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Aula 9: Os anos 1980: crise da dívida, crise fiscal do Estado e descontrole inflacionário (1979- 1985) Dias Carneiro & Modiano (1989) “Ajuste Externo e Desequilíbrio Interno, 1980-1984”. I.CONTEXTO HISTÓRICO ECONOMIA MUNDIAL: O início dos anos 1980 foi caracterizado pelas transformações na economia mundial em função do 2º choque do petróleo, desencadeando uma pressão de custos que elevou as taxas de inflação na maioria dos países industrializados a níveis acima de 10%. Em busca de ajuste, políticas monetárias restritivas foram implementadas, especialmente nos EUA (Paul Volcker/FED). As consequências de tais políticas no curto prazo causaram um longo período recessivo que se estendeu até 1983. Nos anos 1980 também houve uma revolução na política fiscal dos EUA, com a nova administração republicana (Reagan, janeiro 1981) promovendo uma reforma fiscal com significativa redução de impostos e, simultaneamente, um aumento dos gastos militares. Os efeitos da alta do petróleo e da política econômica dos EUA sobre os países em desenvolvimento teve um alto custo, cuja conseqüência principal foi a moratória mexicana (agosto 1982). Com a manutenção de déficits fiscais elevados e elevadas taxas de juros reais, os EUA drenou recursos das demais economias industrializadas para o financiamento da sua conta corrente. Em meados da década o desequilíbrio macroeconômico dos EUA – os déficits gêmeos, fiscal e comercial – tornou-se um elemento de forte tensão nos mercados financeiros internacionais, ao criar sérios problemas nos países superavitários com superaquecimento de suas economias e tensões inflacionárias, além de canalizar praticamente a totalidade dos fluxos financeiros internacionais para a economia dos EUA. O receio generalizado de que o dólar poderia se desvalorizar de forma abrupta e caótica impunha a necessidade de coordenação do processo. No acordo do Hotel Plaza (NY) em setembro de 1985 os países industrializados concordaram com a necessidade de coordenar a desvalorização do dólar. O processo de desvalorização do dólar foi favorecido pelo “contra-choque” do petróleo, com uma queda nominal dos preços de quase 1/3 do seu valor entre fins de 1985 e início de 1986, acomodando eventuais pressões inflacionárias nos EUA, levando 1986 a registrar as mais baixas taxas de inflação em muitos anos nas economias industrializadas. Com isso foram criadas condições para um novo surto de vigoroso crescimento que se estendeu até 1989, quando novamente tensões se acumularam e a economia mundial começou a mostrar claros sinais de arrefecimento no seu ritmo de expansão e evidentes pressões inflacionárias. II. QUESTÃO BÁSICA NO PERÍODO Do final de 1980 a meados de 1984, as linhas gerais da política econômica passaram a ser ditadas pela disponibilidade de financiamento externo: a) ‘tautologia’ do BP: C/C + K = 0, Condicionante: quanto será necessário captar de recursos externos para financiar déficit C/C?; b) a partir de 1982 temos C/C como f(K) – ou seja, dado o crédito externo disponível (que no auge da crise era nulo), em quanto terá que se “ajustar” o saldo em Conta Corrente?; c) “O espaço de manobra gerado pela disponibilidade de financiamento externo em 1979/80 foi parcialmente desperdiçado pela política econômica de 1980. Entretanto, o tempo era um fator importante, para o ajuste estrutural, uma vez que os elementos mais importantes da estratégia de longo prazo do final da década de 1970 não estavam ainda consolidados. Apesar dos repetidos anúncios de cortes no orçamento público, os investimentos relacionados ao II PND não só prosseguiram como foram incluídos nas prioridades do III PND” (Dias Carneiro & Modiano). III. CONDICIONANTES DA POLÍTICA ECONÔMICA PERDA DE CONFIANÇA NO GERENCIAMENTO DE CURTO PRAZO DA ECONOMIA B. DISCURSO OFICIAL NOS ANOS SEGUINTES MARCADOS PELA DEMONSTRAÇÃO CONTÍNUA NA FÉ ORTODOXA NOS CONTROLES DE DEMANDA PARA LIDAR COM A INFLAÇÃO; C. RESISTÊNCIA CADA VEZ MAIOR DA ECONOMIA INDEXADA ; D. AUMENTO DA VENDA DE TÍTULOS PÚBLICOS PARA FINANCIAR NFSP + TAXA DE JUROS ELEVADA PARA INCENTIVAR CAPTAÇÃO EXTERNA. IV. EVOLUÇÃO NO PERÍODO: 1. 1980 – PRIMEIRA HETERODOXIA - Maxidesvalorização em novembro de 1979 (30%) com PRÉFIXAÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA (45%) E DO CÂMBIO (40%). Em 1980, elevação dos juros reais e forte controle de preços, para tentar sustentar a “heterodoxia”. Mas em junho 1980, fracassa a tentativa “heterodoxa”, com revisão das metas prefixadas, depois que as retiradas de aplicações financeiras indexadas já se mostravam perigosamente superiores aos depósitos. 2. 