Você tem enfrentado maus bocados, não há nada de vergonhoso em admitir isso. 
― Certo. ― disse ela. ― Não há vergonha alguma. 
Ela estava sentada muito ereta e rígida na cadeira, e a voz era tão cheia de dor e culpa que até mesmo Gregory se condoeu. 
― Eu queria Ivan fora de minha vida. ― murmurou ela em voz quase inaudível. ― Rezei tanto para isso... Por tudo que ele me fez e à Sara principalmente. Deus do céu, eu o queria morto! 
Um rastro de pavor enuviava seus olhos quando ela prosseguiu: 
― Fiquei feliz por ele estar morto. O que isso me torna? Que tipo de monstro faria isso? 
― Tudo que você sentiu ou desejou foi humano. Ivan era um oportunista, um assassino. Era também um co​varde e provou isso ao pular da ponte. Você não tem nada a ver com essa atitude irresponsável. 
A despeito dos argumentos, o silêncio dela foi o bas​tante para deixar claro que a culpa ainda persistia no íntimo de Anna. 
― Tudo bem. ― insistiu ela tão abruptamente que Greg se espantou. ― Desculpe-me, desculpe pelo alarme tê-lo assustado. Mas estou bem agora. Juro. 
Obviamente Anna se sentia tão desconfortável ali quanto ele. 
Rapidamente ela se dirigiu para a porta, seguida por Gregory. 
― Chame Harriet se precisar de alguma coisa e tran​que a porta quando eu sair. 
Greg desceu a escada correndo e se atirou na noite. Entrou no carro e saiu apressadamente. 
Em alta velocidade atravessou a cidade, tentando ignorar o coração disparado dentro do peito, a raiva de não poder controlar os próprios sentimentos. Tinha von​tade de abraçar Anna, desejava-a. Queria que ela fosse diferente, que não fosse tão intocável, tão... 
�
CAPÍTULO III 
Já passava das duas horas da manhã quan​do Greg pôs a chave no bolso e bateu atrás de si a porta do Clube dos Vaqueiros do Texas. 
O Clube, com todos os privilégios oferecidos a seus associados, sempre fora um refúgio para Gregory. Espe​cialmente nos últimos meses, tinha sido uma dádiva po​der se refugiar naquele lugar. 
Naqueles dias em que ele não podia nem sequer obter um minuto de paz de espírito, o Clube tornara-se seu favorito refúgio. 
Ver Anna trêmula e desassossegada um pouco antes não ajudara em nada. Ao deixá-la, não pudera evitar que imagens lhe povoassem a mente, imagens deles jun​tos, em um outro tempo. 
Eis a razão que o trouxera de volta ali. 
Não que ele não tivesse trabalho suficiente para man​ter sua mente ocupada. As Indústrias Hunt haviam sido criadas por seu avô, seu pai as havia ampliado, juntando ao império financeiro da família negócios imobiliários e shopping centers. 
Sob o comando de Gregory, agora também estavam no ramo da indústria de aviação. Como advogado e líder das operações, ele nunca tinha pausa no trabalho. 
Como herdeiro aparente de uma fortuna de bilhões de dólares que ele ajudara a criar, Greg não padecia de carência de motivação. 
Lutara muito para conquistar a própria posição como um empresário de sucesso e era, por mérito, sucessor natural do Império Hunt. 
Às vezes isso parecia pesar demais na vida de Greg. 
Não raro ele invejava seu irmão mais novo, Blake, que não dava a mínima importância para os negócios. 
Um sorriso tênue surgiu no canto da boca de Gregory enquanto ele caminhava pelo bar às escuras, até encon​trar o interruptor de um dos abajures. 
Em um segundo, o aposento estava inundado por uma luminosidade suave, tornando ainda mais aconchegante a decoração masculina. 
Ainda não podia acreditar que seu irmão, o eterno aventureiro, tão aventureiro que se tornara um agente secreto, era agora um homem casado. 
Com um sorriso incrédulo e benevolente nos lábios, Gre​go:ry pegou uma garrafa de seu estoque particular de uísque. 
Não apenas um homem casado, corrigiu Greg para si mesmo, mas um homem casado e com uma família. 
Isso o fez recordar dos gêmeos, sobrinhos de Anna, e foi o suficiente para que sua garganta se fechasse de emoção. 
Não fazia nem uma semana desde que Blake e Josie haviam celebrado o início do processo legal de adoção dos filhos de Sara, irmã de Anna. 
Anna, Anna, sempre ela em sua memória. Por mais que se esforçasse, volta e meia ela se infiltrava em seus pensamentos. 
Com uma expressão irônica no rosto, Gregory pegou um copo de cristal, despejou nele uma generosa dose de bebida e tomou .de um só gole. 
O calor do uísque desceu-lhe garganta abaixo, quei​mando por dentrQ. Mal o calor atingira seu estomago quando ouviu o ruído da porta abrindo e fechando-se. Em seguida passos soaram nos degraus. 
Mal colocara um segundo copo na bandejade prata reluzente quando Hank Langley, o bilionário, ex-membro da Força Especial, e dono do exclusivo clube para cavalheiros, adentrou ao recinto. 
A perna o estava incomodando novamente. Greg per​cebeu isso assim que o viu, o que o aborreceu. 
Desde que Hank se casara com a bonita Callie Riley, havia poucos meses, não vira o amigo se queixar do velho ferimento de guerra. Por certo Hank passara o dia mon​tado na velha motocicleta, subindo e descendo as colinas, para estar daquele jeito. 
Greg sabia fazer melhor que oferecer simpatia ou dar conselhos. Langley era um homem orgulhoso e, embora isso não fosse culpa dele, Greg sabia que Hank conside​rava a perna como uma fraqueza de sua parte. 
Hank fitou o semblante preocupado de Gregory e se apoiou no balcão bem diante dele. 
― Pensei que tivesse ido para casa. 
― E tinha ... Mas voltei. ― retrucou Greg, passando o copo cheio para o amigo através do balcão. ― E o que faz ainda por aqui? Pelo que sei você se tomou um homem de família, de aliança e tudo. 
