Buscar

CRIMES PRETERDOLOSOS

Prévia do material em texto

CRIMES PRETERDOLOSOS
O crime preterdoloso é uma espécie de crime agravado pelo resultado, no qual o agente pratica uma conduta anterior dolosa, e desta decorre um resultado posterior culposo. Há dolo no fato antecedente e culpa no consequente. [ 1 ] 
Exemplo: Lesão Corporal seguida de morte (art. 129
Carregando...
9, § 3º º, CP
Carregando...
P). 
A Doutrina, em sua maioria, é silente, mas é possível extrair do próprio conceito os seguintes elementos[ 2 ]: 
a) Conduta dolosa direcionada a determinado resultado (dolo no antecedente). 
b) Provocação de um resultado culposo mais grave que o desejado (culpa no consequente). 
c) Nexo causal. 
1. Cf
Carregando...
. Gomes, Luiz Flavio; Garcia-Pablo de Molina, Antonio. Direito penal parte geral, cit., p. 422. 
2. Cf . Cunha, Rogério Sanches. Direito penal parte especial, cit., p. 52.
O crime preterdoloso, também chamado de crime híbrido, está previsto no artigo 19
Carregando...
, do CP
Carregando...
com a seguinte redação: 
Art. 19 - Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente. 
No crime preterdoloso, o agente pratica um crime distinto do que havia projetado cometer, advindo resultado mais grave, decorrência de negligência, imprudência ou imperícia. Cuida-se, assim, de espécie de crime qualificado pelo resultado, havendo verdadeiro concurso de dolo e culpa no mesmo fato [dolo no antecedente (conduta) e culpa no consequente (resultado)]. 
O dispositivo legal indica a existência de casos em que o resultado qualificador advém de dolo e culpa. Apenas no segundo caso fala-se em delito preterintencional (preterdoloso). Quando o resultado mais grave advém de caso fortuito ou força maior, não se aplica a qualificadora, ainda que haja o nexo causal. 
Por fim, os crimes preterdolosos não admitem a tentativa, pois neles o agente não quer, nem aceita, o resultado final agravador. 
Vale dizer que o tema em estudo foi objeto de questionamento no concurso do Ministério Público/DF em 2005 e a assertiva incorreta dispunha: A combinação entre dolo (no antecedente) e a culpa (no consequente) é essencial para a caracterização dos crimes qualificados pelo resultado . 
Como distinguir o crime preterdoloso dos demais delitos?
Taísa Caroline dos Santos Machado
 
 
Resumo: O trabalho exposto faz referência ao crime preterdoloso, um assunto amplamente discutido e que tem como base a análise subjetiva do delito. Não deve haver controvérsia com relação à presença da imputação objetiva e dos elementos do fato material, pois estes já devem estar implícitos para que se chegue a indagação da existência ou não da prática desta espécie de crime. A discussão vai além, abordando temas resididos nos elementos subjetivos e na questão da tipicidade. Os principais alvos de estudo aqui abordados são o dolo e a culpa, estabelecendo conceitos, parâmetros e limitações para que se possa, em fim, afirmar se houve ou não o preterdolo, daí a importância da produção deste artigo científico e dos elementos aqui descritos.
Sumário: Introdução; 1. Adequação típica; 2. Fato típico; 3. Teoria finalista da ação; 4. O crime doloso; 5. O crime culposo; 6. O crime preterdoloso; Conclusão; Referências.
Palavras-chaves: Tipificação; fato material; elementos subjetivos; tipo misto; dolo no antecedente; teoria do consentimento; culpa no conseqüente; desqualificação; previsibilidade; cuidado objetivo.
