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SÍNDROME DE PETER PAN 
 
DAN KILEY 
 
O que é Síndrome de Peter Pan? 
Síndrome de Peter Pan é um estado de imaturidade emocional que 
comea com ansiedade e narcisismo e termina em desespero. E um 
fenômeno sociopsicológico detectado em homens que, embora 
tenham atingido a idade adulta, são incapazes de encarar os 
sentimentos e as responsabilidades dos adultos. No esforço de 
esconder seus fracassos, recorrem ao fingimento e à falsa alegria. 
Seguindo o sucesso de Complexo de Cinderela, Síndrome de Peter 
Pan figura na lista dos livros mais vendidos do "The New York 
Times", há quase um ano, pois explora um fenômeno psicológico 
crescente. 
* * * 
 
Um sério fenômeno sociopsicológico está sendo detectado entre os 
homens, diz o psicólogo Dr. Dan Kiley: centenas de milhares de 
homens nun¬ca cresceram. Há muitos anos o Dr. Kiley vem 
estudando a síndrome. Seu primeiro caso clínico foi quando 
trabalhava com um jovem oficial da Força Aérea. Os sucessivos 
anos de acon¬selhamento de adolescentes, universitários e jovens 
casais recém-casados, ensinaram-lhe muito mais do que "as 
preocupações e as tribulações do amadurecimento... que lentamente 
me levaram a um número alarmante de homens que não 
ama¬dureceram, não cresceram. Alguma coisa estava errada". 
Somente quando relia a peça de Barrie é que ele se defrontou com a 
conexão existente entre o problema que estava testemunhando e o 
herói brincalhão, que a seu ver é realmente "um adolescente muito 
infeliz que se encontra à beira do abismo entre o homem que não 
 
quer ser e o menino que ele já não é ... Como O problema espelha a 
vida ficcional do persona¬gem clássico, facilitando desta maneira a 
explicação e a compreensão, não levei muito tempo para rotular esta 
condição de Síndrome de Peter Pan — ou abreviando SPP". 
O Dr. Kiley também explica que tem observado o crescimento deste 
fenômeno há anos: "Suspeito que ocorram casos isolados há um 
longo tempo, mas somente nos últimos 20 ou 25 anos, entretanto, é 
que as pres¬sões da vida moderna têm exacerbado os fatores 
desencadeadores, resultando num crescimento dramático na 
freqüência do problema. Há razões para se supor que a situação 
piore nesses próximos anos". De acordo com o autor, embora eles 
tenham atingido a idade adulta, esses homens são incapazes de 
encarar os sentimentos e as responsabilidades adultos; distantes de 
suas verdadeiras emoções, eles se escondem atrás de máscaras, 
estando repletos de sentimentos vazios e de solidão, e, como o herói 
da história infantil, eles recor¬rem ao fingimento e à falsa alegria 
num esforço supremo de esconder suas fraquezas dos outros. 
Em Síndrome de Peter Pan, o Dr. Kiley dá uma olhada abrangente 
nu vítima clássica da síndrome — seu perfil social e psicológico e os 
seis maiores sintomas que ela exibe (incluindo a irresponsabilidade, 
a ansie¬dade, a solidão e o chauvinismo); as idades em que 
aparecem, as causas e os padrões de comportamentos manifestos. 
Além de detalhar os sintomas e seus efeitos potencialmente 
desastro¬sos na vida de um homem, o autor oferece conselhos 
práticos para aqueles que querem tentar mudar a situação: pais que 
podem perceber sinais em seus filhos adolescentes; esposas e 
companheiras, amigos e conhecidos, e as próprias vítimas. 
 
 
O autor 
Nascido e educado em Illinois, Dr. Kiley graduou-se com M.A. e Ph. 
D. na Universidade de Illinois. Fez parte da equipe de psicólogos do 
 
VA Hospital em Danville, em Illinois, é administrador e psicólogo 
do Departamento de Corregedoria de Illinois — Divisão Juvenil. 
O Dr. Dan Kiley já publicou três livros de sucesso editorial e tem o 
seu próprio programe de rádio em Chicago. Supervisiona 
seminários e workshops nesta área e também escreve artigos para 
Good Housekeeping e Family Circle, bem como para jornais 
especializados no campo do relacionamento dos adolescentes e 
familiares. Kiley mantém um consultório particular em Chicago, 
onde reside. 
 
* * * 
 
À minha esposa Nancy, uma Sininho que faz de cada dia uma 
aventura. 
 
 
 
Agradecimentos 
 
Merecem minha mais profunda gratidão as seguintes pessoas: Evan 
Marshall, editor sênior em Dodd, Mead, cujo estímulo só é 
suplantado por uma editoração brilhante; Kay Radtke, diretora de 
publicidade, e sua excelente equipe; Howard Morhaim, meu agente 
literário, que bem podia ter sido um grande psicoterapeuta; e 
Donald Merz, Ph. D., amigo e colega que vem supervisionando 
minha pesquisa ao longo dos anos. Estas pessoas fizeram este livro 
infinitamente melhor do que eu sozinho jamais teria conseguido. 
 
 
 
 
Sumário 
Agradecimentos 
Nota do Autor 
Prefácio 
 
 
PARTE I — INTRODUÇÃO AO QUADRO 
1 Reconhece este Homem-menino? 
2 O Adulto Vítima da SPP — Teste 
3 A Síndrome de Peter Pan — Quadro Geral . . . . 
 
 
PARTE II — A SÍNDROME DE PETER PAN 
4. Irresponsabilidade 
5. Ansiedade 
6. Solidão 
7. Conflito Relativo ao Papel Sexual 
8. Narcisismo 
9. Chauvinismo 
10. Crise: Impotência Social 
11. Após os 30 anos: Desalento 
 
 
PARTE III — A MUDANÇA 
12 Para os Pais 
13 Para Esposas e Amantes 
14 Para Irmãos, Irmãs e Amigos 
15 Para as Vítimas 
 
 
 
Nota do Autor 
Os casos apresentados neste livro nele constam por propósitos 
educacionais. A fim de proteger aqueles que lutaram na 
confrontação e superação da Síndrome de Peter Pan, modifiquei 
certos dados secundários e misturei outros. As histórias resultantes 
representam as dificuldades cotidianas reais das vítimas da SPP, e 
ocultam ao mesmo tempo as identidades das pessoas mencionadas. 
Qualquer semelhança entre estas histórias e a de algum indivíduo 
ou família real é pura coincidência. 
 
 
Viver seria uma aventura incrível. 
 
Peter Pan 
 
 
 
 
Prefácio 
Não ameaça a vida; portanto, não é uma doença. Mas põe em risco a 
saúde mental da pessoa; portanto, é mais que incômodo. Seus 
sintomas são bem conhecidos; portanto, não posso dizer que é uma 
descoberta. Porém este quadro jamais foi descrito; portanto, este 
livro traz algo de novo. 
Trata-se de um fenômeno psicológico ainda por catalogar. Ele não 
cabe em nenhuma categoria reconhecível, embora não haja como 
negar sua existência. Em minha área, tal anomalia é denominada 
síndrome. Ou, para usar jargão comum, uma síndrome é um 
conjunto de sintomas expresso por algum tipo de padrão social. 
 
Quero falar-lhe sobre uma síndrome, em nossa sociedade, que está 
causando inúmeros problemas. Todo mundo sabe que ela existe, 
mas até agora ninguém a rotulou ou explicou. 
Venho estudando esta síndrome há anos, na tentativa de 
compreender esse emaranhado de causa e efeito. Suspeito que casos 
isolados há muito vêm ocorrendo; contudo, foi só nos últimos vinte 
ou vinte e cinco anos que as pressões da vida moderna 
exacerbaram-lhe os fatores causais, resultando num dramático 
aumento na freqüência do problema. E temos todos os motivos para 
esperar que piore nos anos vindouros. 
Meu primeiro caso clínico foi uma vítima da síndrome, apesar de eu 
não ter percebido isso na época. Eu trabalhava na Força Aérea 
dando orientação a jovens em vias de "atingir a maioridade" ou com 
problemas no processo de amadurecimento. 
Ele chamava-se George. Tinha vinte e dois anos, mas agia como se 
tivesse dez. Suas expressões emocionais eram exageradas, 
inadequadas e tolas. Falava muito, mas não dizia muito de 
aproveitável. Era hora de ele tomar as rédeas de sua vida, porém 
estava fixado em seus tempos de estudante ginasial. Achei que ele 
ultrapassaria seu medo de "virar adulto". Até hoje desconheço se o 
fez ou não. 
Meus anos de orientação a adolescentes, universitários e jovens 
casais ampliaram meu conhecimento das dificuldades e tribulações 
envolvidas no processo de amadurecimento. Aos poucos fui-me 
dando conta de que um alarmante número de moços nãoestava 
amadurecendo. Algo estava errado. 
Este livro enfoca adultos do sexo masculino que não ama-
dureceram, bem como as razões para isso e o que se pode fazer a 
respeito. Aposto que, depois dos dois primeiros capítulos, você já 
terá identificado alguém que conhece como sendo vítima deste 
problema. Imagino que se surpreenderá à medida que o 
comportamento da pessoa lhe for ficando mais compreensível. 
 
Dos dezessete aos vinte e poucos anos de idade, esses homens 
vivem uma vida impetuosa. O narcisismo fecha-os em si mesmos, 
ao passo que seus irrealísticos egos crêem poder e dever pôr em 
ação tudo o que suas fantasias sugerirem. Mais tarde, depois de 
anos de uma insuficiente adaptação à realidade, a guinada de 180° 
em suas vidas. "Quero" é substituído por "Devo". Obter a aceitação 
dos outros parece o único meio de eles se aceitarem. Seus acessos de 
mau humor e irritação são disfarçados como afirmação masculina. 
O amor é algo "obviamente a lhes ser dado, e nunca aprendem a dá-
lo em troca. Fingem ser adultos; todavia, na verdade, comportam-se 
como crianças mimadas. 
Leva tempo para uma criança inteligente e sensível transformar-se 
num adulto imaturo e zangado. Os pais têm muitas chances de 
reverter o processo; por isso, este é um livro destinado aos pais. Mas 
esposas e amantes têm toda oportunidade de transformar o "nunca" 
em "algum dia"; é por isso que este livro se destina especialmente a 
mulheres que mantenham um relacionamento especial (no 
casamento ou fora dele) com a vítima. Amigos e parentes com 
influência sobre a vida da vítima podem oferecer ajuda; portanto, 
este livro pode ser-lhes de valia. Finalmente, nunca é tarde demais 
para um homem amadurecer por seus próprios esforços; é por isso 
que este livro se destina também à vítima propriamente dita. 
Seja você esposa, amante, pai ou mãe, avô, ou simplesmente amigo, 
bem pode ajudar a vítima, independentemente da idade dela. Em 
sua tentativa de compreendê-la, lembre-se: ame a criança, pois ela 
não se ama; acredite no homem, pois ele não acredita em si mesmo; 
e, acima de tudo, ouça-o, pois ele não ouve a si próprio. A fim de 
sobrepujar esse problema, ele precisa percorrer a maior distância do 
mundo: a que vai de sua boca a seus ouvidos. 
 
 
 
PARTE I 
INTRODUÇÃO AO QUADRO 
1 
Reconhece este Homem-menino? 
 
 
CAPITÃO GANCHO: — Você tem algum outro nome? 
PETER PAN: — Hum, hum. 
GANCHO (ansiosamente): — Legume? 
PETER: — Não. 
GANCHO: — Mineral? 
PETER: — Não. 
GANCHO: — Animal? 
PETER (após consultas com um amigo): — Sim. 
GANCHO: — Homem? 
PETER (desdenhosamente): — Não. 
GANCHO: — Menino? 
PETER: — Sim. 
GANCHO: — Menino como os outros? PETER: — Não! 
GANCHO: — Menino maravilhoso? 
PETER (para consternação de Wendy): — Sim! 
 
Reconhece esta pessoa? A julgar pela idade, é um homem; porém, 
por seus atos, é uma criança. O homem deseja seu amor; a criança 
quer sua compaixão. O homem almeja a aproximação; a criança 
teme ser tocada. Se você enxergar além de sua máscara de orgulho, 
verá sua vulnerabilidade. Se desafiar sua audácia, sentirá seu medo. 
Você acha que conhece bem essa pessoa, mas a verdade é o inverso. 
As contradições são incômodas. As respostas são ambíguas. Fica até 
 
mesmo difícil encontrar as perguntas corretas. Contudo, olhe para 
seus filhos, ou para os de algum amigo, e pergunte-se: "Como seria 
se o corpo dele crescesse e sua mente parasse no tempo?" 
Este homem-menino é vítima de um mal grave. Se não for ajudado, 
amargará muito a vida. Não se trata de doença mental nem de 
incapacidade de convivência em sociedade. No entanto, ele é muito 
triste. Para ele a vida é uma perda de tempo. Ele se esforça por 
camuflar a tristeza com vivacidade e piadas. Em muitos casos isso 
engana, ao menos por alguns anos. Com o tempo, porém, aqueles 
que o amam vão se cansando de sua imaturidade. À primeira vista 
isso parece prematuro e até injusto. Mas analise melhor o quadro, e 
entenderá por que desejam livrar-se dessa pessoa. 
Sua tarefa é identificar esse homem-menino. Quanto antes 
reconhecê-lo, maiores suas chances de auxiliá-lo. Ele pode ser seu 
filho, seu marido, um tio ou um primo. Ou ainda um amigo, um 
vizinho, um colega de trabalho. Ou, se você é do sexo masculino, 
pode ser você! Quem quer que seja ele, pensa que não quer sua 
ajuda. Não a quer porque não sabe que precisa dela. Está tão 
acostumado a encarar a vida como uma caverna vazia que suas 
atitudes do tipo "não ligo a mínima" parecem normais. Se ele ousar 
gostar de alguém, ficará perturbadíssimo. Prefere a paz e a 
tranqüilidade da bela indiferença. 
Possivelmente você não conseguirá identificar esse homem 
enquanto ele tem pouca idade. O contraste entre esta e seu grau de 
maturidade será o primeiro indício. Uma vez identificado o 
problema, você poderá planejar a ajuda a oferecer ou, pelo menos, 
evitar contribuir para as dificuldades dele. Ao compreender a 
complexidade do quadro, você poderá perceber os primeiros sinais 
indicadores da síndrome. Se acaso você for pai ou mãe de um 
menino que apresente esses sinais, poderá aprender como 
interromper tal desenvolvimento deletério. 
O problema começa a aparecer cedo na vida de um homem. Quem 
sabe alguma criança em seu meio esteja agora atingindo o estágio 
 
de crise? Pode ser o filho do vizinho, um dos filhos de algum amigo, 
o líder do grupo de jovens de sua igreja, ou mesmo seu filho. 
Quanto mais íntimo desse menino, maior a probabilidade de você 
interromper o processo. 
A identificação desse homem-menino implica um processo de três 
passos. Este processo foi elaborado de modo que possa oferecer 
objetividade; conseqüentemente, tem um ar um tanto impessoal, 
algo parecido com os livros técnicos de psicologia, onde se estudam 
casos clássicos. 
Em primeiro lugar, defina seu campo de observação. Esse campo inclui 
sua casa, a vizinhança, seu local de trabalho e quaisquer outros 
lugares onde você passe um período significativo de tempo. Onde 
quer que você entre em contato com os outros — é aí que acabará 
vendo essa pessoa. Pode acontecer numa festa, numa reunião de 
Amigos do Bairro, num piquenique familiar, ou no escritório ao 
lado do seu. Se você for pai ou mãe sensível, pode ver este homem-
menino em miniatura à mesa do jantar. Se for uma mulher 
apaixonada, pode talvez vê-lo em sua cama. Se for um homem que 
pensa, pode até localizá-lo no espelho à sua frente. 
Em segundo lugar, assuma o papel de investigador social. Reúna 
dados preliminares, usando este perfil social do caso clássico: 
 
Perfil Social da Vítima 
Sexo: Masculino Idade: De 12 a 50 anos 
 
Cronologia sintomática: 
 
De 12 a 17 anos: Quatro sintomas fundamentais desenvolvem-se em 
graus variáveis: irresponsabilidade, ansiedade, solidão e conflitos 
relativos ao papel sexual. 
 
De 18 a 22 anos: Aparece a negação à medida que o narcisismo e o 
chauvinismo dominam o comportamento. 
De 23 a 25 anos: Período de crise aguda, durante o qual a vítima 
pode procurar ajuda queixando-se de uma vaga, mas profunda 
insatisfação com a vida. Geralmente interpretado como normal pelo 
médico ou terapeuta. 
De 26 a 30 anos: A vítima entra no estágio crônico, representando o 
papel de "adulto". 
De 31 a 45 anos: A vítima casou-se, tem filhos, um emprego estável, 
porém angustia-se por sentir a vida entediante e monótona. 
Após os 45 anos: Aumentam a depressão e a agitação à medida que 
se aproxima a andropausa (climaterio masculino). A vítima pode 
rebelar-se contra um estilo de vida indesejado e sem significado 
próprio, tentando recapturar sua juventude. 
 
Nível socioeconómico: classe média para alta. 
Aparência: Ele é visto como amável e agradável por pessoas que não 
o conhecem muito bem. Tem sorriso insinuante e deixa uma 
primeira impressão excelente. 
Condição financeira: Os mais jovens raramente se sustentam. Aos 
vintee poucos anos ainda moram com os pais, ou destes dependem 
financeiramente. Vítimas com mais idade podem apresentar uma 
situação segura, sentindo, contudo, que não a têm. Costumam ser 
mesquinhas, exceto com relação à satisfação de seus próprios 
desejos. 
Situação marital: Até aproximadamente os vinte e cinco anos, os 
homens costumam manter-se solteiros. Namoram mulheres mais 
novas, ou aquelas cujas ações sugerem imaturidade. Depois de 
casadas, em geral, estas mulheres acabam tendo que manter a 
vítima "na linha". Esta costuma preferir os amigos à família. 
Situação educacional: As vítimas mais jovens levam a faculdade "na 
brincadeira" e têm dificuldade em resolver o que desejam estudar. 
 
Raramente terminam o curso universitário no período normal. As 
vítimas com mais idade sentem-se insatisfeitas com o grau de 
instrução obtido, achando que deveriam ter ido além. Esses homens 
raramente são vistos como vencedores ou empreendedores. 
Situação profissional: Os mais novos têm uma história profissional 
bastante instável. Só trabalham quando sob pressão. Querem uma 
carreira, mas não querem "batalhar". Ofendem-se facilmente com 
relação a empregos que consideram "indignos" deles. Têm 
problemas empregatícios por causa de sua negligência. As vítimas 
de mais idade caem no extremo oposto. Trabalham duro, na 
tentativa de provar seu valor. Têm expectativas irrealistas em 
relação a si mesmos, a seus colegas de trabalho e a seus chefes. 
Vêem-se acometidos pela incômoda idéia de não ter encontrado o 
emprego "certo". 
Família: A vítima geralmente é o filho mais velho de uma família 
tradicional. Os pais permanecem casados e têm boa situação 
financeira. Provavelmente o pai é executivo de alguma empresa, 
enquanto a mãe considera o cuidar da casa e dos filhos como sua 
principal tarefa. Ela talvez trabalhe fora para aumentar.a renda 
familiar, embora não tenha ambições profissionais. 
Interesses: O grande interesse das vítimas mais novas são as festas. 
As mais velhas esforçam-se por se divertir em festas, mas também 
tendem a se envolver além de limites razoáveis em esportes 
comunitários. 
 
O terceiro passo no processo de identificação é a decisão de assumir 
o papel de investigador psicológico. Após reconhecer a vida da vítima 
externamente mediante a utilização do perfil social, use este perfil 
psicológico para avaliar sua vida interior: 
 
Perfil Psicológico da Vítima 
 
Sete traços psicológicos dominam a vida da vítima da SPP. Estão 
presentes em cada estágio de desenvolvimento, porém são mais 
perceptíveis durante o período de crise. No estágio crônico a vítima 
tende a esconder esses traços por trás de uma máscara de 
maturidade. 
Paralisia emocional: As emoções da vítima são inadequadas. Não são 
expressas da mesma forma com que são experimentadas. A raiva 
costuma emergir como fúria, a alegria toma a forma de histeria, e 
uma decepção transforma-se em autopiedade. A tristeza pode 
manifestar-se como alegria forçada, brincadeiras imaturas ou 
risadas nervosas. As vítimas mais idosas afirmam que amam você 
ou que gostam de você, mas não parecem capazes de expressar tal 
amor. Ironicamente, apesar de quando crianças haverem sido 
extremamente sensíveis, estes homens de modo geral parecem ser 
egocêntricos até a crueldade. Acabam chegando ao ponto de 
aparentemente se recusarem a compartilhar seus sentimentos. Na 
verdade, perderam contato com suas emoções, e simplesmente não 
sabem o que sentem. 
Procrastinação: Durante o estágio desenvolvimental, a jovem vítima 
adia as coisas até ser absolutamente forçada a fazê-las. "Não sei" e 
"não me importa" tornam-se sua defesa contra as críticas. Seus 
objetivos de vida são obscuros e mal definidos, principalmente 
porque ela adia para o dia seguinte pensar sobre eles. A culpa força 
a vítima mais idosa a compensar a procrastinação do passado, 
transformando se em alguém que precisa estar sempre fazendo 
alguma coisa. Ela simplesmente não sabe relaxar. 
Impotência nas relações sociais: Não importa quanto se esforcem: as 
vítimas não conseguem fazer amizades verdadeiras. Na 
adolescência são facilmente levadas pelos companheiros. Os 
impulsos assumem a prioridade sobre o sentido do certo e do 
errado. Procurar amigos e ser agradável a meros conhecidos têm 
precedência sobre as demonstrações de amor e a preocupação com a 
 
família. A vítima sofre de uma desesperada necessidade de 
pertencer a grupos; é terrivelmente solitária e entra em pânico se 
está só. Ela pode até mesmo tentar comprar amigos. Durante toda a 
vida tem dificuldade em sentir-se bem consigo mesma. Um falso 
orgulho constantemente impede a aceitação das próprias limitações 
(humanas). 
Pensamento magico: "Se eu não pensar nisso, acabará". "Se eu achar 
que é diferente, assim será". Estes exemplos refletem o "pensamento 
mágico" das vítimas, o qual impede que admitam honestamente 
para si próprias terem cometido erros, e praticamente as 
impossibilita de dizer "desculpe-me". Este processo irracional é uma 
defesa utilizada pelas vítimas para sobrepujarem sua impotência 
nas relações sociais e sua paralisia emocional, de vez que lhes per-
mite culpar outrem por seus enganos. Freqüentemente as leva ao 
abuso de drogas, pois crêem que, quando estão "loucas", seus 
problemas desaparecem. 
Conflitos com a mãe: Raiva e culpa causam uma enorme ambivalência 
em relação à mãe. As vítimas desejam libertar-se da influência 
desta, mas sentem-se culpadas toda vez que o tentam. Quando 
estão com a mãe, há sempre uma tensão no ar, pontilhada por 
momentos de sarcasmos seguidos de momentos de ternura reativa. 
Os mais jovens provocam compaixão de suas mães a fim de 
obterem o que querem, especialmente dinheiro. Ao discutirem têm 
repentes de ira, e depois desculpam-se de modo inconseqüente. Os 
mais velhos têm menos o senso de ambivalência e mais o de culpa 
por causa da dor que causaram a suas mães. 
Conflitos com o pai: A vítima sente-se alienada no relacionamento 
com o pai. Anseia aproximar-se, mas convenceu-se de que jamais 
poderá receber amor e aprovação de seu pai. Mesmo com mais 
idade, ainda idealiza o pai, não compreendendo suas limitações e 
muito menos aceitando seus defeitos. Boa parte da problemática da 
 
vítima com respeito a figuras de autoridade origina-se nos conflitos 
com o pai. 
Conflitos sexuais: A impotência social da vítima estende-se até o 
campo sexual. Logo após a puberdade o rapaz começa a buscar 
desesperadamente uma namorada. Contudo, sua imaturidade e 
maneiras tolas tendem a afastar a maioria das moças. 
Seu medo de ser rejeitado leva-o a ocultar sua sensibilidade por trás 
de uma atitude machista, cruel e impiedosa. Na maioria dos casos o 
jovem permanece virgem até entrar na casa dos vinte, coisa que o 
constrange e leva-o a mentir — freqüentemente a ponto de falar em 
estupro, gabando-se de como "ganhou", ou planeja "ganhar", as 
garotas. 
Uma vez rompida a barreira da virgindade, a vítima pode passar 
para o outro extremo, tendo relações sexuais com qualquer moça 
que o deseje — para provar a si mesmo que é potente. Quando 
decide ficar com uma, liga-se completamente a ela. Seu ciúme só é 
suplantado por sua habilidade em despertar nela a compaixão. 
O homem sente-se provocado (e pode até ficar furioso) frente às 
atitudes de afirmação ou de autonomia da mulher; ele precisa que 
esta seja dependente dele para que possa sentir que a está 
protegendo. Na realidade, ele sente-se impotente para lidar com 
uma mulher de personalidade marcante, que o trata de igual para 
igual, e por isso ele a inferioriza. Anseia partilhar sua sensibilidade 
com uma mulher, porém nega este lado de sua personalidade por 
temer que seus amigos o considerem um fraco e não um "homem". 
Nesta altura você provavelmente já identificou pelo menos um 
homem, em seu meio, como vítima deste quadro. É improvável que 
ele se ajusteperfeitamente à descrição que forneci. É mais provável 
que ele apresente alguns, não todos os atributos examinados. É raro 
o caso clássico existir na realidade. No próximo capítulo 
abordaremos a questão de modo menos objetivo, menos didático, 
digamos assim; passaremos a analisá-la mais subjetiva e 
 
vivencialmente. Então talvez você tenha de enfrentar o fato de que, 
em maior ou menor grau, este mal pode estar afligindo sua vida 
cotidiana. 
Isto nos conduz ao próximo passo: personalizar o processo de 
identificação. Para fazê-lo, você deve formular a seguinte questão: 
em que nível o homem em minha vida apresenta essa problemática? 
Sua resposta o ajudará a resolver o que deseja fazer (se é que o 
deseja) a respeito de sua realidade pessoal. 
 
Resumo 
Identificação: Homens que não amadureceram. 
Categorização: Síndrome de Peter Pan (SPP). 
 
 
 
2 
O Adulto Vítima da SPP —Teste 
 
 
PETER: — Como você se chama? 
WENDY (muito satisfeita): — Wendy Moira Angela 
Darling. E você? PETER (desconsolado com a brevidade de seu nome): 
— Peter Pan. WENDY: — Só isso? 
PETER (mordendo o lábio): — Só. 
WENDY (polidamente): — Sinto muito. 
PETER: — Está tudo bem. WENDY: — Onde você mora? 
PETER: — Segunda à direita e daí sempre em frente 
até a manhã. 
WENDY: — Que endereço engraçado! 
PETER: — Não é, não. 
 
WENDY: — Quer dizer, é isso que escrevem nas cartas? 
PETER: — Eu não recebo cartas. 
WENDY: — Mas sua mãe recebe? 
PETER: — Não tenho mãe. 
WENDY: — Peter! 
 
Trata-se de um mal com um nome simples, e sua identificação 
objetiva é relativamente simples. Entretanto, no que tange à 
subjetividade, determinar quem é portador deste mal pode ser tão 
desnorteante quanto tentar decifrar a localização de "segunda à 
direita e daí sempre em frente até a manhã". 
Deve-se ser cauteloso em rotular um homem adulto como vítima da 
Síndrome de Peter Pan. Na área do diagnóstico sempre se corre o 
risco dos "negativos verdadeiros" (a doença parece estar presente, 
mas não está realmente), e dos "positivos falsos" (a doença parece 
não estar presente, mas na realidade está). 
Para complicar ainda mais as coisas, muitos adultos possuem um 
ou dois atributos da Síndrome de Peter Pan sem, na verdade, 
apresentar a síndrome propriamente dita: digamos, uma 
imaginação fértil e um anseio de permanecerem jovens 
mentalmente. Tais traços não sugeririam inteligência e serenidade? 
A presença de um ou dois atributos da SPP não faz de um homem 
uma vítima da SPP; estar inconsciente por acaso significa que a 
pessoa está morta? Não se contente com a primeira impressão. Um 
homem é vítima da SPP apenas quando os atributos atrapalham seu 
funcionamento e seu desenvolvimento de relacionamentos 
produtivos com outras pessoas. Em outras palavras: os atributos da 
SPP tornam-se um problema quando o homem não mais se 
comporta de maneira infantil, mas simplesmente é infantil. 
Um teste simples ajudará a concluir se o homem em sua vida é ou 
não vítima da SPP. Para os homens que ousam analisar-se, este teste 
pode ser altamente revelador. Porém aviso: se você é vítima da SPP 
 
achará o teste tolo, irrelevante e sem sentido. Você pode até ficar 
irritado. Se isto ocorrer, eu diria que você está se sentindo ameaçado 
pela verdade e tentando ignorá-la, como faz com as outras coisas 
que o perturbam; isto é, assume uma atitude cínica rindo por fora, 
mas morrendo de medo por dentro. 
 
O Teste 
O teste é simples. Leia cada descrição comportamental e assinale o 
grau em que ela se aplica à pessoa em questão. O 0 significa que tal 
comportamento nunca ocorre; 1 significa que esse comportamento 
ocorre às vezes (por exemplo, aconteceu uma ou duas vezes 
espaçadas); 2 significa sempre (ou você mal se lembra de sua «5o 
ocorrência). 
Desde que este teste foi elaborado para esposas e amantes, foi 
escrito do ponto de vista de uma mulher observando seu 
companheiro. Se seu relacionamento com a vítima em potencial é 
diferente, modifique as sentenças onde for necessário para facilitar 
sua avaliação. 
0 1 2 Quando comete um erro, ele reage de forma despro-
porcional à situação, exagerando sua culpa ou procurando 
justificativas que o absolvam. 
0 1 2 Ele esquece datas importantes como aniversários. 
 0 1 2 Numa festa ele a ignora, mas faz o máximo para 
impressionar outras pessoas, especialmente as mulheres. 
0 l 2 É quase impossível para ele dizer "desculpe-me". 
0 1 2 Ele espera de você prontidão para relações sexuais quando ele 
está pronto, pouco levando em consideração sua necessidade de 
jogos introdutórios. 
0 1 2 Ele vai além dos limites para ajudar os amigos, mas 
deixa de fazer as pequenas coisas que você lhe pede. 
 
0 1 2 Ele só demonstra preocupação por você e por seus 
problemas, depois de você queixar-se da indiferença dele. 
0 1 2 Ele só toma a iniciativa em situações em que a atividade 
ou a diversão é do interesse dele. 
0 1 2 Ele parece ter enorme dificuldade em expressar seus 
sentimentos. 
0 1 2 Ele anseia aproximar-se do pai, porém qualquer con-
versa (presente ou passada) com ele é afetada, cerimoniosa e 
superficial. 
0 1 2 Ele não dá ouvidos a opiniões que divirjam das suas. 
0 1 2 Ele tem repentinos ataques de raiva, durante os quais 
recusa-se a acalmar-se. 
Ele fica tão intimidado com os desejos da mãe que chega a 
aborrecer-se com ela por ser tão exigente. 
0 1 2 Ele crê não ter um emprego à altura de sua capacidade, 
mas não faz nada a respeito além de reclamar. 
0 1 2 Faltam-lhe sinceridade e calor humano ao relacionar-se 
com outras pessoas, especialmente com o filho mais velho. 
0 1 2 Ao ingerir álcool, sua personalidade parece mudar; surgem 
um temperamento explosivo, falsas bravatas ou uma alegria 
exagerada. 
0 1 2 Para ele não é possível deixar de participar de algum 
divertimento ou evento com os amigos, indo muito além dos limites 
a fim de não ser deixado para trás. 
0 1 2 Ele expressa chauvinismo através de atitudes como: 
"Acho ótimo minha esposa trabalhar fora, contanto que a casa esteja 
sempre limpa". 
0 1 2 Ele parece ter temores inexplicáveis e falta de auto-
confiança, mas recusa-se a conversar a respeito. 
0 1 2 Ele a acusa de ficar histérica, enquanto ele próprio parece 
superior à situação. Quando você se zanga, ele fica impassível. 
 
Agora some os valores por você escolhidos. Use a seguinte 
classificação para julgar o grau em que o homem em questão está 
comprometido. 
0 a 10 Não é vítima da SPP. São apenas alguns sintomas, e nada 
muito sério. Se há alguma situação incômoda entre vocês, converse 
com ele a respeito. É muito provável que ela possa ser resolvida 
numa atmosfera de amor e cooperação. 
11 a 25 A SPP é uma grande ameaça real. Siga as instruções que 
seguem este teste e, se você é do sexo feminino, prepare-se para 
avaliar-se (ver Capítulo 13). Há algumas providências que você 
pode tomar para melhorar a situação; todavia tenha em mente que, 
quanto mais altos forem os índices nesta categoria, tanto mais terá 
que se esforçar. 
26 a 40 A Síndrome de Peter Pan está instalada. Se o homem não 
procurar ajuda para resolver seus problemas, é aconselhável que 
você discuta com um profissional da área sobre o que pode fazer 
para enfrentar a situação. Veja no Capítulo 13 como avaliar seu 
papel na situação. 
 
PROJETO DE MUDANÇA 
Releia o teste. Quanto mais alto o índice, tanto maior o cuidado com 
que você deve avaliar a gravidade de cada traço que sentiu estar 
presente. Mesmo que a Síndrome de Peter Pan esteja instalada em 
alto grau (índice por volta de 30), ainda há esperança. Essa revisão 
do teste poderá oferecer indícios para a elaboração de um projeto de 
mudança. 
Eis o próximo passo: trace numa folha de papel três colunas com os 
títulos "Nunca", "Às vezes" e "Sempre". Agora repasse novamenteo 
teste, porém desta vez rememorando os últimos seis meses; tão 
acuradamente quanto possível, situe cada traço comportamental na 
 
coluna apropriada. Foi assim que uma mulher de trinta e três anos 
completou este projeto de mudança para seu marido: 
Nunca 
Flerta 
Deixa de ouvir 
Repentes de raiva 
Relacionamentos frios 
Às vezes 
Desconsideração de minhas necessidades sexuais 
Esquecimento de datas 
Egoísta com relação à diversão 
Problemas com bebida 
Faz tudo para sair com os amigos 
Chauvinista 
Nega ter medos 
Sempre 
Reações desproporcionais diante dos erros 
Sem "desculpe"' 
Ajuda os amigos 
Indiferente 
Intimidado pela mãe 
Problema com o emprego 
Não expressa sentimentos 
Distante do pai 
Acima de tudo e de todos 
De acordo com a pessoa que respondeu ao teste, este homem obteve 
índice 25. Quando conversei com ela pela primeira vez sobre o 
índice do marido, surgiram contradições (ele era honesto e terno em 
seus relacionamentos, mas nunca expressava seus sentimentos). 
Tais inconsistências sugeriam que, por mais que ela se esforçasse, 
 
nunca conseguia ser totalmente objetiva. Embora parecesse existir 
algum problema, era provável que ela estivesse interpretando 
erroneamente algumas situações. Afinal de contas, ela amava esse 
homem e, portanto, havia desvios em alguns de seus julgamentos. 
Assim, seu projeto de mudança poderia servir de linha mestra em 
sua análise de como lidar com a SPP do companheiro. Poderia 
também ser útil para relembrá-la de que, ao avaliar o marido, ela 
tinha de levar em consideração a influência de seus próprios 
pensamentos e sentimentos. 
Se você realmente se dispõe a ajudar uma vítima em potencial da 
SPP, necessitará desse projeto como um guia. Depois de elaborá-lo, 
ponha-o de lado, enquanto decide qual o passo seguinte. 
Você poderá tomar essa decisão, colocando-se três perguntas e 
selecionando a que mais deseja ver respondida. As perguntas são 
estas: 
Como foi que ele ficou assim? 
Em que ele está pensando? 
O que posso fazer para ajudá-lo? 
Se "Como foi que ele ficou assim?" é a pergunta mais importante 
para você, então gostará de ler os capítulos de 4 a 9. Neles você 
descobrirá os complexos detalhes do desenvolvimento de uma 
vítima da SPP — como uma criança recua diante da realidade e 
refugia-se na segurança da Terra do Nunca. 
Se "Em que ele está pensando?" é o que mais a preocupa, chamo sua 
atenção para o Capítulo 7, especialmentte para a seção final. É com 
o desenvolvimento do conflito em relação ao papel sexual no fim da 
adolescência que a personalidade tipo Jekyll/Hyde começa a 
formar-se. 
Se "O que posso fazer para ajudá-lo?" é a sua questão central, 
recomendo o Capítulo 13. Nele eu a desafio a confrontar não apenas 
os traços que mais a aborrecem em seu companheiro, como também 
a analisar-se criticamente. É provável que você não se surpreenda 
 
ao descobrir que pode estar inconscientemente reforçando a 
Síndrome de Peter Pan. 
Seja qual for seu próximo passo, sugiro que dedique alguns minutos 
para familiarizar-se com a sintomatologia geral da Síndrome de 
Peter Pan contida no capítulo que se segue. Uma compreensão 
dessa sintomatologia irá auxiliá-la a fincar pé no chão e a resistir à 
tentação de fugir da realidade, fingindo que não há nada de errado. 
 
 
 
 
3 
A Síndrome de Peter Pan: Quadro Geral 
 
 
PETER: — Você me poria na escola? 
SRA. DARLING (amavelmente): — Sim. 
PETER: — E depois eu teria que trabalhar? 
SRA. DARLING: — Acho que sim. 
PETER: — Logo eu seria um homem? 
SRA. DARLING: — Logo, logo. 
PETER (com veemência): — Não quero ir para a escola e aprender 
nada sério. Ah, minha senhora, ninguém vai me pegar e me 
transformar em gente grande. Eu quero ser sempre um menininho e 
me divertir. 
 
 
Todos recordamos a constrangedora história de Peter Pan, certo? 
Aquele despreocupado menino meio efeminado que se recusava a 
crescer. Foi Peter quem nos mostrou o encanto da juventude eterna. 
Foi Peter quem enfeitiçou e deu fim ao Capitão Gancho. Sua canção 
e sua dança quebraram o coração do cruel pirata e o conduziram 
por uma passagem autodestrutiva do tombadilho do navio para os 
dentes do vigilante e voraz crocodilo. 
Peter Pan simboliza a essência da mocidade. A alegria. O espírito e 
o vigor inesgotável. Em suas aventuras com a fada Sininho e as 
demais crianças, ele desperta a criança dentro de todos nós. Ele nos 
atrai. Ele é maravilhoso. Ele nos estende a mão de um fiel 
companheiro de folguedos. Quando permitimos que Peter Pan 
toque nosso coração, nossa alma nutre-se da fonte da juventude. 
Contudo, quantas pessoas percebem o outro lado da clássica 
personagem criada por J. M. Barrie? Há entre nós céticos que leiam 
nas entrelinhas deste inquietante conto? Você já parou para pensar 
em por que Peter queria permanecer jovem? Claro, é duro crescer, 
mas Peter Pan evitava isso a todo custo. O que o fez rejeitar todas as 
coisas do mundo adulto? O que é que ele realmente buscava? Será 
tão simples quanto o texto da obra faz parecer? Seu desejo de 
permanecer jovem não era na verdade uma rígida recusa a 
amadurecer? Se assim é, qual era seu problema? Ou problemas? 
Uma leitura cuidadosa do original de Barrie abriu meus olhos para 
uma realidade assustadora. Embora eu desejasse muito acreditar no 
contrário, Peter Pan era um rapaz muito triste. Sua vida era cheia de 
contradições, conflitos e confusão. Seu mundo era hostil e 
impiedoso. Apesar de toda aquela jovialidade, ele era um menino 
profundamente perturbado, vivendo numa época ainda mais 
perturbadora. Ele resvalou no abismo entre o homem que não 
desejava tornar-se e o menino que não podia mais ser. 
Perdoem-me por usar o conhecimento psicológico para desenterrar 
uma história dada como leve e divertida. Mas sinto-me plenamente 
 
justificado. Uma análise séria desse conto não somente propicia 
uma alegoria didática dos caprichos dos jovens, como ainda 
delineia uma realidade apavorante da qual devem conscientizar-se 
os profissionais da área. Sem que muitos pais e professores 
percebam isso, inúmeros de nossos meninos estão 
inconscientemente seguindo o exemplo de Peter Pan. 
Com crescente freqüência, o pouco conhecido lado de Peter Pan 
vem conquistando corações e almas de um significativo segmento 
de nossa população de meninos. Se não forem libertados, sofrerão 
contínuos conflitos emocionais e sociais. Estou certo de que Peter 
não se aborreceria por eu usar sua história para ajudar outros. Na 
verdade, duvido que ele ligasse para isso. 
As crianças de hoje vivem numa época conturbada; aliás, não 
diferente da turbulência que cercava Peter Pan e sua serena Terra 
do Nunca. Diversamente de nosso travesso herói, porém, é 
impossível às nossas crianças evadirem-se e permanecerem jovens 
para sempre. 
Tal como os contemporâneos de Peter, quem mais está sofrendo são 
as crianças do sexo masculino. Em muitos países, rapazes estão se 
recusando a amadurecer. Milhares, talvez até centenas de milhares, 
encaminham-se para um estágio de vida que os assusta. 
Apavorados, apressam-se a engrossar as fileiras da legião dos 
meninos perdidos. Mais cedo ou mais tarde vários deles superam 
seus temores da vida adulta e desertam da legião. Todavia muitos 
outros rendem-se ao medo e submetem-se à convicção de estarem 
perdidos. A legião dos meninos perdidos tem membros de todas as 
idades. Muitos homens adultos "bem-sucedidos" ainda se 
comportam como os meninos da legião de Pan. 
É mais fácil identificar os membros mais moços. Eles constituem 
uma oportunidade de estudo de contrastes. Externamente não há 
nada de errado com eles. Pelo contrário, são umas jóias raras: 
inteligentes e belos, sensíveis e sinceros, a concretização dos sonhos 
 
e esperanças de todos os pais. Contudo, se permanecem na legião 
por muito tempo, seu comportamentotorna-se um tanto estranho. 
Distanciam-se da realidade, deleitam-se com as ervas naturais do 
solo, brincam de fada e fogem às responsabilidades adultas. 
Estas reencarnações de Pan fazem eco à sua apaixonada rebeldia 
expressa no início deste capítulo. Eles não querem nada com o 
estudo, com o trabalho, nem com qualquer outra coisa vinculada ao 
adulto. Seu desejo é fazer tudo o que for possível a fim de 
permanecerem sendo o que são: crianças que não querem crescer. 
A maioria de nós já acalentou esta fantasia em alguma fase da vida. 
É perfeitamente normal polvilhar um pouco de pó mágico na 
cabeça, principalmente quando se é jovem. Aí pode-se voar para a 
Terra do Nunca acompanhando os amigos de brincadeiras infantis, 
ou simplesmente escapar à realidade nas asas das próprias 
fantasias. Certamente não há nada de errado em desejar reunir-se a 
Peter Pan e seus frívolos companheiros. Quer dizer: contanto que se 
retorne da Terra do Nunca, quando chega a hora de relacionar-se com o 
mundo real. 
Lembro-me de meu encontro com Peter Pan e seu pó mágico. Não 
fiquei invisível aos adultos — o que acontecia a Peter; mas assim 
mesmo tentei um dia voar como ele saltando do alto do galinheiro, 
tal qual meus amigos emplumados. A 
natureza me deu uma lição prática (e dolorosa) sobre a realida- 
de. Eu também disse à minha avó que não ia crescer nunca. Ela 
foi gentil e compreensiva ao responder: "Que bom, Danny. 
Agora vá para a horta e cuide dos tomates". 
A realidade neutraliza os poderes do pó mágico. Se os pais, 
professores e demais adultos envolvidos ajudarem a criança a lidar 
com a realidade, os efeitos de Peter Pan e sua legião rapidamente se 
esvaecerão, permanecendo apenas uma fonte de recordações 
agradáveis. Mas se as crianças entram na adolescência totalmente 
envolvidas na busca da juventude eterna, grandes problemas 
surgem à medida que a realidade vai se tornando nebulosa. E se 
 
atingirem o início da casa dos vinte anos com a mesma atitude 
perante a vida, uma séria crise de identidade as acometerá durante 
essa década. 
Existem muitos rapazes cujas imitações de Peter Pan acabam 
trazendo conseqüências deprimentes. Começam como todos nós, 
tomados pelo fascínio da eterna juventude. Contudo, por uma série 
de razões, chegam a um ponto em que os devaneios sobre a Terra 
do Nunca transformam-se em desastroso pesadelo. Alguns se 
recuperam, mas um crescente número deles não. Seu filho talvez 
seja uma vítima; e também seu marido. 
As crianças que seguem os passos de Peter Pan acabam por 
experimentar um grave problema psicológico que em geral conduz 
à desadaptação social. Muitas se comportam inadequadamente nas 
esferas emocional e interpessoal. Sentimentos de isolamento e de 
fracasso se apoderam delas ao se depararem com uma sociedade 
pouco paciente com os adultos que agem como crianças. Porém as 
pessoas desta sociedade não vêem motivos para se sentirem mal. 
Consideram a situação temporária e, portanto, esforçam-se ao 
máximo por ignorá-la. É desnecessário dizer que a situação piora. 
Pelo fato de o problema espelhar a vida ficcional de um herói 
clássico, facilitando assim sua explanação e compreensão, não 
duvidei em optar pela conveniência de intitular esse quadro 
Síndrome de Peter Pan — ou, abreviando, SPP. 
A SPP tem raízes no início da infância. Entretanto ela só começa a 
manifestar-se na puberdade, aproximadamente aos doze anos. 
Entre os doze e os dezoito anos, quatro sintomas se desenvolvem 
lentamente nos meninos que ainda não renunciaram à busca da 
eterna juventude. Cada sintoma é produto das pressões exercidas 
pela sociedade moderna sobre a família e, em última análise, sobre a 
criança. 
Dos dezoito aos vinte e dois anos, dois ou três sintomas emergem, 
ambos fomentados pelos quatro sintomas básicos. Estes dois 
sintomas intermediários fixam o problema, e preparam o cenário 
 
para o período de crise. Durante essa crise o jovem tem de enfrentar 
e de resolver vários anos de pensamento mágico e de um 
desenvolvimento falho do ego. Se não é bem-sucedido nesse 
processo, provavelmente será presa da SPP por um extenso lapso de 
tempo, talvez pelo resto da vida. 
Apresento brevemente a seguir os seis sintomas e a pressão social 
que age como catalisador no desenvolvimento de cada um deles. 
IRRESPONSABILIDADE 
Atitudes permissivas vêm permeando nossa literatura, nossos 
meios de comunicação e filosofias educacionais há mais de trinta 
anos. Estes passam aos pais a noção de que, na criação dos filhos, 
devem evitar o uso da autoridade e da punição, e jamais estabelecer 
ou forçar os limites no espaço de crescimento da criança. 
Os pais que adotam este método promovem o desenvolvimento da 
irresponsabilidade. Não falo de preguiça nem de pequenas 
negligências, mas de uma completa irresponsabilidade que leva a 
criança a acreditar que as regras não se aplicam a ela. 
Quando tal irresponsabilidade segue sem ser questionada, as 
crianças deixam de aprender hábitos básicos relativos ao cuidado de 
si próprias. Um fracasso nas pequenas coisas (limpeza, boas 
maneiras, método) pode avolumar-se até dar lugar a uma 
indolência que destrói a autoconfiança. A criança pensa: "nunca 
conseguirei lidar com as coisas grandes, já que nem sei lidar com as 
pequenas". 
ANSIEDADE 
As vítimas da SPP são cheias de ansiedade. Logo a tensão começa a 
dominar a atmosfera do lar. E vai crescendo a cada ano. 
Ela cerca a criança, tornando-se finalmente o pano de fundo de 
todas as cenas cotidianas. A causa dessa ansiedade flutuante é a 
infelicidade dos pais. 
 
Os pais das vítimas de SPP sentem-se insatisfeitos com seu 
casamento e consigo mesmos. As razões para esse descontenta-
mento são várias e complexas. Algumas das mais importantes são: 
falta de calor humano e de participação, desproporção na relação 
trabalho/lazer, autodisciplina deficiente e subversão dos papéis e 
dos valores tradicionais. 
A infelicidade de cada um dos pais tem efeito diverso sobre a 
criança. O pai camufla sua dor adotando a atitude do "cara durão", e 
utiliza expressões triviais para demonstrar seu interesse ("Ei, 
homem não chora!" Ou "Ah, isso logo passa!"). O resultado é um 
retraimento na relação pai/filho, onde o filho vê o pai como um 
enigma e uma pessoa de cujo amor e aprovação jamais será 
merecedor. A ansiedade é como uma dor persistente. 
A mãe tenta sofrer em silêncio, mas fracassa. Ela exibe seu martírio 
como uma medalha de guerra, e simula satisfação diante da 
perspectiva de sacrificar sua vida pelos filhos ("Eu realmente nunca 
quis nada para mim além de sua felicidade"). O filho percebe esse 
isolamento e descontentamento. Fica tentando culpar o pai, mas não 
o faz porque precisa de seu amor. Então culpa a si próprio, 
concluindo que a mãe tem boas razões para rejeitá-lo. Esta idéia 
irracional persegue-o constantemente e provoca nele uma ansiedade 
semelhante a um troar ensurdecedor. 
Na maioria dos casos os pais fingem ser felizes. Temem encarar seus 
sentimentos e a verdade. A evitação é facilitada pelo fato de não se 
sentirem muito incomodados, mas apenas muito descontentes. 
Assim, simulam falsos sorrisos e promovem atividades familiares 
nas quais a alegria é forçada; servem-se de palavras bombásticas 
que parecem ricas de significado, mas não têm nenhum conteúdo. 
Aos olhos de um observador leigo nada há de errado com essas 
famílias. Elas parecem bem ajustadas e costumam ser objeto de 
inveja dos vizinhos; contudo, essa aparência externa é ilusória. Na 
verdade, o espectro da inquietação espalha-se como um câncer 
 
emocional, devorando a segurança e a paz de espírito da criança. Os 
pais em gerai não assumem, mas estão juntos por causa dos filhos. 
Não deveriam. Os filhos sofrem por isso. 
 
SOLIDÃO 
As famílias de vítimas da SPP geralmente são abastadas. Os pais 
dão aos filhos dinheiro em vez de tempo. Não ajudam ascrianças a 
aprender como ganhar dinheiro, de modo que elas consideram a 
comida, casa e segurança coisas "caídas do céu", e concentram suas 
energias em encontrar novas maneiras de obter prazeres. 
Prodigalidade sem restrições tem um efeito muito prejudicial sobre 
as crianças. O valor do trabalho é o primeiro a desaparecer, pois os 
filhos consideram o prazer um direito e não um privilégio obtido 
pelo trabalho. Então, com tempo demais à disposição e escassez de 
segurança em casa, procuram sua identidade num grupo. Querem 
desesperadamente achar um lugar ao qual sintam pertencer. 
Em estado quase de pânico, os filhos são seduzidos pelos anúncios 
dos meios de comunicação de massa, os quais apregoam que a 
chave para o "fazer parte" é fazer o que "todo mundo" faz. 
Conseqüentemente a pressão dos amigos invade todos os aspectos 
de suas vidas, compelindo-os a "fazer parte", não importa a que 
preço. A pressão em direção do "ser igual aos outros" esmaga seu 
espírito de liberdade e priva-os da pouca autoconfiança que 
possuem. Eles despendem tanta energia para evitar a rejeição que 
mal têm tempo de apreciar as vantagens do "fazer parte". O 
resultado é a solidão. A solidão é hoje um grande problema. Ela 
afeta tanto os adultos quanto as crianças, sendo que estas pagam o 
maior preço. As vítimas da SPP, ansiosas e irresponsáveis, são 
golpeadas pela solidão que emocionalmente as traga como areia 
movediça. Elas necessitam desesperadamente de amigos; no 
entanto, quanto mais se esforçam, pior se sentem. Muitos apelam 
 
para o abuso de drogas, para a promiscuidade sexual e outros 
vícios, na busca infrutífera de salvação. 
Solidão e riqueza tendem a caminhar juntas. Crianças que não 
avaliam a importância do trabalho não têm muita chance de se 
orgulhar de suas realizações. Sem um honesto orgulho, são mais 
passíveis de ser dominadas pela pressão grupai do que as crianças 
cuja sobrevivência não é tão facilmente garantida. 
As crianças pobres das grandes cidades têm uma necessidade 
premente de "fazer parte", porém esta necessidade tem de enfrentar 
as preocupações relativas à segurança e proteção físicas. Esta 
condição retarda o desenvolvimento da Síndrome de Peter Pan. 
Os meninos de zonas rurais têm mais oportunidade de aprender 
bons hábitos de trabalho, o que frustra o desenvolvimento da SPP. 
Se você puder aceitar a premissa de que a riqueza contribui para a 
solidão, verá por que afirmo que a SPP é um mal suburbano. Com 
raras exceções, a SPP afeta crianças das classes média e alta. Logo 
você verá por que essas crianças são exclusivamente do sexo 
masculino. 
CONFLITO RELATIVO AO PAPEL SEXUAL 
Durante os últimos dez ou quinze anos, os acontecimentos políticos 
e a estratégia adotada pelos meios de comunicação vêm colocando 
nossos meninos num terrível conflito relativo ao papel sexual. Este 
conflito resulta do fato de nossas crianças ouvirem mensagens como 
estas: 
Meninos e meninas, é hora de crescerem, e já! A disposição sexual é 
a chave para você conseguir isso. É fácil passar das fraldas para o 
namoro rapidamente se você "batalhar" para isso. Se fracassar, é 
porque você é "careta". 
As meninas já podem assimilar todas as características tradicio-
nalmente tidas como masculinas. Estas incluem, entre outras, a 
obstinação, a resistência, a auto-afirmação, a procura de satisfação 
 
sexual e a independência financeira. Estes são os atributos que 
garantem a aprovação social e política. Se você não os possui, que 
pena! 
A fim de merecerem "fazer parte" e ser aceitos pelo grupo, os 
meninos devem apegar-se ao papel de machos. Portanto, não aja 
como menina. Isto significa que você não deve: expressar 
sentimentos, admitir fraquezas, ser sensível, renunciar à 
possibilidade de uma conquista sexual e jamais depender de uma 
mulher. Se você ousar assumir algum desses traços femininos, será 
rejeitado por seus companheiros. Será considerado "bicha", fora de 
seu grupo. 
Às meninas permite-se vivenciar tanto os aspectos femininos 
quanto os masculinos de sua personalidade. Freqüentemente são 
pressionadas a fazê-lo, quer queiram quer não. Não se considera 
mais "mulher-macho" ou "sapatão" a menina que deseje jogar 
basquetebol, por exemplo. 
 