O rosto de Hank se iluminou com um sorriso, ele le​vantou o copo em um brinde e respondeu: 
― Eu amo aquela garota mais que tudo, e minha fa​mília tem um significado especial para mim. Mas passei grande parte de minha vida no alto dessas escadas e, quando me mudei do apartamento, senti que uma parte minha ficou para trás. 
― Você não se sente pronto para abandonar seu lado solteirão. 
― Eu estava precisando sentir o gostinho da vida que nunca imaginei abandonar um dia. ― corrigiu Langley com um meio sorriso nos lábios. ― Hoje estou sozinho. Callie e a tia Manie voaram para o Leste para visitarem um primo doente. ― concluiu, sorrindo. 
Sorrindo em retribuição, Greg tratou de encher nova​mente ambos os copos de uísque. 
Langley ficou quieto por um instante antes de estudar o amigo com um olhar perscrutador. 
― Então, o que há? 
Greg deu de ombros, em uma evasiva. 
― Não consegui dormir. 
Langley assentiu, olhando para o fundo de seu copo. 
― Algo relacionado a Annie? 
Gregory virou seu drinque de uma vez, considerando se admitia que, nos últimos tempos, tudo tinha relação com Anna. Por fim resolveu pela negativa. 
― Ela está bem? ― insistiu Langley, intuindo que Anna era a razão da insônia do amigo. 
Gregory se lembrou de como a deixara, poucos mi​nutos antes. 
― Sim, está bem. ― Era uma mentira deslavada, mas de nada adiantaria dizer a verdade. 
― E? ― Hank pressionou. 
― E nada. 
Exceto pelo tique-taque do carrilhão antigo, o bar estava imerso em um silêncio tumular. Os painéis de carvalho antigo eram adornados por poucos e valiosos quadros, he​rança do avô de Langley, fundador do mais exclusivo clube para cavalheiros do estado. Uma forte influência britânica se via por toda parte, onde no início do século, as mulheres não tinham lugar nos clubes masculinos. 
― Escute, você pode escolher entre fazer rodeios e fugir do assunto, ou encarar logo que a princesa é a causa de seus problemas. 
Greg suspirou fundo, cerrando os maxilares. 
― Certo. ― A despeito da relutância de Gregory, Hank estava disposto a insistir no assunto. ― Um homem com sua responsabilidade não abandona tudo, planeja e fi​nancia uma operação para resgatar uma princesa do ou​tro lado do Atlântico e a traz para cá sob o disfarce de garçonete. Uma garçonete ainda por cima! ― ele frisou seu assombro com o que Greg fizera. ― E quer que eu acredite que não existe nada. Você pode querer acreditar que tudo está acabado entre vocês, porém suas ações dizem exatamente o contrário. E enquanto você pensa no que vai responder, pegue essas duas garrafas e vamos nos sentar. Se vou passar metade da noite acordado, pelo menos quero me sentir confortável. 
Dito isso, Hank tratou de se acomodar em volta de uma mesinha pequena, onde duas poltronas de espaldar alto e couro macio os esperavam. 
Ironicamente, Greg riu de si mesmo e se juntou ao amigo, levando os copos e a garrafa de uísque com ele. Enquanto Gregory os servia de mais duas doses generosas de bebida, Hank esticava a perna ferida em um tamborete. 
― Nunca entendi a história entre ela e aquele príncipe cafajeste. 
Sobre esses fatos Greg podia discorrer sem problemas. 
― Como você já sabe, o país de Anna está passando por uma séria crise financeira, e o rei e a rainha, pais de Anna, ofereceram-na como uma recompensa para que o príncipe Ivan os tirasse dessa situação. 
― Gente esquisita. 
O risinho de Gregory encontrou eco no sarcasmo de Hank. 
― Strisky tinha sede de poder, e viu o casamento com Anna como uma maneira de controlar o reino de Obers​bourg. Quando ela se rebelou contra o casamento, foi feita prisioneira em seu próprio palácio pela família que esperava, dessa forma, convencê-la a mudar de idéia. 
― Tudo o que aconteceu depois foi um desastre. Quando Anna desapareceu, o príncipe perdeu as estribeiras, e foi até o fim. E que fim! 
Gregory fez uma pausa, levou o copo aos lábios e depois prosseguiu: 
― Fiz algumas investigações e descobri que Marcus Dumond era o treinador de cavalos de Strisky e, pasme: era também o pai dos sobrinhos de Anna. Strisky soube disso e coagiu o sujeito a renunciar a paternidade dos gêmeos em troca de uma generosa soma de dinheiro. ― ​Bebericou o drinque e, balançando a cabeça, arrematou: ― Pobre coitado! Mal sabia que com isso assinou a pró​pria sentença de morte, e também a de Sara. 
― Eu não entendo. Onde é que Anna entra nisso tudo? Se Ivan Strisky queria uma princesa, por que não quis se casar com Sara? 
― Sara era por demais rebelde e insubordinada. Stris​ky deve ter achado que jamais conseguiria controlá-la. Mas Anna sempre foi uma princesa modelo, devotada aos deveres de sua posição. 
― Mas ainda não entendo a morte do tal Dumond. No que isso ajuda Strisky? 
― Na falta de Sara, Anna é a guardiã legal dos gêmeos. Assim sendo, casando-se com ela, Ivan teria também a guarda dos herdeiros do trono. Além de usar os bebês para pressionar Anna. 
― Por isso ela o chamou para socorrê-la, certo? 
― Certo. 
― E agora o príncipe está morto. 
Gregory assentiu. 
― E Annie está se sentindo culpada. 
― Pobre garota... Perder a irmã, desistir dos sobrinhos e estar envolvida no suicídio de Ivan Strisky. Sem falar que a confusão ainda não terminou. Se a imprensa eu​ropéia descobrir essa história e souber que há uma prin​cesa européia escondida no meio do Texas, este lugar vai atrair muitos repórteres. 