Introdução
Diante dos questionamentos feitos acerca do preterdolo em relação à doutrina, fez-se necessário o estudo e a exposição de tal tema, de maneira técnica, permitindo a compreensão. O objetivo é ampliar o conhecimento acerca do mesmo e estimular o debate, devido, sobretudo, a sua importância e, ao mesmo tempo, sua complexidade, tendo em vista a dimensão teórica que lhe é devida. É um tema bastante relevante e passível de discussão, pois envolve principalmente elementos subjetivos do crime, o que, de maneira alguma, é fácil de se
analisar. O presente trabalho busca desenvolver estes conceitos e atribuir ao preterdolo novo significado, enfatizando a questão da previsibilidade, elemento necessário para se chegar às devidas conclusões. Para fins didáticos, o artigo segue com uma divisão de temas essenciais, para facilitar o processo de análise e absorção do conteúdo de maneira prática, discutindo, necessariamente, o conceito de fato típico, a teoria finalista da ação, as espécies de dolo e culpa, a presença ou não do cuidado objetivo, a previsibilidade e a teoria do consentimento.
 
1. Adequação típica 
O Direito Penal é constituído pelo  conjunto  de  normas estabelecidas  pelo  Estado
com  a finalidade de combater o crime. Porém, muitas vezes essas normas não estão dispostas de maneira simples, dificultando a realização de uma adequação típica. Soler (1978, v.2, p.166) ensinava que este problema deve-se ao fato dos tipos não serem valores numéricos, nem puros conceitos lógicos, e, sim, normas que contém uma essência que forma um complexo sistema de relações entre uma figura e outra. Para resolver casos como esse é preciso que se faça uma análise intensa sobre o fato, indagando-se a que figura típica ele deveria ser enquadrado, dentre as muitas que a ele podem ser aplicadas. Jesus (2002, v.1, p.270) faz referência ao assunto afirmando que “na maioria das vezes o problema assume feição de uma operação complexa, seja porque a conduta pode ser analisada sob diferentes pontos de vista, seja porque várias leis podem ser aplicadas sobre ela”. 
E é nesse contexto que está a problemática da análise do crime preterdoloso ou preterintencional, que é um tipo misto, em que há uma conduta que é dolosa, por dirigir-se a um fim típico, e que é culposa pela causação de outro resultado, mais grave, que não era objeto do crime fundamental, pela inobservância do cuidado objetivo.
Também nos sugere Jesus (2002, v.1, p.270) que o crime de preterdolo apresenta-se, na maioria das vezes, sobre a forma de adequação típica de subordinação mediata (ampliada ou por extensão) o fato de não se enquadrar imediatamente na norma penal incriminadora considerada, necessitando para isso do concurso de outra disposição. Ocorre que, as vezes, o tipo se aplica a um fato sem que este contenha todos os elementos daquele. Assim, na tentativa de homicídio por ex., o fato não se amolda de maneira imediata no art. 121, havendo necessidade de empregar-se a norma contida na parte geral que o descreve (art.14). Há, então, uma ampliação temporal da figura típica, uma vez que, com o concurso de outra disposição, o tipo não abrange somente o momento consumado do crime (morte da vítima), estendendo-se também ao instante anterior em que a conduta se dirigia à completa realização do modelo legal. Na participação existe ampliação espacial e pessoal do tipo, pois a figura típica, com o concurso de regra do art. 29, não abrange somente o comportamento que se amolda imediatamente em seu núcleo, estendendo-se também às condutas que, de qualquer modo, concorrem para a realização do crime.
Nos crimes preterdolosos ou preterintencionais, não é suficiente a existência de um nexo de causalidade objetiva entre a conduta antecedente (que constitui o primum delictum) e o resultado agravador. Assim a relação entre a conduta e o resultado, embora necessária, não é suficiente para o processo de adequação típica, uma vez que se exige a relação de causalidade subjetivo-normativa, ou seja, é necessário que haja um liame normativo entre o sujeito que pratica o primum delictum e o resultado qualificador. Este só é imputado ao sujeito quando previsível (culpa). Por isto que ele é chamado preterdoloso, porque vai além do dolo.
2. Fato típico
Para que haja crime é preciso, em primeiro lugar, uma conduta positiva ou negativa. Mas nem todo comportamento do homem constitui delito. Em face do princípio da reserva legal, somente os descritos pela lei penal podem assim ser considerados. Somente o fato típico, ou seja, o fato que se amolda ao conjunto de elementos descritivos do crimecontido na lei, é penalmente relevante.
