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Guia de Estudo - Lógica CA Guia de Estudo Lógica Graduação Geral 2010 Porto Velho/RO 24/03/2009 Guia de Estudo - Lógica HUMBERTA GOMES MACHADO PORTO GUIA DE ESTUDO LÓGICA Orientar alunos das disciplinas semipresenciais e a distância das Faculdades São Lucas e São Mateus. Porto Velho/RO 2010 Guia de Estudo - Lógica Faculdade São Mateus Faculdade São Lucas Coordenação de Educação a Distância - EAD Centro de Ensino São Lucas Rua. Alexandre Guimarães, 1927 – Areal Porto Velho – RO – 78.916-450 Fone: (69) 3211-8009 Faculdade de Tecnologia São Mateus - FATESM Rua. Alexandre Guimarães, 1927 – Areal Porto Velho – RO – 78.916-450 Fone: (69) 3211-8009 Porto Velho/RO 2010 Guia de Estudo - Lógica DIRETORA GERAL Maria Eliza de Aguiar e Silva VICE-DIRETORA Eloá de Aguiar Gazola COORDENADOR DE EAD José Lucas Pedreira Bueno SUPERVISORA PEDAGÓGICA Hélia Cardoso Gomes da Rocha DESIGN INSTRUCIONAL Humberta Gomes Machado Porto REVISORES DE TEXTO Hevio Tavares de Carvalho Wibison Menezes Silva SUPERVISORA DE TECNOLOGIA Sara Luíze Oliveira Duarte ADMINISTRADOR DO AMBIENTE VIRTUAL DE APRENDIZAGEM Marque Onel dos Santos Souza DESIGN/DIAGRAMAÇÃO Diênife Silva de Miranda A AUTORA HUMBERTA GOMES MACHADO PORTO - humbertaporto@yahoo.com.br Graduada em Pedagogia pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Varginha/MG, em 1989. Especialista em Educação Pré Escolar, Metodologia do Ensino, Designer Instrucional em Educação a Distância pela UNIFEI em 2008. Mestre em Educação pela UNINCOR/ MG em 2003. Atualmente trabalha como Pedagoga na rede pública de ensino, Professora Universitária presencial e na Educação a Distância e Designer Instrucional na EAD. Guia de Estudo - Lógica ÍCONES Realize. Determina a existência de atividade a ser realizada. Este ícone indica que há um exercício, uma tarefa ou uma prática para ser realizada. Fique atento a ele. Pesquise. Indica a exigência de pesquisa a ser realizada na busca por mais informação. Pense. Indica que você deve refletir sobre o assunto abordado para responder a um questionamento. Conclusão. Todas as conclusões sejam de idéias, partes ou unidades do curso virão precedidas desse ícone. Importante. Aponta uma observação significativa. Pode ser encarado como um sinal de alerta que o orienta para prestar atenção à informação indicada. Hiperlink. Indica um link (ligação), seja ele para outra página do módulo impresso ou endereço de Internet. Exemplo. Esse ícone será usado sempre que houver necessidade de exemplificar um caso, uma situação ou conceito que está sendo descrito ou estudado. Sugestão de Leitura. Indica textos de referência utilizados no curso e também faz sugestões para leitura complementar. Aplicação Profissional. Indica uma aplicação prática de uso profissional ligada ao que está sendo estudado. CheckList ou Procedimento. Indica um conjunto de ações para fins de verificação de uma rotina ou um procedimento (passo a passo) para a realização de uma tarefa. Saiba Mais. Apresenta informações adicionais sobre o tema abordado de forma a possibilitar a obtenção de novas informações ao que já foi referenciado. Revendo. Indica a necessidade de rever conceitos estudados anteriormente Guia de Estudo - Lógica Conteúdo 1 APRESENTAÇÃO ........................................................................................................................ 7 2 A DISCIPLINA ............................................................................................................................... 8 2.1 Ementa ............................................................................................................................... 8 2.2 Interdisciplinaridade ............................................................................................................ 8 2.3 Considerações Iniciais ........................................................................................................ 8 2.4 Objetivos ............................................................................................................................. 9 2.5 Metodologia ........................................................................................................................ 9 UNIDADE 1 - O SURGIMENTO DA LÓGICA ................................................................................ 10 UNIDADE 2 - ELEMENTOS DA LÓGICA ...................................................................................... 14 UNIDADE 3 - O SILOGISMO ......................................................................................................... 25 UNIDADE 4 - AS FALÁCIAS .......................................................................................................... 28 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................... 47 Guia de Estudo - Lógica 7 1 APRESENTAÇÃO Prezado(a) aluno(a), Antes de apresentá-lo(a) ao Guia de Estudos da Disciplina Lógica, quero parabenizá-lo(a) pela perseverança e o êxito por assumir este compromisso com o seu conhecimento. Este momento é de grande valor, pois você estará refletindo sobre os saberes já elaborados no decorrer do curso e os que estarão por vir. Este Guia de Estudos permitirá a você conscientizar-se sobre a importância da Lógica, que é a parte da filosofia que estuda o fundamento, a estrutura e as expressões humanas do conhecimento, ou seja, não podemos dizer que ela nos ensina a pensar, pois já sabemos pensar, entretanto ela ensina as formas em que nós, os humanos, costumamos pensar, tanto quando raciocinamos de modo correto ou quando o fazemos de modo incorreto. Você já parou para pensar sobre isso? Existem de fato, formas de pensar correta ou incorretamente? Será possível desenvolver estratégias de pensamento que nos ajudem a compreender melhor uma proposição? Portanto, a partir de agora mergulharemos na Lógica e você aprenderá a desenvolver algumas estratégias para ler textos filosóficos, assim como textos do cotidiano, a reconhecer, por exemplo, a estrutura básica do raciocínio. Nossa intenção é que você se aproprie de valiosos instrumentos da Lógica permitindo-lhe identificar possíveis falhas na argumentação. Bom estudo para você! Profª. Ms. Humberta Gomes Machado Porto Está pronto para iniciarmos nossa jornada? Guia de Estudo - Lógica 8 2 A DISCIPLINA 2.1 Ementa Determinação do objeto principal da lógica: as estruturas argumentativas, seus componentes e suas regras. Os silogismos e as falácias. Questionamentos acerca do uso da noção de verdade na lógica. Tipos de argumentos possíveis: válidos, não-válidos, explicativos, retóricos. 2.2 Interdisciplinaridade A mesma será desenvolvida de maneira interdisciplinar, inter-relacionando os tópicos básicos da disciplina com os demais conteúdos acadêmicos do curso. Nestaperspectiva, o ensino-aprendizagem ganha significado e prática e é enriquecido com os múltiplos sentidos explorados e com os resultados práticos que se constitui com o resultado das atividades das disciplinas. 2.3 Considerações Iniciais A importância da Lógica na formação acadêmica é visível no instante em que percebemos que a busca do conhecimento deve estar alicerçada por um conjunto de bons argumentos na medida em que apenas eles podem constituir a defesa de determinada orientação de pensamento, assim como para organizá-los de modo correto. Por outro lado, a lógica é especialmente útil para desmascarar argumentos falaciosos. Podemos destacar na Lógica o cumprimento de duas funções, possibilitar a clareza de ideias e a prevenção dos erros de raciocínio. Ela possibilita uma atitude crítica diante de pressupostos apresentados na formação de vocês. Efetivamente, além da Lógica assumir de uma forma critica os problemas da formação acadêmica, denunciando os falsos problemas com o auxílio de bons argumentos; ela também se posiciona criticamente no que concerne a compreensão dos textos lidos. A atuação da Lógica é fundamental na medida em que coloca à prova as nossas ideias considerando-as criticamente. Assim como permite o debate entre nossas próprias ideias. E este Guia de Estudo - Lógica 9 debate de ideias pressupõe a apreciação dos argumentos que vêm fortalecer nossa capacidade crítica e reflexiva. A Lógica marca a sua diferença em relação às outras disciplinas não só porque se revê em atitudes como a criatividade, a abertura, a crítica, mas também porque possibilita a percepção de que não há uma filosofia, mas várias que norteiam os saberes. A questão fundamental não está numa perspectiva estática, mas, numa atividade dinâmica. E o processo de conhecimento não se efetiva na reprodução dos pensamentos, mas sim no debate de argumentos. De forma a lidarmos criativamente com a lógica, é importante dominar as ferramentas básicas que possibilitarão exprimir com transparência os pressupostos e as conclusões, e simultaneamente assumir uma atitude crítica. A criatividade do pensamento lógico está patente no talento para descobrir outras possibilidades, onde antes só víamos uma. Ele não é, portanto, estático, rígido e fechado, ele é, pelo contrário, flexível, elástico, curioso, insatisfeito e muito ambicioso. O pensador criativo vai à descoberta, não se abandona àquilo que aparentemente só tem uma solução, uma alternativa. A criatividade decorrente da Lógica cumpre-se precisamente neste levantamento de circunstâncias novas, neste esgotamento de todas as possibilidades. 