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Formas apropriação pública DE EB2 1617

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Bernardo Sarrasqueiro, N.: 74211 
Catarina Cardoso, N.: 73386 
Filipa Teles, N.: 73052 
João Pedro Meira, N.: 73383 
Mariana Gonçalves, N.: 73319 
EB2 
Formas de apropriação pública de 
empresas privadas: 
DAS NACIONALIZAÇÕES ÀS GOLDEN SHARES 
 
Licenciatura de Economia 
Direito Económico 
Ano letivo 2016-2017 
Professor Pedro Quartin Graça Simão José 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Índice 
. 
Introdução ..................................................................................................................................... 1 
1. Formas de apropriação pública ............................................................................................. 2 
 1.1. Definição e enquadramento legal ...................................................................................... 2 
 1.2. O Estado empresário .......................................................................................................... 3 
 1.3. O setor empresarial do Estado ........................................................................................... 4 
 1.4. Estado regulador ................................................................................................................ 5 
2. Nacionalizações: um processo complexo em 42 anos de democracia .................................. 6 
 2.1 Um conceito económico ..................................................................................................... 6 
 2.2. Evolução jurídico-constitucional do Regime de Nacionalizações ..................................... 7 
 2.3. Nacionalizações de 75/76: uma reação político-ideológica ............................................... 9 
 2.4. O Socialismo Democrático e a preparação para a entrada na CEE ................................. 10 
 2.5. Influência do Direito Comunitário ................................................................................... 11 
 2.6. Um exemplo de exceção: o caso do BPN ........................................................................ 13 
3. Poderes especiais de apropriação: as golden shares ........................................................... 14 
 3.1 Definição e enquadramento legal ..................................................................................... 14 
 3.2. Contexto histórico das Golden Shares ............................................................................. 14 
 3.3. Razões governamentais para as golden shares ................................................................ 15 
 3.4. Legalidade das Golden Shares ......................................................................................... 15 
 3.5. Golden Shares históricas: EDP, PT e REN ...................................................................... 16 
 3.6. Influência do Direito Comunitário e as reações de outros estados membros .................. 17 
Conclusão .................................................................................................................................... 19 
Referências bibliográficas ........................................................................................................... 21 
 
Introdução 
O trabalho que se apresenta de seguida insere-se numa das temáticas de maior 
discussão e controvérsia política e económica a que assistimos durante o período de 
vigência do Memorando de Entendimento com a Troika - a apropriação públicas dos 
meios de produção – e ainda hoje continua a ser mote para inúmeros artigos científicos 
do ponto de vista doutrinário, que intimamente se tocam com o modelo de crescimento 
económico levado a cabo nas diferentes partes do mundo, principalmente no ceio da UE. 
No que toca à sua forma, a apropriação pública tem sofrido alterações significativas 
nos últimos 70 anos, desde o Estado Novo, passando pelo período revolucionário das 
nacionalizações de 75/76, bem como, pelas reprivatizações da década de 90, chegando às 
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novas formas de apropriação por via de direitos especiais, como as golden shares ou mais 
recentemente à retoma de um conjunto de privatizações, entre 2011 e 2014. 
É através desta evolução cronológica e histórica que este trabalho se desenvolve, 
apresentando para cada um dos casos o enquadramento legal de âmbito nacional e quando 
possível, de âmbito comunitário, caracterizando-se do ponto de vista técnico cada um dos 
conceitos e exemplificando com casos práticos do conhecimento comum. 
No capítulo 1 apresenta-se essencialmente o enquadramento teórico ao tema, de acordo 
com um conjunto de definições, regulamentos e normas jurídicas necessárias ao 
conhecimento do leitor para a compreensão das temáticas desenvolvidas nos capítulos 
seguintes. 
O capítulo 2 permite-nos apresentar o impacto do Estado empresário na economia 
portuguesa, com especial destaque para o período revolucionário que se seguiu ao início 
da democratização do país. É através das nacionalizações de 75/76 e dos pressupostos 
económicos e doutrinários que estiveram por detrás das mesmas que se apresenta a 
evolução deste conceito na prática económica e na Lei portuguesa. 
Por fim, no capítulo 3 é apresentada uma forma especial de controlo da gestão de 
empresas reprivatizadas durante a década de 90 e que vigorou em Portugal até à vinda da 
Troika – as golden shares – que permitiram ao Estado manter sobre o seu poder de 
decisões atividades económicas consideradas de interesse nacional. 
1. Formas de apropriação pública 
1.1. Definição e enquadramento legal 
 
Em primeiro lugar é necessário enumerar o art. 83º da Constituição da República 
Portuguesa, no qual este afirma que “A lei determina os meios e as formas de intervenção 
e de apropriação pública dos meios de produção, bem como os critérios de fixação da 
correspondente indemnização.” 
Contudo, existem medidas diferenciadas das enumeradas no art. 83º, quando nos 
referimos às empresas privadas. Assim, segundo o número 3 do art. 86º “A lei pode 
definir setores básicos nos quais seja vedada a atividade às empresas privadas e a outras 
entidades da mesma natureza.” 
As funções da Lei descritas acima são exercidas, então pela Assembleia da República, 
já que esta, com a devida autorização do Governo em funções, tem o poder de legislar 
acerca dos “meios e formas de intervenção, expropriação, nacionalização e privatização 
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dos meios de produção e solos por motivo de interesse público, bem como critérios de 
fixação, naqueles casos, de indemnizações” [art. 165º, no1, al. l)]. 
Assim, só o Estado tem o poder de realizar nacionalizações. As restantes entidades 
públicas como os municípios e as Regiões Autónomas estão, portanto, excluídas. É, então 
possível definir nacionalização como um exemplo de expropriação, onde uma única 
unidade de propriedade privada é transferida, de forma forçada, para a propriedade 
pública. No caso de Portugal, o regime jurídico da apropriação pública dos meios de 
produção (objeto das nacionalizações) após o caso da nacionalização do BPN foi 
aprovado em 2008. 
Por outro lado, uma privatização é referida como uma estratégia que o Estado utiliza 
com o objetivo de reduzir ou modificar a sua intervenção na economia em prole do setor 
privado. Também o direito à indemnização é referido na Constituição da República 
Portuguesa, no seu art. 4º que enuncia que: 
“1) Aos titulares das participações sociais da pessoa coletiva, bem como aos eventuais 
titulares de ónus ou encargos constituídos sobre as mesmas, é reconhecido o direito a 
indemnização, quando devida, tendo por referência o valor dos respetivos direitos, 
avaliados à luz da situaçãopatrimonial e financeira da pessoa coletiva à data da entrada 
em vigor do ato de nacionalização. 