Entende-se por fato típico o comportamento humano (positivo ou negativo) que provoca um resultado (em regra), e é previsto em lei penal como infração. O fato típico é composto pelos seguintes elementos: conduta humana dolosa ou culposa; resultado; nexo de causalidade entre a conduta e o resultado; enquadramento no fato material (conduta, resultado e nexo) a uma norma penal incriminadora. Não basta, porém, que o fato seja típico para que exista crime. É preciso que seja contrário ao direito, antijurídico (análise do crime sob o aspecto formal). 
Para que se chegue a conclusão de que o crime é preterdoloso não deve haver controvérsia nos autos a respeito da presença dos elementos do fato material: conduta, resultado e nexo de causalidade. Os pontos a discutir residem no elemento subjetivo-normativo (dolo ou culpa) e na conseqüente tipicidade (crime doloso ou preterdoloso).
3. A teoria finalista da ação
A teoria finalista da ação foi adotada pelo nosso código na reforma de 1984, deslocando o dolo e a culpa do terreno da culpabilidade para o campo do tipo penal. Em face disso, considerando o crime como fato típico e antijurídico, o primeiro elemento daquele é a conduta dolosa ou culposa, dirigida a uma finalidade. Assim, para que um fato seja típico, é preciso que haja dolo ou culpa, sem o que não há crime.
Seguindo-se a teoria da ação finalista,  para casos de crimes  preterdolosos,  haverá 
uma decisão desclassificatória, entendendo não haver dolo eventual no tocante ao resultado, mas a existência da culpa consciente, caracterizando o fato como delito preterdoloso ou preterintencional.
Mas o que difere o dolo eventual da culpa consciente?
4. O crime doloso
Dolo é a vontade de concretizar as características objetivas do tipo. Constitui elemento subjetivo implícito do tipo. Não é a simples representação do resultado o que constitui um acontecimento psicológico. Exige representação e vontade, sendo que esta pressupõe aquela, pois o querer não se movimenta sem a representação do que se deseja. Assim, não basta a representação do resultado, exigindo-se vontade de realizar a conduta e de obter o resultado (ou assumir o risco de produzi-lo).
O dolo pode ser direto e indireto. No dolo direto o sujeito visa a certo e determinado resultado (Código Penal, art. 18, 1ª parte).  Ex.: o agente desfere golpes de faca na vítima com a intenção de matá-la. O dolo se projeta de forma direta no resultado morte. Há dolo indireto quando a vontade do sujeito não se dirige a certo e determinado resultado.
O dolo indireto apresenta duas formas: dolo alternativo e dolo eventual. Há dolo alternativo quando a vontade do sujeito se dirige a um ou outro resultado. Ex.: o sujeito desfere golpes de faca na vítima com intenção alternativa: ferir ou matar. Ocorre o dolo eventual, também chamado condicionado, quando o sujeito assume o risco de produzir o evento, prevê, admite e aceita o risco de produzi-lo (Código Penal, art. 18, I, parte final). Ele não o quer, pois se assim o fosse haveria dolo direto. Antevê o resultado e age, ou seja, a vontade não se dirige diretamente ao fim (agente não quer o evento), mas sim à conduta, prevendo que esta pode produzir aquele (vontade dirigida indiretamente ao evento). Percebe que é possível causá-lo e, não obstante, realiza o comportamento. Entre desistir da conduta e poder causar o resultado, este se lhe mostra indiferente.
Uma teoria  bastante  útil  para  identificar  o dolo eventual  é a teoria positiva  do consentimento, formulada por Costa Júnior (1991, v.1, p.83), que afirmava ocorrer tal tipo de dolo quando o agente diz a si mesmo: “seja assim, ou de outra maneira, suceda isto ou aquilo, em qualquer caso agirei”.
5. O crime culposo 
A culpa do delito preterdoloso exige os mesmos elementos do crime culposo: especialmente    conduta     culposa,    descumprimento    do    cuidado     objetivo   necessário, 
previsibilidade do resultado e ausência de previsão.
