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0101 Febre no adulto Durval A. G. Costa Neste capítulo serão abordados outros fatores que podem elevar a temperatura corpórea causando pirexia, sem necessariamente ser de causa infecciosa, reumatológica ou neoplásica. Deve ser feita a diferenciação entre febre e hipertermia. Na hipertermia existe condição que desregula o ponto de ajuste da temperatura, enquanto na febre este ponto só aumenta, pela produção de prostaglandinas. A hipertermia não tem resposta com tratamento com medicamentos antipiréticos, apenas resfriamento mecânico. Ela pode ser dividida em 3 classes, a que ocorre por produção excessiva de calor, por dissipação corpórea ineficiente ou por disfunção talâmica. As 4 condições mais importantes de hipertermia são a termoplegia, síndrome neuroléptica maligna, síndrome serotoninérgica e a hipertermia maligna da anestesia. Na termoplegia, a condição mais frequente é a insolação, que pode levar à morte se não tratada mecânica e agressivamente. A síndrome neuroléptica maligna ocorre em menos de 1% dos pacientes que usam neurolépticos e o haloperidol é a droga mais relacionada ao quadro, que leva a hipertermia por contrações descontroladas da musculatura esquelética após o bloqueio de receptor. Por isso o tratamento é retirar o neuroléptico, e ainda podem ser usados o dantroleno e a bromocriptina. A hipertermia maligna da anestesia é condição que é determinada geneticamente e desencadeada pelo uso de anestésicos halogenados, com hipertermia secundária a tonicidade muscular esquelética involuntária. Por último, a síndrome serotoninérgica é muito frequente por uso crescente de inibidores seletivos da recaptação de serotonina (SSRI). Consiste em hipertermia, associada a hiper-reflexia, hipercinesia e clônus, que acontecem até 5 semanas do início do SSRI. O tratamento é principalmente a retirada do fármaco. 1. Introdução1. Introdução A febre é caracterizada por alteração da temperatura do corpo secundária a mecanismos regulatórios do sistema nervoso central. A temperatura corpórea é regulada pelo hipotálamo, mas inúmeros são os mecanismos que podem fazer alterações deste equilíbrio. Na maior parte dos casos, a febre é lembrada apenas por causas infecciosas. Entretanto, estas não são as únicas causa de febre. No capítulo de sepse, há um tópico que trata sobre febre de origem indeterminada e discutem-se as causas principais para febre obscura, que são infecções, doenças reumatológicas e neoplásicas sumariamente. Neste capítulo definiremos febre, discutiremos outras causas pontuais e suas características, não abordadas até então. 2. Definição2. Definição Febre é definida de maneiras diferentes. Para este capítulo, e considerando os termômetros axilares usados no Brasil, considera-se febre qualquer temperatura maior ou igual a 37,8°C. Lembre-se que na classificação de febre de origem indeterminada, Petersdorf and Beeson (1961) já classificavam febre como temperatura oral >38,3°C (equivalente a temperatura axilar >37,8°C). 3. Diferenças entre febre e hipertermia3. Diferenças entre febre e hipertermia Este é o ponto inicial da discussão. Qualquer paciente que apresente temperatura corpórea aumentada pode ser classificado como febre? A resposta é não. Em um exemplo simples, se um paciente é exposto a grande quantidade de calor por período excessivo de tempo (como num ambiente muito quente, por exemplo), ele pode fazer pirexia (aumento de temperatura corpórea) sem ser definido como febre. A principal diferença é que enquanto na febre há reajuste do limiar de temperatura pelo hipotálamo, na hipertermia eles simplesmente falham. A Tabela 1 mostra as diferenças entre as 2 situações. Tabela 1 - Diferenças entre febre e hipertermia FebreFebre HipertermiaHipertermia Ponto inicialPonto inicial O ponto de ajuste térmico do corpo muda. Os mecanismos de controle de calor falham. FisiopatologiaFisiopatologia Os mecanismos de ajuste térmico hipotalâmico elevam oponto de equilíbrio térmico. A produção de calor excede a dissipação de calor. MotivosMotivos Há causas infecciosas, neoplásicas, reumatológicas emedicamentosas. Há causas externas que impedem a dissipação ou aumentam a produção de calor (síndrome neuroléptica maligna, termoplegia, hipertermia maligna da anestesia). TratamentoTratamento Há necessidade de fármacos para baixar o ponto de controle térmico hipotalâmico novamente (anti- inflamatórios, paracetamol e dipirona). Há controle com resfriamento físico e dissipação de calor. Deve-se tratar causa orgânica da hipertermia maligna. 4. Fisiopatologia da ocorrência de febre e da hipertermia4. Fisiopatologia da ocorrência de febre e da hipertermia É muito importante neste momento discutir o mecanismo que leva ao quadro febril. Entre os mecanismos imunológicos, o gatilho da febre é feito pelas interleucinas 1 e 6. Estas interleucinas são secretadas através dos macrófagos. O mecanismo seguinte é a produção de prostaglandinas, que foram estimuladas por substâncias que aumentam a temperatura corpórea (pirogênicas). As prostaglandinas fazem o feedback no hipotálamo, que aceitará temperaturas mais altas, mas irá desencadear mecanismos para tolerar essas maiores temperaturas. O aumento da temperatura pode ocorrer através de tremores (aumenta o calor fisicamente), através da diminuição da perda de calor (faz vasoconstrição periférica e arrepios). Assim que os pirógenos que desencadearam os sintomas iniciais estejam em níveis mais baixos, haverá diminuição de prostaglandinas e menor estímulo ao hipotálamo, voltando à temperatura inicial. Na hipertermia ocorre falha da hemostasia corpórea por algum fator, como depleção da dissipação de calor, agressão hipotalâmica ou aumento da produção de calor. A Figura 1 estabelece os fluxos mais encontrados na fisiopatologia da febre e da hipertermia, com o estabelecimento final dos mesmos sintomas (aumento da temperatura). IMPORTANTEIMPORTANTE A pirexia (aumento da temperatura) pode ocorrer tanto na febre quanto na hipertermia. Apesar do efeito final ser o mesmo (aumento da temperatura) é importante entender qual o tipo de mecanismo para definir o melhor tratamento. Figura 1 - Fisiopatologia da pirexia, por febre ou hipertermia Fonte: adaptado de Simon HB. Hyperthermia, fever, and fever of undetermined origin. ACP Medicine. 2006; 1-13. 5. Hipertermia5. Hipertermia A hipertermia é, portanto, a perda da capacidade do organismo de regular a temperatura, a chamada termorregulação. Existem causas diferentes de hipertermia. Podem ser divididas em 3 grandes classes: produção de calor excessiva, dissipação de calor diminuída e disfunção do hipotálamo. As causas de cada tipo estão descritas na Tabela 2. Note que algumas causas pertencem a mais de um tipo de classe, pois o mecanismo é multifatorial. Outro ponto interessante é que o valor da febre não pode ser usado para diferenciar febre e hipertermia. O fato de a febre ser alta não indica maior ou menor gravidade. Lembre-se que a magnitude da temperatura pode ser elevada também em doenças inflamatórias e infecciosas. O diagnóstico da hipertermia pode ser feito na maioria das vezes com um exame clínico bem feito, pois na maioria das vezes trata-se de condição aguda. Em pacientes com distúrbios endócrinos ou hipotalâmicos esta situação é mais complicada e eventualmente podem ser encaixados no diagnóstico de febre de origem indeterminada e exigirão investigação mais detalhada. Tabela 2 - Causas de hipertermia Motivos de hipertermiaMotivos de hipertermia Causas mais encontradasCausas mais encontradas Produção de calor excessivaProdução de calor excessiva - Delirium tremens; - Abuso de substância (anfetaminas); - Hipertermia por esforço; - Tétano generalizado; - Termoplegia (por esforço)*; - Catatonia letal; - Hipertermia maligna da anestesia; - Síndrome neuroléptica maligna*; - Feocromocitoma; - Intoxicação por salicilato; - Síndrome serotoninérgica; - Condição epilética; - Tireotoxicose.Dissipação de calor diminuídaDissipação de calor diminuída - Fármacos anticolinérgicos; - Disfunção autonômica; - Desidratação; - Termoplegia (clássica)*; - Síndrome neuroléptica maligna*; Roupas fechadas; - Abuso de substância (cocaína). Disfunção hipotalâmicaDisfunção hipotalâmica - Acidente vascular encefálico; - Encefalite; - Disfunção hipotalâmica idiopática; - Síndrome neuroléptica maligna*; - Sarcoidose e infecções granulomatosas; - Traumatismo; - Tumores. * Causas mistas. É importante pontuar alguns exemplos de hipertermia, comuns na prática clínica: -- Anfetaminas e cocaínaAnfetaminas e cocaína: causam hipertermia maligna, sendo o exemplo mais comum de agentes exógenos causadores de hipertermia maligna; -- Ácido acetilsalicílicoÁcido acetilsalicílico: pode ser causa de hipertermia maligna em crianças, pois desacoplam a fosforilação oxidativa na musculatura esquelética produzindo grande calor nos casos de toxicidade pela medicação em crianças; -- Tempestade tireotóxica e feocromocitomaTempestade tireotóxica e feocromocitoma: produção de calor aumentada pelos hormônios da tireoide e catecolaminas, respectivamente; -- Acidente vascular encefálicoAcidente vascular encefálico: pode desencadear hipertermia contínua por distúrbio hipotalâmico. DICADICA A magnitude da temperatura (quão alta a temperatura está) não pode ser usada para diferenciar febre de hipertermia, nem para identificar a gravidade da doença. Dentro do diagnóstico de hipertermia, serão separados para discussão 4 condições de maior importância: termoplegia, síndrome neuroléptica maligna e hipertermia maligna da anestesia e síndrome serotoninérgica. A - TermoplegiaA - Termoplegia Este termo é utilizado para condições graves em que a temperatura corpórea fica acima de 40°C, associada a disfunção neurológica de delirium, coma ou convulsão. A termoplegia também pode ocorrer em condições em que há grande