Mas isso não se permite aos meninos. Apesar de toda a retórica em 
contrário, a maioria dos meninos ainda não tem o direito de chorar, 
ao menos na frente dos amigos. Todavia, se possuem laços 
familiares fortes, podem romper com essas expectativas rígidas, 
penetrar em território tradicionalmente feminino, e acabar achando 
outros homens iguais a eles. 
Aos meninos que não contam com o apoio familiar restam duas 
opções: ou capitulam diante da chantagem de uma possível rejeição 
do grupo e suprimem a ternura, a sensibilidade e quaisquer outros 
traços considerados fraquezas, não admitindo nunca se sentirem 
alienados e solitários, ou abandonam o campo heterossexual e 
atualizam o lado feminino de suas personalidades, unindo-se a 
certos segmentos da comunidade homossexual que alimentam essa 
atitude. Obviamente não estou dizendo que todos os homossexuais 
 
masculinos o são devido à SPP (embora alguns homossexuais 
realmente se ajustem à descrição da vítima da SPP). 
É irônico e triste que haja considerável apoio político para os 
movimentos feministas e pelos direitos do homossexual, mas nada 
se faça para fortalecer o moral do homem que deseja permissão para 
chorar nos braços da mulher que ama. 
NARCISISMO E CHAUVINISMO 
Estes são os dois sintomas intermediários que emergem nos estágios 
finais da Síndrome de Peter Pan. O narcisismo geralmente precede o 
chauvinismo, proporcionando à vítima um método sistemático de 
projeção das próprias inseguranças sobre outrem. O pensamento 
mágico atinge o ápice neste período, afastando a vítima da 
realidade e fomentando atitudes situadas na fronteira do bizarro. O 
narcisismo fecha o jovem no domínio das próprias fantasias e 
impede o crescimento pessoal advindo de relacionamentos 
significativos com outras pessoas. 
O chauvinismo associado à SPP é muito mais sutil que a altamente 
visível variedade comumente exibida por tiranos e fanfarrões. Ele 
protege a vítima narcisista de decepções e sofrimento sentimentais, 
dando-lhe um "papel adulto" promissor de aceitação, conquanto 
superficial, dos companheiros. As mulheres que se apaixonam por 
vítimas da SPP ficam absolutamente perplexas quando finalmente 
se dão conta do chauvinismo. Ele aparece tão sub-repticiamente que 
a mulher acha que ela é quem tem algum problema. 
O narcisismo e o chauvinismo, juntamente com a irrespon-
sabilidade, a ansiedade, a solidão e o conflito relativo ao papel 
sexual, completam a estrutura sobre a qual assentará o período de 
crise da Síndrome de Peter Pan. 
ESTILO DE VIDA PIRÁTICO 
 
Numa meticulosa leitura dos comentários de Barrie, encontrei o 
conceito que procurava para resumir o padrão comportamental da 
vítima da SPP. Ao fim do Quinto Ato, Cena I, vemos que Peter Pan 
derrotou completamente o Capitão Gancho. O pirata malvado 
comete suicídio atirando-se ao mar e projetando-se nas mandíbulas 
do crocodilo. O autor então comenta: 
Ergue-se a cortina mostrando PETER como um perfeito Napoleão em seu 
navio. A cortina não deverá erguer-se novamente para que possamos vê-lo 
na popa, com o chapéu e os charutos de GANCHO, e com uma pequena 
garra de ferro. 
Barrie sugere que o alter ego de Peter Pan é um pirata. Num dado 
tempo e num determinado espaço, Peter poderia tornar-se tão 
desapiedado e insensível quanto Gancho. Acho isso bem plausível. 
É por isso que sumarizo o estilo de vida da vítima da SPP em uma 
palavra: pirático. 
As vítimas da Síndrome de Peter Pan são uns folgados. Têm 
propensão para risadas ruidosas e para uns bons tragos de qualquer 
bebida alcoólica, e estão sempre procurando divertir-se com um 
grupinho de "adoráveis" meretrizes.São capazes de maldades e de atos inescrupulosos e podem cantar e 
dançar enquanto estão roubando os tesouros da vida alheia. Se 
sentem que você lhes fez algum mal, são tomados de fúria 
instantânea e põem-na(o) a nocaute, ou atravessam seu coração com 
uma promessa e uma mentira. Invadem suas águas territoriais e se 
ofendem com a sua indignação. Se irritados por uma segunda vez, 
farão você caminhar sobre brasas. Então, depois de pilharem 
totalmente seu coração, navegarão em direção ao poente fingindo 
não sentir nenhum remorso nem preocupação. 
 
Pessoas que já foram maltratadas pelo comportamento pirático de 
vítimas da SPP costumam concluir que esse pirata pretensioso não 
 
sente nenhuma preocupação pelo que fez. E é isso que ele quer que 
você ache. Mas pare e raciocine: os piratas não têm lar. Eles anseiam 
por um lugar que possam dizer que é seu. Consomem-se numa 
inquietação que os força a prosseguir na interminável viagem em 
busca da paz de espírito. 
Assim, apesar de a vítima da SPP "roubar" sua confiança, não pode 
usá-la. Confiança nada significa sem amor por si mesmo, e é esse o 
item crucial que falta na vida da vítima. Seu comportamento 
pirático é apenas um consolo temporário no meio de uma vida 
tempestuosa. 
O Capitão Gancho, refletindo sobre a dor e o prazer derivados de 
sua perfídia, coloca isto melhor que eu: 
As crianças deste navio agora vão para a prancha. Esta é a minha 
hora de triunfo! E no entanto algum espírito diabólico me compele a 
fazer um discurso por minha morte, pois posso não ter tempo para 
fazê-lo quando ela chegar. Todos os mortais me invejam; todavia, 
quem sabe não teria sido melhor para Gancho se ele tivesse sido 
menos ambicioso! 
[Após curta interrupção] 
Nenhuma criança me ama. Dizem que as crianças brincam de "faz 
de conta que eu sou Peter Pan", e que é sempre o mais forte que 
quer ser Peter. Elas preferem ser qualquer outro que não o Gancho; 
forçam o mais pequenino a ser o Capitão Gancho. O menorzinho! É 
aí que aparece o câncer. 
É indiscutível a presença do desalento, bem como do arre-
pendimento. Porém não se trata de um arrependimento nascido de 
uma compreensão da natureza do mal feito. Trata-se mais de uma 
espécie de perplexidade brotando da vaga sensação de que as coisas 
não estão se desenrolando conforme os planos. É manifesta a 
ausência de uma auto-avaliação. É quase impossível ao pirata e à 
vítima da SPP suporem poder ter provocado o próprio infortúnio. 
 
Em vez de se arrependerem de seus erros, simplesmente cedem ao 
remorso decorrente da incapacidade de achar alguém a quem 
possam culpar. 
Se você conhece alguma vítima da SPP, sua primeira reação é 
rejeitar esta analogia pirática. Você se agarra à idéia de que ele só é 
um pouco imaturo para a sua idade. Incomoda encarar a 
possibilidade de que alguém tão importante possa ser tão egoísta. É 
preferível ele roubar sua carteira a trair sua confiança. Mas ele não é 
nenhum criminoso, nem doente mental. Ele é um pirata moderno 
navegando a esmo num mar de solidão. 
HÁ CURA PARA A SÍNDROME DE PETER PAN? 
A SPP não é um mal fatal (embora algumas de suas vítimas 
cometam suicídio). Ela é, contudo, devastadora no que toca ao bem-
estar emocional do indivíduo e de sua família. Quando a SPP se 
apresenta completamente desenvolvida, o amadurecimento é 
bloqueado por uma procrastinação fatalista, pelo pensamento 
mágico e irracional e por uma sistemática negação que atinge o 
bizarro. 
Aqueles que amam esses homens frustram-se por completo. As 
vítimas da SPP querem desesperadamente sair do buraco; estenda-
lhes a mão, porém, e será golpeado no coração. Clamam por 
atenção; contudo, quando você tenta ajudá-los, riem-se in-
ternamente de sua insensatez em atendê-los. Os mais idosos têm 
consciência da própria condição, mas recusam-se completamente a 
procurar ajuda ou dela beneficiar-se. Alguns de vocês reconhecerão 
um amigo ou um ser amado como vítima da Síndrome de Peter 
Pan. E ser-lhes-á fácil concordar com a frustração descrita. A gente 
fica sem saber se lhes dá um abraço ou um tapa. 
Trabalhei com esses homens por muitos anos. Vi a Síndrome de 
Peter Pan em seus primeiros estágios, e testemunhei a destruição 
que é seu ápice na meia-idade. 
 
Como você pode imaginar, é duro conseguir que as vítimas se 
entreguem a uma psicoterapia. Internamente elas são tão 
desconcertantes que diversas vezes me vi tentado a pôr grades nas 
janelas de meu consultório para impedir que saíssem voando. Na 
verdade, se tivessem acesso ao pó mágico, com certeza partiriam 
para uma Terra do Nunca subjetivamente criada. 
Meu primeiro encontro com uma vítima da SPP geralmente ocorre 
entre o início de sua adolescência e os vinte e cinco anos de idade. 
Tipicamente esse jovem vive na casa dos pais e estuda ou trabalha 
meio período, com pouco sucesso. Professa-se um heterossexual 
plenamente realizado; na verdade, porém, sente-se muito pouco à 
vontade junto às mulheres. Seu desrespeito e sua irresponsabilidade 
levam seus pais a se preocuparem seriamente com o seu futuro. 
Por uma razão que vocês entenderão mais tarde, é a mãe da vítima 
que acaba conseguindo coagir o filho a procurar ajuda. A ameaça é 
vaga, mas peremptória: "É melhor você dar um jeito em sua vida, ou 
então. . . " 
A mãe não costuma explicitar o que "ou então. . . " significa, mas o 
filho apreende a mensagem: "ou vai, ou a 'mamata' acaba". 
Eu apostaria que a mãe não poria em prática a ameaça, mas o filho 
não deseja correr esse risco. Ele também não quer arriscar-se a ferir 
o coração materno. Assim, ele vem a meu consultório ao menos 
uma vez. Com ares de hostilidade, mas vem. 
Nem bem sentou-se e já começa a reclamar da chantagem da mãe. 
"Não preciso de psiquiatra. Não sou louco. Mas se eu não viesse, ela 
ia continuar me enchendo até eu vir". 
Raramente a vítima admite estar explorando os pais numa idade em 
que já deveria estar cuidando da própria vida. Nem parece disposta 
a falar sobre sua solidão e irresponsabilidade. O prognóstico não é 
bom. Os alicerces e os sintomas intermediários acham-se 
firmemente fincados. 
 
Quando reajo às queixas sobre sua mãe, ele se contorce numa reação 
de culpa. Quase em pânico, escusa-se: "Não foi nada disso que eu 
quis dizer. Não me leve a mal. Minha mãe é ótima. É só que. . . bem, 
acho que ela se preocupa comigo. Mãe é mãe, né?" 
Quando assinalo sua reação defensiva, fica ainda mais nervoso. A 
hostilidade começa a emergir. "Ei, eu não percebi o que tinha dito. 
Esquece, tá? Vamos falar de outra coisa". 
Mudamos o assunto, pois sei que isso não fará a menor diferença. 
Qualquer que seja o tema escolhido, o jovem me "gela", dando de 
ombros, falando monossilabicamente, e usando outras formas 
negativas de resposta a fim de esfriar minha indagação. Ele calcula 
que, mostrando-se frio e descompromissado, me forçará a desistir 
de questioná-lo, e poderá ir dizer à mãe que sim, que foi, e o médico 
não achou nada de errado nele. 
Muitas das vítimas mais jovens são participantes involuntárias da 
psicoterapia. Sendo assim, o processo termina antes de começar. 
Contudo, há casos em que a persistência na reflexão sobre a ligação 
irrealística do jovem com sua mãe conduz a um desfecho produtivo. 
O progresso é lento e entediante. 
Se uma vítima em potencial é atendida antes que o conflito referente 
ao papel sexual se manifeste por inteiro, as chances de uma 
mudança construtiva são boas. Porém, uma vez que a inadequação 
sexual esteja reprimida, o narcisismo e o chauvinismo instalam-se 
metodicamente, e a confrontação resulta em aumento da hostilidade 
e em fuga. 
Se a resistência ao tratamento é definitiva, a maior parte dos jovens 
sai de casa e casa-se. O pó mágico da Terra do Nunca torna-se parte 
de suas almas. Fingem ser felizes com a esposa e a família. Afirmam 
para si mesmos que estão satisfeitos com o trabalho. Negama 
dolorosa evidência de que seus corpos estão enfraquecendo. Têm 
muitas amizades aparentemente duradouras, mas que na realidade 
são superficiais e transitórias. E, como na adolescência, continuam a 
 
divertir-se. Para muitos, o abuso de bebidas alcoólicas é 
considerado um ato social. Outros compulsivamente procuram 
"casos". Sua negligência é justificada como necessidade de relaxar. 
O desalento torna-se um companheiro constante, enquanto a 
solidão toma proporções monstruosas. 
A prevenção da Síndrome de Peter Pan é relativamente fácil. 
Quanto mais cedo a vítima em potencial começar a ser tratada, 
melhor. Tenho certeza de que, se você apreender a totalidade do 
quadro da Síndrome de Peter Pan, será levado pelo impulso de 
ajudar de toda maneira possível. Pois, apesar da raiva, da negação e 
da negligência, as vidas das vítimas da SPP são cheias de tristeza. 
Não existe outra forma de descrever essas vidas. É realmente triste 
que pessoas tão incríveis tenham sido crianças que se evadiam à 
realidade e fingiam viver num perpétuo estado de jovial felicidade. 
Acontece que essa Terra do Nurca acaba transformando-se numa 
terra deserta e estéril. Se permitirmos que permaneçam lá, 
transformam-se em adultos cuja Terra do Nunca vira uma prisão de 
onde é quase impossível escapar. 
Nessa prisão a solidão enfurece-os, mas eles fingem ter amigos; são 
presas da dúvida, mas fingem ser confiantes; anseiam pela 
felicidade, e fingem contentamento; pior que tudo, consomem-se no 
isolamento e fingem ser amados. 
Peço-lhes que não acreditem neles. Tal como seu líder ficcional, as 
vítimas da Síndrome de Peter Pan são sós, terrivelmente sós. 
Quanto à sua afirmação: "Não quero ir para a escola e aprender 
nada sério. Ah, minha senhora, ninguém vai me pegar e me 
transformar em gente grande. Eu quero ser sempre um menininho e 
me divertir" — não acredite nela. Eles mentem para si próprios. 
 
 
 
PARTE II 
A SÍNDROME DE PETER PAN 
Nesta seção explicarei o desenvolvimento da Síndrome de Peter 
Pan. Os pais aqui encontrarão implicações para possíveis mudanças 
em suas estratégias de educação dos filhos. Esposas e amantes 
compreenderão melhor por que o homem a quem amam é 
simultaneamente frustrante e gratificante. Os amigos sentirão 
empatia e mais prontamente estenderão a mão para ajudar. As 
próprias vítimas poderão ganhar consciência e coragem para se 
libertarem da armadilha em que se encontram. 
O grosso de minha explanação centra-se na segunda década de 
vida, aproximadamente. As tentativas de ajudar os jovens a 
amadurecer ensinaram-me que este período se inicia na puberdade 
— aos onze ou doze anos, digamos — e termina por volta dos vinte 
e quatro, época em que a maioria dos jovens entrou na vida adulta. 
Denomino esse período de vida a idade de "atingir a maioridade". 
Já indiquei antes que seis sintomas básicos compõem a Síndrome de 
Peter Pan. Revisarei cada um deles nos próximos seis capítulos. 
Apresento os sintomas e os capítulos cronologicamente, conforme 
as "idades de pico". Minha hipótese é que o sintoma sob 
investigação floresce por um período de dois anos e domina os 
demais durante essa idade de pico. 
 
 
 
 
 
 
 
A melhor maneira de se estudar a Síndrome de Peter Pan e 
visualizar uma estrutura tridimensional composta por sete blocos. 
Primeiramente imagine quatro blocos juntos sobre uma mesa, de 
modo a formar um quadrado. Cada um desses blocos representa 
um de quatro sintomas fundamentais da SPP — quatro alicerces, se 
assim preferir. Esta é a base sobre a qual se constrói a SPP. 
A chave aqui é o conflito quanto ao papel sexual. Uma vez 
instalado, é certa a continuação do mal. 
Agora imagine que dispõe dois blocos sobre os quatro alicerces. 
Estes blocos representam mais dois sintomas da SPP e devem ser 
considerados "intermediários" entre os alicerces e o período final de 
crise. Estes sintomas intermediários fluem 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
da base e, por seu lado, formam a base para o estágio final no 
desenvolvimento da SPP. 
 
 
 
Por fim, coloque um bloco sobre os dois intermediários. Este 
representa o período de crise da Síndrome de Peter Pan. Trata-se de 
uma época em que os seis sintomas convergem para causar a 
impotência nas relações sociais, tão prejudicial à felicidade futura. 
Esta apresentação pode dar-lhe a impressão de que cada um desses 
sintomas se desenvolve de modo previsível; entretanto, não é assim. 
Embora em geral os quatro alicerces apareçam entre as idades de 
onze e dezoito anos, podem desenvolver-se, em diferentes crianças, 
em diferentes idades. Podem, até mesmo, brotar numa seqüência 
diversa da delineada aqui. 
Você pode também ter a impressão de que os quatro sintomas 
devem estar presentes antes de os sintomas intermediários se 
poderem desenvolver. Mas não é assim. Minha experiência ensina 
que o narcisismo e o chauvinismo podem desenvolver-se na 
ausência de um ou dois dos alicerces. Quando isto ocorre, a 
devastação manifestada no período de crise é substancialmente 
menor, e torna-se mais provável a solução da impotência nas 
relações sociais. 
O período de crise da Síndrome de Peter Pan reflete diferentes 
graus de incapacidade. Alguns rapazes podem simplesmente tentar 
um casamento ou uma carreira que prometem anos de chateação, 
mas uma manejável frustração. Outras vítimas sofrem de uma 
impotência tão avassaladora que uma adaptação satisfatória ao 
 
trabalho e um relacionamento afetivo gratificante ficam além de 
suas possibilidades. O grau de incapacidade associa-se diretamente 
à quantidade e à qualidade dos seis sintomas contidos na estrutura 
de blocos. 
No Capítulo 10 personalizarei o estágio de crise da SPP narrando a 
história de Randy, um jovem de vinte e três anos, cuja vida 
dolorosamente demonstra a convergência dos seis sintomas. Você 
verá como a Síndrome de Peter Pan resulta numa impotência social 
que em tudo se infiltra, reduzindo drasticamente a qualidade de 
vida do jovem. 
O último capítulo desta parte analisa homens que nunca 
amadureceram. Você verá como o conflito referente ao papel sexual 
invadiu todos os aspectos significativos de suas vidas. Verá o que 
acontece quando a crise cessa e o desalento passa a constituir-se a 
própria textura da vida. 
 
 
 
 
 
4 
Irresponsabilidade 
 
PETER: — Sou a juventude, sou a alegria, sou um passarinho que 
acaba de sair da casca do ovo. 
 
WENDY: — Mas fugiu por quê? 
PETER: — Porque ouvi meu pai e minha mãe conversando sobre o 
que eu ia ser quando fosse adulto. Eu quero ser sempre um 
menininho e me divertir. 
 
 
 
Será que ser adulto é tão ruim assim? Seja o que for que Peter tenha 
ouvido dos pais, o fato é que ele ficou assustadíssimo. Imagino-o 
descendo a escada da casa para ir pegar um copo de leite na 
cozinha, e acidentalmente ouvindo os pais falarem sobre o seu 
futuro. 
"Pobre Peter", seu pai estaria dizendo. "Ele terá que trabalhar duro, 
agüentar jogo sujo e competição, preocupar-se com a estabilidade 
no emprego, conter a raiva ao ver os impostos comendo seu salário, 
e submeter-se à ladroeira legal das contas de luz, gás. . . " Eu é que 
não o invejo por ter que crescer num mundo como este. . . " 
"E eu me preocupo com a família dele", acrescentaria a mãe. "Peter é 
o tipo do menino que vai morrer de preocupação pela esposa e 
pelas crianças. E, do jeito que vai a situação econômica, acho que a 
esposa dele vai ter que trabalhar fora. Aí seus filhos terão que 
crescer praticamente sem os pais. Ah, que pena. Pobre filho!" 
Ponha-se no lugar de Peter Pan. Se ouvisse essa história de terror 
sobre o seu futuro, você também não gostaria de permanecer 
exatamente como estava? Tudo o que teria de fazer seria concentrar-
se em ser criança. Não seria tão difícil. 
Você teria de brincar o tempo todo, divertir-se independentemente 
do que acontecesse,e fingir que a realidade é uma piada. Acima de 
tudo, teria de esforçar-se dia após dia, ano após ano para tornar-se 
tão irresponsável quanto possível. 
Faz sentido, não? A irresponsabilidade é a chave para se 
permanecer criança. O roteiro parece bastante simples: ser to-
talmente irresponsável, fazer todo o possível para resistir a hábitos 
civilizados, como guardar a roupa, alimentar o cão da família, tirar 
boas notas e dar uma mão em casa. 
A fim de maximizar sua irresponsabilidade, você teria que 
desenvolver hábitos chocantes, como deixar o banheiro na maior 
bagunça, criar uma "zona de guerra" em seu quarto, espalhar copos 
vazios usados, restos de comida e meias sujas pela sala de visitas e, 
mais que isso, ser rude e malcriado quando da visita de adultos à 
 
sua família. E em nenhuma circunstância deveria dizer "por favor" 
ou "obrigado" à sua mãe por tê-lo levado a passear com seus 
amigos. 
Nesta altura, achando que já tinha atingido certo grau de 
irresponsabilidade, você iria querer comparar seu desempenho com 
os de seus colegas. Quantos centímetros de pó acumulado há sob as 
camas deles? Quando foi a última vez que o vizinho escovou os 
dentes? Qual o recorde de dias consecutivos em que só comeu doces 
e coisas do gênero? 
Seu ritmo se estabeleceria conforme as artimanhas de seus colegas. 
Com um pouco de aplicação e quase nenhum esforço pessoal, você 
poderia ser o melhor. Então teria assegurado o direito de reclamar 
cadeira cativa na legião dos meninos que jamais amadurecerão. 
Uma vez assentada a irresponsabilidade, seria interessante você 
empregar certa dose de preguiça para barrar o desenvolvimento de 
qualquer tentativa de maturidade. Pois não é verdade que você não 
quereria que sua mãe dissesse às amigas: "Puxa, meu Peter está 
ficando tão responsável! Ele faz tudo o que-eu peço e nunca me dá 
qualquer problema?" Se isso acontecesse, seus planos iriam por 
terra. Você estaria crescendo. 
Seus amigos podem ajudá-lo a manter sua irresponsabilidade. Com 
eles você aprende a arte e a ciência da protelação. 
"Vou indo" e "daqui a pouco" são suas armas. Aprende também a 
esquecer. "Puxa, mamãe, esqueci!" Ou "você não vai esperar que eu 
me lembre de todas as minhas tarefas, né?" E, quando estas falham, 
sempre poderá aprender novas técnicas de argumentação ou de 
reclamações. "Não é justo", "você sempre implica comigo" e 
"nenhum outro menino tem que fazer isso" — são manobras 
excelentes. 
Você não precisa ser Peter Pan para resistir à maturidade. A 
irresponsabilidade não constitui um sinal automático de 
desadaptação futura. É natural que as crianças se rebelem contra o 
amadurecimento. Crescer é algo assustador, hoje mais do que em 
 
qualquer outra época passada. Só pensar sobre as realidades da 
idade adulta basta para conduzi-lo a um estado de regressão, no 
qual você se enrola em seu cobertorzinho e leva o polegar à boca, 
suspirando pelo tempo em que a decisão mais difícil de tomar era 
qual o brinquedo a escolher. 
Todos nós tivemos momentos de irresponsabilidade. Isso é parte do 
ser criança. Porém, na maioria, nós ultrapassamos a 
irresponsabilidade, e agora a responsabilidade é algo tão habitual 
que precisamos até planejar nossos momentos de lazer. Chegamos a 
um ponto em que não podemos nos evadir à responsabilidade. 
As vítimas da Síndrome de Peter Pan apresentam o problema 
contrário. Eles não podem evadir-ss à irresponsabilidade. É uma 
armadilha que começa como uma inocente e típica rebelião, mas 
acaba transformando-se num estilo de vida do adulto. Uma peça 
fundamental do quebra-cabeça da Síndrome de Peter Pan é a 
completa irresponsabilidade geradora de inépcia nas capacidades 
básicas relativas ao cuidado de si mesmo. 
PICO DA IRRESPONSABILIDADE: 11 A 12 ANOS 
Se a criança tem três anos de idade e enfia purê de batata no nariz, 
isso é normal. Se tem seis e arrumou a cama, ainda que pareça que 
continua desarrumada, ela merece aplauso pela tentativa. Se tem 
nove e a comida que preparou para o almoço queimou, deve ser 
louvada pelo esforço. Porém a uma certa altura algum adulto 
responsável deve dizer: "Você já está grande demais para fazer essas 
tolices". 
As vítimas da SPP nunca dão ouvidos a essa advertência. Ou se o 
fazem, não o registram. Entram no final da adolescência cem sólidos 
hábitos de irresponsabilidade. Muito embora tenham dez ou quinze 
anos a mais, a maioria delas ainda se porta mal à mesa, deixa a 
cama por ser arrumada, e acha que preparar um grande jantar é 
abrir uma lata de salsichas. 
 
A irresponsabilidade é um dos seis alicerces da Síndrome de Peter 
Pan. Ela atinge seu ápice geralmente entre os onze e os doze anos; a 
repentina liberação de hormônios no interior do corpo do menino 
parece estimular a persistência dessa característica. 
Passo a mostrar quatro tipos de irresponsabilidade púbere. Você 
compreenderá o contraste entre eles, persuadindo-se ao mesmo 
tempo de que cada tipo, se não for cuidado, poderá conduzir à 
destruição da responsabilidade no adulto. "Um Anjinho": Esta 
criança parece sempre inocente. O papel angelical aparece sempre 
que existe grande evidência de ela ter algo de errado. Seus olhos 
molham-se instantaneamente, e ela protesta: "Você acha que eu 
pensaria em fazer uma coisa dessas?" O silêncio e a tristeza em seu 
rosto solene e seus lábios trêmulos conquistam seu coração e você se 
esquece de dizer: "Sim". "Ranheta": Esta criança cré que a melhor 
defesa é uma boa ofensa. Ela costuma queixar-se para chantagear os 
pais. Reclama alto e bom som das injustiças de seu poder. Acaba 
por aborrecê-los tanto que eles desistem de mandar e simplesmente 
fazem eles próprios o que competiria ao filho. 
"Cego, surdo e mudo": Se os pais não soubessem como as crianças 
funcionam, achariam que este tipo de irresponsabilidade envolve 
algum tipo de lesão cerebral. Mas um grande número de crianças 
perfeitamente saudáveis utiliza a estratégia do "cego, surdo e 
mudo" para evitar a responsabilidade. Eis como reconhecer essa 
estratégia. Surdo: "Não ouvi você me pedir isso". Mudo: "Eu não 
falei nada disso". Cego: "Nossa, eu nem vi o bilhete que você deixou 
na minha mesa". Cada uma a sua maneira, estas crianças crêem 
poder evitar a responsabilidade se nenhum de seus sentidos parecer 
funcionar direito. 
"O bem intencionado": Como zangar-se com uma criança irres-
ponsável com o jeito de um cachorrinho gentil? Muitos pais 
fracassam diante desse fato. O "bem intencionado" faz rapidamente 
qualquer coisa que você lhe peça, e sorri independentemente de seu 
 
estado de espírito. O problema é que ele nunca executa suas tarefas, 
a menos que você o faça lembrar-se delas uma centena de vezes. 
Este tipo de irresponsabilidade é perigosíssimo, porque os pais 
tendem a evitar atitudes severas para ensinar a criança a assumir 
suas obrigações. 
Vejamos brevemente quatro histórias de crianças, todas elas no pico 
da idade da irresponsabilidade (onze a doze anos). 
Rickey 
O clínico da família disse que ele era um menino cheio de energia 
que exagerava nos salgadinhos e nos doces. O pediatra insinuou 
que Rickey Sharp, de onze anos de idade, talvez fosse hiperativo. A 
orientadora escolar dizia que, por estar enfrentando a puberdade, 
Rickey precisava de compreensão e paciência. A avó dizia que o 
neto, seu orgulho e alegria, estava simplesmente passando por uma 
fase e logo mudaria. De um ou de outro modo, todos estavam 
certos. Mas Ruth Sharp não podia mais esperar. Ela só queria que o 
filho "tomasse jeito". 
Rickey era o típico "anjinho". Tinha grandes olhos azuis, cuja clareza 
e intensidade não haviam mudado desde seu nascimento. Seu 
cabelo loiro e rebelde pareceria mal cuidado em qualquer outra 
criança, mas em Rickey agradava. Sua voz era tão miúda quanto seu 
corpo; ele como que sussurrava ao falar, e mal alcançava o vaso do 
banheiro da igreja.Rickey era um mestre no uso do olhar angelical, e servia-se dessa 
arma no momento exato. Quando acusado de irresponsabilidade, 
fixava os olhos de bebê no acusador e protestava inocência. Erguia 
as sobrancelhas, franzia a testa, e fazia cair o queixo em falsa 
surpresa. Persistia assim até a batalha terminar. Se ganhava, 
afastava-se alegremente; se perdia, continuava a punir o vencedor 
com os lamentos e gemidos de um galante guerreiro 
profundamente ferido. E raramente perdia uma batalha. 
 
Acrescentava-se a esse outro aspecto do angelicalismo de Rickey. 
Sem querer, ele descobrira os poderes ocultos da inocência. 
Utilizava-os para atacar a autoridade, forçar a vida a caminhar 
como ele pretendia, e reforçar a disposição de evitar a 
responsabilidade. E, passando ao extremo da atuação angelical, 
Rickey resvalara para o alter ego de qualquer anjo: o demônio. 
Seus atos deixavam todos atônitos. Fazia experiências com as flores 
do jardim, jogando sobre elas gordura quente — ouvira dizer que as 
plantas gostavam de carboidratos. Querendo saber se os cães caem 
de pé, como os gatos, atirara o cachorro de estimação da família do 
primeiro andar do prédio. Adorava as reprises do seriado de Tarzan 
apresentado na TV aos sábados de manhã e, uma tarde, representou 
o papel de seu herói saltando de uma árvore. Infelizmente 
aterrissou sobre a octogenária e artrítica Sra. Wilson, uma vizinha. 
Quem poderia zangar-se com uma criança que deseja tornar a selva 
segura para a humanidade e garantir que as plantas tenham uma 
dieta balanceada? A Sra. Sharp, ela mesma! Ela não estava 
particularmente incomodada com o cão agora manco, ou com a 
irada Sra. Wilson. Estava, contudo, no limite da tolerância da 
irresponsabilidade cotodiana de Rickey. 
Desvendei o segredo da rotina angelical durante uma breve 
consulta com Rickey em meu consultório. 
Depois de dez ou quinze minutos de conversa informal, sorri 
largamente e inclinei-me para a frente. — Você é um cara e tanto, 
hein, Rickey? 
A bola de chiclete que ele estava fazendo estourou. — Que que você 
quer dizer? 
— Bem, você faz umas coisas bem estranhas, né? Saltar sobre a Sra. 
Wilson, por exemplo. 
— Ah, isso não foi nada — Rickey tinha total controle da situação. 
— Ela podia ter se desviado de mim. De qualquer modo, eu mal 
toquei nela. 
 
Resolvi questionar essa afirmação. — Mal tocou nela? 
— É. 
— É mesmo? — Inclinei-me mais para ele. — Sua mãe me contou 
que a Sra. Wilson quebrou uma perna. Ela está bem machucada. 
— Eu não fiz por querer. — Rickey começou a aborrecer-se. — Que 
mais minha mãe te falou? 
— Bom, ela me contou que você "apronta" muito, é bastante 
preguiçoso e sabe "tirar o corpo fora" quando faz alguma coisa 
errada. 
— Hein? 
— Você sabe muito bem. Quando ela te pega fazendo alguma coisa 
errada, você só olha para ela — arregala os olhos e finge total 
inocência. — Demonstrei a rotina do bebê angelical. 
Rickey foi pego de surpresa ao ver um adulto refletir sua imagem. 
Evidentemente deve ter sentido a mesma espécie de ataque que 
ocorria quando a mãe ou o pai o questionavam sobre seu mau 
comportamento. Passaram-se alguns segundos depois que 
completei meu comentário, e dei-me conta de estar cativo do olhar 
de Rickey. 
Eu era alvo do sofisticado "feitiço" de um garoto de onze anos. 
Pareceu passar-se uma eternidade antes de eu notar o que estava 
acontecendo. Rickey estava fazendo comigo o que fazia com os 
demais adultos que o enfrentavam. Estava abrindo caminho a seus 
poderes demoníacos. 
Após recuperar-me, fiz a única coisa possível. Continuei a espelhar 
seu comportamento. — Puxa, você realmente é bom nisso. 
Rickey não se moveu. Continuou a encarar-me. Acho que vi uma 
pequena lágrima formar-se em seu olho. 
Se tinha de ajudá-lo, não podia permitir que o "feitiço" funcionasse. 
Portanto, pressionei-o, ainda que gentilmente. — Comigo não vai 
funcionar, Rickey. Sei que você aprendeu que encarar os adultos 
assim faz com que eles te deixem em paz. Mas não é bem assim. E 
não vai funcionar agora. Não vou te deixar em paz. Você precisa de 
 
minha ajuda. Você precisa aprender outra forma de lidar com esta 
situação. 
Eu sabia que Rickey precisaria de algum tempo para refazer-se, por 
isso disse-lhe: — Estou com sede. Vou tomar um pouco de água. 
Quando voltar, falaremos sobre isso. 
Saí por um minuto. Quando voltei, Rickey estava sentado com a 
cabeça inclinada. Retomei a questão numa direção diversa. Com um 
largo sorriso e muita animação na voz, disse-lhe: — Você é 
realmente ótimo nisso. Você até conseguiu pegar o velho Dr. Dan 
aqui, por alguns segundos. Aposto que você realmente consegue 
liquidar com sua mãe, né? 
Sua cabeça moveu-se para cima e para baixo, enquanto seus olhos 
permaneciam grudados no chão. 
 É um barato, né? Você realmente os deixa pirados, 
— Eu o estava instigando a contar seus segredos. 
Seus olhos desviaram-se do chão para encarar-me com fixidez. 
Prossegui atentamente. — E isso, não é? 
Ele tentou mostrar-se durão. — É o quê? 
— Você não deixa seus pais pirados com esse olhar? 
— Que olhar? 
— Ah, sem essa — respondi. — Você sabe do que estou falando. 
Você faz alguma coisa errada, descobrem, seus pais tentam puni-lo 
e aí você ataca de bruxo com esses seus olhinhos e, pronto, acabou-
se o problema. E isso pira seus pais. Certo? 
Rickey não sabia bem o que fazer comigo. Seu velho truque não 
surtira efeito. Assim, como a maioria das crianças que tenta uma 
emboscada e fracassa, Rickey fez a única coisa que podia fazer. Ele 
me contou a verdade. — É, eles piram mesmo. 
— E você se orgulha muito disso, não é? Foi sua vez de rir. 
— É. 
Era minha vez de ficar sério novamente. 
— Mas nem sempre é gostoso, ou é? 
— Como é que é? 
 
— Bem, você não fica nem um pouquinho assustado de ter que estar 
sempre fazendo besteira? 
— É. 
— E você às vezes não gostaria que seus pais te fizessem pagar por 
teus erros? 
— Hum, hum. 
— Mas você não vai contar isso a eles, vai? 
Rickey recompôs-se. 
— Não. 
Continuei a conduzi-lo no que eu considerava uma direção positiva. 
— Bom, adivinhe quem vai ter que fazer isso. 
Encaramo-nos. Balancei a cabeça afirmativamente e lancei-me um 
olhar de "sinto muito". — Eu vou ter que fazer isso. 
Ele não capitulou de imediato. 
— Você não tem que fazer nada. 
— Tenho, sim, porque quero ajudá-lo a crescer e a assumir maior 
responsabilidade. 
Rickey foi sentindo-se mais seguro de si, e seu lado "diabólico" 
retornou. Endereçou-me um olhar só parcialmente enfei-tiçante e 
disse: — Não preciso gostar, preciso? 
De forma alguma Rickey ia gostar de aprender a ser responsável. 
Quando me sentei com seus pais para discutir o caso, sabia que, 
mais cedo ou mais tarde, ele juntaria sua voz às de outras crianças 
que experimentaram a frustração e gritaram: — Por que é que 
ninguém mata o Dr. Dan? 
Steven 
Steven Jolly era tudo, menos alegre.* Era malvado e rude, sarcástico 
e de temperamento explosivo. Era um garoto que mergulhara fundo 
 
* Jolly significa "alegre", "jovial", "de bom humor" (N.T.). 
 
 na terrível fase dos dois anos de idade e lá permanecera por dez 
anos. Certamente existem crianças mais ranhetas que Steven, mas 
nenhuma me vem à mente, por mais que tente lembrar-me. Vou 
contar a história de Steven para que vocês possam compreender a 
história do desenvolvimento da raiva que freqüentemente compõe a 
Síndrome de Peter Pan. 
Os pais de Steven devem ter levado anos para se acostumarem à 
"ruindade" do filho. Não há outra explicação para o fato de eles 
haverem tolerado tanto abuso emocional. 
Sharon e Joe Jolly trouxeram Steven ao meu consultório por causa 
de uma séria decadência em seu desempenho escolar. Sua 
adaptação em casa sempre fora insatisfatória, fato que os pais 
haviam aprendido a ignorar. Todavia, dada a atual preocupação 
dos professores, seus pais julgaram chegadaa hora de fazer mais do 
que ignorar os problemas de Steven. Quanto a eles mesmos, a Sra. 
Jolly havia já superado a preocupação com o que os vizinhos 
diriam, e admitia que o filho era incontrolável. 
Steven estava para ser reprovado em todas as matérias, com exceção 
da de Educação Física. Era regularmente mandado para fora da 
classe por péssimo comportamento, como dirigir-se insolentemente 
à professora e bater nas outras crianças. Quando a professora 
tentava punir Steven, ele a desafiava: 
 
"Não tenho que te obedecer, você não é minha mãe". Confrontações 
com o diretor seguiam a mesma linha: "Meu pai não vai gostar de 
saber dessas ameaças". 
Demorei um pouco para entender por que os educadores não 
tinham tomado providências antes. Eles tinham medo. A atitude de 
Steven colocava-os contra a parede. O raciocínio deles era mais ou 
menos assim: "Se Steven é este terror na escola, seus pais devem 
saber. Mas eles não estão fazendo nada para corrigi-lo. Se abrirmos 
o jogo, eles podem virar-se contra nós". 
 
Dado o receio dos burocratas em relação ao enfoque rígido em 
matéria de educação, fazia sentido que o diretor e a professora não 
se dispusessem a arriscar seus empregos em nome de uma luta por 
um menino de quem, aliás, não gostavam. 
Quando os educadores finalmente se manifestaram, a Sra. Jolly 
armou-se de coragem para imitá-los. Ela tinha dificuldades em 
relatar tópicos específicos do desrespeito e da irresponsabilidade de 
Steven. Parecia ter lapsos de memória quando eu lhe pedia que 
narrasse detalhes precisos. Descobri que as "ruindades" de Steven 
magoavam-na tanto que ela havia erigido uma barreira protetora de 
seus sentimentos. A barreira poupava-lhe experimentar a sensação 
do fracasso, mas tornou-a também mais insensível à necessidade de 
mudança. 
Enquanto a Sra. Jolly se esforçava por relembrar dados dolorosos, o 
Sr. Jolly mantinha-se reservado. Se por um lado a esposa lutava 
para enfrentar a verdade, o pai de Steven persistia na negação. Num 
discurso tão bem talhado quanto seu terno, o Sr. Jolly disse: — Só de 
uns meses para cá Steven tem se portado mal. 
A Sra. Jolly tentou mascarar sua hostilidade e decepção. Joe 
querido, acho que você não notou como as coisas têm ido mal. Há 
muitos anos que Steven vem piorando cada vez mais. Lembra-se de 
como a professora da segunda série se preocupava com ele? 
Joe levantou as sobrancelhas, apertou os lábios e suspirou: — Ah! 
Meu sexto sentido captou o comentário não dito: "Você é quem 
sabe, querida". 
Resisti à tentação de propor uma terapia de casal, pois sabia que 
seria inútil. O Sr. Jolly continuaria a negar quaisquer problemas 
sérios, ao passo que a esposa estava absorvida demais na tentativa 
de ajudar o filho. No entanto a tensa comunicação entre os dois 
produziu resultado. A Sra. Jolly recordou um exemplo típico do 
mau comportamento de Steven. 
 
No domingo anterior os três haviam almoçado num restaurante 
próximo à igreja de onde tinham vindo. Depois de Steven tê-la 
importunado bastante, a Sra. Jolly prometera que ele ganharia uma 
sobremesa ao passarem pelo mercado na volta a casa. 
Ao entrarem no mercado, Steven anunciou alto: — Vou pegar um 
pacote de bombons e encontro vocês no caixa. 
A mãe protestou delicadamente dizendo: — Acho que você deve 
comprar uma maçã, Steven. 
A rudeza de Steven dominou-a: — Você disse sobremesa e eu quero 
bombom. Não quero maçã. Isso é ridículo. Vou pegar os bombons. 
A Sra. Jolly tentou exercer sua autoridade. — Steven, disse a Sra. 
Jolly: bombons hoje, não. Escolha uma maçã bem grande e bonita. 
Como sempre, a reação brutal de Steven: — Isso é burrice. Eu já 
tenho idade pra escolher o que quero, e eu disse que quero 
bombom. — Ele berrava, e os demais fregueses haviam-se voltado 
para assistir à briga entre a mãe indefesa e o filho agressivo. Sharon 
Jolly estava prestes a chorar por causa da atitude desrespeitosa do 
filho e do constrangimento que sentia perante os olhares de todos. 
Steven não a poupava. — Se você vai continuar com essa besteira, 
então eu vou pra casa. — Começou a caminhar para a saída. 
A Sra. Jolly sucumbiu à pressão. — Você não pode ir para casa a pé, 
está nevando e faz muito frio. Você vai se resfriar e não poderá ir à 
escola amanhã. 
A última tacada de Steven é provavelmente a mais maldosa que já 
ouvi de uma criança com tão pouca idade. — Não finja ser 
baozinha, mamãe. Você não me dá bombom, e se eu me resfriar a 
culpa é sua. 
A Sra. Jolly saiu atrás do filho e alcançou-o logo à saída. Ela estava 
em pânico. Implorou-lhe que fosse bonzinho e voltasse para dentro. 
Antes de concordar, ele exigiu que ela capitulasse Ela o fez, e o 
incidente encerrou-se tão abruptamente quanto se iniciara. 
 
Para que você não pense que uma criança seja capaz de ser cruel até 
o extremo, permita-me observar que, no íntimo, Steven estava 
sofrendo terrivelmente. Duas ou três vezes por semana ele acordava 
gritando por causa de terríveis pesadelos. Quanto se podia lembrar, 
monstros feios perseguiam-no sem descanso, querendo devorá-lo. 
Não é preciso ter grandes conhecimentos sobre análise de sonhos 
para se concluir que Steven estava sendo vítima de sua própria 
maldade. Ele evitava a responsabilidade atacando figuras de 
autoridade com um comportamento monstruoso. Crescia a 
irresponsabilidade, crescia o monstro. Por não se sentir responsável, 
Steven tinha pouca auto-estima e pouca confiança em si mesmo. Isto 
o tornava vulnerável perante os ataques do monstro por ele criado. 
E agora o monstro estava virando-se contra seu amo. 
A maldade de Steven Jolly promovia sua irresponsabilidade. Ele 
estava rapidamente se especializando em chantagem emocional, 
encarando o dever como um veículo de hostilidade. Estava 
desenvolvendo um traço que freqüentemente ocorre em vítimas da 
Síndrome de Peter Pan; isto é, estava se tornando o tipo de pessoa a 
quem é difícil amar e fácil detestar. 
Note o lado irônico da história de Steven. Aos sete anos, ele fora 
levado pela mãe a um psiquiatra infantil porque ela estava 
preocupada com suas atitudes. O psiquiatra dissera: "Não discipline 
Steven, do contrário a raiva e a hostilidade irão se exacerbar". A Sra. 
Jolly seguiu o conselho do psiquiatra. Cinco anos mais tarde ela se 
viu diante de uma criança cuja raiva e hostilidade se haviam 
exacerbado intoleravelmente. 
Billy 
 
Poucos pais têm de se defrontar com a insuportável maldade de 
Steven Jolly. Na maioria dos casos a hostilidade assume as formas 
de respostas malcriadas ou de discussões intermináveis. Sempre se 
espera de um menino um certo grau de agressividade à medida que 
 
ele luta para tornar-se um homem. Rickey expressava sua 
agressividade numa atitude angelical, e Steven era simplesmente 
agressivo. 
Billy Winters usava uma técnica maravilhosa e tão antiga quanto a 
rebelião infantil. Ele não fazia nada. Ficava parado, limitando-se a 
usar uma das três respostas estereotipadas com que reagia ao ser 
questionado sobre seu pobre desempenho. "Não ouvi. . . " "Esqueci. 
. . " "Não vi. . . " Eram as chaves de sua fuga da responsabilidade. 
Na época em que conheci a família Winters, Billy, então com onze 
anos, acostumara-se a tal ponto a suas justificativas que estava 
quase tornando-se deficiente. Freqüentemente deixava de escutar as 
instruções dadas na aula, arremessava-se no meio do trânsito para 
pegar uma bola, e perdia inúmeros pertences pessoais (cachecol, 
luvas, uma raquete de tênis e outros) por puro esquecimento. 
O casal Winters fora levado ao desespero pela tática do filho. 
Haviam tentado todos os modos imagináveis de modificar os 
hábitos de Billy. Inclusive tinham chegado a extremos perigosos 
com esse propósito. Mas nada funcionava. A meu ver, a razão de 
haverem fracassado foi que tentaram convencer Billy a tornar-se 
responsável. 
Peg e John Winters eram pessoas instruídas e sensatas,e amavam 
muito seu filho único. Peg era fanática por livros sobre educação de 
filhos. Sempre trocava idéias a respeito com o marido, a quem não 
agradava a importância dada à permissividade e à aceitação 
incondicional, preferindo seguir a "linha dura" aprendida do pai e 
do avô. Era assim (com o "vamos conversar sobre isso" da mãe e o 
"obedeça, ou. . . " do pai) que o casal Winters tentava lidar com a 
estóica indiferença de Billy. 
Billy recebia três espécies de mensagem em reação à sua estratégia. 
Se a mãe estava presente, ele ouvia: "Eu faço a mamãe ficar triste". 
Se era o pai que o enfrentava: "Eu faço o papai ficar bravo". Quando 
 
ambos estavam envolvidos na situação, a idéia era: "Eu faço a 
mamãe e o papai brigarem". 
Eis três breves exemplos de confrontações típicas na residência dos 
Winters: 
A Sra. Winters sentava Billy à mesa da cozinha e dava início à 
"sessão pedagógica" dizendo: — Você sabe que tem tarefas em casa 
depois de chegar da escola, né, Billy? 
— Hum, hum — era a resposta. 
— E você sabe muito bem que eu sempre deixo bilhetes sobre as 
coisas que eu quero que você faça, certo? 
— Hum, hum. 
— Então, Billy, por que você não as faz? — Peg sentia-se culpada 
por zangar-se com o filho. — Você sabe como eu fico triste quando 
você não tenta me ajudar em casa. 
Billy era pressuroso em apresentar sua melhor desculpa: 
— Eu nem sempre vejo os bilhetes. 
Peg cerrava os punhos para não explodir: — Você sempre diz isso. 
Mas isso não me deixa menos aborrecida. Por favor, conte-me o que 
está acontecendo com você. Por favor! 
A resposta de Billy completava a circularidade da "discussão": — 
Não sei. 
Como você provavelmente percebeu, esse tipo de conversa não 
levava a nada, apesar de ocorrer diariamente. E a "linha-dura" do 
pai também não produzia resultado. 
O hábito de Billy de perder as coisas irritava seu pai. — Você deve 
pensar que o dinheiro cai do céu! Ou vai ver que você simplesmente 
não pensa. Droga, qual é o problema, hein, Billy? 
Assustado, Billy murmurava: — Não sei. Eu esqueci. 
— Esqueci! Esqueci! Você perde tudo o que eu compro com tanto 
esforço pra você! 
 
Nesse ponto Billy geralmente abaixava a cabeça e nada dizia. 
— Me diga uma coisa, meu filho. Eu quero saber por que é que você 
gosta de me irritar. 
— Não sei. 
 