Para entender melhor este assunto faz-se necessária uma exposição técnica acerca dos temas mencionados:
A culpa consiste na prática não intencional do delito, deixando o agente de observar um dever de atenção e cuidado. Culpa é a conduta voluntária que produz um resultado antijurídico não querido, mas previsível (ou excepcionalmente previsto - culpa consciente), que podia, com a devida atenção ser evitado. A conduta torna-se típica a partir do instante em que não se manifesta o cuidado necessário por parte do agente, pois a todos no convívio social, é determinada a obrigação de realizar condutas de forma a não produzir danos a terceiros. É o denominado cuidado objetivo.
Além da idéia do cuidado objetivo, surge no conceito de culpa, a questão da previsibilidade. Previsibilidade é a possibilidade de se prever o resultado. Em suma, é necessário que o sujeito não tenha previsto o resultado para que sua conduta seja considerada culposa, pois a previsão é elemento do dolo. Na culpa, o resultado é previsível, mas não é previsto pelo sujeito. Daí falar-se que culpa é a imprevisão do previsível. Porém, excepcionalmente, a previsão pode integrar a culpa. Essa exceção ocorre nos casos referentes à culpa consciente, em que o sujeito prevê o resultado, mas acredita que o mesmo não ocorrerá, por confiar demasiadamente na sua perícia ou nas circunstâncias. Há, pois, previsão no sentido de que o caso não ocorrerá.
Devem estar presentes na culpa consciente, dentre outros requisitos comuns: 1º) vontade dirigida a um comportamento que nada tem com a produção do resultado ocorrido. 2º) crença sincera de que o evento não ocorrerá em face da sua habilidade ou interferência de circunstância impeditiva, ou excesso de confiança. A culpa consciente contém um dado importante: a confiança de que o resultado não venha a produzir-se, que se assenta na crença em sua habilidade na realização da conduta ou na presença de uma circunstância impeditiva. 3º) erro de execução.
6. O crime preterdoloso
Diante do exposto, conclui-se que, para que haja crime preterdoloso devem-se observar os elementos subjetivos presentes no momento da conduta, definindo-se se houve a ocorrência de previsão sobre o resultado e se o agente assumiu ou não o risco de produzi-lo. Essas características irão delimitar a possibilidade de existência do dolo eventual ou da culpa consciente no que se refere ao resultado da conduta. A culpa consciente difere do dolo eventual na medida em que neste o agente tolera a produção do resultado, sendo-lhe o evento indiferente (tanto faz que ocorra ou não). Na culpa consciente, ao contrário, o agente não quer o resultado, nem o risco lhe é tolerante ou indiferente. O evento lhe é representado (previsto), mas confia em sua não-produção e, apesar de sabê-la possível, acredita sinceramente poder evitá-lo, o que só não acontece por erro de cálculo ou erro de execução.
Os crimes preterdolosos e os demais qualificados pelo resultado são regulados pelo art. 19: “pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responderá o agente que houver causado ao menos culposamente”. A expressão “ao menos culposamente” indica a existência de casos em que o resultado qualificador admite dolo, como em algumas hipóteses de lesão corporal grave e gravíssima (art. 129, § 2º, III). Quando isso ocorre, não se pode falar em crime preterdoloso, mas simplesmente em delito qualificado pelo resultado.
 É importante fazer uma distinção entre preterdolo e culpa imprópria, para que estes não se confundam. Na culpa imprópria há culpa no antecedente e dolo no conseqüente, ao contrário do que ocorre no preterdolo. Ela está disposta no Código Penal, art. 20, § 1º, 2ª parte, e 23, parágrafo único. A culpa imprópria é, na realidade, culpa por equiparação: o C.P. equipara para fins de pena o delito doloso ao culposo. É o caso do erro de tipo inescusável (evitável, vencível) nas discriminantes putativas, previstas no art. 20, § 1º, parte final (matar alguém, supondo erroneamente que estava sendo atacado - legítima defesa putativa).
ConclusãoPortanto, para que um delito seja considerado preterdoloso é preciso que o agente dirija sua conduta a uma intenção inicial (primum delictum), agindo dolosamente em relação a esta; e tenha como resultado algo mais grave que o pretendido pelo sujeito (resultado qualificador) atribuindo-se a este último a culpa consciente, pois o agente, tendo previsto o resultado no momento de sua conduta, acreditava sinceramente poder impedi-lo, ocorrendo aqui excesso de confiança e erro de execução. É a chamada “preterintencionalidade substitutiva”. O agente quer um minus e seu comportamento causa um majus, de maneira que se conjugam o dolo na conduta antecedente e a culpa no resultado (conseqüente). Daí falar-se que o crime preterdoloso é um misto de dolo e culpa: dolo no antecedente e culpa no conseqüente.
