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Resumo: Introdução à ciência do direito - parte 2Resumo: Introdução à ciência do direito - parte 2 Texto: O direito da liberdade - Ronald DworkinTexto: O direito da liberdade - Ronald Dworkin A maioria das constituições contemporâneas expõe os direitos do indivíduo perante o governo numa linguagem extremamente vaga e abstrata (ex.: o direito à liberdade de expressão). A leitura moral da constituição propõe que todos nós interpretamos e apliquemos esses dispositivos abstratos considerando que eles fazem referência a princípios morais de decência e justiça. A leitura moral insere a moralidade política no próprio âmago do direito constitucional. A moralidade política é intrinsecamente incerta e controversa e por isso todo o sistema de governo que incorpora tais princípios a suas leis tem de decidir quem terá autoridade suprema para compreendê-los e interpretá-los. Os críticos da leitura moral dizem que essa leitura dá aos juízes o poder absoluto de impor suas convicções morais ao grande público. De maneira natural, os juízes cujas convicções são mais conservadoras tendem a interpretar os princípios constitucionais abstratos de maneira conservadoras e os juízes liberais tendem a interpretar os mesmo princípios de maneira liberal. A leitura moral, em si mesma, não é um programa ou estratégia intrinsecamente liberal nem intrinsecamente conservadora. Na prática a leitura moral não é revolucionária, mas se um juíz reconhecesse abertamente a leitura moral ou admitisse que é essa a sua estratégia de interpretação constitucional esse sim seria um fato revolucionário. Existe uma diferença notável entre o papel efetivo da leitura moral na vida constitucional norte-americana, por um lado, e sua reputação, por outro. Quase nunca chega a ser admitida como influência, ela costuma ser descartada como uma corrente “radical” que não seria adotada por nenhuma constitucionalista sensato. Os juízes negam a influência da leitura moral e procuram explicar suas decisões de outra maneira. O resultado mais grave da confusão constitucional está no fato de o público norte-americano não compreender o verdadeiro caráter e importância de seu sistema constitucional. O ideal norte-americano de um governo sujeito não somente à lei, mas também a princípios, é a contribuição mais importante que nossa história já deu à teoria política. Para muitos juristas e cientistas políticos o entusiasmo pela leitura moral dentro de uma estrutura política que atribui aos juízes a suprema autoridade em matéria de interpretação é elitista, anti populista, anti-republicano e antidemocrático. Quanto entendemos a democracia vemos que a leitura moral é praticamente indispensável para a democracia. Os dispositivos da Constituição norte-americana que protegem os indivíduos e as minorias da ação do Estado encontram-se sobretudo na chamada Declaração de Direitos e nas primeiras emendas acrescentadas depois da Guerra Civil. A 1ª emenda que refere-se ao direito de expressão, a 5ª emenda ao processo devido aos cidadãos e a 14ª emenda a uma proteção igual, da constituição norte-americana referem-se a princípios morais abstratos e, por referência incorporam-nos como limites aos poderes do Estado. Para Dworkin os EUA deve comprometer-se com os seguintes ideais políticos: 1. O Estado deve tratar todas as pessoas sujeitas a seu domínio como dotadas do mesmo status moral e político; 2. Deve tentar, de boa-fé tratar a todas com a mesma consideração; 3. deve respeitar todas e quaisquer liberdades individuais que forem indispensáveis para esses fins, entre as quais as liberdades mais especificamente declaradas no documento como a liberdade de expressão e a liberdade de religião. A leitura moral não é adequada para a interpretação de tudo quanto uma constituição contém. Temos de procurar encontrar uma linguagem nossa que capte da melhor maneira possível e em termos que nos pareçam claros o conteúdo do que “autores” quiseram dizer. Para saber o que uma pessoa quis dizer quando disse alguma coisa, temos de saber algo acerca das circunstâncias em que ela se encontrava quando disse aquilo. A interpretação da Constituição não deve levar em conta somente o que os próprios autores pretendiam dizer, mas também a prática jurídica e política do passado. A interpretação constitucional sob a leitura moral é disciplinada pela exigência de integridade constitucional. Os juízes não podem dizer que a Constituição expressa suas próprias convicções. Tem de considerar que fazem um trabalho de equipe junto com os demais funcionários da justiça do passado e do futuro, que elaboram juntos uma moralidade constitucional coerente e devem cuidar para que suas contribuições se harmonizem com todas as outras. Os juízes devem submeter-se à opinião geral e estabelecida acerca do caráter do poder que a Constituição lhes confere. A leitura moral lhe pede que encontrem a melhor concepção dos princípios morais constitucionais. A leitura moral é uma estratégia aplicável por advogados e juízes que ajam de boa-fé, e nenhuma estratégia de interpretação pode ser mais que isso. Os juízes sensatos devem então decidir por si mesmos qual das concepções mais honra seu país. Juristas e constitucionalistas, tanto os práticos quanto os que se dedicam à teoria, vivem ansiosos para encontrar outras estratégias de interpretação constitucional que dêem menos poder aos juízes. Há duas possibilidades. ➔ admitir a leitura moral como correta mas negar aos juízes a autoridade suprema de fazer a leitura moral; ➔ aplicar a chamada estratégia chamada “originalista” ou da “intenção original”. Segundo o originalismo, os grandes dispositivos da Declaração de Direitos não devem ser interpretados como exposições dos princípios morais abstratos que eles descrevem de fato, mas como referências, em código ou disfarçadas, aos pressupostos e expectativas que os próprios autores tinham acerca da correta aplicação daqueles princípios. A leitura moral insiste em que eles não chegaram a compreender plenamente o princípio moral que eles mesmos puseram em forma de lei. A estratégia originalista traduziria essa falta de compreensão numa lei constitucional permanente. Alguns constitucionalistas costumam dizer que o método correto está numa espécie de via do meio que opere um justo equilíbrio entre a proteção dos direitos individuais essenciais e a obediência à vontade popular. A interpretação constitucional deve levar em conta não só a filosofia moral ou política, mas também a história e a estrutura geral da Constituição. Os juristas partem do pressuposto de que as restrições que a Constituição impõe aos processos políticos majoritários são antidemocráticos, pelo menos nos casos em que essas restrições são impostas pelos juízes e a leitura moral parece tornar essa afronta ainda pior. O debate entre os constitucionalistas e juízes nunca teve o objetivo de decidir se os juízes devem mudar a Constituição ou se devem deixá-la em paz. Sempre girou em torno de como a Constituição depende de uma controvérsia política, pensa-se em geral que o debateacadêmico tem por objeto o quanto a democracia pode ser comprometida para que outros valores, entre os quais os direitos individuais, sejam protegidos. A premissa majoritáriaA premissa majoritária Democracia significa governo do povo mas nenhuma definição explícita de democracia se estabeleceu em definitivo entre os cientistas políticos ou no dicionário. A realidade da democracia é objeto de profundas controvérsias. A premissa majoritária é uma tese a respeito dos resultados justos de um processo político: insiste em que os procedimentos políticos sejam projetados de tal modo que, pelo menos nos assuntos importantes, a decisão favorecida pela maioria dos cidadãos ou por muitos entre eles. A premissa majoritária não nega que os indivíduos têm importantes direitos morais que devem ser respeitados pela maioria. Não está necessariamente amarrada a uma teoria coletivista ou utilitarista segundo a qual esses direitos não tem sentido. No Reino Unido, por exemplo, considerou-se que a premissa exige que a comunidade se submeta às ideias da maioria sobre quais são esses direitos individuais e sobre o melhor modo de respeitá-los e garanti-los. O Reino Unido tem uma constituição escrita e outra não escrita, e esta última consiste, em parte, numa compreensão tácita de quais são as leis que o Parlamento não pode aprovar. A premissa majoritária e a concepção majoritária de democracia por ela produzida têm sido elementos mais ou menos tacitamente aceitos de moralidade política britânica desde há mais de cem anos. Nos EUA a maior parte dos que pensam que a premissa majoritária traz em si a definição e a justificação últimas da democracia aceitam mesmo assim que em certas ocasiões a vontade da maioria não deve predominar. Concordam em que a maioria não deve ser sempre a juíza suprema de quando o seu próprio poder deve ser limitado para proteger os direitos individuais. O procedimento não-majoritário em ocasiões especiais é permitido pois acredita-se que em ocasiões especiais esse procedimento é necessário para proteger ou promover a igualdade. A democracia é um governo sujeito às condições de igualdade de status para todos os cidadãos. Quando as instituições majoritárias garantem e respeitem as condições democráticas, os veredictos dessas instituições, devem ser aceitos por todo. Mas quando não o fazem, ou quando essa garantia e esse respeito mostram-se deficientes, não se pode fazer objeção alguma, em nome da democracia, a outros procedimentos garantam as condições democráticas. O povoO povo Numa democracia, o governo é feito pelo povo, o povo coletivamente faz certas coisas que nenhum indivíduo sozinho faz ou pode fazer. Existem dois tipos de ação coletiva, a estatística e a comunitária. Ações coletivas: há dois tipos de ações coletivas, a estatística e a comunitária. ➔ Ação coletiva estatística é quando aquilo que o grupo faz é em função, geral ou específica, de algo que os membros individuais do grupo fazem sozinhos, sem pensar como estão agindo enquanto grupo. ➔ Ação coletiva comunitária é quando não pode ser reduzida a mera função estatística das ações individuais, acontece quando os indivíduos agem juntos de forma que fundam suas ações separadas num ato ulterior unificado. Concepções de democracia: há também duas concepções de democracia, a democracia majoritária e a constitucional. ➔ A democracia majoritária aceita a premissa majoritária e a ação estatística. Numa democracia as decisões são tomadas de acordo com os votos ou desejo de uma maioria de cidadãos individuais. Muito mais comum na teoria política norte-americana. ➔ A democracia constitucional não aceita a premissa majoritária e é compatível com a ação coletiva comunitária onde numa democracia as decisões políticas são tomadas por uma entidade distinta e não por um conjunto qualquer de indivíduos. Essa interpretação é misteriosa e pode até assumir ares de um totalitarismo. Constitucionalismo e a liberdadeConstitucionalismo e a liberdade Segundo a premissa majoritária, uma virtude