2.4 Objetivos Utilizar o raciocínio lógico elaborando argumentos consistentes. Identificar as falácias nos discursos orais e escritos. 2.5 Metodologia Considerando que a metodologia utilizada deverá considerar os objetivos – as características dos alunos, os conteúdos e as técnicas de ensino, a opção perpassará pela metodologia que possibilite ao aluno ser agente do seu processo de conhecimento, observando, discutindo, pesquisando, interpretando, resolvendo problemas que impliquem em análise e síntese dos aspectos fundamentais do processo de conhecimento, alcançando numa perspectiva dialógica, uma aprendizagem significativa pautada na interatividade, na reflexão e na criticidade. Está pronto para iniciarmos nossa jornada? Guia de Estudo - Lógica 10 UNIDADE 1 - O SURGIMENTO DA LÓGICA Ao final do estudo dessa unidade você deverá ser capaz de: Construir o conceito de lógica; Identificar a diferença entre a dialética platônica e a lógica aristotélica. Com toda certeza você já utilizou o termo ―lógica‖ no seu dia a dia. Quando você quer expressar uma certeza, uma conclusão óbvia seja no aspecto positivo ou negativo você utiliza as frases: - Lógico que sim! ou – Lógico que não! Às vezes nos deparamos até mesmo com crianças pequenas dizendo: ―Lógico que...‖ por tão comum e usual esse vocábulo. Assim quando estamos utilizando as palavras ―lógico‖ ou ―lógica‖ estamos seguindo uma tradição da filosofia grega. A palavra ―logos‖ significa linguagem-discurso e pensamento-conhecimento – e foi isso que conduziu os filósofos a indagarem se o logos obedecia ou não a regras, possuía ou não normas, princípios e critérios para seu uso e funcionamento. Na verdade, a Lógica segundo ―Aristóteles é a ‗ciência da demonstração‘; para Liard, é a ‗ciência das formas do pensamento‘ e Aranha e Martins acrescentam ‗é a ciência da conseqüência e da verdade da argumentação; ‘ ‗é a ciência das leis ideais do pensamento e a arte de aplicá-las corretamente na procura da demonstração da verdade‘‖. (APUD. ARANHA E MARTINS, 1991. p.96). Neste sentido, o estudo da Lógica nos possibilita enxergar os raciocínios implícitos que permeiam o nosso mundo, seja em livros, em conversas, debates, filmes, entrevistas e até mesmo em nossos pensamentos. É a capacidade de desvelar, de desnudar o que está posto, seguindo regras para alcançar a verdade. Assim, o nosso Reflita sobre o que você leu e construa um conceito original sobre Lógica. Fig. 1 Aristóteles http://levesofensas.files. wordpress.com/2009/06 /aristoteles1.jpg Guia de Estudo - Lógica 11 objeto de estudo, segundo Chauí (2003), é a proposição, ou seja o juízo do pensamento na verdade é a operacionalização do pensamento. 1.1 O Nascimento da Lógica entre os Gregos Fig. 2 Academia Platônica http://historiaeatualidade.blogspot.com/2008/05/tal-revoluo- francesa.html Há muito tempo os primeiros filósofos já se preocupavam com a origem e o desaparecimento de todos os seres. Preocupavam-se também com as transformações. Nessa perspectiva, surgiram então duas grandes tendências que adotaram posições totalmente diferentes a esse respeito. Segundo, Chauí (2003) no que concerne à Filosofia existem duas grandes tendências da Grécia antiga: para Heráclito - No mundo, nada permanece idêntico, tudo se transforma no seu contrário(lei racional da realidade); já para Parmênides – O fluxo dos contrários é uma aparência, a identidade do Ser é imutável. O que é contrário a si mesmo não pode ser pensado nem dito, pois é contraditório (indizível). Platão dizia que Heráclito estava certo em dizer que a matéria é aquilo passível de mudanças no mundo dos seres corporais, mas dizia também que esse mundo seria apenas uma aparência. Por outro lado, defendia Parmênides ao relatar que o mundo verdadeiro é o das essências imutáveis. Para conhecer as essências e deixar Guia de Estudo - Lógica 12 as aparências, Platão propunha a dialética (diálogo ou conversa em que os envolvidos pudessem, através de discussões, chegar à mesma idéia ou pensamento). Já Aristóteles afirmava que Heráclito tinha razão ao dizer que as coisas mudam, assim como Parmênides também tinha razão ao defender que o pensamento e a linguagem exigem a identidade. Porém, ambos se enganavam ao supor que identidade e mudança são contraditórias. Aristóteles então concluiu que a dialética não era segura, pois a escolha de uma opinião contra a outra não assegurava encontrar a coisa investigada. Então, ele propôs o uso da analítica (conjunto de procedimento de demonstração e prova), que se diferenciava da dialética platonista por oferecer procedimentos empregados em raciocínios que se referiam às coisas das quais era possível ter um conhecimento universal e necessário,e seu ponto de partida eram regras, leis e princípios necessários e universais do pensamento. Assim, a partir desse grande conflito gerado na Grécia com Heráclito afirmando que somente a mudança era real e Parmênides dizendo o contrário, que a essência era imutável, surge Platão propondo a dialética, o diálogo para superar as opiniões contrárias Mas, Aristóteles segue um caminho diferente, dizendo que a dialética apenas não bastaria, era necessário conhecer as formas de raciocínios, as normas que os regem. Nasce então a Lógica, portanto, ele deu à Lógica a autonomia de uma disciplina, um tema que mereceu uma investigação sistemática. Assim, ele foi considerado o fundador da Lógica. É necessário lembrar que a palavra lógica foi empregada séculos mais tarde, pelos estóicos e Alexandre de Afrodísia. No conjunto de obras intitulado Organon, Aristóteles defendeu que a Lógica apresenta uma função especial: servir de instrumento para a Filosofia, instrumento esse, que possibilita a distinção entre Fig. 3 – Aristóteles e Platão. http://filosofandoehist oriando.blogspot.com /2009/08/aristoteles- o-que-e-o-ser.html Guia de Estudo - Lógica 13 raciocínios válidos (dentro de um padrão correto de pensamento e inválidos (quando não seguem um padrão correto de pensamento) Observe que a Lógica foi concebida como um instrumento, como um meio para a análise e a compreensão dos raciocínios. ―Qual a diferença entre a dialética platônica e a lógica (ou analítica) aristotélica? Em primeiro lugar, a dialética platônica é o exercício direto do pensamento e da linguagem, um modo de pensar que opera com os conteúdos do pensamento e do discurso. A lógica aristotélica é um instrumento que antecede o exercício do pensamento e da linguagem, oferecendo-lhes meios para realizar o conhecimento e o discurso. Para Platão, a dialética é um modo de conhecer. Para Aristóteles, a lógica (ou analítica) é um instrumento para o conhecer. Em segundo lugar, a dialética platônica é uma atividade intelectual destinada a trabalhar contrários e contradições para superá-los, chegando à identidade da essência ou da ideia imutável. Depurando e purificando as opiniões contrárias, a dialética platônica chega à verdade do que é idêntico e o mesmo para todas as inteligências. A lógica aristotélica oferece procedimentos que devem ser empregados naqueles raciocínios que se referem a todas as coisas das quais possamos ter um conhecimento universal e necessário, e seu ponto de partida não são opiniões contrárias, mas princípios, regras e leis necessárias e universais do pensamento.‖ (CHAUÍ, 2003, p.107). Lembre-se: o propósito da Lógica é o de estudar um padrão básico do pensamento e, por conseguinte, como se deve pensar, assim também, como devem ser apresentados os raciocínios. Logo, espera-se que o estudo desta disciplina auxilie você a melhor identificar as formas de raciocínio; e como construir raciocínios encadeados e coerentes; assim como lhe possibilitar a identificar e evitar os raciocínios dúbios e enganosos. Guia de Estudo - Lógica 14 UNIDADE 2 - ELEMENTOS DA LÓGICA Ao final do estudo dessa unidade você deverá ser capaz de: Identificar os elementos de Lógica; Compreender o vocabulário básico que compõe a Lógica. Para Aristóteles, a lógica era um instrumento para a ciência, um modo de proceder para chegar à verdade. Segundo Chauí (2003) a lógica caracteriza-se como: instrumental: é o instrumento do pensamento para pensar corretamente e verificar a correção do que está sendo pensado; formal: não se ocupa com os conteúdos pensados ou com os objetos referidos pelo pensamento, mas apenas com a forma pura e geral dos pensamentos, expressa através da linguagem; propedêutica: é o que devemos conhecer antes de iniciar uma investigação científica ou filosófica, pois somente ela pode indicar os procedimentos (métodos, raciocínios, demonstrações) que devemos empregar para cada modalidade de conhecimento; normativa: fornece princípios, leis, regras e normas que todo pensamento deve seguir se quiser ser verdadeiro; doutrina da prova: estabelece as condições e os fundamentos necessários de todas as demonstrações. Dada uma hipótese, permite verificar as conseqüências