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O Pensar Filosófico

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O PENSAR FILOSÓFICO
								Arnaldo Nogaro�
SUMÁRIO
1 COMO ESTUDAR FILOSOFIA? ......................................................... 02
2 POR QUÊ ESTUDAR FILOSOFIA? .................................................... 04
3 HABILIDADES DE PENSAMENTO ....................................................09
	3.1 HABILIDADES DE INVESTIGAÇÃO ....................................14
	3.2 HABILIDADES DE RACIOCÍNIO ..........................................15
	3.3 HABILIDADES DE FORMAÇÃO DE CONCEITOS ................16
	3.4 HABILIDADES DE TRADUÇÃO ...........................................16
4 QUAL O MÉTODO DA FILOSOFIA? ..................................................16
5 A FILOSOFIA NA SALA DE AULA.....................................................20
6 A FILOSOFIA E O LER........................................................................21
	6.1 LEITURA POR PRAZER ......................................................22 
	6.2 LEITURA CRÍTICA ..............................................................23
6.3 COMPETÊNCIAS A SEREM DESENVOLVIDAS NO ENSINO DE FILOSOFIA ...........................................................................26
1 COMO ESTUDAR FILOSOFIA?
						
	O texto que adentraremos agora é uma elaboração com o objetivo de auxiliar o estudante no entendimento do que é o conhecimento filosófico e como estudá-lo. Foi construído a partir e com base no pensamento de diferentes pensadores que se preocupam com a metodologia, a forma, como se estuda a filosofia. Procuramos apresentar estas orientações e esclarecimentos numa linguagem que permita o fácil entendimento do mesmo e que possa ser um instrumento que contribua para a melhor compreensão do que é e como se adquire o conhecimento filosófico.
	As palavras têm história e a história está grávida de significados. Quando exploramos os significados das palavras encontramos uma diversidade de sentidos que já foram utilizados pelas pessoas através dos tempos. O nome filosofia tem história e significado próprios, que vamos explorar e conhecer melhor. Não é verdade que a filosofia se constitui num saber reservado, difícil, complicado e inacessível ao homem, apresentando-se como uma especulação separada da vida. Ela é a consciência despertada no coração do ser humano. É seu olhar novo sobre o mundo. A atividade filosófica não consiste em justificar e legitimar o já sabido, mas em elaborar constantemente uma crítica do pensamento sobre ele mesmo. No mínimo, para buscarmos saber como e até onde poderíamos pensar de outra forma.
	Buzzi (2000) apresenta algumas orientações que auxiliam a iniciação no estudo da filosofia. Vamos a elas:
a) Esteja atento à experiência de como as coisas, fatos, fenômenos se apresentam, como são. Para filosofar é preciso deter-se na experiência, mergulhar no seu curso, acompanhá-la solidariamente, não permitir que a inteligência se distancie dessa primeira e mais imediata de todas as ações;
b) A experiência provoca a meditação. Esta não é fuga da realidade, mas atenção desperta à realidade, num nível tão secreto e tão profundo que nenhuma fala tosca ou polida aí tem acesso. Meditar é ruminar experiência. É uma espécie de ruminação espiritual, é um cogitar (refletir) as experiências no campo da vida.
c) A filosofia é também conquistada através do diálogo com os outros. Estabelecer um nível de conversa que provoca a reflexão, onde se é convocado a questionar a experiência, sem recorrer a fórmulas preestabelecidas. A conversa se torna então método de pesquisa da experiência. A fala é o espetáculo do humano. É poesia da vida, institui a comunidade, cria espaço onde os espíritos se encontram na comunhão do ser e do pensar.
d) Podemos ter acesso ao estudo da filosofia participando de uma aula na escola ou na academia. A dinâmica está no esforço em acompanhar o fio do pensamento, em ouvir o problema, em aprender a captar o essencial, em ver como surge a armadura ou sistema discursivo da palavra.
e) A filosofia é estudo solitário, individual, não significando fugir do mundo, isolar-se. É estar junto de si, aos outros ou às coisas, na assiduidade de cada diferença. A filosofia não é fuga. É mergulho na intimidade da situação. 
f) Chega-se à filosofia por meio da leitura. O específico da filosofia é revelar dimensões de profundidade da experiência humana. Se alguém quiser estudar filosofia escolherá para leitura livros apropriados para esse fim. 
	A filosofia é um saber. O que conduz o homem a produzir esse saber? A intenção primeira do ensino de filosofia não é formar filósofos, mas provocar a reflexão filosófica, inerente a todo ser humano. Vale lembrar aqui o que Gramsci (filósofo italiano) afirmou: somos todos filósofos na medida em que nos propomos questões de natureza filosófica. Estamos sempre dando sentido às coisas e, diante dos problemas apresentados pelo existir, tendemos para a reflexão. A filosofia é um modo de pensar que acompanha o ser humano na tarefa de compreender o mundo e agir sobre ele. “Pensar, pede audácia, pois refletir é transgredir a ordem do superficial que nos pressiona tanto. [...] pensar não é apenas a ameaça de enfrentar a alma no espelho: é sair para as varandas de si mesmo e olhar em torno, e quem sabe finalmente respirar.” (LUFT, 2004, p. 22).
	No estudo da filosofia o estudante encontrará livros que não falam de filosofia ex professo, (de maneira clara, explícita), mas que são altamente filosóficos e livros intitulados de filosofia que não alcançam comunicar a profundidade do pensar. Há também o aspecto subjetivo, isto é, a atitude do leitor. Poderíamos quiçá dizer que não existe objetivamente nenhum livro de filosofia, como se a filosofia estivesse depositada em páginas e bastasse lê-las para conquistá-la. A filosofia surge não tanto porque se lê algum livro que é considerado de filosofia, mas sim da maneira como se lê o livro.
A filosofia tem por objeto de reflexão os sentidos, os significados e os valores que dimensionam e norteiam a vida e a prática histórica humana. Nenhum indivíduo, nenhum povo, nenhum momento histórico vive e sobrevive sem um conjunto de valores que significam à sua forma de existência e sua ação. Não há como viver sem se perguntar pelo seu sentido; assim como não há como praticar qualquer ação, sem que se tenha que perguntar pelo seu sentido próprio, pela sua finalidade. (LUCKESI, 2000, p. 87).
	A filosofia é uma forma coerente e crítica de pensar o mundo, produzindo um entendimento de seu significado, formulando, dessa forma, uma concepção geral desse mundo, uma cosmovisão da qual decorre uma forma de agir. “[...] a filosofia nunca é acabada e só interessa aos que aceitarem começar sempre de novo o esforço de compreensão de si mesmos e da totalidade inesgotável da realidade.” (PERINE, 2007, p. 111). A filosofia, por meio da compreensão que produz, constrói uma fonte permanente e crítica da significação e direcionamento da práxis. De acordo com Dewey (2007) toda vez que a filosofia foi levada a sério, assumiu-se que ela significava alcançar uma sabedoria capaz de influenciar a condução da vida. É o que se constata com base no fato de que quase todas as antigas escolas de filosofia eram também maneiras organizadas de viver, e os que se submetiam a suas doutrinas estavam comprometidos com certos modos distintos de conduta.	
2 POR QUÊ ESTUDAR FILOSOFIA?
	Em geral o homem está tão atarefado pelo imediato viver, pelos fazeres do cotidiano, que gasta a maior parte de seu tempo e o melhor de suas energias para construir e proteger um arranjo de vida que lhe dê sensação de bem-estar e segurança material, não sobrando tempo para outras coisas. Isso quer dizer que, em geral, o homem não filosofa, não discute os pressupostos de seu acerto de vida. 
