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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Instituto Politécnico da PUC Minas Departamento de Engenharia Química Laboratório de Operações Unitárias I Curso de Engenharia Química 7º Período Ana Júlia Porciúncula da Fonseca Isadora Vinseiro Martins Wilson Wallace PRÁTICA 6 - PRODUÇÃO DE CREME HIDRATANTE: Agitação, mistura e emulsão Belo Horizonte 2018 1. INTRODUÇÃO A palavra emulsão deriva do latim emulgeo, que significa mungir, aplicando-se de modo geral, a todas as preparações de aspecto leitoso. Sendo assim, são dispersões coloidais formadas por uma ou mais fases imiscíveis ou praticamente imiscíveis. Denominam-se da seguinte forma: fase interna, dispersa ou descontínua, e a fase que rodeia as gotículas é a externa, dispersante ou contínua (ZANON, 2010). Para além desses dois componentes existe um terceiro designado de agente emulsivo, o qual contribui para tornar a emulsão mais estável, pois posiciona-se entre a fase dispersa e dispersante, retardando assim a separação. Desta forma, trata-se de um sistema termodinamicamente instável, que tende a separar as fases quando mantido em repouso, em função das forças que tendem a reunir novamente as gotículas dispersas (LACHMAN, 2001; MARTINA, 2005). Em relação aos tipos de emulsão, existem basicamente dois, o óleo-água (O/A), cuja fase interna é constituída por substâncias lipofílicas imiscíveis com a fase externa, formada, por sua vez, por água e substâncias polares. O segundo é o água-óleo (A/O), cuja constituição da fase interna dá-se por água e componentes polares, enquanto a fase externa é formada por compostos apolares (SALES, 1998; OLIVEIRA, 2009). No que tange à fase aquosa, constituída por água purificada, se dissolvem ou dispersam os seguintes constituintes: umectantes (glicerina ou propilenoglicol); estabilizantes (ácido poliacrílico ou metilcelulose); conservantes (Nipagin – metilparabeno), que são antimicrobianos e antioxidantes (OLIVEIRA, 2009). Por definição, os umectantes são substâncias que absorvem água, e quando adicionados à emulsão, reduzem ou impedem a perda de água por evaporação, levando à formação de um filme sobre a pele quando aplicados. Alguns apresentam o gosto adocicado, como o Sorbitol e o Glicerol, além dos mais comuns como a vaselina ou as ceras de carnaúba ou manteiga de Karité (GALEMBECK; CSORDAS, 2012). Já os estabilizantes, possuem a função de incrementar a consistência das emulsões, de forma a melhorar a estabilidade destas preparações. Estes compostos ajustam a viscosidade e a fluidez de uma formulação e também podem promover a rápida fixação da formulação líquida em seu local de aplicação, principalmente quando a formulação é aplicada por aspersão (caso dos sprays de cabelo). Há um grande número de substâncias químicas usadas com essa finalidade, muitas delas naturais. Na sua maioria, são polímeros solúveis em água, como a carboximetilcelulose (GALEMBECK; CSORDAS, 2012). A fase oleosa é formada por substâncias de natureza apolar cuja função principal é aumentar a flexibilidade e suavidade da pele (emoliência), e os componentes desta fase podem ser hidrocarbonetos, álcoois gordos, ácidos gordos e seus ésteres, ceras e silicones (OLIVEIRA, 2009). No que diz respeito ao terceiro componente, temos os agentes emulsionantes (ou surfactantes), que reduzem a tensão interfacial. Esses agentes constituem-se em sua maioria por moléculas com características anfifílicas, isto é, aquelas que possuem em sua estrutura uma grande cadeia hidrofóbica e em sua extremidade uma parte hidrofílica (OLIVEIRA, 2009; CASTRO, 2014). Dentre os agentes emulsivos sintéticos (não-iônicos), temos o monoestearato de glicerila, que apesar de ser o mais simples dos compostos não iônicos é um mal agente emulsivo, sendo utilizado como agente auxiliar, aumentando a consistência da fase oleosa. O monoestearato de glicerila é um auto-emulsionante, que consiste no éster do anterior, adicionado de lauriléter sulfato de sódio – o Lauril (CASTRO, 2014). O princípio químico entorno dos