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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA APURAÇÃO DE ATO INFRACIONAL PRATICADO POR ADOLESCENTES ELISABETH ENDERLE DECLARAÇÃO “DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”. ITAJAÍ (SC), 08 de novembro de 2010. ___________________________________________ Professor Orientador: MSc. Patrícia Elias Vieira. UNIVALI – Campus Itajaí-SC UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA APURAÇÃO DE ATO INFRACIONAL PRATICADO POR ADOLESCENTES ELISABETH ENDERLE Itajaí (SC), novembro de 2010. UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA APURAÇÃO DE ATO INFRACIONAL PRATICADO POR ADOLESCENTES ELISABETH ENDERLE Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Professora MSc. Patrícia Elias Vieira Itajaí, 08 de novembro de 2010 AGRADECIMENTO A Deus, pelas oportunidades e proteção a mim dedicadas. A minha família, pela confiança depositada, e que mesmo distante estiveram sempre presentes nesta empreitada da minha vida. Aos amigos, que me apoiaram e demonstraram a importância da verdadeira amizade. A minha orientadora, Patrícia Elias Vieira, pela dedicação, incentivo e colaboração na realização deste trabalho. Aos mestres, que durante este percurso souberam transmitir o conhecimento e a experiência que possuem. Aos colegas de faculdade, de quem sentirei muita falta. DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a meus pais, Wilson e Domingas, e aos meus irmãos Fernando e Heloísa, amores da minha vida. TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí, 08 de novembro de 2010. Elisabeth Enderle Graduando PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Elisabeth Enderle, sob o título A Atuação do Ministério Público na Apuração de Ato Infracional praticado por adolescentes, foi submetida em 23 de novembro de 2010 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Patrícia Elias Vieira, MSc., presidente da Banca; Leôncio Paulo da Costa Neto, MSc., membro da Banca, e aprovada com a nota [Nota] ([nota Extenso]). Itajaí, 23 de novembro de 2010. Patrícia Elias Vieira Orientador e Presidente da Banca Antonio Augusto Lapa Coordenação da Monografia ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS art. Artigo arts. Artigos B.O. Boletim de Ocorrência br. Brasil CONANDA Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente CC Código Civil de 2002 CEJURPS Centro de Ciências Sociais e Jurídicas CPP Código de Processo Penal ECA Estatuto da Criança e do Adolescente ed. Edição gov. Governo In Em MSc. Master of Sciencie - Mestre em Ciências orgs. Organizadores p. Página SC Santa Catarina SP São Paulo UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí www. World Wide Web – rede mundial de computadores § Parágrafo ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Adolescente É aquele “(...) entre doze e dezoito anos de idade”.1 Apuração de Ato Infracional É o procedimento pelo qual será apurado o ato infracional, respeitando ao princípio de devido processo legal.2 Apuração de Ato Infracional na fase policial É a “(...) realizada pela Polícia Judiciária, quando o apreende e ao produto e os instrumentos da infração e determina diligências investigatórias (...)”. 3 Apuração de Ato Infracional na fase ministerial É a “(...) ocasião em que o infrator será apresentado ao promotor de justiça, em audiência informal, com os seus pais ou responsáveis, testemunhas e vítimas (...)”. 4 Apuração de Ato Infracional na fase judicial É “(...) quando o adolescente será ouvido pelo juiz, na presença de seus pais ou responsáveis e de seu advogado (...)”. 5 Arquivamento da Notícia de Ato Infracional 1 BRASIL. Lei n. 8069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm> Acesso em 10.10.2010. 2 Conceito operacional elaborado pela autora da pesquisa com base na bibliografia e citações identificadas no item 3.1 desta monografia. 3 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 170. 4 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 170. 5 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 170. 10 É o cumprimento da sentença judicial que acolhe o requerimento do Promotor de Justiça que requer a extinção do procedimento, ante estar provada a inexistência do fato, não haver prova de ter o adolescente concorrido para o ato infracional, ante a existência de excludente de antijuridicidade ou culpabilidade, ou de outras situações que o Promotor de Justiça julgar cabível.6 Ato Infracional É “(...) a conduta descrita como crime ou contravenção penal”. 7 Criança É “(...) a pessoa até doze anos de idade incompletos (...)”. 8 Direito da infância e Juventude Disciplina jurídica que garante a criança e ao adolescente proteção especial por parte da família, da sociedade e do Estado.9 Direitos Individuais “(...) são bens e vantagens conferidas pela norma”. 10 Doutrina da Proteção Integral “Quer dizer amparo completo, não só da criança e do adolescente, sob o ponto de vista material e espiritual, como também a sua salvaguarda desde o momento da concepção, zelando pela assistência à saúde e bem-estar da gestante e da família, natural ou substituta da qual irá fazer parte”. 11 6 Conceito operacional elaborado pela autora da pesquisa com base na bibliografia e citações identificadas no item 3.3.1 desta monografia. 7 BRASIL. Lei n. 8069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm> Acesso em 10.10.2010. 8 BRASIL. Lei n. 8069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm> Acesso em 10.10.2010. 9 Conceito operacional elaborado pela autora da pesquisa com base na bibliografia e citações identificadas no item 1.1 desta monografia. 10 Apud PRADE, Péricles. In CURY, Munir (coord.). Estatuto da criança e do AdolescenteComentado. 8 ed. São Paulo: Malheiros LTDA, 2006. p. 351. 11 CHAVES, Antônio. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2 ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 51. 11 Garantias Processuais “(...) as garantias são meios destinados a fazer valer esses direitos” individuais, “instrumentos pelos quais se asseguram o exercício e gozo daqueles bens e vantagens”. 12 Medida Sócio-educativa “As medidas sócio-educativas são aquelas atividades impostas aos adolescentes quando considerados autores de ato infracional. Destinam-se elas à formação do tratamento tutelar empreendido a fim de reestruturar o adolescente para atingir a normalidade da integração social”. 13 Ministério Público “O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127)”.14 Remissão Ministerial “(...) o perdão feito pelo Promotor de Justiça ao adolescente infrator de natureza administrativa. Trata referida norma de verdadeira manifestação da soberania do Ministério Público, pois pode o Parquet decidir pela aplicação da medida (...). É forma de exclusão do processo”. 15 12 Apud PRADE, Péricles. In CURY, Munir (coord.). Estatuto da criança e do Adolescente Comentado. 8 ed. São Paulo: Malheiros LTDA, 2006. p. 351. 13 LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 4 ed. São Paulo: Malheiros Editores LTDA, 1997. p. 80 e 81. 14 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Rideel, 2009. p.136 15 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: doutrina e jurisprudência. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 243. SUMÁRIO RESUMO..........................................................................................XIII INTRODUÇÃO .................................................................................. 14 CAPÍTULO 1 ..................................................................................... 17 O DIREITO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE NO BRASIL .................. 17 1.1 A HISTÓRIA DO DIREITO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE NO BRASIL.......17 1.1.1 A LEI DO VENTRE LIVRE E A INFÂNCIA COMO QUESTÃO SOCIAL...........................18 1.1.2 O CÓDIGO DE MENORES...................................................................................24 1.1.3 O NOVO CÓDIGO DE MENORES..........................................................................28 1.2 DA DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL E AS POLÍTICAS DE ATENDIMENTO......................................................................................................32 1.3 DAS MEDIDAS DE PROTEÇÃO APLICADAS ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES...................................................................................................39 CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 49 A PRÁTICA DO ATO INFRACIONAL ............................................... 