	A filosofia é prática de conhecimento que aborda, discute e reflete os fundamentos da prática humana diária, em suas diversas dimensões: existencial, política, social ... Luckesi (2000, p. 74) define a filosofia como“[...] um entendimento que tem por objetivo uma compreensão do mundo que auxilia o ser humano no norteamento de sua vida.” A compreensão filosófica que cada um de nós vier assumir deverá dar direção às nossas ações, sejam de que natureza forem, de forma coerente.
	A filosofia é desafiada “[...] a revelar o sentido das ações humanas. A questionar todo pensamento, todo conhecimento, toda atitude e toda ação quanto a seu ‘em vista do quê’? e a seu ‘por quê’?” (JAPIASSÚ, 1997, p. 15). Auxilia homens a pensar no que fazem, em sua vida e na sociedade segundo referenciais éticos e políticos gerais e, ao mesmo tempo, leva-os ao exercício cotidiano da liberdade de espírito sempre renascente. É interrogar-se sobre os fins que perseguimos, sobre o valor do conhecimento e sobre as condições mesmas de nossa ação. “Uma arma contra os mitos, os preconceitos, os conformismos e a cegueira humana de um modo geral, pois ela habitua a inteligência a refletir com rigor e precisão sobre as questões mais fundamentais da vida humana, tornando-a autônoma, livre das forças materiais que cada vez mais a pressionam.” (MARCONDES, 2011, p. 14).
	A autoridade do pensar filosófico, isto é, a força que a faz crescer e expandir-se, não são os argumentos do discurso, não é a celebridade do pensador, mas a admiração. Admirar em grego é thaumázein que significa ver e, no ato de ver, sentir o estranhamento do que aparece. A regra fundamental de quem filosofa é tão só esta: manter a disposição ou a têmpera existencial, chamada de admiração, que é espanto ou estranhamento diante do que se manifesta. O questionamento filosófico surge, pois, de um sentimento de surpresa, de estupefação e de susto diante do ser que aprece: o que é isto?
	Na origem da filosofia encontramos também a angústia, que é a experiência da fraqueza, a realidade se revela incerta e insegura. A angústia não é unicamente sentimento psicológico, desligado do ser, ela revela nossas impossibilidades; por ela nos confrontamos com a dúvida, nos põem em crise o que exige que tomemos atitudes e para isso precisamos pensar, encontrar alternativas, dialogar com a realidade, conosco mesmos, refletir, em outras palavras, filosofar. 
	A filosofia diz respeito à decisão de não aceitar como óbvias e evidentes as coisas, ideias, fatos, situações, valores, comportamentos de nossa existência cotidiana; jamais aceitá-los sem antes havê-los investigado e compreendido. Ela convida pessoas a serem boas investigadoras, isto é, a saber
[...] cada vez melhor realizar procedimentos investigativos que lhes proporcionem boas respostas às suas indagações. Para tanto, elas precisam ser boas observadoras, boas perguntadoras, boas em elaborar hipóteses plausíveis, boas em argumentar, em comprovar, em sustentar posições e, excelentes, em saber rever suas posições quando os argumentos apontem para tanto. (LORIERI, 2002, p. 37).
	A primeira característica da atitude filosófica é de ordem negativa, isto é, um dizer não ao senso comum, aos pré-conceitos, aos pré-juízos, aos fatos e às ideias da experiência cotidiana, ao que “todo mundo diz e pensa” , ao estabelecido.
	A segunda característica da atitude filosófica é de ordem positiva, isto é, uma interrogação sobre o que são as coisas, as ideias, os fatos, as situações, os comportamentos, os valores, nós mesmos. É também a interrogação do porquê disso tudo e de nós, e uma interrogação sobre como tudo isso é assim e não de outra maneira. O que é? Por que é? Como é? Essas são indagações fundamentais da atitude filosófica.
	A filosofia começa dizendo não às crenças e aos preconceitos do senso comum e, portanto, manifesta dizendo que não sabemos o que imaginávamos saber; por isso que o grego Sócrates, afirmava que a primeira e fundamental verdade filosófica é dizer: “Sei que nada sei.” Platão afirmava que a filosofia começa com a admiração e Aristóteles, acreditava que a filosofia começa com o espanto.
	Admiração e espanto significam que: tomamos distância do nosso mundo costumeiro, através de nosso pensamento, olhando-o como se nunca o tivéssemos visto antes, como se não tivéssemos tido família, amigos, professores... que nos tivessem dito o que e como o mundo é. Para auxiliar o entendimento a respeito da natureza do conhecimento filosófico trazemos o pensamento de alguns filósofos que nos auxiliará a melhor situar nossa visão a seu respeito.
	Platão definia a filosofia como um saber verdadeiro que deve ser usado em benefício dos seres humanos; Descartes afirma que a filosofia é o estudo da sabedoria, conhecimento perfeito de todas as coisas que os humanos podem alcançar para o uso da vida, a conservação da saúde e a invenção das técnicas e das artes; Kant enfatiza que a filosofia é o conhecimento que a razão adquire de si mesma para saber o que pode conhecer o que pode fazer, tendo como finalidade a felicidade humana; Marx declarou que a filosofia havia passado muito tempo apenas contemplando o mundo e que se tratava, agora, de conhecê-lo para transformá-lo, transformação que traria justiça, abundância e felicidade para todos; Merleau-Ponty escreveu que a filosofia é despertar para ver e mudar nosso mundo; Espinosa pontua que a filosofia é um caminho árduo e difícil, mas que pode ser percorrido por todos, se desejarem a liberdade e a felicidade; Politzer menciona que a filosofia é uma concepção geral do mundo da qual decorre uma forma de agir; Basbaum entende que a filosofia é a própria manifestação da vida humana e sua mais alta expressão.
	Por que estudar filosofia? Qual o ganho que temos com isso? Qual sua utilidade? O que é uma coisa útil? O que entendemos por utilidade? É algo imediato? Em nossa cultura e em nossa sociedade, costumamos considerar que alguma coisa só tem o direito de existir se tiver alguma finalidade prática, muito visível e de utilidade imediata. Se assim for a filosofia seria realmente “inútil”: serve para poucas alterações imediatas de ordem pragmática (prática). 
Reduzir sua questão à da “utilidade” é aceitar esta lógica perversa pretendendo que toda ação humana só tem valor pelo serviço que presta. Como se devêssemos julgar o valor de uma ação apenas por sua utilidade social. E o valor de um discurso por sua operacionalidade ou valor de uso. (JAPIASSÚ, 1997, p. 39).
	No entanto, não ter utilidade imediata não significa que seja desnecessária. Onde está então sua utilidade? Está no fato de que, por meio da reflexão, a filosofia nos permite ter mais de uma dimensão, além da que é dada pelo agir imediato no qual o “indivíduo prático” se encontra mergulhado. É ela que permite o distanciamento para a avaliação dos fundamentos dos atos humanos e dos fins a que eles se destinam; reúne o pensamento fragmentado da ciência e o reconstrói na sua unidade; retoma a ação pulverizada no tempo e procura compreendê-la. “Por que a filosofia?” É a primeira e mais importante questão filosófica. “Mesmo que a filosofia não transforme o mundo, se se entende por transformar uma intervenção ativa e direta no curso dos acontecimentos, ela transforma os seres humanos que, pela compreensão da realidade, podem mudar o rumo da história.” (PERINE, 2007, p. 111).