necessárias que dela decorrem; dada uma conclusão, permite verificar se é verdadeira ou falsa; geral e temporal : as formas do pensamento, seus princípios e suas leis não dependem do tempo e do lugar, nem das pessoas e circunstâncias, mas são universais, necessárias . Guia de Estudo - Lógica 15 Algumas noções de lógica Adaptação do texto de António Aníbal Padrão ARGUMENTO: O que é um argumento? Um argumento é um conjunto de proposições que utilizamos para justificar (provar, dar razão, suportar) algo. A proposição que queremos justificar tem o nome de conclusão; as proposições que pretendem apoiar a conclusão ou a justificam têm o nome de premissas. Suponhamos que um jovem queira pedir aos pais um aumento da "mesada". Como justificará este aumento? Recorrendo a razões, não é? Dirá algo como: Os preços no bar da escola subiram; como eu lancho no bar da escola, o lanche ficou mais caro. Portanto, preciso de um aumento de minha "mesada". Temos aqui um argumento, cuja conclusão é: "preciso de um aumento da 'mesada'". E como justificou esta conclusão? Com a subida dos preços no bar da escola e com o fato de lanchar no bar. Então, estas são as premissas do argumento, são as razões que utilizou para defender a conclusão. Este exemplo permite-nos esclarecer outro aspecto dos argumentos, que é o seguinte: embora um argumento seja um conjunto de proposições, nem todos os conjuntos de proposições são argumentos. Por exemplo, o seguinte conjunto de proposições não é um argumento: Eu lancho no bar da escola, mas o João não. A Joana come pipocas no cinema. O Rui foi ao museu. Neste caso, não temos um argumento, porque não há nenhuma pretensão de justificar uma proposição com base nas outras. Nem há nenhuma pretensão de apresentar um conjunto de proposições com alguma relação entre si. Há apenas uma sequência de afirmações. E um argumento é, como já vimos, um conjunto de proposições em que se pretende que uma delas seja sustentada ou justificada pelas outras — o que não aconteceu no exemplo anterior. Um argumento pode ter uma ou mais premissas, mas só pode ter uma conclusão. Exemplos de argumentos com uma só premissa: Exemplo 1 Premissa: Todos os brasileiros são sul- americanos. Conclusão: Logo, alguns sul-americanos são brasileiros. Exemplo 2 Premissa: O João e o José são alunos do 5.º Guia de Estudo - Lógica 16 período da faculdade. Conclusão: Logo, o João é aluno do 5.º período da faculdade. Exemplos de argumentos com duas premissas: Exemplo 1: Premissa 1: Os alunos do 5.º período estudam filosofia. Premissa 2: O João é um aluno do 5.º período. Conclusão: Logo, o João estuda filosofia. Exemplo 2: Premissa 1: Se não houvesse vida para além da morte, então a vida não faria sentido. Premissa 2: Mas a vida faz sentido. Conclusão: Logo, há vida para além da morte. Exemplo 3: Premissa 1: Todos os portovelhenses são rondonienses. Premissa 2: Todos os rondonienses são brasileiros. Conclusão: Logo, todos os portovelhenses são brasileiros. É claro que na maior parte das vezes os argumentos não se apresentam nesta forma. Repare, por exemplo, no argumento de Kant a favor do valor objetivoda felicidade, tal como é apresentado por Aires Almeida et al. (2003b), no site de apoio ao manual A Arte de Pensar: "De um ponto de vista imparcial, cada pessoa é um fim em si. Mas se cada pessoa é um fim em si, a felicidade de cada pessoa tem valor de um ponto de vista imparcial e não apenas do ponto de vista de cada pessoa. Dado que cada pessoa é realmente um fim em si, podemos concluir que a felicidade tem valor de um ponto de vista imparcial." Neste argumento, a conclusão está claramente identificada ("podemos concluir que..."), mas nem sempre isto acontece. Contudo, há certas expressões que nos ajudam a perceber qual é a conclusão do argumento e quais são as premissas. Repare, no argumento anterior, na expressão "dado que". Esta expressão é um indicador de premissa: ficamos a saber que o que se segue a esta expressão é uma premissa do argumento. Também há Indicadores de premissa Indicadores de conclusão pois porque dado que como foi dito visto que devido a a razão é que admitindo que sabendo-se que assumindo que por isso por conseguinte implica que logo portanto então daí que segue-se que pode-se inferir que consequentemente Guia de Estudo - Lógica 17 indicadores de conclusão: dois dos mais utilizados são "logo" e "portanto". Um indicador é um articulador do discurso, é uma palavra ou expressão que utilizamos para introduzir uma razão (uma premissa) ou uma conclusão. O quadro seguinte apresenta alguns indicadores de premissa e de conclusão: É claro que nem sempre as premissas e a conclusão são precedidas por indicadores. Por exemplo, no argumento: O Dunga é treinador de futebol e ganha mais de 10.000 reais por mês. Portanto, há treinadores de futebol que ganham mais de 1.0000 reais por mês. A conclusão é precedida do indicador "portanto", mas as premissas não têm nenhum indicador. Por outro lado, aqueles indicadores (palavras e expressões) podem aparecer em frases sem que essas frases sejam premissas ou conclusões de argumentos. Por exemplo, se eu disser: Depois de se separar do dono, o cão nunca mais foi o mesmo. Então, um dia ele partiu e nunca mais foi visto. Admitindo que não morreu, onde estará? O que se segue à palavra "Então" não é conclusão de nenhum argumento, e o que segue a "Admitindo que" também não é premissa, pois nem sequer temos aqui um argumento. Por isso, embora seja útil, deve-se usar a informação do quadro de indicadores de premissa e de conclusão criticamente e não de forma automática. Proposições e frases Um argumento é um conjunto de proposições. Quer as premissas, quer a conclusão de um argumento são proposições. Mas o que é uma proposição? Uma proposição é o pensamento que uma frase declarativa exprime literalmente. Não devemos confundir proposições com frases. Uma frase é uma entidade linguística, é a unidade gramatical mínima de sentido. Por exemplo, o conjunto de palavras "Brasília é uma" não é uma frase. Mas o conjunto de palavras "Brasília é uma cidade" é uma frase, pois já se apresenta com sentido gramatical. Há vários tipos de frases: declarativas, interrogativas, imperativas e exclamativas. Mas só as frases declarativas exprimem proposições. Uma frase só exprime uma proposição quando o que ela afirma tem valor de verdade, mesmo de repente não sendo verdade. Por exemplo, as seguintes frases não exprimem proposições, porque não têm valor de verdade, isto é, não são verdadeiras nem falsas: 1. Que horas são? Guia de Estudo - Lógica 18 2. Traz o livro. 3. Prometo ir contigo ao cinema. 4. Quem me dera gostar de Matemática. Mas as frases seguintes exprimem proposições, porque têm valor de verdade, isto é, são verdadeiras ou falsas, ainda que, acerca de algumas, não saibamos, neste momento, se são verdadeiras ou falsas: 1. Brasília é a capital da Argentina. 2. Alfenas é uma cidade mineira. 3. A neve é branca. 4. Há seres extraterrestres inteligentes. A frase 1 é falsa, a 2 e a 3 são verdadeiras. E a 4? Bem, não sabemos qual é o seu valor de verdade, não sabemos se é verdadeira ou falsa, mas sabemos que tem de ser verdadeira ou falsa. Por isso, também exprime uma proposição. Uma proposição é uma entidade abstrata, é o pensamento que uma frase declarativa exprime literalmente. Ora, um mesmo pensamento pode ser expresso por diferentes frases. Por isso, a mesma proposição pode ser expressa por diferentes frases. Por exemplo, as frases "O governo demitiu o presidente da BRASPETRO" e "O presidente da BRASPETRO foi demitido pelo governo" exprimem a mesma proposição. As frases seguintes também exprimem a mesma proposição: "A neve é branca" e "Snow is white". Ambiguidade Para além de podermos ter a mesma proposição expressa por diferentes frases, também pode acontecer que a mesma frase exprima mais do que uma proposição. Neste caso dizemos que a frase é ambígua. A frase "Em cada dez minutos, um homem brasileiro pega numa mulher ao colo" é ambígua, porque exprime mais do que uma proposição: tanto pode querer dizer que existe um homem brasileiro (sempre o mesmo) que, em cada dez minutos, pega uma mulher ao colo, como pode querer dizer que, em cada dez minutos, um homem brasileiro (diferente) pega uma mulher no colo (a sua). Por vezes, deparamo-nos com frases que não sabemos com exatidão o que significam. São as frases vagas. Por exemplo, "O professor de Português é calvo" é uma frase vaga, porque não sabemos a partir de qual quantidade de falta de cabelos é que podemos considerar que alguém é calvo. Quinhentos? Cem? Dez? Outro exemplo de frase vaga é o seguinte: "Muitos alunos perderam nota no teste de Sociologia". Muitos, mas quantos? Dez? Vinte? Devemos evitar as frases vagas, pois, se não Guia de Estudo - Lógica 19 comunicarmos com exatidão o nosso pensamento, como é que podemos esperar que os outros nos compreendam? Validade e verdade A verdade é uma propriedade das proposições. A validade é uma propriedade dos argumentos. É incorreto falar em proposições válidas. As proposições não são válidas nem inválidas. As proposições só podem ser verdadeiras ou falsas. Também