49 2.1 O ATO INFRACIONAL E A INIMPUTABILIDADE PENAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE..............................................................................................49 2.2 OS DIREITOS INDIVIDUAIS DOS ADOLESCENTES QUE PRATICAM ATOS INFRACIONAIS...........................................................................................56 2.3 AS GARANTIAS PROCESSUAIS CONFERIDAS AOS ADOLESCENTES QUE PRATICAM ATOS INFRACIONAIS..............................................................64 2.4 AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS APLICÁVEIS AOS ADOLESCENTES QUE COMETEM ATOS INFRACIONAIS...............................................................74 CAPÍTULO 3 ..................................................................................... 85 AS FASES PROCESSUAIS DA APURAÇÃO DO ATO INFRACIO- NAL E A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ............................ 85 3.1 AS CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES DA APURAÇÃO DO ATO INFRACIONAL........................................................................................................85 3.2 A APURAÇÃO DO ATO INFRACIONAL NA FASE POLICIAL.......................86 3.3 A APURAÇÃO DO ATO INFRACIONAL NA FASE MINISTERIAL.................93 3.3.1 O ARQUIVAMENTO DA NOTÍCIA DO ATO INFRACIONAL...........................................97 3.3.2 A REMISSÃO MINISTERIAL...............................................................................100 3.3.3 A REPRESENTAÇÃO À AUTORIDADE JUDICIÁRIA.................................................105 3.4 A APURAÇÃO DO ATO INFRACIONAL NA FASE JUDICIAL.....................111 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................ 121 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ......................................... 126 RESUMO A presente monografia trata da atuação do Ministério Público na apuração de ato infracional praticado por adolescentes. Inicialmente, estuda-se a evolução histórica do Direito da Infância e Juventude no Brasil, chegando-se na doutrina da proteção integral, instituída no ordenamento jurídico pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente de 1991, enfatizando as medidas protetivas elencadas no artigo 101 do mencionado Estatuto. Num segundo momento, aborda-se a questão da inimputabilidade penal dos adolescentes, os direitos individuais e garantias processuais assegurados aos adolescentes que praticam atos infracionais, tratando também das medidas sócio- educativas estabelecidas no artigo 112 do ECA. Passo seguinte é feito um estudo acerca da conceituação de ato infracional, das fases processuais da apuração do ato infracional, destacando-se detalhadamente a atuação do Ministério Público nestas fases, quais sejam: a fase policial, a fase ministerial e a fase judicial. O relato da pesquisa se dá pelo método indutivo. Palavras chave: Ato infracional – Ministério Público - Adolescente INTRODUÇÃO A presente Monografia tem como objeto a atuação do Ministério Público na apuração de ato infracional praticado por adolescentes. O seu objetivo institucional é produzir uma monografia jurídica para obtenção do grau de bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. O seu objetivo geral é investigar a atuação do Ministério Público no procedimento de apuração do ato infracional, investigar as medidas sócio-educativas que podem ser aplicadas aos adolescentes que praticam ato infracional e o procedimento para que sejam elas aplicadas, conforme a legislação e a doutrina pátrias. Para alcançar tal desiderato foram traçados os seguintes objetivos específicos: a) Observar se existem diferenças entre direitos individuais dos adolescentes que praticam ato infracional e garantias processuais conferidas ao adolescente que praticam ato infracional. b) Catalogar quais as fases de apuração do ato infracional praticado por adolescente. O interesse pelo tema abordado deu-se em razão de um estímulo pessoal à causa da criança e do adolescente, pois durante a faculdade a autora realizou estágio na Promotoria de Justiça da Infância e Juventude de Balneário Camboriú - Santa Catarina, tendo contato com processos de ato infracional e de execução de medida sócio-educativa. Para a presente monografia foram levantados os seguintes problemas: 15 Qual a diferença entre direitos individuais dos adolescentes que praticam atos infracionais e garantias processuais conferidas aos adolescentes que praticam atos infracionais? Quais as fases de apuração do ato infracional praticado por adolescente? Quais as formas de atuação do Ministério Público na apuraçãodo ato infracional e quando utilizá-las? E, as respectivas hipóteses: Hipótese 1: Os direitos individuais são vantagens conferidas aos adolescentes pela norma jurídica. As garantias processuais são os meios para fazer tais direitos. Hipótese 2: O procedimento de apuração do ato infracional é composto por três fases: fase policial, fase ministerial e fase judicial. Hipótese 3: O Ministério Público atua na fase ministerial e judicial da apuração do ato infracional. Na fase ministerial o representante do Ministério Público poderá arquivar os autos, conceder remissão ou oferecer representação. Na fase judicial o representante do Ministério Público atua como autor da ação, visando a alcançar os objetivos de ressocialização e reeducação do adolescente. Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando do histórico do Direito da Infância e Juventude no Brasil, com ênfase à fase da proteção integral, adotada pelo sistema legal do nosso País e às medidas de proteção aplicadas às crianças e aos adolescentes. No Capítulo 2, tratando do ato infracional, conceituação e aspectos gerais, os direitos individuais e as garantias processuais dos adolescentes que cometem atos infracionais, bem como as medidas sócio-educativas a eles passíveis de serem ajustadas, tratando, também, acerca da inimputabilidade penal da criança e do adolescente. 16 No Capítulo 3, tratando do procedimento da apuração de ato infracional, das fases deste procedimento, a fase policial, ministerial e judicial, enfatizando a atuação do Ministério Público em todos os momentos. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a atuação do Ministério Público na apuração de ato infracional praticado por adolescentes. Quanto à Metodologia empregada foi utilizado o Método Indutivo16. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do Referente17, da Categoria18, do Conceito Operacional19 e da Pesquisa Bibliográfica20. Após a exposição dos capítulos, passam-se às considerações finais, em que serão apresentadas as sínteses de cada capítulo e as demonstrações sobre as hipóteses básicas da pesquisa, e se foram ou não confirmadas. 16 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86. 17 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54. 18 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25. 19 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37. 20 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209. CAPÍTULO 1 O DIREITO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE NO BRASIL 1.1 A HISTÓRIA DO DIREITO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE NO BRASIL O direito da infância e juventude em vigor apresenta como diretriz a doutrina de proteção integral, instituída pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Cury21 relata que: A inspiração de reconhecer proteção especial para a criança e o adolescente não é nova. Já a Declaração de Genebra de 1924 determinava “a necessidade de proporcionar à criança uma proteção especial”; da mesma forma que a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas (Paris, 1948) apelava ao “direito a cuidados assistência especiais”; na mesma orientação, a Convenção Americana sobre os Direitos humanos (Pacto de São José, 1969) alinhavava, em seu art. 19: “Toda criança tem direito às medidas de proteção que na sua condição de menor requer, por parte da família, da sociedade e do Estado”. Em que pese a legislação internacional ser ampla em tratar sobre os direitos das crianças há anos, a história do Direito da Criança no Brasil é recente, haja vista que antes da instituição da doutrina de proteção integral no Brasil, existiram algumas leis que versavam sobre elas, porém nem sempre seus direitos individuais, por si só, eram garantidos. Observa Veronese22, que as primeiras leis nacionais a se preocuparem com a criança e o adolescente, ainda que de forma precária, estavam ligadas ao regime escravista brasileiro. Na Constituinte de 1823, José Bonifácio apresentou um projeto com vistas na proteção da criança escrava. Entretanto, tal projeto tinha como escopo a preservação da mão-de-obra e não os direitos humanos 21 CURY, Munir (coordenador). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 16. 22 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. 18 dessas crianças. Salienta-se que este trabalho foi vetado por D. Pedro I ao outorgar a Constituição Imperialista de 1824. Por sua vez, a Constituição do Império de 1824 se mostrou totalmente omissa em relação aos direitos das crianças, ao passo que o Código Criminal fez as primeiras referências sobre a responsabilização penal dos menores. Liberati23 assinala que: Pelo Código Criminal do Império, os menores de 14 anos estavam isentos da punibilidade pelos atos considerados criminosos por eles praticados. Os infratores que tinham menos de 14 anos e que apresentassem discernimento sobre o ato cometido eram recolhidos às Casas de Correção, até que completassem 17 anos. Entre 14 e 17 anos, estariam os menores sujeitos à pena de cumplicidade (2/3 do que cabia ao adulto infrator) e os maiores de 17 e menores de 21 anos gozavam de atenuantes de menoridade. De outro norte, a questão da escravidão no Brasil teve repercussão nacional em meados dos anos de 1860, fazendo com que o Senado, por meio dos movimentos abolicionistas, conseguisse aprovar a lei de autoria de Silveira da Mota que estabelecia “a proibição de venda de escravos sob pregão e exposição pública, bem como a proibição de, em qualquer venda, separar o filho do pai e o marido da mulher”, conforme asseverou Macedo24. 1.1.1 A Lei do Ventre Livre e a Infância como questão social A partir de então, notadamente em 1871, tem-se o marco histórico da primeira lei nacional de proteção à infância, a Lei nº 2.040, conhecida como a Lei do Ventre Livre ou Lei Rio Branco, a qual concebia liberdade para as crianças nascidas de mães escravas, visando impedir a continuidade da escravidão por meio dos filhos dos escravos. Contudo, a Lei apresentava cláusulas restritivas, escritas de forma clara por Veronese25: 23 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002. p. 28. 24 Apud VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999, p. 11. 25 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999, p. 12. 19 A Lei estipulava, por exemplo, que o menor deveria permanecer sob a autoridade do senhor (proprietário de escravos) e de sua mãe, quejuntos deveriam educá-lo até a idade de 8 anos. Atingida esta idade, o proprietário da mãe escrava teria duas opções: poderia receber do Estado uma indenização de 600 mil-réis pagos em títulos de Estado, a 6%, no prazo de trinta anos ou se utilizar dos serviços do menor até que este completasse 21 anos. Quase sempre, o senhor preferia ficar com a criança negra, uma vez que a Lei não determinava o número de horas de trabalho, o regime sanitário ou a alimentação que deveriam receber estes “escravos livres”. Na realidade, isto constituía uma nova modalidade de escravidão. Embora a Lei do Ventre Livre não salvaguardasse todos os direitos das crianças livres, causando mais prejuízos do que benefícios, nota-se que sua principal importância foi iniciar um processo de libertação. Conrad26 esclarece que a situação de servidão permaneceu, haja vista que a Lei do Ventre Livre não conseguiu diferenciar e garantir uma vida diversa da dos escravos às crianças. Entretanto, desde a proibição do tráfico de escravos para o Brasil, em 1850, até 1888, paulatinamente o regime escravocrata foi desaparecendo, surgindo a idéia favorável à imigração. Martins27 elucida que: Em meados do século XIX, fatores como a imigração, a abolição da escravatura, a construção de vias férreas, os melhoramentos urbanos e o início da industrialização introduzem algumas modificações na estrutura econômica e social do país, contribuindo para o desenvolvimento relativo do mercado interno e estimulando o processo de urbanização. Para Alves28 esse período provocou “uma mudança de mentalidade: o conceito de infância passou a ser também uma questão social, competência do Estado”. Pontua Martins29, que o sistema familiar passa a adotar o modelo burguês de habitação, as pessoas se retiram das ruas para suas casas, 26 Apud VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. 27 MARTINS, Daniele Comin. Estatuto da Criança e do Adolescente & Políticas de Atendimento. Curitiba: Juruá, 2003. p. 22. 28 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 03. 29 MARTINS, Daniele Comin. Estatuto da Criança e do Adolescente & Políticas de Atendimento. 20 inventando a vida privada e novos hábitos domésticos. Agora a família e a escola assumem o papel de socialização, antes atribuído à rua. Nasce também, com a criação do Estado Nacional Brasileiro, a normalização médica difundida em todas as classes sociais e surgimento de práticas filantrópicas, assistencialistas e medicinais para controle das instituições familiares das classes baixas da população. Escreve Veronese30, que as instituições assistencialistas começam a atuar, ajudando apenas na caridade, não havendo uma preocupação direcionada para o ser criança, sendo tais instituições ligadas às associações civis e religiosas. Destaca a mencionada autora, Veronese31, que inicialmente é a Igreja Católica que aparece como fonte, por meio de ordens religiosas, fornecendo assistência aos órfãos, abandonados e pervertidos. Bastava dar-lhes casa e comida, limitando-se o aprendizado às atividades domésticas e educação familiar, sempre baseada na autoridade e obediência. Assim também, descreve que o tipo de assistência filantrópica era realizada por associações privadas ou particulares, sendo prestada assistência médica ou educacional ou alimentar, de forma alternativa. Segundo Martins32, é inevitável que a família e a escola viessem a sofrer uma forte crise em razão da responsabilidade exercida para sociabilização da criança e do adolescente, tornando-se evidente o retorno dos mesmos ao espaço público, a rua, destacando que esse retorno se deu: “pela porta dos fundos”, é a volta a um espaço já incapaz de sociabilizar e nutrir essas crianças e adolescentes com todos os instrumentos necessário para mantê-los em correspondência aos anseios da sociedade capitalista, surgindo então aquelas figuras conhecidas do “menor abandonado”, do “menor de rua”, do “menor na rua”, do “menor infrator” (...). Curitiba: Juruá, 2003. 30 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p. 18. 31 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p. 18 e 19. 32 MARTINS, Daniele Comin. Estatuto da Criança e do Adolescente & Políticas de Atendimento. Curitiba: Juruá, 2003. p. 25. 21 Outrossim, como marco histórico relevante, salienta-se que, também no período do Brasil Colônia e Império, houve a instituição da Roda dos Expostos nas Santas Casas de Misericórdia, seguindo a tradição portuguesa, inicialmente instaladas no Brasil em Salvador e no Rio de Janeiro, no século XVIII, posteriormente instituída em São Paulo, ressalva feita por Martins33. Para Melo34 tratava-se de “uma roda giratória para recolher crianças abandonadas que para aí podiam ser levadas, sem precisarem os pais aparecer e se expor”, ou seja, havia a garantia do anonimato dos genitores. Os motivos que levavam ao abandono dos filhos são de difícil definição, conforme Souza Neto35, que dispõe: (...) mas tudo faz crer que as razões eram principalmente de ordem econômica e social. Entre as motivações de ordem religiosa e moral para o abandono, convém recordar que a doutrina cristã, no decorrer da história, consolidou o valor ético da família e condenou severamente o adultério, a ponto de o Direito Canônico não admitir a ordenação sacerdotal de um filho bastardo. Assim, o confinamento em instituições de caridade eram práticas comum e que ofereciam assistência precária, razão pela qual foi criada a Roda dos Expostos, que visava a proteção das crianças, afastando-as da prostituição e vadiagem. Porém, estabelece Veronese36 que “na casa dos expostos, devido a escassez de recursos materiais e humanos, era grande o número de crianças que não resistiam às precárias condições a que eram submetidas”. Com o advento da República, a assistência fornecida pela Igreja e também de iniciativas filantrópicas no século XIX, demonstraram-se insuficientes às necessidades da época. 