2) No cálculo da indemnização a atribuir aos titulares das participações sociais 
nacionalizadas, o valor dos respetivos direitos é apurado tendo em conta o efetivo 
património líquido.” 
1.2. O Estado empresário 
Na economia portuguesa o Estado desempenha dois papéis principais que são 
juridicamente reconhecidos: o de empresário e do de regulador. Estes papéis são uma 
consequência direta da evolução constitucional e doutrinária que a Intervenção do Estado 
na economia tem sofrido ao longo dos últimos anos. 
De uma forma geral o Estado empresário baseia-se no papel deste como produtor, 
prestador ou distribuidor de bens e serviços numa economia. 
O Estado empresário contrariamente ao que verificaremos para o Estado regulador, 
tem vindo a perder importância a nível constitucional, nomeadamente a partir da revisão 
de 1989. 
As imensas variações verificadas ao longo dos anos na importância do Estado como 
produtor deveram-se essencialmente a fatores políticos, económicos e jurídicos 
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específicos da realidade portuguesa, e também à evolução do papel do setor público 
empresarial. 
Podemos destacar o período entre o 25 de Abril de 1974 e 1988, em que se verificou 
um aumento da importância do Setor Empresarial do Estado (SEE) a nível económico, 
politico e social. Esta importância era marcada por dois principais preceitos 
constitucionais: 
1. “Principio de irreversibilidade das nacionalizações” - impedindo a privatização 
das empresas nacionalizadas; 
2. “Proibição do acesso do capital privado aos setores básicos da economia” - 
definindo que certos setores estavam vedados à iniciativa privada. 
A partir de 1989 inicia-se um período de reprivatizações, conjugado com um conjunto 
de serviços que passaram a ser concessionados a entidades privadas, reduzindo-se 
substancialmente o SEE, como analisaremos empiricamente mais à frente. 
Por fim, é importante referir que a redução deste setor ocorreu maioritariamente devido 
a opções internas de ordem politico-ideológica e a razões de ordem económica e 
financeira, como a necessidade de criação de receitas públicas. 
1.3. O setor empresarial do Estado 
O conceito de setor público empresarial (SPE) expandiu-se no DL n.º 133/2013 de 3 
de outubro, passando a integrar o SEE e o setor empresarial local. Esta integração tinha 
por objetivo harmonizar a integração jurídica e fortalecer o controlo financeiro da 
atividade empresarial a nível estatal e local. 
O SEE reúne todas as unidades produtivas do Estado, organizadas empresarialmente, 
integrando as empresas públicas e as empresas participadas. Estrategicamente, o Estado 
reúne empresas ou outras instituições que apresentam interesse público para a sociedade, 
no entanto, existem também situações em que o Estado é a única entidade interessada, 
como é o caso do setor das águas, assumindo o controlo, por inexistência de iniciativa 
privada. 
Para compreendermos melhor este conceito temos de definir os tipos de empresas que 
integram este setor do Estado. 
Empresas públicas são, hoje em dia, as entidades públicas empresariais e as 
organizações empresariais - sob a forma de sociedade de responsabilidade limitada nos 
termos da lei comercial - nas quais o Estado ou outras entidades públicas podem exercer, 
isolada ou conjuntamente, de forma direta ou indireta, uma influência dominante (art. 5.º, 
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9.º e 13.º do DL n.º133/2013). Estas empresas são de uma forma mais geral todas as 
sociedades “em mão estatal” (DL. n.º 319/94 de 24 de dezembro). 
Empresas participadas são aquelas em que o Estado ou outras entidades públicas, de 
caráter administrativo ou financeiro, detém uma participação permanente, de forma direta 
ou indireta (art. 7.º do DL n.º133/2013). 
Por fim, é importante referir que o Estado detém um enorme conjunto de participações 
indiretas, integradas em grupos económicos como a Parpública - Participações Públicas, 
SGPS, SA, e a Caixa Geral de Depósitos, S.A. 
As evoluções descritas nos subcapítulos 1.2. e 1.3. acerca do SEE são empiricamente 
apresentadas no gráfico 1, no qual é visível a diminuição substancial do mesmo na 
economia, identificável através da redução do contributo produtivo do SEE na economia 
portuguesa, reduzindo o peso 
do VAB do SEE no PIB 
português de 25%, em 1979 
para cerca de 3,8%, em 2013. 
Por outro lado a criação de 
emprego no setor empresarial 
do estado também diminui 
significativamente entre 
1979 (12%) e 2013 (3,1%). 
1.4. Estado regulador 
Para que a noção de 
Estado Regulador seja compreendida de uma melhor forma, é necessário, em primeiro 
lugar, proceder-se à definição do conceito de regulação. A regulação é então a reunião 
das medidas legislativas, administrativas e convencionadas, com as quais o Estado 
determina, controla ou influencia o comportamento de agentes económicos com o 
objetivo de evitar efeitos significativamente negativo das atividades económicas sobre 
interesses socialmente legítimos, conduzindo estes interesses para uma vertente 
socialmente aceitável. 
Com o regresso do predomínio liberal sobre o mainstream económico, as privatizações 
começaram a surgir na Europa e no resto do mundo. Perante as políticas de reprivatização 
e privatização novas questões levantaram-se, levando à reformulação do papel do Estado 
na economia. Foi, então, possível perceber que era necessário um estado regulador onde 
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1979 2003 2013
SEE na Economia Portuguesa: PIB e Emprego
Peso do VAB (SEE) no PIB Peso no Emprego
Gráfico 1
Fonte: OCDE e DGTF
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se defendia a concorrência e a libertação do estado das suas responsabilidades enquanto 
empresário. Nos anos 80 surge o conceito de estado regulador, que veio substituir o estado 
capitalista. A responsabilidade pela existência de concorrência foi atribuída às 
autoridades competentes e a regulação às agências reguladoras (BdP, CMVM, etc.). 