agentes acima é baseado na formação de micelas. Microestruturas aproximadamente esféricas formadas por tais moléculas, quando em um meio aquoso se organiza criando uma estrutura com seu exterior formado pela parte da molécula que possui afinidade com a água, e no seu interior o material insolúvel no mesmo meio. Essa característica justifica sua importância no meio industrial (SCHWEITZER, 2003). A formação da micela depende de vários fatores que devem ser controlados como concentração, temperatura e pressão de vapor da água. Além disso, existe a concentração micelar crítica, que é a concentração mínima de material anfifílico para que a micela possa se formar no meio (SCHWEITZER, 2003). 2. PRODUÇÃO INDUSTRIAL As emulsões podem ser preparadas por vários métodos, dependendo da natureza de seus componentes e dos equipamentos disponíveis. De maneira sucinta, descreve-se abaixo as etapas de fabricação. 2.1 Pesagem e medida das matérias-primas É a operação que consiste na determinação da massa de um determinado corpo, que por sua vez, é definida como sendo a quantidade de matéria contida no mesmo. Na indústria farmacêutica, pesa-se em balanças industriais (Figura 1) inclusive os líquidos por questão de padronização do processo produtivo (DA SILVA, 2014). Figura 1 – Balança industrial em indústria de cosméticos Fonte: NEWSERRADO, 2011. 2.2 Preparo das fases aquosa e oleosa Consiste na identificação, separação, distribuição e preparo de cada uma das fases que compõem a emulsão, separadamente. Adicionando-se os ingredientes correspondentes a cada uma delas, sendo os ingredientes hidrofílicos adicionados na fase aquosa e os lipofílicos na fase oleosa (DA SILVA, 2014). Esta etapa de preparo das fases pode envolver processos tais como solubilização, aquecimento, fusão de componentes sólidos da fase oleosa, entre outras. Para reduzir a fase interna em pequenas gotículas é necessária a aplicação de energia na forma de calor, agitação mecânica, vibração ultrassônica ou elétrica (DA SILVA, 2014). 2.3 Ajuste de temperatura das fases Para garantir o sucesso da emulsificação e a estabilidade da formulação, é necessário ajustar as temperaturas das duas fases antes de adicionar uma à outra, fazendo com que as temperaturas de ambas sejam iguais ou, no máximo, bem próximas uma da outra. A formação das emulsões ocorre em temperaturas relativamente elevadas e, em seguida, arrefecidas à temperatura ambiente (DA SILVA et al., 2014). A influência mais importante que a temperatura tem sobre uma emulsão é provavelmente sobre a sua inversão, sendo conhecida como temperatura de inversão das fases (TIF). A temperatura de inversão das fases é considerada, normalmente, como a temperatura na qual as propriedades hidrofílicas e lipofílicas do emulgente se equilibram (DA SILVA et al., 2014). 2.4 Mistura e agitação Nesse ponto, tanto a fase aquosa quanto a oleosa e o surfactante são colocados no mesmo recipiente, de forma a promover a emulsificação propriamente dita. São homogeneizados através de mistura ou agitação mecânica e ou automatizada em tanques agitadores de aço (Figura 2), geralmente com hélices de formato apropriado (para reduzir a incorporação excessiva de ar) e sob alta rotação. Esse processo deve ser feito até o total arrefecimento da mistura na temperatura ambiente, 25 ºC (DA SILVA et al., 2014). Figura 2 – Tanque agitador de aço em indústria de cosméticos Fonte: NEWSERRADO, 2011. 2.4.1 Tipos de hélices As hélices são muito importantes nos processos de agitação e mistura, e cada uma possui um objetivo, sendo a sua utilização de acordo com qual o produto deseja-se obter. Os tipos variam entre âncora, espiral dupla, defloculador, rotor-estator, quadripá e tripá, entre outras. Tanto as hélices do tipo âncora quanto as de espiral dupla (Figura 3), são utilizadas para mistura de fluidos muito consistentes, cujo intervalo de viscosidades é entre 5 e 50 Pa.s. O modelo de âncora fornece um escoamento mistoe o modelo helicoidal um fluxo axial (ORTEGA, 20??). Figura 3 – Hélices dos tipos âncora e espiral dupla, respectivamente. Fonte: ORTEGA, 20?? A hélice do agitador deve ser do tipo defloculador (Figura 4) quando o objetivo é um o cisalhamento do material cuja viscosidade é baixa. Possui dentes para cima e para baixo com furos no seu interior (COSMÉTICA, 2017). Figura 4 – Hélice do tipo defloculador Fonte: Cosmética em Foco, 2017 Outro tipo de hélice de cisalhamento é a rotor-estator (Figura 5), que possui um efeito de alto-cisalhamento mecânico devido à sua alta velocidade de rotação (COSMÉTICA, 2017). Figura 5 – Hélices do tipo rotor-estator Fonte: Cosmética em Foco, 2017 No que tange às hélices de fluxo axial, são utilizadas para produtos mais fluidos e possibilitam a troca do material superior com o material presente no fundo, proporcionando uma mistura vertical do produto. As mais conhecidas desse modelo são as quadripás, representadas na figura 6 (COSMÉTICA, 2017). Figura 6 – Hélices do tipo quadripás Fonte: Cosmética em Foco, 2017 As hélices de fluxo radial são as que possibilitam uma mistura radial (centrífuga). Uma das hélices que possui essa função é a tripá (Figura 7), devido à posição de suas pás realiza uma mistura tanto axial, quanto radial, podendo ser utilizada para materiais de alta viscosidade (COSMÉTICA, 2017). Figura 7 – Hélice do tipo tripá Fonte: Cosmética em Foco, 2017 2.5 Afinagem Termo comum na indústria de cosméticos e consiste no processo de apuração da textura e aspecto da emulsão. Serve para garantir a homogeneidade da massa de produto misturada. Pode ser executada através de homogeneizadores especiais que misturam e desaeram concomitantemente (Figura 8), ou por moinhos coloidais (DA SILVA, 2014). Figura 8 – Esquema representativo de um homogeneizador. Fonte: SILVERSON, 2014. 2.6 Envase e rotulagem Últimas etapas da linha de produção e consistem no envase da emulsão nas embalagens finais e aplicação dos rótulos, incluindo a marcação do número do lote e das datas de fabricação e validade (DA SILVA, 2014). 3. REÔMETRO Reômetro é um instrumento que mede a tensão e deformação de um material e a partir dos dados coletados determina funções materiais. Este instrumento é utilizado para determinar a taxa de cisalhamento resultante a partir de uma tensão pré-definida, por meio de uma análise de tensão controlada ou para determinar a tensão resultante quando a taxa de cisalhamento é controlada. O instrumento está representado na Figura 9 (GALINDO, 2013). Figura 8 – Reômetro Fonte: Autoria própria Os reômetros podem ser classificados como rotacionais ou capilares. Os rotacionais são aqueles em que um torque é aplicado para rotacionar a haste e esse movimento giratório provoca o escoamento do fluido pelo arraste. O equipamento utilizado no laboratório da PUC Minas é deste tipo. Em um reômetro capilar, por sua vez, o escoamento é promovido por meio de um gradiente de pressão (PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO DE JANEIRO, 2015). Além disso, os reômetros também apresentam diferentes tipos de geometria: cilindros concêntricos, discos paralelos, cone e placa. A escolha da geometria depende do tipo de fluido, da faixa de viscosidade e da taxa de deformação (PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO DE JANEIRO, 2015). 4. OBJETIVO Produzir creme hidratante, de forma a abordar os conceitos de agitação e mistura e formação de emulsão. 5. MATERIAIS E MÉTODOS Para a produção do creme hidratante, foram utilizados os componentes apresentados na Tabela 1. Tabela 1 – Composição do creme hidratante Componente Porcentagem Fase oleosa Monoestearato de Glicerila 12 Álcool Cetoesteorílico 4 Vaselina Líquida 3 Manteiga de Karite 0,3 Nipazol 5 Fase aquosa Glicerina 0,3 Nipagin 2 Lauril Éter Sulfato de Sódio 0,5 Água qsp Essência 2 mL Fonte: Autoria Própria Para a realização da prática, inicialmente, a fase aquosa e a fase oleosa foram colocadas em béqueres separados e aquecidas com o auxílio de uma manta de aquecimento até atingir a temperatura de 70°C. Em seguida, a fase oleosa foi adicionada a fase aquosa e a mistura foi agitada. Após um tempo, a essência foi adicionada e a agitação continuou sendo realizada até que o creme ficasse com a textura adequada. Por fim, foi feito o envase do creme hidratante no recipiente. Após finalizado, o creme hidratante foi analisado com o auxílio de um reômetro e comparado com um hidratante comercial. 