É importante ampliar-se o estudo acerca desse tema, pois, como já fora mencionado, envolve espécies bastante subjetivas do crime, as quais não são fáceis de se analisar. A desclassificação da tipicidade (de dolo eventual para preterdolo) terá grande repercussão no que diz respeito às penas aplicadas, que possuem diferença de tempo relativamente significante. Se há possibilidade do delito ser tipificado no plano do preterdolo, é relevante que haja um grande esforço, por parte da defesa, para que se faça sobressair esta tese, pois estaríamos diante de uma das circunstâncias mais relevantes aos seres humanos, contemplada até mesmo pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e em nossa Constituição Federal: a liberdade, fundamento que dá ânimo à vida e à perspectiva de um futuro próspero ao réu, que ao ser privado da liberdade, depois de julgado, o seja por tempo justo e próprio do crime cometido, e não por um demasiadamente prolongado, por imprudência ou imperícia da defesa ou incompreensão dos julgadores.
Referências Bibliográficas:
BRASIL. Código Penal. 4ed. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2002.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 4ed. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2002.
COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Curso de Direito Penal, Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 1991.
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal, Parte Geral. 25ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
NÚÑEZ, Juan Antônio Martos. La Preterintencionalidad. Revista de Direito Penal y Criminologia. Madri: Universidad Nacional de Educacion, 1993.
SOLER. Derecho Penal Argentino. Buenos Aires: TEA, 1978.
JURISPRUDENCIA
TJ-SP - Apelação : APL 12468820068260400 SP 0001246-88.2006.8.26.0400 • Inteiro Teor 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Registro: 2012.0000388725
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0001246-88.2006.8.26.0400, da Comarca de Olímpia, em que é apelante RAFAEL FERNANDO DA COSTA, é apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO.
ACORDAM, em 2ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO ao recurso. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores IVAN MARQUES (Presidente sem voto), IVO DE ALMEIDA E ALMEIDA SAMPAIO.
São Paulo, 6 de agosto de 2012.
ALEX ZILENOVSKI
RELATOR
Assinatura Eletrônica
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
VOTO Nº 2.474 RELATOR – 2ª CÂMARA
APELAÇÃO Nº. 0001246-88.2006.8.26.0400
COMARCA : OLÍMPIA
APELANTE: RAFAEL FERNANDO DA COSTA
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO
LESÃO CORPORAL Crime Preterdoloso Evento morte -Absolvição Inadmissibilidade Existência de prova segura da autoria e materialidade do delito Hipótese em que a vítima foi atingida por um pedaço de tijolo e faleceu três dias depois por meningite purulenta - Nexo causal comprovado Legítima Defesa afastada Condenação mantida.
Vistos.
Ao relatório da r. sentença (fls.154/160), acrescenta-se que RAFAEL FERNANDO DA COSTA foi condenado por infringir o artigo 129
Carregando...
, § 3º
Carregando...
, do Código Penal
Carregando...
, à pena de quatro anos de reclusão, no regime inicial semiaberto.
Isso porque, no dia 13 de janeiro de 2006, o acusado ofendeu a integridade física de Alex Siqueira de Souza, tendo-lhe produzido lesão que acarretou sua morte.
Irresignado, recorre, postulando o reconhecimento da legítima defesa e da ausência de dolo. Também pleiteou a aplicação de regime aberto para o cumprimento da pena. Requereu, por fim, a absolvição ou a redução da pena imposta (fls.185/189).
A D. Procuradoria manifesta-se pelo improvimento do apelo (fls. 199/201).
É o relatório.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
A materialidade encontra-se estampada a fls. 46 e v.