é incorreto dizer que os argumentos são verdadeiros ou que são falsos. Os argumentos não são verdadeiros nem falsos. Os argumentos dizem-se válidos ou inválidos. Quando é que um argumento é válido? Por agora, referirei apenas à validade dedutiva. Diz-se que um argumento dedutivo é válido quando é impossível que as suas premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. Repare que, para um argumento ser válido, não basta que as premissas e a conclusão sejam verdadeiras. É preciso que seja impossível que, sendo as premissas verdadeiras, a conclusão seja falsa. Considere o seguinte argumento: Premissa 1: Alguns treinadores de futebol ganham mais de 1.000.000 euros por mês. Premissa 2: O Felipão é um treinador de futebol. Conclusão: Logo, o Felipão ganha mais de 1.000.000 euros por mês. No momento em que o Felipão é treinador de um time europeu ou até mesmo asiático e os jornais nos informam que ganha muito acima de 1.000.000 euros por mês, este argumento tem premissas verdadeiras e conclusão verdadeira e, contudo, não é válido. Não é válido, porque não é impossível que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. Podemos perfeitamente imaginar uma circunstância em que o Felipão ganhasse menos de 1.000.000 euros por mês (por exemplo, o Felipão como treinador de um clube do campeonato regional de futebol, ganhando 10.000 euros por mês), e, neste caso, a conclusão já seria falsa, apesar de as premissas serem verdadeiras. Portanto, o argumento éinválido. Considera, agora, o seguinte argumento, anteriormente apresentado: Premissa: O João e o José são alunos do 5.º período. Conclusão: Logo, o João é aluno do 5.º período. Este argumento é válido, pois é impossível que a premissa seja verdadeira e a conclusão falsa. Ao contrário do argumento que envolve o Felipão, neste não podemos imaginar nenhuma circunstância em que a premissa seja Guia de Estudo - Lógica 20 verdadeira e a conclusão falsa. Você pode imaginar o caso em que o João não é aluno do 5.º período? Bem, se você conseguir isto, significará que a conclusão é falsa, mas a premissa também é falsa. Repare, agora, no seguinte argumento: Premissa 1: Todos os números primos são pares. Premissa 2: Nove é um número primo. Conclusão: Logo, nove é um número par. Este argumento é válido, apesar de quer as premissas, quer a conclusão serem falsas. Continua a aplicar-se a noção de validade dedutiva anteriormente apresentada: é impossível que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. A validade de um argumento dedutivo depende da conexão lógica entre as premissas e a conclusão do argumento e não do valor de verdade das proposições que constituem o argumento. Como vê, a validade é uma propriedade diferente da verdade. A verdade é uma propriedade das proposições que constituem os argumentos (mas não dos argumentos) e a validade é uma propriedade dos argumentos (mas não das proposições). Fonte: http://criticanarede.com/log_nocoes.html PROPOSIÇÃO Como você viu, proposição é o objeto da lógica e mostra os juízos formulados pelo pensamento. O raciocínio (encadeamento dos juízos) se exprime através da conexão de proposições, a qual é chamada de silogismo. De acordo com CHAUÍ (2003), a lógica analisa os elementos que formam uma proposição, sendo estes palavras não combinadas com outras e que aparecem em tudo que pensamos e dizemos. As categorias (substância, quantidade, qualidade, relação, lugar, tempo, posição, posse, ação, e paixão) indicam o que uma coisa é, o que faz ou como está e têm duas propriedades lógicas: extensão (conjunto de objetos Pesquise em outras fontes, confronte o que você já sabe e construa um pequeno glossário: argumento, premissa, conclusão, proposição. Guia de Estudo - Lógica 21 determinados por um termo ou categoria) e compreensão (propriedades que esse termo designa). Assim, classificam-se os termos em: gênero: extensão maior, compreensão menor. Ex. animal; espécie: extensão e compreensão média; Ex. homem; Indivíduo: extensão menor, compreensão maior. Ex.Sócrates. Há de se considerar que a relação de conseqüência é considerada o fator relevante do objeto de estudo da Lógica. Nesse sentido, o estudo investiga como se faz a passagem no raciocínio, das premissas para a conclusão. Há de se considerar também que as proposições se classificam quanto à qualidade e à quantidade. Do ponto de vista da qualidade, elas podem ser afirmativas e negativas. Considerando a partir da quantidade, segundo Chauí (2003) as proposições são divididas em: Particulares: quando se referem a apenas alguns indivíduos da espécie. Gerais: quando se referem ao total da espécie. Singulares: quando se referem a apenas um indivíduo da espécie. Ainda tendo em vista as proposições, podemos também distingui-las pela modalidade: Necessárias: quando o predicado está incluído na essência do sujeito, ou seja, é uma condição necessária. Ex. Todo homem é mortal. Para saber mais acesse: http://www.cfh.ufsc.br/~wfil/convite.pdf Guia de Estudo - Lógica 22 Não necessárias: quando o predicado é impossível de ser atribuído ao sujeito. Ex. Nenhum homem é imortal. Possíveis: quando o predicado pode ser ou não atribuído ao sujeito. Ex. Alguns homens são honestos. Por que conhecer essas classificações? Para que elas nos servem? Na verdade, a importância está em compreender as relações necessárias para alcançar um determinado raciocínio, acompanhar as estruturas que o norteiam. Portanto, a partir de agora fique mais atento (a). Reflita mais sobre o que você ouve e lê. Busque o argumento, analise as premissas e estabeleça a conclusão. TIPOS DE RACIOCÍNIO É bastante pertinente também que você reflita sobre as formas como ocorrem os raciocínios, que podem ser dedutivos, indutivos e por analogias. Dedutivo: é o raciocínio mais estudado na Lógica. É a operação pela qual a compreensão extrai necessária e logicamente uma proposição (conclusão), a partir de proposições antecedentes, ou seja, das premissas. Os raciocínios dedutivos partem de enunciados mais amplos, gerais e universais, para proposições particulares. Trata-se de um processo descendente, do mais amplo para o mais particular. Ex. Todos os cariocas são brasileiros. Alguns homens são cariocas. Logo, alguns homens são brasileiros. Existem pelo menos 2 tipos específicos de dedução: a dedução lógica silogística (os silogismos que são raciocínios lógico- dedutivos) e a dedução matemática (baseada em demonstrações de axiomas). Guia de Estudo - Lógica 23 É relevante ressaltar que apesar deste tipo de raciocínio não possibilitar a descoberta de novos conhecimentos, uma vez que se parte de premissas conhecidas para uma conclusão que delas derivou logicamente, é um procedimento racional de grande utilidade para a ciência e para o conhecimento em geral, já que garante o correto funcionamento do pensamento, o seu rigor e solidez formal (validade). Indutivo: é o raciocínio em que o pensamento, parte de conhecimentos particulares ou menos gerais, extraindo uma conclusão mais geral ou universal, realizando previsões nem sempre são rigorosas e permitindo enunciar probabilidades que, quando comprovadas, podem se converter em leis. É um raciocínio ascendente, pois parte do que é particular e concreto (casos empíricos) para o geral/ universal e abstrato (enunciados gerais ou leis). Ao realizar frequentemente generalizações abusivas, o raciocínio indutivo apresenta falta de rigor: baseia-se no determinismo ao fazer previsões baseados numa lógica simplista de causas e efeitos nem sempre confirmados. Assume importância na ciência, pois permite passar do conhecido ao desconhecido: (permite realizar conjecturas/especulações e formulação de hipóteses). Ex. O calor dilata o ferro O calor dilata o ouro O calor dilata o cobre (O ferro, o ouro e o cobre são metais) Logo, o calor dilata (todos) os metais Guia de Estudo - Lógica 24 Fonte: Fig. 5 Analogia: é uma forma de raciocínio em que a partir de certas semelhanças se infere uma conclusão. As conclusões obtidas por analogia poderão ser mais ou menos rigorosas, de acordo com o grau de maior ou menor semelhança dos casos observados e conforme a verificação das previsões que são feitas. É um dos raciocínios mais vulgares, pois utiliza-se de raciocínios analógicos que contêm expressões deste tipo: ―é semelhante a‖…― é quase tão como...