moral importe se perde ou se compromete quando uma decisão política contradiz aquilo que a maioria dos cidadãos preferiria ou julgaria correto se todos pudessem refletir baseado em informações suficientes. A ideia de que, quando determinados dispositivos constitucionais limitam os poderes de ação de uma maioria, é a liberdade da comunidade que fica comprometida. ➔ De acordo com a interpretação estatística, o controle do indivíduo sobre as decisões coletivas que afetam sua vida é medido pelo seu poder de, sozinho, influenciar de algum modo o resultado. Numa grande democracia, as restrições impostas sobre a vontade de maioria podem aumentar o controle que cada indivíduo tem sobre o próprio destino. ➔ A interpretação comunitária, por sua vez, diz que a liberdade não depende de uma relação entre o governo e os cidadãos considerados separadamente, mas da relação entre o governo e todo o conjunto de cidadãos considerados em sua coletividade. A liberdade positiva é aquela que vigora quando o “povo” controla aqueles que o governam, pelo menos em última análise. É essa liberdade que se afirma comprometida quando se impede que a maioria faça valer a sua vontade. As pessoas querem ser governadas por um grupo a qual pertencem e se identificam, vêem como tirania qualquer comunidade política que não atenda ao seu pré-requisito, por mais que essa comunidade seja justa e satisfatória de outros pontos de vista. Se a verdadeira democracia é o governo do povo, então, no sentido comunitário de autogoverno, a verdadeira democracia é baseada na participação moral. A liberdade positiva não é sacrificada de modo algum quando a premissa majoritária é ignorada, pelo contrário, ela aumenta na medida mesma em que a premissa majoritária é rejeitada em favor da concepção constitucional de democracia. Existem dois tipos de condições de participação moral, e portanto liberdade positiva, e portanto democracia segundo a concepção constitucional: 1. Estrutural: são condições que determinam o caráter que a comunidade como um todo tem de ter para que possa ser considerada uma verdadeira comunidade política. A comunidade política não pode ser somente nominal, tem de ter sido estabelecida no decorrer de um processo histórico que tenha produzido fronteiras territoriais suficientemente reconhecidas e estáveis. 2. Condição de relação: elas determinam como o indivíduo deve ser tratado por uma comunidade política verdadeira para que possa ser membro moral dessa comunidade. Uma comunidade política não pode fazer de nenhum indivíduo um membro moral se não der a essa pessoa uma participação em qualquer decisão coletiva, um interesse nessa decisão e uma independência em relação à mesma decisão. Toda pessoa deve ter a oportunidade de modificar de algum modo as decisões coletivas. A mesma condição insiste na liberdade de manifestação e expressão para todas as opiniões, não somente nas ocasiões políticas formais, mas também na vida informal da comunidade. O processopolítico de uma comunidade política verdadeira deve expressar alguma concepção de igualdade de consideração para com os interesses de todos os membros da comunidade. A participação moral acarreta uma reciprocidade: um indivíduo não pode ser membro a menos que seja tratado pelos outros como tal. A independência moral é essencial para expressar um aspecto da participação moral que pode não ficar explícito numa determinada interpretação das condições estruturais e de relação. Os membro de uma comunidade política podem encarar uns aos outros como sócios num empreendimento conjunto. todos partilham o mesmo trabalho e o mesmo destino. As pessoas que assumem a responsabilidade pessoal por decidir qual o tipo de vida que mais prezam pode mesmo assim aceitar que as questões de justiça sejam decididas coletivamente, de modo que uma única decisão possa ser encarada por todos como adotada de autoridade. IgualdadeIgualdade No majoritarismo não há nada que possa promover automaticamente qualquer outra forma de igualdade, além da igualdade política, em especial, não há nada que favoreça a igualdade econômica. A igualdade política não pode ser definida como uma igualdade de poder político pois não dispomos de nenhuma definição de poder “poder” que possa tornar a igualdade de poder um ideal desejável, quanto mais realizável. Numa democracia representativa, o impacto simplesmente não pode ser igual para todos. O poder político não é uma medida do impacto, mas sim da influência política, compreendida como o meu poder de afetar as opiniões dos outros. A interpretação estatística da ação política coletiva não justifica a ideia de que a igualdade política fica comprometida toda vez que a vontade da maioria é frustrada. A igualdade política é aquele estado de coisas em que, em última análise, é o povo que governa os governantes e não o contrário. Os adversários da leitura moral começara a fazer apelo à virtude revolucionária (a comunidade) e não mais à liberdade ou à igualdade. Afirmam que, como a leitura moral deixa as decisões políticas mais fundamentais a cargo de uma elite de profissionais de direito, ela enfraquece a noção de comunidade perante o povo e rouba deste a noção de que todos estão juntos no mesmo barco. O ideal de comunidade não concorda com a premissa majoritária nem refuta a leitura moral, não mais do que a liberdade e a igualdade, os dois membros mais velhos da brigada revolucionária. Temos de deixar de lado a premissa majoritária e, com ela, a concepção majoritária de democracia.
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