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78 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II Unidade II 5 O MERCADO DE BENS EM UMA ECONOMIA ABERTA A partir deste ponto do livro‑texto, discutiremos de forma mais aprofundada a abertura do mercado de bens. Essa análise se mostra pertinente para entendermos as relações econômicas entre diferentes países, suas posições comerciais, e dá elementos importantes para a análise dos impactos das políticas econômicas nos diversos cenários do modelo de economia aberta. A partir dessa apresentação, teremos condições de conhecer as implicações de economia aberta para o modelo IS‑LM, para obter respostas aos ciclos econômicos no interior dos países e nos momentos de expansão e recessão da economia mundial. Com isso podemos responder a questões como: uma recessão nos Estados Unidos pode, de fato, provocar uma recessão mundial? Por conta da interação entre os países, pode haver formas de coordenar políticas macroeconômicas entre eles? Tais questões podem ser respondidas com o exame do modelo em sua forma expandida, e a partir dele vislumbrar as possibilidades de gestão de políticas econômicas. Será essa a posição que tomaremos a seguir. 5.1 Curva IS em economias abertas Anteriormente, pensando em uma economia fechada, o mercado de bens se restringia à demanda por bens internos nas operações de comércio em um país, em outras palavras, não havia distinção entre a demanda interna por bens e a demanda por bens internos. Então, ocorre certa distinção, pois parte da demanda interna será satisfeita por bens externos e parte da demanda por bens internos virá do exterior, devido à abertura do mercado de bens. Num primeiro momento, como ressalta Blanchard (2011, p. 356), “as expressões ‘demanda interna por bens’ e ‘demanda por bens internos’ parecem muito semelhantes”, mas veremos que, em uma economia aberta, não guardam o mesmo significado. Isso fica claro porque parte da demanda interna recai sobre bens externos e, ao mesmo tempo, parte da demanda externa recai sobre bens internos. No caso de uma economia aberta, a demanda por bens internos (Z) é dada por: Z ≡ C + I + G – ∈IM + X Seus três primeiros termos – consumo (C), investimento (I) e gastos do governo (G) – já constituíam, no modelo fechado, a demanda interna por bens. Por isso também a expressão C + I + G correspondia à demanda por bens internos. Agora, com a abertura do mercado de bens, temos que examinar mais variáveis e promover ajustes, como já nos mostra a equação. 79 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA Em primeiro lugar, devemos subtrair as importações. São elas que representam a parcela da demanda interna que será satisfeita por bens externos em vez de bens internos. No entanto, como nos alerta Blanchard (2011, p. 356): Precisamos ter cuidado aqui: os bens externos são diferentes dos internos, de modo que não podemos simplesmente subtrair a quantidade de importações, IM. Fazendo isso, estaremos subtraindo maçãs (bens externos) de laranjas (bens internos). Temos primeiro de expressar o valor das importações em termos de bens internos. É isso o que representa ∈IM na equação. Como vimos anteriormente, ∈ é a taxa real de câmbio, que condiz com o preço relativo dos bens externos em termos de bens internos. Portanto, o preço multiplicado pela quantidade de bens importados (∈IM) destaca o valor das importações em termos de bens internos. Observação Em algumas representações, ignora‑se a taxa real de câmbio e subtrai‑se IM na equação da demanda interna por bens. O correto, no entanto, é utilizarmos a expressão ∈IM, assim expressando a relação entre os preços dos bens externos com os bens internos. Além disso, um segundo ajuste consiste em acrescentar as exportações (X), que correspondem à demanda por bens internos pelo exterior. Se descrevermos todos os ajustes, teremos que: Demanda interna por bens (C + I + G); menos Demanda interna por bens externos (importações, ∈IM) mais Demanda externa por bens internos (exportações. X) igual a Demanda por bens internos (C + I + G – ∈IM + X) A partir dessa equação, nosso próximo passo deve ser descrever os determinantes de cada um dos cinco componentes da demanda. Primeiramente, vamos