	Para o pensador Dewey (2007) a filosofia apresenta uma tarefa sobre algo que precisa ser feito – algo a ser tentado. Seu valor não está no fornecimento de soluções (que podem ser alcançadas apenas na ação), e sim na definição das dificuldades e na sugestão de métodos para lidar com elas.
	Verdade, pensamento, procedimentos especiais para conhecer fatos, relação entre teoria e prática, correção e acúmulo de saberes: tudo isso não é ciência, são questões filosóficas. O cientista parte delas como questões já respondidas, mas é a filosofia que as formula e busca respostas para elas. “Os efeitos da filosofia se fazem presentes na cultura e na ação de um povo ou de um indivíduo; daí não serem facilmente reconhecíveis.” (LUCKESI, 2000, p. 75).
	Quando a filosofia reflete e tenta compreender a desumanização do “seu tempo”, é para evitar o retorno do “imediato”. Sua referênciaao passado tem por efeito libertá-la dos encadeamentos de morte e torná-la mais apta para inventar novos caminhos. Pensar o tempo em que vivemos remete a confrontarmo-nos com as grandes questões existentes, que surgirão e também com os “poderes” presentes em cada momento histórico.
	A filosofia sempre se confronta com o poder, e sua investigação não fica alheia à ética e à política. A filosofia é, portanto, a crítica da ideologia, entendida como forma ilusória de conhecimento que visa manutenção de privilégios. Eis a vocação do filósofo: desvelamento do que está encoberto pelo costume, pelo convencional, pelo poder. Alguns grupos, especialmente os mais arraigados ao poder descaracterizam o saber filosófico diante da possibilidade de ele despertar a criticidade, devido ao mesmo ter possibilidade de desvendar os valores que sustentam ações individuais ou coletivas. A verdadeira compreensão do significado da filosofia implica assumi-la como forma de entendimento da realidade que coloque nas mãos do ser humano orientação, direcionamento para sua ação. Ela é de fundamental importância para a vida de todos os indivíduos, como seres humanos que desejam encontrar sentido para o seu agir. Ainda que a filosofia construa entendimentos da realidade que possam parecer abstratos, eles, de fato, expressam a vida de forma pensada.
	Só se pode viver e agir a partir de um entendimento do sentido e do significado do mundo e da realidade. Pertence à racionalidade humana buscar sentido para sua vida e sua forma de agir. O que se pode dizer, com propriedade, é que todos vivem a partir de significações, sejam mais ou menos conscientes. A filosofia é a forma consciente e crítica de pensar e agir. “Quanto mais consciente e livre for o ser humano, a partir da própria circunstância social e histórica em que vive, tanto mais coerente e sistemática será a sua filosofia.” (LUCKESI, 2000, p. 85).
	Além da aprendizagem da reflexão, do espírito crítico e da argumentação, a filosofia se interessa por outra questão fundamental: a da vida boa. O que é a vida boa? O que é a vida bem sucedida? A finalidade da
[...] filosofia é ajudar os seres humanos a superar os medos que os impedem de viver bem. Superar os temores que os impedem de chegar à liberdade e à serenidade. [...] como vencer os medos que nos mobilizam, que nos ficham em nós mesmos, que nos impedem não só de ser livres, mas de ser generosos, de ser abertos aos outros, de amar os outros? Como superar os temores para chegar à vida boa? Eis a questão central da filosofia. (FERRY, 2008, p. 40).
	
	Seres humanos carregam uma grande infelicidade que é corporificada em duas palavras: passado e futuro. Estamos sempre lembrando coisas ou procuramos antecipar, caímos na ilusão de que depois será sempre melhor. Como diz Sêneca, dominados pelo passado ou pelo futuro, deixamos de viver o presente. 
Desperdiçamos a única vida que vale, isto é, a vida do presente. De tanto fugir para o passado ou entrar no futuro deixamos de viver, diz Sêneca. Desperdiçamos nossa vida, passamos ao lado do presente. Há um provérbio budista que diz isso muito bem: “Saiba que os instantes que vives aqui e agora, no presente, as pessoas que estão diante de ti aqui e agora no presente, são os instantes mais importantes de tua vida e as pessoas mais importantes de tua vida, por que são os únicos instantes e as únicas pessoas reais. Só o presente é real. O passado não existe mais, o futuro ainda não existe... só o presente é real, e estamos sempre a perdê-lo. (FERRY, 2008, p. 49).
	
	É necessário que façamos distinção: do filósofo especialista, que faz do filosofar um trabalho, utiliza o rigor de um método e conhece a tradição filosófica; e das pessoas comuns que desenvolvem capacidade de pensar bem, de forma coerente e crítica. Não queremos que a filosofia se sobreponha a outras ciências e áreas do conhecimento, mas ela tem como função fundamental indagar sobre todas as coisas. E ela o faz de maneira radical, rigorosa e de conjunto.
Radical: do vocábulo latino radix, radicis, significa raiz, e no sentido figurado fundamento, base. Nossas análises é que nos dão, afinal, nossos pontos de vista: temos de ter disposição para ir, o mais profundamente possível, em busca da compreensão de qualquer coisa, temos de estar dispostos a ir às raízes, aos fundamentos. A filosofia é radical na medida em que busca explicitar conceitos fundamentais usados em todos os campos do pensar e do agir. Por que é um movimento de volta do pensamento sobre si mesmo para conhecer-se, para indagar como é possível o próprio pensamento. Ensina-nos a:
criticar as opiniões recebidas ou impostas, as tradições transmitidas e as ideias admitidas;
ultrapassar o conformismo e o não-conformismo em vista da coerência sempre maior do pensamento e da ação.
Rigorosa: enquanto que a “filosofia de vida” não leva as conclusões até às últimas consequências, nem sempre examinando os fundamentos delas, o filósofo deve dispor de um método claramente definido a fim de proceder com rigor. Apóia-se nele para desenvolver pensamento rigoroso, fundamentado a partir de argumentação coerente em suas diversas partes e, portanto, sistemático. O filósofo usa de linguagem rigorosa para evitar ambiguidades das expressões cotidianas, o que lhe permite discutir com outros filósofos a partir de conceitos claramente definidos. Por isso ele cria expressões novas ou altera o sentido de palavras usuais. Em uma realidade, como a vivida na contemporaneidade, onde tudo é convite à rapidez, ao imediatismo, há que haver convites para se adotar posturas contrárias e até exercícios que levem ao hábito da reflexão.
De conjunto: a filosofia é globalizante, porque examina problemas sob a perspectiva de conjunto, relacionando diversos aspectos entre si. A filosofia visa o todo, à totalidade. É interdisciplinar, pois estabelece elos entre diversas formas de saber e agir humanos.
	A atitude filosófica possui algumas características que são as mesmas, independentemente do conteúdo investigado. Pergunta:
- o que a coisa, ou o valor, ou a ideia é. A filosofia pergunta qual é a realidade ou natureza e qual é a significação de alguma coisa, não importa qual; 
- como a coisa, a ideia ou o valor, é. A filosofia indaga qual é a estrutura e quais são as relações que constituem uma coisa, uma ideia ou um valor;
- por que a coisa, a ideia ou o valor existe, e é como é. Pergunta pela origem ou pela causa de uma coisa, de uma ideia, de um valor. 