― Acho que isso não vai acontecer, esse pessoal de sangue azul tem horror a escândalos. Tenho certeza de que darão um jeito de abafar a situação. Pelo que sei, eles pouco se importam com a morte de Strisky, apenas queriam vivo para salvar o reino da bancarrota. 
― Bom, essa história toda ainda não explica a razão para que você fosse correndo salvar a princesa dos apuros. 
Greg o olhou com firmeza inesperada, retrucando: 
― Não procure achar motivos onde eles não existem em absoluto. 
― Não mesmo? 
― Não. ― repetiu Gregory com segurança, procurando uma desculpa sem encontrar. Optou por se despedir do amigo. 
― Desculpe-me se o fiz perder o sono. 
― Companheiro. ― Langley disse, seu olhar perdido em um ponto da bota, ignorando a súbita pressa de Gre​gory em partir. ― O que me diz daquele garotinho dela? Um menino muito quieto, não acha? Triste, eu diria. 
Gregory pegou as chaves dentro do bolso da calça, enquanto em sua mente surgia a imagem do filho de Anna, com seus enormes olhos azuis e silenciosos como um murmúrio. E mentiu: 
― Nunca pensei nisso. Talvez a boa educação o faça quieto. 
― Isso não tem nada a ver com sangue azul. ― insistiu Langley. ― Por que será que ele é tão calado? 
― Sei lá. Não quero saber, isso não é de minha conta. 
Ele não queria admitir que o menino o preocupava também e que havia uma tristeza em ambos, mãe e filho, que transcendia aos problemas imediatos . 
― Vejo-o por aí. ― disse Greg, fugindo do assunto. ― ​E se estou preocupado, é com um certo amigo velho que pensa que pode chacoalharo esqueleto como se ainda fosse um rapazinho. ― Sorriu para Langley e caminhou em direção à porta. 
― Vá para o inferno, Hunt! Ainda não estou precisando que alguém se preocupe por mim. 
― Conheço uma moça linda que faz exatamente isso, amigão. 
― Vá, suma daqui que eu preciso dormir! E pense na princesa. Pense bem no que está deixando escapar, de novo! 
Isso dito, Langley fechou a porta deixando Greg parado do lado de fora, no escuro da noite. 
As palavras de Hank o perseguiram, acompanhando-o por todo o passeio através da cidade. Enquanto percorria o silencioso caminho até Pine Valley, o exclusivo condomínio onde construíra uma mansão estilo georgiano, havia poucos anos, Gregory não conseguia deixar de pensar no que o amigo lhe dissera. Nem em suas próprias mentiras. 
Nas mentiras que vinha repetindo para si mesmo desde que recebera o telefonema de Anna, quatro meses atrás.
O telefonema de Anna. 
Fora apenas isso. Um único telefonema e sua vida se transformara de repente em uma gigantesca mentira. Passara os últimos quatro anos tentando esquecê-la e, se conseguisse ser cem por cento honesto consigo mesmo, admitiria que bastara olhar para Anna uma vez para perceber que não fora bem-sucedido nesse intento. 
Notícias sobre os nobres e seus passatempos vendiam jornais e revistas. Dificilmente passava uma semana sem se deparar com o rosto de Anna ou de sua famosa irmã, Sara, na capa de um daqueles tablóides sensacionalistas ou em uma revista de fofocas. 
Não, ele não a esquecera, e só Deus sabia como tentara. 
Quando a conhecera estava com vinte e sete anos e, mesmo naquela época, era dono de seu nariz. Nascido em uma família cuja fortuna era antiga e obscenamente vultosa, fora criado em um ambiente de disciplina e amor e, sem ferir os padrões familiares e a tradição, sempre fizera as coisas a sua própria maneira. O que explicava sua resolução de, após se formar em Direito, ter se alis​tado nos fuzileiros navais. 
Não foi apenas para provar sua coragem ou mostrar para o pai que seguiu determinado para a missão no exterior. Quando finalmente estava para dar baixa em seu último posto, em Obersbourg, é que conhecera Anna. 
As mãos se crisparam no volante ao se recordar das poucas noites que haviam compartilhado como amantes. Tinham sido as noites e os dias mais felizes de sua vida. 
�
CAPÍTULO IV 
Anna voltou a cabeça para a confusão ins​taurada diante da porta frontal do Café. 
Um pequeno homem, vestindo calça xadrez e portando um microfone portátil, veio em sua direção. 
Ele parecia tão deslocado.do ambiente forrado de chapéus de vaqueiro como um par de tênis em uma festa a rigor. 
Um medo antigo e familiar percorreu a espinha de Anna à medida que o homem se aproximava dela, por entre as mesas. Atrás dele, um fotógrafo barbudo tirava fotos como se estivesse cobrindo uma cerimônia de coroação. 
― Fantástico! ― exclamava o homem, a voz exultante de alegria. ― Cara, isto é simplesmente fantástico! A princesa, a princesa Anna von Oberland! ― Esfregando um cartão de visita debaixo do nariz de Anna, passou um braço por sobre seus ombros, como se fossem íntimos. 
― Herkner. ― apresentou-se ele. ― Willis Herkner, do Investigador Americano, a seu dispor, Alteza. ― E viran​do-se para o fotógrafo, disse: ― É melhor você registrar isto, Jackson. Uma garçonete! Eles a vestiram como uma garçonete! ― Ele lançou-lhe um sorriso e com voz melíflua disse: ― Agora, princesa, diga-me; o que uma pequena da realeza faz neste buraco, vestida com esses trajes? 
Anna ficou tão estupefata com o espocar dos flashes e com o uso de seu título real, que por alguns instantes ficou sem voz, assim como todos os demais presentes no Royal Diner. Ela relanceou a vista ao redor do Café, todos estavam olhando-a. Um misto de choque e curiosidade lia-se nos olhares, assim como desconforto. 
Aquelas pessoas eram suas amigas, pelo menos ela acreditava que eram. Mas o que viu nos olhos deles foi a si mesma como uma traidora. De certa forma, Anna sentiu que traíra a confiança deles. 
― Você está enganado. Meu nome é Annie, Annie Grace... ― murmurou ela, sua mentira soando pouco convincente. 