33 MARTINS, Daniele Comin. Estatuto da Criança e do Adolescente & Políticas de Atendimento. Curitiba: Juruá, 2003. p. 25 e 26. 34 Apud LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002. p. 28 35 SOUZA NETO, João Clemente de; NASCIMENTO, Maria Letícia (orgs.). Infancia, violência, instituições e políticas públicas. São Paulo: Expressão e Arte, 2006. p. 20. 36 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p.16. 22 Pontua Veronese37 que “fazia-se necessário que as instituições formassem o indivíduo na moral, bons costumes, educação elementar e que lhe fornecessem ainda uma capacitação profissional”, o que “mais tarde lhe permitiria o seu próprio sustento”. Levando-se em conta as necessidades da época, por volta do século XX, surge a participação do Estado no que tange à assistência à infância, afirmando Rizzini38 que agora está voltada a reeducação, ligadas não somente aos ensinamentos da fé, mas também à ciência, no âmbito jurídico e pedagógico. Assim, o século XX começou sob a égide do Código Penal da República de 1890, o qual, segundo Liberati39, declarou a irresponsabilidade de pleno direito dos menores de 9 anos de idade, como também dos que possuíam de9 a 14 anos, desde que tivesse agido sem discernimento. Já os que demonstravam ter discernimento do ato praticado, eram recolhidos em estabelecimentos disciplinares industriais, de acordo com o tempo que o juiz julgasse necessário, entretanto sem exceder a idade limite de 17 anos de idade, mantendo-se aqui a imposição da pena de cumplicidade ao maior de 14 e menor de 17, bem como a atenuante de menoridade, estabelecidas no Código Penal do Império. De acordo com o mesmo autor, Liberati40, essa teoria do discernimento sofreu diversas críticas em razão dos estabelecimentos industriais não terem sido organizados, fato que fez com que as crianças e adolescentes fossem lançados às prisões comuns. Coaduna Neves de Jesus41, sustentando que em sinal de protesto à omissão estatal, no ano de 1899, por meio de esforços particulares, foi 37 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p 21. 38 Apud VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p 22. 39 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002. p. 28. 40 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002 41 JESUS, Maurício Neves. Adolescente em conflito com a lei: prevenção e proteção integral. Campinas/SP: Servanda Editora, 2006. p. 41. 23 criado no Rio de Janeiro o Instituto de Proteção e Assistência à Infância, sendo que “pouco depois, em 2 de março de 1903, o decreto estadual 4.780 instituiu a Escola Correcional XV de Novembro, dedicada a internar menores abandonados para prevenir a delinqüência infanto juvenil”. Já em 1921, surge a Lei orçamentária sob o número 4.242, de 5 de janeiro, que além de eliminar o critério de discernimento, fixando a idade de responsabilização penal em 14 anos, também “autorizava o governo a organizar o serviço de assistência e proteção à infância abandonada e delinqüente e abria oportunidade para a criação dos Juízos de Menores”42. Discorre Saraiva43, que “contemporaneamente a isso, o Decreto nº 16.272, de 20 de dezembro de 1923, criava as primeiras normas de Assistência Social visando a “proteger os menores abandonados e delinqüentes”. Assim, Neves de Jesus44 relata que: Em 1924 surgiu o primeiro Juizado de Menores do Brasil, no Distrito Federal, tendo como seu titular o magistrado José Cândido Mello Mattos. Para funcionar junto ao juizado criou-se um abrigo destinado a recolher e educar os infratores e os abandonados, ou preservar estes e reformar aqueles, que ficavam em ambientes separados. Entretanto, para o mesmo autor, Neves de Jesus45, “não seria a criação de um ou dois abrigos que atenderia a demanda”, acrescentando que “jamais se encontrou uma solução que permitisse a execução das medidas previstas para a delinqüência infanto-juvenil”. Complementa Veronese46 que para alguns, o Juízo de Menores, criado em 1924, “foi mais um erro do que um acerto em favor da criança, 42 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p.04. 43 SARAIVA, João Batista Costa. Adolescente em conflito com a lei: da indiferença à proteção integral: uma abordagem sobre a responsabilidade penal juvenil. 3. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009. p. 41. 44 JESUS, Maurício Neves. Adolescente em conflito com a lei: prevenção e proteção integral. Campinas/SP: Servanda Editora, 2006. p. 41. 45 JESUS, Maurício Neves. Adolescente em conflito com a lei: prevenção e proteção integral. Campinas/SP: Servanda Editora, 2006. p. 42. 46 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p. 24. 24 pois lhe faltava uma organização técnico-administrativa, que lhe desse a credibilidade necessária”. 1.1.2 O Código de Menores Mais tarde, em 12 de outubro de 1927, por meio do Decreto n. 17.943-A, é aprovado o primeiro Código de Menores, criado pelo jurista José Candido Albuquerque Mello de Matos, também conhecido como “Código Mello Matos”, cujo objetivo era desenhar uma política de responsabilidade do Estado, assistencialista, "em que o Poder Judiciário tornou-se ente hegemônico no trato das questões sociais referentes à criança e ao adolescente, de modo a garantir o controle social ao Estado”, esclarece Martins47. Contempla Liberati48, que: A nova postura legislativa classificou os menores de 18 anos em abandonados e delinqüentes; os delinqüentes, com idade superior a 14 anos, não eram submetidos a processo penal, mas a um processo especial de apuração de sua infração; a “Teoria do discernimento” foi abolida e a medida de internação ao delinqüente era imposta por todo o tempo necessário à sua educação entre 3 e 7 anos; os abandonados eram recolhidos e encaminhados a um lar, fosse dos pais, fosse de pessoa responsabilizada por sua guarda; aos menores de 2 anos, determinava sua entrega, para serem criados “fora da casa dos pais”. Previu, também, aquele Código o aconselhamento das mães, para evitar-se o abandono dos filhos; o sigilo dos atos processuais foi instituído nos casos de acolhimento do menor por outra família; o trabalho do menor foi limitado à idade de 12 anos e o trabalho noturno foi proibido aos menores de 18 anos. Acrescenta Alves49 sobre a medida de internação, que “aos delinqüentes abandonados a lei reservava internação de um a cinco anos; e aos pervertidos, internação de três a sete anos”, sendo que o internamento seria em estabelecimento de reeducação ou profissional, aplicando-se as medidas de assistência e proteção aos menores de 14 anos. 47 MARTINS, Daniele Comin. Estatuto da Criança e do Adolescente & Políticas de Atendimento. Curitiba: Juruá, 2003. p. 32. 48 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002. p. 30. 49 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 5. 25 Para o mesmo autor, Alves50, o Código de Menores de 1927 foi se tornando obsoleto, sendo que: A doutrina entendia necessário rejeitar as designações menor delinqüente e menor abandonado, e propunha a criação de fórmulas gerais dentro das quais o menor deveria ser assistido. (...) Por outro lado, faltava ao Código estabelecer a possibilidade de uma assistência educativa, quer pela família do menor, quer por instituições especializadas. Do mesmo modo, extrai-se dos ensinamentos de Silva51 que: O Código Mello Matos refletia a elite moralista de sua época, os “menores” objeto da Lei encontravam-se à margem do sistema econômico-social e, em consequência, eram alvo de discriminação e condenação moral da mesma forma como ocorria com outros excluídos sociais. Visando solucionar tal impasse, é criado em 1942, o Serviço de Assistência aos Menores, o SAM, segundo Saraiva52: (...) um órgão de Ministério da Justiça que funcionava como um equivalente do Sistema Penitenciário para a população menor de idade. A orientação do SAM é, antes de tudo, correcional-repressiva, e seu sistema baseava-se em internatos (...) para adolescentes autores de infração penal e de patronatos agrícolas em escolas de aprendizagem de ofícios urbanos para os menores carentes e abandonados. Argumenta Liberati53, que “o SAM foi criado, para cumprir as medidas aplicadas aos infratores pelo Juiz, tornando-se mais uma administradora de instituições do que, de fato, uma política de atendimento ao infrator”. ArremataVeronese54 afirmando que “o SAM não conseguiu cumprir suas finalidades, sobretudo devido à sua estrutura emperrada, sem 50 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 5 51 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiça da Infância e Juventude. Florianópolis: Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p.20. 