umidade e calor extremo, com pouca hidratação (insolação). Ela pode ser dividida em 2 tipos: -- Termoplegia clássicaTermoplegia clássica: ocorre principalmente em idosos e crianças. É a forma mais comum. Ocorre grande onda de calor na temperatura ambiente e a exposição excessiva ao calor (também muito presente em moradores de rua) leva à dificuldade de dissipação do calor, ocasionando mortes. São as famosas mortes no verão quando existem temperaturas ambientes muito altas; IMPORTANTEIMPORTANTE A termoplegia clássica (insolação) é a condição de hipertermia mais frequentemente vista em pronto-atendimentos, nem sempre diagnosticada. -- Termoplegia de esforçoTermoplegia de esforço: ocorre em indivíduos jovens que fazem exercícios exagerados. Pode ocorrer em atletas, recrutas do exército e funcionários que trabalham com serviço pesado expostos ao sol; - Diagnóstico clínico- Diagnóstico clínico: é feito observando altas temperaturas (geralmente acima de 40,5°C), associadas a fraqueza ou fadiga indevida, falta de concentração ou confusão, tontura, cefaleias, náusea ou cãibras musculares diante da exposição ao calor. São os sintomas iniciais, que se não tratados podem evoluir para lesões mais graves, convulsões ou coma. A pele normalmente é pegajosa e úmida se a termoplegia for por esforço e quente e seca se for a clássica. Choque, arritmias, isquemia miocárdica e edema pulmonar tendem mais a ocorrer de forma antecipada em idosos e pacientes debilitados, com termoplegia clássica. Ocorre ainda hiperventilação e alcalose respiratória. Entre as alterações pulmonares, edema pulmonar, síndrome da angústia respiratória aguda e pneumonia por aspiração são complicações possíveis. A oligúria ocorre por desidratação e também podem aparecer vômito e diarreia. Hematúria e sangramento gastrintestinal podem refletir coagulação intravascular disseminada, que está associada a lesão direta no endotélio vascular pelo calor. - Diagnóstico laboratorial- Diagnóstico laboratorial: é feito por hemoconcentração, alterações de tempo de protrombina e trombocitopenia associados ao quadro clínico. CPK e aldolase podem estar alteradas se houver lesão muscular; - Tratamento- Tratamento: medicações antipiréticas são inefetivas e o resfriamento físico é essencial. Portanto, retire as roupas do paciente, dê um banho com água fria, faça compressas de gelo, se disponíveis. De preferência, deve-se realizar terapia de hidratação intravenosa (com a oral pode haver aspiração). Durante o resfriamento, a monitorização da temperatura corpórea é essencial para evitar danos e, se as medidas demorarem a surtir efeito, outras mais agressivas devem ser tomadas, como a imersão do paciente em água gelada. A mortalidade nesta condição é alta mesmo com medidas agressivas de resfriamento. IMPORTANTEIMPORTANTE A termoplegia é uma condição grave que requer tratamento rápido e agressivo de resfriamento, pois há alta mortalidade mesmo com as medidas de resfriamento. B - Síndrome neuroléptica malignaB - Síndrome neuroléptica maligna A Síndrome Neuroléptica Maligna (SNM) é uma condição de hipertermia que ocorre em menos de 1% dos pacientes que fazem uso de neurolépticos e geralmente no 1º mês de uso (primeiros 30 dias). A SNM ocorre pela administração de alguns medicamentos e o mais frequente causador é o haloperidol. Outras medicações implicadas são mostradas na Tabela 3. Tabela 3 - Medicações envolvidas na síndrome neuroléptica maligna - Butirofenonas: haloperidol (mais comum desencadeador), droperidol; - Fenotiazinas: clorpromazina; - Tioxantenos; - Antipsicóticos atípicos: risperidona, clozapina; - Metoclopramida (não psiquiátrico); - Antidepressivos tricíclicos: amitriptilina, nortriptilina; - Inibidores da monoamina oxidase; - Remoção de fármacos dopaminérgicos usados na doença de Parkinson: amantadina, levodopa. - Fisiopatologia- Fisiopatologia: produção excessiva de calor precipitada pelo bloqueio de receptores dopaminérgicos nos tratos nigroestriatais, levando a contrações descontroladas da musculatura esquelética que, por sua vez, produzem calor corpóreo em excesso; - Diagnóstico clínico- Diagnóstico clínico: hipertermia, bradicinesia, rigidez muscular grave, taquicardia, pressão arterial lábil e anormalidades extrapiramidais; - Diagnóstico laboratorial- Diagnóstico laboratorial: hipernatremia, acidose, hemoconcentração e leucocitose, rabdomiólise e alteração de função hepática e renal; - Tratamento- Tratamento: suspensão do agente suspeito neuroléptico. Resfriamento físico pode ser usado na fase aguda. Dantroleno (relaxante muscular) e bromocriptina (agonista dopaminérgico) apresentam bons resultados na SNM. C - Hipertermia maligna da anestesiaC - Hipertermia maligna da anestesia Nesta condição, há alta mortalidade também, associada a hiperatividade muscular esquelética involuntária secundária ao uso de medicamento (semelhante à SNM). A diferença é que a determinação desta condição é genética, com precipitação com o uso de agentes anestésicos inalatórios halogenados e relaxantes musculares despolarizantes. Neste ponto, há história familiar de distúrbio prévio. Pode ser feita a confirmação do risco de hipertermia maligna da anestesia através de biópsia muscular com teste de contratura com cafeína-halotano com resultado positivo. DICADICA A principal diferença entre a hipertermia maligna da anestesia e a síndrome neuroléptica maligna é que a primeira tem característica genética que determina a hipertermia, com o gatilho do uso de halogenados. O quadro clínico é de rigidez muscular e hipertermia grave logo após a administração da anestesia (podendo ser, em alguns casos, horas depois). Progressivamente, também aparecem taquicardia, arritmia, hiperpneia, hipóxia, hipercapnia e hipercalemia. O tratamento é feito com resfriamento físico e correção de distúrbios metabólicos existentes. D - Síndrome serotoninérgicaD - Síndrome serotoninérgica Esta síndrome se tornou conhecida por conta do uso cada vez maior demedicamentos conhecidos como inibidores seletivos da recaptação de serotonina (SSRI) que são, basicamente, fluoxetina, paroxetina, sertralina e citalopram. Esta condição ocorre em até 26% dos pacientes que tomam doses elevadas de SSRI. - Fisiopatologia- Fisiopatologia: ocorre agonismo excessivo dos receptores serotoninérgicos existentes no sistema nervoso central e no sistema nervoso periférico, o que ocorre dentro das 5 primeiras semanas do uso do SSRI; - Diagnóstico clínico- Diagnóstico clínico: hipertermia, hipercinesia, tremores intermitentes, hiper-reflexia e clônus. Podem ocorrer, ainda, diarreia e taquicardia. Em casos brandos pode não haver hipertermia; IMPORTANTEIMPORTANTE Para diferenciar a síndrome serotoninérgica da síndrome neuroléptica maligna, lembre-se que a última tem evolução mais lenta, com bradicinesia e acinesia. O clônus, a hipercinesia e a hiper-reflexia só ocorrem na síndrome serotoninérgica. - Tratamento- Tratamento: obviamente é necessária a remoção do SSRI suspeito da síndrome. Ao contrário da SNM, não há ação da bromocriptina e do dantroleno. Antipiréticos e betabloqueadores também são inefetivos. RESUMORESUMO QUADRO-RESUMOQUADRO-RESUMO Pirexia (termo para oPirexia (termo para o leigo: “febre”)leigo: “febre”) Condição assumida como aumento da temperatura acima de 37,8°C, em temperatura axilar Febre e hipertermiaFebre e hipertermia - Febre: mudança do ponto de equilíbrio hipotalâmico da temperatura, pela produção de prostaglandinas, após fator pirógeno inicial; - Hipertermia: condição de aumento de temperatura por desequilíbrio no sistema de controle hipotalâmico. Causas de hipertermiaCausas de hipertermia - Produção excessiva de calor: delirium tremens, abuso de substância (anfetaminas), hipertermia por esforço, tétano generalizado, termoplegia (por esforço)*, catatonia letal, hipertermia maligna da anestesia, síndrome neuroléptica maligna, feocromocitoma, intoxicação por salicilato, síndrome serotoninérgica, condição epilética, tireotoxicose; - Incapacidade do organismo de dissipar calor: fármacos anticolinérgicos, disfunção autonômica, desidratação, termoplegia (clássica), síndrome neuroléptica maligna, roupas fechadas, abuso de substância (cocaína); - Disfunção direta no hipotálamo: acidente vascular encefálico, encefalite, disfunção hipotalâmica idiopática, síndrome neuroléptica maligna, sarcoidose e infecções granulomatosas, traumatismo, tumores. CaracterísticasCaracterísticas particulares de situaçãoparticulares de situação de hipertermiade hipertermia - Termoplegia: clássica ou de esforço. A clássica (insolação) é a causa mais comum de hipertermia. Pode desenvolver coagulação intravascular disseminada e aumento de CPK. Tratamento com resfriamento mecânico agressivo e deve ser imediato, porque tem alta mortalidade; - Síndrome neuroléptica maligna: relacionada ao uso de neurolépticos, em 1% dos casos de uso. O mais frequente é o haloperidol, mas pode ocorrer com qualquer neuroléptico. O tratamento é feito com a retirada do neuroléptico e o uso de bromocriptina e dantroleno; - Síndrome serotoninérgica: secundária ao uso de SSRI (até 26%, ocorrendo nas primeiras 5 semanas). Tratamento essencialmente com a retirada do SSRI; - Hipertermia maligna da anestesia: condição genética, com gatilho através do uso de anestésicos halogenados. O tratamento é feito com o resfriamento mecânico e não se deve usar novamente o anestésico. 