― Que é isso, princesa... querida... Não me venha com mentiras. Agora, conte-me tudo. Vamos entrar em um acor​do antes que o resto da turma chegue aqui. Quero uma entrevista exclusiva e estou disposto a pagar por isso. 
O ruído estridente e abrupto dos sininhos da porta de entrada interrompeu a frase e atraiu todos os olhares.
― Bastardos! ― disparou Herkner quando uma equipe de televisão adentrou ao recinto, o logotipo nas câmaras indicando se tratar de uma das maiores redes nacionais. 
Logo atrás deles mais e mais repórteres se acotovela​vam para entrar no Café. 
― Vamos, princesa! ― Herkner pegou Anna pelo braço, puxando-a até a porta dos fundos do Royal Diner. ​― Esta história é minha, e não vou deixar que nenhum outro se aproprie dela, pode apostar que não. Por que está escondida aqui? O que sabe da morte do príncipe Ivan? Todos sabemos que ele veio até aqui a sua procura, e que agora está morto. É sua chance de contar toda a história. ― concluiu ele com um risinho maldoso. 
Segurando o braço dela com força, Herkner ensaiou levá-la de volta ao salão lotado. Mesmo quando ele a bombardeava de perguntas uma chusma de repórteres se juntava sobre Anna, enfiando microfones na sua boca e espocando flashes sem parar. 
Manny colocou a cabeça para fora da cozinha. 
― Que está acontecendo aí? 
Anna se agarrou em uma mesa, como se fosse uma âncora. 
― Manny! ― implorou ela por socorro. Mas mesmo que conseguisse saltar sobre o balcão seria inútil, os repórteres eram muitos, e Manny, apenas um. 
De mais a mais, Herkner já estava levando Anna pela saída dos fundos. 
― Detenha-os, Manny! 
O olhar de Anna se voltou ao ouvir o som da voz de Gregory sobressaindo-se em meio à algazarra da multidão de repórteres e das cadeiras e mesas tombando pelo salão. O coração dela se encheu de esperança ao avistar ao longe as abas do imenso chapéu preto de caubói acima da multidão. 
Greg não ficou no meio da multidão por muito tempo. Com um ágil movimento ele subiu em uma cadeira, da cadeira para cima de uma mesa e assim, de mesa em mesa. Voavam saleiros, guardanapos, copos e pratos sob as botas negras, e não fosse assustadora, a cena seria hilária. Tal e qual um dos filmes policiais que William adorava ver na televisão. 
O Diner inteiro parecia uma praça de guerra. 
Herkner apertava o braço de Anna brutalmente, e o exército de repórteres, fotógrafos e câmaras de televisão continuava implacável em seu encalço. 
Derrubando mesas, Gregory procurava chegar onde ela estava. Forrest Cunningham e Sterling Curchill se jun​taram à massa, bem atrás de Greg, que com as feições fechadas e duras tentava alcançar Anna. 
Langley também se juntou a eles, postado à frente da porta de entrada do Diner, tal e qual uma muralha de cimento. O olhar sombrio em seu semblante era visível através da aba de seu chapéu que disparava fagulhas de ódio que intimidava todos os retardatários que, por ventura, ainda pensassem em entrar no Diner. 
― Deixe-a ir, seu imprestável! ― Gregory gritou ao dar uma chave de braço no pescoço de Herkner. 
Quando o repórter torceu ainda mais o braço de Anna, Greg não teve dúvida, com o joelho acertou o rim esquerdo de Herkner que, ganindo de dor, soltou-a. 
― Isto é um ataque! Vou processá-los! ― balbuciou ele. 
― Então nos veremos no tribunal ― Greg disparou enquanto Herkner se esborrachava no chão. 
Dando um passo, Greg puxou Anna para seu lado.
― E quando chegarmos lá, que tal termos uma conversa com o juiz sobre invasão de privacidade. Que tal juntarmos a isso tentativa de seqüestro, só por farra? 
Com o braço a seu redor, forte, porém gentil ao mesmo tempo, Gregory usou o próprio corpo como um escudo para proteger Anna. 
Um fotógrafo se aproximou e começou a disparar. 
― Você entrou em uma zona de perigo, amigo. ― avisou Manny, bloqueandoa passagem. 
― Cai fora, cara... Você não sabe que a temporada de caça à princesa está sempre aberta? ― respondeu furioso homem. 
― Sei que está aberta a temporada de caça a cretinos. ― Polidamente Manny bateu com uma haste de metal nas pernas do sujeito, que caiu como um saco de batatas. 
― Vai, vai, rapaz! ― gritou para Greg, com um risinho irônico nos lábios e, dirigindo-se para o fotógrafo estate​lado no chão, perguntou: ― Quer insistir com as fotos? Então venha cá. 
Aquilo tudo parecia um pesadelo para Anna que era levada em segurança por Gregory até a porta dos fundos. 
Tal e qual em seu pesadelo, Anna sentia-se perseguida e agarrada por milhares de mãos, que a suspendiam no ar. 
Com um gemido de alívio, Anna se lançou nos braços de Gregory em busca de conforto e segurança, recostando face contra o peito forte e protetor dele. 
Anna ouviu o barulho da porta batendo atrás deles. A sensação que a acometeu foi tal qual o sol do Texas aquecendo seu rosto e o calor do corpo de Gregory contra seus seios.
Ao abrir novamente os olhos, ainda estava nos braços dele, sentindo-lhe o bater acelerado do coração. 
Correram pelo pátio, Gregory ágil como um atleta olím​pico. Parou na esquina, verificando se havia repórteres de tocaia antes de entrar no carro. Abriu a porta para Anna, jogou-a para o interior do veículo e, em seguida, pegou no volante, pronto para dar a partida. 
Nesse ínterim, porém, um dos fotógrafos mais afoitos se adiantou, impedindo Greg de fechar a porta do carro. 
― Fora! ― ordenou Gregory. 
― Nem morto! ― vociferou o outro já se posicionando para mais uma foto. 
