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LITERATURA ENEM professor Marlus Geronasso Aula 18 Murilo Mendes “Eu me sinto um fragmento de Deus Como sou um resto de raiz Um pouco da água dos mares O braço desgarrado de uma constelação.” Poema espiritual Eu me sinto um fragmento de Deus Como sou um resto de raiz Um pouco de água dos mares O braço desgarrado de uma constelação. A matéria pensa por ordem de Deus. Transforma-se e evolui por ordem de Deus. A matéria variada e bela É uma das formas visíveis do invisível. Cristo, dos filhos do homem és o perfeito. Na igreja há pernas, seios, ventres e cabelos Em toda parte, até nos altares. Há grandes forças de matéria na terra no mar e no ar Que se entrelaçam e se casam reproduzindo Mil versões de pensamentos divinos. A matéria é forte e absoluta Sem ela não há poesia. Jorge de Lima “Mulher proletária – única fábrica que o operário tem (fabrica filhos) na tua superprodução de máquina humana forneces anjos para o Senhor Jesus tu forneces braços para o senhor burguês.” Cecília Meireles “O mar de língua sonora sabe o presente e o passado. Canta o que é meu, vai-se embora: que o resto é pouco e apagado.” Modinha Tuas palavras antigas Deixei-as todas, deixei-as, Junto com as minhas cantigas, Desenhadas nas areias. Tantos sóis e tantas luas Brilharam sobre essas linhas, Das cantigas – que eram tuas Das palavras – que eram minhas! O mar, de língua sonora, Sabe o presente e o passado. Canta o que é meu, vai-se embora: Que o resto é pouco e apagado. Cecília Meireles Espectros – 1919. Viagem – 1939. Mar absoluto – 1945. Carlos Drummond de Andrade sua filha, Maria Julieta. O poeta escritor (o maior) Poeta maior da 2a. geração Modernista. Apresenta a Poesia rica em variedade temática, versatilidade técnico-formal, amplo domínio verbal, uso da norma culta, aplicação da linguagem coloquial, utilização de neologismos. Um eu todo retorcido - “o gauche” O “eu-lírico tímido, dasajeitado, desajustado, com dificuldade de relacionamento social e amoroso.” Sensível, vivendo muitas emoções íntimas, tendo o seu mundo interior conturbado, porém rico. “Quando nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: vai Carlos! Ser gauche na vida.” Uma província:esta A clara tematização da terra natal: Itabira, Minas Gerais. O enfoque da tradição mineira em suas pequenas, contudo históricas e tradicionais cidades. “Itabira é apenas uma fotografia na parede. Mas como dói!” A família que me dei A representação da família, das raízes ancestrais do poeta, principalmente diante da recomposição de imagens, da recuperação de aspectos do passado. “Este retrato de família está um tanto empoeirado. Já não se vê o rosto do pai quanto dinheiro ele ganhou.” O cantar os amigos O cantar dos companheiros, artistas, pessoas próximas: Manuel Bandeira, Charlie Chaplin, Jorge de Lima, Mário de Andrade, Frederico García Lorca. “O ofício, é o ofício que assim te põe no meio de nós todos, vagabundo entre dois horários; mão sabida” Amar-amaro O questionamento social, o aspecto político, o poeta retratando a sua impotência diante da urgente ação solidária por um viver melhor. “Não serei o poeta de um mundo caduco. Também não cantarei o mundo futuro. Estou preso à vida e olho meus companheiros. Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.” Uma, duas argolinhas A retrato do amor nas palavras do poeta, o sentimento representado muitas vezes pelos encontros e desencontros. O Amor, não há como fugir dele. “Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar? amar e esquecer, amar, desamar, amar? Sempre, e até de olhos vidrados, amar? “ Poesia contemplada A incansável busca pela própria poesia, a necessidade de uma criação artística singular, o fazer poético, ou seja o desvendar da “metapoesia”. “Não faças versos sobre acontecimentos. (...) O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.” Na praça dos convites O poeta torna-se brincalhão, ou seja, o aspecto lúdico da poesia surge através de exercícios, com o uso do próprio surrealismo. “A chuva me irritava. Até que um dia descobri que maria é que chovia. (...) O estar-no-mundo A poesia de Drummond torna-se filosofante, buscando evidenciar os contornos da existência humana. “No meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra.” MODERNISMO 1930 A Fase Madura No meio do caminho No meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas. Nunca me esquecerei que no meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho No meio do caminho tinha uma pedra. Poema de sete faces Quando nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra Disse: Vai, Carlos! Ser gauche na vida. As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde talvez fosse azul, não houvesse tantos desejos. O bonde passa cheio de pernas: pernas brancas pretas amarelas. Para que tanta perna, meu Deus [pergunta meu coração. Porém meus olhos não perguntam nada. O homem atrás do bigode é sério, simples e forte. Quase não conversa. Tem poucos, raros amigos o homem atrás dos óculos e do bigode. Meu Deus, por que me abandonaste se sabias que eu não era Deus se sabias que eu era fraco. Mundo mundo vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não seria solução. Mundo mundo vasto mundo, Mundo mundo vasto mundo, mais vasto é meu coração. Eu não devia te dizer mas essa lua mas esse conhaque botam a gente comovido como o diabo. José E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José? e agora, você? você que é sem nome, que zomba dos outros, você que faz versos, que ama, protesta? e agora José? Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora, José? E agora, José? sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro, sua incoerência, seu ódio – e agora? Com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora? Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse a valsa vienense, se você dormisse, se você cansasse, se você moresse... mas você não morre, você é duro, José! Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, sem teogenia, sem parede nua para se encostar,sem cavalo preto que fuja a galope, você marcha, José! José, para onde? Quadrilha João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria Joaquim que amava Lili que não amava ninguém. João foi pra os Estados Unidos, Teresa para o convento, Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia, Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes Que não tinha entrado na história. Morte do leiteiro Há pouco leite no país, é preciso entregá-lo cedo. Há muita sede no país, é preciso entregá-lo cedo. Há no país uma legenda, que ladrão se mata com tiro. Então o moço que é leiteiro de madrugada com sua lata sai correndo e distribuindo leite bom para gente ruim. Sua lata, suas garrafas e seus sapatos de borracha Vão dizendo aos homens no sono que alguém acordou cedinho e veio do último subúrbio trazer o leite mais frio e mais alvo da melhor vaca para todos criarem força na luta brava da cidade. Na mão a garrafa branca não tem tempo de dizer as coisas que lhe atribuo nem o moço leiteiro ignaro, morador na Rua Namur, empregado no entreposto, com 21 anos de idade, sabe lá o que seja impulso de humana compreensão. E já que tem pressa , o corpo vai deixando à beira das casas uma apenas mercadoria. E como a porta dos fundos Também escondesse gente que aspira ao pouco de leite disponível em nosso tempo, avancemos por esse beco, peguemos o corredor, depositemos o litro... Sem fazer barulho, é claro, Que barulho nada resolve. Meu leiteiro tão sutil de passo maneiro e leve, antes desliza que marcha. É certo que algum rumor sempre se faz: passo errado, vaso de flor no caminho, cão latindo por princípio, ou um gato quizilento. E há sempre um senhor que acorda, resmunga e torna a dormir. Mas este acordou em pânico (ladrões infestam o bairro), não quis saber de mais nada. O revólver da gaveta saltou para sua mão. Ladrão? Se pega com tiro. Os tiros na madrugada liquidaram meu leiteiro. Se era noivo, se era virgem, Se era alegre, se era bom, não sei, é tarde para saber. Mas o homem perdeu o sono de todo, e foge para a rua. Meu Deus, matei um inocente. Bala que mata gatuno Também serve para furtar a vida de nosso irmão. Quem quiser que chame médico, polícia não bota a mão neste filho de meu pai. Está salva a propriedade. A noite geral prossegue a manhã custa a chegar mas o leiteiro estatelado, ao relento, Perdeu a pressa que tinha. Da garrafa estilhaçada, No ladrilho já sereno Escorre uma coisa espessa que é leite, sangue, não sei. Por entre objetos confusos, mal redimidos da noite, duas cores se procuram, suavemente se tocam, amorosamente se enlaçam, formando um terceiro tom a que chamamos aurora. Amar Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar? amar e esquecer, amar e malamar, amar, desamar, amar? sempre, e até de olhos vidrados, amar? Que pode, pergunto, o ser amoroso, sozinho, em rotação universal, senão rodar também, e amar? amar o que o mar traz à praia , o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha, é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia? Amar solenemente as palmas do deserto, o que é entrega ou adoração expectante, e amar o inóspito, o áspero, um vaso sem flor, um chão de ferro, e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma [ ave de rapina. Este o nosso destino: amor sem conta, distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas, doação ilimitada a uma completa ingratidão, e na concha vazia do amor a procura medrosa, paciente, de mais e mais amor. Amar a nossa falta mesmo de amor, e na [secura nossa Amar a água implícita, e o beijo tácito,e a [sede infinita. O poeta da canção Vinícius de Moraes Vinícius de Moraes “Se você quer ser minha namorada Ah, que linda namorada Você poderia ser...” Soneto de devoção Essa mulher que se arremessa, fria E lúbrica em meus braços, e nos seios Me arreta e me beija e balbucia Versos, votos de amor e nomes feios. Essa mulher, flor de melancolia que se ri dos meus pálidos receios A única entre todas a quem dei Os carinhos que nunca a outra daria. Essa mulher que a cada amor proclama A miséria e a grandeza de quem ama E guarda a marca dos meus dentes nela. Essa mulher é um mundo! – uma cadela Talvez... – mas na moldura de uma cama Nunca mulher nenhuma foi tão bela! Vinícius de Moraes “Se você quer ser minha namorada Ah, que linda namorada Você poderia ser...” Soneto de devoção Essa mulher que se arremessa, fria E lúbrica em meus braços, e nos seios Me arreta e me beija e balbucia Versos, votos de amor e nomes feios. Essa mulher, flor de melancolia que se ri dos meus pálidos receios A única entre todas a quem dei Os carinhos que nunca a outra daria. Essa mulher que a cada amor proclama A miséria e a grandeza de quem ama E guarda a marca dos meus dentes nela. Essa mulher é um mundo! – uma cadela Talvez... – mas na moldura de uma cama Nunca mulher nenhuma foi tão bela! Mário Quintana A rua dos cataventos – 1940. O aprendiz de feiticeiro – 1950. Pé de pilão – 1975. Quintanares – 1976.
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