Contudo, apesar das mudanças radicais ocorridas, os apoiantes deste novo conceito de 
estado regulador nunca descartaram a hipótese de ainda existir uma parte de estado 
intervencionista para que o interesse público fosse defendido e salvaguardado. Um 
mercado regulado representaria assim, uma hipótese de o estado conseguir, quer proteger 
o interesse público, quer respeitar a ordem pública económica e regular os mercados 
financeiros. Assim, para que esta hipótese fosse atingida, segundo os liberais, a regulação 
deveria ser feita pelas agências reguladoras competentes e não pelo Estado. 
O Estado passou, assim, de produtor para regulador, onde já não é da sua 
responsabilidade a produção e distribuição direta de bens e serviços, mas sim a regulação 
e consequente supervisão da produção e distribuição, realizada por privados. 
Relativamente à Europa, ocorreu uma expansão do uso do termo “regulação”, 
associada aos princípios descritos anteriormente. A UE passou a denominar-se como um 
regulatory state. 
2. Nacionalizações: um processo complexo em 42 anos de 
democracia 
2.1 Um conceito económico 
Naturalmente a criação de setores públicos empresariais está ligada historicamente às 
nacionalizações. Em Portugal, foi após 11 de março de 1975 que a figura da empresa 
pública ganhou mais relevância política e económica devido às nacionalizações ocorridas 
neste período. 
Juridicamente, uma nacionalização é uma espécie de expropriação, traduzindo-se na 
transferência forçada, por ato de autoridade, de uma unidade económica da propriedade 
privada para a propriedade pública. 
No entanto, há que distinguir nacionalização de expropriação.Uma vez que uma 
expropriação stricto sensu consiste na desapropriação de um bem imóvel privado em 
benefício de uma entidade privada ou pública, por outro lado, uma nacionalização tem 
sempre por objetivo unidades económicas. A primeira assenta no direito de propriedade 
e a segunda tem por objetivo a propriedade dos meios de produção. 
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1 Eric N. Baklanoff, University of Alabama, Department of Economics, Finance & Legal Studies 
2 Art. 1º da CRP de 25 de abril de 1976 
3 Art. 2º da CRP de 25 de abril de 1976 
 
Posto isto, mais rigorosamente uma nacionalização consiste num ato político, sob a 
forma legislativa, implicando a transferência forçada de empresas privadas para a 
propriedade pública, na generalidade dos casos do Estado stricto sensu. Esta afeta o 
direito de propriedade e o direito de iniciativa privada, sendo a forma mais “radical” de 
apropriação pública dos meios de produção. 
2.2. Evolução jurídico-constitucional do Regime de Nacionalizações 
O conceito de nacionalização tal como o conhecemos hoje apenas é recebido em 
Portugal após a Revolução de 25 de Abril de 1974, na medida em que durante o período 
da ditadura o papel do Estado sobre a economia era claramente restritivo e moderado 
seguindo a índole do “sistema económico-político corporativo”1 que vigorava no Estado 
Novo, tal como previa a sua Constituição de 1933, onde se lê no seu artigo 33º: “O Estado 
só pode intervir diretamente na gerência das atividades económicas particulares quando 
haja necessidade de financiá-las e para conseguir benefícios sociais superiores aos que 
seriam obtidos sem a sua intervenção”. 
Iniciado o período revolucionário após 25 de Abril de 1974 um conjunto de reformas 
políticas, económicas e sociais estruturantes são desencadeadas no cumprimento das 
diretivas do Conselho da Revolução e do Comissão Coordenadora do Movimento das 
Forças Armadas (MFA), que de acordo com a forte tendência de esquerda que vigorava 
sobre o poder político fez aprovar em Assembleia Constituinte, após o I Pacto Partidos-
MFA, a Constituição da República Portuguesa de 25 de abril de 1976, que se caracterizou 
por uma “orientação comunista”1. A aprovação do texto definia a “transformação (de 
Portugal) numa sociedade sem classes”2, cujo regime político-económico se basearia 
desse dia em diante na “transição para o socialismo mediante a criação de condições 
para o exercício democrático do poder pelas classes trabalhadoras”3 
A aprovação da nova constituição do regime democrático é a confirmação do forte 
papel intervencionista do Estado na economia, sendo feitas aprovar um conjunto de 
propostas de apropriação dos meios de produção e expropriação dos latifúndios na 
sequência da Lei da Reforma Agrária (Decreto-Lei n.° 406-A/75, de 29 de Julho). Desta 
forma, a CRP de 1976 veio legislar o conjunto de nacionalizações de empresas privadas 
iniciado logo após a Revolução de 25 de Abril, inserido no Processo Revolucionário em 
Curso (PREC), bem como definir no seu artigo 82º a “nacionalização e socialização dos 
meios de produção, bem como os critérios de fixação de indemnizações”, assumindo uma 
forte componente ideológica de um Estado Forte sobre a economia, na medida em que 
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“todas as nacionalizações efetuadas depois de 25 de Abril de 1974 são conquistas 
irreversíveis das classes trabalhadoras” (art. 83º da CPR de 25 de abril de 1976). O art. 
82º da CRP previa também as expropriações dos latifúndios, sem que houvesse lugar à 
referida indemnização, por forma a dar fundamento constitucional à Lei da Reforma 
Agrária. 
Depois da aprovação da CRP de 1976 e das eleições legislativas de 1976, Portugal 
começara a distanciar-se do rumo do Socialismo Económico, em direção ao Socialismo 
Democrático. Com o aumento do número de europeístas nos denominadas partidos de 
Bloco Central e crescente vontade de integrar as Comunidades Europeias (CE) urge a 
necessidade de compatibilizar a política económica praticamente no país e aquela que 
doutrinariamente se encontrava redigida na CRP de 1976. 
Em 8 de julho de 1989 efetua-se a segunda Revisão Constitucional que altera o art. 
82º, suprimindo-o no art. 83º, segundo o qual se passa a considerar “a apropriação 
coletiva dos meios de produção”, no lugar da até então assumida “nacionalização e 
socialização” nos termos da CRP. De igual modo, o art. 83º é alterado e suprimido no art. 
85º que no seu número 1 revoga a “irreversibilidade das nacionalizações”, prevendo a 
“reprivatização da titularidade ou do direito de exploração de meios de produção e 
outros bens nacionalizados depois de 25 de Abril de 1974”. 