Esse foi o grande erro do homem. Gregory, completa​mente fora de si, não teve dúvidas, arrancou a câmera das mãos do fotógrafo. 
― Ei, isso é propriedade particular! Você não pode... ― tentou argumentar o dono da máquina. Porém o ruído da câmara espatifando-se contra o capô do carro inter​rompeu-o no meio da frase. 
Aproveitando a confusão, Gregory arrancou com o car​ro, cantando pneus por quase três quarteirões. 
Anna arriscou olhar pelo retrovisor e o que viu foi desanimador; a turba de repórteres estava correndo para seus veículos. 
― Eles virão atrás de nós! 
― Podem tentar. ― murmurou Greg por entre os den​tes, com um risinho. ― Aperte o cinto de segurança, isto não vai ser exatamente um passeio. 
Gregory pisou fundo no acelerador, os prédios voavam pela janela lateral. Zonza, Anna viu-o ziguezaguear entre os outros veículos, fugir dos sinais fechados em arriscadas manobras, até acabarem prensados entre uma muralha de pedra e um caminhão de lixo. 
Dez longos minutos se passaram até que Gregory vol​tasse a olhar para Anna a seu lado. Toda a adrenalina que a perseguição despejara em sua corrente sanguínea se dissipou ao vê-la. 
Anna estava arranhada, abatida e pálida. 
A observação idiota do repórter voltou à mente de Gre​gory “a temporada de caça às princesas está sempre aberta". 
Pela primeira vez desde que tudo começara, Greg sentiu pena do tipo de vida que Anna levava, sempre exposta como um peixe em um aquário, alvo das atenções de todo o mundo. 
Ao mesmo tempo, a única coisa que lhe vinha à mente era a sensação inebriante que o dominara ao tê-la acon​chegada contra seu peito minutos antes. 
Fazia muitos anos desde a última vez que a abraçara. Quatro longos anos desde que sentira seu hálito doce e o calor de seu corpo. 
Gregory apertou com força o volante. 
― Acho que os despistamos. ― disse ele, desejando tê-la novamente entre os braços. ― Anna, você está bem? 
Ela assentiu, o olhar fixo no horizonte. 
Subitamente a preocupação tomou lugar do desejo no coração de Gregory. 
― Aquele bastardo a machucou? 
Ela cerrou os olhos, pôs as mãos sobre os próprios ombros e balançou a cabeça. 
Imediatamente alerta, Gregory soltou o próprio cinto de segurança e se voltou para Anna, suspendendo a manga de seu uniforme até o cotovelo. Manchas roxas no formato dos dedos de um homem maculavam a alvura da pele adamascada. No dia seguinte estariam maiores e mais escuras. 
Gregory viu quando lágrimas escorreram do rosto de Anna. Um pranto silencioso, contido e, por isso mesmo, muito doído. Aquilo o fez perder completamente a razão. 
― Droga. ― praguejou ele, deslizando para mais perto dela. ― Venha cá. ― murmurou Greg, abrindo o cinto de segurança de Anna e puxando-a a para si. 
Ela se deixou envolver, e ele sentiu que estava perdido. Mais uma vez, perdido, foi o que Gregory pensou no ins​tante em que Anna se aninhou em seu colo. 
― Já passou, já passou. ― murmurou ele. 
Foi o bastante para que as lágrimas, até então repre​sadas, rolassem pelas faces de Anna, desabando em choro convulso. 
― Oh, Anna, não. Não chore, por favor, Anna. ― sus​surrava Greg, pressionando os lábios contra os cabelos louros, tocando as delicadas orelhas. ― Eu lhe peço, por favor, pare de chorar. 
Gregory agiu com total naturalidade quando puxou para si o rosto de Anna e enxugou as lágrimas com os polegares. Ela continuava chorando, um pranto silencioso e doído, de partir qualquer coração. Ele manteve o silêncio na tentativa de resguardar, um pouco que fosse, o orgulho real intacto. 
Roçando seus lábios nos de Anna, sussurrando-lhe o nome, Gregory provou o gosto salgado de suas lágrimas e então abandonou o bom senso. 
Silenciou seus soluços com um beijo. 
Um longo, profundo e terno beijo. 
Pousando sua boca na dela, Gregory prometeu matar todos os dragões, escalar todas as muralhas, vencer todas as batalhas só para que cessasse seu pranto. 
A princípio Anna chorou ainda mais, como se quisesse acreditar naquelas promessas, porém receasse não ser digna delas. Então, diante de tão poderosa ofensiva de Greg, começou a ceder. 
Começou a confiar no que ele oferecia, na mensagem de sua ternura e a aceitar o que Gregory estava tão ansioso por lhe oferecer. 
Anna abriu os olhos, e Greg viu o renascer de um intenso desejo. Ele viu a urgência de sua necessidade e se dispôs a satisfazer a ambos. 
Tomou a boca de Anna, protetora e possessivamente, cuidadoso. 
A princípio isso foi o bastante, por um momento foi suficiente, então tudo mudou. 
O toque da mão dela em sua face, a princípio uma tentativa hesitante, tornou-se uma carícia ardente. O con​torno de sua boca contra a dele, primeiro trêmula e ansiosa, logo ávida e embriagante. Anna não apenas se abrira para ele, como o convidava para entrar. 
Um convite que Gregory esperava havia quatro longos anos. 
Ela era doce e suave. Doce como a água para o homem perdido no deserto, suave como a seda dos cabelos louros que tinha entre seus dedos ansiosos. 
Gregory a segurou com mais firmeza junto de si, pressionando a delicada curva do quadril contra sua virilha, deixando-a sentir o volume crescente de seu desejo, cruzando a mão sobre seu seio... 
Um balido estridente quebrou o encanto que mantinha unidos os lábios e, por cima de seu ombro, o olhar frenético de Greg buscava a origem do ruído enquanto seus braços procuravam ocultar Anna junto do peito. 
― Faça isso em outro lugar, amigo. ― gritou um homem gordo e imundo com um cigarro pendurado no lábio inferior. ― Tenho que terminar meu serviço. ― disse, mostrando o caminhão de lixo parado. 