A rigidez e a hostilidade do pai eram tão ineficazes quanto a 
excessiva tolerância da mãe. Em ambos os casos Billy sentia-se 
encostado na parede, e produzia a resposta-padrão: "Não sei . 
Quando ambos os pais estavam envolvidos na confrontação, 
surgiam faíscas em todas as direções. 
A briga costumava iniciar pelo pai. — Droga, Billy, é a terceira vez 
neste mês que você perde o caderno! Não vou mais aceitar essa' 
desculpa. Ou você endireita ou eu vou ter que começar a te bater 
como se você íosse um garotinho. 
Billy permanecia imóvel e silencioso, enquanto a mãe tentava 
suavizar a "bronca'' do pai. — Billy, explique pra gente por que você 
não está conseguindo lembrar-se das coisas. Conta pra gente o que é 
que está te perturbando. 
Billy não respondia; o pai fazia-o por ele. — Ah, qual é, Peg? Não há 
nada de errado com o Billy que uma boa surra não resolva. 
— John — replicava Peg exasperada —, Billy jamais nos contará o 
que o incomoda se você continuar a menosprezá-lo. 
Com esse comentário a atenção inevitavelmente desviava-se de 
Billy, e Peg e John iniciavam longas discussões. Tudo sempre muito 
igual. O pai advogava severidade, ao passo que Peg defendia a idéia 
de que Billy era irresponsável por sofrer de algum tipo de angústia 
mental. Entrementes, Billy era relegado a segundo plano, o que o 
levava a julgar-se a causa da briga dos pais. 
Em suma, tudo indicava que enquanto Billy estava aprendendo 
como evitar a responsabilidade, ia percebendo que era a figura-
chave da infelicidade familiar. Não apenas era surdo, mudo e cego, 
como também se via como um menino mau, por incomodar tanto os 
 
pais. As medidas extremistas da mãe e do pai eram facas de dois 
gumes. 
Sam 
Todos amavam Sam, graças à boa índole de que era dotado. Os 
vizinhos podiam contar com ele para ajudar a procurar o 
animalzinho de estimação. As beatas da igreja afirmavam que ele 
era o menino mais educado da congregação. O chefe dos escoteiros 
elogiava Sam pela liderança, gentileza e paciência para com os 
companheiros mais novos. Até o diretor da escola admirava a 
personalidade tão agradável desse garoto de doze anos, apesar de 
queixar-se de que Sam às vezes era um tanto turbulento. 
Havia, porém, um problema sério. A mãe de Sam, senhora que 
trabalhava muito, tanto em casa como fora, desconhecia por 
completo o menino descrito por todos. "Não pode ser meu Sam", 
pensava. "Claro, ele é amável, de boa índole, mas não consigo que 
ele faça nada a menos que suplique de joelhos!" 
A história do menino de boa índole, Sam, é típica de muitas vítimas 
da SPP. Não são malvados, nem estóicos, nem angelicais Não são 
particularmente desagradáveis nem maleáveis. Na verdade, 
revelam-se excelentes relações públicas, avançados demais para a 
idade. São os primeiros a oferecer auxílio a qualquer pessoa 
necessitada. Chegam inclusive a arriscar a segurança pessoal para 
ajudar alguém. Todavia, a menos que extremamente exigidos, não 
movem um só dedo para ajudar em casa. 
Como pode uma criança tão disposta a ajudar os outros ser tão 
irresponsável em casa? Para mim, a melhor maneira de desvendar o 
sentido dessa inconsistência é sumanzar o estudo que fiz do 
paciente Sam Koler, de doze anos de idade. A espécie de 
irresponsabilidade apresentada por Sam é a mais perigosa de todas, 
pois é um estilo de vida fácil de se desenvolver e, se a criança não 
for tratada, esse traço se cristaliza e se torna um permanente alicerce 
da Síndrome de Peter Pan. 
 
Sam era o mais velho de três irmãos com as idades respectivas de 
12, 9 e 7 anos. Estava na sexta série de uma escola pública, onde 
mantinha a média 8, sem precisar estudai muito. A professora 
relatara que Sam era muito querido, mas ocasionalmente mostrava-
se a ovelha negra da classe. Um dia, ao mandá-lo para a diretoria 
por ele ter perturbado a ordem da classe com gracinhas, ouviu-o 
xingá-la com um palavrão ao sair da sala. Ficou chocada ao ouvir tal 
linguagem, por tratar-se de Sam. Parecia estar fora do contexto de 
sua conduta. Na realidade não estava, Sam era um garoto cheio de 
raiva. 
A raiva de Sam provinha de várias fontes. Seu corpo estava se 
modificando, com novas exigências internas. Ele estava descobrindo 
a independência, mas vivendo numa situação plena de 
dependência. Desejava furtar-se à superproteção materna, atitude 
bastante natural mas que, de qualquer forma, fomentava 
consciência de culpa. Estes sentimentos são típicos do início da 
adolescência, e passariam. Porém existia uma fonte de raiva não 
inócua e passível de provocar problemas duradouros em Sam. Ele 
sentia-se desamado pelo pai. 
O pai de Sam era dedicado ao trabalho. Mas pouco se dedicava à 
esposa e menos ainda a Sam. Tentando ganhar o amor do pai, Sam 
assumiu o papel de adulto com o ardor de um homem feito e com a 
eficiência de um bebê. Ele necessitava desesperadamente do amor 
do pai, mas nunca o obtinha. Mergulhou como podia no mundo 
adulto, onde esperava que suas ações repercutissem de tal modo 
que as pessoas pudessem contar a seu papai como era maravilhoso 
seu primogênito. 
Sam calculava que, quando os adultos dissessem a seu pai como ele 
era adorável (coisa que eles faziam), o pai se abriria para ele e o 
abraçaria (coisa que ele não fazia). Diante do fracasso, Sam concluía 
que tinha de esforçar-se mais. Assim, quanto mais o pai o ignorava, 
mais ele tentava ganhar seu amor, agradando as outras pessoas. 
 
Ele sentia-se internamente compelido a mostrar bons desempenhos. 
Isto provocava-lhe tensão. Preocupava-se constantemente com a 
possibilidadede o pai considerá-lo ruim. Isto o fazia nervoso e 
receoso. Consumia-se com os conceitos de "deveria", "devo" e "tenho 
que". E isto o enraivecia. 
Ele só achava alívio, preso neste círculo vicioso, rebelando-se em 
casa. Por sentir-se seguro do amor da mãe, esta se tornou o alvo 
lógico de sua rebelião. Se ele soubesse verbalizar essa idéia 
inconsciente, diria: "Mamãe vai continuar me amando, mesmo que 
eu a trate mal". 
Outro componente de sua justificativa pela persistência na 
irresponsabilidade em casa era estar imitando o pai. "Se eu for como 
ele, ele vai gostar de mim", pensava. Infelizmente o pai era 
inabalável em sua noção chauvinista de que cabia à mulher o 
trabalho doméstico. Sam jamais disse isto, mas agia como se 
acreditasse nisso. 
Não percamos de vista outro componente da irresponsabilidade de 
Sam: ele era uma criança. Contava doze anos, e como qualquer pré-
adolescente normal, estava fazendo o máximo para não crescer. 
Entretanto, esta parte do curso normal dos acontecimentos estava 
pesando demais na balança. Foi ela, para mim, o primeiro indício de 
que algo estava errado. 
Sam era bom demais. Exagerava na tentativa de agradar. Esse fato 
levou-me a investigar além de sua máscara de perfeição. Descobri 
que seu comportamento era enganoso. Contrariando as aparências, 
ele não estava aprendendo a ser responsável. Profundos 
sentimentos de insegurança motivavam sua conduta "responsável". 
Apenas conseguia um alívio temporário do sofrimento provocado 
por esses sentimentos, quando se via aclamado aos olhos dos 
outros. 
Desnecessário dizer que sua tensão emocional ia avolumando-se. 
Ele sentia-se distanciado do pai e compelido a esforçar-se a fim de 
obter a aprovação social, a qual, como esperava, resolveria seu 
 
problema. O problema, porém, aumentava e ele se esforçava ainda 
mais, aprofundando sempre sua aversão à responsabilidade. Estava 
desenvolvendo a idéia de que a responsabilidade era um ardil — 
algo feito pelas pessoas com o fim único de conseguirem aprovação. 
Conseqüentemente nunca assimilara o sentido da responsabilidade. 
Quando conheci Sam e sua família, um dos alicerces da Síndrome 
de Peter Pan estava firmemente assentado. A reversão dessa 
tendência era um problema familiar. Discutirei minha postura em 
relação ao problema de Sam, bem como ao dos outros três meninos, 
no Capítulo 12. 
 
 
 
 
5 
Ansiedade 
 
JOHN: — (Peter) na verdade não é nosso pai. Ele nem sabia ser pai 
até que eu ensinei. 
PETER: — Wendy, você está enganada quanto às mães. Eu pensava 
como você sobre a janela (que permaneceria aberta), por isso fiquei 
luas e luas longe, e depois voltei, mas aí havia grades na janela, 
porque a minha mãe tinha se esquecido de mim, e havia outro 
menino dormindo em minha cama. 
 
Peter Pan era como uma bomba-relógio, pronta para explodir a 
qualquer instante. Sua ansiedade ricocheteava por toda a Terra do 
Nunca, contaminando todos a seu redor. Vocês todos conhecem 
esse tipo de pessoa. Suas emoções estão tão à flor da pele que o ar à 
sua volta fica carregado de eletricidade psíquica. Quando você lhe 
pergunta se está bem, ele encerra c assunto com algo assim: "Eu? 
 
Bem? Eu estou ótimo! Numa boa! Comigo não há nada de errado! 
Por quê? Algo de errado com você?" 
Pare um instante e olhe o que há por trás de tanta jovialidade, e verá 
que as comportas da ansiedade de Peter estão para romper-se. E não 
precisa ser psicólogo para notá-lo. Esqueça as manchas de tinta e 
todo o resto da bateria de testes projeti-vos. Simplesmente observe 
seu comportamento diário. 
A mais palpável evidência da ansiedade de Peter Pan é o fato de ele 
julgar erroneamente situações vitais. Por exemplo: sua calma 
enquanto o Capitão Gancho acendia o pavio da bomba. Excitava-o a 
perspectiva de afogar-se, pois morrer parecia um ótimo programa 
para aquela tarde. Não é necessário ser histérico para preocupar-se 
com essas duas calamidades. Peter Pan, contudo, não se 
impressionava. 
Mas como se inquietou pela perda de sua sombra! Mais: teve um 
ataque quando seus fiéis seguidores não se propuseram brincar do 
jeito que ele queria. E ficava nervosíssimo frente à possibilidade de 
ser tocado por alguém. Em resumo, as prioridades de Peter 
seguramente divergiam das da maioria das pessoas. 
Se, como eu, você acredita que Peter Pan não era mentalmente 
enfermo, será forçado a concluir que alguma coisa o estava 
perturbando. Apesar de não saber do que se tratava, ele percebia 
seus efeitos negativos. Sentia-os, mas não podia falar deles. 
Como todas as pessoas ansiosas, Peter tentava mascarar sua 
inquietação, o que na verdade denunciava sua causa. Isto é, 
defendendo-se do nervosismo, ele exibia os indícios da causa de sua 
ansiedade. As duas citações no início deste capítulo representam 
esses indícios: Peter Pan sentia-se alienado do pai e profundamente 
magoado pelo que interpretava como a rejeição de sua mãe. Essa 
combinação originara nele uma ansiedade incomensurável. Não 
contava com nenhuma figura em quem pudesse confiar. Ele 
precisava de ajuda. 
 
Se me houvesse sido dado ajudar Peter no tocante à sua ansiedade, 
eu teria enfocado minha atenção sobre seus pais, tratando o 
nervosismo de Peter como indicador de um problema familiar. Algo 
não ia bem no casamento de seus pais. Será que o Sr. Pan era um 
escravo do trabalho e cheio de autocomiseração? Ele seria o produto 
de uma geração a cujos meninos era vedado chorar? A Sra. Pan 
estava satisfeita com o tradicional papel de dona-de-casa e mãe? Os 
Pans tentavam adaptar-se às expectativas sociais quanto à criação 
dos filhos? O Sr. Pan era chauvinista? Se o era, a Sra. Pan 
desempenhava o papel de chauvinete"? Os Pans dedicavam-se um 
ao outro, ou seu casamento se mantinha por mera questão de 
hábito? 
As respostas a estas e a outras perguntas desvelariam a atmosfera 
em que Peter estava sendo criado — uma atmosfera de tensão e 
ansiedade. De algum modo o Sr. e a Sra. Pan estavam passando ao 
filho a impressão de que ele devia evitar aproximar-se demais do 
pai, e de que talvez sua mãe não o amasse. 
* * * 
A ansiedade, que é o fundamento da Síndrome de Peter Pan, 
origina-se de problemas conjugais e deles se alimenta. Os pais 
acham-se de alguma forma distanciados um do outro. Em geral não 
há profunda desarmonia aparente; conseqüentemente não vêem 
razão de procurar um conselheiro ou terapeuta de casais. Pode 
parecer banal, mas seu problema concentra-se numa falha de 
comunicação. 
Os pais das vítimas da SPP crêem possuir valores em comum. Na 
verdade, o tempo e a experiência levam-nos a perceber que, em 
alguns aspectos, seus valores são conflitantes. Entretanto, 
acostumaram-se um com o outro e deduzem que, desde que ainda 
estão casados, o casamento é realmente produtivo. Esta crença 
mágica impede-os de se comunicarem efetivamente. Ocorre-lhes 
 
uma persistente sensação de saturação, porém dão de ombros, 
encarando-a como um mal necessário da vida em família. 
Isto não faz com que tal sensação seja esquecida. Quando os pais 
não conseguem comunicar-se e resolver seus conflitos, eles também 
experimentam ansiedade. A frustração de viver com alguém de 
quem não nos sentimos próximos acaba por envolver outros 
membros da família, inclusive os filhos. 
As vítimas da SPP são crianças muito sensíveis. Escutam os pais e 
tentam agir segundo o que lhes é dito. Nem sempre o demonstram 
(ver Capítulo 4, "Irresponsabilidade"), porém têm um forte sentido 
do certo e do errado. Muitas vezes, em sessões de orientação com 
jovens e adultos, vítimas da SPP, desejei que eles fossem menos 
influenciáveis no relacionamento com os pais. Se tivessem resistido 
mais à influência deles talvez não tivessem caído em tão profundos 
abismos. É irônico que crianças, inicialmente tão receptivas às 
mensagens dos pais, se tornem tão desagradáveis justamente para 
com aspessoas de quem mais gostam. 
Descobri oito mensagens que fomentam o aparecimento da 
Síndrome de Peter Pan. Chamo-as mensagens ocultas, pois são idéias 
perturbadoras transmitidas pelos pais inconscientemente. A fim de 
mascarar a própria ansiedade os pais falam aos filhos, sem perceber, 
em vez de dialogar com eles. 
Classifiquei quatro dessas mensagens ocultas como mensagens 
mãe-filho, porque são dadas ao filho pela mãe. São: 
Não incomode seu pai. 
Você está agindo como seu pai. 
Seu pai não entende nada de sentimentos. 
É uma pena que para seu pai o trabalho seja mais importante que a 
família. _ 
As outras quatro mensagens são mensagens pai-lilho, porque são 
dadas ao filho pelo pai. São as seguintes: 
Faça sua mãe parar de me encher. 
Não magoe sua mãe. 
 
Sua mãe não entende os homens. 
Tenha calma, você sabe como são as mulheres. 
Antes de analisar estas mensagens, explicarei por que são tão 
prejudiciais durante os primeiros anos da adolescência. 
PICO DA ANSIEDADE: 13 A 14 ANOS 
Escolher uma idade-pico para esta ansiedade é algo um pouco 
artificial. A discórdia conjugai exerce efeito negativo a partir do 
momento em que as crianças são capazes de sentir a atmosfera do 
lar. Os especialistas em desenvolvimento afirmam que essa 
sensibilidade emocional age já antes do nascimento da criança. 
Portanto, uma vítima em potencial da SPP é afetada pela falta de 
comunicação dos pais, e sua tensão resultante tem início logo que 
ela começa a desenvolver-se. Apesar deste fato, tenho em que 
fundamentar-me para designar os 13-14 anos como a idade-pico da 
ansiedade. 
Com o início da adolescência vem o do interesse pelo re-
lacionamento menino-menina. Não constitui surpresa o fato de que 
o primeiro relacionamento enfocado pelos púberes seja o dos pais. 
Se até então não se tinham dado conta dos problemas conjugais dos 
pais, certamente isso ocorrerá aproximadamente à idade de treze 
anos. E, uma vez conscientes desses problemas, tornar-se-ão 
altamente receptivos a quaisquer mensagens provenientes dos pais. 
m O jovem de treze a quatorze anos está também na fase do 
cavaleiro romântico". Intrigado pela natureza oculta das mensagens, 
arvora-se em detetive investigador do seu significado oculto. Ele 
não precisa usar de muita dedução para concluir que os pais estão 
com problemas. Por ser um cavaleiro audaz, subirá em seu cavalo 
branco e se apressará em salvá-los. Por ser uma criança 
inexperiente, concluirá erroneamente que ele é o problema. Isso o 
assusta, mas ele sabe que deve salvar os pais de sua própria 
maldade. 
 
MENSAGENS OCULTAS 
Mensagens ocultas são aquelas perigosíssimas coisas que se dizem 
sem querer ("escapou!") e elevam a ansiedade a níveis intoleráveis. 
São transmitidas sem que tenha havido intenção: os pais ficam 
horrorizados ao saber que o filho as ouviu de suas bocas. São 
metafóricas: os pais ficam constrangidos ao reconhecer seu 
significado oculto. São imensamente danosas: os pais ficam 
profundamente arrependidos ao perceber, com o passar do tempo, 
que os filhos tentaram agir conforme eles próprios mandaram. 
As mensagens ocultas de que trato agora são aquelas através das 
quais o pai ou a mãe despeja sua frustração conjugal sobre a criança. 
Em lugar de aclararem a situação com conversas em particular 
sobre suas decepções mútuas, os pais mantêm suas frustrações 
"atravessadas na garganta". Um dia o nível da frustração atinge um 
ponto incontrolável. Eis o momento em que a criança é colocada no 
meio da discórdia conjugal e, como resultado, uma ansiedade 
debilitante começa a crescer. 
Na análise da estrutura familiar das vítimas da SPP, descobri que as 
mensagens ocultas agrupam-se em volta de duas temáticas centrais: 
uma transmitida pela mãe ao filho, e a outra proveniente do pai. A 
temática mãe-filho é: Não se aproxime de seu pai. A temática pai-filho 
é: Sua mãe é uma fraca e você a está magoando. 
Para vermos o funcionamento destas temáticas, vamos visitar uma 
família na qual um jovem, vítima da SPP, vai em breve receber uma 
poderosa dose de ansiedade. 
A mãe chega do serviço a tempo de atender a um telefonema de um 
amigo do filho. Não, não sabe onde ele está, ele nunca se dá ao 
trabalho de dizer nada a ela. Aí ela descobre que ele se esqueceu de 
descongelar a carne, segundo ela mandara em um bilhete deixado 
sobre a mesa. Em trinta minutos ela tem de servir o jantar, e o prato 
principal ainda está congelado. O que mais deseja nesse momento é 
tomar um banho, descansar alguns minutos e torcer o pescoço do 
 
filho, não necessariamente nessa ordem. A dobradiça do armário da 
"ozinha geme, ao tornar-se mais uma vez o bode expiatório. 
O pai chega do trabalho ávido de carinho, de compaixão e do jornal 
vespertino. Tenta ser simpático, porém jamais obteve muito sucesso 
nisso. Há vários meses, quando a esposa voltou a trabalhar fora, ela 
lhe pediu que ajudasse nas tarefas de casa. Na noite seguinte ele foi 
buscar o jornal e pôs o lixo para fora. Foi o começo e o fim de sua 
participação nas lides domésticas. A esposa devia ter reclamado 
abertamente; em vez disso, ela o criva de tiradas sarcásticas que, 
aparentemente ionoradas por ele, só serviram para reforçar sua 
decisão de freqüentar mais o golfe. 
A mãe reprime constantemente sua raiva e seu ressentimento. O 
marido praticamente desconhece a tensão em que ela se encontra. 
Nem mesmo a abraça, a menos que ela lhe peça expressamente. 
Sente-se presa de um filho de treze anos irresponsável, de um 
horário de trabalho extenuante e um marido insensível. 
Ironicamente o marido sente o mesmo, com o detalhe de que, rindo, 
rotula a esposa de "chata" e afoga a raiva no uísque. 
Enquanto a mãe e o pai fingem que a tensão não existe, seu filho 
único entra na cozinha como um furacão, querendo saber quanto 
tempo o jantar vai demorar. Sem aguardar a resposta, segue para a 
sala de estar e pede ao pai dinheiro para o fliperama. O pai 
resmunga algo sobre o filho achar que o dinheiro cai do céu, e 
entrega-lhe cinco dólares. As comportas do dique se abrem. As 
mensagens ocultas portadoras do germe da ansiedade começam. 
— Deixe seu pai em paz — a mãe grita da cozinha. — Ele teve um 
dia duro e precisa descansar. De qualquer modo, você não merece 
dinheiro nenhum, depois de desaparecer o dia inteiro e esquecer 
suas tarefas aqui. 
Que tarefas? — vem a resposta atrevida. Não sei quantas vezes 
tenho que te relembrar. — A voz da mãe trai seu estado de espírito. 
— Estou por aqui com você! Seu pai e eu nos matamos de trabalhar 
 
por você, e você nem tem coragem de fazer uma ou duas coisinhas 
para ajudar. 
O menino tenta rebater. — Não lembro de você me pedir nada. Não 
sei por que tanta bronca. 
A provocação do filho estimula a primeira mensagem oculta do pai. 
— Nao seja malcriado com sua mãe, filho. Ela está tentando 
preparar o jantar e você só a magoa. Pare com isso já! 
A mãe amaldiçoa uma recalcitrante lata de ervilhas. Atira a lata 
semi-aberta sobre a pia da cozinha e sobe para trocar de roupa. Fita 
o filho com um ódio do qual se arrependerá antes de chegar no topo 
da escada. Na realidade não é a irresponsabilidade dele que a irrita 
tanto, e ela sabe disso. Ela sofre por viver com um homem mais 
atencioso para com os estranhos do que para com ela. 
O pai chama o filho à sala. Com suavidade, tentando reduzir a 
tensão, diz: — Filho, você precisa aprender a entender as mulheres. 
Sua mãe não agüenta trabalhar o dia inteiro, e depois ainda vem 
você maltratá-la. 
É impossível a esse garoto de treze anos apreender o significado 
escondido nas palavras do pai. Ele as toma literalmente. — Mas eu 
não maltratei a mamãe, papai. 
O pai não está interessado em maiores explicações. Enfia 
novamente o nariz no jornal e encerra o assunto: — Você precisa ter 
em mente que sua mãe não entende os homens. Cuidado, hein? 
Silenciado desta maneira tão peremptória,o filho sobe para seu 
quarto. Mal percebe que está sendo sufocado pela carga 
contraditória das mensagens ocultas. 
A mãe ouve o filho no banheiro lavando o rosto e as mãos. Tomada 
pelo remorso por causa de seu acesso de ira, bate timidamente à 
porta do banheiro. Ela sabe que ele dirá que entre, porém as batidas 
significam para ela o início de seu pedido de desculpas. 
A suavidade de sua voz seduziria qualquer criança. — Posso falar 
com você um minutinho? — Sem esperar pela resposta, a mãe 
 
explica seu comportamento, usando palavras tão meigas que 
ninguém poderia acusá-la de nada. 
— Eu sei que fui severa demais com você. Demais. É que quando 
vejo você agir como seu pai, fico realmente assustada. Seu pai anda 
muito ocupado no serviço e não tem tempo de ajudar. Não quero 
que você seja assim. Você não é como seu pai; você tem bons 
sentimentos. Quero que você os expresse e não seja tão cruel. 
Atualmente o trabalho de seu pai é mais importante para ele do que 
a família. Você vai ter que aceitar isso. Algum dia ele voltará a ligar 
para nós. Mas, até lá, preciso que você me ajude. 
O filho olha fixamente para a parede da frente, balançando a cabeça 
para cima e para baixo. A mãe está tão envolvida em sua raiva 
contra o marido que nem nota as lágrimas assomando nos olhos de 
seu filho. Acaricia-lhe a cabeça e desce para terminar o jantar. 
O interesse do pai pelas notícias é interrompido pelo barulho da 
esposa movendo-se na cozinha. Ele faz uma frágil tentativa de 
atenuar as coisas oferecendo-se para ajudar. Isto só o expõe ao 
ataque. A esposa ainda não está bem certa de seus sentimentos, mas 
o tom rude de sua voz é revelador. 
— Por que você dá tanto dinheiro a ele? Você sabe que ele já passa 
tempo demais nesse maldito fliperama. — Sem dar-lhe chance de 
responder, ela prossegue: — Se você passasse um pouco mais de 
tempo com seu filho, talvez soubesse o que é que ele está sentindo. 
Talvez soubesse de que ele precisa. Ele não precisa de um pai que o 
encha de dinheiro. Ele precisa de um pai que o ame e compreenda a 
fase difícil por que está passando. Talvez você devesse parar de 
jogar tanto golfe e dedicar algum tempo a seu filho. 
As explicações do pai não são ouvidas. Mas ele sabe que a esposa 
não espera dele respostas. Seu objetivo é fazê-lo sentir-se culpado. 
Esta tática funcionou até certo ponto: até o ponto em que, por estar 
se acostumando à tensão conjugal, ele já não dá muita atenção às 
queixas da esposa. Ele está sofisticando seu manejo da inércia 
emocional. 
 
Essa atmosfera rancorosa subsiste à mesa do jantar. O filho é tratado 
como uma peteca, jogado de um lado para outro, entre dois ferozes 
competidores que violam flagrantemente as regras básicas que 
governam a decência e a disciplina. 
As maneiras do filho à mesa são detestáveis. Em vez de repreendê-
lo com severidade, a mãe o espicaça. Ele reclama da comida. Em 
lugar de envolvê-lo numa conversa agradável, c pai faz um ridículo 
esforço de aplacar a esposa sugerindo que talvez haja algum 
problema com as papilas gustativas do filho. O filho fica amuado, 
dando aos pais a oportunidade de, em uníssono, lembrar-lhe que 
ninguém quer por amigo uma pessoa mal-humorada. Não 
demorará muito para o filho tentar desesperadamente provar que 
estão errados. 
Como esta cena ocorre mais ou menos freqüentemente, o filho está 
se acostumando. A coisa toda não o atinge tanto quanto você possa 
imaginar. Por isso não me surpreende vê-lo tirar a mesa 
calmamente, cantarolando. Ele ainda não está totalmente apático, 
mas começa a perceber as vantagens de anestesiar seus sentimentos. 
Após uma hora e meia de surra emocionai, o filho está em excelente 
estado. Resta-lhe suportar o último golpe verbal, o "golpe de 
misericórdia", proveniente do pai. Em certo sentido, este fere mais 
que os outros. 
O golpe vem numa hora em que pai e filho poderiam estar 
compartilhando um momento de trégua e paz. Embora o tom de 
voz do pai seja caloroso e sincero, o filho treme por dentro à 
aproximação do pai. A vida ensinou-lhe que momentos de quietude 
com o pai acabam tornando-se dolorosos. — Tente tomar jeito, filho, 
e faça sua mãe parar de me encher — diz o pai. — Não agüento 
mais suas reclamações contra você. 
Ao ouvir essa tirada, você provavelmente teria ímpetos de agarrar 
esse pai pelo colarinho. Não adiantaria nada. Ele não só negaria 
qualquer significado oculto em suas palavras, como sentir-se-ia 
 
insultado à mínima sugestão de que, com elas, poderia ter magoado 
o filho. Afinal de contas, protestaria ele, nenhum pai que tenha a 
cabeça no lugar jamais diria ou faria qualquer coisa para magoar o 
filho. 
Se você ouviu a conversa com atenção, percebeu que prescrição 
nenhuma de qualquer anestésico emocional poderia evitar que este 
garoto se sentisse uma porcaria. Nada lhe adiantaria queixar-se. Tal 
como a mãe, o pai não percebe o que está fazendo. A única coisa 
boa a esperar, depois disso tudo, é que por essa noite a dose tenha 
terminado. 
Saindo da casa desta família, olhe para o quarto aceso do filho, e 
ouça as vozes que lhe azucrinam a cabeça. 
 
Eu magoo minha mãe porque sou como meu pai, que não tolera que 
eu magoe a mamãe. Papai não gosta da gente como gosta do 
trabalho porque não tem sentimentos. Mamãe não me entende, e eu 
a faço encher o papai. Eu devo protegê-la, mas isso quer dizer que 
preciso usar meus sentimentos para fazer o que papai não faz. Pra 
proteger meu pai, preciso tomar jeito e não ser como ele. 
As mensagens ocultas atingem sua plena capacidade maléfica, 
quando o menino tenta enxergar algum sentido no absurdo. 
Imagine a dor e a confusão que assaltam a mente deste menino. O 
nó em sua garganta condena-o; o grito contido aponta um dedo 
acusador para ele. Será tão ilógico que ele pense ser o causador do 
sofrimento das pessoas a quem mais ama? Quando consegue 
adormecer, o pouco de auto-estima que tenha conseguido reunir 
nesse dia com certeza foi destruído. 
Vê agora o que este menino faria se Peter Pan voasse até sua janela e 
o convidasse para juntar-se a ele na Terra do Nunca? Ele agarraria o 
pó mágico com tanta ansiedade que seus olhos mal registrariam o 
ato. Cobriria o corpo com fagulhas de alegria eterna, convencido de 
 
que na Terra do Nunca seria livre de tudo o que se relacionasse com 
o amadurecer. 
Cena horrível, não? É verdade que em geral as crianças não são 
expostas a todas estas mensagens em uma só noite; todavia, a 
vítima da SPP costuma ouvi-las todas no curso de uma ou duas 
semanas. Mas ser o receptor de mensagens ocultas é na verdade o 
menor de dois males. Muito pior é o fato de não ouvir qualquer 
refutação. Nem a mãe, nem o pai vão a ele mais tarde para dizer: 
"Desculpe por toda essa pressão, filho. Eu errei. O problema não é 
seu. Cuide de comportar-se e mamãe (ou papai) e eu resolveremos 
nosso problema". 
Excetuando-se a magia, nada pode aliviar o temor da condenação 
eterna. O filho tem consciência da existência de algo muito grave. 
Seu bom senso talvez sugira que os pais são os errados, porém sua 
lealdade e sua atitude naturalmente auto-concentrada combinam-se 
para apontá-lo como réu. Ele é forçado a concluir que é o errado. 
Neste estado de não estou OK, vários desenvolvimentos têm lugar na 
mente do menino. Com o aumento da culpa vem a diminuição da 
autoconfiança. Uma inquietante sensação de tristeza acompanha os 
silêncios, e ele passa a evitar estar só. Tira conclusões ilógicas sobre 
sua capacidade de ferir e de proteger os pais. Isto torna-se parte de 
um irracional senso de poder que leva o menino a acreditar que tem 
a faculdade de salvar os pais da dor emocional. E condena-se, 
quando fracassa. 
Estes estados mentais assumem proporções alarmantes. Ele faz 
generalizações muito prejudiciais sobre a natureza de sua alma. 
Enquanto reconhece que os pais o amam, julga-se incapaz de 
retribuir-lhes.Em algum lugar de seu interior ele vê um demônio 
que faz dele uma pessoa indigna de ser amada. 
Esta auto-imagem negativa transforma-se numa profecia auto-
realizadora. Convencido de que é indigno de ser amado, não vê 
motivos para ser polido e atencioso. A voz interior diz: "Não vai 
adiantar nada tentar me comportar, porque não sou legal". 
 
Levará anos para a vítima da SPP conseguir perceber o círculo 
vicioso criado por essa auto-imagem negativa. Neste estágio do mal, 
no início da adolescência, o garoto só tem consciência da 
necessidade de escapar à dor emocional. É no contexto da evitação 
que os conflitos com as figuras materna e paterna tomam forma. 
O relacionamento da vítima com os pais nunca amadurece além 
deste ponto. Sua fuga para a Terra do Nunca resulta na estagnação 
da maturidade emocional. Muitos passam o resto de suas vidas 
tentando se aproximar do pai sem pânico, e se distanciar da mãe 
sem culpa. Em todas as encruzilhadas são assaltados pela crença de 
terem o poder de salvar os pais da dor. Tal poder simplesmente não 
existe. 
A vítima da SPP acaba apresentando problemas com pessoas 
(masculinas) de autoridade. Alimenta expectativas impossíveis de 
serem atingidas em relação a professores, empregadores, 
orientadores e treinadores, entre outros. Ultrapassa todos os limites 
do razoável para agradar a essas pessoas. Em troca, espera delas a 
atribuição de um status especial, que interpreta como uma ligação 
simbólica com seu pai. No processo todo, tem a esperança de obter 
o perdão de seu fracasso em agradar o pai. Este conflito com a 
figura paterna contamina os relacionamentos da vítima com figuras 
masculinas representativas de autoridade e, na maioria dos casos, 
provoca o desenvolvimento de um maior distanciamento. 
Seu conflito em relação à figura materna acaba se revelando quando 
ele se aproxima de uma mulher. Sua forma de amar uma mulher é 
fazer dela uma substituta de sua mãe. Exigirá que a mulher se 
comporte segundo um certo padrão. Se ela se desviar da linha de 
suas exigências (a principal delas é a de que ela aprove sempre o 
que ele faz e diz), ele terá um ataque de mau humor ou, pior, uma 
crise em que haverá sempre algum excesso. Se for capaz de agradar 
totalmente a esta substituta 
 
 
de sua mãe, ele espera conseguir finalmente aprender a ser uma 
pessoa digna de amor. 
Graças à aparência de alegria e à própria natureza instável dos anos 
da adolescência, boa parte desta confusão interna não vem à tona 
por alguns anos. A deterioração e a estagnação se desenvolvem sem 
que o jovem se dê conta. Há, contudo, dois indicadores 
fundamentais desta avassaladora ansiedade e desta auto-imagem 
negativa. 
Freqüentemente vê-se um adolescente vítima da SPP "pegar no pé" 
de alguém muito chegado. Se houver uma irmã mais nova que ele 
na família, é ela a escolhida para objeto de sua "maldade 
emocional". Houve época em que ele a idolatrava. Dava-lhe de 
comer quando ela era bebê e desejava estar a seu lado todo o tempo. 
Agora ele a atormenta sem dó. Caçoa dela. A inveja e o ciúme 
provocam por parte dele maus comentários. Não se trata de uma 
rivalidade normal entre irmão e irmã. Não, as críticas são 
incessantes e freqüentemente fazem a irmã chorar. Ela então vai à 
mãe e diz: "Faça alguma coisa, me ajude. Não quero odiar meu 
irmão". 
Esta ansiedade nos anos de adolescência pode também manifestar-
se numa súbita queda nas notas escolares. Entre o fim do primeiro 
grau e o início do segundo, o desempenho escolar do menino cai. Os 
professores dizem que ele é inteligente, mas não executa as tarefas. 
Classificam-no de preguiçoso. Seu rendimento é abaixo da média 
esperada. Onde está sua concentração? Às vezes faz o papel de 
palhaço da classe. Estudo, medidas disciplinares, ameaças, nada 
parece fazer diferença. Ele verdadeiramente não liga para nada. 
IRRESPONSABILIDADE + ANSIEDADE 
A atitude de "não estou nem aí" é um subproduto da auto-imagem 
negativa. Quando combinada com a enorme irresponsabilidade 
 
examinada no último capítulo, emerge um dos traços básicos do 
perfil psicológico da vítima da SPP: a procrastinação. 
A procrastinação da vítima da SPP é muito mais danosa do que 
aquela a que você e eu ocasionalmente nos entregamos. Adiamos as 
coisas por um ou dois dias porque estamos cansados, esgotou-se 
nossa energia mental, ou simplesmente porque não temos tempo. 
Mas a coisa acabará sendo feita. 
No que toca à vítima da SPP, a coisa provavelmente não será feita. 
Ele adia as coisas porque tem pouca ou nenhuma razão para 
investir no amanhã. Imagina que qualquer energia gasta só 
resultará em mais fracassos. Este fatalismo transforma uma 
procrastinação comum num desastre. As coisas são sempre deixadas 
para amanhã. Obviamente nunca são realizadas. 
O efeito cumulativo de irresponsabilidade mais ansiedade é uma 
procrastinação fatalística. Isto atrapalha muito a capacidade do 
adolescente de superar sua estagnação emocional. O hábito de adiar 
não somente está muito assentado, como também ele não tem mais 
esperança em mudar. Está perdido. Sua rebeldia alia-se à depressão 
para erguer um intransponível obstáculo ao crescimento. Suas 
energias dissipam-se num exasperado desejo de "fazer parte". No 
próximo capítulo veremos como a pressão grupai se torna o 
elemento de união da legião dos meninos perdidos, capitaneada por 
Peter Pan. 
OS DARLING DA ERA MODERNA 
No início e no final da historia de Peter Pan, o autor nos apresenta a 
dinâmica familiar de um lar, o dos Darling, George e Mary. Eles 
tinham três filhos: Wendy, Miguel e João. No desenrolar da história 
Peter recruta Wendy para ser sua mãe-subs-tituta, e Miguel e João 
para serem membros de sua legião de meninos perdidos. 
Existe ampla evidência de que a Síndrome de Peter Pan já estava 
florescendo na residência dos Darling. O Sr. Darling era chauvinista 
 
e cheio de autocomiseração: um menino em corpo de homem. A 
Sra. Darling era uma sofredora: fazia o papel de mãe para com o 
marido e sacrificava-se pelos filhos. Não nos é dado acesso aos 
problemas pessoais do casal Darling, mas podemos ouvir muitas 
mensagens ocultas trocadas em casa. George e Mary tinham 
dificuldades conjugais, e os filhos sofriam com a tensão resultante. 
Leia as primeiras páginas da história, e compreenderá por que Peter 
foi atraído à janela do quarto das crianças Darling. 
Há inúmeras famílias Darling atualmente, que, sem querer, se 
constituem em fortes convites a Peter e sua legião. Eis as histórias 
de duas delas. 
Os Pilsen 
Desde pequena, Mary tinha vergonha e raiva da pobreza. A estrada 
de ferro que dividia ao meio a minúscula cidadela onde nascera 
formava em sua mente uma divisa ambígua. O trilho do lado sul era 
o limite externo de um acampamento primitivo, onde brincavam as 
crianças que tinham o privilégio da aceitação e da aprovação. O 
trilho do lado norte parecia feito de arame farpado, a julgar pela 
forma como ela se sentia arranhada e ferida cada vez que tentava 
ultrapassá-lo. Embora o lado norte nunca a tivesse deixado passar 
fome, ela jamais perdoou o pai por gostar de trabalhar para aquela 
estrada de ferro que a mantinha cativa. 
À medida que crescia transformando-se numa linda moça, Mary 
passou a perseguir sem descanso dois objetivos: comprar roupas 
que mostrassem a todos que ela era realmente uma moça de classe, 
e continuar a ser sempre a primeira da classe, a fim de garantir uma 
bolsa de estudos em alguma universidade que lhe abrisse o 
caminho para um bom casamento, afastando definitivamente as 
sombras do passado. 
Entrementes, Barry Pilsen consumia-se na seguinte idéia: 
compensar a mãe pela vida dura que tivera. O pai de Barry morrera 
quando ele tinha quatro anos de idade. Deixara dinheiro bastante 
 
para os estudos do filho, não porém o suficiente para as despesas 
diárias. Praticamente todos os diasa mãe relembrava ao menino os 
sacrifícios que ela fazia por ele. Em mais de uma ocasião ela lhe 
dissera que toda a sua dor seria esquecida se ele desposasse a 
mulher certa e a protegesse. A implicação deste contrato emocional 
causou a maior parte dos problemas de Barry. 
Mary e Barry sentiram-se instantaneamente atraídos um pelo outro, 
durante o primeiro baile daquele ano na universidade. Mary 
imediatamente depositou suas esperanças e sonhos na seriedade de 
Barry. Barry viu em Mary a mulher capaz de tornar-se o veículo 
para a realização do contrato com a mãe. 
O assunto casamento surgiu antes do final de seu primeiro ano da 
faculdade. Mary e Barry sonhavam tanto que jamais se eram ao 
trabalho de realmente se conhecerem com profundidade. Na 
verdade, Barry nunca chegou a fazer um pedido formal 
de casamento. É óbvio que ela o aceitou. Casaram-se no dia seguinte 
ao de sua formatura. 
A prontidão de Barry em sacrificar-se passivamente pelos outros fez 
dele um perfeito homem de corporação. Sua meteórica ascensão nos 
negócios era acompanhada passo a passo pela ascensão social de 
Mary. Além de ser membro de vários clubes sociais, ela se 
orgulhava do convite feito ao marido para associar-se a um 
prestigioso clube de campo. À promoção de Barry para gerente de 
vendas equiparou-se a escolha de sua esposa para residente do 
corpo de voluntárias do hospital local e para conselheira de um 
grupo de bandeirantes. Em algumas festas Barry era ironicamente 
chamado de Sr. Mary Pilsen. 
A sombra do passado de Mary estava quase desvanecida. Ela 
mentia com tal freqüência sobre sua infância que quase acreditava 
ter sido uma órfã criada por um casal de tios idosos em Dakota do 
Norte. Ela escolhera aquele Estado porque, aparentemente, em seu 
 
círculo social Dakota do Norte mal existia. A probabilidade de 
alguém descobrir o engodo era praticamente nula. 
A mãe de Barry estava encantada com Mary. Nunca deixou de 
expressar sua satisfação pela escolha do filho. Nem de pedir-lhe 
para fazer inúmeras coisinhas para ela. Por morarem em cidades 
que distavam 200 km, Barry passava horas ao telefone falando com 
advogados, banqueiros, contadores e até encanadores, tudo com a 
finalidade de manter a mãe feliz. Desagradava-lhe essa 
superdependência da mãe, mas a mínima queixa dela paralisava-o 
de remorso. 
Barry e Mary cumpriram o roteiro da história familiar tendo três 
filhos, dois meninos e uma menina. Com os filhos sobreveio uma 
gradual quebra na frágil estrutura montada pelos Pilsen. As 
necessidades emocionais das crianças forçaram Mary a auto-
examinar-se. Externamente ela detinha credenciais maravilhosas, 
mas por dentro sentia-se vazia. Por motivo de trabalho, Barry 
viajava durante a maior parte da semana. A solidão levou então 
Mary a buscar uma vida melhor. Resolveu mudar as regras do 
casamento. 
Barry não entendeu a maior parte das coisas que a esposa começou 
a lhe dizer sobre compartilhar, crescimento emocional e aumento de 
comunicação. Para ele a inquietação da esposa denotava apenas 
uma crise precoce relativa à meia-idade. Aconselhou-a a procurar 
um emprego e jogar mais tênis. A idéia de duas mulheres fazendo 
exigências absurdas apavorava-o. Bastava sua própria ansiedade, 
que ele tentava aplacar aumentando a freqüência nos jogos de 
squash e o consumo de álcool. Desejava ter um caso mas estava 
amedrontado demais para procurá-lo. 
Colin Pilsen iniciou a adolescência num lar cheio de ressentimentos 
silenciosos. Não possuía maturidade suficiente para desmascarar a 
discórdia conjugal dos pais. Aliás, ele era muito pouco atento à 
maioria das coisas à sua volta, incluindo suas responsabilidades. 
Mary irritava-se por ver o filho outrora tão sensível e atencioso, 
 
agora insolente, preguiçoso e mal-educado. Em vez de estabelecer 
medidas disciplinares racionais, Mary gritava e reclamava da 
irresponsabilidade desse filho de quatorze anos. Essa sua atitude 
apenas servia para tornar o menino ainda mais insensível à sua 
orientação. 
Uma psicoterapia teria possibilitado a Mary Pilsen perceber que 
muito de sua frustração com relação a Colin na verdade era um 
deslocamento da raiva que sentia por seu marido. Ela teria também 
descoberto que, no íntimo, condenava-se por negar seu passado, o 
qual fora infinitamente melhor que a vida que ela e seu marido 
ofereciam aos filhos. Marcou hora com um terapeuta, mas desistiu 
no último momento. A possível mancha na imagem social que 
cultivava era um risco grande demais. 
Até onde sei, esta história tem um final infeliz. Mary e Barry ainda 
estão casados, e gastam a maior parte de suas energias evitando-se 
mutuamente. Mary preside vários comitês sociofilantrópicos — 
alguns deles com a finalidade específica de auxiliar crianças com 
problemas de conduta. Barry está próximo da presidência da 
corporação onde trabalha, e agora tem uma jovem namorada a 
quem ama profundamente. Graças à importância de uma imagem 
social positiva e ao espectro do desastre financeiro, o divórcio está 
fora da questão. 
Colin conta vinte e quatro anos e ainda está na faculdade. E um 
alcoólatra incipiente, nunca trabalhou mais que um ou dois meses, e 
começa a sofrer períodos de depressão, quando acalenta a idéia de 
suicídio. 
O irmão e a irmã de Colin parecem haver escapado à sina familiar. 
Como freqüentemente ocorre, também neste caso as mensagens 
ocultas atingiram mais intensamente o filho mais 
velho. É ele quem sai em busca de uma resposta à confusão e a 
encontra na Terra do Nunca. 
Os Tolson 
 
O pai de Jim Tolson nunca fora verdadeiramente pai. Foi um 
enigma até o dia de sua morte, jim o temia, mas não o respeitava, 
combinação que freqüentemente origina rebeldia. Assim foi neste 
caso. Jim era um "criador de casos". "Um machão", diria ele mais 
tarde. Na realidade, sua rebeldia quase o levou à prisão em diversas 
ocasiões. 
Jim foi criado numa fazenda, e começou a trabalhar tão logo 
começou a andar. Trabalhar duramente foi para ele uma bênção e 
sua perdição. Foi o que o impediu de tornar-se um delinqüente 
juvenil, conforme pensava, porém acabou por escravizá-lo. O jovem 
Jim não podia permitir-se relaxar antes de, suado, haver exaurido 
suas energias em tarefas laboriosas. Esperava com isso receber a 
aprovação do pai; tudo o que conseguiu foi transformar-se num 
escravo do trabalho. Jim iniciou a vida adulta com uma inabalável 
resolução de subir na vida e um intenso desejo de aprender como 
ser um pai capaz de dar amor ao filho. 
Edna, esposa de Jim, era adorada por seu pai e tinha uma mãe que 
sofria de distúrbios mentais. Ela acreditava que o pai permanecera 
casado com sua mãe apenas por compaixão. Este sentimento, aliado 
ao sentimento de culpa por beber excessivamente, o mantivera 
ligado a uma mulher que já sofrera quatro crises nervosas, das quais 
ela culpava o marido. 
A atmosfera na casa de Edna era explosiva. Sua mãe acusava o 
marido de tudo: desde ter queimado as torradas até ter dormido 
com a mulher do vizinho. O pai geralmente falava pouco até 
embebedar-se. Então tornava-se abusivo tanto em suas palavras 
quanto em suas ações. Edna o perdoava, a mãe não. 
Edna passou a ter fobia das brigas dos pais. Faria qualquer coisa 
para evitá-las. Trocou as próprias aspirações pelo papel de 
mediadora. Deixava de sair para que os pais não tivessem chance de 
discordar sobre sua roupa. Abandonou os planos de fazer faculdade 
para não provocar reclamações de caráter financeiro. Sem perceber 
isso, começava a culpar todas as mulheres pelo fato de ela não 
 
conseguir tornar-se uma pessoa. Guardava profundo ressentimento 
da mãe, venerava o pai, e detestava ter nascido menina. 
Depois de completar um curso de secretariado, saiu de casa. Foi 
trabalhar numa bem-sucedida companhia construtora com um 
brilhante mestre-de-obras de nome Jim Tolson. A timidez de Edna 
camuflava a falta de pendoressociais. Jim sentiu-se atraído por sua 
modéstia. Em breve faziam planos para o casamento. 
Seu primeiro filho foi concebido durante a lua-de-mel, sexualmente 
calamitosa. Nenhum dos dois confiou ao outro sua decepção, que 
aliás não os incomodava muito, pois Jim estava mais interessado 
numa boa mãe para seus filhos do que numa esposa, e Edna 
procurava um pai-substituto que a protegesse da dor emocional de 
viver. Muito típico da família da vítima da SPP, Jim e Edna 
combinavam perfeitamente — por razões erradas. 
Aos trinta e três anos, Jim tinha parte na sociedade da firma 
construtora e era pai de dois meninos que adorava. Das oitenta 
horas semanais de trabalho e de todos os minutos livres devotados 
aos filhos, pouco tempo sobrava para Edna. Teria ficado atônito se 
soubesse o que ia pelo coração da esposa. 
Edna tinha ódio de ser deixada de lado. Reprimia sua desilusão 
desfiando para si mesma o rosário de bênçãos que significava um 
lar livre de conflitos emocionais. Conseguira o ambiente asséptico 
que sempre almejara. Mas por que pagar um preço tão alto por seu 
Jardim do Éden? 
Ela entrou em crise quando, pelo desejo de Jim de abrir sua própria 
firma, foi forçada a voltar a trabalhar fora. Detestava-se por detestar 
o marido. Com a emergência de suas emoções, as imagens de sua 
infância passaram a persegui-la. O filho mais velho, um adolescente 
mimado e preguiçoso, foi o alvo de sua intranqüilidade. 
"Deixe seu pai em paz", era a mensagem oculta através da qual 
Edna expressava seu ressentimento. Variações persistentes deste 
tema levaram finalmente Jim a dizer ao filho: "Vá com calma com 
sua mãe, ela não entende os homens". Jim Jr. era o "joão-bobo" entre 
 
um pai insensível a quaisquer desejos que não os próprios e uma 
mãe cansada de viver e intimidada pelo mais leve sinal de mal-estar 
emocional. 
Por fim os empregos de ambos levaram ao ponto critico seu 
casamento. 
O novo chefe de Edna era gentil e lhe dava muitas atenções — um 
excelente tônico para seu ego enfraquecido. Almoçavam juntos, 
davam longos passeios a pé, e compartilhavam sua insatisfação 
quanto a seus casamentos. A amizade transformou-se em paixão. 
Edna agora podia aceitar-se, o que lhe proporcionava grande 
prazer. Mas também a machucava. Sentia-se dividida entre a 
excitação de estar apaixonada por um homem e o conforto de ainda 
amar seu marido. 
Numa noite em que estava para sair ao encontro do amante, Edna 
recebeu um telefonema da firma construtora do marido. Jim sofrera 
uma queda e estava em estado grave. Voou para o hospital sem se 
lembrar de cancelar o encontro. Embora bombardeada por diversas 
emoções, ela deu-se conta de uma verdade simples: 
independentemente do que acontecesse, sua vida jamais seria a 
mesma. 
Deixou o emprego para dedicar-se à convalescença de Jim. Era 
tolerante, paciente e amorosa, mesmo reconhecendo que Jim era 
extremamente exigente e insensível. No passado ela se teria 
culpado. Mas não desta vez. A experiência de amar um homem 
como a si mesma deu-lhe a coragem de enfrentar seu casamento 
improdutivo. 
O clímax deu-se numa noite em que Jim mancava levemente pela 
casa, sentindo-se bastante bem para retornar ao trabalho, mas ainda 
sem alta médica. Ele estava sendo particularmente detestável. Edna 
fez algo até então inimaginável. Começou a brigar com o marido. 
Ela se livrou de anos de frustrações reprimidas. Boa parte de sua 
catarse assumiu o caráter de acusações exageradas. Estava furiosa e 
não se importava de estar ferindo os sentimentos de Jim. O que, 
 
aliás, foi ótimo. Se ela houvesse sido menos intensa, Jim teria 
permanecido indiferente. Em vez disso, ficou chocado. Só conseguiu 
dizer: "Nossa, nunca pensei que você se sentisse assim". Edna 
também estava chocada. Em vez de ter medo, estava 
experimentando alívio. Pusera tudo "em pratos limpos" e nada de 
terrível ocorrera. Curara sua fobia. 
Jim e Edna Tolson começaram a fazer terapia de casal na semana 
seguinte. Tinham que modificar muitos maus hábitos. Mas 
atacaram seus problemas de frente. Passaram a conversar 
constantemente, descobrindo um no outro coisas realmente esti-
mulantes. Esse despertar chegou ao quarto de dormir, onde 
descobriram que eram excelentes amantes. Em alguns meses 
perceberam não somente que se amavam, mas também que estavam 
apaixonados. 
Prosseguindo com o trabalho de reformulação de seu casamento, 
Jim e Edna reformularam também seu procedimento no tocante à 
educação dos filhos. Jim Jr., bem como o irmão mais novo, 
reuniram-se a eles para uma terapia familiar. Juntos lutaram para 
modificar a forma pela qual cada um contribuía para a unidade 
familiar. Jim tornou-se um homem capaz de enxergar além das 
próprias necessidades. Edna tornou-se uma mulher disposta a 
batalhar por amor. E, acima de tudo, Jim Jr. desertou da legião dos 
meninos perdidos e deixou para trás a Síndrome de Peter Pan. 
Jim e Edna Toisón propiciaram aos filhos a coragem e as 
experiências necessárias para crescerem. Para fazê-lo, contudo, mãe 
e pai tinham que amadurecer. E o conseguiram. Tarde, mas não 
tarde demais. 
"DEVO SER EU" 
Os Pilsen e os Tolson fomentaram nos filhos a intranqüilidade. Não 
o fizeram de propósito. Aliás, eles jamais perceberam estar fazendo 
 
isso. Como em toda comunicação oculta, suas mensagens exigiam 
um poder de adivinhação e de interpretação do pensamento. 
Pais de diferentes meios ambientes utilizam diversos conjuntos de 
vocábulos, em épocas várias e em situações diversas, para enviar 
mensagens ocultas a seus filhos. Dentro dessa heterogeneidade, 
uma coisa se mantém constante para as vítimas da SPP. Todas 
concluem a mesma coisa: "Há algo de errado aqui e devo ser eu". 
Culpar-se torna-se a reação imediata nas vítimas jovens: a 
camuflagem representada pela negação vem em seguida. Ao ten-
tarem decifrar as mensagens ocultas dos pais, ficam presos num 
circulo vicioso. Concluem erroneamente que sua existência é a causa 
do sofrimento dos outros. Evadem-se ao desespero conseqüente 
negando qualquer responsabilidade por seus atos, e substituindo-a 
pela crença de que nunca fazem nada de errado. 
Vão de um extremo a outro. Aqueles com quem mantêm ligações 
enxergam apenas a negação, interpretando-a como insensibilidade. 
É surpreendente que justamente as crianças de início mais 
suscetíveis aos sentimentos dos outros acabem comportando-se de 
modo tão impassível. 
Como o passar do tempo lhe proporciona um relacionamento mais 
amplo com os adultos, a vítima é atacada pelo condicionamento 
infantil que a estimula a culpar-se toda vez que com maior 
probabilidade concentrará as expectativas mais seguidas. Diante do 
remorso e da vergonha irracionais, a vítima se absolve fingindo 
nunca cometer erros. "Desculpe" é palavra que não faz parte de seu 
vocabulário, pois não consegue pronunciá-la sem sentir-se indigna. 
As duas histórias também nos revelam que os pais da vítima da SPP 
têm, eles próprios, problemas. Vestígios de insegurança da infância 
infiltram-se em suas vidas cotidianas, forçando-os a viver com um 
pé no presente e outro no passado. Casam-se sem se conhecer 
profundamente, e são incapazes de se comunicar efetivamente. Na 
maioria dos casos, a vida familiar desempenha papel secundário em 
 
relação à excessiva preocupação com o dinheiro e posição social. 
Evitam uma confrontação racional pelo temor de magoar a outra 
parte. Em vez de serem sinceros, refugiam-se no "faz de conta" da 
felicidade matrimonial. A presença de mensagens ocultas é sintoma 
do fato de que em geral estes pais também não amadureceram. 
O PRIMOGÊNITO 
No perfil psicológico da vítima da SPP (ver Capítulo 1), afirmei que 
ela provavelmente é a criança mais velha da família. Embora 
obviamente haja exceções, é importante notar que, nos casos que 
registrei, 82% das vítimas eram as crianças mais velhas. 
Faz sentido. O mais velhoé tipicamente o "filho-cobaia" e, em geral, 
o centro das preocupações e discordâncias. É este que com maior 
probabilidade concentrará as expectativas mais altas e inacessíveis. 
Seu mau comportamento provoca uma desaprovação exagerada 
tanto por parte dele como dos pais; por isso ele se torna o alvo 
principal das mensagens ocultas. 
Os manuais de psicologia tratando da ansiedade dizem que uma 
pessoa fica ansiosa quando encara uma situação em que deve fazer 
algo, mas as alternativas parecem inúteis. As vítimas da Síndrome 
de Peter Pan são atormentadas por este tipo de ansiedade; 
Decodificam as mensagens ocultas que fluem dos conflitos 
conjugais dos pais, e o fazem de tal modo que concluem haver algo 
de errado e "devo ser eu". A fim de resolver o problema precisam 
encontrar uma forma de salvar os pais de si mesmos. 
Se desejam continuar vivos (o que ocorre na maioria dos casos), não 
há uma saída lógica. Os efeitos colaterais da ansiedade prolongada 
são enormes. A aguda sensação de rejeição torna-se companheira 
constante, além da raiva e do sentimento de culpa com relação à 
mãe e do distanciamento do pai. Um poder irracional e o 
pensamento mágico tomam forma. Os pensamentos dominam as 
emoções à medida que a criança dá-se conta de poder usar a cabeça 
 
para anestesiar a dor do coração. Sobrevêm a paralisia emocional 
como refúgio contra a angústia. Seu autoconceito e sua auto-estima 
ficam bastante abalados, mas a sobrevivência está garantida. 
Eis como a mãe de um rapaz de vinte e dois anos, vítima da SPP, 
resumiu sua explicação dos motivos pelos quais o filho desenvolveu 
esse mal. Seus olhos farão a leitura, mas atente para a mensagem 
oculta que ela transmite. 
Sua reação à autoridade dos pais era mitigada por uma extrema 
bondade disfarçada como necessidade. A situação era exacerbada 
por uma aparente pressão parental (o que era um mito, não reali-
dade). Isto tudo se deu no contexto de um menino que idolatrava os 
pais, ao mesmo tempo que tinha consciência de estar de alguma 
forma empenhado em dificultar-lhes muito a vida. 
Deve ter havido alguma distorção de sua psique na primeira série 
escolar, quando ele teve uma professora muito severa e repressora. 
Ele era tão turbulento que as férias dos pais, infreqüentes mas 
merecidas, tinham que ser interrompidas. 
Durante os anos da adolescência ele apresentava maneiras simul-
taneamente esnobes e autocentradas. A mãe não tinha nem cabeça 
nem saúde para tolerar suas insinuações. Ela é uma pessoa fácil de 
se amar, mãe de jovens realmente adoráveis, e merecia ter sido pou-
pada de tal desgraça. Seus comentários sobre garotas devem ser 
compreendidos como observações indiscretas e desleais no campo 
do relacionamento social, não como referências a quaisquer contatos 
físicos. 
Esta descrição fria e cheia de menosprezo foi feita por uma mulher 
com bom nível cultural, cujo filho apresentava graves problemas 
emocionais. Sua falta de empatia era estonteante. A referência à 
professora da primeira série corresponde perfeitamente a seu estilo 
de tratamento. Não é de espantar que este jovem fosse tão 
atormentado pela ansiedade e pelo sentimento de rejeição. Você 
pode avaliar a solidão que ele devia sentir. Alistou-se na legião de 
 
Peter Pan sem pensar duas vezes. Enquanto escrevo isto, o rapaz 
está retornando da Terra do Nunca, mas certamente sem contar com 
a ajuda da mãe. 
 