0202 Hepatoesplenomegalias crônicas Durval A. G. Costa Neste capítulo, serão abordadas as principais doenças infecciosas que causam hepatoesplenomegalias crônicas: a leishmaniose visceral e a esquistossomose. A primeira é causada por protozoários do gênero Leishmania, transmitida pela picada do mosquito Lutzomyia longipalpis, causando inicialmente febre, diarreia e dor abdominal inicialmente, evoluindo posteriormente com emagrecimento e hepatoesplenomegalia. O tratamento de escolha é feito com antimonial pentavalente (Glucantime®). Já a esquistossomose é uma afecção causada pelo platelminto Schistosoma mansoni, cuja transmissão ocorre pela penetração ativa de cercárias na pele quando o indivíduo nada em “lagoas de coceiras”. Os sintomas envolvem febre, diarreia e tosse seca, além de dermatite cercariana e pneumonite intersticial eosinofílica na fase aguda e hepatoesplenomegalia associada, muitas vezes, a ascite na fase crônica. O tratamento de escolha é feito com praziquantel ou oxamniquina. A leishmaniose visceral é doença de notificação compulsória em todo o Brasil, enquanto a esquistossomose é doença de notificação compulsória em áreas não endêmicas no país. 1. Introdução1. Introdução Este capítulo tem como função reunir as 2 doenças infecciosas que causam mais hepatomegalia e esplenomegalia no Brasil: leishmaniose visceral e esquistossomose. Exatamente por causar sintomas e sinais pareados, uma serve de diagnóstico diferencial para a outra em vários aspectos. Por esse motivo, a apresentação de ambas no mesmo capítulo facilita a comparação e o entendimento. 2. Leishmaniose visceral2. Leishmaniose visceral A - Introdução e epidemiologiaA - Introdução e epidemiologia A leishmaniose visceral é conhecida como calazar e é causada por um protozoário, com apresentação de doença sistêmica. Esse protozoário flagelado é da mesma família que o Trypanosoma cruzi, existindo 3 espécies que formam o complexo Donovani: Tabela 1 - Complexo Donovani LeishmaniaLeishmania chagasichagasi Causadora da doença no “novo mundo” (Brasil, Colômbia, Venezuela e Bolívia) LeishmaniaLeishmania donovanidonovani Causadora da doença no “velho mundo” (Índia, China e África do leste) LeishmaniaLeishmania infantuminfantum Causadora da doença também no “velho mundo”, mas também na Europa do mediterrâneo e norte da África DICADICA Não confundir leishmaniose visceral com leishmaniose tegumentar; são protozoários diferentes, apesar de serem do mesmo gênero. L. braziliensis, L. guyanensis e L. amazonensis são as principais causadoras de leishmaniose tegumentar no Brasil e serão discutidas no capítulo Outras doenças infecciosas. A doença é distribuída mundialmente, mas com a característica diferente da leishmaniose cutânea, que além de atingir apenas a pele (também de forma não sistêmica) não tem a mesma distribuição mundial. A leishmaniose cutânea é endêmica em 88 países de 4 continentes. Entretanto, ao se falar de leishmaniose visceral, o quadro é mais restrito, pois mais de 90% das leishmanioses viscerais se concentram em Bangladesh, Índia, Brasil e Sudão. Figura 1 - As áreas em amarelo representam os países que apresentam casos de leishmaniose visceral: notar que, na América, o Brasil responde pela maioria dos casos No Brasil, a doença se concentra nos locais onde existe a prevalência do mosquito vetor. Este mosquito é o Lutzomyia longipalpis, conhecido como mosquito-palha, pois apresenta pequeno tamanho em comparação ao pernilongo comum (Culex). Figura 2 - O Lutzomyia longipalpis não é o único transmissor da leishmaniose visceral, mas é o principal no Brasil. Além de mosquito-palha, é conhecido como birigui ou tatuquira. Prefere regiões mais secas, mas vive bem em domicílios urbanos, facilitando a transmissão da doença Figura 3 - Casos descritos no Brasil de leishmaniose visceral de 2009 a 2011, segundo o Ministério da Saúde: notar que a prevalência da infecção se concentra no Nordeste, apesar de haver muitos casos na divisa com a Bolívia (Mato Grosso) Os dados mais recentes divulgados pelo Ministério da Saúde mostram 3.289 casos em 2015, a maioria na região Nordeste. Isoladamente, o Maranhão é o campeão de casos em 2015, seguido de Ceará, Pará (único estado fora do Nordeste entre os que têm mais casos) e Piauí. Outra característica importante da doença é que ela é uma zoonose, pois normalmente atinge outros animais, apesar de eventualmente atingir o homem. A doença ganhou destaque nos países do Mediterrâneo (Portugal,Espanha, Itália, França), pois nesses casos há associação muito frequente com o HIV, causando uma doença com perfil diferente. O cão é seu principal reservatório urbano da doença. B - Fisiopatologia e ciclo da doençaB - Fisiopatologia e ciclo da doença A principal característica deste protozoário é a presença de 2 fases distintas: a forma promastigota, definida como forma infectante (forma flagelada e móvel) e a forma amastigota, que está presente nos macrófagos do mamífero parasitado (que pode ser o homem, o cão ou outro mamífero) e é imóvel. O ciclo do parasita nesses mosquitos dura de 3 a 5 dias e tem 2 fases: Tabela 2 - Fases do ciclo parasita Estágio infectante ou estágio noEstágio infectante ou estágio no mosquitomosquito Dura desde o momento em que o mosquito pica o animal infectado, com a transformação no intestino do mosquito de amastigotas em formas infectantes, as promastigotas. Estas serão transmitidas em uma nova picada. Estágio no ser humanoEstágio no ser humano Começa no momento da picada do inseto, com a transmissão de promastigotas, que serão logo fagocitadas. A partir daí haverá transformação em amastigotas, que se dividirão em vários tecidos do corpo, principalmente gânglios e medula. IMPORTANTEIMPORTANTE Há 2 fases no ciclo parasita da leishmaniose visceral: promastigota (infectante, flagelada e móvel) e amastigota (presente nos macrófagos de mamífero infectado – imóvel). O parasita utiliza 2 proteínas para a penetração na célula, Gp63 e LPG. As Leishmanias parasitam apenas macrófagos e não causam liberação de citocinas (como IL-12), por isso eles não são ativados, ficando repletos de formas amastigotas. O macrófago repleto de parasitas se rompe, liberando as formas amastigotas, que infectam outras células. O acúmulo dos macrófagos infectados no baço e no fígado gera a hepatoesplenomegalia. E a hiperplasia dos macrófagos na medula óssea compromete a produção das outras células, causando pancitopenia. A resposta celular fundamental neste tipo de doença divide-se para 2 fatores na resposta ao parasita: o tipo de resposta predominante do linfócito T CD4 (Th1 ou Th2) e a resposta do macrófago ao estímulo pelo IFN-gama (o IFN-gama funciona ativando os macrófagos e fazendo que estes não sejam permissivos à infecção por Leishmania). Havendo predomínio de resposta Th1, há produção de IFN-gama e IL-2, que ativam macrófagos e contêm a doença. Em caso de predomínio de Th2, há produção de IL-4, IL-5 e IL-10, com progressão da doença. DICADICA A falta de resposta celular é o que define a existência da leishmaniose visceral. A resposta nessa doença é a humoral, ou Th2. Portanto, o tipo de resposta imunocelular define quem vai desenvolver a doença. Muitas vezes o paciente apresenta a doença assintomática, só descoberta eventualmente em exame. Figura 4 - Ciclo da leishmaniose visceral Fonte: adaptado do Centers for Disease Control and Prevention. C - Quadro clínicoC - Quadro clínico O quadro clínico depende diretamente da resposta imunológica. Os pacientes que não conseguem responder adequadamente ao protozoário apresentam quadro visceralizado. Existem formas oligossintomáticas e afebris de difícil diagnóstico, que podem evoluir para cura espontânea ou para formas sintomáticas. Pode-se dividir a clínica em fases nos casos de formas sintomáticas. a) Período iniciala) Período inicial Corresponde à fase de aparecimento dos sintomas. Costuma também ser classificada como fase aguda, na qual pode haver confusão com várias outras doenças agudas, virais ou bacterianas. Apresenta febre irregular, não muito alta (<38,5°C), com períodos de acalmia por algumas semanas, diarreia e dor abdominal. Tosse seca e irritante pode decorrer de pneumonite intersticial. IMPORTANTEIMPORTANTE No período inicial da leishmaniose visceral, ocorre o aparecimento de sintomas como febre, diarreia e dor abdominal. Figura 5 - Principais regiões onde o protozoário terá preferência para manifestar suas formas amastigotas. O aumento do fígado não é representado, mas muitas vezes aparece como uma resposta ao quadro sistêmico, não necessariamente por multiplicação do protozoário. Ao contrário, a medula é repleta de Leishmania b) Período de estadob) Período de estado É a fase também chamada de crônica, em que os sintomas clássicos estão presentes. O paciente apresenta emagrecimento e palidez cutânea. Hepatomegalia, de 3 a 4cm da linha hemiclavicular direita, é um achado frequente. A esplenomegalia pode chegar a ser muito exuberante (baço ultrapassando a linha média em direção à fossa ilíaca direita). Geralmente, a consistência do baço é amolecida, mas pode ser dura em caso de fibrose (quadros mais crônicos). Dor esplênica à palpação pode indicar periesplenite (inflamação da cápsula esplênica), e dor esplênica aguda é sugestiva de infarto esplênico. Não há grande adenomegalia, mas a micropoliadenopatia generalizada não dolorosa é comum. Observam-se sinais de desnutrição: pele seca, pelos quebradiços e cílios longos (sinal de Pittaluga). Em geral, tais pacientes já são desnutridos de base, mas esse quadro se agrava pela perda intestinal de proteínas. IMPORTANTEIMPORTANTE No período de estado da leishmaniose visceral, ocorrem os sintomas clássicos, como emagrecimento com desnutrição, hepatoesplenomegalia e micropoliadenopatia. Figura 6 - A hepatoesplenomegalia na leishmaniose é mais facilmente visualizada em crianças, nas quais o quadro clínico da fase crônica tende a ser mais grave Podem acontecer infecções secundárias na leishmaniose visceral, pois os pacientes se comportam como um imunodeprimido. Podem ocorrer tuberculose, bactérias capsuladas (Streptococcus pneumoniae e Haemophilus influenzae) e bactérias Gram negativas. A infecção secundária é a principal causa de morte nesses pacientes. A hemorragia também é causa de óbito frequente, já que desenvolve trombocitopenia (geralmente pancitopenia). Portanto, esta doença torna-se diagnóstico diferencial sempre que houver esplenomegalia (em área endêmica, quanto maior o baço, maior a chance de calazar), e, nos pacientes com quadros graves, toxemia, anemia ou pancitopenia, hepatoesplenomegalia, hemorragias, infecções graves, vômitos, diarreia, tosse, instabilidade respiratória e hemodinâmica sem uma causa óbvia (pode ser necessário iniciar o tratamento antes do diagnóstico confirmado). A presença de cães infectados ou doentes nas redondezas (cão emagrecendo, perdendo pelos, com unhas grandes e deformadas, sangramentos) reforça a suspeita da doença. Tabela 3 - Achados histopatológicos frequentes na leishmaniose visceral HepatomegaliaHepatomegalia A arquitetura hepática está preservada. As células de Kupffer estão aumentadas quanto ao tamanho e contêm muitos parasitas na forma amastigota. Não se observava necrose de hepatócitos. Excepcionalmente, pode haver fibrose intralobular difusa, padrão conhecido como cirrose de Rogers. Com o tratamento, tal fibrose pode regredir. EsplenomegaliaEsplenomegalia Observam-se intensa hipertrofia e hiperplasia do sistema fagocítico-monocitário. O baço tem consistência amolecida. Pneumonia intersticialPneumonia intersticial Pode evoluir para focos de fibrose septal. Não se encontram formas amastigotas. Nefrite intersticialNefrite intersticial Leva a insuficiência renal aguda por hiperplasia e hipertrofia das células mesangiais do glomérulo. A insuficiência épouco frequente, mas possível, decorrente do depósito de imunocomplexos. Em algumas situações, o calazar tende a ser mais grave, com maior risco de mortalidade, por isso deve ser tratado de maneira mais agressiva, inclusive com tratamento medicamentoso mais potente. Tabela 4 - Sinais de gravidade na leishmaniose visceral - Idade abaixo de 6 meses ou acima de 65 anos; - Desnutrição prévia grave; - Comorbidades (HIV, diabetes mellitus) associadas a pelo menos 1 das outras condições: · Icterícia; · Fenômenos hemorrágicos (exceto epistaxe);· Edema generalizado; · Sinais de toxemia (letargia, má perfusão, cianose, taquicardia ou bradicardia, hipoventilação ou hiperventilação e instabilidade hemodinâmica). Eventualmente, o protozoário da leishmaniose visceral pode causar leishmaniose cutânea, sendo uma característica mais frequente da L. donovani, que é presente na Índia e, portanto, rara no Brasil. Essas lesões são mais frequentes durante o tratamento por L. donovani. Deve ser lembrado que o causador habitual de leishmaniose não é nenhum destes, e sim o L. braziliensis, L. guyanensis e L. amazonensis. A L. donovani é causadora ocasional apenas. A coinfecção pelo HIV é mais frequente na Europa que no Brasil, mas existem casos diversos descritos aqui. A principal alteração que o HIV pode causar em associação com a leishmaniose é o desenvolvimento quase certo da doença, ou seja, o paciente não costuma ter leishmaniose assintomática. Além disso, esses pacientes têm um risco de evolução para gravidade maior. D - DiagnósticoD - Diagnóstico DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO O diagnóstico da leishmaniose visceral é feito com base no achado do protozoário em aspirado de medula óssea. Entretanto, há exames inespecíficos que também sugerem a doença, como o hemograma, que evidencia pancitopenia. O padrão-ouro para o diagnóstico na leishmaniose é o encontro do protozoário no tecido parasitado, e o melhor local para o encontro deste é no aspirado de medula óssea (mielograma). Entretanto, outras medidas podem ser tomadas para o encontro, específicas ou não. a) Específicoa) Específico Tabela 5 - Diagnóstico de leishmaniose Mielograma/mieloculturaMielograma/mielocultura Cultivo em meio específico NNN para identificação de formas promastigotas de Leishmania(sensibilidade de 55 a 90%) Punção e aspiração hepática ouPunção e aspiração hepática ou esplênicaesplênica - Mais perigoso para sangramentos, principalmente porque trombocitopenia é um achado clínico frequente; - Sensibilidade entre 75 e 80%; - Os melhores locais para procurar o parasita são baço, medula óssea, fígado, linfonodos e sangue periférico. ImunológicoImunológico - Sorologia: ELISA, imunofluorescência indireta (1:40 na forma clássica; sensibilidade e especificidade de 90%). Lembrar que, em áreas endêmicas, pode resultar falso positivo, por isso não pode ser diagnóstico, portanto um paciente com sorologia positiva com valor limite positivo pode ser, realmente, um falso positivo; - Reação de Montenegro: à semelhança do PPD, essa prova observa hipersensibilidade tardia. Como para ocorrer leishmaniose visceral deve haver falta de resposta celular, normalmente o teste de Montenegro é negativo na visceral (e positivo na leishmaniose cutânea). Nos pacientes com infecção sem doença, entretanto, o teste é positivo. PCR (reação em cadeia da polimerase)PCR (reação em cadeia da polimerase) Cada vez mais frequente, os testes em tempo real (RT-PCR) são os de preferência. Utilizadosatualmente para pesquisa do parasita em medula ou baço. b) Inespecíficob) Inespecífico - Hemograma:- Hemograma: o principal exame inespecífico a ser considerado é o hemograma, que normalmente apresenta pancitopenia, pelo hiperesplenismo presente; - Diagnósticos diferenciais:- Diagnósticos diferenciais: desde o início do capítulo, ficou claro que os principais diferenciais são com outras doenças que causam hepatoesplenomegalia. Entre as doenças infecciosas a principal causa é a esquistossomose. Entretanto, há outras doenças não infecciosas que merecem ser lembradas. Tabela 6 - Principais diagnósticos diferenciais para esplenomegalia na leishmaniose visceral Doenças infecciosasDoenças infecciosas Esquistossomose Doenças não infecciosasDoenças não infecciosas - Linfoma; - Leucemias; - Macroglobulinemia de Waldenström; - Policitemia vera. DICADICA O teste de Montenegro é negativo na leishmaniose visceral por falta de resposta imune celular. E - TratamentoE - Tratamento TRATAMENTOTRATAMENTO A 1ª escolha para tratamento da leishmaniose visceral é o antimonial pentavalente (Glucantime®), seguido pela anfotericina e pentamidina. Existem 3 drogas que fazem tratamento efetivo para leishmaniose, que são o antimonial pentavalente (Glucantime®), a anfotericina e a pentamidina. A droga mais potente é a anfotericina, que deve ser reservada para retratamentos ou casos de gravidade. A 1ª droga de escolha para tratamentos gerais deve ser o antimonial pentavalente. A pentamidina não é facilmente encontrada no Brasil atualmente, por isso está em desuso (menos na região Norte do país – Manaus). a) Antimoniais pentavalentes: Glucantime® (meglumina)a) Antimoniais pentavalentes: Glucantime® (meglumina) - Antimoniato de n-metil-glucamina (também chamado de meglumina), ampolas de 5mL; cada mL contém 85mg de antimoniato na dose de 20mg de antimoniato/kg/d; - O tratamento deve ser feito por 21 dias; - Trata-se de uma droga cardiotóxica, nefrotóxica e hepatotóxica, e a droga de escolha no Brasil; - O paciente deve fazer o tratamento internado e com monitorização cardíaca principalmente (eletrocardiograma antes do início do tratamento e pelo menos 1x/sem). b) Anfotericina Bb) Anfotericina B - Dose de 1mg/kg/d se desoxicolato ou 5mg/kg/d se lipossomal; - Droga nefrotóxica, cardiotóxica e hepatotóxica; - A droga é a 1ª escolha em algumas situações, ampliada pelo Ministério da Saúde desde 2014, conforme a Tabela a seguir: Tabela 7 - Indicações de anfotericina lipossomal para pacientes com leishmaniose visceral - Idade menor do que 1 ano; - Idade maior do que 50 anos; - Pacientes com gravidade aumentada, avaliados clínica e/ou laboratorialmente; - Insuficiência renal; - Insuficiência hepática; - Insuficiência cardíaca; - Transplantados cardíacos, renais ou hepáticos; - Intervalo QT corrigido no exame eletrocardiográfico maior do que 450 milissegundos (ms); - Uso concomitante de medicamentos que alteram o intervalo QT; - Hipersensibilidade ao antimoniato de n-metil-glucamina ou a outros medicamentos utilizados para o tratamento da leishmaniose visceral; - Infecção pelo HIV; - Comorbidades que comprometem a imunidade; - Uso de medicação que compromete a imunidade; - Falha terapêutica ao antimoniato de n-metil-glucamina ou a outros medicamentos utilizados para o tratamento da leishmaniose visceral; - Gestantes. - Uso por 21 dias. c) Pentamidinac) Pentamidina - Dose de 2 a 4mg/kg/d em dose única diária ou em dias alternados; - Uso por 40 doses; - Droga pancreatotóxica, hipotensora, nefrotóxica e cardiotóxica. d) Outras medicaçõesd) Outras medicações Outras medicações estão em discussão para entrada no Protocolo Brasileiro de Tratamento de Leishmaniose Visceral e poderão ser incorporadas a partir de 2017 entre as disponíveis para tratamento, como a miltefosina, utilizada para tratamento de todos os tipos de leishmaniose (visceral e tegumentar). Na leishmaniose visceral, faz tratamento em conjunto com a anfotericina em casos graves. F - Critérios de curaF - Critérios de cura Muito se discute sobre como se dá o critério de cura, pois em situações de tratamento parcial o uso de um novo tratamento, com mais agressividade, deve ser discutido (anfotericina). A cura após o tratamento é sempre presuntiva, pois não se pode ter certeza de que todos os parasitas tenham sido eliminados. Usam-se critérios clínicos: Tabela 8 - Critérios clínicos - Desaparecimento da febre (2º ao 5º dia de medicação específica); - Diminuição do baço e do fígado (pode demorar mais no fígado do que no baço); - Melhora da pancitopenia; - Ganho de peso (costuma ser lento); - Presença de eosinófilos no sangue periférico (bom sinal, pois indica retorno de imunidade); - Melhora dos sintomas, que permanecem após 12 meses do fim do tratamento; - Não há indicação de esplenectomia. G - ProfilaxiaG - Profilaxia Desde 2009, existe vacina canina para evitar leishmaniose, licenciadae patenteada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. A vacina é efetiva e muito se tem discutido sobre a sua assimilação pelo governo em programas de vacinação em massa nas áreas endêmicas. Entretanto, não há acordo sobre sua realização ainda. Os cães que se infectam por leishmaniose não se curam adequadamente com os medicamentos que existem para os humanos. Isso leva à necessidade do sacrifício do animal sempre que é detectada leishmaniose. Apesar de existir grande discussão das sociedades de animais quanto ao sacrifício (existe lei que obriga o sacrifício dos animais infectados), efetivamente nenhum tratamento é capaz de erradicar a doença no cão infectado. 