Gregory não percebera que estava bloqueando a passagem, interferindo no trânsito com seu beijo. Instantaneamente afastou Anna e recolocou o cinto de segurança dela e o seu. Em seguida avançou, desbloqueando a via pública. 
Amaldiçoou silenciosamente a si mesmo por ter perdido o autocontrole. 
― Desculpe-me. ― disse em voz baixa. ― Isso não deveria ter acontecido. 
Quando Anna afastou os cabelos do rosto, Gregory percebeu que sua mão não estava muito longe da dele. Ela simplesmente decidiu ignorar o pedido de desculpas, como também o beijo, apenas respirou fundo e perguntou: 
― Aonde estamos indo? 
Gregory suspirou e, com os olhos fixos na estrada diante deles, respondeu: 
― Ainda não sei ao certo. 
Depois do segundo quarteirão,Greg discou um número no telefone do carro, e uma voz formal se fez ouvir nos alto-falantes: 
― Residência dos Hunt. 
― Lawrence. ― respondeu Greg abruptamente, ainda tentando se recompor. ― Estou no trânsito, pode me dizer qual é o clima por aí? 
― O clima, senhor? 
― Quero que cheque as câmaras de segurança. Veja se há carros na entrada. 
― Um momento, senhor. 
Gregory lia nos olhos de Anna uma dúzia de perguntas não respondidas. Ignorou a quase todas, respondendo apenas a uma, aquela que, no momento lhe pareceu a única razoável: 
― Lawrence toma conta de Pine Valley, minha casa. 
― Senhor, ― era a voz de Lawrence novamente. ― Há um movimento pouco usual de carros estacionados diante dos portões, parece-me que muitos trazem equi​pamentos de vídeo. 
Amaldiçoando Herkner pela descoberta de Anna e do envolvimento do Clube dos Vaqueiros no resgate dela de Obersbourg, Gregory praguejou baixinho. 
― Senhor, há algo que eu possa fazer a respeito? Devo chamar a polícia? 
― Não já, Lawrence. Não já. 
― Senhor?
― Darei instruções mais tarde. Nesse ínterim guarde a fortaleza, não os deixe entrar. 
― Como quiser, senhor. 
Gregory desligou, checando o retrovisor novamente. 
― E agora? 
Respirando fundo, Greg relutante tomou uma decisão. 
― Agora vamos torcer para que eles não descubram o rumo de meu rancho até você estar em segurança. 
― Rancho? Você tem um rancho? 
― Estamos no Texas, Anna. Claro que tenho um rancho. 
― É muito longe? 
― Longe o bastante para manter aqueles chacais a distância.
― William. ― gritou ela de repente. ― Não posso partir sem ele. 
Sem dizer uma palavra, Gregory discou outro número no celular. 
Harriet atendeu no terceiro toque. 
― Alô! O que você manda? 
― Olá, Tanque. 
― Já soube que você arrasou hoje no Royal, com seu estilo de fuga. 
― Depois lhe contarei isso. No momento preciso apenas que você e o pequeno saiam do apartamento de Anna e venham até meu rancho, certo? Sem demora e sem confusão.
― Considere feito. Vejo-o daqui a uma hora. 
Gregory sabia que podia contar com Harriet de olhos fechados. 
― Estaremos esperando. 
Ele desligou e olhou para Anna.
― Tudo certo? 
Ela assentiu. 
― Tudo. 
Mas nada estava realmente certo. E enquanto corria para fora dos limites da cidade em direção ao campo aberto que levava a Casa Royale, Greg ponderava se alguma coisa em sua vida, ou na dela, voltaria a ficar bem outra vez. 
�
CAPÍTULO V 
O sol do poente derramava reflexos doura​dos sobre os cabelos louros de Anna que corria em direção ao carro de Harriet, braços abertos para enlaçar o filho que ali estava. 
Gregory assistia à cena entre as sombras do celeiro.
A sensação de estar excluído se avolumava dentro de seu peito, embora absolutamente indesejada. Não apenas ele não se encaixava naquele quadro como também se escondia daquela realidade, mantendo distância de Anna. Como um covarde, como um homem cujo sofrimento quei​mava em seu íntimo como uísque puro garganta abaixo. 
Sim, tinha perdido o controle naquele beco, mas fora só o momento, dizia a si mesmo, vendo Anna correr em direção ao carro de Harriet. Era só vê-la para que a descarga de adrenalina voltasse a bombardear suas veias. 
Você tem que manter as mãos longe dessa mulher. Greg repetiu para si mesmo ao cobrir a distância em largas e lentas passadas. Mas uma parte dele não conseguia entender a razão pela qual eles não podiam ficar juntos. Uma parte dele sofria por não entender por que havia terminado o que ambos haviam vivido tão intensamente quatro verões atrás. 
Mas uma porção sã e racional dele sabia que a razão era simples e de puro bom senso. Eles não tinham futuro algum juntos. Nem bom, nem ruim. 
― Olá, Greg. ― saudou-o Harriet ao vê-lo. 
Harriet tinha sessenta e cinco anos de idade e vivera cada um deles intensamente. Greg confiaria a própria vida àquela mulher de calça jeans e camisa xadrez, com os cabelos grisalhos, por isso confiara a ela a vida de Anna e William. 
Gregory sabia, mesmo antes de perguntar, que não havia nada para se preocupar a respeito da fuga deles de Royal.
― Algum problema para vir até aqui? 
― Nada. 
― Foram seguidos? 
Ela sorriu irônica. 
― Apenas por dois amigos seus. Mas deram meia-volta há alguns quilômetros, assim que tiveram certeza de que nada sairia errado. ― Harriet disse, abrindo o porta-malas. 
Gregory arqueou uma sobrancelha. 
― Desculpe, querido. Eu sei que disse para nos apres​sarmos, mas até para a pressa há um limite. Precisei juntar minha maquiagem, e nosso amiguinho precisou trazer seu pijama. Certo, Will? 
O príncipe William von Oberland sorriu timidamente.