 
 
 
6 
Solidão 
 
WENDY: — Onde você mora agora? 
PETER: — Com os meninos perdidos. 
WENDY: — Quem são eles? 
PETER: — São crianças que caem dos carrinhos de bebê, quando a 
babá não está olhando. Se ninguém reclama por eles em sete dias, 
são enviados para a Terra do Nunca. Eu sou o capitão. 
WENDY: — Deve ser muito divertido. 
PETER: — É, mas a gente é um pouco só. 
TOOTLES (um dos meninos perdidos): — Já que não posso ser nada de 
importante, algum de vocês gostaria de me ver fazer uma mágica? 
 
Falar sobre rejeição? A própria palavra dá um nó na garganta. Dá 
para imaginar algo pior? Você é um bebezinho e cai do carrinho. 
Aliando humilhação à dor, passam-se sete dias e sua babá não sente 
sua falta. Uma vez que seu espírito foi destroçado os ventos da 
solidão levam os pedaços para longe e os espalham na Terra do 
Nunca. Não fossem os atrativos da juventude, você enlouqueceria. 
Peter Pan resistiu à provação. Quando despertou na Terra do 
Nunca, assaltado pela solidão, não entrou em pânico. Olhou à sua 
 
volta, viu outros padecendo de uma sina idêntica, e transformou a 
possível tragédia em vitória. Unificou todos os meninos perdidos 
numa legião cujo vínculo era representado pela situação comum: 
todos tinham sido rejeitados da pior forma possível. Selou a união 
declarando-se capitão. E realmente o era. 
Somente um verdadeiro líder seria capaz da façanha de converter 
sentimentos de rejeição numa raison d'être. 
Apesar da camaradagem e da identidade grupai, Peter Pan e sua 
legião de meninos perdidos eram atormentados pela solidão. Para 
suportá-la, tinham de encontrar formas de transformar o pesadelo 
num jogo. Dado o jogo ser a palavra de ordem das crianças, não nos 
surpreende que eles conseguissem mascarar sua solidão com 
jovialidade e alegria. Tootles reflete essa "trucagem" com sua atitude 
compensatória. Quase todos vocês reconhecerão essa atitude, se 
recordarem seus tempos de estudantes. É ela a força motriz que está 
por trás do "engraçadinho" da classe. 
Através dos comentários feitos na narração, Barrie informa sua 
audiência do alto preço pago por Peter Pan pela manipulação da 
solidão. Vemos que Pan é muito superficial. Várias vezes troca de 
aliados, e alimenta visões mágicas de si mesmo. É chocante ver 
como este jovem advogado da felicidade reage às atenções e 
gentilezas dos outros, usando a compaixão para manipular e a 
indiferença para intimidar. Por mais que se debatesse para escapar, 
Peter era cativo da solidão . 
Todos nós experimentamos solidão. Ela se manifesta de modos 
diversos em cada um de nós. Ela pode ser sentida como um dia 
cinzento e enevoado que não acaba nunca. Algumas pessoas 
experimentam um imenso vazio na região do estômago. Outros 
saem dos respectivos corpos e se vêem como minúsculos grãos de 
pó soprados pela tempestade da insignificância. Outros, ainda, 
almejam tanto o contato humano que se sujeitam a qualquer coisa 
para poder estar perto de alguém. 
 
Este último é o tipo de solidão que afeta os adolescentes. A maioria 
deles não possui inspiração para ser poetas de sua solidão. Só se 
dão conta de sua necessidade de contato humano. Quando não o 
têm, perseguem-no a qualquer custo. 
A solidão torna-se um dos alicerces da Síndrome de Peter Pan, 
quando uma criança sente-se indesejada em sua própria casa. 
Conforme foi visto nos dois capítulos anteriores, você pode 
perceber como uma criança irresponsável e ansiosa pode sentir-se 
solitária em sua própria casa. Vítima do distanciamento do pai, do 
sentimento de culpa e da raiva em relação à mãe, e da auto-imagem 
negativa, o jovem não tarda em ser assaltado pela dilacerante 
sensação de não pertencer à sua família. 
A solidão para estas crianças é agravada pela tentativa de seus pais 
de compensar a falta de amor dando-lhes dinheiro e presentes. 
Quando isto ocorre, a riqueza age como catalizador, acelerando o 
movimento da criança em direção à crise da SPP. O mito "o dinheiro 
compra o amor" dá à criança uma falsa sensação de segurança, e 
acaba por confundi-la ainda mais. A criança é levada a pensar: "Se 
eu tiver dinheiro e as coisas de que gosto, não vou precisar das 
pessoas". Este engano apresenta-se como solução do problema da 
solidão, mas na realidade somente o agrava. 
Aos jovens, vítimas da SPP, é dificílimo romper o binômio solidão-
riqueza. Acreditam que os pertences são um bem material, algo 
passível de ser comprado ou trocado. Assim, tentam obter 
admiraçãodos outros exibindo habilidades "extraordinárias" (como 
Tootles), ou tentam chamar a atenção comprando as roupas certas; 
muitos saltam o passo intermediário e simplesmente tentam 
comprar amigos. 
Os pertences de um grupo resultam da dedicação; as crianças qua 
abraçam o estilo de vida da SPP não compreendem isso. 
Preocupam-se tanto em comprar amor que jamais chegam a co-
nhecer as alegrias proporcionadas pela dedicação. E como seus pais 
se acham presos no círculo vicioso "o dinheiro compra a felicidade", 
 
não existe quem lhes ensine a encontrar os pertences na dedicação 
aos outros. 
Lentamente essa busca de alívio da solidão vai se tornando mais 
desesperadora. Quanto pior se sente a vítima da SPP, tanto mais se 
rodeia de um número crescente de outros jovens. A medida que o 
grupo cresce em tamanho, crescem o frenesi das aventuras, a busca 
de excentricidades e a pressão para conformar-se. O resultado é a 
histeria da pressão grupai que sufoca a dedicação e exacerba a 
solidão. 
A pressão grupai encontra força na ameaça da rejeição: "Faça o que 
todo mundo está fazendo, ou será rejeitado e ninguém se importará 
com você". Para a criança que se sente rejeitada em casa isto se torna 
um constante lembrete de que sua única chance de ter contato 
humano é pertencer ao grupo. Ela arriscará toda e qualquer coisa 
para não perder essa chance. 
Quando a pressão grupai assume estas proporções, a vítima da SPP 
entra em sérias dificuldades. Seus amigos tornam-se infinitamente 
mais importantes do que sua família. O código do grupo facilmente 
suplanta os valores de seus pais. A autoridade destes se desvanece 
diante da conformidade com o grupo. Seus padrões 
comportamentais tornam-se um exemplo clássico do cego 
conduzindo o cego. 
IDADE PICO: 15 A 16 ANOS 
A solidão atinge a todos nós; no início da adolescência, contudo, ela 
é avassaladora. Localizei nos 15-16 anos o pico da solidão porque é 
durante esse período que se começa a incorporar padrões sociais de 
conduta. Se o garoto de quinze anos aprende a manejar a solidão 
acompanhando cegamente o grupo mais próximo, sua força para 
resistir aos três próximos estágios da SPP fica seriamente reduzida. 
 
IRRESPONSABILIDADE + ANSIEDADE + SOLIDÃO 
 
Você pode ver todos os dias, à saída das aulas, um grupo de cinco 
ou seis garotos que passa diante de sua casa, perambulando sem 
direção. Pode ouvi-lo na sala de cinema, na abertura da sessão. Pode 
escutar, tarde da noite, a algazarra desse grupo em que todos falam 
ao mesmo tempo, e ninguém ouve. São vozes possantes, atrevidas e 
cheias de menosprezo. Você se irrita com esses adolescentes tão 
malcriados. Mas não é a rudeza deles que faz você estremecer. 
É algo mais primitivo, mais assustador. Eles parecem animados e 
satisfeitos. No entanto exibem uma alegria artificial, risadas 
histéricas. Revelam uma felicidade lúgubre, agourenta. 
Talvez lhe seja difícil reconhecê-lo, mas o que você sente é pânico. 
Um pânico abrangente. Nem mesmo os garotos percebem que estão 
assustados. O pânico cria a necessidade de estarem sempre um 
passo à frente dos competidores. Na corrida pelo reconhecimento, 
farão praticamente tudo para obter as graças do grupo. O objetivo é 
pertencer a ele — ou melhor, fugir da solidão. 
Conseguir a aprovação dos companheiros é parte da vida de cada 
um, mas especialmente da vida do adolescente. Todavia, quando 
uma criança se dispõe a renunciar à sua moral a fim de obter a 
aprovação, já perdeu o equilíbrio que conseguira desenvolver em 
sua pessoa. Suas ações são ditadas por impulsos comandados pelo 
pânico. 
A vítima da SPP experimenta esta espécie de pânico. Os anos de 
irresponsabilidade roubaram-lhe a estima de si própria. A 
incessante ansiedade que paira em sua casa origina sentimentos de 
rejeição que lhe negam a esperança de um futuro melhor. A 
necessidade insatisfeita de filiação força o jovem a procurar os 
pertences fora do âmbito familiar; passa a vagar pelas ruas, onde 
acaba encontrando outros garotos iguais a ele. São os errantes 
solitários. 
A SPP NA VIDA SUBURBANA 
 
A ironia do desesperado esforço feito pelo jovem, vítima da SPP, 
para conseguir o reconhecimento grupai é que, por mais que se 
esforce, ele nunca obtém por completo esse reconhecimento. Pode 
participar de várias atividades grupais, mas raramente é 
considerado membro de algum grupo. 
Os desordeiros o abandonam porque é atencioso demais para 
combinar com suas tendências destrutivas. Os "machões" rejeitam-
no por sua relativa meiguice: chamam-no "bicha" ou fazem 
referências a uma possível homossexualidade. Há quem não o 
aceite por suas maneiras serem pouco sofisticadas. Não existe lugar 
para ele entre os vencedores, pois nada tem em comum com eles. Os 
maconheiros o convidam para as suas reuniões, mas não confiam 
nele. 
O pânico do jovem priva-o de qualquer amizade verdadeira. 
Preocupa-se tanto com rejeição que está sempre dizendo ou fazendo 
alguma coisa errada na hora errada. Sua risada é prolongada e tola. 
Sua vulgaridade é forçada. Ele chega a extremos em palavras e 
ações, tudo em busca de aprovação. E isso é uma faca de dois 
gumes. O pânico, combinado com maneiras sociais inadequadas, 
resulta em rejeição e em aumento de solidão. 
Este garoto finge ter amigos. Entretanto estes "amigos" raramente o 
procuram (é ele quem tem que telefonar) e propositadamente 
deixam de lhe falar sobre alguma atividade especial, pois não 
desejam sua presença. O pior é que ele não entende o que acontece. 
Os únicos contatos permanentes são com dois ou três garotos como 
ele — párias formando um grupo cuja entidade baseia-se no fato de 
ninguém querer nada com eles. 
É espantoso que esta triste cadeia de fatos tenha lugar nos subúrbios 
de classe média e alta, centros de socialização e de solidariedade 
comunitária. Contudo, o que tenho observado é que em muitas 
áreas suburbanas as pessoas vêm se dedicando de tal forma à 
conquista de uma "vida melhor" que se esquecem daquilo que faz a 
vida boa. Possuem dinheiro nos bolsos, e solidão nos corações. Este 
 
estado de coisas é que, por fim, transmite a mensagem: compre isto 
e será parte do grupo! 
Os pais aceitam a mensagem; os filhos imitam-nos. Os pertences 
tornam-se o primeiro item na lista de compras da família. Na 
miséria emocional em que se encontram, os membros da família 
transformam-se nos marionetes do "faz-de-conta" que o dinheiro 
pode ser convertido em sentimento de pertences. O objeto dessa 
ilusão pode ser uma casa, um carro, férias bem desfrutadas, um 
casaco de pele, um vídeo-cassete ou qualquer outro brinquedo de 
adulto. Para os filhos o objeto será um estéreo novo, um espetáculo 
de rock, uma calça jeans de etiqueta famosa ou uma festa. 
O objeto se deteriora rapidamente. Um só instante de solidão e o 
comprador percebe que não comprou a coisa certa. Pois não 
percebeu que é impossível comprar pertences. Aliás, basta que se 
coloque uma etiqueta de preço nos pertences para se ter a certeza de 
não consegui-los. A tentativa de se comprar pertences só aumenta a 
solidão. 
O psicólogo Abraham Maslow já advertira desta inevitabilidade há 
muitos anos. Ele ensinava que uma forma simples de se conhecer o 
comportamento humano é focalizar nossas necessidades e a 
maneira como atuamos para satisfazê-las. Ele sugeria a seguinte 
hierarquia de necessidades: abrigo, segurança, pertences, auto-
estima e auto-realização. Segundo a teoria de Maslow, uma vez 
sentindo-nos seguros de que uma necessidade será satisfeita, 
voltamos nossa atenção para a necessidade imediatamente acima na 
hierarquia. 
Tendo trabalhado com famílias de todos os níveis socioeconómicos 
de nossa sociedade, estou convencido de que a teoria de Maslow 
explica por que a Síndrome de Peter Pan é um mal que afeta 
basicamente as classes média e alta. O habitante da zona suburbana 
(nos Estados Unidos) possuirecursos e status social suficientes para 
não precisar preocupar-se muito com abrigo e segurança. Ele, a 
esposa e os filhos concentram suas atenções em satisfazer as 
 
necessidades de pertences. Como o dinheiro lhes proporcionou a 
satisfação das duas primeiras necessidades, admitem erroneamente 
que ele possa ser usado também para obter a terceira na hierarquia 
das necessidades humanas. Impossível. O pior é que não se 
conscientizam de estar envolvidos numa busca infrutífera. 
Nas famílias em que a permissividade e a discórdia conjugal 
acompanham passo a passo o aumento da renda, os filhos, 
especialmente o primogênito, são tomados por sentimentos de 
rejeição e perdem a autoconfiança. A dose de solidão que expe-
rimentam é dupla. Buscam amigos loucamente: daí o pânico 
descrito acima. Os pais muitas vezes percebem esse pânico e fazem 
a única coisa que jamais deveriam fazer: dão aos filhos mais 
dinheiro e bens materiais, em lugar de atenção e amor. Não demora 
muito para o espírito de Peter Pan penetrar sorrateiramente em seus 
quartos e roubar seus corações. 
"POR FORA" 
É extremamente dificultoso identificar a vítima da SPP quando se 
tem um encontro casual com um grupo de adolescentes que estão 
tentando se encontrar. A irresponsabilidade do adolescente é uma 
ocorrência comum e, em si mesma, não diz muito. A ansiedade e a 
solidão são visitantes ocasionais na vida de todos e, 
moderadamente, não representam uma séria ameaça. Porém 
quando a combinação de irresponsabilidade, ansiedade e solidão 
consome a vida de um jovem, ele pode sentir-se "por fora" do 
mundo. 
Vez por outra, todas as crianças se acham na periferia da atividade 
de um grupo significativo — parte normal da montanha-russa 
chamada adolescência. Contudo, eis as histórias de dois jovens que 
nunca acharam lugar algum a que pudessem pertencer. Se você 
acha que talvez seu filho esteja "por fora", compare sua situação às 
destes adolescentes. Se encontrar um padrão comum, é possível que 
 
seu filho esteja alimentando a idéia de fugir para a Terra do Nunca. 
Entretanto, tenha em mente que ele poderá ultrapassar essa fase, se 
pertencer realmente ao grupo capaz de proporcionar-lhe segurança: 
sua família. 
Tom 
Aos dezesseis anos de idade, Tom andava com rapazes de cerca de 
vinte anos. Dizia que eles eram mais maduros, imunes às tolices das 
crianças. Como parte desse grupo, ele tinha regularmente acesso à 
cerveja e à maconha, e a garotas cuja forma infantil de se 
relacionarem faziam-no sentir-se homem; tinha também de assumir 
atitudes contrárias à educação, ao trabalho e à autoridade de 
pessoas adultas. 
O resultado imediato dessa associação foi uma queda dramática em 
seu desempenho escolar. Se não estava "matando" as aulas, em geral 
dormia nelas. Reclamava incessantemente dos professores, segundo 
ele, chatos e incompetentes. Dizia aos pais para ficarem "fora de sua 
vida", quando reclamavam de sua negligência. A única razão para 
Tom não abandonar a escola foi o fato de haver desenvolvido 
excelentes atitudes educacionais nos anos anteriores. Sua média de 
notas no primário e no ginásio fora 9, e ele planejava estudar 
matemática e ciências na faculdade. No entanto, em um ano aqueles 
valores tinham-se transformado em "besteiras de criança". 
Os pais de Tom culpavam os amigos do filho por essas atitudes. O 
pai dizia que eram vagabundos e perdedores. A mãe implorava a 
Tom que procurasse amigos de sua idade. Tom nem mesmo dava 
ouvidos às queixas dos pais. O que seus pais nunca notaram era que 
Tom sabia que os rapazes eram vagabundos e perdedores; era por 
isso que gostava deles. Ele achava ter muito em comum com eles. 
Tom estava sendo usado pelos mais velhos. Ele provavelmente 
conhecia e aceitava esse fato. Recebia vinte e cinco dólares por 
semana de mesada, a maior parte dos quais destinava-se a comprar 
cerveja e maconha para os amigos. Tom era para eles uma garantia 
 
de divertimento. Além disso, achavam interessante calcular quanto 
poderiam extrair desse garoto ingênuo. Ele se rebaixara a essa 
humilhação em troca da oportunidade de sentir-se um pouco parte 
de um grupo. 
Ele bem poderia relacionar-se com rapazes bons e de sua idade. A 
igreja e a vizinhança convidavam-no para reuniões de adolescentes. 
Ele rejeitava esses convites sem pestanejar. Chamava esses garotos 
de tolos, "cabeças-de-vento" e de outros nomes e recusava envolver-
se. Sem dúvida esses garotos tinham suas falhas; afinal de contas, 
eram ainda crianças. Mas Tom se fixava em seus mínimos defeitos e 
os maximizava a tal ponto que até seus pais tinham de concordar 
em parte com suas críticas. Então ele jurava fidelidade eterna a 
outros rapazes cujos defeitos eram tão graves que seus pais ficavam 
atônitos. 
O modo de vida pessimista e destruidor desses rapazes mais velhos 
sugeria a Tom que ele tinha algo de comum com aqueles. Ele 
pertencia a eles; eram todos perdedores. Ele tivera uma excelente 
educação e sabia que os amigos seguiam um caminho errado; por 
isso os escolhera. A ansiedade e a rejeição experimentadas em casa 
haviam-no convencido de que também ele estava no caminho 
errado. 
Foram necessárias várias sessões de confrontação direta para que os 
pais de Tom percebessem o que o filho estava fazendo. Eles haviam 
procurado ajuda para Tom, sem saber que teriam de encarar os 
próprios problemas conjugais. Reagiram prontamente a meus 
questionamentos, pois não pretendiam continuar assistindo à 
dissolução da família. Em poucas semanas estavam preparados 
para admitir seus erros perante o filho e pedir que ele mudasse seu 
comportamento. 
Tom rebelou-se. Reclamou, fez ameaças, forçou os pais até o 
extremo da tolerância. Ao ver que eles não se submetiam à 
chantagem, começou a capitular. Nunca admitiu seus erros, porém 
o comportamento melhorado sugeria esperanças para o futuro. 
 
Porque Tom gozava de uma péssima reputação na escola e 
apresentava padrões de sociabilidade muito insatisfatórios, a 
família decidiu mandá-lo para um colégio interno. Discutimos 
longamente sobre o modo de se encontrar uma nova dinâmica 
familiar nessa nova situação em que Tom estaria ausente a maior 
parte do tempo. Os pais achavam que a única maneira de Tom 
recomeçar vida nova era romper totalmente com o passado. 
Provavelmente ser-lhe-ia impossível modificar os maus hábitos 
continuando a morar em casa. Relutando, concordei. 
Tom foi matriculado numa escola particular a centenas de 
quilômetros de sua cidade. Isso representava um sacrifício fi-
nanceiro para seus pais e um enorme sofrimento para Tom, 
socialmente bem menos equipado que os novos colegas. Na nova 
escola ele recebeu treinamento extra em áreas acadêmicas e 
socializantes. Pelo que sei, atualmente Tom é um excelente aluno e 
um dos melhores jogadores do time de hóquei de sua escola. Os 
pais reformularam completamente seu relacionamento conjugal e 
estão felicíssimos pela descoberta de que a vida em família pode ser 
linda e serena. Nas férias escolares, Tom vem-se revelando um 
esplêndido exemplo para a irmã e os irmãos menores. 
A família já está pensando na possibilidade de Tom voltar para 
terminar o colegial em sua cidade. Está considerando todos os 
fatores envolvidos na questão. Acima de tudo, porém, querem saber 
o que Tom deseja. E estão certos: ele não é mais um perdedor. 
Toby 
A julgar pelas aparências, Toby, um garoto de quinze anos, não se 
ajustava à descrição da vítima da SPP. Ele era o segundo filho do 
casal; o pai e ele passavam bastante tempo juntos, e ele era o líder 
de um grupo de meninos da vizinhança. Na maioria dos casos, 
essas características se aplicam a um desertor da legião de meninos 
 
perdidos. Entretanto, no caso de Toby, a primeira impressão era 
enganosa. 
Toby não era o primogênito, porém era objeto de uma excessiva 
permissividade. Seus pais haviam sido severos comseu irmão, 
cinco anos mais velho. O irmão se saíra tão bem que os pais tinham 
relaxado a disciplina que haviam empregado em sua educação. 
Acreditavam que, por terem tido êxito com um filho, não 
precisavam esforçar-se com o outro. Assim, enquanto o irrnão fizera 
por merecer o que desejasse — garantindo desse modo uma fonte 
de orgulho honesto —, Toby obtinha tudo o que quisesse sem 
mover um só dedo. Sua irresponsabilidade fê-lo vulnerável às 
dificuldades pessoais do pai. 
O pai de Toby era um homem frustrado. Não conseguira instrução e 
a posição social almejadas, e sentia-se traído por ter sido pobre na 
infância e na juventude. Tinha um temperamento explosivo e 
costumava culpar os outros por seus problemas. Em resumo, era 
um homem colérico. Por sentir-se inseguro e desejoso da aprovação 
paterna, Toby esforçava-se ao máximo por imitar o pai. Dada sua 
fixação em um modelo agressivo, Toby tornou-se briguento. 
Nem mesmo sua identidade em relação ao grupo era o que parecia 
ser. Toby era realmente tido como líder. Mas os garotos da 
vizinhança assim o tratavam apenas por questão de segurança 
física, não porque o respeitavam. Ninguém ousava desafiá-lo, 
porque de um momento para o outro ele podia tornar-se agressivo. 
Em outras palavras, Toby era um valentão. 
Ele tinha ordem específica do pai para jamais iniciar uma briga; ao 
mesmo tempo era ensinado a nunca fugir dela. Em vez de canalizar 
sua inteligência para a atividade escolar, Toby dedicava-se à 
invenção de formas sutis de provocar brigas. Tinha especial 
habilidade em usar palavras irritantes para atingir os outros 
garotos. Descobriu que alusões à homossexualidade em geral 
terminavam em sopapos. Andava desarrumado, vestia camisetas 
estampadas com dizeres vulgares, tudo com a finalidade de 
 
transformar uma confrontação verbal em ataque físico. Arvorava-se 
em defensor dos fracos, não por questão de justiça, mas porque isso 
lhe proporcionava amplas oportunidades de surrar outros rapazes. 
Toby não perdia muitas lutas. Era alto, forte e musculoso. Sempre 
que telefonavam reclamando da agressividade de Toby, seu pai 
pedia detalhes da briga, aparentemente com o propósito de julgar a 
conduta do filho e puni-lo, se necessário. Na verdade, secretamente 
deliciava-se vendo o filho extravasar a raiva que ele próprio 
reprimia. 
A mãe percebia a situação, e fazia tudo para dar-lhe um fim. Mas, 
em vez de enfrentar o marido, inadvertidamente transmitia ao filho 
a mensagem oculta de que ele estava decepcionando o pai. A reação 
de Toby era dedicar-se com mais afinco a agradar àquele, tornando-
se mais agressivo. 
Quando conheci Toby, ele já estava emaranhado em sua própria 
reputação, e descrente de si mesmo por causa da ansiedade, da 
irresponsabilidade e da solidão. Ele sabia que, se modificasse seu 
comportamento, perderia vários amigos; pior ainda, sabia que 
muitos garotos aguardavam a chance de se desforrarem. Ele temia 
que, para parar de brigar, tivesse de enfrentar mais brigas. 
Necessitava da ajuda do pai. 
Para minha surpresa, seu pai deu-lhe essa ajuda. O pai de Toby 
conseguiu abrir-se com relação a suas próprias frustrações, e ficou 
verdadeiramente chocado ao perceber quanto elas afetavam o filho. 
Atuei como intermediário em diversas discussões entre pai e filho, 
durante as quais Toby se aliviava da carga de ter que substituir as 
frustrações paternas. Ao compreender que a fraqueza do pai não era 
problema seu, Toby viu-se livre para modificar seus métodos de 
sociabilidade. 
Ele nem mesmo se queixou (muito) quando os pais instituíram 
medidas disciplinares mais rígidas. Passou a ter hora para chegar a 
casa e seu desempenho escolar era acompanhado de perto. Foi 
obrigado a comportar-se em casa e a apresentar-se sempre limpo e 
 
bem vestido. Essas regras o forçaram a abandonar o papel de brigão 
e o recompensaram por se tornar um adolescente gentil e atencioso. 
Confessou que elas também o ajudaram a fazer novos amigos e a 
sentir-se confiante como aluno. O mais sintomático, porém, foi seu 
comentário espontâneo: "Acho que agora meus pais ligam pra mim 
como ligavam pra meu irmão". 
RESULTADO: INFLEXIBILIDADE QUANTO A PAPÉIS 
Toby e Tom tinham muitas coisas em comum. Uma delas foi o 
resultado de sua luta contra a solidão. Denomino-a inflexibilidade 
quanto a papéis. Especializaram-se em justificar seus fracassos e na 
recusa em tentar qualquer coisa de novo. Acharam um meio de 
lidar com a solidão, e não desejavam — e por fim não conseguiam 
— arriscar-se a serem rejeitados por uma tentativa de 
comportamento novo e mais adequado. Seu padrão de sociabilidade 
solidificara-se como uma rocha. Sua falta de flexibilidade 
transformou-os em alvos fáceis do conflito relativo ao papel sexual, 
que é o quarto e mais destacado alicerce da Síndrome de Peter Pan. 
E a inflexibilidade quanto a papéis que encerra a vítima da SPP 
numa estreitíssima visão de si mesmo como homem. No próximo 
capítulo veremos como esta inflexibilidade se combina com a 
irresponsabilidade, a ansiedade e a solidão, para produzir o traço 
"sexista" da SPP. 
 
 
 
7 
Conflito Relativo ao Papel Sexual 
 
 
 
WENDY: — Quais são seus sentimentos por mim, Peter? 
PETER: — Os de um filho devotado, Wendy. 
WENDY (dando-lhe as costas): — Foi o que eu pensei. 
PETER: — Você é bem estranha. Igual à Lily; eu sei 
que ela quer ser alguma coisa minha, mas ela diz 
que mãe é que não é. 
WENDY (enfaticamente): — Não, não é mesmo. 
PETER: — Então o que é? 
WENDY: — Não fica bem para uma moça falar dessas coisas. 
PETER (vexado): — Acho que ela quer dizer que quer 
ser minha mãe. 
SININHO (disparando centelhas de luz em código): — Seu grande idiota. 
 
Para um líder, Peter Pan era muito ingênuo. Ele não entendia que 
tinha uma fixação na mãe; em sua obsessão, não podia compreender 
a frustração de Wendy. Estava cego aos sinais de caráter sexual 
provenientes de Lily, uma co-habitante da Terra do Nunca, e jamais 
dava valor às "dicas" cheias de bom senso oferecidas pela fadinha 
amiga, Sininho. 
Peter desejava que as meninas agissem como se fossem mães dele. 
Ele se preocupava com a aceitação e a aprovação maternas. Suas 
primeiras necessidades de dependência, datadas da primeira 
infância, inibiram o desenvolvimento de relacionamentos maduros. 
Peter Pan tinha uma só coisa em mente: se as meninas não 
correspondessem, não queria nada com elas. 
Wendy esforça-se ao máximo para satisfazer às exigências de Peter 
Pan. Embora seu desapontamento seja evidente, ela continua 
tentando fazer com que Peter se sinta um filho querido. Mas isso 
não a gratifica. Em certa ocasião ela força Peter a fazer o papel de 
pai e de marido. Isto o perturba e ele retoma rapidamente o papel 
de filho, deixando o de amante. Wendy satisfaz a todos os seus 
caprichos. 
 
Sininho também quer ser namorada de Peter Pan. Contudo, por sua 
sarcástica reação diante da ingenuidade de Peter, fica claro que ela 
não tolerará infantilidades naquele a quem ama. Apesar de não ser 
humana, Sininho experimenta inúmeras emoções humanas, 
inclusive o amor e o ciúme. Mas Peter a rejeita sistematicamente. 
Desagrada-lhe que ela se comporte como mulher, em vez de mãe-
substituta. 
A relação de Wendy com Peter Pan é distante e convenientemente 
controlada. Ela age de acordo com o que Peter deseja, e não hesita 
em alterar o curso de seus pensamentos e ações a fim de satisfazer 
às exigências dele conquanto estas sejam pueris. Ela gosta de Peter, 
mas expressa isso mediante uma excessiva tolerância e mimos. Isto 
a confunde; mesmo assim, se submete à exigência de Peter de não 
ser tocado por ela. 
Sininho, por sua vez, se constitui de uma matéria viva e vibrante. 
Suas reações assemelham-se mais às que se esperariam de Wendy. 
Todavia Sininho é mais humana que Wendy, muito embora não seja 
mais que um quantum de energia em formade luz. Com Peter ela 
almeja ter um relacionamento mutuamente envolvente, onde haja 
espaço para a espontaneidade e o crescimento. Ele, porém, rejeita 
essa idéia sem compreendê-la. A ironia de um espírito carregado 
eletricamente ser capaz de penetrar as emoções humanas, 
intensifica-se ao descobrirmos que a Sininho é permitido tocar 
Peter. 
A história de Wendy e de Sininho disputando o afeto de Peter Pan 
apóia-se na recusa de Peter em crescer. E o destino determina que 
uma das meninas deverá vencer. No final da história ficamos 
sabendo que carne e osso triunfam sobre a realidade elétrica. Peter 
mantém com Wendy uma relação altamente estruturada, fria e 
distante. Ela garantiu uma ligação com Peter, porém a esperança de 
que esta ligação se torne um relacionamento produtivo esvai-se à 
medida que sua maturidade a distancia da Terra do Nunca. Quanto 
 
a Sininho, temos seu destino revelado neste curto mas instrutivo 
diálogo: 
WENDY: — Não vi Sininho desta vez. 
 PETER: — Quem? 
WENDY: — Ah, claro. Acho que é porque você tem tantas aventuras. 
 
O que havia em Peter Pan para fazer com que duas mulheres tão 
diferentes o quisessem tanto? Aparentemente ele não se 
considerava um sedutor. Não tinha um bom emprego (poder-se-ia 
dizer que era um militar cumprindo missão além-mar). Ninguém 
poderia acusar Peter de ter sangue azul, dado o fato de ele haver 
caído do carrinho e a mãe simplesmente ter encomendado outro 
filho. E quaisquer que fossem seus recursos financeiros, viver num 
toco de árvore certamente não sugere grandes perspectivas de boa 
vida. 
O devotamento de Peter Pan à eterna juventude foi sua bênção e 
sua perdição. Ele produziu reações divergentes em Wendy e em 
Sininho. Wendy amava Peter pelo que ele era: uma criancinha 
necessitada de proteção. Sininho amava-o pelo que ela acreditava 
que ele poderia tornar-se: um homem de espírito jovial e cheio de 
energia. O fato de Peter haver preferido ficar com Wendy esclarece 
o último dos quatro alicerces da Síndrome de Peter Pan: o conflito 
relativo ao papel sexual. 
 
CONFLITO RELATIVO AO PAPEL SEXUAL 
Se fosse possível ouvir a "voz" do conflito relativo ao papel sexual 
existente dentro da cabeça da vítima da SPP, ela diria mais ou 
menos isto: 
Há um vazio dentro de mim, um buraco em minha alma. Persegue-
me e me assusta, mas não sei seu nome. Às vezes, quando estou 
com meus amigos, acho que a coisa foi embora. Mas ela sempre 
 
volta, gritando em meu ouvido: "Cuidado! Tome cuidado! Uma 
coisa horrível vai acontecer". Mas nada jamais acontece, eu só me 
sinto só. 
Sempre que me sinto assim, minha única vontade é falar com 
mamãe. Quando ouço a sua voz, não tenho medo. Sinto-me um 
idiota sempre precisando da mamãe, mas assusta-me pensar em não 
falar com ela. 
O vazio é pior ainda quando estou com uma garota. Quero tocá-la, 
porém não quero cometer erros quando o fizer. Não gosto de ter 
medo das meninas. Quase que eu gostaria de não ter sensações 
sexuais. Mas tenho. 
Por que é tão difícil falar com as garotas de quem eu gosto? Por que 
fico tão nervoso quando uma delas me excita? E principalmente, por 
que tenho raiva das meninas que me excitam? 
É, eu tenho raiva das meninas que me excitam. Invejo-as. Para elas é 
tão fácil. Elas são livres para ser duronas ou sexi, passivas ou 
calorosas, femininas ou masculinas. Não é justo que a gente queira 
as meninas mais do que as meninas querem a gente. 
Não possso falar sobre nada disso. Meus amigos acham que sou um 
perfeito "garanhão". Eles cairiam de costas se soubessem o que 
estou pensando. Eu gostaria de ser terno, falar de meus 
sentimentos, até de chorar. Mas não posso. E se eu tentasse abrir o 
jogo com meus amigos, eles ririam de mim e me chamariam de 
"bicha". E aí como ficaria eu? Com certeza pior do que agora! 
Esta voz interna do conflito fala de impotência. É uma impotência 
resultante do fato de a vítima estar sendo puxada em direções 
opostas ao mesmo tempo. O impulso sexual do menino empurra-o 
em direção à exploração de novas formas de relacionamento com as 
garotas. Sua insegurança impele-o a refugiar-se sob a saia da mãe. O 
conflito relativo ao papel sexual prende os meninos num padrão 
comportamental de inatividade. Eles não lidam com a sexualidade 
 
de um modo particularmente positivo ou negativo. Simplesmente 
não conseguem lidar com ela. 
O conflito relativo ao papel sexual indica um declínio fundamental 
no processo de amadurecimento da vítima da SPP. Ao aproximar-se 
da idade adulta, podemos compará-lo a um corredor de obstáculos 
que cai de cara no chão. Enquanto a realidade acena para que ele se 
junte aos outros na arriscada empresa da exploração sexual, o pó 
mágico da Terra do Nunca narcotiza seus impulsos biológicos. Seu 
amadurecimento sexual é cerceado, e sua impotência é camuflada 
pela intensificação de uma falsa alegria. 
Todos os jovens encontram dificuldades em compreender o que 
significa ser uma criatura sexual. É uma aventura assustadora, 
conquanto excitante. Todavia, a freqüência e a intensidade do 
conflito vêm aumentando terrivelmente nos últimos vinte ou vinte e 
cinco anos. Se bem que as meninas experimentem grande confusão 
nessa área, são os meninos quem se vêem imobilizados pelo dilema 
"culpado se faço", "culpado se não faço". 
No final da década de 50 e no início da de 60, existiam linhas claras 
de demarcação que serviam para poupar os jovens da imobilização 
quando eles experimentavam sua identificação com o papel sexual. 
Dispunham de um caminho bem definido a seguir na descoberta de 
sua sexualidade. 
Relembro os anos 60 e visualizo o espírito de Peter Pan circulando 
nos autocines procurando recrutas para a sua legião. Mas mesmo os 
rapazes que sofriam de rejeição em casa e de solidão fora dela 
tinham em mãos um tônico poderoso. Minimizavam a influência de 
Peter seguindo as regras tradicionais que ditam o relacionamento 
com as garotas: os rapazes eram machos, as meninas conheciam seu 
lugar. 
Os acontecimentos sociopolíticos das duas últimas décadas 
modificaram as regras tradicionais. Às meninas ofereceu-se um 
novo roteiro; para os rapazes, infelizmente, restou o antigo. Para 
 
aqueles que se sentem bastante seguros para assumir o risco, a 
situação atualmente é comparável a uma viagem numa montanha-
russa: nunca se sabe quando virá a próxima queda. Mas para os 
jovens perseguidos pela ansiedade e pela solidão, as novas regras só 
implicam maiores ameaças de rejeição. 
Para mostrar a maior gravidade, em termos sexuais, da Síndrome 
de Peter Pan nos dias de hoje, vamos comparar a vítima de agora 
com a de vinte e cinco anos atrás. 
Ambas as vítimas podem ser cruéis, embora intimamente sejam 
bastante sensíveis. Ambas são inflexíveis quanto a seus papéis e 
pouco propensas a assumirem riscos. Ambas temem a rejeição, 
particularmente a das mulheres. Mas a vítima de nossos dias tem 
menos autoconfiança por desfrutar de maior permissividade e bem-
estar e, portanto, ter de lutar menos. 
Os roteiros podem ter mudado, porém o cenário é o mesmo — as 
reuniões de adolescentes. Nos anos 50 elas tinham lugar nos 
bailinhos. Segundo a garotada, seu propósito lá era ouvir música e 
dançar. Contudo, não era segredo para ninguém que o verdadeiro 
objetivo era aprender a se relacionar com o sexo oposto. Sempre 
estavam presentes alguns adultos, em geral professores, para 
acompanhar a grande descoberta e garantir a manutenção das 
regras tradicionais. 
Colocavam-se em lados opostos do salão: de um lado os rapazes, do 
outro as meninas. Os rapazes, em grupinhos, gabavam-se de ser 
grandes amantes, um pouco incertos do significado desse termo. 
Tinham as mãos nos bolsos, os corações nas mangas e os estômagos 
na boca. Agiam de modo muito displicente, fingindo não notar as 
garotas. Peter Pan vagava entre eles, o que era evidenciado pelas 
piadas com que escondiamseu medo, e pelas gargalhadas 
provocadas pela última diabrura do "engraçadinho" da classe. 
Enquanto isso, as meninas ficavam dando risadinhas. Todas se 
ocupavam em aparentar total desprezo pelos imaturos garotos do 
 
outro lado do salão. Entretanto, elas não deixavam de sussurrar 
seus comentários sobre qual deles era o mais bonito e de fazer 
perguntas sobre quem tinha telefonado para quem. As mais 
audaciosas ousavam apostar sobre quais rapazes iriam tirá-las para 
dançar primeiro. 
À medida que os dois grupos se iam misturando, mostravam-se 
muito cuidadosos em não se aproximar demais. O ritual atingia o 
clímax quando o adulto estimulava os rapazes a dançar com as 
meninas. Pelo modo como eles protestavam, pensar-se-ia que lhes 
pediam que cometessem suicídio. Finalmente o mais corajoso 
atravessava a linha imaginária no meio do salão. O silêncio era 
completo. Logo dois ou três outros cruzavam a linha e a tensão se 
reduzia. O pó mágico do mascaramento era dispensado em 
benefício da aprendizagem sobre os estranhos poderes que faziam 
os rapazes e as meninas corar de excitação. Percebendo que ali não 
encontraria novos recrutas, Peter voava para longe. 
Nesse cenário tradicional, cabia aos rapazes serem agressivos, e às 
meninas serem dependentes e passivas. O rapaz devia tomar a 
iniciativa com sofreguidão, e a menina tinha de proteger a si e a ele 
para evitar que fossem longe demais. Ao se depararem no meio do 
salão, ambos desempenhavam seus respectivos papéis com êxito. 
A vítima da SPP, sofrendo de solidão e de medo de rejeição, ali 
podia recuperar um pouco de autoconfiança. Seu sucesso 
propiciava-lhe a oportunidade de sobrepujar sua irresponsabilidade 
e inflexibilidade. 
O aspecto triste dessa cena é que muitos desses rapazes e meninas 
jamais ultrapassaram as limitações desses estereótipos sexuais. Os 
rapazes se satisfaziam com o papel chauvinista, e as meninas se 
ajustavam ao de personagens secundárias. As meninas sentiam-se 
fracas e indefesas, mas tinham que ser fortes o bastante para 
suportar as imaturidades de um namorado centrado em si mesmo. 
Alguns se casavam e caíam na extenuante rotina imposta pelos 
limitados papéis de "provedor" e de "dona-de-casa". O 
 
relacionamento como que murchava; o fascínio todo se resumia ao 
experimentado no baile da escola, nos tempos de ginásio. Vários 
dos participantes daqueles bailes são hoje pais de vítimas da SPP. 
O movimento de liberação, liderado pelos rebeldes dos "bailinhos", 
veio reescrever o roteiro. E já era hora disso. A linha dura e fria que 
demarcava o salão da escola pode ter ajudado os adolescentes de 
então a explorar sua sexualidade com segurança, porém 
aprisionava-os num padrão comportamental que os privava da 
chance de um crescimento autêntico como seres humanos. 
Entretanto, comparado com o cenário dos bailinhos da escola, o 
novo roteiro contém tantas falhas quanto o antigo. Analisemos o 
baile moderno, agora simplesmente denominado "festa" pelos 
adolescentes, e vejamos como operam as novas regras. 
Realmente trata-se de uma festa. O visual provavelmente é outro. O 
salão do colégio é despojado demais para os adolescentes de hoje; a 
espaçosa sala de estar de suas casas oferece uma atmosfera mais 
aconchegante. Os adultos — se presentes — pisam sobre ovos, pois 
receiam ser tidos como "caretas" se pretenderem impor limites à 
"curtição". 
Não existem linhas imaginárias na sala de estar. Aliás, há pouca 
organização na festa (se é que há alguma). Para os jovens que já têm 
um pouco de experiência social, o pandemônio é tolerável. Esses 
estabelecem suas próprias normas de conduta. Mas para a maioria 
dos adolescentes, não há regras que limitem a exploração sexual. 
Muitos deles acalmam sua ansiedade bebendo uma ou duas 
cervejas antes da festa, ou fumando um cigarro de maconha no 
começo da noite. A altura do som abafa qualquer resíduo de medo 
que não haja sucumbido às drogas. 
A maioria dos rapazes posta-se de mãos nos bolsos. Os mesmos 
velhos assuntos são discutidos por aqueles que ainda estão 
suficientemente sóbrios para raciocinar. Os que têm mais traquejo 
social juntam-se a uma garota assim que for possível. Outros 
apóiam-se no velho papel do machão para mascarar seu temor à 
 
rejeição. As vítimas da SPP, mais cedo ou mais tarde (em geral mais 
cedo), acabam no quintal "puxando" mais fumo ou afogando-se em 
cerveja. Os solitários, desconsolados, voltam logo para casa. 
As meninas, por outro lado, desempenham seu novo papel sendo 
agressivas e "atiradas". Algumas tentam competir entre si trocando 
piadas sujas, identificando o "cara" mais "gostoso" do grupo, e 
declarando o que pretendem fazer com ele quando o "pegarem" a 
sós. Muitas sentem-se impelidas a ser supermu-lheres, sempre com 
o controle de todos os seus pensamentos e sentimentos. Por dentro 
estão aterrorizadas, sem saber o que fazer. 
O novo roteiro ensina as meninas a jamais serem submissas a um 
homem, ainda que o desejem. Elas devem ser ousadas a ponto de 
serem agressivas, indiferentes a ponto de serem sarcásticas, e 
exigentes até a insensibilidade. As que forem incapazes de seguir o 
roteiro sentem-se alienadas. As que não querem seguir o roteiro 
provavelmente ficarão em casa achando que elas são as erradas. 
Uma menina de quinze anos confessou-me que, após ter tomado 
duas cervejas, dirigiu-se a um rapaz, pôs a mão sobre o zíper de sua 
calça e disse: "Se você é homem mesmo, vamos ver isso lá fora!" Ela 
admitiu que estava tentando agir segundo o novo modelo de papel 
que, achava, lhe proporcionaria aceitação. 
Poucos rapazes possuem a maturidade ou o autocontrole 
necessários para manejar esse tipo de aproximação. Certamente não 
há nenhum adulto por perto para dizer-lhes que é perfeitamente 
natural darem uma risadinha, ficarem vermelhos e correrem para o 
banheiro. Enquanto as garotas cruzam a linha em busca de atitudes 
de afirmação tradicionalmente consideradas masculinas (a menina 
mencionada acima é uma exceção, não a norma), a maior parte dos 
rapazes tentam afirmar-se agarrándose ao papel de "machão" e 
fracassam. 
É compreensível que a vítima da SPP, temendo a rejeição e sendo 
sensível demais para desempenhar bem o papel de "machão", saia 
 
da festa e se agrupe com outros rapazes como ele. Saem de carro e 
se embebedam, queixando-se das mulheres arrogantes e dos 
homens afeminados. Longe deles admitir que sentem vontade de 
compartilhar seus temores. Em vez disso, se enraivecem e acariciam 
o ego ferido contando vantagem com suas supostas aventuras. 
Por que ocorre isso? O que se passa pelas cabeças desses 
adolescentes para tornar o conflito referente ao papel sexual tão 
arrasador? Minha experiência clínica ensina que, enquanto se dá às 
meninas um roteiro que lhes permite penetrar num território 
tradicionalmente masculino, nega-se aos rapazes uma linha de 
conduta para a travessia em direção ao território tradicionalmente 
considerado feminino. Por conseguinte, é perfeitamente normal que 
as meninas se tornem ousadas e independentes, mas não se vê como 
normal que rapazes sejam passivos e dependentes. Este contraste 
cria em certos meninos o conflito referente ao papel sexual, e faz 
deles excelentes candidatos à legião dos meninos perdidos de Peter 
Pan. 
Onde eles estão aprendendo este roteiro de autofrustra-ção? Minha 
experiência mostra que eles não o aprendem dos pais. Na realidade 
seus pais não lhes estão oferecendo nenhuma orientação no tocante 
à exploração sexual. Tentando suprir a ignorância nesse campo, eles 
se voltam para o grande mestre da era moderna: a televisão. 
Vejamos o que a televisão está dizendo a nossos adolescentes nesse 
sentido. 
O Roteiro Feminino 
A maioria de vocês se lembrará de um comercial de televisão que 
diz tudo. 
Uma mulher linda e sedutora surge na tela vibrando de 
autoconfiança e fascínio sexual. É impossívela qualquer rapaz ou 
moça deixar de notá-la. A mulher está cantando uma canção com 
 
uma mensagem tão explícita quanto a captada pelos professores 
presentes aos bailes de vinte e cinco anos atrás: 
Posso levar para a casa o filé que vou preparar para o jantar. E 
nunca, nunca deixarei você se esquecer de que é um homem. . . 
Pronto! As meninas têm que comprar o produto imediatamente. 
Então elas também poderão enviar essa mensagem aos homens. 
Com efeito, dizem: "Posso trabalhar e ganhar tanto quanto você. E 
ainda posso assumir o papel tradicional de dona-de-casa 
preparando o jantar. Mais ainda, tomarei a iniciativa de seduzir 
você e satisfarei todas as suas necessidades sexuais. Sou uma 
mulher completa e sou capaz de fazer tudo bem". 
 