começar especificando C, I e G para relembrarmos o que já fixamos com o exame de uma economia fechada. Numa economia aberta devemos nos perguntar o que se modifica nas descrições anteriores sobre esses três componentes? Em uma resposta concisa, não teremos muitas mudanças. Pela ótica dos consumidores, suas decisões de gasto ainda dependem 80 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II de sua renda e riqueza, mesmo que a taxa real de câmbio tenha algum efeito sobre a composição dos gastos de consumo entre os bens internos e externos. Portanto, não encontramos uma grande razão para impactos relevantes no nível geral de consumo. Temos um raciocínio parecido para o investimento, já que a taxa real de câmbio pode afetar a decisão das empresas no tocante à decisão de comprar insumos ou máquinas nacionais ou estrangeiras, mas não terá novamente grandes impactos no nível de investimento total. Isso nos possibilita usar as mesmas descrições quanto ao comportamento do consumo, investimento e gastos do governo que vimos no modelo de economia fechada. Deste modo, temos: Demanda interna: C + I + G = C(Y – T) + I(Y, r) + G ( + ) ( +, – ) Relembrando: supomos que o consumo dependa positivamente da renda disponível, Y – T (renda menos os impostos), e que o investimento depende positivamente do produto (Y) e negativamente da taxa real de juros (r). Por fim, continuamos supondo que os gastos do governo (G) são dados. Por ora, não incluiremos todos os detalhes introduzidos no exame anterior desses componentes, mas os acresceremos nos momentos pertinentes para o melhor entendimento dos efeitos em um ambiente de abertura da economia. Dito isso, partiremos para os elementos que são novidades nesta nova descrição da demanda interna, ou seja, as importações e exportações. Começando pelas importações, poderíamos perguntar: do que depende a quantidade de importações (IM)? Em um primeiro instante, depende do nível que se apresenta a demanda interna, já que um maior nível de demanda doméstica leva a uma maior demanda por bens, sejam internos, sejam externos. Em segundo lugar, as importações também dependem da taxa real de câmbio, pois, quanto mais alto o preço dos bens externos em relação ao preço dos bens internos, representará uma menor demanda interna por bens externos em relação aos bens internos, o que corresponde a uma menor quantidade de importações. Se expressarmos em uma equação, teremos as importações como: IM = IM(Y, ∈) ( +, – ) Pela equação, temos que a quantidade de importações depende da renda (ou, de modo equivalente, do produto), portanto, uma renda maior favorece a ocorrência de mais importações. Por outro lado, a quantidade de importações também depende da taxa real de câmbio (∈), que corresponde à relação dos preços externos e internos. Supondo uma taxa real de câmbio mais alta, em outras palavras, os bens externos mais caros em relação aos bens internos, isso leva a uma queda na quantidade de importações. O movimento contrário também é verdadeiro. Tal efeito negativo da taxa real de câmbio é representado pelo sinal de negativo visualizado abaixo da expressão. 81 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTAObservação Em alguns casos, as importações dependem da composição da demanda. Podemos ilustrar isso, por exemplo, quando países pobres importam a maior parte de seus equipamentos de capital, mas consomem principalmente bens internos. Nesse caso, a composição da demanda teria importância para as importações. No caso das exportações, devemos ter em mente que a exportação de um país corresponde à importação de outro. Ao pensarmos nos determinantes das exportações do Brasil, devemos nos questionar o que determina as importações dos países do resto do mundo. Tendo em vista a discussão sobre os determinantes das importações, podemos deduzir que as importações estrangeiras irão depender do nível de atividade externa e do preço dos bens externos (na ótica desses países, seus bens internos). Vamos adotar Y* para representar o produto do resto do mundo, que denominaremos de produto externo. Assim, as exportações serão determinadas como: X = X(Y*, ∈) ( +, + ) Por conta disso, qualquer aumento do produto externo