Interrogado em Juízo (fls.91/92), o apelante afirmou que atirou a pedra na vítima, porém, para se defender. Disse que não pediu dinheiro à vítima. Afirmou que surgiram dois rapazes, que estavam com a vítima, para agredi-lo. Disse que não usava drogas na época dos fatos. Afirmou que atirou a pedra porque a vítima continuava a vir em sua direção. Asseverou que a vítima portava uma faquinha branca.
Luiz Carlos (fls.188) não presenciou os fatos, mas teve conhecimento de que o apelante agrediu um rapaz.
Anderson Carlos (fls.119) ficou sabendo que um rapaz desferiu uma pedrada na cabeça do filho do Jacaré e disseram que a causa teria sido cinco reais.
Sebastião (fls.120) reconheceu em Juízo o apelante como sendo a pessoa que atirou a pedra na cabeça da vítima, que corria dele.
Edney (fls.121) disse que socorreu a vítima, atingida na cabeça, ao lado da orelha, por um pedaço de tijolo. Soube que a vítima saiu de bicicleta e foi atingida por um tijolo jogado contra ela. No interior do veículo, a vítima disse-lhe que o apelante queria cinco reais para fumar droga e, como não tinha, foi agredida. Disse que a vítima afirmou que discutiu verbalmente com o apelante e quando percebeu que seria agredida por ele, saiu correndo de bicicleta, mas foi atingida pelo tijolo.
Gleice (fls.122) afirmou que era companheira da vítima. Afirmou que não presenciou os fatos. Disse que a vítima lhe contou que estava em companhia de uns amigos quando o apelante o chamou. Afirmou que a vítima, seu marido, devia cinco reais ao apelante. A vítima também lhe disse que pediu ao apelante que fosse buscar os cinco reais na lanchonete da mãe dele (vítima). Também afirmou que a corrente da bicicleta escapou e a vítima a colocou de volta e, quando levantou, teria sido atingida por uma tijolada.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
O laudo do exame necroscópico concluiu: “... a morte foi consequência de meningite purulenta devido à contaminação por agentes biológicos de hematoma subdural, produzido por traumatismo crânio-encefálico devido à ação de agente contundente” (fls.46 e v.).
A prova é francamente hostil ao réu.
O nexo causal encontra-se devidamente demonstrado.
Não se discute, por outro lado, animus necandi. Trata-se de ação penal, na qual se irroga ao apelante o crime de lesão corporal seguida de morte.
Tal delito, capitulado no artigo 129
Carregando...
, § 3º
Carregando...
, do Código Penal
Carregando...
, é preterdoloso, ou seja, o agente age com dolo para a ofensa a integridade física da vítima e culpa quanto ao evento morte.
Destarte, em nada favorece ao apelante sua afirmação de que não tinha a intenção de provocar a morte da vítima.
Por outro lado, não há que se falar em legítima defesa.
A versão apresentada pelo apelante restou absolutamente isolada nos autos, não havendo, diante da prova colhida, o mínimo indício de que o apelante teria agido em legítima defesa.
O apelante não logrou, destarte, demonstrar a ocorrência da alegada excludente de ilicitude, principalmente porque há relatos dando conta de que a vítima foi atingida enquanto tentava fugir do local do evento.
Assim, a condenação era mesmo a única solução consentânea com a evidência dos autos.
Também agiu bem a Magistrada ao compensar o mau antecedente com a atenuante da menoridade, restando a pena fixada em 04 (quatro) anos de reclusão.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São PauloInviável a substituição da pena corporal por restritiva de direitos, pois se trata de crime cometido com violência à pessoa.
Por fim, o regime prisional fixado foi o mais adequado em razão do mau antecedente reconhecido.
Inviável, portanto, a fixação do regime aberto para início do cumprimento da reprimenda, por não se mostrar suficiente para a prevenção e repressão deste delito.
Ante o exposto, NEGA-SE PROVIMENTO ao recurso.
TJ-SP - Apelação : APL 00406884420128260564 SP 0040688-44.2012.8.26.0564 • 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Registro: 2014.0000724943
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0040688-44.2012.8.26.0564, da Comarca de São Bernardo do Campo, em que é apelante CARLOS ANTONIO DA COSTA, é apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO.