Desta forma, abriu-se caminho a um novo período caracterizado pela adesão de 
Portugal à CE e por um consenso maioritário entre as instituições políticas, sociais e 
económicas portuguesas que permitiu aprovar na Revisão Constitucional de 12 de 
Dezembro de 2001 o art. 296º (que altera e suprime o art. 85º anteriormente mencionado) 
que “regula a reprivatização da titularidade ou do direito de exploração de meios de 
produção e outros bens nacionalizados depois de 25 de Abril de l974”. 
Na atualidade e de acordo com a CRP é competência da Assembleia da República os 
“meios e formas de intervenção, expropriação, nacionalização e privatização dos meios 
de produção e solos por motivo de interesse público”, ao abrigo do no. 1 do art. 165º. 
Todavia, as nacionalizações apenas deverão ser concretizadas à luz do art. 80º da CRP, 
al. d) que assegura a “propriedade pública dos recursos naturais e de meios de produção, 
de acordo com o interesse coletivo” e desde que não coloquem em risco a concorrência 
de mercado, suprimindo ou menorizando de qualquer forma a iniciativa privada, dando 
cumprimento ao mesmo artigo, al. c) que define a “liberdade de iniciativa e de 
organização empresarial no âmbito de uma economia mista”. 
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2.3. Nacionalizações de 75/76: uma reação político-ideológica 
Tal como já referimos, durante o Estado Novo a intervenção do Estado sobre a 
economia era minimalista, sendo apenas destacável como instituições públicas a Caixa 
Geral de Depósitos, o Banco de Fomento Nacional, os portos e a indústria de armamento. 
Para a História de Portugal ficará reconhecido como o grande período de 
nacionalizações os anos de 1975/76, todavia, este processo iniciou-se desde logo após o 
a Revolução do 25 de Abril de 1974 e com ela o arranque em toda a sua plenitude do 
PREC, decretando-se logo em Setembro de 1974 a nacionalização do bancos emissores 
de moeda, como o Banco Ultramarino, o Banco de Angola e o Banco de Portugal. 
Durante o denominado Verão Quente de 1975 a Comissão Coordenadora do MFA, até 
então possuidora do poder político indiretamente, em sucessivos governos provisórios, 
dirigidos por um dos seus principais membros, o coronel Vasco Gonçalves, faz aprovar 
em Assembleia um conjunto de nacionalizações que se caracterizaram por: 
1. Após o golpe direitista de 11 de Março de 1975, aprova-se por Decreto-Lei de 14 
e 15 de Março a total nacionalização dos bancos comerciais e dos seguros, sendo 
este o mote para a nacionalização indireta de 1300 empresas, dependentes 
financeiramente destas instituições; 
2. Decreto-Lei nº 203-C/75 atribuí ao Estado capacidades “bruscas” e “massivas” de 
controlo sobre as “alavancas” da economia, lançando-se os princípios gerais para 
as nacionalizações nos setores dos transportes, agricultura, petroquímica, 
siderurgia, energia, comunicações, papel, construção naval e minério, sendo todas 
estas empresas incluídas no SEE não financeiro; 
3. Conclusão das nacionalizações das grandes empresas, até setembro de 1975: 
TAP, CP, empresas petrolíferas, Cimentos de Leiria,Siderurgia Nacional, ENVC, 
LISNAVE, Companhia Nacional de Navegação, Companhia União Fabril (CUF), 
empresas rodoviárias, Rodoviária Nacional, etc…; 
4. Processo de nacionalização de todos os meios de comunicação social (com 
destaque para a RTP), à exceção dos católicos, até ao final de 1975; 
5. Conclusão da nacionalização dos grandes grupos familiares empresariais 
Champalimaud, Espírito Santo, Mello e Pinto e Sotto Mayor, durante o ano de 
1976. 
O conjunto de nacionalizações anteriormente apresentado são o testemunho político-
ideológico da época, na medida em que eram fundamentos da esquerda revolucionária 
que controlava o poder político do país: a intervenção do Estado na estrutura económica 
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como forma de coletivização dos meios de produção, que garantisse recompensar as 
classes trabalhadores “oprimidas” e “marginalizadas” durante o regime fascista; a 
necessária condução da política económico-financeira no sentido do Socialismo 
Económico e a correção das falhas de mercado que impossibilitavam o igual e amplo 
acesso de toda a população a produtos básicos, cuja exploração pelo setor privado excluía 
as classes mais baixas de rendimento. 
A doutrina que acabamos de descrever viria a predominar em Portugal apenas durante 
os anos acesos da Revolução, sendo contrariada pela imposição do Socialismo 
Democrático, alternado com a Social-Democracia, nos últimos 40 anos de democracia. 
2.4. O Socialismo Democrático e a preparação para a entrada na CEE 
Antecedendo a aprovação da CRP de 1976, a 25 de novembro de 1975 desencadeia-se 
um golpe militar liderado pelo General Ramalho Eanes contra as forças político-
militarizadas da esquerda revolucionária que insistiam na propaganda pela conversão da 
economia e do Estado português num regime do Socialismo Económico. A partir deste 
golpe, as forças políticas e os partidos reorganizam-se e as eleições legislativas de 1976 
serão decisivas para a viragem ideológica e doutrinária de Portugal para o Socialismo 
Democrático, ainda que o Regime de Nacionalização se mantivesse inalterado até à 
Revisão Constitucional de 1989. 
Com as manifestas intenções por parte de Portugal em aderir à CE era necessário 
preparar a economia portuguesa para o choque que viria pela entrada num mercado de 
370 milhões de consumidores, bem como, pelo impacto socioeconómico da integração 
com países maioritariamente mais ricos que Portugal. Ainda que a resposta constitucional 
tarde, as ações políticas levadas a cabo pelos Governos de Mário Soares forçadamente 
foram no sentido de, no curto prazo, levar ao reconhecimento das reprivatizações. 
Após a adesão de Portugal à CE a 1 de janeiro de 1986 e com a primeira vitória 
absoluta de um único partido em democracia, o PSD, desde o início da II República, nas 
eleições legislativas de 1987, o então eleito primeiro-ministro, Aníbal Cavaco Silva, 
suporta-se da parangona de Milton Friedman “Menos Estado, Melhor Estado”, para 
defender junto dos portugueses a promoção da eficiência do Estado, por via de um 
processo de reprivatizações que permitissem o enquadramento de Portugal à luz do 
Tratado da CE, bem como, por forma a iniciar-se uma política económica capitalista 
concorrencial que progressivamente permitisse a maior abertura do país ao mercado 
europeu e internacional. 