condiciona um aumento da demanda externa por todos os bens, sendo que parte desse aumento pode se destinar à aquisição de bens do Brasil, logo, levando ao crescimento das exportações do Brasil. Do mesmo modo que um aumento da taxa real de câmbio, em outras palavras, um aumento do preço relativo dos bens externos em termos dos bens do Brasil, isso faz dos bens do Brasil relativamente mais atraentes em relação aos bens externos, resultando num aumento das exportações brasileiras. A partir de tais colocações podemos ilustrar graficamente, na figura a seguir, as deduções que realizamos, traçando os vários componentes da demanda em relação à renda, mantendo constantes as demais variáveis (taxa de juros, impostos, gastos do governo, produto externo e taxa real de câmbio) que afetam a demanda. A) Pr od ut o, Y Produto Demanda interna (C + I + G) DD B) Pr od ut o, Y Produto Importações(∈IM) DD AA Figura 30 – Demanda por bens internos e exportações líquidas 82 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II Na figura 30A, a linha DD corresponde à demanda doméstica (C + I + G) por causa do produto, Y. Percebemos, dadas as suposições do modelo, que a inclinação da relação entre a demanda e o produto é positiva, mas com valor inferior a 1, já que um aumento do produto (ou da renda) aumenta a demanda, mas em uma proporção menor que um para um. Para expressar a demanda por bens internos, precisamos subtrair primeiro as importações. Tal operação equivale ao ilustrado na figura 30B, possibilitando chegarmos a uma nova reta que denominaremos AA; essa reta AA representará a demanda interna por bens internos. Podemos deduzir, com isso, que a distância entre DD e AA será igual ao valor das importações, dada pela taxa de câmbio multiplicada pela quantidade importada (∈IM). Logo, como a quantidade de importações eleva‑se com a renda, a distância entre as duas linhas aumenta com a renda. Como nos lembra Blanchard (2011, p. 359), podemos traçar dois fatos sobre a linha de demanda interna por bens internos (AA): 1) AA é menos inclinada do que DD: à medida que a renda aumenta, parte da demanda interna adicional recai sobre os bens externos em vez de sobre os bens internos. À medida que a renda aumenta, a demanda interna por bens internos aumenta menos que a demanda interna total. 2) Enquanto parte da demanda adicional recai sobre bens internos, AA terá uma declividade positiva: um aumento da renda provoca certo aumento da demanda por bens internos. Nosso próximo passo consiste em considerar as exportações. Na figura 31A, logo a seguir, acrescentamos as exportações à reta AA, o que nos dá a reta ZZ, que, por esse raciocínio, estará acima de AA. A linha ZZ expressa a demanda por bens internos. A distância entre ZZ e AA corresponde às exportações. Ao não depender do produto interno, a distância entre as duas retas será constante, razão para que as duas retas apresentem‑se paralelas. Quanto às inclinações, como AA é menos inclinada que DD, por consequência, ZZ também será menos inclinada que DD. Por fim, com base nas informações da figura 31A, temos condições de apontar o comportamento das exportações líquidas, dado pela diferença entre exportações e importações, por conta do produto. A cada nível de produto, as exportações serão dadas pela distância AC e as importações, pela distância AB, caracterizando as exportações líquidas pela distância BC. 83 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA A) Pr od ut o, Y Produto Y Exportações (X) DD ZZ AA C B A YTB B) E xp or ta çõ es lí qu id as , N X BC NX Superávit comercial Déficit comercial YTB Figura 31 – Demanda por bens internos e exportações líquidas Lembrete Lembre‑se de que exportações líquidas é um sinônimo de balanço comercial. Exportações líquidas positivas equivalem a um superávit comercial e exportações líquidas negativas, a um déficit comercial. Quando relacionamos as exportações líquidas e o produto, construímos a reta NX na figura 31B. Como as exportações líquidas estão em função do produto, a reta será uma função decrescente do produto, pois à medida que o produto aumenta, há uma elevação das importações e um comportamento constante por parte das exportações, o que ocasiona uma queda