― Caubóis. ― respondeu o menino entre os braços da mãe e olhando para Greg. 
― Caubóis? ― perguntou Gregory sem entender. 
― O pijama dele... ― explicou HarrÍet, seguindo para a casa ao lado de Gregory. ―... é do Dallas Cowboys. 
― Ah, bom. Se é assim, tudo bem. ― respondeu com um sorriso para o menino. ― Fico feliz por saber que se lembrou do campeão. ― disse, passando a mão sobre os cabelos escuros dele. 
A carícia espontânea enterneceu Anna. Seu filho estava tão pouco habituado a demonstrações de afeto, especial​mente masculinas que aquilo tocou seu coração de mãe. 
Era a dor que machucava seu coração desde antes William nascer, que pesava em seu peito. 
― Telefone, sr. Hunt. 
Uma mulher magra, com grandes olhos castanhos e a pele morena que proclamava sua origem mexicana, foi ao encontro deles no vestíbulo. 
Gregory já apresentara Anna a Juanita Hernandez quando, um pouco antes, levara-a para conhecer a casa. 
Juanita brindou Harriet e William com um caloroso sorriso de boas-vindas e entregou o telefone sem fio para Gregory. 
― Aqui é Hunt. ― disse Greg ao atender a ligação, fazendo sinal para que Anna e Harriet se acomodassem no confortável aposento enquanto ele falava ao telefone. 
Com o dedo Juanita fez um gesto para que William a seguisse até a cozinha. Seu enorme sorriso e o aroma convidativo foram convincentes, mas mesmo assim o me​nino consultou a mãe com o olhar antes de se decidir. 
― Você gosta de biscoitos? ― ofereceu Juanita, pe​gando-o pela mão. ― Meu Tito adora biscoitos, e aposto que vai gostar de você também. Vou mostrar onde guardo a lata de biscoitos. 
― Juanita é a empregada de Greg. ― explicou desnecessariamente Harriet assim que os dois entraram na cozinha. ― O marido dela, Alexandro, treina os cavalos quarto-de-milha do rancho. Tito é o filho caçula deles, acho que tem cinco anos agora. Uma criança adorável. Tenho certeza de que será uma ótima companhia para William enquanto estiverem aqui. 
Enquanto estiverem aqui. Anna repetiu a frase mentalmente, perguntando-se por quanto tempo ficariam ali. Ou melhor, quanto tempo ela suportaria ficar ali. 
Até aquele instante, porém, nada havia lhe parecido tão assustador e perigoso quanto o beijo daquela tarde. Perigoso, excitante e totalmente proibido se quisesse manter intacta sua sanidade mental. 
Gregory havia lhe mostrado o interior da casa logo na chegada, mas Anna estava tão perturbada com todos os acontecimentos e de tal modo preocupada com William que pouco ou nenhuma atenção prestara. 
Agora que William estava a seu lado e em segurança, e passado o choque inicial, Anna começava a reparar na beleza arquitetônica do lugar. Do sofá onde estava, pas​sou a admirar cada detalhe da casa de Gregory. 
Tudo ali transpirava a essência texana. Aposentos am​plos e arejados, arcos grandiosos e tudo banhado de sol. Azuis intensos e vermelhos queimados, vários tons de terra. Todas as cores e texturas combinadas para dar a sensação de aconchego. 
Das paredes externas de barro queimado e madeira, dos tijolos e vigas da sala principal, tudo naquela casa levava a pensar em uma intensa e profunda comunhão com a natureza, com a própria terra e com ele mesmo. A casa parecia uma extensão de seu íntimo, de seu caráter. 
No centro da sala uma lareira de pedra dominavao ambiente, exatamente como Gregory dominava todos os lugares que estava. 
O mesmo cedro rústico que vira nos mourões da varanda estava presente no forro. O mobiliário era no estilo da fron​teira, pesado e agradavelmente acolhedor. Por toda parte havia tapetes coloridos feitos pelos índios Navajo, alguns tão trabalhados que eram verdadeiras obras de arte. 
Cada um dos detalhes da decoração traduzia o espírito do Texas, o respeito que Gregory nutria por sua origem e seus antepassados. 
Aquilo era um lar em sintonia total com o passado histórico e grandioso da terra venerada que, Gregory lhe contara, estava na família há mais de um século. 
A expressão dura dele ao desligar o telefone fez com que Anna deixasse de lado seus devaneios e voltasse sua atenção para o presente. 
― Más notícias? ― Harriet interpelou-o logo. 
― Era Blake. Ele fez uma pequena investigação sobre o que provocou o incidente no Diner. Parece que vazaram algumas informações da embaixada de Asterland sobre a morte do príncipe. O repórter que a agrediu, Herkner, trabalha para o Investigador Americano. 
― Investigador? Aquele tablóide sensacionalista? ― ​interrompeu Harriet. 
― Esse mesmo. ― confirmou Greg, olhando de esguelha para Anna ao se dirigir para o bar no canto da sala. 
― Não foi o Investigador que deu a notícia sobre a possível presença do príncipe Ivan em Royal? 
― Exatamente. Enquanto a equipe Alfa estava acom​panhando os passos de Strisky, eu conversei com certas pessoas e deixei escapar "nossa" versão da história. Isso não evitou que Herkner saísse por aí fazendo perguntas. Ficou sabendo que os pais de Anna e Strisky haviam tratado o casamento real, e quando escarafunchou mais, descobriu que a noiva havia desaparecido. Com a notícia da morte de Ivan, foi questão de tempo até ele juntar os fatos e acabar concluindo que a chave do enigma estava aqui em Royal. Chegou aqui, fez algumas perguntas e, sem muita dificuldade acabou encontrando a princesa. 
Gregory deu a volta no balcão, abriu o frigobar e tirou de lá uma cerveja. Anna pensou que ele fosse levar a garrafa aos lábios, mas ao invés disso viu-o estender o braço em direção a Harriet, em um oferecimento.
Sem titubear, ela aceitou o oferecimento e virou no gargalo mesmo um largo gole da bebida gelada. Só depois de Anna recusar qualquer sugestão de drinque é que Greg se serviu de outra cerveja e, como fizera a amiga, também dispensou o copo. 