52 SARAIVA, João Batista Costa. Adolescente em conflito com a lei: da indiferença à proteção integral: uma abordagem sobre a responsabilidade penal juvenil. 3. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009. p. 44 e 45. 53 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002. p. 60. 54 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p. 32. 26 autonomia e sem flexibilidade e a métodos inadequados de atendimento”, o que gerava “revoltas naqueles que deveriam ser amparados e orientados”. Salienta-se Liberati55 que: O indicador da institucionalização estava na classe social, na pobreza, na miséria, na falta de condições psicológicas e da carência assistencial dos pais. O abandono, a vadiagem, a mendicância eram motivos suficientes para a intervenção judicial, que determinava a internação como forma de “ressocialização” ou de “recuperação” da criança e do adolescente. Em razão da ineficácia do Serviço de Assistência ao Menor e também das demais medidas até então adotadas em face das crianças e adolescentes, Neves de Jesus56 relata que: A década de 50 foi marcada pelos debates que visavam a reformulação da legislação infanto-juvenil”, acrescentando que “o desejo de normas mais democráticas cresceu com a Declaração Universal dos Direitos da Criança, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, a 20 de novembro de 1959 (...). Complementa Saraiva57, que com o advento da Constituição Federal de 1946 e findada a Ditadura Vargas, “o país viveu um período de inspiração liberal. Em 1964, todavia, estabeleceu-se uma ruptura, com a instalação da Ditadura Militar”. Firma-se, agora, segundo Liberati58, em substituição do Serviço de Assistência a Menores – o SAM, a Fundação nacional do Bem-Estar do Menor – a FUNABEM ou FNBEM, instituída pela Lei 4.513, de 1º de dezembro de 1964. Sustenta Veronese59 que o Governo Militar se sensibilizou com o drama da criança brasileira, adquirindo a infância um status de problema social, 55 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002. p. 62 e 63. 56 JESUS, Maurício Neves. Adolescente em conflito com a lei: prevenção e proteção integral. Campinas/SP: Servanda Editora, 2006. p. 53. 57 SARAIVA, João Batista Costa. Adolescente em conflito com a lei: da indiferença à proteção integral: uma abordagem sobre a responsabilidade penal juvenil. 3. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009. p. 49. 58 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002. p.67 e 68. 27 sobre o qual recaiu os preceitos da ideologia de segurança nacional, que eram repassados pela política nacional do bem estar do menor, sob a responsabilidade da FUNABEM. Martins60, por sua vez, acrescenta que a atuação da FUNABEM estava ligada ao processo de marginalização, “voltava-se ao afastamento da criança do meio em que vivia, classificado como à margem da lei e dos bons costumes”, sendo que tal situação tinha responsabilidade atribuída à família. Destaca-se que a FUNABEM foi instituída na esfera nacional, mais tarde surgindo as FEBEMs como sucessoras nos âmbitos estaduais. No entanto, destaca Silva61 que: (...) esses dois instrumentos de controle social não foram eficientes, haja vista o crescente número de crianças marginalizadas e a incapacidade de proporcionar qualquer espécie de reeducação. A metodologia aplicada pelas instituições de educação e reclusão, em vez de socializar a criança e o adolescente, massificava-os e, dessa forma, em vez de criar estruturas sólidas nos planos psicológicos, biológicos e social, afastava esse chamado “menor em situação irregular” definitivamente da vida comunitária. Liberati62 acrescenta que: As medidas aplicadas aos menores, fossem eles carentes ou delinqüentes, tinham natureza punitiva, revestida de proteção assistencial. O menor abandonado era internado, porque seus pais não tinham condições financeiras; o órfão era internado, porque não tinha responsáveis; o infrator era internado, porque, agora, estava em situação irregular, por conduta desviante, proporcionada por ele próprio. Assim, bem pontua Silva63 ao descrever que: 59 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p. 33. 60 MARTINS, Daniele Comin. Estatuto da Criança e do Adolescente & Políticas de Atendimento. Curitiba: Juruá, 2003. p. 33. 61 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiça da Infância e Juventude. Florianópolis: Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p. 22. 62 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional. São Paulo: editora Juarez de Oliveira, 2002. p. 73. 28 A situação da infância e juventude brasileira, assim como de toda a sociedade brasileira, não foi em nada melhorada com o golpe militar de 1964. A Constituição da República Federativa outorgada em 1967, não trouxe qualquer colaboração para a proteção de crianças e adolescentes. Dentro deste panorama, surge a necessidade de uma nova Lei para tratar dos direitos dos menores. 1.1.3 O novo Código de Menores Veronese64 enfatiza que surge em 1979, por meio da Lei 6.697, de 10 de outubro, o novo Código de Menores, no qual se estabeleceu um novo termo “menor em situação irregular”, o qual se referia ao menor de 18 anos de idade “que se encontrava abandonado materialmente, vítima de maus-tratos, em perigo moral, desassistido juridicamente, com desvio de conduta e ainda o autor de infração penal”. Leciona Alves65 que: O Código de Menores de 1979 dispunha sobre assistência, vigilância e proteção aos menores de 18 anos, que se encontrassem em situação irregular, ou entre 18 e 21 anos, nos casos expressos em lei (art. 1º). Eram previstas seis situações irregulares – que determinavam a competência da Justiça de Menores - , graduadas desde o abandona até a infração penal (art. 2º). O Código propunha para elas seis diferentes medidas de assistência e proteção, desde a advertência ou entrega do menor a seus pais até a internação (art.14). Não havia proporcionalidade entre as situações irregulares e as medidas, de modo que a aplicação destas dependia de um exame socioeconômico e cultural do menor e de sua família. Com isso, as medidas detentivas de segurança podiam ser aplicadas independentemente da prática de um fato delitivo. O juiz e o promotor não eram sujeitos neutros: assumiam uma função tuitiva, e não integravam uma tríplice relação processual. Aliás, as medidas podiam ser aplicadas mediante procedimentos administrativos ou contraditórios, de iniciativa oficial ou provocados pelo Ministério Público ou por quem tivesse legítimo interesse (art. 86). Neste diapasão, Veronese66 aduz que: 63 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiça da Infância e Juventude. Florianópolis:Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p. 23. 64 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p. 35. 65 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 6 e 7. 29 O processo em que o “menor” se submetia era inquisitorial, isto significa que a verdade material se sobrepunha aos direitos da pessoa humana, colocando a criança como mero objeto da análise investigatória. Em tais processos, não obrigava a lei menorista à participação do advogado. A intimidade dessa criança ou adolescente era desregradamente vasculhada, sendo que as medidas legais chegavam a intervir na família e no meio em que o mesmo vivia. Importante frisar, as palavras de Neves de Jesus67 ao comentar o art. 2º e 3º daquele Código, quando se verifica que faltando estabelecimentos adequados, o adolescente poderia ser internado em locais destinados a maiores, “garantida a incomunicabilidade”. Assim também, ressalta que o adolescente ao “completar vinte e um anos sem que houvesse se declarado o fim da medida passaria ao juiz da execução penal que, por seu turno, decretaria o fim da medida se julgasse cessada a causa que motivou a internação do infrator (...)”