ACORDAM , em 8ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO ao recurso, mantendo a sentença em sua integralidade. V.U", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores LOURI BARBIERO (Presidente) e MARCO ANTÔNIO COGAN.
São Paulo, 6 de novembro de 2014
ALCIDES MALOSSI JUNIOR
RELATOR
Assinatura Eletrônica
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
APELAÇÃO Nº 0040688-44.2012.8.26.0564
APELANTE: CARLOS ANTONIO DA COSTA
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
COMARCA: SÃO BERNARDO DO CAMPO
VOTO nº 473
APELAÇÃO. LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE. 
Recurso defensivo. Agente que desfere golpe fatal na vítima após ser atingido por um soco. Afastamento da legítima defesa pela desproporcionalidade do golpe desferido. Recurso não comporta provimento.
VISTOS.
Ao relatório da respeitável sentença (fls. 125/131), que ora se adota, acrescenta-se que o réu CARLOS ANTONIO DA COSTA foi condenado pelo crime previsto no artigo 129
Carregando...
, § 3º
Carregando...
, do Código Penal
Carregando...
, à pena de 04 anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade, e o pagamento de prestação pecuniária em favor da viúva da vítima, no valor de dez salários mínimos, vigentes na data do efetivo pagamento (sentença publicada certidão fls.134).
Apela o acusado buscando sua absolvição com fulcro na ocorrência de causa de exclusão de ilicitude fundada em legítima defesa, ou subsidiariamente, em caso de condenação, pleiteia a redução da prestação pecuniária para dois salários mínimos (razões fls.136/146).
Trânsito em julgado para a Acusação em 07 de abril de 2014 (certidão de fls.147).
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Recurso devidamente processado, com manifestação da douta Procuradoria Geral de Justiça pelo seu não provimento (fls.153/155).
É o relatório.
Conforme descrito na inicial acusatória, CARLOS ANTONIO DA COSTA, no dia 03 de agosto de 2012, por volta das 19h30min, na Avenida Jeronymo Moratti, nº 984, Jardim Detroit, na Cidade de São Bernardo do Campo, teria ofendido dolosamente a integridade corporal de Alexandre Reche de Souza, causando-lhe lesões corporais que resultaram em sua morte, sendo este último evento causado culposamente pelo apelante (denúncia de fls. 01-d/02-d, formalmente recebida em 02 de outubro de 2012).
O recurso não comporta provimento.
Segundo apurado nos autos, o acusado e a vítima possuíam vagas na mesma garagem de um condomínio edifício, e no dia dos fatos iniciaram discussão em razão do carro da vítima se encontrar mal estacionado na vaga.
Ao que se depreende, a esposa da vítima estava aprendendo a dirigir, e seu instrutor havia estacionado o veículo na garagem de forma a atrapalhar o apelante. A vítima foi chamada para ajustar o carro, fato que deu início a uma discussão entre o apelante e a vítima. Segundo consta, a vítima teria dado um soco no apelante, e quando esse se levantou, retribuiu a ofensa física, desferindo um soco na vítima, que caiu no chão, bateu a cabeça e ficou desfalecido.
O óbito da vítima está documentado pelo laudo de exame necroscópico (fls.16).
Os relatos da esposa e da vizinha da vítima, que presenciaram os fatos, convergem para a conclusão de que o apelante cometeu o crime que lhe foi imputado na inicial acusatória.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
A esposa da vítima, Cícera da Paz Barros de Souza, afirmou que a vítima desceu para garagem e entrou no carro para manobrá-lo, ao contrário do que alegou o apelante, que afirmou em seu interrogatório que a vítima não chegou a ingressar no veículo:
Observe-se:
“ (...) meu marido estava entrando com vaga (sic) com nosso carro na garagem e o Carlos estava do lado xingando e ofendendo meu esposo, falando palavrão. E meu esposo falava 'Carlos, fica tranquilo, não precisa disso tudo', e ele do lado xingando meu esposo de burro, idiota, que ele era um fdp, e uns palavrões assim mais horríveis, e meu esposo dentro do carro e ele falava 'para com isso', eu falei 'não adianta vocês ficarem discutindo, é só uma vaga de garagem'.” (pág. 89)
Releva notar que, embora a testemunha Cícera tenha afirmado que foi seu marido quem desferiu o primeiro soco, o apelante, após revide, mesmo diante da vítima já desmaiada, continuava a agredi-la verbalmente, demonstrando inequivocamente o dolo com que agiu.