― Se Herkner não houvesse sido tão cabotino a ponto de se gabar de sua esperteza para um amigo que, por acaso também era repórter, nós teríamos conseguido conter a situação. Pô-lo para correr não teria sido difícil e, no mínimo, teríamos ganho algum tempo a mais. Mas o idiota tem a boca maior que o cérebro, e as notícias se espalharam mais depressa que fogo em palheiro.
― Daí o enxame de repórteres hoje no Diner. ― con​cluiu Harriet enquanto Anna se afastava deles em direção à janela. 
Lá fora um gramado cuidadosamente aparado e ver​dejante servia de moldura para os mais variados tipos de cactos, canteiros floridos e um sem número de árvores em miniatura, que iam do carvalho à amoreira. Tudo isso confinado entre os muros da propriedade de Gregory. Além deles se podia avistar a planície quase desértica que se estendia até o horizonte. Anna suspirou, pensando que, embora magnífica, aquela casa não passava de uma prisão. A sua prisão. 
Não bastava ter escapado de Obersbourg, onde quer que fosse as grades a acompanhariam, afinal a mídia não co​nhecia fronteiras, e era dela que Anna tentava escapar. 
Harriet e Gregory se entreolharam preocupados. 
― Eles não poderão alcançá-la aqui, Anna. ― assegu​rou Greg ao tomar por medo o silêncio da princesa. ― Eu protejo minha propriedade e minha privacidade. 
Eu a protejo. As palavras não foram pronunciadas, mas ficaram subentendidas. 
Em um lampejo, Anna se deu conta que, após a morte de Ivan, não havia nada que a ameaçasse realmente, nada a não ser sua própria condição de princesa. Nada a poderia proteger de sua vida. Ela crescera com o espocar dos flashes em seus olhos, sendo alvo da atenção e cu​riosidade do público. Até chegar ao Texas como Annie Grace nunca tivera uma vida sua, privada. Todas suas ações sempre foram de domínio público. 
Era egoísmo deixar que Gregory se dispusesse a enfren​tar o mundo para preservá-la de uma situação que era parte inerente de sua vida. Se conseguira suportar por vinte e oito anos essa rotina, não era justo reclamar agora. 
Só queria um pouco mais de sossego. Só um pouquinho mais, embora sentisse as faces arderem de vergonha só de pensar nas inúmeras obrigações deixadas de lado. Um pouco mais de tempo e tranqüilidade até que conseguisse reunir coragem para contar à Gregory a respeito de William. 
Anna relanceou os olhos em direção ao pai de seu filho. Uma tristeza incomensurável enchia seu coração, expul​sando seu sonho impossível de felicidade. 
Quem o protegerá, Gregory, da dor, quando finalmente eu reunir forças para lhe contar de minha traição? 
Mesmo quando se fazia essa pergunta, já sabia que só havia uma resposta. Ela e só ela, poderia fazer isso. 
Gostaria de pensar que a alegria de conhecer seu filho amenizaria o impacto de saber ter sido enganado. 
Só de imaginar o momento da revelação, o coração de Anna disparava. Sabia que Gregory jamais entenderia seus motivos, tinha certeza de que ele nunca entenderia suas razões para mantê-lo afastado de seu filho tantos anos. 
Não poderia convencê-lo mas talvez pudesse compen​sá-lo. Uma única visão dos olhos azuis de William, olhos iguais aos do pai, ou a lembrança do carinho de Gregory ajeitando os cabelos do menino, já eram mais que sufi​cientes para convencê-la de que era preciso compensar a ambos tantos anos de ausência. Mesmo que isso sig​nificasse correr o risco de perder seu filho. 
Mas risco muito maior era continuar omitindo a ver​dade de William. Ela sabia que Gregory o aceitaria como filho, embora tivesse dúvidas de como ele reagiria ao se deparar com um filho cuja sede de amor e carinho pa​ternos eram imensos. 
Essas dúvidas que a assaltavam eram mais que sufi​cientes para Anna retardar um pouco mais a revelação. Porém, ela sabia que não partiria para Obersbourg antes de estar certa do amor de Gregory pelo filho. Nesse mo​mento e só nesse, ela revelaria a verdade para os dois. 
Cruzando de ponta a ponta o amplo horizonte do Te​xas, uma luz prateada anunciava o alvorecer. Como uma borboleta saindo do casulo, a luz do sol coloria de azul cobalto o céu. 
Anna vestiu um robe e foi ao pátio assistir extasiada ao nascer do sol, enquanto ouvia os sons que anunciavam o despertar da casa a sua volta. Somente quando lhe chegaram às narinas os aromas vindos da cozinha de Juanita é que Anna retornou a seu quarto. 
Tomou um rápido banho, agradecendo a Harriet a lem​brança de trazer, junto com os pijamas de William, uma calça jeans, um suéter e roupas íntimas para ela. 
Tito e William vieram correndo da casa em direção ao quintal assim que Anna se sentou à mesa colocada no pátio. Uma brisa suave assanhou seus cabelos e, sob os pés descalços, pôde sentir o frio da noite ainda presente no piso de cerâmica. 
As paredes externas da casa eram recobertas de hera, formando um adorável quadro natural. Um pouco à frente Anna podia ver a mureta de pedra ao redor da piscina, onde Juanita tivera o bom gosto de plantar um arbusto típico do Texas cujas flores deviam cobrir toda a extensão na primavera. 
Primavera! Anna não podia imaginar onde estaria quando chegasse a primavera. Seu olhar vagueou pelo jardim a sua frente, admirou as esculturas de pedra que ponteavam aqui e ali, e deteve-se um pouco na fonte de água cristalina. 
Há poucos metros dali, William e Tito brincavam sobre a grama. Anna estava pronta para ir se juntar a eles quando foi surpreendida por um cão imenso que galopava em direção a William. 
Assustada com o tamanho do animal, ela se pôs em pé, mas antes que pudesse fazer qualquer movimento foi interceptada

Continue navegando