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Em 1989 é aprovada na Assembleia da República por proposta do PSD e com 
aprovação maioritária de todos os partidos à exceção da Aliança Povo Unido, dirigida 
pelos comunistas, a Revisão Constitucional que revertia o princípio de irreversibilidade 
das nacionalizações após o 25 de Abril. Em Abril de 1990 entra em vigo a Lei Quadro 
das Privatizações que previa o desmantelamento a 100% das empresas públicas, bem 
como, permitia formas inovadores de apropriação pública dos meios de produção: as 
golden shares. 
Desde 1986 e até à crise económica e financeira de 2008 estava assumido 
explicitamente um consenso político estável em torno do modelo económico para 
Portugal, nomeadamente em matérias de nacionalizações e privatizações, o que nos 
permitia caracterizar o regime português, do ponto de vista económico, como uma 
economia capitalista aberta e regulada, do ponto de vista mais político, como um país do 
Socialismo Democrático, todavia, a crise de 2008 e com ela o caso da nacionalização do 
BPN vieram abrir precedentes para um questionamento ideológico para o futuro 
económico do país, testemunhado com o processo de privatizações a que assistimos 
durante a vigência do Memorando de Entendimento com a Troika (2011 – 2014). 
2.5. Influência do Direito Comunitário 
Após a adesão de Portugal às então Comunidades Europeias a Lei portuguesa fica 
sujeita a diretivas e regulamentos da Lei comunitária, previstos no Tratado sobre o 
Funcionamento da União Europeia (TFUE), cujos artigos 107º e 108º presentes nas 
Regras de Concorrência da Secção 2 “Os auxílios concedidos pelos Estado” nos permitem 
proceder ao enquadramento legal das formas de apropriação dos meios de produção no 
Direito Comunitário, como causa da evolução constitucional que foi apresentada 
anteriormente no que toca à Lei portuguesa. 
No seguimento do artigo 107º, os auxílios concedidos pelos Estados não são 
compatíveis com o mercado interno, uma vez que afetam as trocas comerciais entre os 
Estados-Membros e a concorrência entre os mesmos, levando ao favorecimento de 
determinadas empresas ou determinadas produções. 
Existem, mesmo assim, casos que se consideram compatíveis com o mercado interno, 
destacando-se, por exemplo, auxílios de natureza social ou auxílios que se destinam a 
remediar danos causados por fatores naturais. Relativamente a outros casos, podem ainda 
ser considerados compatíveis com o mercado interno, por exemplo, auxílios que se 
destinam à promoção do desenvolvimento económico de regiões menos favorecidas ou 
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auxílios que se destinam ao incentivo para a realização de projetos com interesse a nível 
europeu. 
No seguimento do artigo 108º, a Comissão Europeia, com a ajuda dos Estados-
membros irá proceder à análise permanente de todas as formas de auxílio que existam 
nesses mesmos Estados e proporá também medidas que se adequem ao desenvolvimento 
e melhor funcionamento do mercado interno. 
Para além do mencionado, se a Comissão verificar algum auxílio concedido por parte 
de um Estado que não esteja de acordo com o referido nos termos do artigo 107º, ou seja, 
que não seja compatível com o mercado interno ou que, de alguma forma está a ser 
aplicado de forma abusiva, o Estado em questão terá de suprimir ou modificar esse mesmo 
auxílio. Caso haja incumprimento, a Comissão ou outro Estado-membro que manifeste 
interesse pode recorrer ao Tribunal de Justiça da União Europeia. 
A Comissão deve sempre ser informada antecipadamente de quaisquer projetos 
relacionados com auxílio estatal, sendo que estes não podem ser postos em prática caso a 
Comissão não os considere compatíveis com o mercado interno, nos termos do artigo 
107º e, por isso, os mesmos não poderão ser aplicados. 
No que toca à opinião das instituições europeias relativamente ao controlo dos auxílios 
estatais é cada vez mais unânime a defesa da não intervenção do Estado na Economia por 
parte dos Estados-membros da UE, sendo estes a favor de que a concorrência entre os 
mesmos, ou mesmo dentro dos seus próprios mercados, se baseia num princípio de 
igualdade. 
 A concessão de apoios conhecidos por auxílios estatais podem levar à distorção da 
concorrência real entre empresas e afetar a economia, motivo pelo qual são controlados 
pela Comissão Europeia. 
Beneficiar de um auxílio estatal significa que, por exemplo, uma empresa recebeapoio 
público, que pode revestir diversas formas, como bonificações de juros, isenções fiscais, 
etc. Isto leva a empresa a obter uma vantagem incorreta relativamente aos seus 
concorrentes. 
Assim, é por isso que o TFUE, de forma geral, proíbe os auxílios estatais, a não ser 
que estes sejam devidamente justificados e que promovam o desenvolvimento económico 
a nível geral, como está a acontecer muito recentemente no que toca à recapitalização da 
Caixa Geral de Depósitos com dinheiros públicos. 
13 | P á g i n a 
 
2.6. Um exemplo de exceção: o caso do BPN 
A 11 de Novembro de 2008, entrou em vigor a Lei nº62-A/2008 relativa à 
nacionalização do Banco Português de Negócios (BPN). Esta justifica a razão pela qual 
foi escolhida esta forma de apropriação pública. Tal como foi dito anteriormente, a 
revisão constitucional de 1989 previu a eliminação do regime de nacionalizações da lei 
fundamental portuguesa. Durante os 19 anos que se sucederam, ainda que as 
nacionalizações fossem uma competência da Assembleia da República prevista ao abrigo 
do art. 165º da CRP, não se verificou a existência de um regime jurídico para as mesmas. 
Perante a necessidade de se proceder a uma nacionalização, a lei de 2008 permitiu a 
reintrodução no sistema jurídico português de matéria legal referente às nacionalizações. 
Motivos da Nacionalização do BPN 
O BPN foi nacionalizado de forma a garantir estabilidade no sistema financeiro e 
bancário e minimizar a preocupação e desconfiança dos depositantes. Esta encontra-se 
relacionada com a solidez desta instituição de crédito causada pela crise financeira de 
2008, tal como prevê a Lei acima mencionada: “o volume de perdas acumuladas (...), a 
ausência de liquidez adequada e a iminência de uma situação de ruptura de pagamentos 
que ameaçam os interesses dos depositantes e a estabilidade do sistema financeiro e 
apurada a inviabilidade ou inadequação de meio menos restritivo apto a salvaguardar o 
interesse público, são nacionalizadas todas as acções representativas do capital social 
do BPN”. 