	A atitude filosófica inicia-se dirigindo essas indagações ao mundo que nos rodeia e às relações que mantemos com ele. Pouco a pouco, porém, descobre que essas questões se referem, afinal, à nossa capacidade de conhecer, à nossa capacidade de pensar. “A filosofia torna-se, então, o pensamento interrogando-se a si mesmo. Por ser uma volta que o pensamento realiza sobre si mesmo, a filosofia se realiza como reflexão.” (CHAUÍ, 2000, p. 12).
3 HABILIDADES DE PENSAMENTO
	Para que uma pessoa possa ter pensamento crítico, rigoroso, radical, abrangente e criativo precisa desenvolver habilidades básicas de pensamento. A habilidade é o domínio de qualquer fazer ou de qualquer forma de atividade. Pessoas realizam atividades mentais ou de pensamento, no entanto, parece consenso que nem todas realizam bem, especialmente quando necessitam articulá-las para produzir pensamento claro, objetivo, seguro, profundo, consistente... daí a proposta de que sejam desenvolvidas as habilidades de pensamento.
	Pensar, na significação etimológica do termo, quer dizer sopesar, pôr na balança para avaliar o peso de alguma coisa. O pensamento quando faz filosofia, usa ao máximo seus recursos para aprender a avaliar. O pensamento faz com que nos familiarizemos com o mundo, buscando compreender o significado dos objetos e das pessoas, das relações entre uns e outros. Pensar é processo de descobrir relações existentes na realidade e de representá-las na consciência: isso nos permite atinar com os significados o os sentidos que, de alguma forma, estão dadosna realidade. O pensar é um dos determinantes da ação, pois produz sentidos, direções, significações na e para a ação. O pensar de ordem superior, crítico e criativo, supõe a utilização coordenada e integrada das habilidades de pensamento que se concretizam no pensar bem.
� INCLUDEPICTURE "http://www.monica.com.br/comics/piteco/images/capa-01.gif" \* MERGEFORMATINET ���
	Disponível em: http://www.monica.com.br/comics/piteco/welcome.htm
	As habilidades de pensamento não são utilizadas uma de cada vez, mas em grupos e de forma articuladas e integradas. Não todas de uma vez, mas em agrupamentos de habilidades, dependendo dos desafios de cada situação em que estejamos envolvidos. Competência é isso: ter habilidades bem desenvolvidas e ser capaz de articulá-las integralmente e de acordo com as necessidades de cada situação.
3.1) Habilidades de investigação
	Investigação é busca. Procura por soluções, de saber como é, como ocorre, como se faz, como se resolve um problema. É pesquisar. Tomar conhecimento das relações que produzem determinado fato, objeto ou situação. Para ter competência no processo de investigação são necessárias habilidades de:
- Observar bem: observar é dar-se conta dos elementos e das relações que estão envolvidos em uma situação e, é também, dar-se conta de possíveis elementos novos e de possíveis novas relações que possam aí entrar, tendo em vista, principalmente resolver impasses, dificuldades ou problemas que aí se apresentam. É a habilidade que todos temos, mas é possível desenvolvê-la mais e melhor, estimulando seu emprego em determinadas situações. 
- Saber formular questões ou perguntas substantivas: perguntar, todos, sabemos fazê-lo. O que nem sempre ocorre é formular “perguntas boas”, isto é, perguntas que desafiam nosso esforço de indagação, de busca pela reposta ou pela solução. Trata-se de desenvolver capacidade de formular perguntas substantivas, perguntas que tenham conteúdo de interesse investigativo que nos impulsionem à busca de soluções pela importância delas nas situações em que estamos envolvidos.
- Saber formular hipóteses: é o mesmo que saber pensar respostas possíveis às questões ou perguntas que temos ou que outros nos propõem. É ser capaz de imaginar, supor, criar alternativas ou prever possíveis respostas. Significa ser capaz de pensar respostas ou soluções que tenham alguma chance ou possibilidade de ser respostas que vão resolver questões ou problemas postos. “Tudo isso está ligado ao pensamento criativo, uma das competências muito exigidas, hoje, de todos nós, para podermos nos orientar melhor em uma época de tantas mudanças, de tantos desafios novos, para os quais não temos receitas prontas nem regras definitivas.” (LORIERI, 2002, p. 110).
- Saber buscar comprovações: a segurança de nossos saberes depende de quanto são comprovados. É uma habilidade que pode ser desenvolvida quando somos estimulados à verificação e averiguação dos fatos, à argumentação e experimentação, à constatação e exemplificação...
- Se dispor à autocorreção: é um caminho para a sabedoria, o que denominamos de “aprender com os erros”. É quando somos convidados a rever nosso modo de pensar.
3.2) Habilidades de raciocínio
	Raciocínio é o processo de pensar pelo qual conseguimos obter novas informações com base em informações que já temos. Processo de pensar pelo qual tiramos ou obtemos novas informações de dentro das relações de informações anteriores. Habilidades que favorecem o desenvolvimento do raciocinar. Ser capaz de:
- produzir bons juízos, quer dizer, ser capaz de produzir afirmações sustentadas por boas razões. 
- estabelecer relações adequadas entre ideias e, especialmente, entre juízos. 
- inferir, isto é, tirar conclusões. 
- identificar ou perceber pressuposições subjacentes. Trata-se da capacidade de “ler nas entrelinhas” ou de inferir o que “está sendo dito”, de forma “mais ou menos escondida”, quando se afirma algo.
3.3) Habilidades de formação de conceitos
	O termo conceito vem do verbo latino concipere que significa recolher, tomar inteiramente, perceber, conceber. O pensamento no empenho de conhecer a realidade, a toma no conceito. Pensar significa perceber a coisa na mente. Conceito é a explicação intelectual de algo. É a construção de nosso pensamento, na qual coisas, fatos, situações são descritos, são “entendidos” nas características e nas relações necessárias que os compõem, permitindo-nos a compreensão de sua natureza. É sempre organização de informações em uma ideia que pode ser expressa por uma palavra, por um conjunto de palavras, por esquemas, etc. É o conjunto de informações relacionadas entre si que formam um sentido, um significado. Pensar é articular conceitos ou ideias. Habilidades a serem desenvolvidas para aquisição/ formação de conceitos. Habilidade de:
- explicar ou desdobrar, o significado de qualquer palavra.
- analisar, esmiuçar elementos que compõem um conceito qualquer e, em seguida, sintetizar, unir de novo tais elementos, reconstituindo o conceito.
- buscar significados de palavras em fontes como dicionários, enciclopédias, pessoas e de adequar os significados encontrados no contexto em que tais palavras estão sendo utilizadas.
- observar características essenciais para que algo possa ser identificado como tal.
- definir, isto é, de ser capaz de dizer o que algo é e o que o torna inconfundível.
3.4) Habilidades de tradução
	Traduzir é conseguir dizer algo que está dito com certas palavras, ou de certa forma, por meio de outras palavras, ou por meio de outras formas, mantendo o mesmo significado.
4 QUAL O MÉTODO DA FILOSOFIA?
	A palavra método é constituída pelos termos gregos metá – por meio de e hodós – caminho, ou seja, caminho por meio do qual chegamos a um fim, atingimos determinado objetivo. Quem está habituado ao estudo dos filósofos sabe que a filosofia não tem um objeto único, uma vez que trata de todas as coisas, nem um método que lhe seja exclusivo. Os filósofos não mantêm entre si concordância, uniformidade na aceitação das regras do método, de modo que os caminhos percorridos por eles têm sido diferentes conforme cada pensador. Daí a variedade de métodos: dialético, transcendental, intuitivo, existencial, etc., além dos métodos gerais que cada um pode privilegiar: análise, síntese...