‖; ― é igual/parecido a…‖, ― é tão quanto…‖ etc. Apesar das limitações e da falta de rigor, reconhece-se a sua importância nos campos da Arte e até da Ciência, uma vez que estimula a imaginação, favorecendo a descoberta. Ex. Pedro é muito ansioso, reagindo agressivamente a situações de stress. Lucas, gêmeo de Pedro, é igualmente ansioso. Logo, Lucas reagirá tão ansiosa e agressivamente quanto Pedro a situaçõesde stress. Reconhecer os processos que o raciocínio toma para conhecer é relevante. Podemos distinguir o dedutivo quando partimos do todo para as partes, o indutivo, quando conhecemos a partir das partes chegando ao todo, por analogia, quando estabelecemos relações de semelhanças. - Resaltar - Resaltar Guia de Estudo - Lógica 25 UNIDADE 3 - O SILOGISMO Ao final do estudo dessa unidade você deverá ser capaz de: Compreender as características de um silogismo; Identificar um silogismo. O silogismo é um tipo de argumento composto de três proposições: duas premissas e uma conclusão. Segundo CHAUÍ (2003), ―a teoria aristotélica do silogismo é o coração da lógica, pois é a teoria das demonstrações ou das provas, da qual depende o pensamento científico e filosófico Observe o texto abaixo: Todo homem é mortal Sócrates é homem Logo, Sócrates é mortal. A primeira proposição, chamamos de premissa maior, a segunda proposição chamamos de premissa menor, a terceira proposição chamamos de conclusão. Essa é a forma básica de um silogismo. Ele contém os seguintes termos: homem, animal e mortal. O termo que se repete na premissa maior e menor, que é o termo homem, chamamos de termo médio. Os outros dois termos do silogismo, animal e mortal, chamamos de termos extremos. A função do termo médio é ligar os termos extremos permitindo chegar à conclusão. Portanto, o termo médio nunca se repete na conclusão. O silogismo possui três características principais: 1. é mediato: exige um percurso de pensamento e de linguagem para que se possa chegar a uma conclusão; 2. é dedutivo: é um movimento de pensamento e de linguagem que parte de certas afirmações verdadeiras para chegar a outras também verdadeiras e que dependem necessariamente das primeiras; 3. é necessário: porque é dedutivo (as conseqüências a Guia de Estudo - Lógica 26 que se chega na conclusão resultam necessariamente da verdade do ponto de partida). Por isso, Aristóteles considera o silogismo que parte de proposições apodíticas superior ao que parte de proposições hipotéticas ou possíveis, designando-o com o nome de ostensivo, pois ostenta ou mostra claramente a relação necessária e verdadeira entre o ponto de partida e a conclusão. Observe algumas normas para que você fique atento(a), quanto aos silogismos: Um silogismo deve ter somente um termo maior, um termo menor e um médio; O termo médio nunca deve aparecer na conclusão, mas sim nas duas premissas; Pelo fato de poder concluir mais do que o permitido, nenhum termo pode ser mais extenso na conclusão; A conclusão não pode conter o termo médio; nada pode ser concluído de duas premissas negativas ou de duas premissas particulares; Duas premissas afirmativas devem ter conclusão afirmativa; A conclusão sempre acompanha a parte mais fraca. Para Aristóteles há dois tipos de silogismos: os dialéticos com argumentações contrárias por ter premissas que são meras opiniões, pois são premissas prováveis e conclusões hipotéticas. E os científicos é aquele que se refere ao universal e necessário, ao que é de uma maneira e não pode deixar de ser tal como é, aquele que acontece sempre e sempre da mesma maneira. De acordo com CHAUÍ (2003): O silogismo científico não admite premissas contraditórias. Suas premissas são universais necessárias e sua conclusão não admite discussão ou refutação, mas exige demonstração. Por esse motivo, o silogismo científico deve obedecer a quatro regras, sem as Guia de Estudo - Lógica 27 quais sua demonstração não terá valor: 1. as premissas devem ser verdadeiras (não podem ser possíveis ou prováveis, nem falsas); 2. as premissas devem ser primárias ou primeiras, isto é, indemonstráveis, pois se tivermos que demonstrar as premissas, teremos que ir de regressão em regressão, indefinidamente, e nada demonstraremos; 3. as premissas devem ser mais inteligíveis do que a conclusão, pois a verdade desta última depende inteiramente da absoluta clareza e compreensão que tenhamos das suas condições, isto é, das premissas; 4. as premissas devem ser causa da conclusão, isto é, devem estabelecer as coisas ou os fatos que causam a conclusão e que a explicam, de tal maneira que, ao conhecê-las, estamos obedecendo as causas da conclusão. Esta regra é da maior importância porque, para Aristóteles, conhecer é conhecer as causas ou pelas causas. O que são as premissas de um silogismo científico? São verdades indemonstráveis, evidentes e causais. São de três tipos: 1. axiomas, como, por exemplo, os três princípios lógicos ou afirmações do tipo ―O todo é maior do que as partes‖; 2. postulados, isto é, os pressupostos de que se vale uma ciência para iniciar o estudo de seus objetos. Por exemplo, o espaço plano, na geometria; o movimento e o repouso, na física; 3. definições (que, para Aristóteles, são as premissas mais importantes de uma ciência) do gênero que é o objeto da ciência investigada. A definição deve dizer o que a coisa estudada é como é, por que é sob quais condições é a definição. Guia de Estudo - Lógica 28 UNIDADE 4 - AS FALÁCIAS Ao final do estudo dessa unidade você deverá ser capaz de: Identificar os principais tipos de falácias; Reconhecer os mecanismos utilizados numa falácia. Você sabe o que é uma falácia? Falácia é, segundo o dicionário Aurélio, uma afirmação falsa ou errônea, ou ainda, qualidade daquele que é falaz, ou seja, intencionalmente enganador, ardiloso, enganoso, capcioso, vão, quimérico e ilusório. Assim, em Lógica, Falácias são erros de raciocínio com aparência de correção, ou seja, um raciocínio incorreto, ilegítimo que parece-nos correto, legítimo e, como consequência, surge-nos com poder de persuasão e convencimento. Para que você possa compreender melhor leia o texto a seguir: O Amor é uma Falácia M. Sulman Eu era frio e lógico. Sutil, calculista, perspicaz, arguto e astuto - era tudo isso. Tinha um cérebro poderoso como um dínamo, preciso como uma balança de farmácia, penetrante como um bisturi. E tinha - imaginem só - dezoito anos. Não é comum ver alguém tão jovem com um intelecto tão gigantesco. Tomem, por exemplo, o caso do meu companheiro de quarto na universidade, Pettey Bellows. Mesma idade, mesma formação, mas burro como uma porta. Um bom sujeito, compreendam, mas sem nada lá em cima. Do tipo emocional. Instável, impressionável. Pior do que tudo, dado a manias. Eu afirmo que a mania é a própria negação da razão. Deixar-se levar por qualquer nova moda que apareça, entregar a alguma idiotice só porque os outros a seguem, isto, para mim, é o cúmulo da insensatez. Petey, no entanto, não pensava assim. Certa tarde, encontrei-o deitado na cama com tal expressão de sofrimento no rosto que o meu diagnóstico foi imediato: apendicite. - Não se mexa. Não tome laxante. Vou chamar o médico. - Couro preto - balbuciou ele. Guia de Estudo - Lógica 29 - Couro preto - disse eu, interrompendo a minha corrida. - Quero uma jaqueta de couro preto - disse. Percebi que o seu problema não era físico, mas mental. - Por que você quer uma jaqueta de couro preto? - Eu devia ter adivinhado - gritou ele, socando a cabeça - Devia ter adivinhado que eles voltariam com o Charleston. Como um idiota, gastei todo o meu dinheiro em livros para as aulas e agora não posso comprar uma jaqueta de couro preto. - Quer dizer - perguntei incrédulo- que estão mesmo usando jaquetas de couro preto outra vez? - Todas as pessoas importantes da universidade estão. Onde você tem andado? - Na biblioteca - respondi, citando um lugar não freqüentado pela pessoas importantes da Universidade. Ele saltou da cama e pôs-se a andar de um lado para o outro do quarto. - Preciso conseguir uma jaqueta de couro preto - disse, exaltado - Preciso mesmo. - Por que, Pety? Veja a coisa racionalmente. Jaquetas de couro preto são desconfortáveis. Impedem o movimento dos braços. São pesadas, são feias, são ... - Você não compreende - interrompeu ele com impaciência - é o que todos estão usando. Você não quer andar na moda? - Não - respondi, sinceramente. - Pois eu sim - declarou ele - daria tudo para ter uma jaqueta de couro preto. Tudo. Aquele instrumento de precisão, meu cérebro, começou a funcionar a todo vapor. - Tudo? - perguntei, examinando seu rosto com olhos semicerrados. - Tudo - confirmou ele, em tom dramático. Alisei o queixo, pensativo. Eu, por acaso, sabia onde encontrar uma jaqueta de couro preto. Meu pai usara um nos seus tempos de estudante; estava agora dentro de um malão, no sótão da casa. E, também por acaso, Petey tinha algo que eu queria. Não era dele, exatamente, mas pelo menos ele tinha alguns direitos sobre ela. Refiro-me à sua namorada, Polly Spy. Eu há muito desejava Polly Spy. Apresso-me a esclarecer que o meu desejo não era de natureza emotiva. A moça, não há dúvida, despertava emoções, mas eu não era daqueles que se deixam dominar pelo coração. Desejava Polly para fins engenhosamente calculados e inteiramente cerebrais. Cursava eu o primeiro ano de direito. Dali a algum Guia de Estudo - Lógica 30 tempo, estaria me iniciando na profissão. Sabia muito bem a importância que tinha a esposa na vida e na carreira de um advogado. Os advogados de sucesso, segundo as minhas observações, eram quase sempre casados com mulheres bonitas, graciosas e inteligentes. Com uma única exceção, Polly preenchia perfeitamente estes requisitos. Era bonita. Suas proporções ainda não eram clássicas, mas eu tinha certeza de que o tempo se encarregaria de fornecer o que faltava. A estrutura básica estava lá. Graciosa também era. Por graciosa quero dizer cheia de graças sociais. Tinha porte ereto, a naturalidade no