Os problemas do BPN agravaram-se quando este adquiriu o Banco Insular de Cabo 
Verde, do qual os prejuízos não revelados colocaram o BPN numa situação de grande 
fragilidade económica. A Sociedade Lusa de Negócios, que detinha a maior parte do 
capital do BPN, realizou um conjunto de operações clandestinas que não se encontravam 
registadas, das quais eram perdas em operações através do Banco Insular de Cabo Verde, 
por onde passavam as operações offshore do BPN. 
Os debates políticos sobre a situação do BPN levam à conclusão de que a insolvência 
do banco em causa teria como consequência um agravamento da crise económica e 
financeira e teria também grandes impactos no sistema financeiro a nível nacional, 
gerando-se um risco sistémico, que a expandir-se a todo o mercado interbancário levaria 
a uma rutura e possível falência de outras instituições financeiras. 
Assim, após a nacionalização, a Caixa Geral de Depósitos ficou responsável por definir 
os objetivos de gestão do Banco Português de Negócios. 
14 | P á g i n a 
 
3. Poderes especiais de apropriação: as golden shares 
3.1 Definição e enquadramento legal 
Segundo o Código das Sociedades Comerciais (CSC), as ações de uma sociedade 
anónima podem ser agrupadas em três tipos: ordinárias, diminuídas e privilegiadas. As 
ações privilegiadas ou golden shares são tidas como ações que conferem aos seus 
detentores vantagens, podendo estas ser criadas no momento da fundação da sociedade 
ou não. 
Segundo o art. 302º no.1 do CSC podemos afirmar que não existe qualquer carácter de 
tipicidade na criação de ações privilegiadas, isto é, pode existir qualquer tipo de 
vantagem. 
Assim, estas ações podem dar qualquer tipo de vantagem referente à gestão da 
empresa, desde o voto em assembleia geral em que o acionista, mesmo com uma 
participação social inferior procede à eleição do administrador da empresa. 
 O Estado por razões políticas ou económicas sente a necessidade de ficar com 
parte do capital social da empresa no ato de privatização ou reprivatização. É nesta altura 
que existe o uso das golden shares por parte do Estado em que o mesmo tem poderes de 
gestão na empresa, mesmo que desproporcionados em relação aos direitos de 
propriedade que lhe cabem. Em alguns casos como analisaremos mais à frente o Estado 
pode mesmo ter o direito de veto. 
 Em Portugal, o uso de golden shares foi permitido pela primeira vez graças à Lei 
nº11/90 de 5 de Abril de 1990, reconhecida como Lei Quadro das Privatizações 
(LQP), mais precisamente por feito do transcrito no seu art. 15º que veio tornar possíveis 
não só o uso das golden shares como também a privatização de qualquer empresa pública, 
ainda que em alguns casos específicos, apenas privatizáveis até aos 49% do capital social, 
tal como prevê o art. 84º da CRP como empresas do domínio público. 
3.2. Contexto histórico das Golden Shares 
Uma vez que as golden shares estão intimamente ligadas com as privatizações e a 
necessidade do Estado permanecer com poderes sobre a empresa, a origem das mesmas 
está relacionada com a origem das privatizações. 
Com as crises da década de 70 e com o falhanço dos ideais Keynesianos, a ideia de 
que a presença do Estado na economia, sem ser apenas como regulador da mesma faliu 
com a ascensão de ideais neoliberais. Nos processos de privatizações os Estados usaram 
as golden shares como uma forma de manterem a sua presença e poder dentro das diversas 
15 | P á g i n a 
 
empresas de interesse nacional, mas podendo ao mesmo tempo lucrar com a venda da sua 
participação social. Ajudando assim, num dos objetivos mais importantes das 
privatizações, a diminuição de desequilíbrios orçamentais e a contribuição para a redução 
do peso da dívida pública. 
Os primeiros países a usar as golden shares foram o Reino Unido e os Estados Unidos 
mas rapidamente todos os países ocidentais as passaram a usar. 
3.3. Razões governamentais para as golden shares 
Já em pontos anteriores foi referido de que o uso das golden shares por parte do Estado 
é fundamentado pela necessidade dos mesmos defenderem interesses públicos ao mesmo 
tempo que defendem um mercado livre com o livre funcionamento dos mecanismos do 
mesmo, existindo um meio-termo entre os dois. Contudo, mais especificamente, as razões 
entre muitas outras, são: 
 Utilizar o poder conferido para garantir que os proprietários respeitam os 
interesses públicos limitando o controlo sobre os preços e quantidades fornecidas 
à população, como é o caso da eletricidade; 
 Impossibilitar a alienação da empresa a outros proprietários, algo que é 
impossibilitado graças ao poder de veto por parte do Estado e que mais a frente 
iremos abordar no caso da Portugal Telecom em que o Estado impossibilitou a 
venda de um dos ativos a uma empresa estrangeira; 
 Auxiliar a empresa contra outras concorrentes dando benefícios de forma a manter 
a competitividade da mesma. 
3.4. Legalidade das Golden Shares 
A existência e o uso de golden shares por parte do Estado foi pela primeira vez 
permitido no art. 15º da Lei Quadro das Privatizações, tendo sido durante mais de duas 
décadas o pilar jurídico para a existência de golden shares em empresas com participações 
do Estado. Em 2002 o Tribunal de Justiça Português pronunciou-se em relação a três 
casos relacionados com o uso de golden shares, motivado pela crítica feita pela 
comunicação da Comissão Europeia relativa à ilegalidade do uso das mesmas. 
Apesar disto, apenas em 2008 a Comissão formalizou um pedido ao Tribunal de Justiça 
(TJ) para a condenação de Portugal devido ao uso das golden shares. Segundo a 
Comissão, o poder de vetopor parte do Estado impedia o bom funcionamento e livre 
circulação de capitais. Em 2010 o TJ, depois do Estado ter usado o poder de veto numa 
Assembleia Geral da empresa, impedindo a venda da empresa Vivo, detida pela PT, à 
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empresa Telefónica, condenou as ações do Estado impedindo o uso do veto no caso 
referido. Finalmente a 13 de Setembro de 2011, a Lei 11/90 sofreu uma revisão e o art. 