	 O ensino de filosofia não depende de escolher um desses métodos, de forma artificial, mas permitir que o aluno compreenda o tipo de abordagem da realidade que a filosofia costuma fazer. Não se trata de ensinar simples técnicas intelectuais, nem desenvolver puras habilidades que se acrescentariam de for ao saber. “Só é possível adquirir métodos de trabalho em filosofia se antes for compreendido que o método é inerente à própria filosofia. Elaborar uma metodologia, com efeito, é já fazer filosofia.” (FOLSCHEID e WUNENBURGER apud ARANHA, 1998, p. 7).
	Devemos fazer da filosofia a arte de colocar questões em cada domínio do saber e da ação; arte de argumentação capaz de permitir, aos seres humanos, em cada caso, resgatar o todo do pensamento, vale dizer, abordar toda e qualquer questão segundo a perspectiva do universal; provocarmos em nossos alunos a manifestação do desejo de saber sempre mais.
	Devemos partir sempre dos problemas reais, eles são mais importantes que os textos e os autores. A reflexão filosófica organiza-se em torno de três grandes conjuntos de perguntas ou questões:
1 Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais motivos, razões e causas para pensarmos o que pensamos, dizermos o que dizemos, fazermos o que fazemos?
2 O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos e o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos ou fazemos?
3 Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? Isto é, qual é a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos e fazemos?
	A filosofianão se realiza ao acaso, segundo preferências e opiniões de cada um. A filosofia não é “eu acho que” ou “eu gosto de”. As indagações filosóficas se realizam de modo sistemático. Que significa isso? 
	Significa que a filosofia trabalha com enunciados precisos e rigorosos, busca encadeamentos lógicos entre os enunciados, exige fundamentação racional do que é enunciado e pensado. 
O conhecimento filosófico é um trabalho intelectual. É sistemático porque não se contenta em obter respostas para as questões colocadas, mas exige que as próprias questões sejam válidas e, em segundo lugar, que as respostas sejam verdadeiras, estejam relacionadas entre si, esclareçam umas às outras, formem conjuntos coerentes de ideias e significações, sejam provadas e demonstradas racionalmente. (CHAUÍ, 2000, p. 13).
	Quando começamos estudar filosofia, somos logo levados a indagar a respeito do que ela é. Somos surpreendidos com várias definições de filosofia. Mas podemos auxiliar os leitores a se aproximar de uma definição do que é filosofia apresentando quatro grandes ideias.
1 Visão de mundo de um povo, de uma civilização ou de uma cultura. Conjunto de ideias, valores e práticas pelos quais uma sociedade aprende e compreende o mundo e a si mesma, definindo para si o tempo e o espaço, o sagrado e o profano, o bom e o mau... Esta definição é genérica e identifica filosofia e cultura, pois apresenta a visão de mundo coletiva que se exprime em ideias, valores e práticas de uma sociedade.
Temos de estar dispostos a ver os fatos, as situações, as coisas por todos os ângulos, em todas as dimensões e em todos os relacionamentos possíveis. Isso significa buscar ver tudo de forma contextualizada, ver tudo como parte de totalidades cada vez mais abrangentes. Tudo faz sentido nos contextos relacionais em que se dá. Tudo é resultado de múltiplas determinações ou relações. Quando entendemos essas múltiplas relações, armamos em nosso entendimento totalidades referenciais significativas. (LORIERI, 2002, p. 39).
 
Sabedoria de vida. Identificada com a definição e a ação de algumas pessoas que pensam sobre a vida moral, dedicando-se à contemplação do mundo para aprender com ele a controlar e dirigir suas vidas de modo ético e sábio. Porque é sintonizando com a “voz do silêncio”, sem deixar de estar consciente do nosso corpo e da nossa mente e do burburinho e vozerio do mundo que nos cerca que vamos ficando cada vez mais sintonizados com a Sabedoria da nossa Essência interior. A filosofia é contemplação do mundo e dos homens para conduzir-nos a uma vida justa, sábia e feliz, ensinando-nos o domínio de nós mesmos, sobre os impulsos, desejos e paixões. Esta definição diz, de modo vago, o que é a filosofia, enquanto sabedoria interior. 
Esforço racional para conceber o Universo como totalidade ordenada e dotada de sentido. Esta definição é problemática porque dá à filosofia a tarefa de oferecer explicação e compreensão totais sobre o Universo, elaborando um sistema universal ou um sistema do mundo, mas sabemos, hoje, que essa tarefa é impossível. 
4 Fundamentação teórica e crítica dos conhecimentos e das práticas. Ocupa-se com condições e princípios do conhecimento que pretenda ser racional e verdadeiro; com a origem, forma e conteúdo dos valores éticos, políticos, artísticos e culturais; com a compreensão das causas e das formas de ilusão e do preconceito no plano individual e coletivo; com as transformações históricas dos conceitos, das ideias e dos valores.
	Sem abandonar as questões sobre a essência da realidade, a filosofia procura diferenciar-se das ciências e das artes, dirigindo a investigação sobre o mundo natural e o mundo histórico num momento muito preciso: quando perdemos nossas certezas cotidianas e quando as ciências e as artes ainda não ofereceram outras certezas para substituir as que perdemos.
	A filosofia se interessa por aquele instante em que a realidade natural e a história tornam-se estranhas, espantosas, incompreensíveis e enigmáticas, quando o senso comum já não sabe o que pensar e dizer e as ciências e artes ainda não sabem o que pensar e dizer.
	Além da análise, reflexão e crítica, a filosofia é busca do fundamento do sentido da realidade em suas múltiplas formas, indagando o que são, qual sua permanência e qual a necessidade interna que as transforma em outras. 
A filosofia não é ciência: é uma reflexão crítica sobre os procedimentos e conceitos científicos. Não é religião: é uma reflexão crítica sobre as origens e formas das crenças religiosas. Não é arte: é uma interpretação crítica dos conteúdos, das formas, das significações das obras de arte e do trabalho artístico. Não é sociologia nem psicologia, mas interpretação e avaliação crítica dos conceitos e métodos da sociologia e psicologia. Não é política, mas interpretação, compreensão e reflexão sobre a origem, a natureza e as formas de poder. Não é história, mas interpretação do sentido dos acontecimentos enquanto inseridos no tempo e compreensão do que seja o próprio tempo. Conhecimento do conhecimento e da ação humanos, conhecimento da transformação temporal dos princípios do saber e do agir, conhecimento da mudança das formas do real ou dos seres, a filosofia sabe que está na História e que possui uma história. (CHAUÍ, 2000, p. 15).
	A filosofia é uma das formas de saber e de conhecimento que os seres humanos produzem para tentar explicar a realidade da qual fazem parte e a si mesmos; porque ela é um conjunto de procedimentos da consciência humana que, ordenados de certa forma, procuram produzir respostas, mais garantidas possível, para questões com as quais seres humanos se deparam em suas vidas ou para questões que eles se fazem quando se põem a pensar mais atentamente.
PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DO MÉTODO
	Vamos examinar dois pressupostos que nos auxiliam a entender como proceder em relação ao ensino da filosofia.
Pressupostos antropológicos: resulta da pergunta “que tipo de ser humano formar”? A resposta tem variado dependendo do lugar, do tempo e da classe social.
Pressupostos epistemológicos: o que é o conhecimento filosófico? Que tipo de conhecimentos ensinar? É bom lembrar que não há ensino de filosofia sem referência à história da filosofia, portanto a filosofia como produto é indispensável, caso contrário, a intervenção dos alunos permanece espontaneísta, repetindo que já sabem, sem que seja aproveitada a contribuição da cultura filosófica. 