1981 – RECESSÃO SEM FUNDO – “a política macro que prevaleceu em 1981/82 foi basicamente direcionada para a redução das necessidades de divisas, através do controle da absorção interna - queda de demanda interna para tornar a atividade exportadora mais atraente, ao mesmo tempo em que reduzia as importações. O grau de sucesso dessa estratégia na redução do hiato de recurso reais depende da intensidade da recessão resultante” (Dias Carneiro & Modiano). - medidas adotadas: a. contenção salarial, b. controle de gastos do governo, c. aumento da arrecadação, d. aumento da taxa de juros interna, e. contração da liquidez real, sem abrir mão do tratamento especial (subsídios) dado às exportações, energia, agricultura e pequenas empresas. Efeito das políticas restritivas de demanda na taxa de inflação foi praticamente nulo. A partir daí, início da discussão sobre INÉRCIA INFLACIONÁRIA, contrapondo ao “otimismo deflacionista” de Lemgruber e Contador, as posições de Lara Resende, Chico Lopes e Modiano entre outros (CONTROLE MONETÁRIO x INÉRCIA). A partir de novembro, reduzido controle de preços, como forma de reduzir as críticas dos setores empresariais. QUESTÃO IMPORTANTE – Por que o governo não recorreu logo ao FMI, tendo esta demora custado cerca de US$ 400 mil. na conta de juros? RESPOSTA: Parecia temer que o FMI demandasse drásticas mudanças na estratégia de ajustamento estrutural de longo prazo e restringisse sua liberdade em relação à política econômica (ou seja, poderia ser considerada uma demonstração de fraqueza). 3. 1982 – DA RECESSÃO AO FUNDO (ao FMI) – “A recessão mundial, acentuada pelo comportamento defensivo dos dirigentes das economias centrais frustrava a tentativa de produzir um significativo superávit comercial. Novas restrições ao crescimento econômico tornaram-se inevitáveis depois do anúncio da MORATÓRIA MEXICANA (agosto 1982), ficando claro que não seria possível convencer os banqueiros privados a continuarem dobrando suas apostas na estratégia brasileira de longo prazo”. Setembro 1982, a reunião anual do FMI não aumentou recursos para os “endividados” - Brasil começa negociações “secretas” com FMI. 4. 1983 – O FUNDO DA RECESSÃO - Nos 24 meses subsequentes ao acordo com FMI - 7 Cartas de Intenções (acordadas e não cumpridas); Mudança na metodologia do FMI para calculo Déficit Público (Nominal, Operacional, Primário), dada dificuldade em aplicar metodologia tradicional a uma economia em desenvolvimento altamente indexada, na qual o setor público não somente era responsável por algo entre 30/50% do investimento global, como também intermediava grande parte do investimento privado através da administração de importantes fundos compulsórios de poupança. Uma combinação de fatores (recessão interna, queda do salário real, desvalorização cambial, queda do preço do petróleo e da taxa de juros internacional) e a recuperação da economia norte-americana (que se fortaleceu durante a segunda metade do ano) contribuíram para o cumprimento de praticamente todas as metas relacionadas com as contas externas em 1983. Mas houve fortes dificuldades no cumprimento das metas internas. Novo patamar inflacionário – aumento de 100% em 1980/82para 200% em 1983/85, explicado pela nova maxidesvalorização cambial em fevereiro de 1983 (30%), gerando choque cambial, que se adicionou a um choque agrícola. 5. 1984 – COM O FUNDO (FMI), SEM RECESSÃO - PELA PRIMEIRA VEZ DESDE 1979, RESTRIÇÃO EXTERNA MOSTRA SINAIS DE RELAXAMENTO, mas a estabilidade das taxas mensais de inflação até agosto, em torno de 10%, reforçava o caráter inercial do processo inflacionário brasileiro e sua relativa invariância ao nível de atividade - diversas sugestões para eliminar a indexação, entre elas as de Pérsio Arida e Lara Resende (“moeda-indexada”) e de Chico Lopes (“choque heterodoxo”). 6. ALGUMAS CONCLUSÕES: Os resultados do balanço de pagamentos em 1984 comprovaram determinadas teses acerca do ajustamento externo: 1) importância do comportamento da demanda mundial por exportações para um ajustamento externo não recessivo; 2) o encolhimento da capacidade produtiva existente, simultaneamente com a transferência ao exterior de 4% do PIB devido ao endividamento externo explosivo; 3) mostraram que a estratégia de longo prazo seguida depois do primeiro choque do petróleo estava gerando dividendos - um crescimento substancial do PIB foi finalmente alcançado, juntamente com uma queda do coeficiente de importação (6.3% do PIB) e um aumento do coeficiente de exportação (12.3% PIB), na medida em que a maioria dos projetos associados ao ajuste estrutural de longo prazo começou a operar (Castro & Souza, 1985, A economia em Marcha Forçada).
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