andar e a elegância que deixavam transparecer a melhor das linhagens. Á mesa, suas maneiras eram finíssimas. Eu já vira Polly no barzinho da escola comendo a especialidade da casa - um sanduíche que continha pedaços de carne assada, molho, castanhas e repolho - sem nem sequer umedecer os dedos. Inteligente ela não era. Na verdade, tendia para o oposto. Mas eu confiava em que, sob a minha tutela, haveria de tornar-se brilhante. Pelo menos valia a pena tentar. Afinal de contas, é mais fácil fazer uma moça bonita e burra ficar inteligente do que uma moça feia e inteligente ficar bonita. - Petey - perguntei - você ama Polly Spy? - Eu acho que ela é interessante - respondeu - mas não sei se chamaria isso de amor. Por quê? - Você - continuei - tem alguma espécie de arranjo formal com ela? Quero dizer, vocês saem exclusivamente um com o outro? - Não. Nos vemos seguidamente. Mas saímos os dois com outros também. Por quê? - Existe alguém - perguntei - algum outro homem que ela goste de maneira especial? - Que eu saiba não. Por quê? Fiz que sim com a cabeça, satisfeito. - Em outras palavras, a não ser por você, o campo está livre, é isso? - Acho que sim. Aonde você quer chegar? - Nada, anda - respondi com inocência, tirando minha mala de dentro do armário. - Onde é que você vai? - quis saber Petey. - Passar o fim de semana em casa. Atirei algumas roupas dentro da mala. - Escute - disse Petey, apegando-se com força ao meu braço - em casa, será que você não poderia pedir dinheiro ao seu pai, e me emprestar para comprar uma jaqueta de couro preto? Guia de Estudo - Lógica 31 - Posso até fazer mais do que isso - respondi, piscando o olho misteriosamente. Fechei a mala e saí. - Olhe - disse a Petey, ao voltar na segunda feira de manhã. Abri a mala e mostrei o enorme objeto cabeludo e fedorento que meu pai usara ao volante de seu Stutz Beacat em 1955. - Santo Pai - exclamou Petey com reverência. Passou as mãos na jaqueta e depois no rosto. - Santo Pai - repetiu, umas quinze ou vinte vezes. - Você gostaria de ficar com ele? - perguntei. - Sim - gritou ele, apertando a jaqueta contra o peito. Em seguida, seus olhos assumiram um ar precavido. - O que quer em troca? - A sua namorada - disse eu, não desperdiçando palavras. - Polly? - sussurrou Petey, horrorizado. - Você quer a Polly? - Isso mesmo. Ele jogou a jaqueta pra longe. - Nunca - declarou resoluto. Dei de ombros. - Tudo bem. Se você não quer andar na moda, o problema é seu. Sentei-me numa cadeira e fingi que lia um livro, mas continuei espiando Petey, com o rabo dos olhos. Era um homem partido em dois. Primeiro olhava para a jaqueta com a expressão de uma criança desamparada diante da vitrine de uma confeitaria. Depois dava-lhe as costas e cerrava os dentes, altivo. Depois voltava a olhar para a jaqueta. Com uma expressão ainda maior de desejo no rosto. Depois virava-se outra vez, mas agora sem tanta resolução. Sua cabeça ia e vinha, o desejo ascendendo, a resolução descendendo. Finalmente, não se virou mais: ficou olhando para a jaqueta com pura lascívia. - Não é como se eu estivesse apaixonado por Polly - balbuciou. - Ou mesmo namorando sério, ou coisa parecida. - Isso mesmo - murmurei. - Afinal, Polly significa o que para mim, ou eu pra ela? - Nada - respondi. - Foi uma coisa banal. Nos divertimos um pouco. Só isso. - Experimente a jaqueta - disse eu. Ele obedeceu. A jaqueta ficou bem larga, passando da cintura. Ele parecia um motoqueiro mal vestido da década de Guia de Estudo - Lógica 32 cinqüenta. - Serve perfeitamente - disse, contente. Levantei-me da cadeira e perguntei, estendendo a mão. - Negócio feito? Ele engoliu a seco. - Feito - disse, e apertou a minha mão. Saí com Polly pela primeira vez na noite seguinte. O Primeiro programa teria o caráter de pesquisa preparatória. Eu desejava saber o trabalho que me esperava para elevar a sua mente ao nível desejado. Levei-a para jantar. - Puxa, que jantar interessante! - disse ela, quando saímos do restaurante. Fomos ao cinema. - Puxa, que filme interessante! - disse ela, quando saímos do cinema. Levei-a para casa. - Puxa, que noite interessante - disse ela, ao nos despedirmos. Voltei para o quarto com o coração pesado. Eu subestimara gravemente as proporções da minha tarefa. A ignorância daquela moça era aterradora. E não seria o bastante apenas instruí-la. Era preciso, antes de tudo, ensiná-la a pensar. O empreendimento se me afigurava gigantesco, e a princípio me vi inclinado a devolvê-la a Petey. Mas aí comecei a pensar nos seus dotes físicos generosos e na maneira como entrava numa sala ou segurava uma faca, um garfo, e decidi tentar novamente. Procedi, como sempre, sistematicamente. Dei-lhe um curso de Lógica. Acontece que, como estudante de direito, eu freqüentava na ocasião aulas de Lógica, e portanto tinha tudo na ponta da língua. - Polly - disse eu, quando fui buscá-la para o nosso segundo encontro. - Esta noite vamos até o parque conversar. - Ah, que interessante! - respondeu ela. Uma coisa deve ser dita em favor da moça: seria difícil encontrar alguém tão bem disposta para tudo. Fomos até o parque, o local de encontros da universidade, nos sentamos debaixo de umaárvore, e ela me olhou cheia de expectativa. - Sobre o que vamos conversar? - perguntou. - Sobre Lógica. Ela pensou durante alguns segundos e depois sentenciou: - Interessante! Guia de Estudo - Lógica 33 - A Lógica - comecei, limpando a garganta - é a ciência do pensamento. Se quisermos pensar corretamente, é preciso antes saber identificar as falácias mais comuns da Lógica. É o que vamos abordar hoje. - Interessante! - exclamou ela, batendo palmas de alegria. Fiz uma careta, mas segui em frente, com coragem. - Vamos primeiro examinar uma falácia chamada Dicto Simpliciter. - Vamos - animou-se ela, piscando os olhos com animação. - Dicto Simpliciter quer dizer um argumento baseado numa generalização não qualificada. Por exemplo: o exercício é bom, portanto todos devem se exercitar. - Eu estou de acordo - disse Polly, fervorosamente. - Quer dizer, o exercício é maravilhoso. Isto é, desenvolve o corpo e tudo. - Polly - disse eu, com ternura - o argumento é uma falácia. Dizer que o exercício é bom é uma generalização não qualificada. Por exemplo: para quem sofre do coração, o exercício é ruim. Muitas pessoas têm ordem de seus médicos para não exercitarem. É preciso qualificar a generalização. Deve-se dizer: o exercício é geralmente bom, ou é bom para a maioria das pessoas. Do contrário está-se cometendo um Dicto Simpliciter. Você compreende? - Não - confessou ela. - Mas isso é interessante. Quero mais. Quero mais! - Será melhor se você parar de puxar a manga da minha camisa - disse eu e, quando ela parou, continuei: - Em seguida, abordaremos uma falácia chamada generalização apressada. Ouça com atenção: você não sabe falar francês, eu não sei falar francês, Petey Bellows não sabe falar francês. Devo portanto concluir que ninguém na universidade sabe falar francês. - É mesmo? - espantou-se Polly. – Ninguém? Contive a minha impaciência. - É uma falácia, Polly. A generalização é feita apressadamente. Não há exemplos suficientes para justificar a conclusão. - Você conhece outras falácias - perguntou ela, animada. - Isto é até melhor do que dançar. - Esforcei-me por conter a onda de desespero que ameaçava me invadir. Não estava conseguindo nada com aquela moça, absolutamente nada. Mas não sou outra coisa senão persistente. Continuei. - A seguir, vem o Post Hoc. Ouça: Não levemos Bill - Resaltar - Resaltar Guia de Estudo - Lógica 34 conosco ao piquenique. Toda vez que ele vai junto, começa a chover. - Eu conheço uma pessoa exatamente assim - exclamou Polly. - Uma moça da minha cidade, Eula Becker. Nunca falha. Toda vez que ela vai junto a um piquenique... - Polly - interrompi, com energia - é uma falácia. Não é Eula Becker que causa a chuva. Ela não tem nada a ver com a chuva. Você estará incorrendo em Post Hoc, se puser a culpa na Eula Becker. - Nunca mais farei isso - prometeu ela, constrangida. - Você está bravo comigo? - Não Polly - suspirei. - Não estou bravo. - Então conte outra falácia. - Muito bem. Vamos experimentar as premissas contraditórias. - Vamos - exclamou ela alegremente. Franzi a testa, mas continuei. - Aí vai um exemplo de premissas contraditórias. Se Deus pode fazer tudo, pode fazer uma pedra tão pesada que ele mesmo não conseguirá levantar? - É claro - respondeu ela imediatamente. - Mas se ele pode fazer tudo, pode levantar a pedra. - É mesmo - disse ela, pensativa. - Bem, então eu acho que ele não pode fazer a pedra. - Mas ele pode fazer tudo - lembrei-lhe. Ela coçou a cabeça linda e vazia. - Estou confusa - admitiu. - É claro que está. Quando as premissas de um argumento se contradizem, não pode haver argumento. Se existe uma força irresistível, não pode existir um objeto irremovível. Compreendeu? - Conte outra dessas histórias interessantes - disse Polly, entusiasmada. Consultei o relógio. - Acho melhor parar por aqui. Levarei você em casa, e lá pensará no que aprendeu hoje. Teremos outra sessão amanhã. Deixei-a no dormitório das moças, onde ela me assegurou que a noitada fora