O Roteiro Masculino 
Enquanto as meninas planejam como desempenhar esse papel de 
supermulher, os rapazes tremem no sofá, procurando uma fórmula 
para contrabalançar tanta competência. Logo, logo, o grande meio 
de comunicação lhes dará a resposta. 
Lá está um homem gentil, sem temor de expressar abertamente seus 
sentimentos. Nada mal, hein? Porém apenas os rapazes começam a 
personalizar este roteiro, acrescenta-se uma nova dimensão. O 
sujeito é um tonto. Tropeça nas coisas, troca os pés pelas mãos e é 
tratado como criança. Como se isto não bastasse, o tipo é mentiroso. 
Ele supostamente vive com duas garotas e aprecia o sexo oposto. 
Mas para assumir esse modernismo, finge ser homossexual. A 
mensagem: "Se você pretende ser sensível e gentil, estará agindo 
como um palhaço e será tido pelos outros como um indivíduo que 
não chega a ser um homem 'de verdade' ". Qualquer garoto que 
deseje ser heterossexual rejeitará este papel imediatamente. 
Mas nem todas as esperanças estão perdidas. Dali a uma hora outro 
filme mostra um detetive particular, homem bonito e sempre hábil 
nas questões sociais. Nunca faz nada de errado; seus amigos o 
 
consideram o "cara mais legal do mundo". Quando este herói quer 
uma mulher, não precisa dizer nada. Ele deixa seus músculos, seus 
cabelos e sua força falarem por ele. 
Este homem nunca perde. Seja qual for a situação, sai sempre por 
cima. Além disso, não deixa ninguém perceber seus problemas. 
Jamais precisa admitir que não sabe o que fazer da solidão ou do 
medo. 
Alguns garotos ficam confusos. Dão-se conta de seus sentimentos e 
da vontade de compartilhá-los. Mas se o fizerem, correm o risco de 
ser considerados fracos e bobos. Contudo, se imitarem o grande 
herói, não haverá lugar para o fraco. 
Enquanto eles ainda estão se esforçando por esclarecer a confusão, 
aparece um filme de relativo sucesso. Eles vêem um homem de 
meia-idade, o tipo de pai. É gentil, comunicativo, adora cozinhar, 
cuida dos filhos e admite abertamente suas fraquezas. Chora, tem 
medo e não esconde seus sentimentos. Ah! talvez esta seja a 
resposta. Nem bem os garotos começaram a avaliar os benefícios 
deste roteiro, descobrem tratar-se de um homossexual. Ficam 
aterrorizados. "Podia ser eu", dizem consigo mesmos. 
Se este seleto grupo de garotos, muitos dos quais são vítimas da 
SPP, adotar o último roteiro, há boa probabilidade de virem a entrar 
em contato com a comunidade gay. A homossexualidade parece 
oferecer-lhes uma solução para o conflito. No entanto, a maioria dos 
homossexuais sofre tanto (ou talvez mais) com o conflito referente 
ao papel sexual quanto os heterossexuais. Eles podem ter 
desenvolvido o lado feminino de sua personalidade, mas restam-
lhes profundas dúvidas quanto à sua identidade masculina. Na 
tentativa de lidarem com a solidão, simplesmente mudaram o tipo 
de mascaramento, porém ainda vivem na Terra do Nunca. (Um 
aspecto interessante deste conflito é o fato de que geralmente o 
papel de Peter Pan é feito por uma mulher nas versões teatrais da 
história). 
 
O conflito referente ao papel sexual inibe as vítimas da SPP. 
Tornam-se incapazes de apreciar a natureza fluente e dinâmica de 
um relacionamento maduro. Sua inflexibilidade impede-lhes a 
experimentação e aprisiona-os em papéis rígidos. Seu temor do 
fracasso e da rejeição reduz sua capacidade de assumir riscos, 
impedindo-os de investirem coração e alma num relacionamento. 
Na verdade eles se tornam incapazes de amar. Se admitirem esta 
falsa situação, ela pode transformar-se em realidade conduzindo-os 
a um narcisismo ofuscante. Para combatê-la restam-lhes três 
alternativas: encontrar uma mulher que assuma o papel de mãe e os 
proteja contra o crescimento, evadir-se ao conflito sexual fingindo 
que a vida de gay não é solitária, ou buscar ajuda na confrontação 
de sua solidão e na obtenção do controle de suas vidas. 
 
IDADE PICO: 17 A 18 ANOS 
Tenho três razões para escolher o período dos 17-18 anos como pico 
do conflito referente ao papel sexual: 
Em primeiro lugar, é durante esses dois anos que a sexualidade do 
jovem amadurece a ponto de as atitudes e as preferências sexuais 
começarem a se fixar. Quaisquer atitudes já desenvolvidas tendem a 
mostrar-se resistentes à mudança. 
Em segundo lugar, a emergência do conflito referente ao papel 
sexual depende da inflexibilidade resultante da luta contra a solidão 
nessa idade. A rigidez cria uma unilateralidade de visão no jovem, 
incapacitando-o para a experimentação com diferentes formas de 
relacionamento com o sexo oposto. Segue-se daí que as atitudes 
sexuais desenvolvidas freqüentemente são frias, limitando-se à 
obtenção de satisfação física. 
Em terceiro lugar, é nessa idade que a emergência do conflito 
referente ao papel sexual dá lugar a um labirinto de outros conflitos. 
Estes possivelmente não virão à tona por vários anos, porém uma 
vez que o indivíduo atinja o estágio onde se cristaliza a confusão 
 
relativa a seu papel sexual, outros conflitos tomam forma. As 
restrições em torno de um comportamento socialmente aceitável 
dão lugar a um estilo de vida em que um ato extremista segue-se a 
outro. Seja este indivíduo seu filho de dezoito anos ou seu marido 
de quarenta, os extremos entre os quais ele oscila deixam-na 
atordoada. Quem é este homem? Em que ele está pensando? 
EM QUE ELE ESTÁ PENSANDO? 
Peter Pan optou por ficar com Wendy porque ela o protegia de seus 
conflitos íntimos. Ela satisfazia a todos os seus caprichos e sentia dó 
dele por sua fraqueza emocional. Embora ela experimentasse um 
pouco de decepção diante de sua imaturidade, evitava questioná-lo 
sobre seu senso de lealdade tão instável. Como resposta ele exibia 
uma personalidade dupla. Oscilava entre um mundo real onde 
experimentara a rejeição e o desespero e um mundo de fantasia 
onde fingia poder ser uma criança feliz para sempre. 
Wendy, Sininho ou qualquer outra mulher que tente amar ou 
compreender um dos meninos perdidos reconhecerá a dualidade 
Jekyll/Hyde na vítima da SPP. Há momentos em que ela se 
aconchega a uma pessoa carinhosa e atenciosa para, uma hora 
depois, ser recepcionada com uma fria indiferença. Sob vários 
aspectos a vítima da SPP sente-se de um modo, mas age de outro. 
Seus enormes contrastes entre pensamento, palavra e ação apontam 
para uma personalidade dividida. Contudo você sabe que ele não é 
louco. E você está certo. Ele não perdeu o contato com a realidade; 
ele sabe que está péssimo. Apenas não tem força necessária para 
mudar a situação. 
Os contraditórios padrões comportamentais originados do conflito 
referente ao papel sexual podem vir à superfície em diversas 
seqüências. Podem inclusive manter-se adormecidos até a vítima 
entrar na rotina de trabalho, de casamento e filhos. É raro 
verificarem-se todos os conflitos possíveis num curto espaço de 
tempo. Independentemente da freqüência ou seqüência, os conflitos 
 
são reveladores. Aparentemente confundem, impedindo-nos de ver 
a ligação entre os extremos de comportamento ou de estados de 
espírito. Mas se você se conceder um momento de reflexão sobre oque os dois extremos têm em comum, terá a resposta à pergunta: 
em que ele está pensando? 
Eufórico x Deprimido 
A postura da vítima da SPP diante da vida tem um caráter cíclico. 
Ele oscila entre uma animação maníaca pela chegada da primavera 
e um desalento depressivo com a aproximação das festas natalinas. 
Por vezes este ciclo é tão pronunciado que você começa a 
preocupar-se com um potencial suicida. 
Você diz para si mesma ou comenta com alguma amiga chegada: 
"Estou preocupada com ele. Num dia ele ama a vida e no outro, não 
vê sentido nenhum nela". 
Você acaba de descrever o germe da dúvida que habita bem no 
fundo desse homem inteligente e sensível. Em suma, é a questão 
existencial que atormenta a todos nós: "Por que estou aqui?" 
Quando a vítima da SPP vê razão para existir, sua animação é 
contagiante. Quando a vida não lhe oferece objetivos, a depressão é 
fúnebre. Por amá-la, você sente-se como um iô-iô. Num dia está 
bem, no outro está mal. E você anseia por estabilidade. 
A falta de tranqüilidade do jovem relaciona-se com a tempestade 
em sua alma. O fato de estar vivo não lhe basta para poder sentir-se 
autêntico. Ele sente que deve provar diariamente que é uma boa 
pessoa, e digno de estar vivo. Quando lhe mostram amor 
(especialmente a mãe), sente-se bem consigo mesmo e invade-o a 
esperança. Diante de um fracasso ou desaprovação, conclui que não 
é bom e não é digno de estar vivo. É então que ele se deixa consumir 
pela depressão. 
É por não se sentir autêntico que ele se cerca de amigos, chega a 
extremos ridículos para ser apreciado, torna a mulher de sua vida 
 
como coisa certa, rejeita sentimentos negativos a respeito de outrem, 
e fica furioso quando é criticado. O pior de tudo é que nunca é livre 
para ser simplesmente ele mesmo. O mascaramento e a falsa alegria 
da Terra do Nunca constituem seu único alívio. 
 
Dedicação x Desprezo 
Em seus primeiros anos os jovens, vítimas da SPP, têm imenso 
respeito pelas mulheres de suas vidas. Seguem-se desse respeito 
muita gentileza, maneiras encantadoras e grande disposição para 
ajudar. Assim tornam-se benquistos pelos vizinhos, pelos 
professores, pelos membros da igreja e pelos pais. Re-
trospectivamente poder-se-ia argumentar que esse respeito é in-
sincero e forjado. Incorreto. Ele é sentido com intensidade e 
expresso com honestidade. 
À medida que os conflitos começam a exaurir o ego da vítima, o 
medo de ser rejeitado aumenta, e este respeito se degrada por uma 
dedicação excessiva. A idolatria resultante gera servilismo. A raiva 
é inevitável; também o é a rebelião. Para se defender dessa 
subserviência às mulheres, a vítima adota uma atitude de desprezo 
para com elas, imputando-lhes a culpa de sensação de impotência. 
O desprezo é tão irracional e ilógico quanto o era a dedicação. 
Esses homens demonstram exagerado respeito diante das mulheres, 
mas acumulam-nas de críticas e menosprezo em conversas com os 
amigos. Ficam então gabando-se de sua incrível habilidade em pôr 
as mulheres em seus devidos lugares. Quando o medo e a raiva 
falam juntos, essa auto-exaltação colore-se de fortes tons de 
dominação sexual pela força física. 
Você pode suspeitar que seu homem vacile entre a devoção e o 
desprezo. Provavelmente jamais virá a escutar aquelas gabolices, 
pois em geral são só ditas diante de outros homens. Poderá, porém, 
detectar a natureza paradoxal do respeito que esse homem exibe 
para com as mulheres. Meu exemplo favorito é o sujeito de "boca 
 
suja" que, contudo, ofende-se profundamente se alguma 
vulgaridade é expressa na presença de uma mulher. Ele põe a 
mulher num pedestal apenas para, às suas costas, rir dela. 
 
Gregário x Solitário 
A vítima da SPP ama as pessoas; pelo menos dá essa impressão. 
Vive cercando-se de inúmeros "amigos" e zanga-se só em pensar ter 
perdido algum programa. É dos últimos a sair das festas a fim de 
aproveitar tudo. Você, no lado oposto da sala, pensa: "O pessoal já 
está com cara de cansado. Como é que ele não nota? E por que ele 
está rindo tanto? Não vejo nada de engraçado". 
A resposta é que, pelas gargalhadas, ele está tentando extinguir os 
ecos da solidão. Pois, apesar de seu espírito gregário, de seus 
amigos e de sua obsessão por festas, a vítima da SPP sente-se muito 
só, mesmo em meio à multidão. 
Há uma enorme distância psicológica entre a vítima e as outras 
pessoas. Ainda que esteja ao lado de um amigo ele sente-se a um 
milhão de quilômetros de distância. Em geral ele se acostuma a isso, 
e o aceita como normal. 
O "solitário no meio da multidão" provoca pena na esposa ou na 
amante. Uma mulher perguntou-me um dia: "Por que tanta 
dedicação? Por que ele não relaxa um pouco? Será que ele não sabe 
que é amado do jeito que ele é?" A resposta a esta última pergunta é 
não. 
 
Sensibilidade x Indiferença 
As vítimas da SPP são, em princípio, crianças excepcionalmente 
empáticas e sensíveis. Suas mães lhes propiciam a sensação de 
validade emocional que lhes permite a segurança de expressar 
abertamente seus sentimentos. Todavia, dada a falta de 
autodisciplina que acompanha a preguiça e a irresponsabilidade, 
 
essas crianças não conseguem aprender a controlar suas emoções. 
Desconhecem formas de lidar com as inevitáveis decepções da vida. 
Por isso seus sentimentos são feridos com facilidade. 
Logo após a puberdade, tendo de enfrentar a rejeição dos 
companheiros, e sentindo-se incapazes disso, começam a se mostrar 
reservadas. Como não sabem como se proteger da mágoa, apelam 
para a fuga do sentimento. Assim, sempre que se sentem mais 
vulneráveis, procuram apresentar indiferença. Isto ajuda a explicar 
por que a vítima da SPP adota típica atitude de "não estou nem aí", 
toda vez que é tomada por tristeza ou pelo remorso. Anos depois 
essa indiferença apresenta-se na afirmação de que ela está acima de 
qualquer emocionalidade "barata". 
 
Delicadeza x Crueldade 
Provavelmente este é o mais doloroso conflito que tem de enfrentar 
um homem que é amado. Ele pode despedir-se de manhã com um 
beijo ou um abraço caloroso para, à noite, atacar com uma série de 
comentários cruéis e irracionais. Ele espera que a amante, a esposa 
ou talvez a mãe suportem suas imaturidades e maldades por ser 
essa a sua função! Suas sinas são tolerar-lhe a crueldade, perdoar-lhe 
os insultos e amá-lo independentemente do que ele faça. Ele não 
entende sua raiva nem se dispõe a desculpar-se. Ele está convencido 
de que: "Você me amará sempre, não importa o que eu faça". 
A vítima da SPP na verdade não leva em consideração a esposa ou 
amante. Equaciona esse tipo de amor com o de uma mãe. O amor 
adulto é distorcido a ponto de o homem pensar que a esposa ou 
amante não pode esperar dele mais do que ele decide dar-lhe, e no 
momento por ele escolhido. Ele não compreende que o amor adulto 
é condicional — que envolve dar e receber. Em vez disto, ele é o 
recebedor e a esposa ou amante é a doadora. Se uma mulher 
questiona essa ineqüidade, é vista como uma ingrata que não 
enxerga o valor do que tem. 
 
Desnecessário dizer que, se esse conflito permanece sem resolução, 
desaparece esperança de desenvolvimento de um relacionamento 
afetivo maduro. 
Vítima x Salvação 
A vítima da SPP conhece mil formas de autocomiseração. 
Resmunga quando acusado de crueldade, gela diante da raiva da 
esposa e fica amuado quando sua supermãe tenta controlar-lhe a 
vida. Tivesse ele vivido na época do Velho Testamento, bem 
poderia ter sido o primeiro da fila a oferecer o sacrifício de sua auto-
estima para apaziguar a fúria dos deuses. 
Este mesmo mártir, entretanto, toma para si a tarefa de proteger a 
esposa e salvá-la do mundo. Tem suas próprias idéias de como ela 
deve comportar-se, e de repente sai correndo para fazer uma boa 
ação para outrem, sem nem sequer avisá-la onde está ou o que está 
fazendo. Ele parece estar perenementepronto a salvar todo mundo, 
mas fica imóvel quando a esposa precisa de ajuda. 
Para compreender este conflito ela deve lembrar-se de que Peter 
Pan se recusava a ver as mulheres como outra coisa que não figuras 
maternas (releia o diálogo no início deste capítulo). Tendo 
percebido que a vítima da SPP a olha como projeção de uma mãe 
idealizada, será fácil para a esposa imaginar como ele reage ao ouvir 
que a mãe precisa de ajuda. 
Primeiramente, ele não entende como uma mãe perfeita possa ser 
melhorada. Ele a faz tão perfeita quanto seu desejo, e fica aturdido 
quando a esposa não se ajusta ao papel. 
Em segundo lugar, ele teme oferecer-lhe auxílio porque, dada sua 
baixa auto-estima, ele está certo de que cometerá algum erro. Seu 
maior erro é não tentar ajudar. A saída mais fácil para ele é retirar-
se da situação ou negar (às vezes veementemente) que a esposa 
tenha quaisquer limitações. 
Se ela entendeu estas duas reações, imagino-a agora protestando: 
"Mas eu não quero ser mãe dele!" Muito bem. Mas consulte o 
 
Capítulo 13 para assegurar-se de que não está agindo como mãe 
dele. 
Fiel x Flertador 
Você pensa que o conhece, porém desconhece-o totalmente. Esta 
afirmação é válida para você? No que tange à fidelidade de seu 
homem, deve ser válida. Você acredita nele quando diz que é fiel a 
você, mas em festas e reuniões ele pouco faz para disfarçar seus 
flertes. Ele se entrega tanto à tentativa de impressionar outras 
mulheres que acaba se tornando ridículo. 
O homem, vítima da SPP, afirma à namorada, amante ou esposa 
que ela é o centro de seu mundo. À maneira dele, é mesmo. Porém 
aquele olhar sedutor para as outras mulheres é mais que uma coisa 
passageira. Ele parece compelido a dar "cantadas" freqüentemente 
pueris em mulheres que não passam de meras conhecidas. E não é 
muito discreto em seus flertes. Não é raro esse homem querer falar-
lhe sobre seus desejos sexuais em relação a outras mulheres, como 
se não tivesse consciência de seu ciúme. Ele deseja abrir-se com 
você, como se você fosse sua irmã mais velha (ou, o que não é de 
espantar, sua mãe). 
Para compreender essa atitude, você precisa entender seu 
narcisismo. Sua necessidade de aceitação é tal que ele distorce a 
realidade, imaginando que vence todos os outros homens em 
erotismo, e que privar as outras mulheres do homem mais sexi do 
mundo é correr o risco de magoá-las. Sei que isto parece 
inacreditável, mas costuma ser bem real. O próximo capítulo analisa 
a complexidade dessa fantasia narcisista. 
 
 
 
 
 
8 
Narcisismo 
 
PETER: — Wendy, não se zangue. Eu sempre fico assim exultante 
quando estou satisfeito comigo mesmo. 
WENDY (para Peter): — Estranho que as histórias de de que você 
mais gosta são justamente as que falam sobre você mesmo. 
 
Imagine-se entrando numa sala cheia de espelhos. Em todas as 
direções em que olha, você vê seu reflexo. Inicialmente você sorri, 
satisfeita com as intermináveis visões de si própria. Começa a fazer 
algumas caretas engraçadas, no mínimo para avaliar quanto você é 
versátil. 
Por estar só, não há constrangimentos. Você se pergunta: "Sou 
bonita?" "Meu nariz é grande demais?" "Não estou engordando nos 
lugares errados?" Esta autocrítica serena parece natural e inócua. 
Impossível resistir à tentação de descobrir como os outros a vêem. 
Você deseja que os outros gostem de você; claro, isso facilita e colore 
mais a vida. 
Após alguns minutos nessa sala, você começa a sentir-sé pouco à 
vontade. Os espelhos voltam-se contra você. Eles a irritam. Não, 
você não é bonita. Sim, seu nariz é grande demais. Engordando nos 
lugares errados? Em todos os lugares! Em breve a mínima ruga em 
seu rosto assume proporções de maqui-lagem especial para filmes 
de terror. Que criatura é essa que está na sala pronta para atacá-la? 
Os espelhos parecem adquirir personalidade própria — uma 
personalidade hostil. Você se surpreende respondendo a 
ela, defendendo sua inteireza. Está ocupada demais, reagindo às 
críticas, para notar que essa personalidade é apenas uma outra 
dimensão de si mesma. Os espelhos tornam-se o ponto concêntrico 
 
de suas inseguranças. Quanto mais habituada estiver a mentir para 
si própria em relação a suas fraquezas, mais hostis e incansáveis 
serão os espelhos. 
Depois de lutar bastante com suas inseguranças, as falhas de seu 
caráter ficam tão evidentes quanto as de seu corpo. Sua baixa 
capacidade de afirmação é tão perceptível quanto os culotes extras 
em seus quadris. Seus conflitos sexuais são tão pronunciados 
quanto os pés-de-galinha ao redor de seus olhos. Você rememora a 
última atividade social de que participou, convencida de que os 
outros viram o que você vê agora. E fica preocupadíssima por ser 
tão transparente. 
Pode imaginar o que aconteceria se ficasse presa nessa sala de 
espelhos por dias, semanas ou até anos? Primeiro, você fecharia os 
olhos, cortando a visão de seus defeitos, já agora grotescos. Você 
tentaria bloquear a ligação com esse mundo onde cada falha sua é 
multiplicada por mil. Olhos bem cerrados, começaria a cantar com a 
finalidade de abafar as vozes de desaprovação e reafirmar sua 
presença. 
A negação acaba por não funcionar. Você está machucada, magoada 
e precisa achar um modo de lidar com essa personalidade hostil. 
Você anseia por um amigo, alguém que lhe diga que, apesar de 
todos os seus defeitos, você é legal. Mas não há ninguém ali. Só 
resta uma coisa a fazer: defender-se. 
Você abre os olhos. Mas, desta feita, em vez de esperar a 
personalidade hostil atacar, você ataca primeiro. Você utiliza seus 
registros de memória para construir fantasias opostas às acusações 
ouvidas. Você domina a situação projetando essas fantasias sobre o 
espelho. É como estar num cinema, forçada a assistir a um filme 
ruim. Com seu cérebro você modifica o filme a seu bel-prazer, e 
projeta sobre a tela a versão aceitável. 
Suas inseguranças cedem lugar às maravilhas. Agora você tem o 
nariz mais perfeito do mundo. Sua beleza é perturbadora. Nenhuma 
 
Miss Universo pode competir com suas medidas. Você se sente 
renovada por não sentir necessidade de ninguém que a faça sentir-
se melhor. Tudo o de que precisa para orientar suas projeções 
fantasiosas e, portanto, para garantir-se contra quaisquer ataques 
futuros, é a perfeição. Tudo o que saia de você para ser projetado 
nos espelhos deve ser perfeito. Só há um problema. Quando as 
portas se abrem, você não consegue sair da sala de espelhos. É 
prisioneira da perfeição. 
 
A BUSCA DA PERFEIÇÃO 
Peter Pan queria ouvir histórias sobre si mesmo para reforçar suas 
projeções de perfeição. Ele ignorava o fato de que Wendy, sem 
querer, aumentava seu problema. Peter perseguia a perfeição com 
zelo exagerado. Mas tinha de fazê-lo. A única alternativa seria 
enfrentar suas imensas inseguranças. Seu narcisismo protegia-o da 
solidão e do medo. Ele não podia abandoná-lo. 
O homem vítima da Síndrome de Peter Pan vive obcecado na busca 
da perfeição. Quanto mais intensa sua insegurança, mais vívidas 
suas reflexões críticas e maior sua necessidade de projetar perfeição. 
O ataque das inseguranças projetadas é exacerbado pela ausência de 
amigos íntimos e confidentes. Anos de ansiedade e solidão 
impedem-no de procurar amparo em pessoas que realmente gostem 
dele. Ele sacrifica o amor pela segurança oferecida pela perfeição. 
Ele persegue a perfeição com fervor compulsivo. Porém, dada sua 
insegurança básica, é incapaz de atingir a perfeição em qualquer 
forma socialmente aceitável. Compensa as grandes imperfeições 
permanecendo na sala de espelhos, enxergando o que deseja. Brota 
então um conjunto de traços narcisistas. Esses traços formam 
corredores de interligação dentro da sala de espelhos; cada um 
deles inicia-se como uma defesa contra a imperfeição, e distancia a 
 
vítima da realidade, trazendo-a de voltaao lugar onde se sente mais 
à vontade — cercada de imagens de perfeição. 
Eis os traços de narcisismo predominantes, tais como se manifestam 
na vítima da Síndrome de Peter Pan: 
Exploração. A vítima da SPP explora os amigos e conhecidos a fim 
de promover sua perfeição. Pode inclusive mudar seus valores com 
o propósito de se salientar. Faz, por exemplo, um convincente 
discurso sobre o valor da virgindade diante da mãe de uma garota 
que deseje conquistar. Uma hora depois enfeitiça a menina com sua 
teoria de que os jovens devem rebelar-se contra os opressivos 
preconceitos sexuais dos pais. A vítima da SPP tem pouco senso de 
lealdade, se é que tem algum. 
Fúria. Quando lhe é impossível fazer a realidade desaparecer, a 
supremacia de sua perfeição fica ameaçada. É aí que toda a sua 
doçura pode instantaneamente transformar-se em fúria. Se a 
exploração falha, ele se utiliza da fúria para intimidar quem quer 
que pretenda impor-lhe o domínio da realidade. O ataque de fúria é 
tão agudo e súbito que o outro fica paralisado. É como se alguém 
atingisse você com balas de material emocional. A maioria das 
pessoas recua, deixando-o dominar a situação. As únicas exceções 
são os valentões e outros indivíduos narcisistas. É por isso que as 
vítimas da SPP às vezes se metem em brigas. Em geral perdem, mas 
jamais admitirão isso. 
Sua fúria isola as pessoas de sua frágil auto-estima. Infelizmente, 
isola também o amor e o calor humano. A fúria é a barreira que 
mantém a vítima da SPP isolada de um contato íntimo com os 
outros. 
Ausência de culpa. O jovem vítima da SPP nunca se culpa de nada. 
Por mais insensato que seja seu comportamento ou malévolas suas 
intenções, ele joga sempre a responsabilidade sobre pessoas ou 
coisas das quais não teve controle. Se chega em casa tarde, é porque 
precisou levar vários amigos para casa. Se foi pego com maconha, é 
 
porque a estava guardando para um amigo. Se deixou a casa em 
desordem, é porque saiu para procurar emprego (que não achou). 
Se a namorada lhe deu o fora, é porque lhe contaram uma mentira 
sobre ele. Admitir culpa seria admitir imperfeição — coisa que 
simplesmente não pode fazer. 
Imprudência. Como não assume a responsabilidade de seus atos, a 
vítima da SPP tem uma incrível capacidade de se associar a 
pequenos acidentes. Objetos quebrados, livros perdidos, carros 
enguiçados e compromissos esquecidos perseguem-no como uma 
nuvem escura pairando-lhe sobre a cabeça. 
O mais frustrante é que a vítima não aprende com seus erros. 
Repete-os incessantemente. Visto que não tolera encarar os erros 
como falhas suas, nunca lhe ocorre fazer algo para evitar sua 
imprudência. 
Abuso de drogas. Vício muito comum nas vítimas da SPP. Apesar 
de sua busca de perfeição, ela não consegue atribuir-se nenhum 
valor. Isto a estimula a procurar algum alívio. Já que muitos de seus 
amigos se acham envolvidos com drogas, é fácil para a vítima 
entregar-se à "expansão da consciência" tipicamente associada ao 
abuso de drogas. O consumo excessivo de bebida alcoólica e de 
maconha torna-se um hábito. Em casos mais graves, a cocaína 
torna-se o veículo para alcançar a sensação de perfeição. 
Promiscuidade sexual. Nada alimenta mais o frágil ego da vítima 
da SPP do que os suspiros e gemidos das moças a quem seduziu 
sexualmente. Quanto maior o número de garotas em sua lista de 
conquistas sexuais, mais perfeito se julga. Tal como em relação aos 
demais, a vítima sente-se melhor se a garota se mantém 
emocionalmente distante. Ele não se desaponta se ela apenas finge 
excitamento e satisfação; aliás, sua atitude exploradora em geral 
impede-o de perceber o fingimento. 
 
AS RACHADURAS NOS ESPELHOS 
 
Tentei apresentar uma definição didática do narcisismo. Os pro-
fissionais da saúde mental raramente vêem este caso clássico. Ele 
não é muito comum. Uma pessoa com o grau de narcisismo descrito 
está muito mal; para ela o prognóstico é ruim. 
As vítimas da SPP experimentam um narcisismo muito menos 
grave. Os traços dos narcisistas não se combinam num todo tão 
destrutivo. Eles podem ser imprudentes, mas secretamente culpam-
se por vários de seus fracassos. Podem ter um ataque de fúria, 
porém seu senso de adequação leva-os a se desculparem. Podem ser 
exploradores, mas na realidade têm um ou dois amigos de verdade. 
Ocasionalmente ocorre-lhes que seu pensamento é mágico e que 
não são tão perfeitos quanto fingem ser. E os que são sexualmente 
ativos geralmente encontram uma mulher que os ama 
verdadeiramente. A ternura toca-lhes o coração, e pode constituir-se 
o estímulo necessário para enfrentarem suas imperfeições e saírem 
da sala de espelhos. 
Portanto, a fim de melhor compreender como o narcisismo se 
enquadra no arcabouço desenvolvimental da Síndrome de Peter 
Pan, imagine que os espelhos da sala onde se encontra a vítima da 
SPP estão rachados. A realidade escoa-se para dentro da sala, 
oferecendo-lhe uma oportunidade de fuga. 
IDADE PICO: 19 A 20 ANOS 
Você já deve ter notado que os sintomas componentes da SPP não 
surgem em períodos de idade pré-selecionados, como se 
determinados por algum relógio biológico ou psicológico. Eles se 
acham mesclados, realimentando-se uns aos outros. O narcisismo é 
um dos dois sintomas intermediários (o outro é o chauvinismo) 
resultantes da interação de problemas mais fundamentais (ver o 
diagrama na pág. 51). Embora o germe do narcisismo apareça no 
início da vida, demora para se desenvolver. Considerando-se que o 
narcisismo depende tanto de outros fatores, há esperança de poder-
se frustrar seu crescimento. 
 
O germe do narcisismo ganha vida quando a exigente criança de 
dois anos de idade obtém tudo o que quer, como quer. Se os pais se 
submetem, sua atitude indulgente tira à criança a oportunidade de 
aprender a lidar com suas imperfeições num meio seguro. Se a 
criança atinge a puberdade com a mesma atitude dos pais e os 
quatro alicerces da SPP — irresponsabilidade, ansiedade, solidão e 
conflito referente ao papel sexual — continuam operando, o 
narcisismo pode acabar florescendo. 
Se essas condições mantêm-se intocadas ou inalteradas, o 
narcisismo alcança seu pico aos dezenove ou vinte anos de idade do 
jovem. É a época em que a transição da adolescência para a idade 
adulta leva o jovem a uma aguda conscientização de suas 
imperfeições. Se ele assumir o controle de sua vida, aceitar suas 
limitações e aprender com seus erros, poderá "curar-se" da 
Síndrome de Peter Pan e amadurecer. Se negar suas limitações e 
continuar perseguindo a perfeição, estará dando um gigantesco 
passo em direção a uma "prisão em vida" cujas grades são suas 
próprias inseguranças. 
 
DOIS NARCISISTAS 
O narcisismo não é um flerte inócuo com o pó mágico da Terra do 
Nunca. Na Síndrome de Peter Pan ele representa um perigoso 
desvio da realidade. O pensamento racional e a sensatez cedem 
lugar a processos de pensamentos ilógicos e até bizarros. 
A vítima da SPP utiliza sua inteligência para criar um sistema de 
idéias e opiniões impermeáveis à crítica. Indepencientemente da 
instrução, da experiência ou dos diplomas, é impossível ganhar 
uma discussão com esse narcisista. Ele funciona a partir de 
premissas errôneas que jamais você entenderá. E se você apreende e 
questiona sua primeira premissa, ele simplesmente a modifica. Se 
você lhe apontar essa manobra, ele o dominará com a ameaça de um 
iminente ataque de fúria. 
 
Seguem-se relatos de três jovens, vítimas da SPP, engajados na 
busca da perfeição. O pânico emocional e a inflexibilidade quanto a 
papéis descritos em capítulos anteriores ocultavam-se sob um 
narcisismo caracterizado por uma concepção (errônea) básica. Casos 
aparentemente perdidos — mas felizmente havia rachaduras em 
seus espelhos. Se assim não fosse, esses jovens jamais teriam vindo a 
meu consultório. 
 
Denny 
— O Senhor é meu pastor. 
Mesmo quevocê seja uma pessoa profundamente religiosa, haverá 
de convir que o trecho inicial do Salmo 23 é uma resposta bizarra à 
minha pergunta: — O que o trouxe aqui? 
Esta resposta, vinda deste jovem especificamente, pegou-me de 
surpresa. Eu conhecia seus pais: eram boas pessoas e haviam feito o 
melhor possível para criar seus três filhos. Aquele rapaz sentado à 
minha frente, recusando-se a relaxar, apesar de estar semi-enterrado 
numa enorme poltrona, era o primogênito. Seu nome era Denny. 
Denny era um jovem alto e bonito, com cabelos crespos escuros, 
boas maneiras e um sorriso que significava: "Gosto de você". 
Contava dezenove anos e ia passar para o segundo ano numa 
grande universidade estadual, onde era aplaudido por seu talento 
dramático. Seus pais haviam contado que ele tivera dificuldade em 
se adaptar à faculdade, porém conseguira médias boas e estava 
ansioso por voltar à universidade. 
Então por que a citação bíblica em resposta a uma pergunta 
estereotipada? Tratava-se de uma reação simultaneamente 
defensiva e hostil; a menos que ele estivesse louco, e eu sabia que 
não estava. Concluí que ele estava assustado e zangado e, por vias 
indiretas, avisando-me de que não iria se comunicar comigo. 
Ignorei sua resposta inicial, inclusive porque, de qualquer maneira, 
não me levaria a nada. Prossegui tentando obter dados. 
 
Denny viera procurar-me porque sua mãe achava que eu poderia 
ajudá-lo. 
— Ajudar em quê? — Ele não sabia. Provavelmente essa ajuda tinha 
a ver com as mudanças pelas quais ele havia passado no último ano. 
— Que mudanças? — Ele encontrara Deus e a graça divina de Jesus 
Cristo, mas seus país nunca o entenderiam. 
O que queria dizer com "encontrar"? Esta pergunta provocou nele 
um instante de ódio, mas ele usou seu sorriso gélido e dirigiu-me 
um olhar de "pobre alma desgarrada", enquanto reprimia 
rapidamente suas emoções. Não resistia ao esclarecimento de sua 
recém-descoberta consciência transcendental. Reuniu retalhos de 
teologia e remotos conceitos de metafísica e de epistemologia num 
aglomerado rotulado de tranqüilidade espiritual — uma salada 
mista cerebral sem qualquer sentido. 
Eu o interrompi após uns cinco minutos de dissertação desconexa 
para recomeçar algo parecido com um diálogo construtivo. 
Quando encontrou Jesus? Mais ou menos ao meio do primeiro ano 
da faculdade. Retomou a dissertação. Eu o interrompi 
imediatamente. 
Em sua opinião, por que Deus escolhera essa época em particular 
para ungi-lo com o Espírito Santo? Não sabia, porém chegara a 
várias hipóteses relativas ao modo pelo qual Deus o conscientizará 
de que o que consideramos realidade não é verdadeiramente real. A 
verdadeira realidade é representada por uma vida posterior no Céu 
ou no Inferno. 
— Um momento — disse eu. — Este não é o mundo real? — De 
modo algum — replicou. — O que nós humanos somos neste 
momento do tempo é uma miragem. Este é um campo de testes 
para Deus e o demônio nos avaliarem e decidirem quem fica com 
quem na próxima vida. 
—Parece que Deus está jogando na loteria — respondi. Desta vez 
ele não ocultou sua raiva. — Você é como todos 
 
os outros. Destruidores da fé. Vocês tentam confundir os crentes, 
afogando-nos em sua decadência e pecados carnais. Bem, em minha 
alma você não vai tocar. É difícil discriminar Deus de Satã; mas eu 
sei, no meu íntimo, eu sei quem é quem. 
Continuou a misturar confusas idéias teológicas. Suas verbalizações 
careciam de sentido. Porém sua comunicação não-verbal fazia 
muito sentido. Enquanto despejava tolices cognitivas, esfregava o 
rosto com movimentos circulares, rodando, rodando, sem jamais 
cobrir os olhos nem o nariz. Apenas o resto do rosto. 
— Por que você está esfregando o rosto? 
— É só um costume — foi a resposta. Não a aceitei. 
— De que você está se escondendo? Parece que não gosta do rosto 
que Deus lhe deu neste mundo irreal, não? 
Acertei na mosca. 
— Você gostaria? Hein? Espinhas por todo lado! É feio! Vi lágrimas 
em seus olhos. 
— As pessoas talvez não percebam como é feio. Mas eu sei. Eu bem 
sei como meu rosto é feio. 
— Que pessoas? 
— Ah, pessoas. Gente, pessoas. 
— Pessoas. Acho que sei quem são essas pessoas. Você quer dizer 
garotas, não é? 
Corou momentaneamente. 
— É, talvez. 
Ele gostava de garotas? Ficou mais vermelho. 
— É, gosto. 
Vendo as rachaduras em suas defesas, avancei no interrogatório 
focalizando as garotas. Não demorou muito em confiar-me sua dor. 
Ele gostava de garotas e desejava satisfação sexual, mas temia a 
rejeição. Suas ricas fantasias e o medo de inadequação social 
levavam-no ao que ele considerava um excesso de masturbações 
(média de duas por dia). Tentara uma relação sexual com uma 
garota, porém tivera ejaculação precoce, sem conseguir a 
 
penetração. Condenava-se por haver tentado, mas condenava-se 
também por haver falhado. Aliás, ele se condenava por quase tudo 
o que fazia. 
Ele se condenava por estar na faculdade sem saber por que, pois 
não estudava, desperdiçava o dinheiro dos pais, fumava maconha e 
era virgem. Para suportar o sentimento de culpa, escondia-se no 
interior da sala de espelhos (narcisismo). Porém, quanto mais se 
olhava nos espelhos, mais feio se via. Seus traços faciais refletiam a 
feiúra de sua alma. As declarações religiosas eram o sortilégio a que 
recorria para salvar-se da incessante autocondenação. 
Denny e eu analisamos essa complexa mistura de explicações 
psicológicas, recolocando os fatos em sua perspectiva real. Quando 
ele voltou à cidade onde estudava, já estava persuadido de que seu 
medo à rejeição lhe impedia a autocompreensão e um futuro 
crescimento. Seus objetivos incluíam aceitar o fato de que a 
masturbação e a virgindade não são anormais, melhorar seus 
hábitos de estudo e convidar as garotas para sair sem se obrigar a 
ter relações sexuais. À medida que íamos discutindo essas coisas, 
sua preocupação com o pecado diminuiu, bem como suas confusões 
metafísicas. 
Na última vez em que tive notícias de Denny, ele estava muito 
contente com a vida. Estava para formar-se e começar um curso de 
pós-graduação. Parece que conseguira escapar ao opressivo 
narcisismo e achara afinal seu lugar no mundo real. 
Jerry 
— Como é que um cara como você tem antecedentes como estes? 
Furto, roubo, invasão de propriedade e outras demonstrações de 
conduta desordeira. E essas são apenas algumas das "façanhas" que 
deram motivo à prisão de Jerry. Só Deus sabe o que mais ele havia 
feito. 
Como é que este esforçado ladrão de dezenove anos podia ser um 
narcisista e uma vítima da SPP? Demorou um pouco para eu 
 
descobrir. Por que estava ele dando-se ao trabalho de falar com um 
psicólogo? A resposta era simples: a mãe o mandara. Ele ainda fazia 
o que a mãe mandava; com relutância, mas fazia. Afinal de contas, 
era ela quem resolvia seus problemas. Ela o tirara da prisão mais 
vezes do que ele podia lembrar-se. O mínimo que podia fazer por 
ela era atender a seu pedido e procurar-me. Isso não o preocupava. 
Não ia mesmo dizer nada. . . 
Jerry já fora a vários colegas meus. Psiquiatras, psicólogos, 
assistentes sociais, orientadores pedagógicos e até ministros 
religiosos. Ele conhecia todo o jargão desses especialistas e ma-
nipulava-o melhor que muita gente com o dobro de sua idade. 
Mas acho que não estava preparado para me enfrentar. Porque 
assim que notei seu narcisismo, levantei a hipótese de ele ser vítima 
da Síndrome de Peter Pan. Com este diagnóstico eu estava um 
passo à sua frente. 
Para compreender o narcisismo de Jerry você precisa rememorar a 
última vez em que viu uma criança de dois anos brincando de 
esconde-esconde. Alguém conta até dez e o garotinho corre para 
trás do sofá. Um momento depois ouve-se uma risadinha, e uma 
olhadela a seus pés mal escondidos revela seu esconderijo. 
A criança fica perplexa por ter sido descoberta tão rapidamente. 
Talvez atéproteste: "Não vale, você olhou!" 
O aborrecimento dessa criança esclarece a natureza do narcisismo 
de Jerry. Por não ver você a criança crê que você não a vê. O que os seus 
olhos viam — as costas do sofá — é o que ela acredita que você viu 
— somente o sofá. Nunca passou por sua cabecinha existir algo 
mais do que aquilo que seus olhos percebiam. E em sua excitação 
passou-lhe despercebida sua própria risada, de modo que não tinha 
razão nenhuma para imaginar que lhe dera a "dica" de sua 
localização. Assim, só podia concluir que fora enganada. 
Esta interpretação me ocorreu pelo exame da história das prisões de 
Jerry; ele fora apanhado mais vezes do que se poderia esperar. 
 
Concorreu também para essa minha conclusão o fato de que a única 
emoção real expressa por Jerry era a raiva por ter sido apanhado. — 
Acho que os tiras gostam de me encher — foi sua explicação para o 
grande número de prisões. 
Jerry fez o máximo para me deslumbrar com seu suposto 
autoconhecimento e, assim, tentar enrolar-me. Não conseguiu. 
Quando me disse: — Preciso arrumar um emprego para retribuir à 
minha mãe tudo o que ela fez por mim — simplesmente concordei. 
Ao jurar que eu era o melhor conselheiro com quem já conversara 
(depois de quinze minutos), calmamente mostrei duvidar disso. 
Vendo que eu não reagia do modo como ele esperava, ficou nervoso 
e eu fiz-lhe notar que ele estava descontrolado. Isso só o enervou 
ainda mais. Irritado, disse-me que eu não o estava ajudando. 
Retruquei: 
— É claro que não. Você não quer ajuda; você só está aqui porque 
não quer que sua mãe fique zangada. 
Então ele se enfureceu. E através da raiva surgiu a verdade. 
— Você me acha um preguiçoso, não é? Não reagi. 
— Você acha que eu gosto de enganar as pessoas, né? Silêncio. 
— Você acha que eu estou procurando a saída mais fácil, certo? 
Permaneci calado. 
— Ei, você não vai dizer nada? Você não está parecendo médico. 
Finalmente enfrentei-o. 
— Para você eu não sou médico. Você só está tentando me 
enrolar, como faz com todo mundo. E eu simplesmente não vou 
permitir isso. Você acabou de me dizer que está procurando a saída 
mais fácil. Aqui isso não vai funcionar. 
Ele jogou a cabeça para trás, respirou profundamente e, acreditem 
ou não, relaxou. 
— Como é que você ficou tão esperto em tão pouco tempo? 
 
— Você não desiste facilmente, não é? Agora me vem com o jogo 
"vamos dizer ao doutor como ele é ótimo". É só isso que você sabe 
fazer: joguinhos e manipulações? 
— É tudo que eu sempre fiz. Devo ser bom nisso. Sua franqueza era 
também pueril, mas reanimadora. 
— Você realmente gosta disso? — perguntei. — De enganar todo 
mundo com esses truquezinhos e brincadeiras? 
— Ajuda a ir levando até "pintar" coisa melhor. 
— E quando vai ser isso? 
— Quando eu achar alguma coisa que eu goste mais do que o que 
eu já tenho. 
Não pude resistir à tentação. Como calculei que Jerry não marcaria 
outra consulta, arrisquei dizer-lhe do que eu achava que ele estava 
se escondendo e o que poderia fazer para que algo melhor 
"pintasse". Falei-lhe sobre a vida que, em minha opinião, ele estava 
tendo como vítima da Síndrome de Peter Pan. 
Fui bem direto. Ele saíra detrás do sofá; antes que corresse a se 
esconder em outro lugar, despejei tudo. 
— Você é o filho mais velho e seus pais ainda estão casados. Seus 
testes de QI indicaram que você tem uma inteligência acima da 
média, mas para você a escola é uma chatice. Você gosta muito de 
garotas mas ainda é virgem, coisa que o envergonha muito. Não 
consegue ficar empregado em lugar nenhum, e preferiria divertir-se 
e tomar cerveja a respirar, se tivesse que escolher. Nunca teve 
intimidade com seu pai e não suporta sua mãe, mas morre de medo 
de dizer isso a ela. Você acha que tem um monte de amigos, mas 
sabe muito bem que isso é mentira. Você não tem um só amigo de 
verdade, e passa horas e horas evitando sentir-se só. A única coisa 
de que ainda pode se orgulhar é sua capacidade de roubar; mas 
nem nisso você é bom. Você se esconde de toda essa confusão 
fingindo não ligar para nada. Bem que você gostaria de ser frio e 
 
calculista, mas não é. Você é um menininho perdido querendo que 
alguém te ame. 
Ele ficou imóvel. Pensei que talvez tivesse sido duro demais com 
ele. Antes de começar a me apiedar dele, soltou um suspiro de 
alívio. 
— Puxa, é bom ver que alguém me "saca" como eu sou. Como é que 
você adivinhou tudo isso? 
Evitei alguma possível armadilha contornando a pergunta. 
— Isso não importa. Só a verdade importa. Com ela você pode 
começar a construir algo melhor para si mesmo. 
— Você vai me ajudar? Essa pergunta soou autêntica. 
— Vou, mas só se você demonstrar que está firme no propósito de 
achar algo melhor. 
— Por onde começo? 
— Voltando aqui na próxima semana. 
Jerry voltou na semana seguinte, e na outra. Discutimos suas falhas 
em comunicar seus sentimentos e necessidades, assim como a 
necessidade de ser ajudado com relação à escola, ao trabalho e ao 
uso do dinheiro. Durante nossas conversas eu repetia que ele teria 
de provar seu desejo de mudar, mudando realmente. Ele concordou. 
Jerry parou de vir após a quarta sessão. Conseguira um emprego e 
usou isso como desculpa para interromper o tratamento. Não tenho 
notícias dele há algum tempo. Seus pais não telefonaram mais, pelo 
que suponho que ao menos não se meteu em confusões 
recentemente. 
Gostaria de poder afirmar que ele escapou definitivamente da Terra 
do Nunca. Porém, depois de árdua batalha contra a Síndrome de 
Peter Pan, preciso ver para crer. 
 
 
 
9 
Chauvinismo 
 
PETER: — Wendy, uma menina vale mais que vinte meninos. 
PETER: — Não, você não deve tocar (Wendy); não seria muito 
respeitoso. 
MÃE DE WENDY: — Mas Peter, eu vou deixar (Wendy) ir passar com 
você uma vez por ano, durante uma semana, para fazer a faxina da 
primavera. 
 
 
Ponha-a sobre um pedestal. Venere-a: é uma deusa. Mas garanta 
que ela limpe a casa e prepare as refeições. Ela vale mais que vinte 
homens e não é possível, ao mesmo tempo, tocá-la e respeitá-la. 
Todavia, a vida para ela começa e termina com um vaso sanitário 
limpo e um prato de arroz soltinho. 
Esta espécie de incoerência acabou com o movimento feminista, 
certo? Errado! O chauvinismo está vivo e passa bem. As evidências 
disso são freqüentes em nossa vida diária. Os meios de 
comunicação de massa refletem papéis sociais sexistas. O 
pagamento desigual por um trabalho igual persiste. A voz do 
chauvinismo é claramente audível nos bares, clubes ou em qualquer 
lugar onde três ou quatro homens se reúnam para fingir não terem 
sentimentos, fraquezas nem dúvidas em relação a si próprios. 
Sou testemunha de comportamentos e atitudes chauvinistas em 
meu consultório o tempo todo. Elas minam a interação familiar. 
Impedem o crescimento no casamento. Acima de tudo, sao um 
péssimo exemplo para as crianças. E as crianças seguem o exemplo, 
especialmente os meninos; mais ainda os meninos que buscam uma 
maneira de evitar o amadurecimento. 
 
A vítima da SPP exibe um chauvinismo um pouco modificado, 
geralmente mais sutil e camuflado. Muitas vezes não se nota sua 
presença até que sejam percebidos seus efeitos negativos. Recordo-
me de um jovem que dizia ter um relacionamento terno, caloroso e 
pleno de respeito com sua namorada. Tentou convencer-me de que 
era o grande defensor da igualdade entre os sexos. Em meu 
ceticismo pedi que explicasse o que entendia por igualdade. Falou-
me sobre os momentos maravilhosos passados com ela. Ela gostava 
dele, compreendia-o e lhe dava apoio. Era manifesta a ausência de 
reciprocidade por parte dele. Obviamente se deixava embalar pelo 
nascisismo ao afirmar: "Ela não precisa dizer-me o que deseja, eu 
sempre sei. E lhe dou". 
O chauvinismo da SPP é, sob vários aspectos, mais perigoso que o 
outro de tipo comum. Neste, o sujeito não esconde o fatode crer na 
existência de dois conjuntos de regras — um para os homens, outro 
para as mulheres. Não tenho pena da mulher que se envolve com 
esta espécie de chauvinista. A culpa é dela. Ele é sincero em suas 
idéias sexistas, dando-lhe todos os indícios de que deve manter-se 
afastada. Qualquer mulher que "ame" este homem obviamente 
carece de orgulho próprio suficiente para exigir um relacionamento 
no qual ela não seja tratada apenas como uma pessoa de segunda 
classe. 
A vítima da SPP, por seu turno, é mestra no logro. Ela pode até 
dizer que acredita num relacionamento igualitário entre os homens 
e as mulheres. Mais ainda, ela pode até acreditar nisso por algum 
tempo. No início do relacionamento é mesmo possível que a ponha 
em prática preparando o jantar, ajudando a esposa a limpar a casa e 
fazendo o supermercado. No encantamento de um novo amor, 
muitas mulheres interpretam esses atos de gentileza como 
demonstrações de uma postura não-sexista. O verdadeiro teste vem 
quando a mulher tem algum problema ou enfrenta uma situação 
emocionalmente difícil. É aí que o chauvinista da SPP se revela. 
 