2014 - FHEMIG 1. Uma mulher de 30 anos, residente em Belo Horizonte, é internada com quadro de anorexia, inapetência e emagrecimento1. Uma mulher de 30 anos, residente em Belo Horizonte, é internada com quadro de anorexia, inapetência e emagrecimento acentuado, com 45 dias de evolução. No exame físico inicial, foram observados febre, palidez cutâneo-mucosa eacentuado, com 45 dias de evolução. No exame físico inicial, foram observados febre, palidez cutâneo-mucosa e hepatoesplenomegalia não dolorosa. Os exames laboratoriais evidenciam anemia e leucopenia; dosagens de albumina =hepatoesplenomegalia não dolorosa. Os exames laboratoriais evidenciam anemia e leucopenia; dosagens de albumina = 2,2g/dL (valor de referência: 3,8 a 5,4g/dL) e de globulina = 6,4g/dL. Com relação a este quadro, é correto afirmar que:2,2g/dL (valor de referência: 3,8 a 5,4g/dL) e de globulina = 6,4g/dL. Com relação a este quadro, é correto afirmar que: a) o exame com a maior probabilidade para confirmação do diagnóstico para o caso é o aspirado para pesquisa de Leishmania b) por se tratar de paciente febril, com comprometimento do estado geral, está indicada coleta de hemoculturas e início imediato de terapia empírica com antibiótico, até resultado de exames c) está indicado solicitar sorologia para HIV e iniciar, imediatamente, a terapia antirretroviral devido à gravidade do caso d) trata-se de quadro de febre de origem indeterminada, cuja etiologia, provavelmente, não é infecciosa, devido ao tempo prolongado de evolução Resposta no final do capítulo 3. Esquistossomose3. Esquistossomose A - IntroduçãoA - Introdução Esta doença poderia estar no capítulo de parasitoses, pois se assemelha muito a outras verminoses, inclusive caracterizada como uma das que têm ciclo pulmonar, causando pneumonite eosinofílica. Entretanto, foi mais uma doença aqui englobada pela sua característica importante de hepatoesplenomegalia, tentando facilitar os diagnósticos diferenciais. A Organização Mundial da Saúde considera a doença uma “doença negligenciada”, que é o grupo de doenças que atingem apenas países subdesenvolvidos e, por conta disso, há poucos esforços dos países ricos em desenvolver novos tratamentos e vacinas. A esquistossomose é causada por um platelminto, e na América Latina e na África a espécie Schistosoma mansoni responde pelas infecções. Em outros lugares do mundo existem outras espécies de Schistosoma que causam infecção, inclusive urinária (não presente no Brasil). No caso do S. mansoni, a apresentação da doença é hepática e esplênica. Pela prevalência no Brasil, abordaremos apenas o S. mansoni. PERGUNTAPERGUNTA Figura 7 - Espécies de Schistosoma mansoni: (A) a fêmea é mais fina do que (B) o macho A esquistossomose afeta 200 milhões de pessoas no mundo e se alastra principalmente nos países mais pobres, segundo a Organização Mundial da Saúde. Figura 8 - Apesar de apresentar menor incidência do que na África, no Brasil a esquistossomose é endêmica em alguns estados do Nordeste. Na América Central e na Ásia, também existem áreas de prevalência e endemicidade Estima-se em 5% a porção da população brasileira contaminada com esquistossomose. A doença leva a quadros hepatoesplênicos em formas graves, motivo pelo qual entrou neste capítulo. Os estados brasileiros com maior incidência são os do Nordeste (onde há maior mortalidade) e os do Sudeste, especialmente Minas Gerais. Figura 9 - Mapa da esquistossomose no Brasil: notar que há áreas com alta prevalência (>5%), do estado de São Paulo até o Pará, com seguimento maior em toda a área do litoral brasileiro desde o Sudeste Para ocorrer a infecção pela esquistossomose no homem, é necessário um hospedeiro intermediário. Nesse caso, é o caramujo do gênero Biomphalaria, que normalmente vive em lagoas de água parada, conhecidas como “lagoa de coceira”. Figura 10 - Caramujo do gênero Biomphalaria: diversas espécies desse gênero são hospedeiras do S. mansoni, mas uma das mais prevalentes por todo o Brasil é o B. glabrata DICADICA O caramujo do gênero Biomphalaria, que vive em lagoas de água parada, conhecidas como “lagoa de coceira”, é o hospedeiro intermediário do S. mansoni. B - Fisiopatologia e ciclo de transmissãoB - Fisiopatologia e ciclo de transmissão IMPORTANTEIMPORTANTE A transmissão da esquistossomose se dá pela penetração das cercárias pela pele, causando prurido e até edema e rubor local. Após caírem na circulação, chegam até os pulmões, podendo causar pneumonite eosinofílica. A esquistossomose inicia seu ciclo por meio da eliminação nas fezes de pessoas contaminadas por ovos de S. mansoni. Além de haver a presença de fezes, deve existir no local o caramujo do gênero Biomphalaria. A deposição de fezes leva à contaminação do ambiente com ovos de Schistosoma, e, normalmente, quando caem na água, liberam larvas móveis ciliadas denominadas miracídios, que penetram nos caramujos e os infectam. No caramujo, que é o hospedeiro intermediário, ocorre a transformação da larva em outro estágio, denominado cercária, que é liberada pelo caramujo e permanece livre no ambiente aquático. As cercárias penetram ativamente a pele humana porque apresentam sensores de temperatura. Geralmente, ocorre reação alérgica no local da penetração do parasita, gerando muito prurido, e por isso há o nome de “lagoas de coceira”. Podem ocorrer edema e rubor local. Após penetrar a pele, as larvas caem na circulação e são levadas aos pulmões, onde é possível surgir uma pneumonite eosinofílica, a exemplo de outras verminoses que podem causar síndrome de Löeffler (Necator, Ancylostoma, Strongyloides e Ascaris). Essas formas amadurecem nos pulmões, transformando-se em vermes adultos, que depois atingem a circulação portal. Na veia porta, os vermes adultos se instalam, migrando depois para o plexo hemorroidário para a deposição dos ovos. Uma parte destes atravessa o endotélio vascular, submucosa e mucosa, caindo na luz intestinal, para ser eliminada com as fezes. Alguns ovos ficam retidos na parede, enquanto outros voltam para o fígado. Os ovos são as causas principais de lesão no hospedeiro, pois desencadeiam reação inflamatória crônica granulomatosa, que no fígado é reparada por fibrose. O granuloma da esquistossomose causa uma resposta esperada (Th2), levando à produção de IL-4 (aumento da produção de IgE) e IL-5 (eosinofilia). Isso leva a diversos problemas dependendo do local onde estão os ovos que, ao morrerem com a fibrose, desencadeiam lesões graves. Por isso, a hipertensão portal e a diarreia na colite são exemplos de problemas desencadeados. Nas formas pulmonares, há granulomas nos septos alveolocapilares, gerando hipertensão pulmonar. Figura 11 - Ciclo da esquistossomose Fonte: Centers for Disease Control and Prevention. C - Quadro clínicoC - Quadro clínico IMPORTANTEIMPORTANTE As manifestações clínicas na fase aguda da esquistossomose são: febre, diarreia e tosse seca, além de dermatite cercariana e pneumonite intersticial eosinofílica. Na fase crônica, as principais manifestações são hepatoesplenomegalia associada muitas vezes à ascite. As manifestações clínicas da esquistossomose podem ser dividas em 2 momentos: a fase inicial ou aguda e a fase crônica. O quadro clínico da fase aguda muitas vezes só é vistoem áreas endêmicas, pois são resultantes do 1º contato com o parasita. Este quadro agudo aparece entre 30 e 40 dias após o contato com água contaminada pelos caramujos infectados. Os principais sintomas são febre, diarreia e tosse seca de instalação súbita. Quando ocorrem outros sintomas, alterações do sistema nervoso central e hepatoesplenomegalia são os mais comuns, mas estes regridem após a resolução desta fase. A fase aguda raramente é fatal, normalmente é autolimitada e, muitas vezes, oligossintomática. A febre aparece principalmente no momento em que os vermes se instalam no mesentério, já na fase adulta. Isso ocorre entre 4 e 8 semanas após a entrada inicial das larvas. DICADICA A febre da esquistossomose no momento da instalação dos vermes no mesentério é conhecida como febre de Katayama. a) Fase agudaa) Fase aguda As principais manifestações visíveis são: - Dermatite cercariana:- Dermatite cercariana: ocorre no local da penetração do verme. Geralmente apresenta edema, eritema e prurido, todos resultantes da reação de hipersensibilidade; Figura 12 - Lesões em pele causadas pela penetração das cercárias. As reações podem ser leves, moderadas ou graves, com eritema e prurido intensos, e são mediadas por resposta imune por IgE. Pode ser necessário o uso de anti-histamínicos Figura 13 - Lesões na pele, causadas por penetração das cercárias. Muitas vezes as lesões de pele são confundidas com outros tipos de eritemas, como picadas de insetos. O que confirma o diagnóstico é a observação no momento da entrada do verme, ainda durante o banho na “lagoa de coceira” (relatado pelo paciente como prurido intenso) - Pneumonite intersticial eosinofílica:- Pneumonite intersticial eosinofílica: geralmente ocorre tosse e broncoespasmo, por conta do ciclo pulmonar do verme. Raramente é fatal, mas causa desconforto importante. Figura 14 - Pneumonia eosinofílica: entre pacientes