	Por outro lado, de nada adianta tanta informação se o aluno não tiver a oportunidade de expressar sua experiência, mesmo que fragmentada, para que possa iniciar um processo reflexivo, entendendo o vivido com maior profundidade. Uma nova orientação deve existir, sem deixar de valorizar o já pensado, também se ocupar em estimular a reflexão autônoma e o pensamento crítico.
5 A FILOSOFIA NA SALA DE AULA
	A atitude do professor não é neutra. Está situado no seu tempo e imbuído de determinados valores ético, políticos e estéticos. No entanto, este engajamento não dá ao professor o direito de doutrinação dos alunos, porque a sala de aula deve ser espaço, por excelência, de pluralismo e diversidade. A sala de aula deve ser o lugar para discussão de valores, de clarificação de conceitos, de exposição plural de ideias. Justamente porque a intenção não é transmitir convicções, mas dar oportunidade para que os educandos desenvolvam as competências necessárias para o seu pensar autônomo.
	Um dos objetivos de estudar filosofia é o desenvolvimento de competências que significa capacidade de mobilizar diversos recursos cognitivos para enfrentar situações novas. Desenvolver competências não significa desistir de transmitir conhecimentos nem deixar de reservar espaço para aula. O que está sendo proposto é não deixar de dar destaque também à aquisição de competências, o que, em muitos casos, significa criticar quem só se preocupa com a informação. 
	A filosofia nos dá “bisturis teóricos” para chegarmos às diferentes realidades, para proceder à leitura crítica do contexto socialem que vivemos. Essa leitura se dá em três níveis:
1 No nível da prática da vida cotidiana ou da espontaneidade vital, o filósofo deve ser o homem de seu tempo, deve estar presente, ser participante, atuante e engajado. O objetivo é encontrar as melhores razões para viver. 
2 No nível da reflexão propriamente dita, quer dizer, do trabalho do pensamento para transformar o saber da experiência vivida em saber produzido e compreendido; o pensamento é um trabalho que consiste em produzir um saber novo pela mediação da reflexão do sujeito sobre sua experiência vivida, a fim de transformá-la, de algo não-sabido a um saber compreendido.
3 No nível das práticas científicas, o filósofo não pode limitar-se a refletir sobre as ciências ou para elas, mas com elas. O que se espera do filósofo é que ele elabore o discurso da realidade. Não sozinho, mas em companhia dos cientistas, notadamente humanos, ajudando-os a descobrirem como e até onde se torna possível se pensar de outra forma.
6 A FILOSOFIA E O LER
	Somos desafiados e obrigados a interpretar, ou seja, dar significado a uma série de acontecimentos que invadem nosso dia a dia. Para esta atividade de atribuir significado podemos dar o nome de leitura. A leitura, nesse sentido, passa ser uma atividade bastante ampla: é efetuada toda vez que identificamos significado em algum acontecimento, alguma atitude, algum texto escrito, comportamento. Tudo isso podemos chamar de leitura do mundo. Para que saibamos fazer a leitura do mundo, é preciso saber observá-lo, recolhendo informações dos mais variados tipos. Precisamos estar atentos a tudo o que acontece à nossa volta e saber que todos os nossos sentidos estão constantemente nos fornecendo inúmeras informações a respeito do mundo.
	Os medievais afirmavam que um livro lido cum legentibus crescit, isto é, cresce com aqueles que o leem. Uma ideia enigmática que vale a pena aprofundar. É inquestionável que quem lê cria um sistema pessoal de convicções, comunica-se melhor, domina a estrutura do idioma. No entendimento de Perissé (2011), precisamos desenvolver uma leitura viva, isto é, fazer com que o livro também melhore quando cair nas mãos de um bom leitor. O leitor atento sabe despertar os dotes e valores adormecidos do texto, dos quais o próprio autor talvez não tivesse plena consciência. Uma leitura viva dá vida ao texto e renova a vida de seus leitores. “Ler para valer significa elevar o texto, o livro, a palavra lida a níveis de beleza e grandeza que o próprio autor não soube alcançar. [...] O segredo está em permitir que também os livros extraiam de nós os nossos talentos ocultos.” (PERISSÉ, 2011, p. 85). 
	Além da leitura de mundo, há a leitura de textos. Em latim texto significa “tecido” e é entendido como qualquer significado articulado através de uma linguagem determinada. “Conjunto de signos linguísticos que codificam uma mensagem.” (SEVERINO, 2008, p. 9). Precisamos lembrar que essa tarefa de leitura, de atribuição de significado, depende da vivência de cada leitor, porque é ela que faz cada um observar o mundo de uma forma diferente dos outros (ter seu paradigma: “modelo” ou forma de como vê ou vai olhar as coisas). Toda leitura depende de nossas experiências, idade, sexo, país, nossa história de vida. Enquanto que a escrita é o processo de codificação da mensagem, pelo autor, a leitura é processo inverso e simétrico de decodificação da mensagem, pelo leitor. “Ler nesse caso é encontrar-se com a palavra e reconhecer debaixo de sua mortalha o sopro, o ritmo, o vigor do humano dimensionado e vivido pelo autor.” (BUZZI, 2000, p. 134).
	Textos verbais, isto é, textos em que utilizamos a palavra, incluem desde livros, apostilas usados em aula até artigos de jornais e revistas, contos, poesias, filmes, propaganda. Da mesma forma que existem diferentes tipos de texto, existem diferentes tipos de leitura desses textos, cada um dos quais atendendo a um objetivo diferente. 
Lidamos, na leitura, com as palavras ou termos, e com os conceitos ou ideias. As palavras ou termos são o lado visível e material da linguagem, estruturando-se de acordo com as regras gramaticais de cada língua. Já os conceitos ou ideias são os “conteúdos mentais” que correspondem a cada palavra, por meio dos quais representamos um objeto, pensamos uma coisa ou uma relação entre palavras. (SEVERINO, 2008, p. 11-12).
	Leitura analítica é o processo de decodificação de um texto escrito, com vistas à apreensão-recepção da mensagem nele contida. É uma abordagem do texto com o objetivo de apreender a mensagem global da unidade de leitura, de modo que o leitor tenha visão da integralidade do raciocínio desenvolvido pelo autor, levando-o tanto à compreensão dessa mensagem como à sua interpretação. No entanto, os textos científicos e filosóficos demandam alguns recursos próprios, diferentes daqueles que usamos na leitura dos textos literários, jornalísticos ou coloquiais.
6.1 LEITURA POR PRAZER: é subjetiva, nos empolga, liberando emoções e dando asas à nossa fantasia. Entregamo-nos de corpo e alma ao universo criado pelo autor, seja ele imaginário ou real, viajando no tempo e no espaço, experimentando prazer ou angústia. Nesse tipo de leitura, o único critério de avaliação usado é o da preferência: gostamos ou não de um texto, dependendo de motivos pessoais ou de características do texto que não são definidas. Durante o processo de leitura por prazer, algo acontece ao leitor, que sofre, se angustia e se alegra com as situações apresentadas no texto. Estaremos, então, fazendo uma dupla leitura: do texto e da nossa própria realidade. 