das exportações líquidas. Para entendermos a representação da situação do balanço comercial, tomaremos Ytb como o nível de produto que equivale ao equilíbrio do balanço comercial, ou seja, no qual o valor das importações se iguala ao valor das exportações, e, portanto, as exportações líquidas são iguais a zero. Logo, valores do produto acima de Ytb levam ao aumento das importações e ao aparecimento de déficits comerciais. Para níveis de produto abaixo de Ytb, ocorre uma diminuição das importações, o que resulta em situações de superávit comercial no balanço. A partir dessa apresentação gráfica, temos condições de avançar na relação entre produto e balanço comercial, com o intuito de maior formalização do modelo de economia aberta. 5.2 Produto e balança comercial Podemos caracterizar o equilíbrio no mercado de bens quando o produto interno for igual à demanda por bens internos num dado país. Iremos representar como: Y = Z Portanto, tal equilíbrio prescinde que essa situação ocorra, sendo que, no caso de uma economia aberta, devemos reunir as relações que evidenciam essa demanda por bens internos (Z), que realizamos ao deduzir os componentes dessa demanda: 84 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II Y = C(Y – T) + I(Y, r) + G – ∈ IM(Y, ∈) + X(Y*, ∈) Construímos, assim, a posição de equilíbrio que determina o produto e a condiciona como função das variáveis tomadas como dadas, da taxa real de câmbio e ao produto externo. Para os economistas, essa relação não se caracteriza como simples, o que ficará mais compreensível com a representação gráfica fornecida pela figura a seguir. Na figura 32A, a demanda é medida no eixo vertical e o produto (ou, a renda), no eixo horizontal. A reta ZZ, como destacada anteriormente, traça a demanda como função do produto, guardando as características de apresentar declividade positiva e inferior a um. Então, o produto de equilíbrio encontra‑se no ponto em que a demanda é igual ao produto, pela intersecção entre a reta ZZ e a reta de 45 graus, tendo assim um ponto A que nos aponta o nível de produto (Y) no eixo horizontal. A) De m an da , Z Produto, YY ZZ A 45º B) Ex po rt aç õe s l íq ui da s, N X B C 0 NX Déficit comercial Produto, Y Produto, Y }YTB Figura 32 – Produto de equilíbrio e exportações líquidas No caso da figura 32B, temos uma reprodução da figura 31B, com as exportações líquidas como função decrescente do produto. Aqui, devemos deixar claro que não há nenhuma razão para que o nível do produto de equilíbrio (Y) equivalha exatamente a uma situação de equilíbrio do balanço comercial (Ytb). Pela figura, o produto de equilíbrio encontra‑se associado à ocorrência de um déficit comercial apontado pela distância BC. Tal divergência entre os equilíbrios ocorre porque o nível de equilíbrio do produto é dado pela condição Y = Z, e o nível de produto correspondente ao equilíbrio do balanço comercial dado por X = ∈IM. O nível de equilíbrio do produto é dado pela condição Y = Z. O nível do produto em que há equilíbrio do balanço comercial é dado pela condição X = E: IM. Temos, portanto, o entendimento de que as condições dos equilíbrios são diferentes. Com base nisso, podemos somar mais algumas ferramentas necessárias para entender os efeitos e para responder às perguntas sobre a interação entre os países e suas relações comerciais. 5.3 Variações de demanda interna e externa Após as apresentações das principais associações entre as variáveis, principalmente entre a demanda interna e o produto, partiremos para a análise de casos nos quais ocorrem variações pelo lado da 85 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA demanda. Como mudanças na demanda afetam o produto em uma economia aberta? Para ilustrar tal exercício, usaremos o exemplo dado por Blanchard (2011, p. 361) de um aumento dos gastos do governo para entender as mudanças na demanda interna. Depois, partiremos para o exame dos efeitos de um aumento da atividade externa. Partiremos da suposição de que a economia de um país está em recessão e que o governo tome como medida elevar seus gastos, expandindo, portanto, a demanda e o produto interno. Quais efeitos teriam tal decisão sobre o produto e o balanço comercial? Podemos