15º foi revogado. A revogação do mesmo foi motivada não por interesses nacionais mas 
europeus em que o Tribunal de Justiça Europeu, após diversos casos contra os entraves 
públicos ao investimento privado, não só português mas também de outros Estados-
Membros, foi claro em relação a existência de golden shares. Os dois artigos que limitam 
a existência das mesmas são o art. 63º e 49º do TFUE que protegem a livre circulação do 
mercado. 
Assim, não existe qualquer lei portuguesa que impossibilite o uso de golden shares 
por parte do Estado, mas também não existe nenhuma que o permita. Contudo, uma vez 
que Portugal se insere na comunidade europeia tem de respeitar o TFUE que impossibilita 
o uso das mesmas. 
3.5. Golden Shares históricas: EDP, PT e REN 
Após o período de privatizações levado a cabo pelo Estado português existiram três 
casos históricos de três empresas dominantes nos diferentes setores em que se inseriam. 
Depois de 1990, as três viram a presença do Estado diminuir mas não o seu poder através 
da utilização de direitos especiais por parte do Estado sobre o capital social das mesmas: 
as golden shares. Devido às sucessivas críticas por parte da comissão europeia e a 
respetiva condenação das ações por parte do Estado na Portugal Telecom, com o 
cumprimento do estabelecido no Memorando sobre as condicionalidades da política 
económica que acompanhou o acordo com a Troika, Portugal procedeu à revogação da 
existência de golden shares perdendo a existência das mesmas na EDP, GALP e PT. 
 
EDP – Energias de Portugal 
A EDP foi criada em 1976 através da fusão de 13 empresas que foram nacionalizadas 
em 1975. O processo de privatização iniciou-se em 1991, com a empresa a tornar-se uma 
Sociedade Anónima, passando por seis operações de privatização de 1996 a 2006. 
Durante este processo o Estado criou as golden shares de forma a manter o seu poder na 
empresa, poder este desproporcional da presença acionista na empresa. 
Ainda que tivesse base legal para o processo, tal como já foi referido antes, a Comissão 
Europeia (CE) apresentou relutância em relação à existência das mesmas levando o 
Tribunal de Justiça Europeia em 2010 a declarar a ilegalidade das mesmas: “No acórdão 
hoje proferido, o Tribunal de Justiça declara que, ao manter na EDP direitos especiais 
atribuídos ao abrigo das «golden shares», Portugal não cumpriu as obrigações que lhe 
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incumbem por força da livre circulação de capitais”. 
Em 2011, no seguimento do Memorando com a Troika, os acionistas da EDP votaram 
em assembleia geral o fim das golden shares, o qual passou com 94% dos votos a favor. 
É importante referir que o Memorando de Entendimento obrigava Portugal a abdicar da 
sua presença nas três empresas com o uso de golden shares para que pudesse ter direito a 
ajuda monetária. 
 
GALP Energia 
O caso da GALP é semelhante ao da EDP no sentido de que esta também foi uma 
empresa nacionalizada pelo Estado após o 25 de Abril. Sofreu vários processos de 
privatização o que levou à criação de golden shares após a regulamentação da LQP. 
Tal como a EDP, após 2011 o Estado perdeu as golden shares na empresa detendo 
indiretamente 7% do capital social da empresa na atualidade. A abdicação da participação 
na EDP e na GALP criaram controvérsia junto dos diferentes partidos, devido à 
importância de ambas as empresas, não só pelo valor estratégico que representavam para 
o país como pelas receitas que ambas geravam e pela possibilidade de subida de preços 
em dois bens essenciais para a população. 
 
PT-Portugal Telecom 
O caso da PT, é semelhante aos anteriores tanto no processo de privatização como de 
criação das golden shares. De entre os três foi aquele que teve mais atenção e críticas por 
parte da CE devido ao uso do poder de veto em Assembleia Geral por parte do Estado no 
processo de venda da Vivo, empresa detida pela PT, caso já referido acima. 
Assim, em 2011, o Estado perdeu o controlo da PT, não tendo atualmente qualquer 
presença no capital social da mesma. 
3.6. Influência do Direito Comunitário e as reações de outros estados 
membros 
O direito comunitário manteve-se durante longos anos focado na liberdade de 
circulação de mercadorias e serviços e indiferente relativamente à adoção de medidas, 
descritas no Tratado de Roma, acerca da liberdade de circulação de capitais. 
Ao virar a sua atenção para esta liberdade de circulação de capitais, começou por 
eliminar as restrições aos impostos, e mais recentemente eliminou as intervenções estatais 
que permitiam a cada país, proteger a sua própria economia. 
Após a aprovação da Lei que afirma que a utilização de golden shares é ilegal, estas 
passam a violar o direito comunitário, com exceção de casos de força maior, tal como 
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1 Lei no. 11/90, de 5 de Abril, art. 15º, no. 3 
afirma a anterior Lei: “Poderá ainda o diploma referido no no. 1 do art. 4º, e também a 
título excecional, sempre que razões de interesse nacional o requeiram, prever a 
existências de ações privilegiadas, destinadas a permanecer na titularidade do Estado, 
as quais, independentemente do seu número, concederão direito de veto quanto às 
alterações do pacto social e outras deliberações respeitantes a determinadas matérias, 
devidamente tipificadas nos mesmos estatutos.”1 
Assim, este tipo de ações viola o direito comunitário já que não vai de acordo com o 
Tratado que diz respeito à não discriminação e à livre circulação de capitais. Aquando da 
violação deste Tratado, a Comissão Europeia deve intervir de forma rápida e eficaz. 
De forma resumida, o Estado ao emitir golden shares é movido pela tentativa de chegar 
a um meio-termo entre um mercado livre e defensor do interesse público. Assim, o poder 
governamental é mantido, mas existem possibilidades de entrada de investidores. A 
existência de golden shares não é um processo controlador, mas sim regulador, tal como 
explicado anteriormente no conceito de Estado regulador. 