Se você tem um relacionamento íntimo com um homem vítima da 
SPP, atente para estes sinais de chauvinismo (é claro que sua 
ocorrência se dá em graus variáveis). Se você tem um problema, ele 
imediatamente o assume como problema dele e lhe diz o que fazer, 
ou simplesmente o faz por você. Por exemplo, digamos que numa 
festa um homem a paquere. Seu homem resolverá o problema para 
você, providenciando para que o outro não a importune mais. Em 
resumo, à vítima da SPP é praticamente impossível deixar a 
namorada ou a esposa tentar, ela mesma, resolver o próprio 
problema. 
Outro indicador do chauvinismo da SPP tem lugar quando você não 
está bem emocionalmente. Isso provoca reações imprevisíveis, e até 
absurdas, em seu companheiro. Ele se irrita com você por ser 
"emocional demais" e, rotulando seu mal-estar de tolice, exige que o 
afaste de imediato. Muitas mulheres reprimem suas emoções 
perante os companheiros apenas para garantir a "paz" com eles. 
O chauvinismo é ponto-chave na questão da "maturidade" da 
vítima da SPP, por uma série de razões. 
Reduz o abismo entre o jovem e seu pai. Ele segue o exemplo do 
pai, supondo que assim o pai o amará. Considera-se um "homem de 
verdade", e acredita que um dia o pai o admirará por isso. 
Serve como justificativa de sua raiva e de seu sentimento de culpa 
em relação à mãe. Seu chauvinismo permite-lhe encarar as 
reclamações da mãe apenas como parte desagradável, mas normal, 
da natureza feminina. 
Silencia a constante dúvida associada à sua sexualidade. O jovem 
conclui que suas inadequações sexuais na realidade são culpa da 
garota. É ela quem tem conflitos sexuais, não ele. E acredita que as 
mulheres tiram proveito de sua generosidade e solicitude. Isto 
aumenta ainda mais sua insensibilidade. 
Fortalece sua relação com outros homens porque isso define sua 
masculinidade. Também lhe oferece a possibilidade de encontrar 
 
trabalho no "mundo masculino", onde seus problemas com as 
mulheres são igualmente vivenciados pelo chefe e colegas. 
Por fim, e talvez seja este o ponto fundamental, o chauvinismo é o 
meio empregado pela vítima da SPP para fingir-se adulto. É o fator 
que gera uma aparente consistência em sua vida de fingimento e 
negação. Juntos, o narcisismo e o chauvinismo proporcionam-lhe 
uma atitude de serviço, fundada na auto-ilusão. Então seus 
preconceitos se transformam em sabedoria, sua rigidez em 
compreensão, sua frieza em empatia. 
É incrível como um menino meigo e sensível pode transformar-se 
numa criatura tão desprezível, em termos sociais. Aliás, quanto 
mais sensível tenha sido a criança, tanto mais firmemente enraizado 
se forma o chauvinismo na idade adulta. Isto não deve surpreender 
ninguém. Quando se chega ao conhecimento da insegurança 
emocional associada à solidão e ao conflito sexual, e se compreende 
como o narcisismo permite à vítima justificar suas limitações, 
conclui-se que a emergência do chauvinismo como sintoma final da 
SPP faz sentido. É o resultado lógico, conquanto irracional, de uma 
luta empreendida durante a maior parte da vida. 
Quero esclarecer um ponto relacionado a esse chauvinismo: essa 
atitude sexista não consiste tanto num ataque às mulheres como 
numa defesa contra a rejeição. É uma mentira a mais na longa lista 
de mentiras engendradas pela vítima com o fim de sentir-se 
aprovado em seu modo de viver. O que se pode esperar é que, em 
algum ponto subjacente à negação e às projeções, exista uma pessoa 
cônscia de que, embora seu corpo haja chegado à cabeceira da mesa, 
sua mente ainda permanece no jardim de infância. 
IDADE PICO: 21 A 22 ANOS 
Demora para o chauvinismo tornar-se parte da vida cotidiana da 
vítima. O aspecto positivo deste fato é que seus entes queridos 
dispõem de anos para identificar o sexismo e confrontá-lo. Ele não 
surge de súbito para ficar. 
 
Apesar da dificuldade para definir um período de pico para os 
sintomas da irresponsabilidade, ansiedade e solidão, é relati-
vamente seguro afirmar-se que o chauvinismo geralmente aparece 
logo após os vinte anos de idade. Escolhi 21-22 anos como o período 
de pico, por diversas razões. 
Em primeiro lugar, a sociedade designou a idade de 21 anos como a 
"maioridade" oficial. Tendo alcançado essa idade, espera-se do 
jovem um comportamento adulto. Se ele é vítima da SPP, faltam-lhe 
as habilidades de adulto e necessita de um sistema de camuflagem 
de suas deficiências. O chauvinismo lhe propicia essa máscara. 
Em segundo lugar, a vítima deseja livrar-se do grande sofrimento 
há tanto tempo experimentado. O chauvinismo permite-lhe 
apaziguar sua dor, imputando a outros, especialmente às mulheres, 
a culpa. 
Finalmente, o bem-sucedido desabrochar do narcisismo, um ou dois 
anos antes, leva-o ao chauvinismo. Os dois costumam caminhar 
juntos. Dada a projeção de suas inseguranças sobre outras pessoas, 
segue-se como conseqüência um culto irracional de sua 
masculinidade. 
NÃO FOI COM ESTE HOMEM QUE EU CASEI 
O ar de Jennifer sugeria extremo sentimento de culpa — olhos no 
chão, cabeça baixa, voz também. 
— Eu não devia ter vindo — disse. — Estou com raiva de mim por 
não conseguir resolver isso. Não devia precisar falar com alguém 
sobre isso. 
— Que tal você me contar o que há de errado? — respondi. 
— Sou eu. 
Seus olhos cravaram-se no nada. 
— Não estou conseguindo adaptar-me à vida de casada. Permaneci 
em silêncio, e ela continuou. 
— Estou triste e decepcionada. Estou me tornando uma chata. 
— Como assim? 
 
— Pareço estar sempre chorando ou reclamando. Acuso Mark — 
meu marido — de não me amar, de ficar trabalhando para estar 
longe de mim, de gostar mais dos amigos do que de mim. . . Não é 
terrível? 
— Por que terrível? 
— Estou arruinando meu casamento. Só estamos casados há dez 
meses, e já estou destruindo todos os meus sonhos. Não quero me 
divorciar. 
— O que a faz pensar em divórcio? 
— Mark não quer mais ficar comigo, e não posso dizer que esteja 
errado. Ele trabalha muito e precisa de tempo para relaxar. Mas eu 
quase não o vejo. Quando lhe digo como me sinto, ele fala que sou 
ciumenta. Peço-lhe para passar mais tempo comigo, e ele responde 
que tem de trabalhar para que possamos ter nossa família. 
Mas eu ainda não quero filhos. Quero terminar meu último 
semestre de faculdade, arranjar um emprego melhor e me adaptar à 
vida de casada antes de ter filhos. Mark afirma que serei mais feliz 
quando tiver filhos e ficar em casa. Eu digo que não quero ser dona-
de-casa, mas ele responde que esposa dele não vai trabalhar até os 
filhos terminarem o primário. Digo-lhe que não quero ficar presa 
em casa pelos próximos quinze anos, e ele me acusa de estar 
faltando com minha palavra de instituir uma família. 
— Pelo jeito, ele já planejou toda a sua vidapor você — disse. 
— O que você quer dizer com isso? — perguntou ela. 
— Bem, ele determina o que você vai fazer, como vai fazer e 
promete que será feliz fazendo isso. E não dá ouvidos ao que você 
quer. 
— Ele só está tentando ajudar. Novamente silenciei. 
— Mark diz que eu jamais conseguiria viver do meu salário. Afirma 
que meu dinheiro não faz muita diferença. E é bem verdade que eu 
não ganho tanto quanto ele. Acho que eu só gostaria que ele 
colocasse isso de outra maneira. 
— Isso é uma opinião sua ou dele? 
 
— Bem, Mark diz. . . 
Não dava para eu continuar em silêncio. 
— Você nunca se cansa desse "Mark diz"? 
— Mas "pera" aí, ele é um cara maravilhoso. E inteligente. 
— Tudo bem, acredito. Mas isso não significa que tudo que dá 
errado em seu casamento seja por falha sua. Mark está sempre certo 
e você sempre errada? 
— Bom, é o que parece. Ele mudou e eu reclamo o tempo todo. Aí 
ele se afasta de mim, e isso me deixa mais infeliz, e aí eu reclamo 
mais. 
— Quer dizer que você provocou essa mudança? Você está dizendo 
que Mark não pensa por si próprio; é totalmente dependente do seu 
comportamento e você precisa protegê-lo como se ele fosse seu 
filho, e não seu marido. 
— Essa afirmação é muito dura, não é? — comentou Jennifer. 
— Talvez, mas você precisa ouvir a verdade. Não é verdade que 
você está tentando proteger o Mark de si mesma? 
— Acho que se pode dizer isso. 
— Isso o faz um fraco. Ele é tão fraco assim? 
— De jeito nenhum. Quando o conheci ele era expansivo e 
independente. Ele nunca se preocupava com o trabalho; nós nos 
divertíamos o tempo todo. Minha família até achava que ele jamais 
teria sucesso por ser tão preguiçoso. Mas nós nos divertíamos. Ele 
podia ser um pouco imaturo, mas não fraco. 
— Ou. . . — Fiz uma pausa para chamar-lhe mais a atenção para o 
seguinte: — Ou você na época não enxergou os problemas dele 
porque era tão imatura quanto ele? 
— Pode ser — admitiu. 
— E agora você está crescendo e ele não. Jennifer pareceu assustar-
se com as implicações. 
— Não me entenda mal. Ele é um homem maravilhoso. Ele trabalha 
muito e me dá tudo o que quero. 
 
— Tudo? 
Estendeu a mão para a caixa de lenços de papel que estava sobre a 
mesinha, e usou um deles para enxugar as lágrimas que lhe 
assomaram aos olhos. — Bem, não exatamente. Mas ele é tão bom 
para mim. 
— É mesmo? 
Ela ficou em silêncio. Seu choro intensificou-se. 
— Parece que você tem medo de criticar Mark. Por acaso ele é 
alguma espécie de deus da perfeição? 
— De jeito nenhum! Às vezes ele é um pé no saco. 
— Fale-me sobre esse lado do Mark. 
— Bem, ele mudou muito. Trabalha feito um idiota — umas oitenta 
a noventa horas por semana — e queixa-se dos que não trabalham 
tanto. E essa é a mesma pessoa que largou a faculdade porque não 
gostava de levantar cedo para as aulas da manhã. Passa a maior 
parte do tempo livre bebendo cerveja com os amigos. Antes, ele 
nunca teve amigos de verdade, e agora parece que não consegue 
viver sem eles. Ele sempre me dizia que eu era sua única amiga de 
verdade. E agora, quando saímos, temos de ir sempre àquele 
barzinho asqueroso, aonde vão seus velhos amigos, barulhentos e 
mal-educados. Ele fica rindo e bebendo com eles e me ignora. 
E ele é cruel. As coisas que diz sobre as pessoas são horríveis. Na 
firma onde Mark trabalha há duas senhoras consideradas como 
chefonas — são responsáveis pela contabilidade, serviços de 
secretaria, seleção do pessoal, esse tipo de coisas. E são muito 
conservadoras. Bem, outro dia Mark e os amigos estavam no bar 
falando coisas terríveis sobre elas, e Mark gritou: "Porra, o que 
aquelas vacas precisam é de um bom cacete". Fiquei estarrecida. 
Mark não falava desse jeito antes. Silêncio. Deixei que ela 
assimilasse suas próprias palavras. 
— É, ele mudou. 
— Mas você assumiu a culpa disso. 
 
— Bom, eu realmente fiz algumas coisas erradas, como ficar 
reclamando, por exemplo. 
— Está bem. Você cometeu alguns erros. Quer dizer que é humana. 
Mas parece-me que seu maior erro é assumir a responsabilidade 
pelos problemas de Mark. 
— Você pode nos ajudar? — suplicou. — Não quero que meu 
casamento acabe. Eu o amo. De verdade. 
— Posso ajudar você, mas não dá para ajudar Mark nem a seu 
casamento, se Mark não vier aqui. 
— Ele disse que vir aqui é perda de tempo e dinheiro. 
— E o que você acha? 
— Não será desperdício nenhum se ajudar nosso casamento. 
— Será que ele virá? 
— Acho que se eu o pressionar, ele virá. Vai ficar cheio, e então virá. 
— E assim que você consegue que ele faça as coisas para você? 
— É, mas nem sempre dá certo. Por exemplo, há muito eu lhe vinha 
pedindo para viajarmos em algum fim-de-semana prolongado, só 
nós dois, e estávamos planejando sair no último fim-de-semana. E o 
que ele fez? Convidou dois dos amigos para irem junto. E só me 
contou na última hora. Acabei passando o fim-de-semana 
conversando com as duas esposas, enquanto Mark e os amigos 
jogavam e bebiam. Odiei-o por isso. O ódio me assustou. Foi por 
isso que me decidi a vir aqui. Não quero odiar meu marido. 
— Você acha que ele virá falar comigo? 
— Virá, sim. Pelo menos uma vez. Ele provavelmente lhe dirá que 
não teríamos nenhum problema se eu parasse de reclamar. 
— Você conseguiria parar? 
— Talvez. Mas aí não obteria nada do que quero. 
— Você gosta realmente de obter o que deseja dessa forma? 
— Eu não estaria aqui se gostasse. 
Ela mesma conseguira chegar à conclusão óbvia. 
 
— Então não há nada a perder, a não ser conflitos desnecessários — 
disse. — Se você parar de reclamar, Mark terá de encarar seus 
próprios problemas. 
— Então que devo fazer? 
— Bem, pare de agir como mãe dele, pare de culpar-se pelos 
problemas dele, e pare de reforçar aquele seu chauvinismo 
machista. 
— O quê? — Jennifer ficou perplexa. — Nunca achei Mark 
chauvinista. 
— Talvez antes ele não o demonstrasse. Mas como é que se pode 
rotular isso senão como chauvinismo? Ele estabelece duplos 
padrões de conduta, mostra-se insensível, e faz comentários sexistas 
e cruéis. Define o papel de você em seu relacionamento, torna-se 
escravo do trabalho para provar sua superioridade, e praticamente 
confina você à casa enquanto fica jurando fidelidade eterna aos 
companheiros de bebedeira. 
— Puxa, isso tudo soa terrivelmente! 
— Não deixo de perceber os aspectos positivos de Mark, embora 
ainda não o conheça pessoalmente. Porém não gosto de 
chauvinismo, e tenho uma forma agressiva de lidar com ele. Se 
Mark for capaz de me ouvir por um momento, enxergará seu 
chauvinismo e o abandonará antes que piore. E você pode ajudar. 
— Eu? 
— Sim. Pare de se comportar como mãe de Mark, ou como mártir, 
ou como uma menininha má e cheia de culpas. Apegue-se às suas 
esperanças e sonhos, e recuse-se a participar do chauvinismo dele. 
Se ama Mark, não o deixe antes de ter tentado tudo em seu 
casamento. 
Ela acenou com a cabeça: — Mas, e se ele não continuar o 
tratamento? 
— E então? 
 
— Aí simplesmente continuarei a dar-lhe mais e mais amor. Foram 
só alguns meses; há tempo de sobra para reconquistarmos o que 
éramos. 
— Duvido que vocês algum dia voltem a ser o que eram. O que 
espero é que você vá se transformando mais e mais no que deseja 
ser. 
Enquanto saía de meu consultório Jennifer parou e disse: — Por 
favor, não o magoe. 
Sorrindo, dei-lhe uma piscada e repliquei: — Sim, mamãe. 
Ela caiu na risada. — Droga, de novo! 
Dei-lhe um tapinha leve no ombro. — Não se recrimine, Jennifer. 
Firme-se em seu amor e vá em frente. O amor pode dar cabo do 
chauvinismo, sempre. 
 
 
 
 
10 
A Crise: Impotência Social 
 
WENDY: — O que foi, Peter? 
PETER (amedrontado): — É só de mentirinha, né, que eu sou pai deles? 
WENDY (desanimada): — Ah, sim. 
 
Aproximadamente entre os vinte e os vinte e cinco anos, a vítima da 
SPP começa a notar que tem algum problema. Tenta convencer-sede que se trata apenas de um probleminha comum a todos. Porém, 
como ainda está em contato com a realidade, sabe que não é assim. 
Sabe que está pagando um preço alto pelo mascaramento de seus 
 
conflitos. Seu desejo de mudar choca-se com a excessiva negação. 
Ele adentra o estágio de crise da Síndrome de Peter Pan. 
Uma incômoda sensação de surrealismo empurra o jovem para uma 
autoconfrontação. As forças naturais do calor humano, da lógica e 
da decência forçam o caminho em direção a seu consciente. Os 
conflitos demandam uma solução. 
Ele é levado a ver a fragilidade de sua paralisia emocional. Sua cega 
busca de uma identidade grupai e a solidão resultante têm um 
preço. Sua crença na magia do pensamento e seu descaso pela lei 
cognitiva e pela ordem são desafiados pelo senso comum. Sua 
ambivalência em relação aos pais e a incapacidade de amar 
verdadeiramente uma mulher embotam sua mente. Tal combinação 
arrasta-o para um estado de total imobilidade. Vinte anos de 
"crescimento" deixaram-no socialmente impotente. 
Durante a crise, a vítima da SPP quer ajuda. Todavia, a ilusão de 
competência e a falta de coragem constituem imensos obstáculos. 
Vou apresentar-lhes o lado íntimo da vida de uma vítima da SPP 
que reuniu a necessária coragem para ultrapassar os obstáculos e 
desafiar sua impotência. 
"Minha mãe estava certa o tempo todo, mas eu fui burro demais 
para ver a realidade. E agora é tarde demais para voltar atrás e 
corrigir tudo. Tenho certeza de que ela jamais me deixará esquecer 
isso." 
Desesperança. Remorso. Sentimento de culpa. Aos vinte e três anos 
de idade, Randy estava no fundo do poço. A julgar por suas 
palavras, estava com raiva da mãe, porém, por trás da fachada, 
estava totalmente enojado de si mesmo. Havia finalmente 
despertado dos sonhos dourados da adolescência e dado uma 
olhada em sua vida. Detestou o que viu. É espantoso ver como um 
jovem tão inteligente e agradável conseguira arruinar a sua vida em 
todos os seus aspectos significativos. 
 
Estivera em três faculdades durante quatro anos, e ainda devia 
créditos somando mais um ano. Eterno desconhecedor de seu saldo 
bancário ou do que significava uma refeição balanceada, incapaz de 
manter-se num emprego por mais de duas semanas, vivia numa 
quitinete miserável com cinco rapazes medíocres e mal-sucedidos, 
sempre fugindo do senhorio, furioso pelo atraso nos pagamentos do 
aluguel. Randy pertencia ao grupo de rapazes tão entediados com a 
vida que nem mesmo fumar maconha lhe dava prazer. Abandonara 
o fumo e retornara à velha muleta, o álcool. O mais grave era seu 
hábito de procrastinar. Não era daqueles que costumam adiar as 
coisas para o dia seguinte; procrastinava indefinidamente e 
afirmava: "Que se dane o amanhã; vou adiar, e ponto final!" 
Uma espessa camada cinzenta de desesperança enevoava os 
amanhãs de Randy. Ele se havia persuadido de que cada novo dia 
só traria mais fracassos e decepções. Com efeito, para ele a 
esperança de um amanhã era nada mais que um trote cruel 
ridicularizando o ontem cheio de fracassos. 
Preocupou-me principalmente a intensidade da depressão e da 
raiva de Randy. Ele tinha todos os motivos para estar deprimido, e 
mal disfarçava sua raiva. Se estas duas poderosas emoções 
convergissem, tendo como alvo a energia vital de 
Randy, não tardaria que seu desejo de manter-se vivo se enfra-
quecesse. Dado o nível de seu desespero, Randy podia vir a 
suicidar-se. 
Contudo, durante nossas entrevistas iniciais, evidenciou-se que ele 
não estava correndo o risco de matar-se. Num período de diversas 
semanas vim a descobrir que Randy dispunha de um sistema de 
negação muito eficaz. 
Eu conhecia as respostas às primeiras perguntas, mas era 
importante que Randy se ouvisse, dando-as. — O que o traz aqui? 
Com um sorriso inocente falou: — Minha mãe disse que eu tinha de 
vir. 
 
Ele ouviu. E continuaria nessa linha se eu esperasse. A agitação de 
Randy aumentou enormemente. 
— Ela disse que se eu não viesse consultá-lo, ela cortaria minha 
mesada. 
Começou a enrubescer. — Chantagem — disse eu com seriedade. 
— Você está absolutamente certo. Chantagem. Ela não tem direito 
de me forçar a nada. Ela me trata como um garotinho. "Faça isto, 
não faça aquilo. Cuidado. É melhor você ir a esse psicólogo". Sua 
voz era suave, mas com um tom definidamente irônico. 
Questionei-o de imediato. 
— Então por que você veio? Você sempre capitula diante de 
chantagens? 
Seus olhos dardejaram raiva. 
— O que é que você acha? 
Pausa. Então deu-se conta da perda de autocontrole e rapidamente 
desculpou-se. Passou a relatar seu problema financeiro. 
Randy saíra de uma universidade e se entendiara com o ambiente 
"infantil" da faculdade local. Quando a deixou e começou a procurar 
emprego, a mãe decidiu que, para continuar morando em casa, ele 
teria de lhe pagar aluguel. Como não conseguiu um emprego 
satisfatório, foi para outra universidade. Não era o que queria, mas 
isso o livrava da mãe. 
A mãe pagava suas mensalidades e lhe dava duzentos e cinqüenta 
dólares mensais para aluguel e alimentação. Tudo o que tinha a 
fazer era passar nos cursos. À época de nossas primeiras entrevistas 
havia o perigo de ele ser reprovado em todas as matérias. Então ele 
e a mãe teriam outra briga. 
Eu pretendi envolvê-lo quando disse: — Pelo jeito você ainda não 
conseguiu deixar de ser o filhinho da mamãe. 
— Como é que é? — Ele pareceu genuinamente surpreso. Lembrei-
lhe o comentário inicial, em que ele parecia culpar 
 
a mãe por seus problemas. Em seguida fiz um paralelo entre essa 
atitude e sua dependência financeira da mãe, e contrastei ambas 
com sua falta de vontade ou incapacidade de sair "da barra de sua 
saia". Pensei que ele fosse ficar confuso. Enganei-me novamente. 
— Acho que isso é um mau hábito. Eu sempre tendi a culpar minha 
mãe por meus problemas. Eu achava que tinha razões de sobra. Ela 
me enchia constantemente, lembrando-me todos os meus erros. Isso 
me irritava. Era mais fácil atribuir a culpa de meus problemas ao 
fato de ela me aborrecer tanto do que fazer alguma coisa para 
resolvê-los. Acho que ainda estou agindo assim. 
Agora eu é que estava confuso. 
— Se você percebe tudo tão claramente, por que não muda? 
A resposta veio com facilidade e rapidez. — Não sei. Levei um 
minuto para retomar o diálogo. 
— Você não muda porque não acha que isso é possível. Você sente 
que não adiantaria nada tentar. 
— Não entendo. Por que eu pensaria isso? 
— Não sei. Vamos descobrir. 
Expliquei-lhe que não o considerava mentalmente doente. Portanto, 
seu padrão comportamental, embora complexo e misterioso, fazia 
sentido. Podia ser irracional, mas era lógico. O único problema era 
descobrir essa lógica. 
Falamos de como sua vida estava caindo cada vez mais. Narrou 
com detalhes como empregava mal o dinheiro. Contou-me dos 
empregos que abandonava por causa das mais insignificantes 
reprimendas dos patrões, e daqueles de que fora despedido por 
causa de brigas com os colegas. Ficava atônito ao conscientizar-se 
de sua raiva, e confuso diante de tanta impulsividade. Com o 
aumento de sua confiança em mim, crescia a freqüência de palavras 
como "fracasso", "desprezível" e "burro", em sua auto-análise. 
Ficou mais fácil explicar a Randy o que parecia estar acontecendo 
com ele. Estava suportando um grande tormento psicológico. 
Estava retomando os antigos métodos de lidar com dificuldades. 
 
Convinha-lhe acusar a mãe por seus problemas. Queria acreditar 
que culpar a mãe faria de algum modo seus problemas 
desaparecerem, como acontecia em sua adolescência. 
Isto revelou outra característica de Randy: ele acreditava num 
caráter mágico de seu pensamento. Começara bem cedo em sua 
vida, quando lhe era permitido sobrepor seu pensamento mágico à 
realidade. "Se eu achar que é assim, assim será." Para as crianças, 
isto é apenas uma frivolidade inócua;para os adultos é desastroso. 
Este traço há muito devia ter desaparecido da vida de Randy, mas 
não desaparecera. 
Diante da terrível ameaça da depressão e da autodestruição, não é 
de espantar que ele houvesse retornado a seus velhos mecanismos 
de defesa. Era como a criança de sete anos que, na ansiedade 
provocada pelo primeiro dia na escola, volta ao calor e à segurança 
de chupar o dedo. Só que neste caso Randy ainda sentia pena de si 
mesmo por sua mãe causar-lhe problemas. Isto lhe aliviava o 
sentimento de culpa. Se aceitasse essa sua reação à ansiedade, 
poderíamos examinar mais a fundo sua personalidade. 
Existia, porém, um grande problema impossível de ser atribuído a 
sua mãe e que, além de enchê-lo de constante tristeza e aflição, deu 
origem a seus primeiros pesadelos. Ele se via incessantemente 
rejeitado. Quando o questionei sobre a utilização da mãe como bode 
expiatório, ele confessou ter problemas com as mulheres em geral. 
Estas foram suas palavras: 
"Eu desejo muito um relacionamento duradouro com uma mulher. 
Mas como em tudo o que faço, em amor sou também um fracasso. 
Tenho a impressão de que, sempre que começo a ficar legal com 
uma garota, faço alguma coisa para estragar o relacionamento. Toda 
vez que percebo que estou me apaixonando, começo a procurar 
outras garotas e a pensar em conquistá-las. Sexualmente, quero 
dizer. É claro que nenhuma garota decente agüenta isso, 
especialmente quando deixo tão evidente o que estou fazendo." 
 
Que colocação complexa! Nela se expressavam suas esperanças, 
seus sonhos, temores, frustração sexual, insegurança, desconfiança e 
consciência de si mesmo. Com alguma percepção psicológica 
também abria caminho para um problema em maior ou menor grau 
comum a muitos de seus contemporâneos. A história que se 
esconde atrás desta colocação é a chave para a lógica peculiar de 
Randy. 
Nas sessões seguintes Randy discorreu sobre suas experiências 
sexuais. Falou do primeiro encontro, do primeiro beijo, da primeira 
namorada firme e, muito embaraçado, da primeira relação sexual. 
Em cada história transparecia a atitude do tudo ou nada. Ele 
encarava cada encontro sexual bem-sucedido como uma vitória. 
Randy queria possuir garotas fisicamente, porém rejeitava o contato 
emocional. Em três ocasiões diferentes dera o fora numa garota por 
ela haver tentado estreitar os laços entre eles. Como ele mesmo 
dissera, seu método era "óbvio". E extremamente nocivo também. 
Eu o vi como que executando emocionalmente as mulheres que 
ousassem amá-lo. 
Insinuei que sua atitude em relação às mulheres era anormal, que 
ele parecia nutrir grande raiva e ressentimento contra o sexo oposto. 
Ele pareceu verdadeiramente chocado. 
— Não posso imaginar-me odiando as garotas. Eu quero amá-las. 
Não consigo acreditar que tenha tais sentimentos dentro de mim. 
Mas alguma coisa existe, né? 
— Certamente. — Avancei mais um passo nessa linha. — E se 
quiser saber, é vingança. Essa é a grande mensagem que eu percebo 
no que você diz. Você está querendo ficar quites com elas. 
Ele ficou verdadeiramente perplexo. 
— O quê? Isso não faz nenhum sentido. Vingança? Por que eu 
quereria me vingar delas? 
— É por isso que você está aqui. Para descobrir por quê. Portanto, 
faça-o por Randy, não por mamãe. Juntos descobriremos por quê. 
 
Por quê? Ótima pergunta. Por que Randy era tão maldoso com as 
garotas? Por que a execução emocional? Ele teria sido traído por 
alguma namorada? Pelo que vimos juntos, não. Ou sua mãe seria 
uma mulher insana, uma esquizofrênica sádica? De forma alguma. 
Talvez seu pai lhe tivesse feito uma lavagem cerebral, induzindo-o a 
odiar as mulheres; ou então Randy tinha tendências homossexuais 
latentes. . . Também não. 
Para atingir a raiz do problema, pedi a Randy que relatasse uma 
experiência sexual recente. Eu queria* uma narração completa de 
tudo o que acontecera. Falou-me de encontros físicos altamente 
simbólicos. Envolviam uma complexa trama de fantasias infantis, 
exploração ilícita e às vezes ilegal de meninas pequenas, e um 
pandemônio de comprimidos e bebidas. Em resumo, a essência de 
sua história era sexo e drogas. 
Randy vivia numa cidade onde 70% dos habitantes dependiam, 
para seu sustento, da universidade local. Muitas casas antigas 
haviam sido convertidas em repúblicas de estudantes. Os locadores 
se limitavam a cobrar o aluguel, pouco se importando de manter as 
propriedades em boas condições. Randy conhecera cinco estudantes 
que moravam numa casa velha e em péssimo estado. Eles estavam 
procurando um sexto elemento para a divisão das despesas. Randy 
pagava oitenta dólares mensais, e tinha de arcar com os custos de 
sua alimentação. Coube-lhe um quartinho no segundo andar, que 
fora outrora um espaçoso banheiro. 
Para viver necessitava de festas tanto quanto de ar e de água. 
Supunha que lá teria um grande suprimento de festas promovidas 
pela turma da faculdade. E não se decepcionou. 
Foi recepcionado pelos cinco companheiros com uma festinha. 
Nada de especial, apenas algumas caixas de cerveja, umas garrafas 
de gim, haxixe, maconha e uma preciosa dose de cocaína. Pelas 9 h 
da noite havia uns quinze ou vinte jovens "loucos" espalhando-se 
pelas escadas da velha casa. As vibrações do estéreo faziam tremer 
 
as paredes. Todos falavam, contando os últimos casos pessoais e 
comentando os mais recentes boatos sobre outros elementos da 
faculdade. Como sempre, ninguém ouvia. 
Em dado momento entraram na festa três participantes inesperadas 
(para Randy). Sua aparência jovem indicava que não deveriam estar 
lá, porém era claro que estavam familiarizadas com a casa e seus 
cinco ocupantes. Eram estudantes do segundo ano do curso colegial 
que moravam naquela área e faziam dessa casa seu segundo lar. 
As três meninas eram muito amigas. Haviam conhecido o pessoal 
da casa por acaso. Estavam passeando, começaram a conversar com 
três dos rapazes, e logo começaram a passar suas tardes tomando 
cerveja e pondo em prática seu desejo de 
serem vistas como moças sofisticadas e modernas. Os rapazes lhes 
ofereciam toda a atenção que desejavam, toda a cerveja que 
conseguiam beber e, ocasionalmente, uma pitada de cocaína. A 
retribuição era simples: sexo. 
Randy foi imediatamente apresentado às três garotas. Sabiam o 
roteiro de cor. Tinham exclamações de admiração para as histórias 
de Randy e morriam de rir com suas piadas. Estavam realmente 
bem treinadas; já nem faziam caretas pelo gosto amargo da bebida. 
Randy foi instantaneamente aceito como um "amigo especial", 
rótulo de crucial importância para as meninas, como se com ele 
pudessem justificar suas ações. 
Em uma hora Randy estava na cama com uma delas. Ela seguia bem 
o roteiro. Os elogios que lhe fazia como amante eram perfeitas 
reproduções das falas da heroína de um romance barato. Ela até 
fumou um cigarro após a sessão amorosa de quatro minutos de 
duração. Estava estupefata por tanta masculinidade e que 
maravilha sentir-se tão à vontade com um homem em tão pouco 
tempo! 
Randy sentiu-se ótimo. A gratificação de seu ego equiparava-se à 
satisfação do corpo. Ele era o máximo como amante. Era o máximo 
 
dos máximos como pessoa. Enquanto a menina prosseguia nos 
elogios, Randy experimentava ondas de paixão, alternando paz de 
espírito e desejo sexual. Estava contente consigo mesmo. Isso o 
excitava ainda mais. 
Retirou o cigarro dos lábios da garota, resmungou algo sobre amá-la 
e agressivamente expressou sua paixão renovada. Um pouco depois 
Randy estava deitado ao lado dessa estranha, tentando pensar em 
algo para dizer. Ele sempre detestara os momentos pós-sexo, 
quando teoricamente se deve falar alguma coisa. 
Quebrou o silêncio com palavras de elogio aos dotes físicos da 
companheira. Ela respondeu friccionando-lhe o peito e 
massageando-lhe o ego com falsos afagos. O significado de 
"especial" tornou-se mais claro.A garota tinha somente dezesseis 
anos, mas era uma mulher especial para ele. Uma mulher com a 
capacidade de fazê-lo sentir-se vivo. Uma pena não lembrar seu 
nome. 
A garota retornou à festa apesar dos protestos de Randy. Ele se 
consolou com um cigarro de maconha. Fumou por puro hábito, sem 
necessidade; já estava "louquíssimo". Não demorou um instante 
para que Randy percebesse que estava contente por ela ter saído. 
Passados alguns minutos sua "viagem" foi interrompida. Outras das 
três meninas estava à porta. Após um segundo de hesitação, sem 
qualquer palavra, desnudou o lindo corpo de quinze anos e caíram 
na cama. Tirou o cigarro da boca de Randy, tragou profundamente 
e soltou a fumaça com ar sensual. 
Imediatamente passaram a fazer amor. Embora excitado, Randy 
começou a perder a capacidade de ereção. Porém sua auto-exaltação 
iria por terra se tivesse de explicar sua impotência. Tal como fizera 
antes, fingiu ter orgasmo, no que foi imitado pela companheira. Era 
tudo parte do jogo. 
A menina gemia de prazer. Randy desgostou-se da simulação, mas 
não estava fazendo o mesmo? Ela não o atraía; mesmo assim, 
regalou-a com sua própria simulação de satisfação. Concordou até 
1 
em ser um "amigo especial". Tinha de fazê-lo. Ela pedira isso como 
se a resposta não pudesse ter sido impensável. 
Esta amiga especial saiu depois de o cigarro de maconha terminar. 
Randy ficou um pouco confuso. Seu estômago doía. Não lhe parecia 
correto ter relações sexuais com duas menores desconhecidas. 
Muito menos ficar impotente. Pôs de lado a preocupação, repetindo 
para si mesmo que tivera sorte. Realizara sem querer o sonho de 
qualquer jovem "garanhão". Mal podia parar de se perguntar 
quando traria a terceira adolescente para a cama. 
Só depois de muitos dias que Randy cometeu a mais desastrosa gafe 
emocional. Ele combinara com a namorada de vir visitá-lo em sua 
nova casa, prometendo-lhe um fim-de-semana inesquecível. Pelo 
menos nisto ele não mentiu. 
Eram 3 h da tarde, e a namorada chegaria às 4 h. Às 3 h e 15 min, a 
terceira componente do trio irrompeu pela casa e tirou uma cerveja 
da geladeira. Randy estava sozinho na sala, ouvindo música. 
A menina deixou-se cair no sofá ao lado de Randy, fazendo seus 
longos cabelos loiros se espalharem sobre ele. Contou que matara a 
última aula para comemorar o início do fim-de-semana. Riu-se ao 
pensar nas outras duas penando com o professor e, portanto, 
impossibilitadas de chegarem a casa dentro de uma hora. 
A menina não aguardou pelo que teria sido um tímido avanço de 
Randy. Contou que as duas amigas se haviam maravilhado com o 
entusiasmo e a ternura dele. Ela falava das relações sexuais que 
haviam tido, porém suas palavras sugeriam algo bem mais 
profundo. Eram 3 h e 50 min quando Randy e sua nova "amiga 
especial" se enfiaram na cama. 
A namorada de Randy estacionou na frente de sua casa exatamente 
às 4 h. Um dos moradores da casa ia chegando quando ela estava 
para tocar a campainha. Ele se apresentou e convidou-a a entrar. A 
música estava altíssima. O rapaz disse que Randy devia estar no 
 
quarto se vestindo, e sugeriu que ela subisse e lhe fizesse uma 
surpresa. Ela subiu. 
Randy tivera dificuldade em atingir o orgasmo. Estava totalmente 
concentrado nisso. Aconteceu exatamente no momento em que a 
namorada entrou em seu minúsculo quarto. Por um instante ele 
confundiu os gritos de desagrado da namorada com os de prazer da 
amiga especial. "Esta aqui é excelente", foi seu primeiro 
pensamento. 
A namorada virou-se e saiu antes que ele conseguisse entender o 
que estava acontecendo. A exclamação de surpresa da loirinha 
deixou-o atordoado. Pulou da cama sobressaltado. Não demorou 
em dar-se conta do que ocorrera. Voou escada abaixo e alcançou a 
janela quando a namorada partia pisando fundo no acelerador. 
Randy tentou repetidas vezes telefonar para a garota. Ele queria 
muito explicar-se. Ela recusou-se a ouvi-lo. As semanas seguintes 
foram um inferno para ele. O incidente não lhe saía da mente. Cada 
vez que tentava ter relações sexuais com uma das outras garotas, 
visões daquela situação o assaltavam. Ele não conseguia chegar à 
ereção. 
Rapidamente a notícia espalhou-se entre as três meninas; Randy 
não era mais um amigo especial. Uma a uma, as três expressavam 
abertamente sua decepção e seu ressentimento pela insensibilidade 
dele. Queixavam-se amargamente de que ele as tinha usado. 
Pareciam particularmente ofendidas pelo que ele fizera com a 
namorada. Em breve foi marginalizado pelos companheiros da 
república. Tiveram de escolher entre ele e as três meninas. Ele 
perdeu. Confuso e aflito mudou-se de lá. 
Quando Randy terminou o relato, ficou claro que ele ainda estava 
perdido. As recentes conquistas sexuais, inicialmente vistas como 
algo muito divertido, lhe haviam causado intenso sofrimento. Podia 
ter conseguido várias "vitórias", mas saíra perdendo. O pior era que 
não compreendia o que acontecera. 
1 
Ele perdera o contato consigo mesmo. A maior parte de sua vida 
compunha-se de auto-enganos. Até sua aparência era ilusória. O 
sorriso cativante escondia a dúvida; os olhos, de um azul 
esfumaçado, estavam vitrificados pelas inúmeras lágrimas de 
sentimento de culpa não-derramadas; o firme aperto de mão traía 
um profundo constrangimento e vergonha. Ele era um jovem 
inteligente a quem o mundo deveria aplaudir. Em vez disso, agia 
como um abutre, preguiçosamente circulando à volta do mundo, e 
que mantinha a própria existência alimentando-se de menininhas 
mais imaturas que ele. Não é de espantar que se sentisse tão mal. 
Tive que me aproveitar do sofrimento de Randy para ajudá-lo. Meu 
próximo passo seria assinalar as contradições em seu modo de vida: 
ele dizia que era especial para as pessoas, porém não tinha amigos; 
suas palavras calorosas ocultavam atos cheios de fria indiferença; 
manipulava os outros, fingindo estar experimentando sensações de 
proximidade e intimidade. Desejava amar as mulheres, mas se 
alguma se aproximava demais, ele a punia severamente. 
Iniciei a viagem de Randy em direção à autocompreensão tocando 
no ponto crítico da questão. — Você realmente está muito só, não é? 
Seus olhos encheram-se de lágrimas. Embora não proferisse 
palavra, dizia tudo. 
— Como você sente isso? Pareceu engasgar-se. — É horrível. 
— Não dá para fazer isso sumir agora, dá? 
— Não. 
— Bom, dá para você conviver com esse sentimento e aprender com 
ele? 
A testa franzida provava que ele estava falando sério. — Não estou 
entendendo o que você quer dizer. 
Ensinar alguém a confiar nos próprios sentimentos e sensações e 
aprender com eles é tão simples que se torna quase impossível. 
Randy não era exceção. 
— Você sempre evitou a solidão, não é? 
— Acho que sim. 
 
— Bem, desta vez não a evite. Não lute contra ela. Aceite-a. Deixe 
esses sentimentos aflorarem. Não tema sentir-se solitário. Pode ser o 
único sentimento real que você vem tendo há muito tempo. Você 
pode aprender com ele. 
— Mas, em que isso vai ajudar? 
Comecei o processo de ajudá-lo a atentar para seus sentimentos e 
recuperar o contato firme com a realidade. 
— Eu vou mostrar a você. Vamos acompanhar esse seu sentimento 
de solidão e ver aonde ele nos leva, tá? 
Ele ainda estava incerto, sem saber aonde íamos chegar. 
— Tudo bem, você é quem sabe. O médico é você. De onde começo? 
— Exatamente de onde está. 
— O quê? 
— Você está se sentindo solitário agora, correto? 
— Sim. 
— Muito bem. Sinta isso. Experimente isso. Você está só. Fiz uma 
pausa para dar-lhe tempo de assimilar as instruções e segui-las. 
— Agora, o que acontece quando pensa em sua solidão? 
— Quero calar esse sentimento. Quero acabar com ele. 
— Você está assustado, não está? Acenou com a 
cabeça e eu continuei. 
— Agora são duas emoções, você está se sentindo só e assustado. 
Qual a sua reação? 
— Quero sair daqui, já. 
— Então,quando você se sente só, fica assustado e quer fugir, certo? 
— Você é quem sabe. 
— Não! Não sou eu! 
Esta resposta o pegou de surpresa. Ficou tenso e olhou-me 
atentamente. 
— Você acaba de expressar seus sentimentos. Esses sentimentos são 
seus, não meus. 
— Tá bem. É, fico meio em pânico. Como se estivesse no meio de 
um incêndio. Só quero correr. 
1 
— Está bem. Está vendo o que está acontecendo? Você partiu de um 
sentimento real, o de estar só. Aí sentiu-se assustado e 
experimentou pânico. Você está caminhando. 
Randy pareceu perplexo. — Claro. Em círculos. 
Continuei apegando-me a minhas armas. — Certo. Esse é seu 
próximo sentimento. Andando em círculos. Voltas e voltas. Agora 
está confuso. O que a confusão provoca em você? 
— Uma reação estranha. 
Corou e riu. — Você não vai acreditar no que eu pensei. 
— Vamos ver. 
— Pensei naquela primeira noite com a primeira garota. Puxa, que 
menina! 
Ergui as sobrancelhas e sorri, como que a dizer que também sou 
humano. Então prossegui o trabalho, só que desta vez deixando a 
maior parte da tarefa em suas mãos. 
— Agora, conte-me o que está passando por sua cabeça. 
— Comecei me sentindo só e acabei ficando excitado. Eu te disse 
que era estranho. 
— Na realidade você partiu da solidão, passou ao medo, ao pânico, 
à confusão e aí lembrou-se de um encontro sexual específico. O que 
significou aquela experiência sexual? O que te proporcionou? 
Randy interrompeu temporariamente suas associações. 
— Ei, mas é muito estranho. Que loucura! Eu não devia pensar 
assim. 
Era importante confrontar a idéia irracional implícita. 
— Não, todas as experiências são válidas. O que quer que tenha 
passado por sua cabeça enquanto fazia amor com a menina, tudo 
bem. 
— O quê? Todas as experiências são boas? A solidão é boa? Corta 
essa. Como é que a solidão pode ser boa? 
— Porque você a sente, e você é bom. 
— Isso não faz nenhum sentido. 
 
— Não faz sentido porque você acredita que se tiver um sentimento 
ruim, você é ruim. E isso não faz nenhum sentido. 
Randy me olhou. Acho que descobri em seus olhos uma luzinha de 
compreensão. Nunca imaginara que ele e seus sentimentos 
pudessem ser vistos como duas coisas diferentes. Usei minha 
descoberta para retomar as associações. 
— Parece que quando você se sente confuso, vê-se negativamente. 
Relembra uma experiência sexual, e isso de algum modo faz você 
sentir-se bem. Por alguns momentos, ao menos. 
— Acredite ou não, estou te entendendo. Quer dizer, me 
entendendo. Quer dizer, estou entendendo você e você está me 
entendendo. Puxa, agora eu estou confuso mesmo. 
— Não, não está. Você está indo bem. Começou sentindo-se só e, 
depois de alguns outros sentimentos, foi dar numa experiência 
sexual específica. E sente essa transição estranha. Sem problemas. 
Fique aí. Vamos ver aonde ela nos leva. 
— Tá legal. Acho mesmo que não pode doer mais. 
— Vamos retomar sua lembrança do encontro sexual com a 
primeira menina. O que isso te proporcionou? 
Randy caiu na risada. Eu também, ao me dar conta do duplo 
sentido de minhas palavras nessa situação. 
— Eu sei o que proporcionou a seu corpo. O que eu quis dizer foi: o 
que proporcionou à sua cabeça? 
Randy pensou por um momento. — A primeira palavra que me 
vem à cabeça é idiota. Mas tá lá. 
— Qual é? 
— Vitória. 
Repeti-a para que ele se desse conta de seu peso. — Vitória. 
— É, vitória. Eu venci. 
— Soa como se você estivesse num jogo. Ou numa batalha. A 
menina estava tentando ganhar de você alguma coisa — ou você 
achou isso. Mas você a derrotou. O que esse vitória te proporcionou? 
1 
— Não sei. 
— Bem, como você se sentiu em relação a essa vitória? 
— Bem e mal. Uma parte de mim achou ótimo, outra achou 
péssimo. 
— Como é esse "péssimo"? 
— Eu usei a menina. Eu a magoei. 
Era hora de mais uma pequena dose de realidade. Isto me ocorrera 
quando ele falara sobre a festa. — Talvez sim. Mas talvez você esteja 
superestimando seu poder. 
— Como assim? 
— Sei que você é um cara bonito e ótimo amante. Mas essa tal 
amiga especial estava só representando. Você só era mais um 
personagem na cena de sempre. O que você acha que ela fez com o 
novo inquilino de seu quarto? O que ela e as amigas sempre fazem 
depois de beber e de fumar? Elas "dão", é só. É o pagamento. "Dar" 
para você era parte do pagamento. Sinto te desapontar. 
Randy ficou sério. Estava magoado. Espantei-me por notar que ele 
jamais pensara nisso. Ele realmente se achara especial para o trio 
adolescente. Assim, alimentando seu orgulho irracional, ficara cego 
à realidade. Acontece que quando se trinca o espelho do narcisismo, 
a imagem nunca é bonita. 
Concedi-lhe alguns momentos para ordenar seus pensamentos e 
recomecei. 
— Você sente que a conquistou. E venceu. E isso alivia sua solidão. 
— Talvez. Por alguns minutos. E aí eu fico com raiva. Raiva de 
mim, da situação. Fico com ódio de ter estado lá. Fico me odiando e 
não sei por quê. 
Randy estava ficando aflito novamente. Era evidente a raiva que 
sentia de suas próprias ações. Estava frustrado. E tentando 
novamente fugir. 
— Calma! Você não precisa fugir da raiva e da frustração. Você 
conquistou a garota, mas se sente mal, certo? 
 
— É. 
— Quer dizer que, na verdade, você não ganhou nada. Perdeu. 
Perdeu o jogo. Você acha que ganhou, mas na verdade perdeu. 
— Hã? 
— Pense nisso. Você evita a solidão porque ela te causa pânico. Aí 
se joga nos braços de uma garotinha imatura a fim de garantir uma 
vitória. Mas ela não é uma competidora de seu nível. Aliás, ela nem 
está no mesmo jogo. Ela é simplesmente um corpo que você usa 
para fazer uma masturbação a dois. A briga é com você mesmo, 
Randy. Você se sente péssimo e furioso porque está brigando 
consigo mesmo. Assim não há jeito de ganhar. 
— Por que eu faço isso? 
— Não sei bem. Mas você usa as garotas para suas próprias 
necessidades, para combater a solidão. E não estou falando em 
termos sexuais. Não quero te ofender mas, pelo que você descreveu, 
você não é exatamente um Don Juan como amante. 
O sorrisinho tímido demonstrou que tinha compreendido. 
— Você usa as meninas emocionalmente. E com a memória, com as 
lembranças, continua usando-as. Você as seduz — o que não é tão 
difícil — e aí, nos elogios convencionais que elas te fazem, você 
encontra material para reforçar seu ego, criando uma imagem 
interior de sua própria grandeza. Você precisa tanto de 
reconhecimento e aclamação que, mesmo quando falsos, você os 
engole avidamente. 
— Isso é um horror. 
— Lá vem você de novo. Chegamos a um ponto em que se torna 
possível para eu ajudá-lo a enxergar a realidade, e você se condena. 
Se continuar assim, nunca aprenderá com seus erros. 
— Mas é uma coisa errada. 
— Bem, digamos que é ineficaz. Você fica todo inchado seduzindo 
emocionalmente as menininhas. Orgulho é uma coisa que deveria 
nascer de dentro de você mesmo, e não roubado de outrem. Mas 
você não sabe como conseguir isso. Aí fica se engajando em batalhas 
1 
que não pode vencer. Acho até que, mentalmente, você anota cada 
uma delas. 
— Mentalmente não. 
Foi minha vez de ficar confuso. — Como? 
— Não é mentalmente, é por escrito mesmo. Fiz uma lista num 
caderno, com o nome de cada menina com quem fui pra cama. 
Anoto o nome dela, onde estávamos e qualquer outro detalhe fora 
do habitual. 
Não resisti. — Aposto que a lista cresceu muito depois do trio. 
Nossas risadas suavizaram sua tensão e abriram caminho para a 
emergência de outro de seus segredos. 
— Acontece que um de meus objetivos — nossa, parece tão ridículo 
—, eu sei, eu sei, não devo ser tão duro comigo mesmo. . . Bem, um 
de meus objetivos é comer um certo número de garotas, até 
conseguir uma lista com pelo menos um nome que comece com 
cada letra do alfabeto. Sabe como é, Amy, Bárbara, Cindy, Dolores, 
e assim por diante, até chegar no Z. Eu não falei que era ridículo? 
—Não é ridículo quando se trata de um pensamento apenas, é? 
— Não. É excitante. 
— Mas, a longo prazo, a que te leva uma lista de nomes? Randy 
refletiu por um momento, depois seus olhos se 
iluminaram. 
— Solidão de novo! 
Fitei-o como a dizer: "Como você sente isso?". Ficamos em silêncio 
por um ou dois minutos. Randy usou o silêncio de modo bastante 
produtivo. 
— Agora me vem outra sensação estranha. Mas boa. Cheia de paz, 
como se tudo se ajustasse. Meus atos finalmente fazem sentido. 
— Explique isso, por favor. 
— Bem, começo sentindo-me só a maior parte do tempo. Fico muito 
assustado e me refugio na lista. Aí, para me sentir melhor, fico 
procurando garotas pra poder botar nomes novos na lista. Ajuda 
 
por algum tempo, mas no fim acabo no mesmo ponto, sentindo-me 
só. Aí essa merda recomeça igualzinha. 
— Como você. . . ? 
Rendy interrompeu-me com um sorriso bem-humorado. 
— Já sei. Como sinto isso? Bom, é triste. Isso é triste. É triste eu ter 
que ser assim. 
— Você tem que ser assim? 
— Pelo jeito. . . Não consigo amar nenhuma mulher. Quer dizer, 
amar mesmo. Então, como posso ser de outro modo? 
Era minha vez de interrompê-lo. 
— Espera aí. Não consegue amar nenhuma mulher? Essa é uma 
conclusão incorreta. Na verdade, é uma mentira. Você bem poderia 
amar alguma mulher. O problema é que você não deixa nenhuma 
mulher te amar. Você se acha não-amável, não-desejável. E sabe muito 
bem como impedir uma garota de se aproximar. Você é um 
prisioneiro de uma solidão que você mesmo constrói. E certamente 
não conseguirá escapar dessa prisão se continuar a permitir que as 
adulações de menininhas pseudomoderninhas acariciem seu ego 
ferido. 
Randy pareceu apreciar minha franqueza. A verdade é um 
maravilhoso instrumento terapêutico. Houve um último silêncio, 
antes do final de uma sessão particularmente frutífera. 
Randy preparou o terreno para o trabalho futuro perguntando: — 
Como é que eu fiquei assim? 
Como? Nas semanas seguintes discutimos os porquês de sua 
problemática. Analisamos sua preguiça, sua procrastinação, sua 
baixa auto-estima e sua falta de autodisciplina. Mergulhamos no 
seu relacionamento distante com o pai e no seu sentimento de culpa 
e de raiva em relação à mãe. E sua irresponsabilidade! Se metade do 
tempo que gastou tentando evitar seus problemas tivesse sido 
aplicado em resolvê-los, Randy teria saído dessa há muito tempo. 
Randy estava no período de crise da Síndrome de Peter Pan. Essa é 
uma época composta simultaneamente de dificuldades e 
1 
esperanças. Dificuldades, porque é o estágio em que os espelhos do 
narcisismo começam a rachar, e a crueza do chauvinismo 
freqüentemente acarreta uma dura rejeição. Esperanças, porque 
nessa crise o jovem tem a oportunidade de modificar a própria vida. 
Com ajuda profissional e/ou de amigos, a vítima em crise pode dar 
os primeiros importantes passos em direção oposta à Terra do 
Nunca. 
 
 
 
 
11 
Após os 3 0 anos: Desalento 
 
PETER: — Morrer será uma aventura e tanto! 
 