. Ao discorrer sobre o tema, o mesmo autor citado no parágrafo acima, Neves de Jesus68, comenta que: Os critérios incertos de aplicação da lei do Código de menores de 1979 não foram hábeis a prevenir e tratar o abandono e o desvio social da infância e da juventude no Brasil. Além disso, os primeiros anos de sua aplicação foram os últimos anos do regime militar no país, uma época de transição, abertura política e restabelecimento do estado de direito. A sociedade civil, novamente com voz ativa, reclamava por novos conceitos, políticas sociais e participação. Neto e Nascimento69 descrevem que é diante deste cenário que “na década de oitenta, as Igrejas iniciaram um processo de articulação das forças da sociedade civil em defesa dos menores”, sendo que: Em meados dos anos oitenta, organizou-se o Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua (MNMMR), com o objetivo de ser um grupo de articulações e pressão para a transformação social. Empenhava-se no envolvimento dos meninos e meninas como 66 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: LTr, 1999. p. 38. 67 JESUS, Maurício Neves de. Adolescente em conflito com a lei: prevenção e proteção integral. Campinas/SP: Servanda Editora, 2006. p. 62. 68 JESUS, Maurício Neves de. Adolescente em conflito com a lei: prevenção e proteção integral. Campinas/SP: Servanda Editora, 2006. p. 62. 69 SOUZA NETO, João Clemente de; NASCIMENTO, Maria Letícia (orgs.). Infancia, violência, instituições e políticas públicas. São Paulo: Expressão e Arte, 2006. p. 28. 30 protagonistas da história e na articulação dos diferentes grupos da sociedade, em prol dos direitos da criança e do adolescente. Tinha consciência de que esta era uma luta comum dos segmentos que tinham seus direitos negados, para forçar o Estado a implementar políticas sociais e assumir uma postura pedagógica que facilitasse às crianças e adolescentes uma leitura crítica da realidade e a nela interferir, dentro do possível. Segundo Neves de Jesus70, foi a partir deste movimento nacional, que “deu-se a reunião de esforços de setores especializados do poder público federal e organismos da sociedade civil”, interação que tornou possível “transformar em norma constitucional as concepções norteadores da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, mesmo antes da aprovação desta, que se daria em 1989”. Conforme Alves71 é a partir de três documentos internacionais que surge uma mudança na legislação brasileira referente aos menores, sendo eles: (...) as Regras Mínimas para a Administração da Justiça de Menores (Regras de Beijing, Res. 40/33, de 29-11-1985, da Assembléia Geral das Nações Unidas); a Convenção sobre os Direitos da Criança (Res. 1.386, de 20-11-1989, da Assembléia Geral da ONU); e as Diretrizes para a Prevenção da Delinqüência Juvenil (Diretrizes de Riad, Res. 45/112, de 14-12-1990, da Assembléia Geral da ONU). Acrescenta ainda, o mesmo autor, Alves72, que “a eles se uniram as regras Mínimas das Nações Unidas para Proteção dos Jovens privados de Liberdade”. Já Neto e Nascimento73 destacam outras legislações internacionais que teriam sido incorporadas pela sociedade brasileira para a transformação, sendo elas: “a Declaração dos Direitos Humanos de 1948, a Declaração de Genebra, de 1923, a Declaração dos Direitos da criança e do Adolescente, de 1959 e as Convenções e Recomendações da OIT, de 1955”, 70 JESUS, Maurício Neves de. Adolescente em conflito com a lei: prevenção e proteção integral. Campinas/SP: Servanda Editora, 2006. p. 64. 71 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 7. 72 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 7. 73 SOUZA NETO, João Clemente de; NASCIMENTO, Maria Letícia (orgs.). Infância, violência, instituições e políticas públicas. São Paulo: Expressão e Arte, 2006. p. 29 e 30. 31 acrescentando também o Ano Internacional da Pessoa Portadora de Deficiência em 1981. Para Saraiva74, “este conjunto normativo revogou a antiga concepção tutelar, trazendo a criança e o adolescente para uma condição de sujeito de direito”, conferindo a eles “direitos e obrigações próprios de sua peculiar condição de pessoa em desenvolvimentos”. Assim, “a redemocratização do País e a promulgação da nova Constituição da República Federativa do Brasil suprimiram a doutrina da situação irregular e introduziram a doutrina da proteção integral, afirmada no art. 227” 75. O artigo 22776, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, prevê, por sua vez, que: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. De acordo com Silva77, “o legislador, motivado pela necessidade de criar instrumentos à nova Carta Política, promulgou a inovadora Lei nº 8.069/1990, que instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente”, o qual concebeu a estes sujeitos “direitos específicos para lhes assegurar o desenvolvimento, o crescimento e o cumprimento de suas potencialidades”. A Doutrina da Proteção Integral e o Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990 serão abordados no próximo item, tocando seus aspectos relevantes, suas características e aplicação no Brasil. 74 SARAIVA, João Batista Costa. Adolescente em conflito com a lei: da indiferença à proteção integral: uma abordagem sobre a responsabilidade penal juvenil. 3. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009. p. 60. 75 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiça da Infância e Juventude. Florianópolis: Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p. 25. 76 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/sf/legislacao/const/> Acesso em: 30 de maio de 2010. 77 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiçada Infância e Juventude. Florianópolis: Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p. 25. 32 1.2 DA DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL E AS POLÍTICAS DE ATENDIMENTO Como já visto o surgimento e a adoção da doutrina de proteção integral no Brasil, resta caracterizá-la, apresentar seus princípios norteadores, as diferenças dela advindas e demais aspectos relevantes, a exemplo as políticas adotadas para seu atendimento. Liberati78 aduz que: Essa doutrina tem como referência a proteção de todos os direitos infanto-juvenis, que compreendem, ainda, um conjunto de instrumentos jurídicos de caráter nacional e internacional, colocados à disposição de crianças e adolescentes para a proteção de todos os seus direitos. Leciona também Liberati79 que tal doutrina assegura um direito universal às crianças e adolescentes, sem distinção entre abandonados, carentes e infratores. É visível que a partir da adoção da doutrina de proteção integral “a legislação específica não seria mais um instrumento de controle e repressão dos jovens em situação irregular, mas um conjunto de direitos a ser assegurados com absoluta prioridade (...) sem discriminação ou privilégios”, de acordo com os ensinamentos de Neves de Jesus 80. É neste ângulo que complementa Tavares81, afirmando que “o regime anterior circunscrevia-se aos menores em situação irregular”, destacando que “o atual se estende a toda criança e a todo adolescente em qualquer situação jurídica”. 78 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 13. 79 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 14. 80 JESUS, Maurício Neves de. Adolescente em conflito com a lei: prevenção e proteção integral. Campinas/SP: Servanda Editora, 2006. p. 65 e 66. 81 TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 07. 33 Em busca de um significado à “proteção integral”, Chaves82 salienta que: Quer dizer amparo completo, não só da criança e do adolescente, sob o ponto de vista material e espiritual, como também a sua salvaguarda desde o momento da concepção, zelando pela assistência à saúde e bem-estar da gestante e da família, natural ou substituta da qual irá fazer parte. Já Liberati83 explica o sentido da expressão “integral”, asseverando que: É integral, primeiro, porque assim diz a CF em seu art. 227, quando determina e assegura os direitos fundamentais de todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de qualquer tipo, segundo, porque se contrapõe à teoria do “Direito tutelar do menor”, adotada pelo Código de Menores revogado (Lei 6.697/79), que considerava as crianças e os adolescentes como objetos de medidas judiciais, quando evidenciada a situação irregular, disciplinada no art. 2 da antiga lei. Por sua vez, Cury84 trata do fundamento da doutrina da proteção integral, pronunciando que: A proteção integral tem como fundamento a concepção de que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, frente à família, à sociedade e ao Estado. Rompe com a idéia de que sejam simples objetos de intervenção do mundo adulto, colocando-os como titulares de direitos comuns a toda e qualquer pessoa, bem como de direitos especiais decorrentes da condição peculiar de pessoa em processo de desenvolvimento. É, portanto, com o surgimento do Estatuto “que o menor torna- se sujeito de muitos direitos que não lhe eram conferidos por nosso ordenamento jurídico”, o que foi ressaltado por Elias85. 