“ (...) Carlos do lado continuava xingando, e falava 'esse daí já era, eu dei na nuca pra ele morrer', eu falava moço, pelo amor de Deus, fica quieto, para de falar, eu estou tentando socorrer meu marido, e ele falava o tempo todo 'esse aí já era, é para ele aprender, eu dei na nuca para ele morrer'(...).” (pág. 91).
A testemunha Marinete Francisca da Conceição, vizinha da vítima,
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
relatou que não presenciou toda a briga, mas escutou da janela de seu apartamento o desespero de alguém que gritava “para, para, para”, e quando foi verificar o que estava acontecendo visualizou a vítima caindo de costas ao chão.
A depoente igualmente afirmou que o apelante, após a queda da vítima, continuava gritando e lhe ofendendo:
(...) É, aí eu saí da janela e corri, quando cheguei lá estava o corpo assim e ele ao lado falando assim 'se precisar eu faço de novo', e ele ficava lá provocando, a gente tentando socorrer a vítima (...) Ele ficou falando que deu uma paulada e daria de novo (...)”.
A testemunha ainda relatou que quando a vítima já estava no chão, viu o apelante se armando para novamente golpeá-la mesmo já desacordada:
“MP: A senhora falou que viu ele dando um soco quando o Alexandre já estava caído? É, quando o Alexandre já estava caído, ele armou a mão para dar na cara do Alexandre. Da janela eu vi. (...) Mas não viu ele batendo? Não vi, não posso afirmar porque não vi”.
Compulsados os autos e analisado o conjunto probatório constatouse que a intenção do apelante, no mínimo, era de lesionar, situação denominada por nossa doutrina como crime preterdoloso.
Em consequência, a alegação de legítima defesa não merece prosperar. Para a caracterização da excludente de ilicitude fundada na legítima defesa exige-se que se trate de agressão atual ou iminente, injusta e que os meios utilizados sejam suficientes para repeli-la.
No caso em tela, é inconcebível aceitar que em razão de uma briga
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
por vaga de garagem alguém venha a perder a vida, sendo inaceitável, portanto, a alegação de que o meio utilizado foi adequado.
O golpe desferido pelo apelante foi absolutamente desproporcional a ofensa recebida, tanto que a vítima caiu desfalecida logo em seguida.
Nesse sentido ensina com proficiência Julio Fabbrini Mirabete:
“Entende-se que, na verdade, o agente deve utilizar, entre os meios de que dispõe para sua defesa, no momento da agressão, aquele que menor lesão pode causar. Além disso, é necessário que seja moderado na reação, que não use o meio de forma a cometer excesso na defesa; só,assim, estará caracterizada a descriminante.” (Código Penal
Carregando...
Interpretado, Julio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini, 7ª edição, editora Atlas, pág.123).
Ademais, as testemunhas afirmaram com clareza que o apelante queria continuar agredindo a vítima, mesmo após ela estar desacordada, afastando, dessa forma, a possibilidade de reconhecimento da legítima defesa.
O conjunto probatório é claro e permite condenação firme e segura, não se podendo falar em absolvição pelo reconhecimento de legítima defesa. Bem provados, portanto, materialidade e autoria do delito.
No que toca ao pleito de redução da prestação pecuniária, melhor sorte não merece à Defesa.
Considerando as gravíssimas consequências do fato para a vítima e seus familiares, o apelante já foi até beneficiado com a aplicação de pena mínima, nada tendo, portanto, a reclamar. Nesse sentido, bem asseverou o douto Representante do Ministério Público em primeira instância: “Ora, a morte de uma
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
pessoa, sem sombra de dúvidas, supera o valor de 10 salários mínimos, sendo cabível à viúva da vítima, ainda pleitear a correta reparação do dano no Juízo Cível (...)”.
Do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo a sentença em sua integralidade.
Alcides Malossi Junior
DESEMBARGADOR ELATOR

Continue navegando