visualizar tal resposta através da figura a seguir. Antes de o aumento dos gastos do governo, a demanda interna é dada por ZZ na figura 33A com o equilíbrio no ponto A, correspondendo a um produto igual a Y. Adicionamos também o pressuposto que o comércio esteja inicialmente em equilíbrio, de modo que em 33B ocorra Y = Ytb. Qual o efeito quando o governo aumenta seus gastos em ∆G? A) De m an da , Z Produto, Y ∆G>0 Y Y’ ZZ’ ZZ A A’ 45º B) Ex po rt aç õe s l íq ui da s, N X B C 0 NX Déficit comercial Produto, Y }YTB Figura 33 – Efeitos de um aumento dos gastos do governo Com isso, em todos os níveis de produto, a demanda será maior em ∆G e desloca a relação de demanda para cima na magnitude de ∆G, passando de ZZ para ZZ’. O ponto de equilíbrio se desloca de A para A’ e o produto aumenta de Y para Y’. Outro ponto que devemos ressaltar será que a elevação do produto é maior que o aumento nos gastos do governo e em razão de um efeito multiplicador, devemos acrescentar que ocorrem duas diferenças importantes no caso de uma economia aberta, o que nos lembra Blanchard (2011, p. 361): • Há agora um efeito sobre o balanço comercial. Como os gastos do governo não entram diretamente nem na relação de exportações, nem na relação de importações, a relação entre exportações líquidas e produto [na figura 33B] não se desloca. Portanto, o aumento do produto de Y para Y’ provoca um déficit comercial igual à BC. • Os gastos do governo agora não só geram um déficit comercial, como também seu efeito sobre o produto é menor do que em uma economia fechada. Lembre‑se [...] de que quanto menor a declividade da relação de demanda, menor é o multiplicador (por exemplo, se ZZ for horizontal, o multiplicador será exatamente igual a 1). E lembre‑se [da figura 30] de que a relação de demanda 86 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II é menos inclinada do que a relação de demanda para uma economia fechada, DD. lsso significa que o multiplicador é menor na economia aberta. A explicação para o déficit comercial e o multiplicador menor tem a mesma origem: esse aumento da demanda não se restringe somente sobre os bens internos, mas também sobre os bens externos. Logo, quando temos uma elevação da renda, a demanda por bens internos será menor do que no caso da economia fechada, ocasionando um multiplicador menor também. Já que parte dessa expansão da demanda recai sobre as importações, sem alteração no nível de exportações, o resultado apresentará um déficit comercial. Temos assim duas implicações importantes para uma economia aberta: primeiro, os aumentos da demanda interna têm um efeito menor sobre o produto do que na economia fechada; e em segundo, leva a um efeito adverso sobre o balanço comercial. Também temos que destacar que quanto mais aberta a economia de um país, menor o efeito sobre o produto e maior a ocorrência de déficit no balanço comercial. Dando como exemplo o caso da Bélgica, cuja participação das importações em relação ao PIB está próxima de 90%, qualquer elevação da demanda interna faz com que grande parte do aumento assuma a forma de bens externos em vez do crescimento da demanda por bens internos. Isso terá como efeito uma expansão do déficit comercial, com pequeno reflexo no aumento do produto, o que torna a expansão da demanda interna uma política não muito eficaz para esse país. O mesmo raciocínio pode ser aplicado aos Estados Unidos, cujo coeficiente de importação é de cerca de 14%, em que um acréscimo da demanda estará associado a uma situação de déficit do balanço comercial, mas numa dimensão menor do que no caso da Bélgica (BLANCHARD, 2011, p. 362). Para completarmos nossa análise, vamos considerar um aumento do produto externo, isto é, uma expansão do produto do resto do mundo (Y*). Tal evento pode ter como causa um aumento dos gastos dos governos estrangeiros, mas não precisamos de tanta exatidão sobre as causas do aumento para entendermos seus efeitos sobre uma economia. Com base na figura a seguir, temos possibilidade de visualizar os efeitos de um aumento da atividade externa sobre o produto interno e o balanço comercial. A) De m an da , Z Demanda interna por bens Demanda por bens internos Produto, Y ∆X>0 ∆NX Y Y’ ZZ DD ZZ’ A D C A’ 45º B) Ex po rt aç õe s l íq ui da s, N X 0 NX NX’ Produto, Y } YTB ∆X>0 ∆NX Figura 34 – Efeitos de um aumento da demanda externa 87 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA Como já representamos anteriormente, a demanda inicial por bens internos será representada por ZZ na figura 34A, com o equilíbrio dado pelo ponto A associado com certo nível de produto (Y). Continuamos supondo que o comércio esteja em equilíbrio; portanto, novamente as exportações líquidas associadas a Y são iguais a zero (Y = Yeb) na figura 34B. Também será descrita a reta que corresponde à demanda interna por bens (C + I + G), em função do produto, representada pela reta DD na figura 34A. Nesse caso, ocorre uma reta DD mais inclinada que a ZZ e a diferença entre ZZ e DD corresponde às exportações líquidas. Assim, temos que o ponto A representa o comércio equilibrado, com as retas ZZ e DD se interceptando neste ponto. Passamos então aos efeitos de um aumento do produto externo. Agora considere os efeitos de umaumento do produto externo, ∆Y* Com um produto externo maior, temos uma expansão na demanda externa, inclusive para bens do Brasil. Por fim, o efeito direto do incremento do produto externo é uma elevação das exportações do Brasil em determinado montante, que chamaremos de ∆X. Tomando um certo nível de produto, esse aumento das exportações ocasiona um acréscimo de ∆X na demanda por bens do Brasil, em que a reta da demanda por bens internos em função do produto desloca‑se para cima em ∆X, passando de ZZ para ZZ’. Por fim, a um dado nível de produto, as exportações líquidas também aumentam em ∆X. Este último efeito desloca as exportações líquidas como função do produto para cima em ∆X, indo de NX para NX’. Cria‑se assim um novo equilíbrio, que será expresso pelo ponto A’ conjuntamente com um nível de produto Y’, conforme ilustra a figura 34A. Vimos, portanto, que um aumento do produto leva a uma expansão do produto interno. Tal movimento é intuitivo, pois a dilatação do produto externo provoca um acréscimo da exportação de bens internos, tornando possível a elevação do produto interno e a demanda interna por bens por meio do multiplicador. Nesse caso, o que podemos saber sobre o comportamento do balanço comercial? Podemos certamente afirmar que as exportações aumentam. Ao mesmo tempo, com a expansão do produto interno via exportações, o balanço comercial terá uma reação positiva, já que, elevando a demanda externa, a demanda por bens internos desloca‑se de ZZ para ZZ’, mas a reta DD não se desloca, pois não teremos nenhum impacto sobre a demanda interna por bens em função do produto. Para o novo nível de produto de equilíbrio Y’, a demanda interna será dada pela distância DC e a demanda por bens internos é dada por DA’. No caso das exportações líquidas, sua magnitude corresponde à distância CA’, que se encontra abaixo de ZZ’, como a reta DD, significando que, embora as importações se dilatem, tal aumento não anula o crescimento das exportações, portanto, garantindo a melhora do balanço comercial. Observando as mudanças nas demandas internas e externas, conseguimos tirar as conclusões pertinentes quanto aos efeitos sobre o balanço comercial e a ocorrência de déficits e superávits. Passaremos agora para a apresentação dos impactos das políticas fiscal e cambial numa economia aberta. 88 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II 5.3.1 Política fiscal e cambial numa economia aberta Após a análise dos efeitos sobre os aumentos das demandas internas e externas sobre o balanço comercial, partiremos para o exame dos papéis que tomam o produto e o balanço na vigência de políticas fiscais e cambiais ativas. Anteriormente, vimos que, na apresentação precedente, as movimentações das demandas resultavam em efeitos diversos na economia de um país. Em resumo, no caso de uma expansão da demanda interna, teremos um consequente acréscimo do produto interno junto com o aparecimento de um déficit comercial. Já no caso de um aumento da demanda externa observa‑se uma dilatação do produto interno com a ocorrência de um superávit comercial. Portanto, para os governos, a principal fonte de preocupações está nos casos que provocam