82 CHAVES, Antônio. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2 ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 51. 83 LIBERATI. Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 13. 84 CURY, Munir; PAULA, Paulo Afonso Garrido de; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da Criança e do Adolescente anotado. 3 ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 21. 85 ELIAS, Roberto João. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 02. 34 Deste modo, com a doutrina protetiva várias mudanças são introduzidas, destacando Silva86 as seguintes alterações pilares: - A criança e o adolescente deixam a categoria de objeto de tutela estatal e passam a sujeitos de direitos, sendo-lhes conferidas todas as garantias fundamentais a essa condição (art. 3º do Estatuto). - A criança e adolescente tornam-se prioridades absolutas, tendo seus reflexos indicados no art. 4 do Estatuto, a saber: “a primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; a precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; a preferência na formulação e na execução das políticas sociais; a destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude”. - A criança e o adolescente são reconhecidamente pessoas em desenvolvimento, devendo a família, a sociedade e o Estado respeitarem essa condição (art. 6º do Estatuto). Também Silva87, traz três importantes princípios norteadores da doutrina de proteção integral, o da prioridade absoluta, o do melhor interesse e o da municipalização. Tais princípios são salientados dentre os demais. Acerca da prioridade absoluta, Liberati88 diz que: Por absoluta prioridade devemos entender que a criança e o adolescente deverão estar em primeiro lugar na escala de preocupação dos governantes; devemos entender que, primeiro, devem ser atendidas todas as necessidades das crianças e adolescentes, pois “o maior patrimônio de uma nação é o seu povo, e o maior patrimônio de um povo são suas crianças e jovens”. Acrescenta Silva89, que é necessária a prioridade absoluta “porque a criança e o adolescente são seres em desenvolvimento e, considerando a fragilidade natural decorrente dessa condição peculiar, carecem de proteção especializada, diferenciada e integral”. 86 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiça da Infância e Juventude. Florianópolis: Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p. 26. 87 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiça da Infância e Juventude. Florianópolis: Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p. 27. 88 LIBERATI. Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 16. 89 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiça da Infância e Juventude. Florianópolis: Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p. 28. 35 Sobre o princípio do melhor interesse, Silva90 adverte que este “desponta como um princípio hermenêutico, à medida que orienta, tanto o jurista quanto o legislador, a optar pela decisão que melhor atende aos interesses da criança e do adolescente”, classificando-o como um “princípio orientador”. Relacionado ao princípio da municipalização, entende-se dos ensinamentos de Silva91, que este está ligado às políticas de atendimento e a descentralização dos atendimentos. Assim, dispõe que: (...) municipalizar significa que os demais entes federativos transferiram atribuições, antes somente suas, aos Municípios, ente mais próximo da realidade das crianças e dos adolescentes cidadãos. A municipalização incorpora desde a iniciativa para formular programas direcionados ao atendimento dos direitos da criança e do adolescente até a execução desses mesmos programas. Neste panorama, estamos diante da política de atendimento,regulada pelos artigos 86 a 89 do Estatuto da criança e do Adolescente. Para Liberati92, podemos entendê-la como: (...) o conjunto de medidas, ações, normas, instituições e programas criados e desenvolvidos pelo Poder Público destinados ao atendimento de crianças e adolescentes, visando à promoção e garantia dos direitos fundamentais. Essas ações e programas devem suprir as necessidades básicas de todas as pessoas e, em especial, de crianças e adolescentes. O próprio texto do artigo 86 do ECA prevê que tais ações serão governamentais e não-governamentais, ou seja, “as primeiras criadas e mantidas pelo Poder Público e, as segundas, por particulares, ainda que subvencionadas pelo estado”93. 90 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiça da Infância e Juventude. Florianópolis: Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p. 30. 91 SILVA, Marcelo Gomes (coord.). Manual do Promotor de Justiça da Infância e Juventude. Florianópolis: Coordenadoria de Comunicação Social, 2008. p. 32 e 33. 92 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 82. 93 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 150. 36 Seguindo, verifica-se que o artigo 8794 do mencionado dispositivo legal, estabelece as linhas de ações da política de atendimento, sendo elas: I - políticas sociais básicas; II - políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, para aqueles que deles necessitem; III - serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão; IV - serviço de identificação e localização de pais, responsável, crianças e adolescentes desaparecidos; V - proteção jurídico-social por entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente. VI - políticas e programas destinados a prevenir ou abreviar o período de afastamento do convívio familiar e a garantir o efetivo exercício do direito à convivência familiar de crianças e adolescentes; VII - campanhas de estímulo ao acolhimento sob forma de guarda de crianças e adolescentes afastados do convívio familiar e à adoção, especificamente inter-racial, de crianças maiores ou de adolescentes, com necessidades específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de irmãos. Como políticas sociais básicas, Elias95 destaca que “devem ter por finalidade a defesa dos direitos fundamentais de que trata o art. 227 da Constituição Federal”, que são segundo Liberati96, “o trabalho, a educação, a saúde, a habitação, o abastecimento, o transporte, o esporte, o meio ambiente e o lazer”. 94 BRASIL. Lei n. 8069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm> Acesso em 10.10.2010. 95 ELIAS, Roberto João. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 62. 96 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 82. 37 Acercas das políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, assevera Liberati97 que estão “ligadas à existência de desigualdades sociais, que são incapazes de desaparecer, espontaneamente, pela atuação dos mecanismos postos pela política social básica”, o que caracteriza “a situação de risco, sugerindo a necessidade de aplicar a ação compensatória”. De maneira sucinta, o mesmo autor, Liberati98, trata os incisos III a V do artigo 87, do ECA, como “política de proteção especial”, destinada aos casos de “crianças e adolescentes considerados em situação de risco pessoal e social”, quando “ultrapassam o âmbito das políticas sociais básicas e assistenciais, exigindo esquema especial de abordagem e tratamento”. No que tange às diretrizes da política de atendimento, estas estão traçadas no artigo 88 do ECA, que para Alves99 são: a) municipalização do atendimento; b) criação de conselhos municipais, estaduais e nacionais dos direitos da criança e do adolescente; c) a criação e manutenção de programas específicos, observada a descentralização político-administrativa; d) manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente; e) integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Segurança Pública e Assistência Social, preferencialmente em um mesmo local, para efeito de agilização do atendimento inicial a adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional; f) mobilização da opinião pública no sentido da indispensável participação dos diversos segmentos da sociedade. Também no entendimento de Alves100, as inovações mais relevantes do ECA “foi a municipalização do atendimento, notadamente com a criação dos Conselhos Municipais e Tutelares, e ainda, dos Fundos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente”. 97 LIBERATI. Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 51 e 52. 98 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 84. 