com esquistossomose em casos graves de áreas endêmicas, a doença deve entrar no diagnóstico diferencial e faz parte das doenças causadoras da síndrome de Löeffler b) Fase crônicab) Fase crônica Muitas vezes esta forma é assintomática. Entretanto, pela gravidade das lesões, quando ocorrem, devem ser identificadas e tratadas adequadamente. A fase crônica é dividida em tipos de apresentações da esquistossomose: Tabela 9 - Tipos de apresentações da esquistossomose Forma intestinalForma intestinal Há restrição do quadro a sintomas intestinais, sendo que a maioria dos pacientes (85% dos casos) apresenta estaforma. Ocorre diarreia, que pode estar associada a cólicas, por conta da deposição dos ovos na mucosa intestinal. Forma hepatointestinalForma hepatointestinal Na circulação hepática, os ovos impactam o espaço pré-sinusoidal, levando à formação de granulomas e fibrose,que dificultam o fluxo portal. Sua principal característica é a hepatomegalia. Forma hepatoesplênicaForma hepatoesplênica Pode haver hipertensão portal ou não. Quando não existe hipertensão portal, ao tratar a doença a esplenomegalia cede (diminui o estímulo imunológico). Caso contrário, são frequentes a circulação colateral e as varizes de esôfago e de fundos gástrico e intestinal. A hipertensão portal é intra-hepática pré-sinusoidal. A ascite é um evento tardio exatamente pela hipertensão portal ser pré-sinusoidal. Entretanto, nesse perfil de paciente, a esplenomegalia é muito importante e normalmente não cede com tratamento. Figura 15 - Ascite + circulação colateral. São muito presentes na fase crônica em pacientes com a forma hepatoesplênica e justificam o nome popular da doença como “barriga d’água”. Normalmente há morte por sangramento, principalmente pelas varizes de esôfago e estômago DICADICA Na forma hepatoesplênica com hipertensão portal da esquistossomose, é comum a presença de ascite e varizes de esôfago que fazem aumentar as chances de sangramento. Tabela 10 - Complicações SangramentoSangramento Normalmente, 70% do suprimento normal sanguíneo dos hepatócitos são feitos pela veia porta e 30% pela artéria hepática. Quando existe a esquistossomose com forma crônica, o fluxo torna-se ao contrário, causando o que se chama de arterialização do fígado (inversão com proliferação da artéria hepática para cobrir a deficiência da veia porta). Insuficiência hepáticaInsuficiência hepática Ocorre devido à necrose hepática, quando há muito sangramento. Infecções secundáriasInfecções secundárias O verme pode carregar em seu intestino bactérias Gram negativas enterofermentadoras, especialmente E. coli e Salmonella. Ao fazer o ciclo pulmonar, pode haver bacteriemias subsequentes, com febre de origem indeterminada, eosinofilia e leucocitose. GlomerulopatiasGlomerulopatias Pode ocorrer dano renal, principalmente quando da forma hepatoesplênica. Pode haver glomerulonefritemembranoproliferativa. Esquistossomose noEsquistossomose no sistema nervoso centralsistema nervoso central Grave e geralmente fatal se presente grande quantidade de ovos. A neuroesquistossomose não acomete apenas o sistema nervoso central, mas também pode atingir a medula, levando à inflamação grave do canal medular (mielite). D - DiagnósticoD - Diagnóstico DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO O diagnóstico da esquistossomose consiste em achar o parasita, porém, na fase aguda, há eosinofilia importante, e na fase crônica há pancitopenia, associada a hiperesplenismo. O padrão-ouro para o diagnóstico consiste em achar o verme. Porém, em algumas situações, como na fase aguda, outras metodologias podem ser realizadas. a) Exames inespecíficosa) Exames inespecíficos - Hemograma:- Hemograma: · Na fase aguda:Na fase aguda: eosinofilia importante (até 80% de eosinófilos); · Na fase crônica:Na fase crônica: pancitopenia (principalmente pelo hiperesplenismo). - Exames de imagem:- Exames de imagem: · Tomografia mostra hepatoesplenomegalia; · Endoscopia digestiva alta confirma varizes de esôfago e estômago; · Ultrassonografia mostra hipertensão portal. Figura 16 - A hepatoesplenomegalia só está presente em algumas fases crônicas, mas, como é bastante típica nas formas crônicas principais, deve sempre entrar no diagnóstico diferencial de hepatoesplenomegalias b) Exames específicosb) Exames específicos - Reação imunológica:- Reação imunológica: sorologia para esquistossomose, ELISA ou imunofluorescência. Pode ser usada na fase aguda do diagnóstico, mas deve- se ter muito cuidado, pois pacientes em áreas endêmicas podem ter a sorologia sem doença em atividade; - PPF (parasitológico de fezes):- PPF (parasitológico de fezes): pesquisa de ovos pesados nas fezes – Kato-Katz; - Biópsia retal:- Biópsia retal: pode ser feita como alternativa a PPF sem resultados positivos. É feita uma retossigmoidoscopia com biópsia do reto, onde os ovos ficam depositados mais frequentemente. E - TratamentoE - Tratamento O tratamento é feito com medidas para o controle dos sintomas na fase aguda e uso de antiparasitários específicos na fase crônica. São o praziquantel e a oxamniquina. TRATAMENTOTRATAMENTO O tratamento da esquistossomose é feito com praziquantel 50mg/kg de peso para adultos e 60mg/kg de peso para crianças, em dose única, ou com oxamniquina 15mg/kg (em adultos), em dose única. A discussão do tratamento gira em torno do diagnóstico e pode ser dividida em tratamento específico e tratamento de sintomas. Geralmente os sintomas são tratados de acordo com a fase da doença. O tratamento compreende desde anti-histamínicos para fase aguda até medicamentos para controle de ascite, cirrose e varizes de esôfago, como todo hepatopata deve ter. É importante lembrar que o tratamento da verminose não melhora completamente os sintomas de uma fibrose grave, apenas impede que novos danos sejam causados. Tabela 11 - Tipos de tratamento nas fases aguda e crônica Tratamento de sintomas*Tratamento de sintomas* Fase agudaFase aguda - Dermatite cercariana: anti-histamínicos. Exemplo:hidroxizina 25mg VO 8/8h; - Dermatite cercariana: se infecção secundária, utilizar cefalexina 1g IV 6/6h; - Dermatite cercariana: hidrocortisona creme 1% tópico em casos graves. Fase crônicaFase crônica - Varizes de esôfago: propranolol 20mg 12/12h; - Varizes de esôfago: omeprazol 40mg 12/12h; - Ascite: espironolactona 100mg VO 1x/d e/ou furosemida 40mg VO 1 ou 2x/d. Tratamento específico**Tratamento específico** Fases aguda e crônicaFases aguda e crônica - Oxamniquina: 15mg/kg (adultos) a 20mg/kg (crianças) em dose única. Específica para S. mansoni; - Praziquantel: 50mg/kg de peso para adultos e 60mg/kg de peso para crianças, em dose única. Cura em até 90% dos pacientes e trata outras espécies de Schistosoma. * O uso de prednisona é importante em fase aguda para diminuir os efeitos inflamatórios. ** Se suspeita de sepse por enterobactérias associadas, associa-se tratamento com antibióticos para Gram negativos. No tratamento de esquistossomose aguda grave, a prednisona é iniciada na dose de 1mg/kg de peso/d. O paciente recebe o esquistossomicida (oxamniquina ou praziquantel) 24 a 48 horas depois. Na semana seguinte, a dose de corticosteroides é reduzida para 0,5mg/kg de peso/d e para 0,25mg/kg de peso na 3ª semana. O praziquantel não tem doses de segurança para crianças abaixo de 4 anos, não sendo recomendado seu uso em menores de 2 anos. É classe B do Food and Drug Administration (FDA) para gestação, o que indica que não deve ser usado habitualmente em gestantes e nem durante a amamentação (no dia do tratamento e nas 72 horas subsequentes, a mãe não deve amamentar). A oxamniquina deve ser usada com cautela em pacientes com convulsões prévias (pode causar crises) e deve ser evitada em gestantes e na amamentação, pois não existem estudos de segurança (classe C do FDA). Pode ser realizado, ainda, tratamento cirúrgico da hipertensão portal como maneira de controlar as formas graves. A esplenectomia pode ser empregada em casos sem regressão devido ao tratamento, melhorando o hiperesplenismo secundário. IMPORTANTEIMPORTANTE O tratamento do parasita da esquistossomose não elimina os sintomas de hipertensão portal caso estes já estejam presentes, apenas impede a evolução de doença pelo parasita. Os tratamentos dos sintomas devem ser mantidos. F - ProfilaxiaF - Profilaxia A principal profilaxia diz respeito ao cuidado com águas em que haja a presença do caramujo. Sua erradicação pode ser difícil, mas é uma boa medida de prevenção. Em situações onde haja a ineficiência de medidas de controle do hospedeiro intermediário, o ato simples de não entrar em águas que sejam ricas no caramujo (e consequentemente no parasita) é uma boa medida de prevenção. O desenvolvimento de uma vacina para esquistossomose foi alvo de grande euforia, tendo sido realizado pelo Instituto Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. A vacina foi criada com a utilização da proteína Sm14, obtida do Schistosoma mansoni. Desde 2011 há testes em humanos, com ótimos resultados e previsão de lançamento comercial nos próximos anos. 2014 - UFRN PERGUNTAPERGUNTA 2. Uma criança de 3 anos, procedente da região do Seridó, deu entrada no ambulatório com ascite, hepatomegalia e dor2. Uma criança de 3 anos, procedente da região do Seridó, deu entrada no ambulatório com ascite, hepatomegalia e dor abdominal. A mãe informa que a criança tem contato com animais domésticos e raramente toma banho de rio. Os examesabdominal. A mãe informa que a criança tem contato com animais domésticos e raramente toma banho de rio. Os exames apresentados mostraram os seguintes resultados: anemia, eosinofilia no sangue e líquido ascítico e hipergamaglobulinemiaapresentados mostraram os seguintes resultados: anemia, eosinofilia no sangue e líquido ascítico e hipergamaglobulinemia policlonal. A hipótese diagnóstica mais plausível é:policlonal. A hipótese