6.2 LEITURA CRÍTICA: exige compreensão mais abrangente do texto e mobiliza, além do sentimento, as capacidades racionais do leitor (separar suas partes, relacioná-las, sintetizar ideias...) Estabelecemos um diálogo com o texto fazendo perguntas que nos levam a compreender sua forma de construção e seus significados mais profundos. Os textos, em geral, não nos entregam totalmente seus significados logo numa primeira leitura. Temos, na verdade, que conquistar o texto, respeitando as características próprias que o fazem diferente dos demais. Podemos dizer que a leitura crítica de um texto é uma forma de recriar esse texto, visando sua compreensão mais profunda. A recriação é feita a partir das perguntas que fazemos ao texto. A leitura crítica comporta, assim, subdivisão em níveis, que constituem etapas de aprofundamento da interpretação: análise textual (denotação), análise temática, análise interpretativa (crítica) e problematização.
a) Análise textual: após leitura tenta, mas rápida, o leitor levanta dúvidas de vocabulário, identifica o autor no seu contexto histórico e na corrente de pensamento a que pertence; nesse estágio pode ser feito breve esquema com a identificação dos principais tópicos. Seu objetivo é identificar os elementos que permitem a adequada decodificação do texto, bem como o contexto de sua produção. É o primeiro nível de leitura crítica de um texto. Visa compreensão do sentido mais literal, direto e superficial do texto e envolve as seguintes etapas:
a) Levantamento das informações adicionais, como: 
Delimitação de uma unidade de leitura e levantamento vocabular: definição da unidade de leitura (texto todo, uma parte, tempo para leitura...) identificar o sentido das palavras desconhecidas. As informações sobre termos e palavras desconhecidos têm seus sinônimos e explicações nos dicionários da língua portuguesa. Mas, em se tratando de “conceitos novos”, mesmo quando a palavra já nos é conhecida, precisamos dirigir-nos a fontes especializadas, tais como os dicionários de filosofia, de sociologia... 
Buscar dados sobre o autor (isto auxilia muito para elucidação das ideias expostas no texto), situação histórica e finalidade para a qual ele foi escrito; (perfil geral do texto: natureza geral do texto, como surgiu?)
 Autores, teorias, obras, eventos, comentados no texto que nos são desconhecidos.
b) Primeira leitura panorâmica. Trata-se de um trabalho prévio deidentificação de pontos que eventualmente precisam ser esclarecidos para que uma leitura efetivamente compreensiva possa acontecer. É hora de fazer a esquematização da unidade de leitura. “O esquema dá conta do pano, da estrutura do texto, embora não seja o resumo. O esquema ajuda o leitor a ter uma visão geral do texto: a visão panorâmica da unidade.” (SEVERINO, 2008, p. 17).
c) Procura da ideia central do texto.
d) Análise do desenvolvimento do raciocínio do autor. No momento em que conseguimos perceber como o autor montou seu texto, nós entramos na posse de sua estrutura lógica, revelada pelo encadeamento das ideias que devem desembocar na conclusão.
b) Análise temática: nesta fase, o leitor aprende a “ouvir” o autor, ou seja, compreender o que ele diz e as ideias que defende; destaca então a ideia central e ideias secundárias, na tentativa de identificar com clareza o problema que o autor se propôs a discutir. É a fase de busca por compreensão, a mais objetiva possível, da mensagem do autor. É hora de saber qual mensagem ele nos transmite por meio de seu texto, o que ele quer comunicar.” (SEVERINO, 2008, p. 18). Muitas vezes, esta fase é confundida com a atividade de interpretação (que será objeto da próxima etapa). É que muita gente entende a leitura como se ela fosse apenas a “interpretação” do texto. Mas há uma etapa prévia a ser levada em conta na leitura: a fase da “compreensão”, durante a qual precisamos “ouvir” o mais atentamente possível o autor.
	Procura os significados não explícitos, escondidos, ou seja, os significados conotativos ou figurados. É nesse nível que vamos analisar mais a fundo os diversos elementos que compõem o texto, examinando relações que eles mantém entre si e como cada um influencia o outro. É nesse nível, também, que cruzamos ideias e valores presentes no texto com a situação histórica e social da época em que foi escrito e, às vezes, até com a biografia do autor. 
	Severino (2008) apresenta cinco questões, bem diretas e precisas, que auxiliam na obordagem do texto:
1) Do que está falando, qual o tema ou assunto do texto?
2) Qual o problema que se coloca, ou seja, por que o tema está em questão?
3) Qual a resposta que o autor dá ao problema, qual a tese que defende ao tentar resolver o problema ou explicar o tema?
4) Como o autor demonstra sua hipótese? Como ele a comprova?
5) Que outras ideias secundárias o autor, eventualmente, defende no texto em análise?
	Fica assim retomada, de forma sistemática, a mensagem contida no texto lido. É necessário entender que muitas interferências de ordem objetivas e subjetivas ocorrem durante o processo de leitura, perturbando a decodificação da mensagem. Daí a confusão que muitos fazem entre compreensão e interpretação do texto.
c) Análise interpretativa – análise crítica: é a que torna a leitura um processo crítico na relação com o conhecimento. O leitor deixa de apenas “ouvir” e começa a “dialogar” com o autor; lendo nas entrelinhas, levanta hipóteses sobre os subentendidos do texto, examina seus pressupostos, relaciona as ideias do autor a outras concepções filosóficas. “Enquanto na fase anterior a compreensão da mensagem do autor se dava a partir exclusivamente dos elementos presentes no texto escrito, nessa fase interpretativa a compreensão se dá a partir de dados de forma do texto, interpretando o autor, discutindo-se com ele.” (SEVERINO, 2008, p. 19). Interpretar um texto é aprender o sentido depositado nas palavras, é retirá-lo de sua reclusão e pô-lo gradativamente ao alcance de quem lê. A atividade de interpretar faz surgir o mundo. Para chegarmos à interpretação precisamos ler várias vezes o texto para perceber mais claramente o possível tema. “As leituras rápidas, as leituras chamadas dinâmicas, são inimigas da verdadeira leitura. Ler é reencontrar-se com a vida da palavra. Só o ler pausado e repetido faz com que apareça e se revele ao leitor o mundo oculto, amortalhado na obra da palavra.” (BUZZI, 2000, p. 139).
	É preciso desenvolver então a crítica, examinando a coerência do texto (se o autor não se contradiz), se consegue solucionar o problema proposto, se avança na discussão ou não tem originalidade, etc. Não crítica gratuita, baseada no gosto e na opinião individual, subjetiva, mas aquela que surge de nosso entendimento da proposta do próprio texto. Trata-se da crítica objetiva, que não depende do nosso gosto e que está fundamentada em aspectos do próprio texto. Ao chegar a esse ponto da leitura, teremos completado nossa análise. Saberemos dizer do que o autor trata, quais os itens por ele enfocados, com que ponto de vista o assunto foi desenvolvido e qual sua contribuição à discussão daquele assunto. 
	Severino (2008) mostra que podemos adotar alguns procedimentos que nos ajudam a alcançar a interpretação:
1) Situação do conteúdo da unidade no contexto da obra de onde ela foi extraída, bem como no conjunto do pensamento do autor.
2) Situação do autor no âmbito do pensamento teórico, na história do pensamento de sua área de reflexão. Localizar o autor no contexto mais amplo da cultura filosófica.
3) Explicitação dos pressupostos implicados no texto. Os pressupostos são ideias que justificam, fundamentam ideias defendidas pelo autor, dando-lhe coerência.
4) Levantamento de ideias associadas que estão presentes no texto. É hora de comparar, de aproximar posições, de destacar diferenças.