Contudo, o facto de o Estado utilizar golden shares e violar a Lei de modo a defender 
o interesse público não esclarece quais são de facto as justificações para a utilização 
destas ações. Assim, os privilégios do Estado apoiam-se em quatro pontos principais: 
1- Privilégios relativos a bens ou serviços de primeira necessidade. Ao possuir este 
privilégio, o Estado poderá assegurar de forma constante uma distribuição igualitária e 
acessível a toda a população. 
2- Privilégio de o Estado poder continuar a condicionar a emissão de ações e assim, 
impedir o aumento de poder sobre a empresa por parte dos investidores. 
3- Privilégio de continuar a proteger as empresas participadas das empresas privadas, 
de forma a manter uma posição de votos maioritária nos mercados. 
4- Privilégios face ao direito europeu das sociedades, de forma a poder contornar as 
leis do mercado livre e concorrencial para que os interesses nacionais sejam protegidos. 
Em 2011, em toda a União Europeia, existiam pelo menos 9 estados-membros onde as 
golden shares ainda estavam presentes na economia. Países como a Alemanha, Reino 
Unido, Irlanda, Grécia, Bélgica, Polónia, Finlândia ou até mesmo França não veem os 
seus interesses nacionais coincidir com os propostos pela Comissão Europeia. Como 
justificação da utilizaçãode golden shares, estes recorrem maioritariamente a motivos de 
natureza económica. Contudo, estes oito países acima enumerados são apenas alguns 
exemplos de locais onde as golden shares ainda se encontram ativas, pelo que a Comissão 
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Europeia não possui uma lista completa e exaustiva de todos os países que ainda utilizam 
este tipo de ações. 
Interrogações e previsões futuras: 
1. O caminho que o direito comunitário está a tomar na UE está assente na defesa da 
liberdade de mercado. Contudo, o funcionamento livre deste mercado de capitais poderá 
perder a sua importância quando bens como a eletricidade ou as telecomunicações 
surgem. Após este surgimento, o oligopólio pode surgir, destruindo assim a livre 
circulação de capitais no mercado, já que existirá concorrência, mas esta será imperfeita. 
2. A impossibilidade de manter as liberdades de circulação defendidas pelo direito 
comunitário nas fonteiras internas poderá levar à criação de uma liberdade global e 
consequentemente, a uma exposição global aos riscos de aparecimento de um oligopólio. 
3. Para que exista um bom funcionamento dos serviços gerais, são apenas necessários 
mecanismos comuns de regulação administrativa, mesmo que não haja intervenção por 
pate dos acionistas ou até do mercado. Contudo, a contínua utilização das golden shares 
tem não só como objetivo o funcionamento seguro e contínuo dos serviços essenciais mas 
também a criação de estratégias para um melhor funcionamento do mercado de capitais. 
4. Os países mais fracos a nível económico da União Europeia, ao continuarem a pôr 
em prática as golden shares invocam o seu interesse nacional. Contudo, este assenta numa 
realidade que os restantes países da União desprezam. 
5. Numa economia de mercado, apesar das argumentações que os países que ainda 
possuem golden shares se concentrarem em argumentações de carácter económico e 
social, colocando em risco os objetivos exigidos pela União Europeia, estas razões não 
podem ser totalmente postas de parte e ignoradas pela comunidade europeia aquando a 
utilização das golden shares. 
Conclusão 
O estudo que acaba de ser apresentado é apenas o retalho de um conjunto de conteúdos, 
dissertações e análises empíricas que existem acerca da temática em causa, todavia, no 
âmbito em que se insere este relatório permite-nos principalmente caracterizar a evolução 
política, económica e doutrinária da interpretação dada por Portugal às formas de 
apropriação pública dos meios de produção. 
Indiscutivelmente, Portugal é um caso muito peculiar e atípico na comunidade 
europeia em que se insere, na medida em que experimentou um conjunto de modelos 
económicos em termos parciais, mas que à sua medida produziram efeitos reais sobre a 
20 | P á g i n a 
 
economia e que ainda hoje fazem perdurar marcas da sua passagem, como demonstrámos 
através da evolução cronológica: sistema corporativista, sistema económico socialista 
(índole comunista), sistema capitalista regulado e sistema liberal de concorrência de 
mercado (atual). 
Esta evolução económico-política foi causa e consequência simultânea para a prática 
inexistência de controlo dos meios de produção por parte do Estado durante o período 
fascista, que evolui para uma apropriação e nacionalização, assumidas como irreversíveis, 
de um conjunto de meios de produção considerados lucrativos e de estrategicamente 
definidos como propícios ao interesse nacional, o que levou à presença de cerca de 25% 
do PIB português causado pelo SEE, em 1979, traços característicos do Socialismo 
Económico, que se asseguraram após a Revolução de 25 de Abril de 1974 que abriu 
caminho para um aumento progressivo da intervenção do Estado sobre a economia. 
Definido o rumo político de Portugal e assumido o objetivo de integração nas então 
Comunidades Europeias, as sucessivas revisões constitucionais são representativas da 
evolução do modelo económico, que se caracterizou por um conjunto de reprivatizações. 
Ainda que o Direito Comunitário previsse desde a adesão de Portugal, em 1986, e hoje 
com maior ênfase e rigor doutrinário, a progressiva liberalização da atividade económica 
e com ela a diminuição da presença do Estado na economia, dando cumprimento aos 
princípios da iniciativa privada, do direito à propriedade, da concorrência de mercado e 
da livre circulação de bens, serviços e capitais, Portugal, juntamente com outos estados-
membros desenvolveu direitos especiais de controlo da gestão das empresas que a seu 
tempo ia reprivatizando – as golden shares – com o objetivo de assegurar o 
aprovisionamento e interesse nacionais. 
Com a ilegalização das golden shares à luz do TFUE, as empresas controladas pelo 
Estado português foram totalmente privatizadas e na atualidade, após a vigência das 
políticas de “austeridade expansionista” tantas vezes impostas pela UE (não apenas em 
Portugal, ainda que as tenhamos sentido de forma mais repentina e avassaladora), 
poderemos considerar que se assume um objetivo liberal de minimização do Estado na 
economia, o que nos faz concluir que estamos perante uma nova “revolução” doutrinária 
e “massiva”, que poderá vir a assumir contornos idênticos aos que experimentámos em 
75/76, no que toca unicamente às matérias em estudo, todavia, do outro lado da barricada, 
esquecendo-nos tantas vezes de que “no meio é que está a virtude”, como dizem as gentes 
lusas. 
21 | P á g i n a 
 
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