99 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 34. 100 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 34. 38 Em suma, Ishida101 destaca como objetivo do Conselho de Direito da Criança e do Adolescente “estabelecer prioridades e definir políticas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente no município”, acrescentando Alves102 que “cada um dos conselhos deve gerir um fundo dos direitos da criança e do adolescente, também criado por lei, destinado ao financiamento das políticas de atendimento”. Contribui Liberati103, afirmando que estes conselhos “serão órgãos deliberativos (...) e controladores das ações governamentais nos respectivos níveis, em todas as questões relativas ao atendimento dos direitos da criança e do adolescente (...)”. Destacam-se, também, as palavras de Neves de Jesus104, ao fazer menção sobre a criação do “Conselho Nacional dos Direitos da Criança – CONANDA”, ao qual compete “elaborar as normas gerais da política nacional de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, além de zelar pela sua aplicação”. Já o Conselho Tutelar “é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, responsável direto pela primeira atenção à criança e ao adolescente em situação de risco pessoal e social” 105. Novamente Alves106, atenta que: O Conselho Tutelar está habilitado a promover a execução de suas decisões, podendo para tanto requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança, expedir notificações e requisitar certidões de nascimento e óbito de crianças e adolescentes. 101 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 149. 102 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 35. 103 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 85. 104 JESUS, Maurício Neves de. Adolescente em conflito com a lei: prevenção e proteção integral. Campinas/SP: Servanda Editora, 2006. p. 70.105 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 35. 106 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 37. 39 Outrossim, é importante comentar brevemente o artigo 90107 do ECA, que prevê: Art. 90. As entidades de atendimento são responsáveis pela manutenção das próprias unidades, assim como pelo planejamento e execução de programas de proteção e sócio-educativos destinados a crianças e adolescentes, em regime de: I - orientação e apoio sócio-familiar; II - apoio sócio-educativo em meio aberto; III - colocação familiar; IV - acolhimento institucional; V - liberdade assistida; VI - semi-liberdade; VII - internação. Assim, verifica-se que “também integram a rede de atendimento as entidades a quem se atribui o planejamento e execução de programas de proteção e de cumprimento de medidas socioeducativas”108, as quais “estão sujeitas à fiscalização do Judiciário, do Ministério Público e dos Conselhos Tutelares”. 1.3 DAS MEDIDAS DE PROTEÇÃO APLICADAS ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES Denota-se do artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que as crianças e adolescentes receberão tratamento especial e que contemple os direitos fundamentais, sendo-lhes garantido “o direito à 107 BRASIL. Lei n. 8069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm> Acesso em 10.10.2010. 108 ALVES, Roberto Barbosa. Direito da Infância e da Juventude. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 37. 40 vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária” 109. Ao passo que tais direitos são ameaçados ou violados, afirma Liberati110 que as medidas de proteção surgem “proporcionando o restabelecimento da situação anterior de regularidade”. As medidas de proteção são reguladas pelos artigos 98 a 102 do Estatuto da Criança e do Adolescente, subdividindo-se em disposições gerais e medidas de proteção específicas. Nesta ordem, Nogueira111 classifica as medidas de proteção em genéricas e específicas. A modalidade genérica “decorrem da ação ou omissão da sociedade ou do Estado, da falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis, e da conduta do menor, mas visam protegê-lo”. As especificas, por sua vez, “são as previstas no art. 101, incisos I a VIII, e serão determinadas pela autoridade competente”. Assim, como genérico, analisa-se primeiro o artigo 98112 que dispõe: Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados: I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III - em razão de sua conduta. 109 BRASIL. Constituição Federal da República Brasileira de 1988. Art. 227. 110 LIBERATI. Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 63. 111 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 4 ed. rev., aum., e atual. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 146. 112 BRASIL. Lei n. 8069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm> Acesso em 10.10.2010. 41 Sobre este dispositivo, Chaves113 ressalta que “tais medidas escalonam os menores em três categorias: os carentes, ou em situação irregular, os menores vítimas e os que praticaram atos infracionais”. Neste norte, como situação irregular das crianças e adolescentes, Ishida114 esclarece que será identificada “sempre que se constatar situação de abandono ou de risco envolvendo os mesmos”, isso em decorrência das hipóteses descritas no artigo acima citado. Já Liberati115 prefere considerar os incisos do artigo 98 como “base de verificação da real situação de risco pessoal e social em que se encontram as crianças e adolescentes”. Seguindo nos comentários do artigo mencionado, Elias116 trata o inciso I como “uma série de situações advindas de falhas da sociedade ou do Estado”. Liberati117, por sua vez, exemplifica a omissão da sociedade e do Estado, dizendo que isso ocorrerá “quando crianças estiverem vivendo na rua, sofrendo maus-tratos em entidade de atendimento à criança, seja governamental ou não-governamental, não sendo atendidas por escolas ou hospitais (...)”. Adentrando nos comentários do inciso II, Elias118, de maneira sucinta assoalha que: Se a sociedade e o Estado devem ser cobrados, muito mais deve-se exigir dos pais ou responsáveis, por força dos direitos inerentes ao pátrio poder ou outro liame legal. Atente-se, por exemplo, ao que 113 CHAVES, Antônio. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2 ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 455. 114 ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 157. 115 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 88. 116 ELIAS, Roberto João. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 76. 117 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 88. 118 ELIAS, Roberto João. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. São Paulo: Saraiva, 1994. p.77. 42 dispõe o art. 122 do Estatuto, que se refere aos deveres dos pais com relação ao sustento, guarda e educação dos filhos menores. Assim, também, quanto à obrigação de matricular os filhos na rede regular de ensino (art. 55), bem como a obrigatoriedade de cumprir medidas determinadas pelo Juiz da Infância e da Juventude (art. 129, I a VI). De maneira diversa, Liberati119 contempla as categorias omissão, abandono, negligência e abuso, afirmando que: Por omissão entende-se a ausência de ação ou inércia dos pais ou responsável; por abandono, tanto material quanto o jurídico, identifica-se o desamparo daquele ser desprotegido; por negligência supõe-se o desleixo, o descuido, a incúria, a desatenção, o menosprezo, a preguiça e a indolência dos pais ou do responsável. (...) o abuso é a exorbitância das atribuições do poder familiar. Já em relação ao inciso III, aponta Ishida120 que “referem-se à própria conduta do menor”, apresentando Liberati121 como exemplo, a prática de ato infracional, “dando origem à ação judiciária, que resultará na imposição de medida socioeducativa e/ ou protetiva mais adequada para o caso”. No tocante à aplicação das medidas protetivas, Nogueira122 afirma que podem ser ajustadas “isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo, tendo em vista sempre o interesse da criança ou do adolescente”, acrescentando que “deve-se levar em conta preferencialmente aquelas que visem fortalecer os vínculos familiares e comunitários”. De acordo com o parágrafo único do artigo 100123 do ECA, auto explicativo, a aplicação das medidas específicas de proteção será regida pelos seguintes princípios: 119 LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito da Criança e do Adolescente. 3 ed. São Paulo: Riddel, 2009. p. 89. 120 ISHIDA, Válter Kenji.
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