déficits comerciais, sobretudo quando esta situação não tem caráter esporádico. Uma das principais razões para certas preocupações reside no fato de que um país que experimenta um déficit comercial constante passa a acumular dívidas com seus parceiros comerciais do resto do mundo, sendo que tais débitos representam o pagamento de juros mais altos ao longo do tempo. Sendo assim, o conjunto de países prefere aumentos da demanda externa a elevações da demanda interna, pois a primeira favorece a melhora do balanço comercial. No entanto, a preferência de todos por essa alternativa gera implicações desfavoráveis a todos. Conforme o exemplo a seguir, temos como entender tais implicações: Considere um grupo de países, todos com intensas relações comerciais entre si, de modo que um aumento da demanda em qualquer um deles recaia em grande parte sobre os bens produzidos nos demais países. Suponha que todos esses países estejam em recessão e que cada um deles tenha um comércio exterior praticamente equilibrado. Cada um desses países pode estar muito relutante em tomar medidas para aumentar a demanda interna. O resultado poderia ser um pequeno aumento em seu produto, mas um enorme déficit comercial (BLANCHARD, 2011, p. 364). Com base nesse exemplo, para não ocasionar déficits comerciais, cada país tomaria a decisão de aguardar que os outros tomassem medidas para aumentar sua demanda interna. No entanto, se todos esperarem, nenhuma posição diferente será tomada e o processo de recessão dessas economias persistirá ao longo do tempo. Diante disso, existiria alguma saída para tal situação? Pelo menos em teoria, haveria uma solução razoável, que depende de uma coordenação das políticas macroeconômicas entre os países, na qual todos eles elevariam simultaneamente suas demandas internas. Dessa forma, poderiam crescer sem incorrer em aumento do déficit comercial em cada uma das economias envolvidas. Isso ocorre porque essa estratégia coordenada de aumentos nas demandas internas propicia incrementos das exportações e importações em todos os países. Na prática, a expansão da demanda 89 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA interna pressiona para o aumento das importações, mas que seria compensado pela elevação das exportações em razão da expansão da demanda externa. É por situações como essa que os países frequentemente advogam a favor de políticas econômicas coordenadas. Para exemplificar tal recomendação, as sete maiores economias do mundo (Estados Unidos, Japão, França, Alemanha, Reino Unido, Itália e Canadá), a cada rodada de discussões sobre a situação econômica mundial, sempre comunicam como principal medida as coordenações de políticas. Na prática, no entanto, essa capacidade de coordenação apresenta‑se bem limitada, já que sempre esbarra nas estratégias e preocupações divergentes dos países. No primeiro caso, podem ocorrer situações em que alguns países tenham mais a fazer no plano econômico, sendo que alguns preferem não fazer nada quando necessário, por exemplo, quando a recessão acontece apenas em alguns países. Os que não sofrem com um ambiente de recessão serão relutantes em elevar suas demandas internas, assim, os países que expandirem suas demandas – em razão de suas recessões – apresentarão um déficit comercial perante os países que não seguiram tal coordenação. Outro caso apresenta‑se quando alguns países já incorrem em elevados déficits orçamentários (despesas governamentais maiores que suas receitas). Diante disso, tais países não serão favoráveis a medidas que reduzam impostos ou aumentem seus gastos e pedirão que os outros países, em melhor situação econômica, arquem com a maior parte desse ajuste. Assim, os outros países, seguindo seus próprios interesses, serão relutantes em fazer tais políticas, logo, os países têm um forte incentivo para prometer coordenação e depois não cumprir a promessa. Como explica Blanchard (2011, p. 365): Uma vez que todos os países tenham concordado, digamos, em aumentar os gastos, cada país terá um incentivo para não o fazer, a fim de se beneficiar do aumento da demanda em outros lugares e, dessa maneira, melhorar sua posição comercial. Mas se cada país tentar enganar os demais, ou se não