diagnóstica mais plausível é: a) toxocaríase b) ancilostomíase c) tricocefalíase d) esquistossomose na forma hepatoesplênica Resposta no final do capítulo RESUMORESUMO QUADRO-RESUMOQUADRO-RESUMO Leishmaniose visceralLeishmaniose visceral Epidemiologia e fisiopatologia - L. chagasi, L. infatum e L. donovani são os causadores mais frequentes; - Mosquito Lutzomyia longipalpis (mosquito-palha) é o vetor; - 2 estágios: infectante (promastigotas) e estágio no ser humano (amastigotas, que invadem os tecidos); - Motivo para evolução da doença (relacionado à resposta Th1). Se o predomínio for Th2, será evolução típica da doença. Clínica - Fase inicial (aguda): febre, diarreia e dor abdominal;- Fase de estado (crônica): hepatoesplenomegalia, emagrecimento, nefrite intersticial. Diagnóstico - Padrão-ouro: encontrar amastigotas na medula (fazer mielograma sempre); - Inespecífico: pancitopenia periférica; - Reação de Montenegro: funciona para leishmaniose tegumentar, mas na visceral é negativa (resposta imunológica baseada em Th2); - PCR (reação em cadeia da polimerase): sangue, medula ou baço; - Sorologia (pouco valor em áreas endêmicas pois dará positiva, sem indicar doença). Tratamento - Glucantime® (antimonial pentavalente): droga de 1ª escolha; - Indicação do uso de anfotericina: extremos de idade, gestantes, pacientes grave, pacientes que falharam com Glucantime®; - Pentamidina: 3ª opção, pouco utilizada. Critérios de cura Melhora da hepatoesplenomegalia, cessação da febre, melhora da pancitopenia EsquistossomoseEsquistossomose Epidemiologia e fisiopatologia - Agente etiológico: S. mansoni; - Hospedeiro intermediário: caramujo do gênero Biomphalaria (só existe doença onde existe o hospedeiro intermediário); - Epidemiologia: casos presentes principalmente no Nordeste do Brasil, mas descrições de casos do Paraná até o Pará; - Penetração das cercarias na pele em regiões de lagoas ou açudes ricos no caramujo: “lagoas de coceira”. Quadro clínico - Fase aguda: dermatite cercariana, pneumonite intersticial eosinofílica; ocorre febre e diarreia também; - Fase crônica: ocorrem hepatoesplenomegalia e ascite. Pode haver hipertensão portal; - Dividida em 3 formas de doença: intestinal (na maioria dos casos, ocorre apenas cólicas e diarreia); hepatomegálica: ocorre apenas hepatomegalia; hepatoesplenomegálica: também ocorre aumento do baço e hipertensão portal pode estar presente, inclusive com varizes de esôfago. Diagnóstico - Padrão-ouro: encontrar o parasita; - Inespecífico: hemograma com eosinofilia na fase aguda e pancitopenia na fase crônica; - PPF: Kato Katz (pesquisa de ovos pesados nas fezes); - Biópsia retal (local onde o parasita se fixa); - Sorologia: pode vir positiva em pacientes sem doença moradores de áreas endêmicas. Tratamento - Específico: praziquantel (não usar em crianças abaixo de 2 anos) ou oxamniquina. Ambos em dose única; - Tratamento inespecífico: · Fase aguda: anti-histamínicos para lesões de pele; · Fase crônica: medidas para hipertensão portal em pacientes com esta alteração. - Tratamento dos sintomas. Respostas das questões do capítuloRespostas das questões do capítulo 1. A 2. A 0303 Endocardite infecciosa Durval A. G. Costa A Endocardite Infecciosa (EI) é uma infecção causada, principalmente, pela bactéria Streptococcus viridans, que causa endocardite subaguda, e logo em seguida a bactéria mais prevalente é o S. aureus, que causa endocardite aguda. O acometimento é das valvas cardíacas ou mesmo da parede do endocárdio, podendo-se formar vegetações que liberam êmbolos para outras regiões do corpo. Os principais sintomas incluem febre, sopro cardíaco, calafrios e sudorese, sendo necessário avaliar os critérios de Duke (presença de 2 critérios maiores, 1 maior + 3 menores ou 5 menores) para fechar o diagnóstico. O tratamento pode ser empírico, com base nos agentes etiológicos mais frequentes, em função do tempo de evolução do quadro. Logo, se agudo, cobrir S. aureus e, se subagudo, pensar no S. viridans e nos enterococos.1. Introdução1. Introdução A Endocardite Infecciosa (EI) é uma séria infecção que acomete partes do endocárdio do coração. Deve ser lembrado que não há necessidade de acometimento específico de valvas cardíacas. Desta maneira, uma lesão vegetativa na parede interna do átrio ou na cordoalha tendínea, causada por bactérias, também é definida como EI. Figura 1 - Visão esquemática do coração, com cavidades e lesão esquematizando endocardite: lembrando que a lesão não precisa estar na valva cardíaca, mas em qualquer parte do endocárdio para ser chamada de endocardite As EIs são classificadas de diversas maneiras. Podem ser por tipo de bactéria (se perfil típico de infecção no endocárdio, por exemplo), por evolução (se aguda ou subaguda), por perfil de pacientes (com predisposição valvar ou situações que favoreçam o aparecimento, como uso de drogas injetáveis ou de cateter venoso central por longos períodos) e ainda por tipo de valva (natural ou protética). Podem ainda ser classificadas pelo lado do coração atingido. A endocardite à esquerda (valvas mitral e/ou aórtica) ocorre, mais comumente, em indivíduos com valvopatia prévia. Procedimentos odontológicos e bacteriemia oriunda de focos distantes de infecção são fontes frequentes de semeadura, enquanto a manipulação do trato gastrintestinal ou geniturinário são causas menos comuns. A endocardite à direita, envolvendo as valvas tricúspide e/ou pulmonar, é mais comum entre usuários de drogas parenterais e portadores de cateteres vasculares. A classificação mais utilizada é a do tempo de evolução (aguda ou subaguda). Tabela 1 - Classificação das endocardites infecciosas Por evoluçãoPor evolução Por tipo de valvaPor tipo de valva Pelas câmaras cardíacasPelas câmaras cardíacas Aguda Natural Direita (usuários de drogas intravenosas – UDIVs –, cateteres vasculares) Subaguda Protética Esquerda Entretanto, a classificação mais importante a ser guardada é a que diz respeito ao perfil de evolução (em tempo e agressividade). Tabela 2 - Classificação mais utilizada ClassificaçõesClassificações CaracterísticasCaracterísticas Aguda - Comprometimento importante do local atingido (o que a torna uma doença grave); - Agressiva, com manifestações clínicas importantes em pouco tempo; - Febre alta; - Rápida em tempo: evolução em dias ou em até 6 semanas; - Comum, por exemplo, em ambientes hospitalares, para pacientes internados; - Staphylococcus aureus como o agente mais prevalente; - Mortalidade alta. Subaguda - Comprometimento não tão agressivo, demorando muito para causar lesão com destruição; - Febre baixa e persistente; - Manifestações clínicas lentas e graduais; - Evolução de semanas (mais de 6 semanas) a meses; - Streptococcus viridans e Enterococcus spp. como os agentes mais comuns, embora ainda possa ser causada por Staphylococcus coagulase-negativo e qualquer outro Gram negativo. DICADICA A classificação mais importante da EI é aquela que leva em conta o perfil de evolução: aguda (mais agressiva) e subaguda (menos agressiva e com manifestações clínicas lentas e graduais). - Fatores de risco- Fatores de risco Os fatores de risco podem ser relacionados ao paciente ou a comorbidades e estão resumidos na Tabela a seguir: Tabela 3 - Fatores de risco para endocardite infecciosa Relacionados ao pacienteRelacionados ao paciente - Idade >60 anos; - Sexo masculino; - Uso de drogas injetáveis; - Infecção dentária ou dentes em mal estado. Relacionados a comorbidadesRelacionados a comorbidades - Doença cardíaca estrutural; - Doença vascular; - Doença cardíaca congênita; - Valva protética; - História prévia de endocardite; - Presença de dispositivo intravascular; - Hemodiálise; - Infecção pelo HIV. 2. Importância do agente etiológico2. Importância do agente etiológico DICADICA O Streptococcus, bactéria classificada como do grupo viridans, é a causadora mais frequente de EI. Apesar de poder ser causada por bactérias Gram negativas, a endocardite é, essencialmente, uma infecção de Gram positivos, especialmente cocos Gram positivos. Eventualmente pode ser causada por fungos, e quando isso acontece a Candida spp. é o fungo mais prevalente. Exatamente pela prevalência de Gram positivos ser importante é que o tratamento empírico é feito com base nessas bactérias, além do perfil do paciente (fatores de risco) e do lado do coração atingido, conforme será discutido. Entre os Gram positivos, a 1ª bactéria a ser apresentada é o Streptococcus, classificada como do grupo viridans. Essa bactéria é a mais frequente causadora de endocardite na comunidade, com predileção pela faixa etária entre 16 e 60 anos. É um Streptococcus alfa-hemolítico e pode ter 4 representantes: S. sanguis, S. mutans, S. mitior e S. intermedius. O S. bovis (atualmente chamado de S. gallolyticus) é um Streptococcus não viridans que também causa endocardites subagudas como o grupo viridans. Pertence ao grupo D de Lancefield e está presente na luz do intestino humano, associado a diverticulose e procedimentos intestinais, como causa de bacteriemia. No paciente que tem endocardite por S. bovis deve ser investigado tumor de cólon, pois pode ocorrer em lesão ulcerada por este tumor (deve ser feita colonoscopia nestes casos). O Streptococcus pneumoniae eventualmente pode causar EI aguda, sendo mais prevalente em pacientes alcoólatras. A evolução é progressiva e grave, com acometimento preferencial da válvula aórtica culminando com dano valvar severo e complicações embólicas. A tríade composta por endocardite + pneumonia + meningite recebe o nome de síndrome de Austrian. Tabela 4 - Classificação de bactérias – grupos de Lancefield GruposGrupos Principais agentesPrincipais agentes Doenças principaisDoenças principais Grupo A Streptococcus pyogenes Faringite, escarlatina Grupo B Streptococcus agalactiae Meningite no recém-nascido Grupo C Streptococcus pneumoniae