realmente interessante, e voltei desanimadamente para o meu quarto. Petey roncava sobre sua cama, com a jaqueta de couro encolhida a seus pés. Por alguns segundos, pensei em acordá-lo e dizer que ele podia ter Polly de volta. Era evidente que o meu projeto estava condenado ao fracasso. Ela tinha, simplesmente, uma cabeça à prova de - Resaltar - Resaltar Guia de Estudo - Lógica 35 Lógica. Mas logo reconsiderei. Perdera uma noite, por que não perder outra? Quem sabe se em alguma parte daquela cratera de vulcão adormecido que era a mente de Polly, algumas brasas ainda estivessem vivas. Talvez, de alguma maneira, eu ainda conseguisse abaná-las até que flamejasse. As perspectivas não eram das mais animadoras, mas decidi tentar outra vez. Sentado sob uma árvore, na noite seguinte, disse: - Nossa primeira falácia desta noite se chama ad misericordiam. Ela estremeceu de emoção. - Ouça com atenção - comecei - Um homem vai pedir emprego. Quando o patrão pergunta quais as suas qualificações, o homem responde que tem uma mulher e dois filhos em casa, que a mulher e aleijada, as crianças não tem o que comer, não tem o que vestir nem o que calçar, a casa não tem camas, não há carvão no porão e o inverno se aproxima. Uma lágrima desceu por cada uma das faces rosadas de Polly. - Isso é horrível, horrível! - soluçou. - É horrível - concordei - mas não é um argumento. O homem não respondeu à pergunta do patrão sobre as suas qualificações. Ao invés disso, tentou despertar a sua compaixão. Cometeu a falácia de ad misericordiam. Compreendeu? Dei-lhe um lenço e fiz o possível para não gritar enquanto ela enxugava os olhos. - A seguir - disse, controlando o tom da voz - discutiremos a falsa analogia. Eis um exemplo: deviam permitir aos estudantes consultar seus livros durante os exames. Afinal, os cirurgiões levam as radiografias para se guiarem durante uma operação, os advogados consultam seus papéis durante um julgamento, os construtores têm plantas que os orientam na construção de uma casa. Por quê, então, não deixar que os alunos recorram a seus livros durante uma prova? - Pois olhe - disse ela entusiasmada - esta é a ideia mais interessante que eu já ouvi há muito tempo. - Polly - disse eu com impaciência - o argumento é falacioso. Os cirurgiões, os advogados e os construtores não estão fazendo teste para ver o que aprenderam, e os estudantes sim. As situações são completamente diferentes e não se pode fazer analogia entre elas. - Continuo achando a idéia interessante - disse Polly. - Santo Cristo! - murmurei, com impaciência. - A seguir, tentaremos a hipótese contrária ao fato. - Resaltar - Resaltar - Resaltar - Resaltar - Resaltar Guia de Estudo - Lógica 36 - Essa parece ser boa - foi a reação de Polly. - Preste atenção: se Madame Curie não deixasse, por acaso, uma chapa fotográfica numa gaveta junto com uma pitada de pechblenda, nós hoje não saberíamos da existência do rádio. - É mesmo, é mesmo - concordou Polly, sacudindo a cabeça. - Você viu o filme? Eu fiquei louca pelo filme. Aquele Walter Pidgeon é tão bacana! Ele me faz vibrar. - Se conseguir esquecer o Sr. Pidgeon por alguns minutos - disse eu, friamente - gostaria de lembrar que o que eu disse é uma falácia. Madame Curie teria descoberto o rádio de alguma outra maneira. Talvez outra pessoa o descobrisse. Muita coisa podia acontecer. Não se pode partir de uma hipótese que não é verdadeira e tirar dela qualquer conclusão defensável.- Eles deviam colocar o Walter Pidgeon em mais filmes - disse Polly - Eu quase não vejo ele no cinema. Mais uma tentativa, decidi. Mas só mais uma. Há um limite para o que podemos suportar. - A próxima falácia é chamada de envenenar o poço. - Que engraçadinho! - deliciou-se Polly. - Dois homens vão começar um debate. O primeiro se levante e diz: ‗o meu oponente é um mentiroso conhecido. Não é possível acreditar numa só apalavra do que ele disser‘. Agora, Polly, pense bem, o que está errado? Vi-a enrugar a sua testa cremosa, concentrando-se. De repente, um brilho de inteligência - o primeiro que vira - surgiu nos seus olhos. - Não é justo! - disse ela com indignação - Não é justo. O primeiro envenenou o poço antes que os outros pudessem beber dele. Atou as mãos do adversário antes da luta começar... Polly, estou orgulhoso de você. -Ora - murmurou ela, ruborizando de prazer. -Como vê, minha querida, não é tão difícil. Só requer concentração. É só pensar, examinar, avaliar. Venha, vamos repassar tudo o que aprendemos até agora. - Vamos lá - disse ela, com um abano distraído da mão. Animado pela descoberta de que Polly não era uma cretina total, comecei uma longa e paciente revisão de tudo o que dissera até ali. Sem parar citei exemplos, apontei falhas, martelei sem dar trégua. Era como cavar um túnel. A princípio, trabalho duro e escuridão. Não tinha idéia de quando veria a luz ou mesmo se a veria. Mas insisti. Dei duro, até que fui recompensado. Descobri uma fresta de luz. E a fresta foi se alargando até que o sol jorrou para dentro do túnel, clareando tudo. - Resaltar - Resaltar Guia de Estudo - Lógica 37 Levara cinco noites de trabalho forçado, mas valera a pena. Eu transformara Polly em uma lógica, e a ensinara a pensar. Minha tarefa chegara a bom termo. Fizera dela uma mulher digna de mim. Está apta a ser minha esposa, uma anfitriã perfeita para as minhas muitas mansões. Uma mãe adequada para os meus filhos privilegiados. Não se deve deduzir que eu não sentia amor por ela. Muito pelo contrário. Assim como Pigmaleão amara a mulher perfeita que moldara para si, eu amava a minha. Decidi comunicar-lhe os meus sentimentos no nosso encontro seguinte. Chegara a hora de mudar as nossas relações, de acadêmicas para românticas. - Polly,- disse eu, na próxima vez que nos sentamos sob a árvore - hoje não falaremos de falácias. - Puxa! - disse ela, desapontada. - Minha querida - prossegui, favorecendo-a com um sorriso - hoje é a sexta noite que estamos juntos. Nos demos esplendidamente bem. Não há dúvidas de que formamos um bom par. - Generalização apressada - exclamou ela, alegremente. - Perdão - disse eu. - Generalização apressada - repetiu ela. - Como é que você pode dizer que formamos um bom par baseado em apenas cinco encontros? Dei uma risada, contente. Aquela criança adorável aprendera bem as suas lições. - Minha querida - disse eu, dando um tapinha tolerante na sua mão - cinco encontros são o bastante. Afinal, não é preciso comer um bolo inteiro para saber se ele é bom ou não. - Falsa Analogia - disse Polly prontamente - eu não sou um bolo, sou uma pessoa. Dei outra risada, já não tão contente. A criança adorável talvez tivesse aprendido a sua lição bem demais. Resolvi mudar de tática. Obviamente, o indicado era uma declaração de amor simples, direta e convincente. Fiz uma pausa, enquanto o meu potente cérebro selecionava as palavras adequadas. Depois reiniciei. - Polly, eu te amo. Você é tudo no mundo pra mim, é a lua e a estrelas e as constelações no firmamento. For favor, minha querida, diga que será minha namorada, senão a minha vida não terá mais sentido. Enfraquecerei, recusarei comida, vagarei pelo mundo aos tropeções, um fantasma de olhos vazios. Pronto, pensei; está liquidado o assunto. - Ad misericordiam - disse Polly. Cerrei os dentes. Eu não era Pigmaleão; era - Resaltar - Resaltar Guia de Estudo - Lógica 38 Frankenstein, e o meu monstro me tinha pela garganta. Lutei desesperadamente contra o pânico que ameaçava invadir-me. Era preciso manter a calma a qualquer preço. - Bem, Polly - disse, forçando um sorriso - não há dúvida que você aprendeu bem as falácias. - Aprendi mesmo - respondeu ela, inclinando a cabeça com vigor. - E quem foi que ensinou a você, Polly? - Foi você. - Isso mesmo. E portanto você me deve alguma coisa, não é mesmo, minha querida? Se não fosse por mim, você nunca saberia o que é uma falácia. - Hipótese Contrária ao Fato - disse ela sem pestanejar. Enxuguei o suor do rosto. - Polly - insisti, com voz rouca - você não deve levar tudo ao pé da letra. Estas coisas só têm valor acadêmico. Você sabe muito bem que o que aprendemos na escola nada tem a ver com a vida. - Dicto Simpliciter - brincou ela, sacudindo o dedo na minha direção. Foi o bastante. Levantei-me num salto, berrando como um touro. - Você vai ou não vai me namorar? - Não vou - respondeu ela. - Por que não? - exigi. - Porque hoje à tarde eu prometi a Petey Bellows que eu seria a namorada dele. Quase caí para trás, fulminado por aquela infâmia. Depois de prometer, depois de fecharmos negócio, depois de apertar a minha mão! - Aquele rato! - gritei, chutando a grama. - Você não pode sair com ele, Polly. É um mentiroso. Um traidor. Um rato. - Envenenar o poço - disse Polly - E pare de gritar. Acho que gritar também deve ser uma falácia. Com uma admirável demonstração de força de vontade, modulei a minha voz. - Muito bem - disse - você é uma lógica. Vamos olhar as coisas logicamente. Como pode preferir Petey Bellows? Olhe para mim: um aluno brilhante, um intelectual formidável, um homem com futuro assegurado. E veja Petey: um maluco, um boa vida, um sujeito que nunca saberá se vai comer ou não no dia