5) Formulação de críticas à construção do texto, bem como aos pontos de vista do autor: críticas positivas e negativas.
d) Problematização: nesta fase, que geralmente ocorre na discussão em grupo, são retomados os principais temas sugeridos pelo texto e que podem ser ampliados nas mais diversas direções. Isto significa dizer que o texto é desencadeador de novos questionamentos, num âmbito que valoriza reflexão autônoma.
	Nesse nível nos distanciamos do texto e pensamos em assuntos ou problemas que, embora levantados a partir da leitura cuidadosa, possam ir além dele. A necessidade de aprender ler é muito mais ampla e profunda do que normalmente se coloca, pois envolve a prática de dar significado ao mundo que nos cerca e à nossa própria vida. É tarefa que pode ser conseguida através dos sentimentos e também da razão.
	A leitura crítica, como vimos, apresenta uma série de etapas que correspondem ao aprofundamento gradual dos significados presentes no texto, o que pode nos levar, para além do próprio texto, aos valores implícitos, escondidos, que presidiram a sua criação. 
6.3 COMPETÊNCIAS A SEREM DESENVOLVIDAS NO ENSINO DE FILOSOFIA:
- Ler textos filosóficos de modo significativo. Toda leitura de um texto filosófico supõe a retomada do pensamento vivo de um filósofo, mesmo que ele pertença a outra época muito distante. A leitura filosófica significativa supõe aprender a descobrir os pressupostos do texto, a desenvolver condições de inteligibilidade, exercitar a capacidade de problematização. Portanto, é preciso apropriar-se dele de maneira metódica, rigorosa, sistemática. 
Leia o livro em tom dialogal. O texto não é um objeto-coisa que está aí à sua frente. O texto é um interlocutor que fala e discute com você, faz-lhe resistência, provoca-o, engana-o, ensina-o, ouve-o, confirma-o. A leitura o irá envolvendo no mundo do outro com o qual você pretende se medir. Pode abalar ou até demolir os alicerces de seu arranjo existencial. Pode também confirmar suas posições, esclarecê-las melhor, descobrir o implícito que você já vive. O texto de leitura é, por conseguinte, um “outro eu” que surge diante de mim, que me provoca, me anima, me desanima com seu contexto diferente. A leitura é sempre um confronto consigo mesmo. [...] O método de leitura filosófica não é, pois, um instrumento já existente em si, utilizável mecânica, segura e cientificamente; é antes um processo, uma operação, uma ação contínua, uma meditação, uma reflexão interiorizada, que deve ser exercitada por cada um em particular, não só no ato da leitura, mas na práxis da vida. (BUZZI, 2000, p.148-149).
	Leitura e análise de texto oferece um caminho fértil e indispensável à iniciação filosófica, primeiro porque, por meio do texto original, se retoma a herança do já pensado e, segundo, porque proporciona o exercício da reflexão pessoal e crítica. 
- Ler, de modo filosófico, textos de diferentes estruturas e registros. Como o filosofar supõe compromisso com o cotidiano de nossas vidas, pode-se utilizar textos não filosóficos para lançar sobre eles um “olhar filosófico”. Trata-se de artigos de jornal, poesias, filmes, músicas, programas de tv, discursos políticos, descobertas científicas, determinados tipos de comportamentos e acontecimentos diversos. O rigor da abordagem filosófica deve aparecer aqui, de forma que o aluno consiga fazer uma “leitura analítica” das diversas expressões, identificando problemas, avaliando pressupostos, interpretando fatos e levantando questionamentos que possibilitem fazer uma leitura crítica do mundo.
- Articular conhecimentos filosóficos e diferentes conteúdos e modos discursivos nas ciências naturais e humanas, nas artes e outras produções culturais. Em um mundo de saberes fragmentados, de ações desconexas, cabe à filosofia articular os diferentes conteúdos das mais diversas expressões da cultura. Esta visão de totalidade tem se tornado cada vez mais importante no mundo de hoje, sobretudo em razão da tendência de as próprias ciências particulares, antes restritas a pequenos recortes da realidade, agora se expandem nas chamadas ciências híbridas, como a mecatrônica, a bioquímica, fisicoquímica, nanotecnologia, etc.
- Contextualizar conhecimentos filosóficos, tanto no plano de sua origem específica quanto em outros planos: o pessoal-biográfico; o entorno sóciopolítico, histórico e cultural; o horizonte da sociedade científico-tecnológica. O trabalho filosófico permite tornar a experiência pessoal uma experiência compreendida. A filosofia não é exercício de reflexão à margem do mundo. A contextualização é esforço de examinar cada doutrina compreendendo os fatores sócio-histórico-culturais que provocaram no filósofo a identificação dos problemas que se propôs discutir. Por sua vez, esse exercício trará frutos para que o aluno se torne capaz de fazer a crítica da sociedade em que vive.
- Elaborar, por escrito, o que foi apropriado de modo reflexivo. O bom leitor se prepara para executar bem o trabalho de elaboração pessoal de um texto. Todo o processo do ensino de filosofia busca dar condições para a autonomia do pensar, quando o estudante adquire a competência de produção pessoal. “A dissertação filosófica é essencial. Não há melhor lugar para exercitar nosso pensamento sobre um tema preciso, para analisar e produzir conceitos articulando-os dentro e através de um discurso.” (WUNENBURGER apud ARANHA, 2003, p. 11). 
- Debater, tomando uma posição, defendendo-a argumentativamente e mudando de posição em face de argumentos mais consistentes. Aprende a debater é, inicialmente, exercício de reconhecimento do outro, de concessão de palavra, de diálogo verdadeiro, em que as pessoas não se dispõem apenas a falar, mas também a ouvir, a trocar ideias. O diálogo não é conversa de surdos, mas oportunidade de cada um organizar seu pensamento, entrar em desacordo ou até reformular seus pontos de vista, no caso de reconhecer melhores argumentos que os seus.
REFERÊNCIAS
ARANHA, Maria L. de Arruda. Temas de filosofia. São Paulo: Moderna, 1998.
________ Filosofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 2007.
BUZZI, Arcângelo. Introdução ao pensar: o Ser, o Conhecer, a Linguagem. Petrópolis/RJ: Vozes, 2000.
CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2000.
DEWEY, John. Democracia e Educação: capítulos essenciais. São Paulo: Ática, 2007.
FERRY, Luc. Aprender a viver – Filosofia e educação na sociedade contemporânea. In: SCHÜLER, F. e SILVA, Juremir Machado da. Fronteiras do pensamento: retratos de um mundo complexo. São Leopoldo: Unisinos, 2008.
JAPIASSÚ, Hilton. Um desafio à filosofia: pensar-se nos dias de hoje. São Paulo: Letras & Letras, 1997.
LORIERI, Marcos. Filosofia: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2002.
LUCKESI, Cipriano. Introdução à filosofia: aprendendo a pensar. São Paulo: Cortez, 2000.
LUFT, Lya. Pensar é transgredir. Rio de Janeiro: Record, 2004.
MARCONDES, Danilo (Org.) A filosofia: O que é? Para que serve? Rio de Janeiro: Zahar, 2011.
PERINE, Marcelo. Ensaio de iniciação ao filosofar. São Paulo: Loyola, 2007.
PERISSÉ, Gabriel. O valor do professor. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Como ler um texto de filosofia. São Paulo: Paulus, 2008.
� Graduado em Filosofia. Mestre em Filosofia – Antropologia Filosófica (PUCRS) e Doutor em Educação (UFRGS). Professor da URI- Erechim.

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