Pneumonia Grupo D Streptococcus do grupo viridans Endocardite Streptococcus bovis Ainda falando das bactérias mais comuns causadoras de endocardite, o Enterococcus também está presente na luz intestinal, sendo relacionado aos mesmos fatores do S. bovis, mas são mais lembrados por manipulação urinária como causa de sua bacteriemia. São causadores também de endocardite subaguda, e os mais prevalentes são o E. faecium e o E. faecalis. Principal causador de endocardite aguda, o Staphylococcus aureus tem um perfil de prevalência em usuários de drogas, mas pode vir da própria pele ou da mucosa nasal e causar a lesão. Geralmente, no usuário, a endocardite é da valva direita, como tricúspide, o que facilita o direcionamento da bactéria mais comum. Infecções de pele extensas, como erisipelas e celulites inflamatórias, também podem ser causas. Entre pacientes internados, pode haver relação com cateteres venosos centrais, mas nesse caso tem dividido a autoria das endocardites hospitalares com fungos, bactérias Gram negativas e ainda os Staphylococcus coagulase-negativos (como S. epidermidis, S. hominis ou S. saprophyticus). Os coagulase- negativos geralmente são contaminantes de pele, mas, em pacientes com imunodepressão por longos períodos de internação, podem ser causadores de infecção. IMPORTANTEIMPORTANTE No geral, independente da idade, a EI mais frequente é aquela por Streptococcus, que causa endocardite subaguda. Logo em seguida, a bactéria mais prevalente é o S. aureus, que causa endocardite aguda. Algumas bactérias são muito difíceis de diagnosticar na EI subaguda e se tornaram famosas exatamente por isso. Trata-se do grupo HACEK – Haemophilus spp., Actinobacillus spp., Cardiobacterium hominis, Eikenella spp. e Kingella spp. Têm em comum serem Gram negativos (1º ponto raro em uma endocardite), terem crescimento lento (causam endocardite subaguda), não crescerem facilmente nos frascos de hemoculturas (solicitar para o laboratório deixar por pelo menos 15 diasno aparelho para tentar facilitar seu crescimento, em vez dos 5 dias habituais de uma cultura) e estarem presentes na orofaringe normalmente. Existem bactérias mais raras ainda, em que não se conseguirá fazer diagnóstico apenas com hemoculturas e se necessitará de sorologias. É o caso da febre Q (causada pela Coxiella burnetii), da brucelose, da bartonelose etc. (Tabela 5). DICADICA O grupo HACEK é composto por Haemophilus spp., Actinobacillus spp., Cardiobacterium hominis, Eikenella spp. e Kingella spp. Tentando facilitar o entendimento e associar causas a fatores, serão apresentadas em seguida 3 Tabelas diferentes para reforçar os pontos mais importantes dos agentes causadores. A 1ª mostra as bactérias divididas por faixa de idade para acometimento. Tabela 5 - Agentes causadores Agentes causadoresAgentes causadores IdadesIdades <2 meses<2 meses 2 meses a 1 ano2 meses a 1 ano >1 a 16 anos>1 a 16 anos 16 a 60 anos16 a 60 anos >60 anos>60 anos Streptococcus 1 7 a 10 30 a 33 45 a 65* 30 a 45 S. aureus 20 a 24 10 a 15 15 a 20 30 a 40* 25 a 30 Staphylococcus coagulase-negativos 30 a 35* 30 a 35* 10 a 12 4 a 8 3 a 5 Enterococcus 5 a 10 10 a 15 8 a 12 5 a 8 14 a 17* Bacilos Gram negativos 10 a 15* 2 a 4 4 a 7 4 a 10 5 Fungos 5 a 10 10 a 15* 1 1 a 3 1 a 2 HACEK e cultura negativos 3 a 7 3 a 7 3 a 8 3 a 10* 5 Difteroides 5 a 7 2 a 5 2 a 3 <1 <1 Polimicrobiano 2 a 4 4 a 7 3 a 7 1 a 2 1 a 3 Observação: a sequência dos agentes causadores representa do mais prevalente até o menos prevalente. * Frequência mais comum. A Tabela 6 representa as situações que devem ser consideradas para tentar definir o agente causador mais comum. Isso se torna importante no momento em que é preciso tratar uma endocardite em um paciente com cultura negativa, mas com alguma destas situações: Tabela 6 - Situações consideradas para o diagnóstico OrganismosOrganismos Histórias clínicasHistórias clínicas Staphylococcus aureus UDIVs/cateteres intravenosos Staphylococcus coagulase- negativo Angiografia/hemodiálise/UDIVs Streptococcus viridans Tratamento dental/higiene oral precária Streptococcus bovis Neoplasias gastrintestinais/pacientes idosos HACEK Tratamento dentário/infecção do trato respiratório/UDIVs Fungos Próteses valvares/UDIVs/imunossuprimidos/cateteres intravenosos de longa permanência Enterococcus sp. Inserção de cateteres urinários/neoplasias gastrintestinais/inserção ou retirada de dispositivo intrauterino Brucella sp. Áreas endêmicas/consumo de leite contaminado/contato com animais infectados Coxiella burnetii (febre Q) Trabalhadores de fazendas/exposição a roedores domésticos/consumo de leite cru/valvulopatiaprévia/área endêmica Bartonella sp. Desabrigados/alcoolismo/exposição a gatos Legionella sp. Usualmente em surtos/instituições/valvas protéticas/pneumonia Chlamydia sp. Pneumonia O quadro reforça a necessidade de uma boa história clínica na investigação de uma EI, já que algumas dessas condições só seriam relatadas pelo paciente se fossem perguntadas pelo médico. A Tabela 7 relaciona os causadores mais comuns com as condições de valva e a situação clínica. Foi colocado dessa maneira por conta do tratamento, que pode ser levado em consideração pelo tipo de valva e perfil do paciente. Tabela 7 - Agentes causadores esperados para tipos de endocardite Perfis da endocarditePerfis da endocardite Agentes causadores esperadosAgentes causadores esperados Endocardite subaguda de valva nativa, em não usuário de drogas - Streptococcus grupo viridans (mais frequente); - Enterococcus spp.; - Streptococcus bovis; - Grupo HACEK. Endocardite aguda de valva nativa, em não usuário de drogas - Staphylococcus aureus (mais frequente); - Streptococcus pneumoniae. Endocardite aguda de valva nativa, em usuário de drogas - Staphylococcus aureus (mais frequente); - Bactérias enterofermentadoras (Klebsiella, Enterobacter, Serratia) e outros Gram negativos habitantes intestinais: Salmonella; - Pseudomonas aeruginosa (aliás, entre os Gram negativos, é a mais prevalente); - Candida spp. Endocardite em valva protética - Até 1 ano da troca valvar: Staphylococcus epidermidis (ou outros coagulase-negativos) é o mais frequente. Candida spp., S. aureus e Gram negativos também podem acometer; - Após 1 ano da troca valvar: mesmas bactérias da subaguda na valva nativa. - Staphylococcus aureus (mais frequente); Endocardite nosocomial - Enterococcus spp.; - Staphylococcus epidermidis. 3. Fisiopatologia e quadro clínico3. Fisiopatologia e quadro clínico A endocardite ocorre pela associação de fatores. O principal motivo que leva à lesão valvar é uma mudança no fluxo de sangue que passa nas câmaras cardíacas. Quando ocorre turbilhonamento do sangue, a tendência é haver lesão valvar pela força do sangue na parede ou valva. A lesão na valva (ou na parede) causada pela mudança no fluxo leva à deposição de fibrina no local. Tal lesão facilita a agregação de bactérias que, eventualmente, estejam na corrente sanguínea. A associação de bactéria e fibrina piora o fluxo sanguíneo, mudando mais ainda seu aspecto, de laminar para turbilhonado, o que leva a novas lesões. Estas acumulam mais fibrina, aumentando mais seu tamanho, que ganha aspecto vegetante. A lesão pode crescer tanto que se torna séssil, desprendendo-se e causando êmbolos a distância. DICADICA A EI ocorre devido a lesão endotelial seguida do depósito de plaquetas e fibrina. Durante episódios de bacteriemia, alguns micro=organismos são capazes de se aderir, colonizar e multiplicar no interior desde tampão, facilitando a deposição de mais plaquetas e fibrina sobre a vegetação que pode fragmentar-se, levando à embolização sistêmica. Diversos fatores levam ao turbilhonamento, mas o mais comum é a ineficácia de fechamento de uma valva cardíaca, como no prolapso da valva ou numa valva metálica. As condições que favorecem a lesão endocárdica são exatamente as que vão indicar profilaxia dependendo do procedimento, conforme será discutido no final do capítulo (indicações de profilaxia). A endocardite causa múltiplos pequenos sinais e sintomas, num quadro geralmente muito “florido”, mas nem sempre perceptível. Quando aguda, as lesões são mais agressivas, com danos mais críticos e, consequentemente, mais perceptíveis, como na lesão por Staphylococcus aureus. Quando subaguda, as lesões são lentas e com aparecimento gradual, como nas valvas metálicas. Entretanto, em todos os casos, os sintomas mais frequentes são febre, sopro cardíaco, calafrios e sudorese. Normalmente, existem outras características causadas por embolizações de trombos a distância ou por fenômenos imunológicos, com deslocamento de imunocomplexos. Os fenômenos imunológicos incluem glomerulonefrite, meningite asséptica, poliartralgia ou poliartrite, manchas de Roth (hemorragias retinianas) e manifestações cutâneas (nódulos de Osler, petéquias em mucosas e hemorragias “em lasca”). Figura 2 - Fisiopatologia: observar que a lesão endocárdica inicial não possui bactérias. A bacteriemia posterior é que faz a deposição no local da endocardite trombótica prévia, por isso a endocardite é sempre a soma de lesão valvar prévia com bacteriemia Este capítulo foi idealizado para discutir EI. Entretanto, lembre-se de que existem outras causas de endocardite, não infecciosa: - Por trombos não bacterianos: comum no câncer avançado; - Marântica: causada por processos secundários a neoplasias e desnutrição; - De Libman-Sacks: causada no lúpus eritematoso sistêmico. Tabela 8 - Manifestações comuns presentes e suas frequências ManifestaçõesManifestações Frequência (%)Frequência (%) Febre 80 a 90 Sopro cardíaco 80 a 85 Calafrios e sudorese 40 a 75 Esplenomegalia 15 a 50 Anorexia, fraqueza e perda de peso 25 a 50 Embolia arterial 20 a 50 Manifestações neurológicas 20 a 40 Novo sopro ou piora de sopro existente 10 a 40 Petéquias
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