seguinte. Você pode me dar uma única razão lógica para namorar Petey Bellows? - Posso sim - declarou Polly - Ele tem uma jaqueta de - Resaltar - Resaltar - Resaltar Guia de Estudo - Lógica 39 couro preto. (in Sulman, M. (1973): As calcinhas cor-de-rosas do Capitão, Porto Alegre: Ed. Globo) Como você pode ver existe um grande número de armadilhas que podemos evitar quando estamos construindo um argumento dedutivo. Assim, as falácias são erros técnicos que fazem um argumento inválido ou indevido. Abaixo está uma lista de algumas falácias comuns, e também alguns planos retóricos muitas vezes usados em debates. A lista foi adaptada a partir do ―Guia Das Falácias de Stephen Downes" a) Ad Hoc Há uma diferença entre argumento e explicação. Se nós estamos interessados em estabelecer A, e B nos é oferecido como evidência, a afirmação "A porque B" é um argumento. Se nós estamos tentando estabelecer a verdade de B então "A porque B" não é um argumento, é uma explicação. A falácia Ad Hoc é dar uma explicação pós-fato que não se aplica a outras situações. Freqüentemente essa explicação Ad hoc estará vestida para parecer um argumento. O Amor é uma Falácia M. Sulman Eu era frio e lógico. Sutil, calculista, perspicaz, arguto e astuto - era tudo isso. Tinha um cérebro poderoso como um dínamo, preciso como uma balança de farmácia, penetrante como um bisturi. E tinha - imaginem só - dezoito anos. Não é comum ver alguém tão jovem com um intelecto tão gigantesco. Tomem, por exemplo, o caso do meu companheiro de quarto na universidade, Pettey Bellows. Mesma idade, mesma formação, mas burro como uma porta. Um bom sujeito, compreendam, mas sem nada lá em cima. Do tipo emocional. Instável, impressionável. Pior do que tudo, dado a manias.Eu afirmo que a mania é a própria negação da razão. Deixar-se levar por qualquer nova moda que apareça, entregar a alguma idiotice só porque os outros a seguem, isto, para mim, é o cúmulo da insensatez. Petey, no entanto, não pensava assim. Certa tarde, encontrei-o deitado na cama com tal expressão de sofrimento no rosto que o meu diagnóstico foi Guia de Estudo - Lógica 40 imediato: apendicite. - Não se mexa. Não tome laxante. Vou chamar o médico. - Couro preto - balbuciou ele. - Couro preto - disse eu, interrompendo a minha corrida. - Quero uma jaqueta de couro preto - disse. Percebi que o seu problema não era físico, mas mental. - Por que você quer uma jaqueta de couro preto? - Eu devia ter adivinhado - gritou ele, socando a cabeça - Devia ter adivinhado que eles voltariam com o Charleston. Como um idiota, gastei todo o meu dinheiro em livros para as aulas e agora não posso comprar uma jaqueta de couro preto. - Quer dizer - perguntei incrédulo - que estão mesmo usando jaquetas de couro preto outra vez? - Todas as pessoas importantes da universidade estão. Onde você tem andado? - Na biblioteca - respondi, citando um lugar não freqüentado pela pessoas importantes da Universidade. Ele saltou da cama e pôs-se a andar de um lado para o outro do quarto. - Preciso conseguir uma jaqueta de couro preto - disse, exaltado - Preciso mesmo. - Por que, Pety? Veja a coisa racionalmente. Jaquetas de couro preto são desconfortáveis. Impedem o movimento dos braços. São pesadas, são feias, são ... - Você não compreende - interrompeu ele com impaciência - é o que todos estão usando. Você não quer andar na moda? - Não - respondi, sinceramente. - Pois eu sim - declarou ele - daria tudo para ter uma jaqueta de couro preto. Tudo. Aquele instrumento de precisão, meu cérebro, começou a funcionar a todo vapor. - Tudo? - perguntei, examinando seu rosto com olhos semicerrados. - Tudo - confirmou ele, em tom dramático. Alisei o queixo, pensativo. Eu, por acaso, sabia onde encontrar uma jaqueta de couro preto. Meu pai usara um nos seus tempos de estudante; estava agora dentro de um malão, no sótão da casa. E, também por acaso, Petey tinha algo que eu queria. Não era dele, exatamente, mas pelo menos ele tinha alguns direitos sobre ela. Refiro-me à sua namorada, Polly Spy. Eu há muito desejava Polly Spy. Apresso-me a Guia de Estudo - Lógica 41 esclarecer que o meu desejo não era de natureza emotiva. A moça, não há dúvida, despertava emoções, mas eu não era daqueles que se deixam dominar pelo coração. Desejava Polly para fins engenhosamente calculados e inteiramente cerebrais. Cursava eu o primeiro ano de direito. Dali a algum tempo, estaria me iniciando na profissão. Sabia muito bem a importância que tinha a esposa na vida e na carreira de um advogado. Os advogados de sucesso, segundo as minhas observações, eram quase sempre casados com mulheres bonitas, graciosas e inteligentes. Com uma única exceção, Polly preenchia perfeitamente estes requisitos. Era bonita. Suas proporções ainda não eram clássicas, mas eu tinha certeza de que o tempo se encarregaria de fornecer o que faltava. A estrutura básica estava lá. Graciosa também era. Por graciosa quero dizer cheia de graças sociais. Tinha porte ereto, a naturalidade no andar e a elegância que deixavam transparecer a melhor das linhagens. Á mesa, suas maneiras eram finíssimas. Eu já vira Polly no barzinho da escola comendo a especialidade da casa - um sanduíche que continha pedaços de carne assada, molho, castanhas e repolho - sem nem sequer umedecer os dedos. Inteligente ela não era. Na verdade, tendia para o oposto. Mas eu confiava em que, sob a minha tutela, haveria de tornar-se brilhante. Pelo menos valia a pena tentar. Afinal de contas, é mais fácil fazer uma moça bonita e burra ficar inteligente do que uma moça feia e inteligente ficar bonita. - Petey - perguntei - você ama Polly Spy? - Eu acho que ela é interessante - respondeu - mas não sei se chamaria isso de amor. Por quê? - Você - continuei - tem alguma espécie de arranjo formal com ela? Quero dizer, vocês saem exclusivamente um com o outro? - Não. Nos vemos seguidamente. Mas saímos os dois com outros também. Por quê? - Existe alguém - perguntei - algum outro homem que ela goste de maneira especial? - Que eu saiba não. Por quê? Fiz que sim com a cabeça, satisfeito. - Em outras palavras, a não ser por você, o campo está livre, é isso? - Acho que sim. Aonde você quer chegar? - Nada, anda - respondi com inocência, tirando minha mala de dentro do armário. Se nós assumimos que Deus trata as pessoas igualmente, então a seguinte explicação é uma Ad Hoc: ―Eu fui aprovado num concurso público‖. Guia de Estudo - Lógica 42 Reze ao Senhor então. Ele que te aprovou. Então, ele irá aprovar em concursos públicos todos os outros que lhe pedirem? ―Os meios de Deus são misteriosos.‖ b) Afirmação do Consequente Essa falácia é um argumento da forma "A implica B, B é verdade, portanto A é verdade". Para entender porque isso é uma falácia, observe o exemplo. ―Se estudamos bastante, somos aprovados na faculdade.‖ ―Ora, fomos aprovados na faculdade.‖ ―Logo, estudamos bastante.‖ Na realidade, não estudamos, mas o professor elaborou uma prova muito fácil. O erro é afirmar a primeira coisa a partir da afirmação da segunda. c) Evidência Anedota A falácia da evidência anedota é que é insignificante estatisticamente, assim não há como assegurar sua validade, mesmo que exista o objeto ou o assunto a que ela se refere. Por exemplo, suponhamos que se prove que sonhos possam prever o futuro. Mesmo assim, isso não excluiria os sonhos que não são previsões e mesmo as coincidências. Não é porque sonhos poderiam prever o futuro, que todos eles serão previsões, mesmo quando se referirem ao futuro. d) Argumentum ad Antiquitatem (Argumento de antiguidade ou tradição). Essa é a falácia de afirmar que algo é certo ou bom simplesmente porque é velho, ou porque "essa é a maneira que isso sempre foi‖. "Se o meu avô diz que Garrincha foi melhor que Pelé, deve ser verdade." e) Argumentum Ad Baculum (Apelo pela Força) - Resaltar Guia de Estudo - Lógica 43 Utilização de algum tipo de privilégio, força, poder ou ameaça para impor a conclusão. "Acredite no que eu digo; não se esqueça de quem é que paga o seu salário‖. f) Argumentum Ad Hominem (Ataque pessoal) Em vez de o argumentador provar a falsidade do enunciado, ele ataca a pessoa de quem fez o enunciado. ―Fulano é um bom jogador de volei‖. ―- Isso é mentira, pois, que eu saiba, ele é um frouxo e um vagabundo.‖ (O fato do primeiro frouxo ou ser vagabundo não significa que ele não jogue bem voleibol.) g) Argumentum Ad Ignorantiam (Argumento da ignorância) Essa falácia ocorre quando o argumento se caracteriza em que algo deve ser verdade, simplesmente porque não foi provado que é falso ou contrariamente quando é argumentado que algo deve ser falso porque não se foi provada ser verdade. ―Existem extraterrestres, pois nunca provaram ao contrário.‖. ―Claro que não existe vida após a morte, pois nunca ninguém provou o contrário.‖ Apesar de não conseguir provar os argumentos acima, não se pode negá-los com certeza. h) Argumentum Ad Misericordiam (Apelo à Piedade) Esse é o Apelo à Piedade, também conhecido como Súplica Especial. A falácia é cometida quando alguém apela à piedade pelo bem de ter a conclusão aceita. Citamos
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