6. RESULTADOS E CONCLUSÃO A partir da análise do creme hidratante realizada no reômetro foi possível criar uma curva de viscosidade x taxa de cisalhamento e uma curva de tensão de cisalhamento x taxa de cisalhamento. As curvas estão representadas nos Gráficos 1 e 2. Gráfico 1 – Viscosidade x Taxa de cisalhamento Fonte: Autoria Própria Gráfico 2 – Tensão de cisalhamento x Taxa de cisalhamento Fonte: Autoria Própria Foi possível notar, a partir da análise do gráfico 1, que o comportamento do creme hidratante produzido foi semelhante ao do creme hidratante comercial. Provavelmente, a viscosidade apresentou valores mais baixos devido a temperatura do creme que ainda estava maior do que a temperatura ambiente, na qual o creme comercial se encontrava. A partir do Gráfico 2 é possível determinar o comportamento do fluido, se é ou não um fluido newtoniano, por exemplo. 7. REFERÊNCIAS CASTRO, Rafaella Morgana Lima de. Emulsão: uma revisão bibliográfica. 2014. 58 f. TCC (Graduação) - Curso de Farmácia, Departamento de Ciências Farmacêuticas, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2014. Disponível em: <http://rei.biblioteca.ufpb.br/jspui/bitstream/123456789/947/1/RMLC18052015.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2018. GALEMBECK, Fernando; CSORDAS, Yara. Cosméticos: a química da beleza. Rio de Janeiro: Ccead, 2012. 37 p. Disponível em: <http://web.ccead.puc-rio.br/condigital/mvsl/Sala de Leitura/conteudos/SL_cosmeticos.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2018 GALINDO, Manuella Suellen Vieira; DE CAMPOS, Tácio Mauro Pereira. Desenvolvimento de uma Metodologia para Determinação da Viscosidade de Solos. 2013. 61 f. Dissertação (Doutorado) – Curso de Engenharia Civil, Pontificia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013. LACHMAN, L., Liederman, H. A. e Kanig, J. L. (2001). The theory and practice of industrial pharmacy, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian. MARTINA, M.C. (2005). Introducción a la dermofarmácia y a la cosmetologia. Zaragoza, Editorial Acribia, S.A. NEWSERRADO. O segredo das coisas: cosméticos. Youtube, 2011. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=rCkmvk6uFgU>. Acesso em: 15 abr. 18. OLIVEIRA, Ângela Zélia Moreira de. Desenvolvimento de formulações cosméticas com ácido hialurônico. 2009. 99 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Farmácia, Faculdade de Farmácia, Universidade do Porto., Porto, 2009. Disponível em: <https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/44681/2/DISSERTAÃO.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2018. ORTEGA, Enrique. Agitação e mistura. 2012. Disponível em: <http://www.unicamp.br/fea/ortega/aulas/aula14_Agitacao.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2018 PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO DE JANEIRO. Departamento de Engenharia Mecânica. Grupo de Reologia: Rio de Janeiro, 2015. 38 slides. SALES, O.D. Manual de Cosmetología,. Editorial Videocinco Multimedia, 1998. SILVERSON. Homogeneizadores. 2014. Disponível em: <http://www.silverson.com.br/pt/produtos/homogeneizadores/?gclid=Cj0KCQjw8MvWBRC8ARIsAOFSVBWwVaL6mV65Z1RiNO52wrYhZX8QU9QwlbogaXI4gDvJnrCZUstYbjQaAvHUEALw_wcB>. Acesso em: 15 abr. 2018. SCHWEITZER, B. Crescimento dos Agregados Micelares em Complexos de Albumina do Soro Bovino – Dodecilsulfato de Sódio Controlado pela Proteína. 2003. Dissertação (Mestrado), Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2004. Qual é a melhor hélice para preparar cosméticos? 2017 Disponível em: <https://cosmeticaemfoco.com.br/artigos/qual-melhor-helice-para-cosmeticos/>.Acesso em 15 abr. 2018. ZANON, A. B. Aspecto Teórico e prático sobre a avaliação da estabilidade de emulsão manipuladas em farmácia. Universidade Federal do Rio Grande do sul, Porto Alegre, 2010