Adentrando a quarta década da vida, o homem, vítima da SPP, 
começa a experimentar a desintegração de sua vida. As promessas 
de interminável alegria e divertimentos ainda se acham irrealizadas. 
Ele tem dificuldade em compreender isso. Afinal de contas, fez o 
possível para imitar Peter Pan. Evitou a responsabilidade, capitulou 
diante da pressão grupai, ignorou suas inseguranças, culpou os 
outros por suas inadequações sexuais e negou-se bravamente a 
comportar-se como adulto. Teoricamente a negação era a chave para 
a juventude eterna. Em vez disso, ela o conduziu ao desalento e à 
desesperança. Desencorajado e aflito, vê na morte a única 
alternativa promissora de algo diferente em sua vida. 
O desânimo da vítima junta-se à confusão gerada por seu modo de 
vida. Cercou-se de todas as armadilhas da vida adulta: esposa, 
filhos, casa, carro, emprego fixo, férias anuais e amigos. Estas coisas 
proporcionaram-lhe pouco alívio. Só as adquiriu porque se 
 
esperava isso dele. Representou de acordo com o roteiro 
socialmente apropriado com o intuito de obter aprovação, mas 
nunca encarnou plenamente o papel. O fato de outros se 
comprazerem com essas coisas deixam-no atônito. 
Embora inútil, o mascaramento se mantém. A realidade de outros, 
satisfeitos com a vida adulta, desafia suas crenças. Ele se volta para 
dentro, chupa o dedo emocional e lamenta; 
"Mas é só isso? Quando é que chega toda aquela curtição que me foi 
prometida?" 
A autocomiseração pouco faz para reparar as rachaduras nos 
espelhos narcisísticos. As rachaduras se aprofundam à medida que 
a dura realidade força lugar entre as fantasias enganosas. Era para 
ele permanecer jovem para sempre; em vez disso, adormece diante 
da TV, para logo despertar com o corpo dolorido. Era para os 
campos de sua vida serem permanentemente povoados de 
companheiros de folguedos; em vez disso, ele se vê engajado numa 
luta solitária contra as ervas de seu jardim. Era para ele ser 
investido do status de um reverenciado líder; em vez disso sente-se 
avassalado por intermináveis obrigações financeiras, uma esposa 
revel a seu chauvinismo e filhos que almejam uma família que não 
existe. Nessas circunstâncias a depressão é inevitável. 
A vítima da SPP geralmente encara seu desalento como um efeito 
normal da transição para a meia-idade. E talvez em parte seja. Mas 
há também uma grande porção de conflitos emocionais resultantes 
de vários anos de evitação e negação. Seu êxito na projeção de uma 
imagem de competência foi tão completo que lhe impede até 
mesmo de levar a própria dor a sério. 
Esse homem, vítima da SPP, acha-se só em sua luta. Ele bem 
gostaria de procurar ajuda, porém há tantos obstáculos! A solidão e 
o medo da rejeição o impedem de correr riscos. O chauvinismo o faz 
orgulhoso demais para admitir suas fraquezas, o hábito de fingir 
alegria está fundamente enraizado. Ele esconde tanto suas facetas 
1 
negativas de si mesmo, que nem mesmo as pessoas mais íntimas 
suspeitam de algo errado — exceto a esposa ou amante. 
A mulher da vítima sabe que há algo errado. Ela o sabe mais ou 
menos desde o tempo em que o conheceu. E sabe que o problema 
não é apenas dele. É um problema de relacionamento, o que 
significa que ela tem a ver com isso. Pode não alcançar a extensão 
de seu próprio envolvimento, mas torna-se-lhe impossível negar a 
presença do desalento em sua própria vida. 
Talvez o problema jamais tenha sido discutido — ao menos de 
forma racional. Os rancores são silenciados e reprimidos, as 
confrontações são distorcidas e descambam em acusações inúteis, a 
confiança mútua e a cooperação ruem sob a avalanche da falta de 
comunicação. Os que ainda não se casaram adiam o casamento; os 
que já se casaram lamentam, muitas vezes, tê-lo feito. Duas pessoas 
que um dia se amaram agora acham que nem mesmo se gostam. 
Ah, mas que bela fachada! "Não há nada de errado conosco. Somos 
simplesmente duas pessoas felizes, vivendo a vida como ela é. Claro 
que temos nossos problemas, mas quem não os tem?" 
No meio de toda essa repressão e negação, existe uma coisa 
inocultável. Alguns consideram-na o mais forte elo de ligação entre 
as pessoas; outros acham que não é o rnais forte, porém o mais 
perceptível. Seja como for, este elo é fundamental em nossa 
natureza; se tentarmos suprimir sua necessidade ou se nos 
recusarmos a satisfazer-lhe as exigências, ele se voltará contra nós. 
Este fortíssimo elo na cadeia de relações interpessoais é o sexo. 
As vítimas da SPP têm problemas sexuais. Esses problemas atingem 
seu relacionamento com as mulheres. É raro que uma vítima da SPP 
tenha um relacionamento sexual normal com a esposa ou com a 
amante. Se isso acontece, trata-se de um caso leve da Síndrome de 
Peter Pan. 
Comumente a profunda insatisfação quanto ao sexo é sentida por 
ambos os parceiros, porém jamais falam sobre issoabertamente. 
 
Pedidos constrangidos de desculpas, indiretas mordazes e mentiras 
— tudo sussurrado num quarto escuro — são as formas pelas quais 
as duas pessoas rodeiam o problema. Apesar de tentarem esquecer 
o assunto, o impulso sexual exige satisfação. A decepção na área 
sexual torna-se a única característica de um relacionamento 
tumultuado, impossível de ser silenciado. 
Não se pode analisar o desalento que se instala na vítima da SPP, 
sem levar em consideração o conflito sexual. As queixas sobre o 
relacionamento sexual geralmente são a única coisa que rompe o 
pacto de silêncio. Na hora do descobrimento, "sexo insatisfatório" é 
encarado como o problema. Na verdade, é apenas um sintoma. 
Somente se o casal se dispuser a enxergar além do sintoma é que o 
relacionamento tem chance de melhorar. 
 
APRENDENDO A SENTIR 
Glenn tinha quarenta e dois anos, era prematuramente grisalho e 
sua voz vibrava com autoconfiança. Ele não só era muito bem-
sucedido, como também tinha uma esposa vivaz e agradável, dois 
filhos lindos e uma espaçosa casa no subúrbio. Muitos achariam que 
ele tirara a sorte grande na loteria da vida. 
Pouco depois de seu quadragésimo aniversário, a sorte grande de 
Glenn começou a mudar. A mulher passara a questionar o restrito 
papel de esposa e mãe, os filhos entravam em plena adolescência, o 
trabalho começava a parecer-lhe cada vez mais tedioso e pouco 
gratificante, e seu corpo ia mostrando os efeitos do abuso do álcool. 
Pior que tudo isso era o incessante desânimo que ia corroendo a 
vida de Glenn, tornando-o cada dia mais deprimido. 
Ele, todavia, negava qualquer deterioração em sua vida, até que a 
esposa insinuou a possibilidade de uma separação legal. Há meses 
Dana vinha se tratando com um psicoterapeuta e repetidamente 
pedia a Glenn que procurasse ajuda para os próprios problemas. Ele 
foi ao médico para um exame completo, e ficou meio decepcionado 
1 
ao ouvir que estava em boas condições físicas. Tinha esperanças de 
que seus problemas não fossem emocionais. No fundo, ele sabia 
qual era a verdade; simplesmente não queria admiti-la. 
Chegou em meu consultório com uma advertência clara: 
— Não confio em nenhum de vocês. Vocês parecem mais fodidos 
que nós leigos. E vocês nunca dizem o que têm em mente. Não 
pretendo sentar-me aqui, despejar toda a minha merda e depois sair 
imaginando o que você achou de alguma coisa que eu tenha falado. 
Ah, se ele não viera ao lugar certo! 
— Minha esposa acha que eu preciso de uma psicoterapia — disse, e 
aguardou minha resposta. 
— Precisa? 
— Não sei, o médico é você. 
Não seria com sutilezas que sua rudeza podia ser enfrentada. 
— Nem eu sei, por isso acho que temos aqui um problema. 
— Quem sabe se você pode me dizer sua opinião sobre uma coisa. 
O que é que um homem pode fazer quando a esposa se volta contra 
ele e lhe tira tudo o que ele almejou? 
— Isso não parece uma pergunta. Parece que você está tentando me 
dizer alguma coisa. Por que não abre o jogo? 
— Todas as coisas que eu sempre quis estão sendo tiradas de mim. 
E não posso fazer porra nenhuma a respeito. Minha esposa precisa 
se encontrar — é isso que ela diz. Só que enquanto procura sei lá o 
quê, estou perdendo minha família. 
O desalento de Glenn se escondia por trás da raiva. Fui mais 
devagar. 
— Como assim? 
— Dana decide que tem de terminar a faculdade; então eu tenho de 
dar uma busca em suas apostilas para achar o Guia de TV. Depois ela 
resolve trabalhar meio período; assim, quando chego do serviço, 
encontro a casa toda bagunçada. A seguir, ela acha que deve fazer 
mais um curso, à noite, e eu tenho de voar pra casa pra liberar a 
 
tonta da baby sitter sentada em minha poltrona, bebendo minha 
cerveja, comendo minhas azeitonas e papeando no meu telefone, 
enquanto meus filhos, que provavelmente não precisam mais de 
baby sitters, estão tentando destruir-se mutuamente. 
Trabalho muito, ganho bastante, sou respeitado em nosso meio — e 
fiz por merecer tudo isso. E agora, qual é a paga que recebo? Minha 
esposa vai a um terapeuta maluco, de repente resolve que não está 
se realizando e começa a falar em carreiras e em separação. E daí eu 
é que estou precisando de ajuda! Que besteira! 
— Parece que você está bem chateado. 
— Chateado? E como! Um homem que trabalha duro para dar o 
melhor à família, e o que recebe? Sabe o quê? Um pé na bunda! 
— Você conversou com sua esposa sobre essa situação? 
— O que é que você acha? 
Ele fitou-me como se tivesse sido eu quem houvesse posto por terra 
seus sonhos. 
— Porra, claro! Mas toda vez que tento falar, ela diz que eu não lhe 
estou dando ouvidos. Aí eu digo que o faria se ela tivesse algo 
interessante para dizer. Mas não, só aquela velha história: "Preciso 
me encontrar e você não entende isso". — A voz em falsete traía 
cinismo. 
— Você goza sua esposa na cara dela? — perguntei. 
Não estou gozando. Só estou tentando descobrir por que ela quer 
me ver sofrer. Depois de tudo o que fiz por ela, não mereço ver meu 
mundo ruir bem diante de meus olhos. Puxa, tive centenas de 
oportunidades de trair Dana, mas nunca o fiz. Fui sempre fiel, e 
agora me dou conta do que isso me valeu. 
Permaneci em silêncio, deixando de lado propositalmente a questão 
sexual, por saber que ela emergiria novamente. 
Com orgulhosa presunção, Glenn desafiou-me a envolvê-lo numa 
ginástica mental. 
— E então, o que é que você acha, hein, doutor? 
1 
— O que é que eu acho? Bem, já que você está querendo 
objetividade, aí vai: você deve sair dessa autocomiseração e me 
contar o que está sentindo, porque é óbvio que está doendo muito. 
Ele se recostou melhor na cadeira, inspirou profundamente e soltou 
o laço da gravata. Um ar de garotinho estampou-se-lhe no rosto. 
— Não tenha medo de me dizer o que está pensando, eu agüento — 
brincou. 
— Você me pediu jogo aberto. Será que eu fui aberto demais? 
Sua resposta me surpreendeu. — Não. Agradeço a Deus por você 
não se ter deixado enrolar. Talvez você não tenha percebido, mas 
consigo enganar os outros. Engano até a mim mesmo, achando que 
eu sei o que está acontecendo. Mas não sei. Meu mundo está ruindo, 
e não tenho a mínima idéia do que fazer. Claro que preciso de 
ajuda, mas na posição em que estou, nenhum homem admite isso. 
Não favorece a própria imagem, sabe como é? 
— Você está com medo, não está? 
— Certíssimo. Você não estaria? 
— Claro. 
— Tenho quarenta e dois anos, estou prestes a assumir uma 
gerência nacional de vendas, tenho uma esposa maravilhosa a quem 
amo muito, dois filhos que são a melhor coisa do mundo, e minha 
vida está se desintegrando. E não sei como parar isso. Sim, estou 
muito assustado. Em pânico, se quer saber. 
Glenn falou sobre diversas áreas importantes de sua vida, numa 
sessão especial que durou mais de três horas. Manifestou seu 
remorso por jamais se ter dado com o pai. Enojava-se de sua 
tendência para agradar os outros, e detestava o fato de não ter 
amigos. Ficava desapontado com seu egoísmo, pois surpreendia-se 
dizendo "meu" com exagerada freqüência. Era extremamente 
ambivalente no tocante à forma como ainda se sentia preso à saia da 
mãe. 
Ao abordarmos o assunto sexo, Glenn mostrou-se cheio de 
sentimento de culpa e embaraçado. Começou a falar de si mesmo 
 
como se fosse o maior amante do mundo. Com um empurrãozinho, 
contudo, abandonou o discurso de "machão" e confessou sua 
dificuldade em aceitar a própria sexualidade aberta e honestamente. 
Narrou um acontecimento recente que, em sua opinião, provava 
quanto ele estava se "abrindo" e aceitando sua sexualidade. 
— Na semana passada, cheguei cedo a casa um dia. Dana estava 
tirando o pó dos móveis. Ela estava muito sexi, de short jeans. Fui 
até ela e agarrei-a pelo busto. 
Ele abriu os braços e flexionou os dedos, imitando a maneira como 
iniciara o "jogo introdutório". 
— Empurrei-a para a mesa da sala dejantar e comecei a abrir o 
zíper de seu short. Ela afastou minhas mãos, dizendo que não 
queria ali. As crianças não voltariam logo, e eu sabia que tínhamos 
tempo. Continuei a tirar sua roupa. Ela me disse que parasse, mas 
eu tinha certeza de que ela acabaria gostando. 
Enquanto prosseguia, seu orgulho aumentava constantemente. 
— Sentíamos emoções opostas. Ela ia se excitando e eu, me 
entristecendo. Eu a encostei na mesa e penetrei-a. E ela acabou 
parando de reclamar. 
Ele riu. 
— Não durou muito. Acho que não durou nem trinta segundos, 
mas foi bom. 
Fiquei calado, refletindo sobre o que Glenn acabara de me contar. 
Era evidente que ele não tinha consciência da natureza de seus atos. 
No tom mais suave e confortador possível naquele momento, dei-
lhe uma injeção de realidade. — Você estuprou sua esposa, Glenn. 
Talvez não legalmente, mas física e emocionalmente você estuprou 
Dana. 
Seu rosto endureceu, a boca se entreabriu e os olhos, arregalados, 
fixavam o nada. Ele não se movia nem acho que o conseguiria. 
Gotículas de lágrimas formaram uma nuvem em seus olhos e ele 
murmurou: "Ah, meu Deus!" 
1 
Milhares de refletores se tinham acendido em sua mente. 
Repentinamente, centenas de coisas que ele nunca imaginara saber 
tornaram-se claras para ele. Estava em estado de choque. A 
intervalos murmurava: "Ah, meu Deus!" De vez em quando me 
fitava, e seus olhos enchiam-se de mais lágrimas. Sua incredulidade 
durou mais de cinco minutos, uma eternidade em psicoterapia. 
Ele tropeçava nas palavras. 
— Claro, foi isso mesmo que eu fiz. Estuprei minha esposa. A única 
pessoa de quem realmente gosto. Que sujeira! 
Sua autocrítica estava carregada de sentimento de culpa. Novo 
silêncio. 
O choque provocado pela conscientização empurrou-o para o fundo 
do poço: — Impossível cair mais fundo. Tudo o que Dana me vem 
dizendo é verdade. Tenho sido estúpido demais para enxergar isso. 
Ela diz que eu não sei amar, que não a respeito. Que não sei 
expressar meus sentimentos. Ela diz que eu preciso crescer. Eu a 
ouvia dizer todas essas coisas, mas nunca lhe prestava atenção. 
Fez uma pausa, com a mente a mil quilômetros. 
— Como posso mudar? Como posso reparar o que fiz? Por onde 
começo? 
Estava desesperadamente buscando alívio para o remorso. 
— Há diversas coisas que você precisa fazer. Primeiro, acabe com 
esse sentimento de culpa. Ele é inútil. Segundo, entregue-se 
realmente ao processo de crescimento. A psicoterapia pode ajudá-lo 
imensamente nesse trabalho. Terceiro, vá para casa, abrace sua 
esposa, diga-lhe que a ama e faça-a compreender que as coisas vão 
mudar. 
Glenn estava em dúvida. 
— Nós não devíamos conversar sobre o que eu fiz? 
— Para quê? Que bem vai fazer concentrar-se num ato 
desrespeitoso que deve ser esquecido? Se Dana for parecida com a 
descrição que você fez, seguramente ela não quererá tocar de novo 
nessa ferida. Ela pode querer conversar sobre as próprias 
 
necessidades sexuais, mas penso que ela não quer ruminar a dois 
algo que foi apenas um erro. De qualquer modo, se você começar a 
mostrar-lhe amor em vez de ficar provando que é um filho da puta, 
ela estará mais que disposta a esquecer o passado. 
— Mas preciso pedir-lhe desculpas. 
— Tudo bem. Peça. Só não a sobrecarregue com lamentações e 
súplicas de perdão. 
— E se ela não me perdoar? 
— Então ela tem algum problema. 
Uma semana depois, atendi Glenn e Dana juntos. Dana não era 
incapaz de perdoar, porém realmente tinha problemas. Ela 
desenvolvera uma estratégia para proteger-se da insensibilidade de 
Glenn. E ela teria que mudar se desejava que surgisse "novo Glenn" 
no casamento. 
Expliquei-lhe isso desta forma: — Por não conseguir vingar-se 
fisicamente, você o vem fazendo emocionalmente. Você está em 
contato com seus sentimentos; Glenn, na maior parte das vezes, não. 
Isto faz você mais forte que ele, ao menos nessa área. E 
compreensível, então, sua tentativa de igualar-se a ele atingindo-o 
onde ele é mais fraco. Percebo que você desenvolveu o hábito de 
acusá-lo de não sentir nada, ridicularizando sua cegueira emocional 
e ironizando suas tentativas de aproximação. E agora, com a 
perspectiva de mudança, você poderá tender inconscientemente a 
usar essa tática quando as coisas se tornarem difíceis. Mas não 
precisa preocupar-se com isso. Com o crescimento mútuo, isso 
acabará desaparecendo. 
Dana também ansiava pela mudança. Perguntou-me: — Então que 
faço com essa "tática" quando ela voltar? 
— Aceite-a. Você não precisa gostar dela; simplesmente não fuja de 
uma característica que é sua. Você tem que aceitar o fato de que 
vocês dois adquiriram alguns maus hábitos. Mas juntos podem 
modificar o funcionamento de seu casamento. 
1 
Com uma ternura tocante, Glenn inclinou-se para a esposa e disse: 
— Quero melhorar nosso casamento e vou fazer qualquer coisa para 
conseguir isso. Hesitou, depois prosseguiu com a pergunta que 
temia formular. — Você ainda me quer? 
Dana sorriu entre lágrimas. — Claro que quero. 
Glenn virou-se para mim, também com lágrimas nos olhos, e disse: 
— Ah, eu quero abraçá-la. 
Com a franqueza que Glenn esperava de mim, respondi: — Não 
diga isso, idiota, faça-o! 
Glenn quase arremessou-se e agarrou Dana como se ela fosse fugir. 
Pedi licença para sair. Quando voltei, estavam de mãos dadas, 
sentados no sofá, como dois adolescentes no primeiro encontro. 
Fui direto mais uma vez. — Vocês certamente terão problemas. Os 
velhos fantasmas podem ressurgir quando menos esperarem. Mas 
será fácil lidar com eles. Para isso recomendo um programa 
chamado "toque e abrace". Quando as coisas estiverem difíceis, 
afastem-se. Cada um num canto da casa, se necessário. Depois de 
uma meia hora, procurem-se e, sem falar nada, toquem-se e abracem-
se. Aí vocês podem discutir o que aconteceu. 
Seus sorrisos denotavam um compromisso com minha sugestão. 
Glenn estava tão animado que mal podia conter-se. — Há tanto a 
dizer. Há tantos sentimentos dentro de mim. Temo perder contato 
com eles se não os traduzir em palavras agora. 
Tentei acalmá-lo. — Compreendo seu temor. Mas você não perderá 
esse contato. Nossos sentimentos estão sempre conosco; você 
simplesmente desconhecia isso. 
— Mas e se eles me abandonarem e eu não os reencontrar? 
— Não tenha medo. O programa toque e abrace os trará de volta. 
— Mas como fazer para me sair bem nesse programa? 
— Como em tudo mais. Pratique, pratique muito. 
— Mas. . . 
— Ei — interrompi-o —, tenho uma ótima sugestão para vocês. Por 
que você não pára de se preocupar com seus sentimentos agora, 
 
leva sua esposa daqui e continua a praticar o programa toque e 
abrace? 
Glenn e Dana irradiavam felicidade ao saírem de mãos dadas. 
 
 
 
 
PARTE III 
A MUDANÇA 
 
Os quatro próximos capítulos contêm recomendações específicas — 
coisas para pensar, para fazer e dizer no processo de ajuda à vítima 
da SPP. 
Os pais aprenderão como evitar que os filhos caiam na armadilha 
da SPP, ou como ajudá-los a retomar um crescimento e 
desenvolvimento normais, caso seu comportamento reflita uma 
excessiva influência do pó mágico. 
O Capítulo 13 induz as leitoras a encarar suas próprias fraquezas, e 
mostra que as mudanças em seu modo de vida podem ter um 
impacto positivo sobre a vítima da SPP a quem amam. Elas devem 
também prestar atenção à primeira parte do Capítulo 12 (Para os 
Pais), ainda que não haja filhos na relação. Se você está apaixonada 
por uma vítima da SPP, sabe que certas facetas de seu 
relacionamento se assemelham ao de uma mãe com seu filho. Isto 
pode ser corrigido, reestabelecendo-se um comportamento maduro 
de comunicação. 
 
Os amigos e parentes descobrirão que, no relacionamento com a 
vítima da SPP, suas primeiras intuições estavam certas. Isto 
provavelmente os animará a segui-las. 
As vítimas da Síndrome de Peter Pan se emocionarão com a história 
de Larry(Capítulo 15). Na verdade, todos os leitores aprenderão 
que nunca é tarde para se engajar numa mudança. 
 
 
 
 
12 
Para os Pais 
 
O sofrimento ensinou ao Sr. Darling que ele é o tipo de homem que, o que 
quer que faça como penitência, deverá fazê-lo em excesso; do contrário, 
logo deixaria de fazê-lo. 
A Sra. Darling não costuma sair para jantar fora; prefere, ao pôr as 
crianças na cama, sentar-se ao lado delas pondo ordem em suas mentes, 
como se se tratasse de gavetas. 
 
 
O Sr. e a Sra. Darling (pais de Wendy) eram o tipo de pais que 
contribuem para o desenvolvimento da Síndrome de Peter Pan. 
Barrie pinta um retrato do Sr. Darling com os traços de um 
indivíduo superficial e narcisista. Sua autocomiseração e seu 
sarcasmo mal se escondem por trás da jovialidade. Quanto à Sra. 
Darling, ela é apresentada como superprotetora dos filhos e 
condescendente para com o marido. É freqüente vermos a atitude 
de mártir da Sra. Darling. Tolera em silêncio as brincadeiras pueris 
do marido, e só encontra significado na vida protegendo 
 
obsessivamente os filhos daquilo que ela chama um mundo frio e 
cruel. 
A tensão no lar dos Darling é palpável. No início da peça, o Sr. 
Darling tem dificuldade em dar o nó na gravata. Queixa-se 
amargamente da injustiça de ser atormentado por um recalcitrante 
pedaço de pano. A esposa reage com uma recriminação um tanto 
arrogante. O Sr. Darling demonstra o exagero de seu narcisismo 
com esta resposta: 
Estou te avisando, Mary, que a menos que esta gravata fique direito, não 
sairemos para jantar hoje, e se eu não sair para jantar hoje, nunca mais irei 
trabalhar, e se eu não for trabalhar, você e eu morreremos de fome, e 
nossos filhos serão abandonados nas ruas. 
 
A Sra. Darling cede ao capricho do marido e dá o nó na sua gravata. 
As crianças assistem a tudo horrorizadas, acreditando que se a mãe 
não for bem-sucedida na tarefa, restar-lhes-á vagarem pelas ruas até 
morrer de fome. 
Tais implicâncias e cruezas são típicas do pai da vítima da SPP. 
Significativa é também a reação condescendente da Sra. Darling. 
Embora exageradas neste exemplo, as duas reações combinam-se 
para criar uma atmosfera familiar, na qual os filhos têm de suportar 
uma incessante ansiedade. Conforme se viu na primeira parte deste 
livro, essa ansiedade é mais prejudicial aos filhos do sexo 
masculino. 
Se você acha que seu filho pode ser uma vítima da Síndrome de 
Peter Pan, há duas decisões a tomar: 
Primeiramente deve decidir se concentrará seus esforços em 
prevenir ou em remediar. Posso ajudá-lo nessa tarefa com a 
seguinte sugestão: se seu filho conta menos de dezesseis anos, você 
deveria trabalhar preferentemente numa linha preventiva. Se ele 
está com mais de dezesseis anos e você já notou evidências de 
 
inflexibilidade quanto a papéis de narcisismo ou de chauvinismo, 
sugiro que adote uma conduta mais remediativa. 
A segunda decisão é mais dura. Esta crua realidade pode orientar 
seus pensamentos: ser-lhe-á impossível ajudar seu filho se você não 
se dispuser a modificar pelo menos parte de sua personalidade e a 
enfrentar quaisquer discórdias conjugais existentes. Se a criança 
vive ou tem um relacionamento significativo com você, você 
contribuiu para o aparecimento do problema. Você cometeu alguns 
erros. Eu o ajudarei a localizá-los, porém cabe a você corrigi-los. Se 
você não se dispuser a tomar esta segunda decisão, não se dê ao 
trabalho de pensar na primeira. 
Se você está determinado a ajudar seu filho, use os exemplos 
fornecidos por Barrie para iniciar um auto-exame. 
Se você é pai, analise sua vida emocional. Você se entrega à 
autocomiseração? Teme seus sentimentos? Você sabe mesmo o que 
sente? Você finge sentir coisas que não sente, enquanto esconde 
outros sentimentos? Você se sente confuso com relação às suas 
emoções? Você compensa sua decepção com seu casamento 
passando a seu filho mensagens ocultas sobre as fraquezas de sua 
esposa? (Ver Capítulo 4). 
Se você é mãe, avalie sua superproteção e sua atitude con-
descendente. Você tolera o chauvinismo de seu marido por temer 
ficar sozinha? Você sente pena dele? Você evita enfrentar suas 
infantilidades? Sua falta de coragem faz você eximir-se de uma 
disciplina .responsável e consistente? Você compensa suas 
decepções matrimoniais dizendo a seu filho que não seja como o 
pai? 
Estas perguntas são duras de se fazer, e duras também de se 
responder. Se você tiver a coragem de encarar suas limitações, já 
estará a meio caminho de uma mudança construtiva. É necessário 
que dê continuidade a esse auto-exame fazendo algo de que 
provavelmente se esqueceu nos últimos anos. Independentemente 
da idade de seu filho, passe a conversar com seu cônjuge e a ouvi-lo. 
 
Vocês precisam comunicar-se verdadeiramente. Pode ser que isto 
exija vários meses de esforço, mas há um problema que pode ser 
resolvido tão logo você feche este livro. 
ACABE COM AS MENSAGENS OCULTAS 
Você pode adotar medidas imediatas para impedir o desenvol-
vimento ou um maior avanço do processo da SPP. Acabe já com todas 
as mensagens ocultas. Sem entrar em detalhes desnecessários, diga a 
seus filhos que você errou em despejar suas frustrações sobre eles. 
Diga-lhes que eles não são culpados de suas desavenças conjugais. 
Em seguida adote medidas disciplinares racionais contra o mau 
comportamento deles e faça com que se responsabilizem por seus 
atos. 
Parece simplista dizer que se pode parar imediatamente com todas 
as mensagens ocultas. No entanto, isso é verdade. Se você estiver 
realmente decidido a poupar seus filhos de uma ansiedade 
desnecessária, prestará atenção e localizará as mensagens ocultas 
em suas comunicações. Tendo-as localizado, haverá de evitá-las, 
mesmo que tenha de interromper-se no meio de uma frase. Caso se 
surpreenda transmitindo uma mensagem oculta, confesse seu erro 
abertamente logo que for possível, peça desculpas e use seu erro 
para demonstrar seu problema. Se tiver coragem, peça às crianças 
ajuda na identificação dessas mensagens. Pode ter certeza de que 
elas as descobrirão. 
Alivie seus filhos do sentimento de culpa, explicando-lhes que sua 
frustração se recai sobre eles. Diga-lhes que usará medidas 
disciplinares racionais para fazê-los responsáveis por seu 
comportamento, em vez de atazaná-los. Não ligue para suas re-
clamações: concentre-se em seu comportamento. Este enfoque 
comportamental elimina qualquer atitude prejudicial de sua parte. 
Se seu cônjuge cooperar nesse processo, em tempo relativamente 
curto vocês conseguirão erradicar a maior parte da tensão em sua 
 
casa. Se não cooperar, você terá de prosseguir por si só. Se, por 
exemplo, seu marido se recusar a admitir sua parte no processo de 
ocultação, você deverá adverti-lo de que será forçada a falar dele às 
suas costas. Esta é uma situação indesejável, porém libertar as 
crianças do sentimento de culpa a torna imprescindível. Se tiver a 
coragem de atacar o problema sozinha, talvez seu marido acabe 
imitando-a. Só empregue esta desagradável estratégia depois de ter 
tentado de todos os modos sensatos melhorar a comunicação com 
seu marido. 
COMUNICAÇÃO 
Uma vez cessada a transmissão de mensagens ocultas, você e seu 
cônjuge devem eliminar a causa dessas mensagens. Isto se faz 
reestabelecendo os canais de comunicação eficazes. Se você tiver a 
coragem de encarar as partes negativas de seu relacionamento, 
poderá alterar drasticamente a atmosfera da casa. Quanto mais cedo 
ultrapassarem as barreiras da comunicação, tanto mais rapidamente 
reduzirão a frustração acumulada, e acabarão com a ansiedade que 
impele tantos jovens em direção à Terra do Nunca. 
O primeiro obstáculo que você encontrará é sua justificativa para 
evitar a verdade. Identifiquei dois pontos de vista igualmente 
errôneos. Um deles é próprio das mães, o outro dos pais. Pelo 
resumoabaixo você recordará as mensagens ocultas descritas no 
Capítulo 4, e verá como esses pontos de vista fomentam as 
mensagens. Também ofereço minhas respostas-pa-drão a cada um 
desses pontos de vista. Se você aceitar minha lógica, sentir-se-á 
apoiado no confronto da verdade. 
Primeiramente encaremos o pai da vítima da SPP e compreendamos 
seu raciocínio. Então veremos como a mãe faz papel complementar 
ao do marido. 
Mensagens ocultas pai/filho: 
"Poupe-me as chateações de sua mãe." 
 
"Não magoe sua mãe." 
"Sua mãe não compreende os homens." 
"Vá com calma, você sabe como são as mulheres." 
 
Justificativas do pai: 
"Minha esposa é fraca e preciso protegê-la. Sua impulsividade lhe 
acarreta problemas, de modo especial com as crianças e 
principalmente com meu filho. Odeio os momentos em que ela está 
chateada, porque então fica pegando no meu pé. Por ser mulher, ela 
não entende que meninos são meninos. Se eu conseguir fazer com 
que meu filho a compreenda, talvez consiga poupar-nos muito 
sofrimento. De qualquer modo, mais cedo ou mais tarde ele terá que 
saber a verdade sobre as mulheres." 
 
Ponto de vista alternativo: 
Se você protege sua esposa quando ela não necessita disso, está 
encoraj ando-a a ser dependente demais — e isso lhe causará 
aborrecimentos. Com certeza ela não é nenhuma retardada, e estou 
certo de que você conhece muitos exemplos de sua força. Se você 
evita confrontá-la, trata-a como criança, ela então se rebelará. 
Meninos podem ser simplesmente meninos, mas isso desculpa o 
mau comportamento deles e elimina sua responsabilidade? Se você 
mantiver seu ponto de vista, estará passando suas fraquezas para 
seu filho, e ele muito provavelmente terá os mesmo problemas e 
preconceitos com a esposa dele. 
 
Mensagens ocultas mãe/filho: 
"Não aborreça seu pai." "Você está agindo como seu pai." "Seu pai 
não entende nada de sentimentos." "É uma pena que para seu pai o 
trabalho seja mais importante que a família." 
 
Justificativa da mãe: 
"Meu marido às vezes age como criança. Quer as coisas do jeito dele 
e se irrita quando não as tem assim. Ele costuma tratar-me como um 
ser inferior, preferindo o trabalho e os amigos a ficar comigo. 
Quando meu filho age de maneira insensível, está apenas seguindo 
o exemplo do pai. Se eu não conseguir que ele mude, coitada da 
mulher com quem ele se casar." 
 
Ponto de vista alternativo: 
Já lhe ocorreu que seu marido a trata como um ser inferior porque 
você aceita isso? Você é realmente firme em suas convicções? Se é 
assim, então não deve aceitar os preconceitos dele. Aceitando a 
maneira como seu marido a trata, você está demonstrando a seu 
filho que as mulheres são de fato inferiores. É bem possível que, em 
vez de mudar seu filho, você deva mudar a si mesma. 
Estes pontos de vista, prejudiciais como são, distanciam os pais e 
põem os filhos na roda. Conduzem a tentativas de adivinhar o 
pensamento e o desejo do outro, o que é uma calamidade no 
casamento. Se você e seu cônjuge tiverem a coragem de se auto-
analisarem e se conseguirem aceitar a lógica dos pontos de vista 
alternativos, estarão prontos para um confronto de pessoa a pessoa. 
Abrir o jogo amedronta. Contudo, isso não somente impedirá o 
futuro desenvolvimento da SPP, como também dará vitalidade ao 
casamento. 
Se abordarem o tema das queixas implícitas e planos ocultos, você e 
seu cônjuge provavelmente brigarão. Um despejará as próprias 
frustrações sobre o outro, criando tensões momentâneas, 
aparentemente insuportáveis. A fim de tornar essas brigas 
produtivas, será necessária uma orientação que reduza as 
possibilidades de piorar a situação. Sugiro a aquisição de um livro 
 
escrito por um médico que já ensinou a milhares de casais a arte e a 
técnica da "briga honesta". 
Como todos os livros que tratam da auto-ajuda, The ln-titnate Enemy 
pode ser mal utilizado. Se você brigar com seu parceiro sem estar 
motivada para uma reconstrução conjugal, nada feito. Todavia, se 
seu intuito é uma mudança construtiva, encontrará nesse livro uma 
galinha de ovos de ouro. Os autores chamam a atenção do leitor 
para o efeito das desavenças conjugais sobre as crianças ao 
afirmarem: "Os filhos são o alvo favorito quando um casal desloca 
os próprios problemas para outra pessoa. A maioria das brigas 
conjugais sobre os filhos, por exemplo, não têm nada a ver com os 
filhos. A discordância é entre os pais; a criança é apenas o pretexto 
para tal discordância". 
Se você resolver servir-se deste livro para ajudar-se a brigar 
racionalmente, eis alguns conselhos retirados do trabalho do Dr. 
Bach: 
• Você deve declarar suas preocupações e desagrados de acordo 
com suas crenças e sentimentos pessoais. Coloque sua posição com 
toda a clareza possível. 
• Uma "briga honesta" tem o sentido de uma discussão séria e 
conduzida de maneira adulta. 
• Não tenha medo de expressar seu desagrado e sentimentos de 
raiva e de insatisfação. Amar é fácil: difícil é aprender como brigar 
racionalmente. 
• Evocar fatos passados pela única razão de ferir o parceiro é 
injusto e desastroso. 
• Cuidado ao colocar suas reclamações relativas a questões sexuais. 
Elas geralmente são colocadas de modo inadequado. 
• Ouvir é um fator crítico na briga honesta. "O que você está 
tentando me dizer?" "O que você quis dizer com isso?" "Deixa ver se 
eu entendi. Você disse que. . ." são boas técnicas que favorecem o 
bom ouvir. 
 
• Se suas brigas não produzem resultados ou se vocês só se 
magoam mutuamente, procurem um terapeuta de casal que os 
assista nessas brigas. 
No aconselhamento de casais, elaborei outras sugestões que se 
podem adicionar às sugeridas pelo Dr. Bach. 
• Não force uma solução de assuntos que envolvam sentimentos. 
Algumas emoções não se prestam a mudanças; apenas devem ser 
compreendidas e aceitas. 
• Muito cuidado com a expressão "Sinto que. . ." Ela serve mais 
para ocultar que para esclarecer as emoções. Isto é, é impossível 
sentir "que"; o que você sente é raiva, tristeza, decepção, alegria, 
confusão etc. Quando seu parceiro introduz os próprios sentimentos 
dizendo "Sinto que. . .", fala de algo que não é sentido. Não entre 
nessa. Responda-lhe dizendo: "Fale-me o que você sente, não o que 
você pensa". 
• Ouvir seu parceiro é fundamental. Igualmente o é ouvir-se. Uma 
forma de verificar sua capacidade de ouvir-se é perguntar ao 
parceiro: "O que você me ouviu dizer-lhe?" Outra forma é praticar o 
ouvir-se, quando em companhia de gente amiga disposta a ajudar. 
• Se você "engasga" quando tenta enfrentar seu parceiro, escreva 
lembretes que ajudem você a colocar sua posição clara e 
inequivocamente. 
• Evite tentar adivinhar os pensamentos do outro. Atenha-se aos 
pronomes "eu", "me" e "mim", em vez de "você". Não diga a seu 
parceiro o que ele está pensando ou sentindo: isso é da 
responsabilidade dele. 
• Eis algumas palavras introdutórias úteis: 
Ao introduzir um problema, diga: "Quero discutir com você ". 
"Quando você faz isso, sinto... 
 ". "Peço que você ".... 
Para responder, diga: "Quando você diz isso, sinto .... 
 
... ". "Minha intenção é ". "Farei (ou não) o que você está 
pedindo". 
• Não force uma discussão geral dentro de um curto espaço de 
tempo. Deixe seus sentimentos e pensamentos emergirem 
espontaneamente, em vez de tentar colocá-los como eles "deveriam" 
ou "teriam que" aparecer. 
Outra coisa que aprendi relacionada aos pais das vítimas da SPP 
não é muito agradável, mas verdadeira: Em geral é a esposa quem 
precisa iniciar a discussão relativa à discórdia conjugal. 
As mulheres costumam estar em maior contato com (não 
necessariamente com maior controle sobre) suas emoções. Como 
mulher, você provavelmente foi ensinada a aceitar suas emoções e a 
dispor-se a compartilhá-las. Pode até ter chegado ao extremo de 
pensar com o coração. Se você é do sexo masculino,provavelmente 
aprendeu a reprimir suas emoções a ponto de converter 
instantaneamente seus sentimentos em idéias. Você sente com o 
cérebro. 
O desnível entre pensamento e sentimento nunca é tão aparente 
como no momento em que os pais se defrontam com a presença da 
Síndrome de Peter Pan. O pai crê que o problema só pode ser 
solucionado com uma lógica fria e eficaz. A mãe, por outro lado, vê-
se inundada pela dor emocional, e sente-se tão avassalada que se 
perde num sentimentalismo excessivo. A mãe critica o pai por não 
ter sentimentos; o pai acusa a mãe de histeria. Ambos vêem-se 
impotentes para resolver o problema. 
Infelizmente as pessoas em geral precisam chegar a um ponto de 
grande sofrimento emocional para se arriscar a mudar a situação. 
Instintivamente sabem que, para haver mudança, as coisas terão de 
piorar antes de melhorar. Visto que a mulher é mais apta para 
perceber o sofrimento da dinâmica familiar, provavelmente será ela 
quem começará a denunciar a situação. 
 
Esta realidade muitas vezes faz com que as mulheres expressem 
ressentimento em relação aos maridos por serem "frios e 
insensíveis". Elas não só se magoam pelo acúmulo de sentimentos 
negativos, como também se irritam por sentir que a pessoa que 
supostamente as ama lhes mentiu. Se você se sente traída pela falta 
de envolvimento de seu marido, leve em conta esta possibilidade: 
existem muitos homens que adoram a esposa e os filhos, mas 
perderam o contato com suas emoções. Embora possa parecer 
estranho, esses homens verdadeiramente não sabem o que sentem. 
Muitos pais de vítimas da SPP padecem da mesma espécie de 
impotência emocional apresentada por seus filhos. Esses homens 
ficaram circulando pela periferia da legião de Peter Pan por muitos 
anos. A única coisa que os impede de se engajarem completamente 
nessa legião é sua capacidade de trabalho. Se, por um lado, a 
dedicação ao trabalho pode levá-los a excessos, por outro, ela lhes 
proporciona um motivo de orgulho; infelizmente, em geral, é a 
única coisa de que se podem orgulhar. 
Se essa descrição se aplica a seu marido, você desejará mais detalhes 
sobre o que fazer para modificar o relacionamento. Dado que este 
capítulo tem como objetivo as relações entre pais e filhos, sugiro que 
você estude meticulosamente o próximo capítulo, onde volto minha 
atenção para as esposas e amantes das vítimas da SPP, pois se você 
é esposa e mãe, é possível que, ao menos na área emocional, você 
esteja ligada a duas vítimas da Síndrome de Peter Pan. 
COMO AJUDAR A VÍTIMA DA SPP 
Tendo confrontado o problema da comunicação em seu casamento, 
concentre-se nas crianças. Apesar de este livro dedicar-se à ajuda às 
vítimas da SPP, muitos dos conselhos que se seguem aplicam-se a 
todos os jovens. Tendo isso em mente, preste atenção a seu filho 
mais velho ou a outro que exiba os comportamentos descritos nos 
Capítulos 3 a 8. Se o menino contar menos de dezesseis anos, 
 
concentre seus esforços na área preventiva; se ele estiver com mais 
de dezesseis, insista nas medidas "curativas". 
Por que dezesseis anos? Atingindo essa idade, a vítima da SPP já 
desenvolveu grande irresponsabilidade e passou por muitos anos 
de uma ansiedade crescente. Encontrou refúgio nos pertences de 
um grupo de amigos que provavelmente têm mais influência sobre 
ele do que você. A inflexibilidade associada ao conflito referente ao 
papel sexual isola-o. Ainda que você promova uma guinada de 180° 
em seu relacionamento, e elimine toda a tensão no lar, pode ser 
tarde demais. É possível que ele tenha aprendido a ignorá-la. 
Entretanto, se ele ainda não tiver desenvolvido todos os sintomas 
(por exemplo, tenha um bom emprego regular), talvez você ainda 
possa impedir o aparecimento do narcisismo e do chauvinismo. 
Você só descobrirá isso, tentando. Assim, se uma vítima da SPP está 
perto dos dezesseis anos, são grandes as chances de ela se engajar 
na legião dos meninos perdidos. Utilize tanto as medidas 
preventivas como as "curativas". Procure seguir todos os meus 
conselhos para encontrar a combinação mais eficaz para seu filho. 
 
RETOMANDO OS PRINCÍPIOS BÁSICOS 
Independentemente da idade e do sexo de seus filhos, é reco-
mendável que você se familiarize com meus princípios funda-
mentais de educação. Estas dez normas dão aos pais a base para a 
prevenção de problemas ou para seu tratamento. Emprestam 
consistência e respeito à autoridade parental, funcionam no sentido 
de corrigir a irresponsabilidade e promovem segurança no lar. Você 
perceberá também que elas oferecem um conveniente meio termo 
estimulador da concordância entre pais que discordam sobre o 
modo de educar os filhos. 
Apresentarei cada princípio e depois darei um exemplo de como a 
norma pode ser usada para impedir o desenvolvimento da 
Síndrome de Peter Pan. 
 
1 . A comunicação pode evitar problemas; a ação soluciona-os. 
Nos últimos vinte ou trinta anos, especialistas em educação levaram 
os pais a acreditar que conversar é a melhor estratégia a ser 
utilizada quando se encara um problema. Não é. A troca de idéias e 
a partilha de sentimentos, ou as explicações sobre as causas e os 
motivos podem auxiliar a criança a aprender a partir de erros, mas 
só depois de a turbulência emocional da situação ter decrescido. As 
tentativas de comunicação racional no meio de um problema 
tendem a piorar as coisas. Quando os pais enfrentam um problema, 
falar dele pouco adianta. A ação resolverá o conflito, dará uma lição 
relevante e abrirá caminho para uma comunicação efetiva. 
Sempre que penso neste princípio, ocorre-me a cena de uma jovem 
mãe com um filho de quatro anos, que berrava no mercado porque 
ela não queria comprar-lhe um bombom. 
O menino se põe no meio do corredor com os lábios trêmulos e o 
rosto cheio de lágrimas. A mãe se agacha e tenta fazê-lo raciocinar. 
Ela explica o efeito negativo do açúcar ou diz que os outros garotos 
rirão dele por comportar-se desse jeito (o que é um perigosíssimo 
uso da pressão grupai). Em vez de escutá-la, ele grita mais alto. Não 
há como comunicar-se com uma criança zangada. A melhor 
alternativa para a mãe é agir. 
Muitas mães batem na criança nessa situação. Essa opção não me 
agrada muito. Sugiro que a mãe simplesmente deixe de ouvir a 
criança, encaminhando-se para outro corredor. O que quer que faça, 
a mãe deve suspender a comunicação com a criança até que ela se 
acalme o bastante para poder ouvir qualquer coisa. 
 
2. Algumas regras são negociáveis, outras não. 
Todo lar deve ser regido por algumas regras que garantam a 
manutenção de princípios morais racionais e razoáveis. Costumo 
encorajar os pais a discriminar entre regras negociáveis e não-
 
negociáveis. As últimas são absolutas e inflexíveis. Por exemplo: o 
desrespeito é inaceitável, a mentira e a trapaça são inadmissíveis. 
Não há lugar para exceções quando se trata de uma norma não-
negociável. Sua violação sempre resulta em alguma ação disciplinar. 
As normas negociáveis são abertas às discussões, mudanças e 
exceções. O horário de chegar a casa em geral depende do tipo de 
atividade; o horário de ir para a cama pode ser flexível se a criança 
mostrar que sabe cuidar-se; privilégios extras podem ser concedidos 
se seu desempenho escolar for melhor. Os pais detêm o poder de 
veto no tocante a todas as regras, mas são levados a transigir de 
acordo com o grau de responsabilidade da criança ou do jovem. 
Uma das coisas que impedem o desenvolvimento da SPP é o traço 
de submissão positiva. Todos temos de aprender a nos submeter a 
certas realidades da vida de maneira positiva; quer dizer, aceitar a 
limitação, mas fazer por ver seu lado positivo. A distinção entre 
regras negociáveis e não-negociáveis ajuda a criança a aprender a 
submissão positiva. 
Se seu filho aprender a se submeter à imperiosa natureza de certas 
regras e for recompensado com um grau crescentede liberdade 
quando apresentar uma negociação positiva, estará preparado para 
lidar com assuntos escolares entediantes, com empregadores 
injustos ou desonestos, e com qualquer pensamento mágico que se 
imiscua em sua alma adolescente. A tolerância à frustração e o 
controle de impulsos são duas resultantes realísticas da distinção 
entre regras negociáveis e não-negociáveis. 
3. Se os filhos são responsáveis (cumprimento de horários, 
maneiras, tarefas, boas notas e uso adequado do dinheiro), 
os pais não devem interferir. 
Este princípio é uma ramificação do princípio 2. Se seu filho mostra 
comportamento responsável em áreas críticas da vida (a experiência 
me ensina que as cinco áreas enunciadas acima são as mais críticas), 
 
você deve mostrar-se mais transigente e propiciar-lhe a 
oportunidade de gozar de maior liberdade. 
Este princípio permite a você confrontar um filho irresponsável em 
seu comportamento, lembrando-lhe que a razão de você interferir 
em sua vida é que ele não sabe cuidar bem dela. Do mesmo modo, 
possibilita a você dizer-lhe que, se ele melhorar seu desempenho, 
você se sentirá feliz em deixar de imiscuir-se em suas coisas. 
Esta postura reduz o conflito, as discussões e a hostilidade que 
freqüentemente surgem quando se tenta disciplinar um filho mais 
velho. A experiência me ensina que este princípio exerce maior 
impacto sobre a irresponsabilidade do que qualquer outra 
estratégia. 
4. Uma boa punição tem pouca duração e não se repete com freqüência. 
Essa é a recompensa da punição. 
Se você impõe uma punição após outra, ou se pune a criança por 
um extenso espaço de tempo, corre o risco de punir-se mais que à 
criança e de reduzir o efeito e o significado das punições. E também 
estimula desnecessários sentimentos de vingança e de rebelião. 
Um bom exemplo de como esse princípio pode ser implementado é 
o seguinte: digamos que seu filho chega a casa tarde e mente ao 
dizer-lhe onde esteve. Em vez de proibi-lo de sair por duas 
semanas, imponha-lhe um castigo de maior intensidade e menor 
duração. Supervisione pessoalmente uma hora do trabalho 
doméstico que você lhe impôs (limpar os armários da cozinha, por 
exemplo). Além disso, faça-o saber que nessa noite não haverá para 
ele nem televisão, nem som, nem telefone. Terá também de ir para a 
cama uma hora mais cedo. O castigo pela violação do horário 
estabelecido e pela falta de respeito (mentir) termina num ou dois 
dias. Depois a criança pode voltar à sua liberdade. 
Se esse castigo precisa ser repetido freqüentemente, quer dizer que 
não está funcionando. Talvez alguma outra coisa esteja acontecendo 
 
(ansiedade, por exemplo), e você deverá avaliar o ambiente da casa 
para remediar as causas da perturbação do garoto. 
 
5.Em geral as queixas infantis são verdadeiras ("Isso não 
é justo. Todo mundo pode fazer isso, só eu não.") 
Respeite, mas não capitule. 
Quando você tiver de tomar uma atitude antipática em determinada 
circunstância, não espere uma submissão sem queixas por parte de 
uma criança ou de um jovem inteligente. Injustiça, conformismo e 
falta de compreensão são alguns dos tópicos que se prestam a 
protestos verbais. Ao ouvir uma reclamação, lembre-se de que 
provavelmente há um ponto de verdade no que diz seu filho. 
Permaneça calma e procure utilizar a reclamação para iniciar uma 
troca positiva de idéias. 
Este princípio é especialmente útil quando se lida com crianças no 
início da adolescência. Por exemplo: "Isso é injusto" é uma queixa 
que forçosamente você ouvirá sempre que tomar uma decisão 
antipática para elas. Em vez de censurar o garoto por lhe responder, 
escute-o e aceite o núcleo de verdade que há na reclamação. Do 
ponto de vista dele, provavelmente você está sendo injusta. Admita isso, e 
então, se ele a estiver ouvindo, poderá mostrar-lhe que uma mãe 
que ama seu filho precisa tomar decisões para o bem-estar dele. 
Tentará explicar que essas decisões, difíceis de compreender na 
idade dele, provocam uma compreensível impressão de injustiça. 
Isto, contudo, não modifica sua decisão. 
6.A criança adquire confiança e auto-estima mediante 
limitações razoáveis e disciplina racional. 
Com o objetivo de fomentar nos filhos um autoconceito positivo, 
muitos pais acreditam que devem ser os melhores amigos da 
criança, não impondo limites e garantindo que ela esteja sempre 
feliz. Isso é falta de realismo. 
 
A criança precisa de pais; amigos, ela os achará em outra parte. As 
limitações induzem a criança ao autocontrole, indispensável para 
seu desenvolvimento sadio. O fracasso é parte da vida, bem como a 
tristeza. Nossos filhos precisam aprender a fracassar e a se sentir 
tristes, sem cair na autocomiseração nem na depressão. 
Se existe um meio de prevenir a Síndrome de Peter Pan, ele se 
encontra neste princípio. Faça a criança entender que você será legal 
com ela, contanto que ela se mantenha dentro dos limites 
estabelecidos. A criança em idade escolar pode aprender a controlar 
suas frustrações, tendo que preparar toda a lição de casa antes que 
lhe seja permitido ir brincar. E durante toda a vida ela poderá ser 
ajudada a tolerar o fracasso e a tristeza recebendo calor humano e 
ternura, sem manifestações de compaixão nem qualquer tratamento 
especial que se traduzem em expressões como: "Coitadinho. Sinto 
tanto por você!" 
7. Os pais reduzem a influência da pressão grupai tomando 
resoluções conforme sua consciência, não pelo conformismo. 
Se você se lembra da mensagem fundamental do Capítulo 5, está 
ciente de que a redução da influência da pressão grupai é 
absolutamente essencial para prevenir a Síndrome de Peter Pan. 
Nunca é cedo demais para exercitar a própria consciência no que 
tange à tomada de decisões. Infelizmente é habitual que isso ocorra 
tarde demais, isto é, depois de o filho adolescente ter optado pelas 
fórmulas impulsivas do grupo de amigos que se sobrepõem à 
sensatez dos pais; então a possibilidade de instilar nele o senso de 
individualidade restringe-se seriamente. 
Reduzir a pressão grupai na vida de seu filho é controlá-la na sua. 
Você se refere a outras crianças ou jovens ao julgar o 
comportamento de seu filho? Você critica seu marido por seu não-
conformismo diante dos filhos? Você baseia suas decisões em 
fatores externos influentes (televisão, jornais, revistas) ou naquilo 
 
que lhe parece ser certo ou errado? As opiniões de outros adultos 
impedem-na de disciplinar seus filhos em público? 
Estas questões devem induzir a um auto-exame. Se você baseou 
suas decisões no conformismo e não em sua consciência, 
seguramente ensinou seus filhos a fazerem o mesmo. Na próxima 
vez em que ouvir: "Mas mamãe (papai), todo mundo faz isso", 
responda: "Pode ser, mas isso não é razão para você fazê-lo". 
 
8. As crianças são fortes e criativas. Os pais podem 
se deliciar com suas manipulações. 
As crianças são muito mais ardilosas do que imaginamos. A atual 
geração é mais nutrida e criada que as anteriores. 
Nossas crianças são mais inteligentes e criativas. Conseqüente-
mente, em geral, testarão os limites da autoridade à procura de uma 
moralidade sólida que as conduza através de uma vida difícil e 
muitas vezes perigosa. 
Pode acontecer que os pais se deliciem com as manipulações 
infantis. Elas indicam que seus filhos são sadios e experimentam as 
fronteiras do poder de seus egos. Este princípio também lhe lembra 
a importância de prosseguir com suas normas morais, assegurando 
que sua palavra seja seu compromisso. 
Não importa qual a idade de seus filhos; deixe claro que você 
acredita na força deles e que eles devem fazer o mesmo. Mostre um 
pouco de compreensão e de ternura diante da "audácia" deles. Não 
grite, não condene. Eles podem estar apenas procurando alguém 
que lhes ensine o autocontrole. Você pode ser esse alguém. 
 
9. As famílias que trabalham e se divertem juntaspermanecem juntas. 
Em toda família onde a SPP floresce, existe uma atmosfera tensa. A 
tensão tem raízes na discórdia conjugal e se ramifica pelas explosões 
diárias de negativismo. Se há tensão em sua casa, você sabe que sua 
 
família raramente consegue estar junta sem que haja alguém 
provocando alguém e todos acabem nervosos. 
Para reverter esta atitude negativa, a família deve envolver-se em 
alguma atividade de que todos gostem. Ir ao cinema, jantar fora, 
visitar museus, assistir a eventos esportivos podem ser o estímulo 
para uma experiência familiar positiva. 
Mesmo que seu cônjuge não ajude, ainda há esperanças de 
mudança. Comece pelo almoço de domingo, onde todos deverão 
estar presentes, e não tolere nenhuma atuação negativa. Se algum 
dos filhos não se comportar, mande-o deixar a mesa e proiba-o de 
sair nesse dia. Talvez demore, mas esforce-se por envolver a família 
em trinta ou quarenta minutos de conversa agradável. Durante este 
processo de reversão, talvez você nem sempre tenha êxito 
(especialmente se não puder contar com ajuda); porém, pelo menos, 
controle qualquer,negativismo a fim de evitar que a situação, já 
ruim, piore ainda mais. 
10. Não doutrine, dê o exemplo; são suas ações, não suas palavras que 
ensinarão. 
Muitos pais substituem as ações pelas palavras, acreditando poder, 
por meio delas, "converter" os filhos. São eles, os pais, que carecem 
de autodisciplina em suas atividades pessoais. Se bem que a maioria 
não se enquadre no perfil da SPP, também eles não amadureceram. 
Alguns deles foram criados em lares sem limitações. Seus filhos 
representam uma segunda geração de permissividade. As crianças 
não gostam de impor restrições a seus impulsos; o pior é que seus 
pais também não sabem como fazê-lo. Os pais dão o exemplo, 
falando de uma forma e comportando-se de outra. Em geral os 
filhos seguem-lhes o exemplo. Resultado: cegos conduzindo cegos. 
Se você tiver a coragem de admitir que desconhece os rudimentos 
da autodisciplina, terá de empenhar-se para consegui-lo. Em vez de 
culpar seus próprios pais, dirija sua atenção para a tarefa de 
amadurecer. Não demorará muito, necessariamente. Se se esforçar, 
 
talvez em alguns meses consiga recuperar os anos perdidos. Caso 
esteja incerta quanto ao modo de pôr isto em prática, tenho uma 
sugestão: os mesmos princípios básicos utilizados na educação de 
seus filhos podem servir para promover seu próprio crescimento. 
ABAIXO DE DEZESSEIS ANOS 
Vimos como seis sintomas — cronologicamente: irresponsabilidade, 
ansiedade, solidão, conflito referente ao papel sexual, narcisismo e 
chauvinismo — combinados resultam no gradual desenvolvimento 
de sete traços psicológicos observáveis. Ao oferecer estratégias 
específicas de prevenção, apresentarei conselhos que visam à 
eliminação desses traços. Dado que esta parte se relaciona com a 
vítima de menor idade, minhas recomendações se concentrarão no 
combate à influência dos quatro alicerces da SPP: a 
irresponsabilidade, a ansiedade, a solidão e o conflito referente ao 
papel sexual. 
A menos que haja outra indicação, cada uma de minhas 
recomendações deve ser seguida pela mãe e pelo pai de forma 
idêntica. Algumas das sugestões requerem diferentes posturas por 
parte deles (mãe e pai). 
 
Impotência Emocional 
Corte imediatamente todas as mensagens ocultas. Explique à 
criança que as mensagens passadas estavam erradas e que ela não 
deve preocupar-se em proteger a mãe e o pai. 
Elimine o negativismo que paira nas reuniões familiares, ainda que 
para isso tenha de suspender qualquer atividade em família. 
Não se aborreça quando seu filho exprimir descontentamento 
diante de uma decisão sua. Contanto que ele mostre um certo 
controle, ignore suas exibições de desagrado. 
Pai: Não responda com frases triviais à manifestação de sentimentos 
de seu filho. Encoraje-o a expressar suas emoções honesta e 
 
abertamente. Ajude-o, expressando seus próprios sentimentos de 
modo maduro. Mostre-lhe que é normal experimentar uma 
variedade de emoções. 
Mãe: Pare de sentir pena de seu filho. Também não lhe passe a 
noção de que ele deve usar seus sentimentos para obter favores 
especiais. 
Procrastinação 
Designe tarefas a serem desempenhadas por seu filho e reforce as 
regras com uma disciplina que o faça responsável pelo desempenho 
do serviço (ver pág. 192). 
Não se permita uma segunda advertência. Uma vez dada uma 
ordem, após a primeira advertência ponha em prática o "ou então..." 
Não tente forçar a criança já crescida, ou adolescente a estudar. 
Determine um horário para o estudo e responsabilize-a pelas notas 
obtidas. 
Pare de fazer as coisas por seu filho pelo motivo de ser trabalhoso 
demais; obrigue-o a fazê-las. Não o poupe da responsabilidade. 
Reduza a mesada dele a um mínimo (preferivelmente a zero) à 
medida que ele se aproxima da adolescência. Ensine-o a ser 
responsável, ajudando-o a substituir a mesada por algum emprego 
ou atividade remunerada. 
Uma vez que seu filho tenha resolvido dar início a algum projeto 
(aulas de música, de tênis etc), não lhe permita desistir até haver 
começado com êxito outro projeto equivalente; se de qualquer 
modo ele desistir, deve ter sua liberdade e privilégios reduzidos até 
retomar os compromissos que assumiu. 
Pai: Ensine seu filho a estabelecer objetivos e a planejar e avaliar o 
resultado. Mostre-lhe seu método de solução dos problemas. Isso, 
além de propiciar-lhe uma lição valiosa, diminui a distância entre 
vocês. 
 
Mãe: Abandone o uso não-intencional de mensagens geradoras de 
sentimento de culpa. "Você gosta de me ver sofrer", "Você nunca me 
ajuda" e "Você não imagina como isso me machuca" são desabafos 
causadores de sentimento de culpa, de desespero ou de atitudes do 
tipo "Pouco estou ligando. .." 
Pressão Grupal 
Não rebaixe os amigos de seu filho, nem o compare a meninos 
"bonzinhos". 
Se ele escolhe "más companhias", tente entender por que faz isso. Se 
você descobrir por que seu filho necessita de um certo tipo de 
amigos, talvez possa ajudá-lo a ultrapassar qualquer fraqueza que o 
leve a essa escolha. 
Siga sua consciência ao explicar a razão da tomada de determinadas 
decisões. Cuide de não se deixar influenciar pelas opiniões de 
outros pais (ver Retomando os princípios básicos 7, pág. 195). 
No que concerne à individualidade, adote a seguinte regra: todos os 
filhos em idade escolar devem exercer alguma atividade 
extracurricular que favoreça o desempenho pessoal (tênis, corrida, 
natação, ginástica, dança, teatro etc). Deixe que cada um escolha a 
atividade que lhe convier. 
Use a seguinte norma para evitar brigas entre os irmãos: se algum 
não se comportar bem com os outros irmãos ou com as irmãs, 
deverá ser-lhe vedado o contato com os amigos. Assim, ser-lhe-á 
proibido sair ou falar com eles pelo telefone, até que faça alguma 
coisa agradável para compensar seu mau comportamento. Partilhe 
com seus filhos suas opiniões referentes a assuntos sociais e 
políticos. Encoraje-os a dar suas opiniões a respeito dos assuntos 
que lhes interessam. Procure que se envolvam nas atividades da 
comunidade. Se não tiver tempo para mais, o mínimo que você 
pode fazer é votar em todas as eleições. Se possível, leve seus filhos 
 
aos locais de votação e deixe-os observar (em silêncio) como você 
exerce seus deveres cívicos. 
Reduza o consumo de bebidas alcoólicas. Destaque os aspectos 
sociais da amizade. Seus filhos devem perceber uma clara distinção 
entre o "social" e a bebida. O mínimo que você pode fazer a esse 
respeito é conversar com seus convidados por alguns instantes 
antes de perguntar: "O que você vai beber?" 
Conflito Sexual 
Providencie para que seu filho receba informações acuradas sobre o 
sexo. Para ajudar a esclarecê-lo em suas conversas, seria bom você 
familiarizar-se com a leitura de livros sobre educação sexual.Ensine a seu filho que conversar com pessoas do sexo oposto é mais 
importante (e mais difícil) que tocá-las. 
Descubra o que seu filho está aprendendo nas aulas de Educação 
Sexual, na escola. Verificar a lição de casa proporciona a você uma 
situação favorável para fazer perguntas e avaliar o nível de 
informação adequada que ele adquiriu. 
Proíba o namoro antes dos quatorze ou quinze anos. 
Fique de olho na espécie de filmes e programas de televisão a que 
ele assiste. Quando você notar que atitudes irrealísti-cas são 
apresentadas como normais, questione-as. Por exemplo, em muitos 
desses programas transmite-se ao rapaz a noção de que um busto 
grande é absolutamente imprescindível para um bom 
relacionamento. 
Pai: Não tente reviver sua juventude mediante uma atitude 
saudosista, fazendo perguntas a seu filho sobre possíveis 
namoradas. Abrace e beije sua esposa diante dele. Fique de mãos 
dadas com ela em situações sociais em família. 
Pensamento Mágico 
Ensine a seus filhos a diferença entre explicações e desculpas. As 
crianças explicam as circunstâncias; os pais desculpam o mau 
 
comportamento. Quando as crianças forjam uma explicação e 
automaticamente pensam ter aí uma desculpa, começam a acreditar 
na magia do pensamento. 
Ajude seus filhos a aprenderem a conviver com o fracasso. Quando 
eles enfrentarem alguma decepção, mostre paciência, não pena; e 
não os isente das regras de conduta moral. Tenha isto em mente: "É 
triste sofrer, mas não se esqueça das regras". 
No exercício de sua autoridade, não fale demais. Se você discursar, 
discutir ou argumentar, estará ensinando a seus filhos que eles 
podem fazer as regras desaparecerem magicamente, manipulando 
as palavras. 
Cuidado com as queixas deste tipo: "Se não fosse por. . ." Esta é uma 
fórmula mágica que implica a transferência da culpa de um fracasso 
para outra pessoa. O melhor que você pode fazer é ajudar a criança 
a encarar bem o problema, e ver como ela deve agir paia superar 
qualquer adversidade que tenha de enfrentar. 
Conflito com o Pai 
Pai: Informe-se bem sobre as normas que governam a casa e use de 
autoridade sempre que necessário. Não tente ganhar concursos de 
simpatia, tentando sempre ser visto como o cara legal da família. 
No trato com seu filho, faça coisas que agradem a você e a ele. Não é 
preciso gastar grandes somas de dinheiro para ter um bom 
relacionamento. O segredo é ambos se apreciarem mutuamente. 
Conte-lhe algumas passagens constrangedoras de seu passado. 
Deixe-o ver o lado humano de seu pai. 
Poupe seu filho de qualquer atitude chauvinista porventura ainda 
presente em você. 
Mãe: Nunca diga: "Espere até seu pai chegar!" 
Além de suprimir todas as mensagens ocultas, não faça seu filho 
partilhar de seus problemas conjugais. 
Conflito com a Mãe 
 
Mãe: Poupe seu filho do papel estereotipado de mulher do lar. 
Ensine-o a cozinhar, a costurar e lavar roupa; ele poderá necessitar 
desses conhecimentos de sobrevivência. 
Dedique a si mesma parte de sua vida, independentemente dos 
filhos. Do contrário poderá cair numa atitude de mártir e de 
superprotetora. 
Esteja particularmente atenta para não implantar nem encorajar 
normas absurdas. 
Poupe seu filho das atitudes femininas chauvinistas. Elas 
complementam o ponto de vista do chauvinista. "Quem manda é 
seu pai" e "Os homens não têm nada a ver com serviço de casa", são 
exemplos dessas atitudes. 
Pai: Além de suprimir todas as mensagens ocultas, não faça seu 
filho partilhar de seus problemas conjugais. 
Ajude seu filho a lidar com os próprios sentimentos e atitudes, no 
processo de experimentação de autonomia em relação à mãe. 
É bom que seu filho aprecie sua masculinidade; porém não tema 
buscar apoio, compreensão e ajuda em sua esposa. 
Se você tiver casos extraconjugais, poupe a seu filho o conhecimento 
deles (embora provavelmente ele sinta que há algo errado). 
Mãe: Jamais transmita a seus filhos informações, boas ou más, sobre 
sua vida sexual. 
Vista-se com relativa discrição. 
ÀS MÃES QUE BATALHAM SOZINHAS 
Minha experiência ensina que a primeira pessoa a captar a situação 
problemática da vítima da SPP é sua mãe. Todavia, como o marido 
geralmente ignora suas preocupações e mantém distância em 
relação ao filho, seu diagnóstico é desprezado por ele, e tido como 
exagero. Se a mãe não consegue convencer o pai da necessidade de 
mudanças, ela está batalhando sozinha. 
 
Caso tenha sido impossível atrair a atenção de seu marido para os 
problemas familiares, não desista. Apesar de algumas coisas não 
poderem ser feitas por você sozinha, outras são factíveis e 
impedirão o desenvolvimento da SPP. As sugestões que se seguem 
destinam-se às mães que batalham sozinhas, seja por causa do 
divórcio, da morte do marido, seja no caso das mães solteiras, por 
nunca terem contado em casa com a presença de um pai. 
Procure um grupo de apoio. Tanto pode ser um grupo de pais 
patrocinado pela APM, a igreja ou algum posto de saúde mental 
local, como um grupo informal constituído por vizinhos e amigos. 
Não tenha vergonha de expressar suas preocupações; várias outras 
mães estão na mesma situação que você. 
 
E essa é a principal finalidade dos grupos de apoio: fomentar a 
esperança e a coragem pela partilha de experiências similares. 
Retome os princípios básicos. Revise meticulosamente meus dez 
princípios. Discuta a implementação deles no caso específico com 
seu grupo de apoio. Atente particularmente para os princípios que 
ajudam você a estabelecer normas sem discutir, nem argumentar, 
nem discursar. Se seu marido não cooperar com você, talvez ele 
possa no mínimo não atrapalhar. 
Faça algo por si mesma. Nada é mais eficaz contra a atitude de 
mártir do que fazer algo de que se gosta. Se você está vivendo com 
um homem que lhe parece estranho, precisa de uma atividade fora 
de casa para agüentar a solidão. Se não sabe por onde começar, 
garanto-lhe que muitas mães, em sua situação, têm tirado grande 
proveito de aulas de dança aeró-bica, de tênis e de expressão 
corporal, bem como da retomada de seus estudos. 
Procure ajuda especializada. Não é preciso ser desequilibrado ou 
louco para se procurar um terapeuta. Nem é necessário ser rico. 
Onde quer que você more, sempre haverá um profissional 
especializado em aconselhamento, e disposto a ouvi-la e a oferecer-
lhe auxílio. Muitas agências empregadoras desses terapeutas 
 
cobram uma taxa correspondente à sua renda. Não lhe faria mal 
nenhum experimentar. Talvez até consiga levar seu marido. 
ACIMA DOS DEZESSEIS ANOS 
Chegando à fase dos dezesseis anos aproximadamente, a vítima da 
SPP começa a desdenhar a autoridade dos pais. Se você não se 
mantiver firme, as estratégias preventivas provavelmente serão 
infrutíferas. O garoto ficará na expectativa de que você lhe dê o que 
ele deseja e não se meta na sua vida. Você não pode esmorecer, do 
contrário estará perdida. 
Admita seus erros. Sem esperar agradecimento nem aplauso. Eis 
uma forma apropriada: "Erramos em te dar tanto dinheiro e tão 
pouca atenção. Deixamos você nos dominar sem reagir. Por estas e 
outras coisas, sentimos muito. Desculpe". 
Depois de admitir seus erros, diga ao garoto que o ama e tentará 
ajudá-lo de todas as maneiras possíveis. Mas lembre-lhe que os 
problemas dele são dele só, e que você não assumirá a 
responsabilidade deles. Use estas colocações para introduzir as 
ações que você pretende executar a fim de ajudá-lo a sair da 
armadilha em que se meteu. 
Procure ajuda especializada. A partir dessa idade, a vítima da SPP 
precisa de aconselhamento ou de terapia. É certo que ele resistirá 
bastante e é possível que o tratamento não dê resultado (ver 
Capítulo 2). A fim de maximizar os efeitos positivos, leve em 
consideração estas sugestões: 
Procure o orientador da escola onde ele estuda. 
Este orientador deve ser de preferência do sexo masculino,dada a 
necessidade do rapaz de se aproximar de uma figura paterna, e 
tendo em vista sua ambivalência para com as mulheres. 
Dependendo da forma como trabalha o orientador, tente conversar 
com ele antes da entrevista com seu filho (mesmo que você tenha de 
ir sozinha). 
 
Explique a seu filho que ele vai conversar com o terapeuta sobre um 
problema familiar; isto é, sobre um assunto que interessa a todos. 
Prepare-se para ter que "forçar a barra" para que seu filho 
compareça às sessões. Clientes desmotivados não prometem bons 
prognósticos, mas ao menos o orientador terá uma chance de 
ajudar. (Falarei mais sobre esse "forçar a barra", logo a seguir). 
Estudo/Trabalho. Sinceramente creio que a melhor terapia do 
mundo é a combinação de estudo com trabalho. Se o garoto está nos 
estágios avançados da SPP, seu desempenho nessas áreas 
provavelmente é modesto. Pouca coisa lhe pode proporcionar um 
justo orgulho de si mesmo. Esforce-se ao máximo para reverter esse 
processo com estas sugestões: 
Ponha o rapaz num programa integral de estudo/trabalho. Se for 
um estudante de tempo integral, terá de obter o dinheiro para seu 
desfrute mediante um emprego de meio período. Se ele não estiver 
na escola, ser-lhe-á imposta uma taxa razoável para as despesas da 
casa. 
Não lhe adiante nenhuma soma a menos que ele tenha provado 
clara e consistentemente que paga seus compromissos em dia. 
Se ele está realmente se esforçando para encontrar um emprego, 
mas não consegue, você pode concordar em pagar-lhe uma 
determinada quantia em troca da prestação de serviços em casa. 
Não discuta com ele sobre dinheiro. Isto só inflamará sua raiva, e nada 
resolverá. 
Se ele está com problemas de estudo ou disciplinares na escola, 
fique na retaguarda, deixando-o arcar com a maior parte da 
responsabilidade. Nessa altura, contente-se com conceitos C. No 
semestre seguinte talvez você possa esperar um resultado melhor. 
COMPORTAMENTOS DESCONTROLADOS EM CASA 
Não o acorde de manhã, mesmo que isso implique a possibilidade 
de ele perder o emprego. 
 
Exija um relativo grau de limpeza e ordem em seu quarto. 
Determine um horário para ele chegar a casa (mesmo que ele tenha 
vinte e um anos e esteja pagando aluguel). Você poderá ser bem 
flexível na aplicação desse horário, se ele estiver se saindo bem nas 
áreas de estudos e de trabalho. 
Não tolere de forma alguma o abuso de drogas. Nem discuta o 
assunto. Diga apenas: "Sei que às vezes você bebe e fuma maconha. 
Mas se eu vir qualquer sinal disso aqui, serei forçada a tomar 
providências. Só porque você já tem alguma idade não quer dizer 
que vou deixar de ser sua mãe quando você resolve agir de modo 
irresponsável". 
Exija dele respeito e consideração pelos outros. Portanto, se ele não 
atender o pedido de abaixar o volume do estéreo e gritar "esse som 
é meu", desligue-o. 
Não lhe conceda uso ilimitado do carro. Enquanto ele morar em sua 
casa, você deve mostrar-lhe que tem algum controle sobre suas 
atividades. 
TOMA JEITO OU CAI FORA 
Sinto dizer que a maioria das recomendações transmitidas acima 
provavelmente não funcionará, especialmente se o rapaz tiver 
dezoito anos ou mais. Portanto você terá de pôr em prática um 
programa do tipo "toma jeito ou cai fora", concretizando sua decisão 
de não mais tolerar que ele continue se autodes-truindo dentro de 
sua casa. É aqui que entra o "forçar a barra" de que falei. 
Continue gradualmente com esse programa. Lembre-se de que você 
contribuiu para que ele chegasse à situação em que se encontra, e 
por isso dê-lhe tempo para tomar jeito. É muito conveniente jogar 
toda a culpa sobre o rapaz. Cômodo, mas não resolve. 
Fique atenta ao seu comportamento. Se você se preocupar em 
demasia com os sentimentos e motivações dele, ficará imobilizada. 
 
Embora você saiba que ele se sinta mal, isso não o exime da 
necessidade de corrigir-se. 
Informe-se com seu advogado sobre seus direitos e sobre as 
responsabilidades de seu filho. 
Se seu filho transgride repetidamente as normas estabelecidas para 
o trabalho, estudos, horários, tarefas, dinheiro e uso do carro, você 
será forçada a adotar medidas mais severas. 
Aplique a "resistência passiva". Não lhe faça a comida, nem lhe lave 
a roupa. Recuse-se a anotar recados telefônicos e dar-lhe dinheiro 
sob qualquer pretexto. Diga-lhe: "Não farei nada por você, se você 
não tomar jeito". 
Se isso não surtir efeito, transforme o quarto dele em quarto de 
costura ou de TV. Faça-o dormir na sala. 
Se tudo isso não for suficiente, proiba-o de entrar na casa. Se ele 
entrar à força, mande prendê-lo. 
Chegando a este ponto, configura-se a situação do "ou vai ou racha". 
Fique firme. Não volte atrás em sua decisão. 
Você poderá (se o orientador concordar) ser mais branda em 
algumas destas atitudes extremas, caso o rapaz decida com 
seriedade procurar aconselhamento. 
Muitos de vocês poderão achar estas recomendações duras demais. 
Talvez sejam. Mas peço-lhes que reflitam sobre o seguinte: se seu 
filho, a quem amam tanto, está lentamente (ou nem tanto) 
destruindo a própria vida, e essa destruição parece absolutamente 
inexorável, não vale a pena tentar tudo, até mesmo a prepotência, 
para salvá-lo? É claro que vale. O amor exige isso. 
 
APOIO DO SISTEMA 
Uma vítima da SPP não adota um estilo de vida prático apenas 
porque seus pais cometeram alguns erros. Outras pessoas respei-
táveis à sua volta contribuíram para sua desgraça. Tias, tios, primos, 
 
avós, professores, empregadores, ministros da igreja e vizinhos bem 
intencionados compõem um sistema cujos membros sem dúvida 
também cometeram erros. Eles provavelmente sentiram pena do 
menino, deram-lhe tratamento especial e uma infinidade de chances 
que só serviram para ensinar-lhe como manipular com mais 
eficácia. Esses componentes do sistema ao redor da vítima devem 
também ajudá-lo a recuperar-se. 
O sistema pode exercer um impacto positivo sobre a vítima da SPP 
apoiando o que vocês, pais, tentam fazer. Assim, o primo não deve 
convidar seu filho para ir ao bar. Os avós não devem arranjar-lhe 
dinheiro emprestado. A tia não deve brindá-lo com um "coitadinho" 
quando ele telefona lamurian-do-se. O chefe deve despedi-lo, se ele 
o merecer. O terapeuta deve enfrentá-lo se seu comportamento 
derrotista o exigir. Seu vizinho não deve alojá-lo na própria casa 
sem aprovação dos pais. Se apenas uma destas coisas acontecer, 
todo o programa de ajuda será sabotado. 
Como pais, a maior tarefa de vocês é implementar as reco-
mendações expressas acima. Entretanto, devem também procurar 
outras pessoas chegadas ao rapaz e explicar-lhes como podem 
ajudar. Peça-lhes que não atrapalhem o que você está tentando 
realizar. Convença-os de que está fazendo algo que não pode, de 
modo algum, deixar de ser feito. Induza-os a apoiar seus esforços e 
faça com que se conscientizem da importância deles. 
Tendo feito isso, você fez tudo o que era possível fazer. Apegue-se à 
esperança de que o jovem tirará proveito das duras lições impostas. 
Como já afirmei anteriormente, o melhor — e talvez o único — 
remédio contra o pó mágico é a realidade. 
Se você acha que seu filho pode estar se tornando uma vítima da 
SPP, insisto — tanto para seu bem como para o bem dele — em que 
tome medidas definitivas já, para interromper essa destruição sem 
sentido. Se seu marido é indiferente a suas preocupações, persuada-
o a ler este livro, especialmente os Capítulos 10 e 11. Será impossível 
que ele não tema o que aguarda seu filho no futuro. 
 
Um último conselho: não perca tempo afligindo-se com o 
sentimento de culpa. Isto só piora as coisas. Se seu filho foi 
capturado pela legião dos meninos perdidos, seja qual for a idade 
dele, aja de maneira a fazê-lo desertar. Seu filho não precisa de seu 
remorso. Ele precisa de sua ajuda. 
 
 
 
13 
Para Esposas e Amantes 
 
Wendy pula dacama com a intenção de abraçar Peter, porém ele recua; 
ele não sabe por que, mas sabe que tem que recuar. Durante toda a peça 
Peter não é tocado por ninguém. 
 
 
A narrativa de Barrie insinua que Peter é escravo de uma com-
pulsão. Inexplicavelmente ele se afasta de Wendy e de seu gesto 
afetuoso. Ela desejava consolá-lo; ele não podia permitir isso. Se 
você está apaixonada por uma vítima da Síndrome de Peter Pan, 
conhece a frustração experimentada por Wendy. Refiro-me às 
"regras de amor" da vítima. 
Mantenha distância. Não venha partilhar seus sentimentos até que 
eu lhe dê permissão. Não espere que eu partilhe meus sentimentos 
com você. Não desafie minhas idéias e crenças. Toque-me conforme 
minha disposição. 
Estas regras não-expressas matam a espontaneidade, ingrediente 
essencial num relacionamento afetivo maduro. O fato de serem não-
expressas dificulta a sobrevivência do amor; o fato de serem 
contraditórias inviabiliza-o. Como dar amor quando seu parceiro 
 
mantém em relação a você atitudes tão rígidas? Ou você se 
comporta de determinado modo, ou será rejeitada. Não fosse o fato 
de você se dar conta da pessoa que ele é em potencial, jamais 
toleraria suas manipulações infantis. 
Mas você as tolera, e como! E por isso contribui para seu próprio 
sofrimento. Essa é a má notícia. A boa é que você pode modificar as 
coisas. A vítima da SPP pode aprender a retornar da Terra do 
Nunca, porém necessita de um ponto de partida. 
Esse ponto de partida é a mulher que o ama. E você começará pelo 
plano de mudança delineado no Capítulo 2. 
O amor lhe dá a motivação para ajudá-lo. O plano lhe oferece a 
direção a seguir. Outro ingrediente necessário é a esperança. Dará 
certo? Valerá a pena? Algo no íntimo lhe diz que sim. Essa voz por 
vezes silencia, mas sempre torna a fazer-se ouvir. A mensagem 
completa é: junte-se a mim e tudo certamente melhorará. Você não 
precisa passar o resto da vida fazendo sempre a mesma coisa. A 
vida pode ser muito mais excitante e gratificante se você tiver 
coragem de mudá-la. A vozinha tem até um nome: Sininho. 
COMO TORNAR-SE "SININHO" 
Dois tipos de mulheres são atraídos pela vítima da Síndrome de 
Peter Pan. Na primeira categoria incluem-se aquelas submissas aos 
homens e propensas a assumir o papel de mãe protetora. Ela mesma 
é insegura; a dependência da vítima a faz sentir-se indispensável. 
Isso até lhe dá uma sensação (distorcida) de força. Suas relações 
sexuais com a vítima da SPP são ritualísticas e previsíveis; também 
terminam rápido. Ela não reconhece que a vítima é imatura, e 
convence-se de que seus problemas são normais. Ela se agarra a esse 
parceiro na crença de que sua vida amorosa melhorará. Mas não 
melhora. Chamo a esse tipo de mulher "Wendy". 
O outro tipo de mulher deseja espontaneidade, crescimento e 
adaptação mútua no relacionamento com um homem. Ela reconhece 
 
a imaturidade da vítima da SPP, porém sente-se atraída por sua 
atitude descompromissada. Ela também crê que o companheiro 
abandonará parte do comportamento pueril. Contudo, quando isso 
não acontece, ela não se agarra a ele. Rompe o relacionamento, 
desiludida e decepcionada. Nunca chega a entender bem por que o 
amor azedou tanto. "Sininho" é a denominação que dou a essa 
mulher. 
Se a vítima da SPP é um prisioneiro da Terra do Nunca, o mais 
freqüente é "apaixonar-se" por uma Wendy. Acostuma-se a ser 
mimado e amparado. Sua Wendy o protegerá de suas próprias 
inseguranças. Quando ele tiver um acesso de fúria ou se tornar um 
alcoólatra, ela compreenderá e aceitará. Ela o suportará porque ele 
precisa muito dela. Existem muitas Wendy nas reuniões dos 
Alcoólatras Anônimos. 
Se a vítima da SPP retorna da Terra do Nunca, procurará uma 
Sininho. Necessitará de seu amor maduro e de seu apoio, enquanto 
vai flexionando músculos emocionais até então desconhecidos. 
Quanto a Wendy, se ela passar a utilizar a carga elétrica adormecida 
em seu interior, poderá tornar-se uma Sininho. Se cansar de ser uma 
perpétua figura materna, desafiará o parceiro a mudar. Se ele não a 
atender, ela abandonará seu Peter Pan e procurará um homem que 
não tema ser uma pessoa inteira. É por isso que vários Peters Pans e 
Wendys acabam se divorciando, ao passo que ex-vítimas e Sininhos 
estão tão ocupadas em descobrir a vida que nem se ouve falar deles. 
Isto pode desagradar-lhe, mas se seu marido ou seu amante é vítima 
da SPP, com toda a probabilidade você é uma Wendy. Talvez nem 
sempre tenha sido Wendy; e pode existir em sua alma uma 
poderosa fagulha do espírito de Sininho. No entanto, se investiu 
tempo e energia num relacionamento com uma vítima da SPP, parte 
de seu subconsciente funciona segundo os padrões de Wendy. 
Em meu trabalho com esposas e amantes de vítimas da SPP, 
primeiramente focalizo os maus hábitos que elas possuem e que 
complementam os do parceiro e reforçam as coisas que ele faz. 
 
Encorajo-as a pôr em ordem sua própria vida antes de tentarem 
ajudar o companheiro. 
Há boas chances de você tornar-se uma Sininho, sem ter de terminar 
seu relacionamento. Como mencionei acima, assim como as 
Wendys, as Sininhos se sentem atraídas pela vítima da SPP por 
causa dos diversos aspectos positivos de sua personalidade. Não é 
preciso ignorar os aspectos positivos para poder lidar com os 
negativos. Todavia, aviso com antecedência: sua transformação em 
Sininho implicará uma sobrecarga em seu relacionamento atual. Se 
a vítima da SPP obteve um índice alto (digamos, acima de 25) no 
teste no Capítulo 2 e rejeitar sua ajuda, é possível que, por fim, você 
resolva romper o relacionamento. E então você compreenderá 
minha afirmativa de que não se pode mudar a vítima da SPP, pode-
se apenas ajudá-la. 
Seu próximo passo no processo de mudança, portanto, é discriminar 
as características de Wendy presentes em você. Isto para seu próprio 
crescimento e amadurecimento. O que, em si, é extremamente 
benéfico e trará inúmeras vantagens a longo prazo. Outra razão 
para você mudar é a necessidade de atrair seu marido ou amante 
para longe da Terra do Nunca, e levá-lo à realidade de que ele é um 
ser humano frágil e amoroso como todos nós. Isto o assustará; ele 
pode resistir. Será difícil e requererá muito esforço por parte de 
ambos. 
Se você resolver parar de ser a mãe de seu parceiro e se tornar uma 
Sininho, a mudança lhe fará bem, ainda que você perca o 
companheiro durante esse processo. Porém, se você pretende 
mudar com o propósito principal de ajudar seu parceiro, então 
continua fazendo o que faz há muito tempo, isto é, continua 
sacrificando-se por ele, e é isso exatamente o que ele espera de uma 
figura materna. Você simplesmente pula da frigideira para o fogo. 
AUTO-EXAME 
 
Eis um teste sobre si mesma. Para fazê-lo é preciso que você olhe 
com honestidade para dentro de si, procurando as características de 
Wendy. 
Quantas das seguintes afirmações se assemelham a coisas que você 
já pensou ou disse a alguma pessoa? 
1. Seu parceiro foi particularmente cruel, levando-a a dar-se conta 
de que a maltrata regularmente. Você pensa: "Só espero conseguir 
agüentar até que ele mude". 
2. Diante da idéia de ele abandoná-la, você pensa: "Não vou 
agüentar ficar sem ele de jeito nenhum". 
3. Ao considerar a idéia de um divórcio ou de uma separação, você 
pensa: "Se eu o deixar, será demais para ele". 
4. Alguém lhe pergunta se você trabalha e você responde: "Não, sou 
apenas dona-de-casa". 
5. Depois de relembrar a falta de consideração dele, sua recusa em 
partilhar seus sentimentos com você e suas frias exigências sexuais, 
você diz: "Ah, mas ele me ama tanto". 
6. Seu parceiro grita com você por ver a casa desarrumada — a qual 
ele nunca ajudou arrumar — ou porque não gostou da comida, e 
você diz: "Sei que a culpa é minha". 
7. Seu parceiro convida os amigos para ocasiões em que afirma 
desejar passar com você, e vocêdiz: "Que egoísta eu sou por ficar 
chateada!" 
8. Seu parceiro tem sempre dinheiro à mão para pagar drinques aos 
amigos, mas irrita-se quando você quer gastar dinheiro consigo 
mesma, e você diz: "Estou errada por sair do meu orçamento". 
9. Quando alguém lhe pergunta qual é a coisa de que mais gosta em 
seu marido, sua primeira resposta é: "Ah, ele luta muito por nós; ele 
trabalha quatorze horas por dia". 
10. Você se sente mortificada pela insensibilidade de seu parceiro, e 
diz: "Se eu me esforçasse por ser como ele, isso não me machucaria 
tanto". 
 
Quantas dessas afirmações lhe passaram pela mente e/ou saíram de 
sua boca? Usando a velha técnica "Numa escala de 1 a 10. . .", 
verifique o índice de sua semelhança com Wendy. Não precisa de 
categorias para avaliar esse índice. Basta dizer que, se o índice vai 
além de 3 ou 4 e se aproxima de 9 ou 10, é sinal de que você se acha 
aprisionada com seu parceiro na Terra do Nunca. Quanto mais 
baixo o índice, maior a probabilidade de você conseguir 
transformar-se numa Sininho e atrair seu companheiro para longe 
da legião dos meninos perdidos. 
Conclua seu auto-exame colocando-se três perguntas semelhantes 
às que propus ao final do Capítulo 2: 
Como fiquei assim? 
Em que estou pensando? 
O que posso fazer para mudar? 
Vamos considerar antes, rapidamente, a última pergunta. O que 
você pode fazer é aliar à motivação a esperança, e utilizar o plano 
de mudança para conduzir seus melhores esforços na direção certa. 
Depois de responder às duas primeiras perguntas, apresentarei 
sugestões específicas no sentido de ajudá-la a tornar-se uma 
Sininho. 
As duas primeiras questões devem ser encaradas como variações de 
outra questão mais fundamental: o que me leva a reforçar 
inconscientemente um padrão de comportamento que acaba por me 
magoar e destruir minhas esperanças de um relacionamento 
amoroso? 
Essa questão já foi respondida de forma prática e bem documentada 
por uma mulher sensível e inteligente, que deve ter lidado com uma 
vítima da SPP durante uma época de sua vida. Seu nome é Colette 
Dowling, e seu livro, realmente, brilhante, é The Cinderella Complex 
(Complexo de Cinderela*). Qualquer Cinderela que deseje tornar-se 
 
 
* Edições Melhoramentos (N. da Editora). 
 
 uma Sininho, deve antes confrontar seu complexo de Cinderela e 
decidir superá-lo. 
O COMPLEXO DE CINDERELA 
Embora nada possa substituir uma cuidadosa leitura do livro da 
Sra. Dowling, seja-me permitido resumir os pontos essenciais 
apresentados na obra e que têm relação com o problema de que 
estamos tratando. 
O complexo de Cinderela é definido como: 
 
Uma rede de atitudes e temores profundamente reprimidos que 
retém as mulheres numa espécie de penumbra, e impede-as de utili-
zar em plenitude suas mentes e sua criatividade. Como Cinderela, 
as mulheres de hoje ainda esperam por algo externo que venha 
transformar suas vidas. 
Dowling acredita que as mulheres vêm sendo treinadas para ser 
dependentes e temer a autonomia. Acredito que muitas mulheres 
tentam conviver com seus medos, refugiando-se num papel 
maternal (Wendy), na esperança de que, sendo carentes, de algum 
modo obterão segurança. Portanto, coloco a hipótese de que ser uma 
Wendy é uma forma de as mulheres tentarem conviver com seu complexo 
de Cinderela. 
Eis como Dowling corajosamente descreve seu próprio retiro: 
Agora eu tinha um vasto terreno, flores, uma grande casa com 
vários cômodos, poltronas confortáveis, recantos aconchegantes. 
Sen-tindo-me segura, pela primeira vez em anos, dediquei-me a 
preparar o tranqüilo domicílio sugerido pelas lembranças dos 
aspectos mais positivos de minha infância. Construí um ninho, 
forrando-o com o melhor algodão e a mais macia lanugem que pude 
encontrar. 
E então me escondi nele. 
 
É importante notar a respeito do retiro de Dowling que ela o fez 
enquanto se relacionava com um homem que não era vítima da 
Síndrome de Peter Pan (minha inferência clínica). A lição é clara: é 
bem possível que você procure a comodidade de ser uma Wendy, 
independentemente da propensão de seu marido ou amante para a 
SPP. Aliás, você pode ter inconscientemente procurado uma vítima 
da SPP, cuja necessidade de uma mãe fez ambos vocês um perfeito 
(embora neurótico) casal. 
Se você está disposta a encarar o nó cego criado por seu amor, 
perceberá que possui um certo grau de pensamento mágico não 
muito diverso do de seu companheiro. Por conseguinte, se é 
verdade que a vítima da SPP usa o pó mágico para escapar para a 
Terra do Nunca, também não é verdade que as mulheres que amam 
Peter Pan estão à espera de uma varinha de condão que as 
transforme em Cinderela, acreditando que seus duros sacrifícios 
criarão de algum modo uma carruagem mágica que as salvará da 
miséria e da solidão? 
Existe um acordo vítima-salvador implícito entre a vítima da SPP e 
sua Wendy. Superficialmente parece que a mulher é a vítima, e o 
homem o salvador; que o homem é forte, e a mulher fraca. Não 
creio que isto seja real. Na verdade a dinâmica do poder, neste caso, 
funciona exatamente ao contrário. O homem é fraco e a mulher é 
forte. O pior é que ela só extrai sua força de motivos errados. 
Em primeiro lugar, não deve haver dinâmica de poder num 
relacionamento de igual para igual. O acordo vítima-salvador é, por 
definição, destrutivo em relação a um casamento orientado para o 
crescimento. 
Em segundo lugar, a mulher está sendo alvo de um menosprezo e 
de um desrespeito que nenhum ser humano deveria tolerar. Seu 
medo de independência a impele a fazer o papel de Wendy, onde 
ela sente mais dor do que prazer. Se os papéis fossem invertidos, 
 
não há dúvida nenhuma de que a vítima da SPP nem por um 
minuto toleraria tal sofrimento. 
Em terceiro lugar, a mulher tem consciência de suas emoções, e sabe 
como dar expressão a seus sentimentos. Isto a faz 
consideravelmente mais forte do que a vítima da SPP, que perdeu 
contato com seus sentimentos, mas oculta sua fraqueza fingindo 
que os sentimentos não são importantes. 
Finalmente, o próprio fato de eu me dirigir tanto às mulheres neste 
livro evidencia que concluí que, no caso de Peter Pan e Wendy, 
minha melhor chance de ajudar a vítima da SPP é ajudar sua 
companheira. Ela pode estar esperando por uma carruagem mágica, 
mas minha experiência mostra que ela tem a coragem e a 
determinação de admitir seus erros, de abrir mão da pseudoforça e 
de batalhar para melhorar as coisas. 
 
O QUE VOCÊ PODE FAZER PARA MUDAR A SITUAÇÃO? 
Era para esta questão que nos vínhamos encaminhando desde o 
teste do Capítulo 2, passando pelo resumo do projeto de mudança 
(que você deve ter em mãos), e terminando com um auto-exame 
psicológico, acompanhado de advertências referentes à influência 
do complexo de Cinderela. 
Você agora vai usar esse projeto para efetuar algumas mudanças na 
forma como você e seu marido ou amante se relacionam. Para isso, 
tenha duas coisas em mente: 
Primeira: Quando você se defronta com um comportamento típico da SPP, 
o que você faz não pesa tanto quanto o que você não deve fazer, PARE DE 
DIZER E FAZER COISAS TÍPICAS DE WENDY. Pare de dar expressão a seu 
medo da autonomia, ocultando-se por trás de Wendy. 
Segunda: Use os atributos positivos anotados em seu projeto de 
mudança para abordar os negativos. E concentre-se nos negativos 
"às vezes" antes de atacar os "sempre" negativos. Por exemplo, se 
suas anotações indicam que seu companheiro nunca flerta com 
 
outras mulheres, mas às vezes se perturba com sua agressividade 
sexual, agradeça-lhe a fidelidade e anuncie que lhe fará uma 
massagem nas costas cujos efeitos ele sentirá o resto da noite. Isto dá 
a você a oportunidade de amenizar o embaraço que ele sente diante 
de sua agressividade sexual, e o induz a que, também ele, venha a 
massagear suas costas. 
Se seu parceiro obteve um índice baixona escala da SPP, e o seu foi 
satisfatório na escala de Wendy, talvez você pense que a lista de 
recomendações que se segue não se aplica a você. Mas reflita. Você 
já resolveu totalmente seu complexo de Cinderela? Você está 
totalmente livre de cair na armadilha representada pela Terra do 
Nunca e pelas fadas-madrinhas? Duvido. Ainda que se considere 
uma Sininho pode existir um charmoso homenzinho imaginário 
usando uma roupa verde, esperando por você na esquina. 
Muito bem, vamos trabalhar. 
Eis como sugiro lidar com os vinte comportamentos típicos da SPP 
apresentados no Capítulo 2. 
?. Ele reage de forma desproporcional ao estimulo, pressionando-a para 
desculpá-lo ou absolvê-lo da culpa. 
O que você não deve fazer: 
• Não tente acalmá-lo com comentários como: "Querido, você fez o 
melhor que podia; não foi culpa sua". 
• Não entre em discussões que possam apoiar as argumentações 
absurdas dele. 
• Não lhe poupe sofrimento mostrando ter pena dele. O que você 
deve fazer: 
• Pergunte-lhe como se sente por ter cometido um erro. 
• Faça-lhe perguntas que lhe provoquem a conscientização; por 
exemplo: "O que você podia ter feito de outro modo? Isso lhe 
ensinou algo para o futuro? O que você pode fazer na próxima 
vez?" 
 
• Saia da sala se ele persiste em fazer o joguinho de inocente. 
• Fale sobre os erros que você cometeu. 
• Use humor ("Oh, é o primeiro erro que você comete este ano"). 
• Proponha alternativas racionais. "Ter raiva é normal. Dê-se o 
direito de errar. O erro é o meio de a natureza nos lembrar que 
somos humanos". 
• Se ele se zangar com você por não sentir pena dele, diga: "Não 
posso acabar com sua dor; isso é responsabilidade sua". 
2. Ele se esquece de seu aniversário, do aniversário de casamento e de 
outras datas importantes. 
O que você não deve fazer: 
• Não jogue indiretas. 
• Não espere remorso, quando ele percebe quanto você ficou 
chateada por seu esquecimento. 
• Não o constranja comprando-lhe um belo presente, se você sabe 
que ele esqueceu o seu. 
• Não planeje natais ou aniversários "inesquecíveis". 
• Não o compare com outros homens que se recordam de datas 
importantes. 
• Não se queixe com os outros dos esquecimentos do seu homem, 
nem mesmo de brincadeira. 
 
O que você deve fazer: 
• Se você quer um presente, provavelmente terá de comprá-lo. 
Diga-lhe: "Você me deu este lindo suéter no meu aniversário". 
• Em lugar de indiretas sutis, circunde as datas importantes com 
tinta vermelha, em algum calendário que ele consulte fre-
qüentemente. 
• Para ajudá-lo a recordar a data, anuncie na noite anterior: 
"Amanhã teremos um jantar especial para comemorar nosso dia". 
 
• Diga-lhe, de preferência não perto de datas importantes, quanto 
significa para você que ele se lembre de seu aniversário e de outros 
dias especiais. Explique-lhe por que é importante. 
• Peça-lhe que conte suas melhores recordações de aniversários e 
de outras festas de sua infância. 
 
3. Ele tenta impressionar as pessoas em festas, especialmente as mulheres. 
 
O que você não deve fazer: 
• Não flerte com outros homens para fazê-lo perceber quanto você 
se sente mal com a atitude dele. 
• Não tente competir com ele para obter as atenções de todos; ele se 
esforçará mais ainda e culpará- você se os outros o ignorarem. 
• Não se pendure no braço dele, reclamando: "Você está me 
ignorando". 
• Não inicie uma discussão com ele, no carro, de volta para casa, 
sobre a crueldade com que ele a trata. 
• Não peça desculpas aos outros pelo comportamento dele. 
• Não faça ameaças inúteis ("Nunca mais vou a uma festa com 
você"). 
• Não o compare aos outros homens da festa ("Haroldo levava 
drinques para Marge e foi buscar o agasalho dela quando ela sentiu 
frio"). Sua vítima da SPP apenas ficará com raiva de Haroldo. 
• Não faça reclamações vagas ("Você não presta atenção em mim"). 
 
O que você deve fazer: 
• Não vá a festas caso seu parceiro não se interesse por seus 
problemas. 
• Peça a outra pessoa (não a outro homem) para levá-la para casa 
se ele a magoar. 
 
• Entenda que você não tem que ficar "grudada" a seu com-
panheiro em uma festa. Solte-se dele, circule e divirta-se sozinha. 
• Aja por sua própria conta quando quiser tomar um drinque ou 
conhecer novas pessoas. 
• Em hora adequada (talvez no dia seguinte), diga-lhe: "Quando 
você beija outra mulher na minha presença, sinto 
 Não faça isso na minha frente de novo". 
• Seja objetiva e precisa quando o repreender pelas coisas que ele 
disse a você e que a magoaram. Por exemplo: "Não quero mais 
ouvir você falar mal de minha mãe para impressionar seu chefe. Se 
você fizer isso de novo, irei embora da festa". 
4. Ele acha quase impossível dizer "desculpe-me". 
 O que você não deve fazer: 
• Não tente arrancar dele um pedido de desculpas. 
• Não lhe chame a atenção todas as vezes em que ele deveria pedir 
desculpas. 
• Não traga à tona erros do passado nem fique lhe apontando suas 
falhas constantemente. 
• Não se ponha a analisar suas fraquezas interpretando o porquê 
de ele não conseguir se desculpar. Por exemplo: "O motivo pelo 
qual você não admite seus erros é que você tem um ego insuflado". 
• Não caçoe dele por não estar dentro dos padrões da "nor-
malidade". 
O que você deve fazer: 
• Aceite outros tipos de pedidos de desculpas. Por exemplo: 
"Gostaria de não ter gritado com você". 
• Peça-lhe desculpas e a outros quando você estiver errada. 
• Agradeça-lhe todas as vezes em que ele tentar se mostrar 
sinceramente arrependido. 
 
5. Ele é insensível à sua necessidade de carícias preliminares. 
O que você não deve fazer: 
• Não se submeta ao ato sexual só para agradar a ele. 
• Não finja que está sentindo prazer. 
• Não elogie falsamente suas proezas e habilidades. 
• Não comece uma discussão inflamada sobre problemas sexuais, 
na cama. 
 
O que você deve fazer: 
• Seja sexualmente ousada e experimente novas técnicas. 
• Se você precisar de ajuda, procure Os Prazeres do Sexo de Alex 
Comfort. 
• Tome você mesma a iniciativa de forma sutil e sedutora. Sente-se 
no colo dele e acaricie-o ternamente. Não se levante senão quando 
você quiser. 
• Mostre-lhe verbalmente e por meios de gestos o que a faz sentir 
prazer durante a relação. Quando fizer isso, seja gentil e concentre-
se naquilo que você quer que ele faça, não no que ele faz errado. 
6. Ele sempre ajuda os amigos, mas raramente a trata 
com a mesma consideração. 
O que você não deve fazer: 
• Não faça comparações ("Você passa o dia todo lavando os carros 
de seus amigos, mas nunca lava o meu"). 
• Não espere que seu homem faça coisas para as quais não tem 
habilidade. 
• Não faça pouco dos amigos dele; você será vista como a errada. 
• Não se exponha ao fracasso. Por exemplo: pedindo-lhe que lhe 
faça alguma coisa, quando você sabe que ele pretende ir buscar um 
amigo no aeroporto. 
 
 
O que você deve fazer: 
• Exija a execução das tarefas que você lhe pediu para desem-
penhar. Por exemplo: "Vou aprontar seu almoço assim que você 
acabar de lavar o carro". 
• Planeje tarefas a serem executadas conjuntamente. Limpar a 
garagem, os dois juntos, numa manhã de sábado, seria uma boa 
idéia. 
• Seja generosa em elogiar quando ele fizer algo que você lhe 
pediu. 
• Dê-lhe bastante tempo para completar a tarefa pedida. 
 
7. Ele só expressa preocupação por seus problemas depois de você se 
queixar. 
 
O que você não deve fazer: 
• Não espere demonstrações de preocupação por seus problemas 
por parte dele: ele acha que tem mais problemas que você. 
• Não se queixe nem reclame de que ele não liga para você. 
• Não transforme cada situação num bicho-de-sete-cabeças. Poupe 
suas ansiedades para problemas de grande monta em sua lista de 
prioridades. 
 
O que você deve fazer: 
• Diga a seu parceiro: "Isto é importante. Meus sentimentos e 
preocupações

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