cumprir tudo o que foi prometido, então a expansão da demanda será insuficiente para que todos saiam da recessão. Essa situação acontece neste momento entre os países da União Europeia, pois as economias encontram‑se altamente integradas e enfrentam frequentemente problemas de coordenaçãonos últimos 30 anos. A primeira experiência no fim dos anos 1970 mostrou‑se uma tentativa malfeita de coordenação. Outra etapa importante ocorreu no princípio dos anos 1980, quando os socialistas franceses tentaram agir de forma independente, tendo como consequência um grande déficit comercial na França, suscitando novamente mudanças na política econômica. Após essas experiências, os países concluíram que a melhor posição que deveriam tomar era esperar por expansões da demanda externa e não recorrer a aumentos em suas demandas internas. Portanto, o que observamos é uma situação de pouca coordenação na política fiscal europeia. Após o exame do comportamento sobre alterações da política fiscal, passaremos para a análise das mudanças pela política cambial. Vamos supor que o governo do Brasil tome medidas políticas que conduzam a uma depreciação do real. Lembre‑se de que a taxa real de câmbio é dada por 90 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II ∈ ≡ ou R EP P * A taxa real de câmbio, ∈ ou R (o preço dos bens externos em termos de bens internos), é igual à taxa nominal de câmbio, E (o preço da moeda estrangeira em termos da moeda nacional), multiplicada pelo nível de preços externo, P*, dividido pelo nível de preços interno, P. Adotando uma hipótese na qual os níveis de preços são dados, ao se realizar uma depreciação nominal reflete‑se integralmente também para uma depreciação real. De maneira mais concreta, se o real se deprecia frente ao dólar em 10% (uma depreciação nominal de 10%) e os níveis de preços no Brasil e nos Estados Unidos permanecerem inalterados, os bens do Brasil ficam 10% mais baratos em relação aos bens dos americanos, ou seja, uma depreciação real de 10%. Partindo disso, podemos investigar os efeitos dessa depreciação real na trajetória do balanço comercial e do produto no Brasil. Em economia essa investigação passa pelo conhecimento da condição de Marshall‑Lerner. Veremos um pouco as prerrogativas dessa condição. Adotando a definição das exportações líquidas: NX ≡ X – ∈ IM Ao substituir X e IM por suas expressões em relação ao produto interno e externo e a taxa real de câmbio, obtemos: NX = X(Y*, ∈) – ∈ IM(Y, ∈) Nessa substituição, notamos que a taxa real de câmbio (∈) encontra‑se do lado direito da equação em três momentos, portanto, uma depreciação real (um aumento de ∈), deve afetar o balanço comercial por meio de dois distintos canais de transmissão: • Impactos sobre as exportações: corresponde a uma expansão da demanda estrangeira por bens brasileiros, provocando um aumento de X. Representa, portanto, que uma depreciação real torna os bens do Brasil mais baratos, logo, principal motivo para a dilatação das exportações do Brasil. • Ocorre uma diminuição das importações (IM): porque a depreciação real torna os bens estrangeiros relativamente mais caros no Brasil. Isso desloca a demanda interna por bens rumo aos bens domésticos, logo, ocasionando uma diminuição da quantidade de importações. Podemos descrever isso de outra forma: o preço relativo dos bens externos (∈) aumenta, portanto, elevam‑se os custos de importação (∈IM). Concluímos com isso que a mesma quantidade de importações agora custa mais caro para comprar em termos de bens internos. Tais efeitos serão sentidos no comportamento do balanço comercial. 91 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA No caso de uma depreciação, para que o balanço comercial tenha um comportamento positivo, as exportações devem ter um crescimento suficiente e as importações, uma diminuição suficiente para compensar a elevação do preço dos bens importados, evidenciando os três canais que sofrem influências da mudança na taxa real de câmbio. Atendidos esses eventos, temos o caso em que uma depreciação real pode conduzir ao aumento das exportações líquidas, o que é conhecido como a condição de Marshall‑Lerner. As evidências empíricas sustentam que essa condição é satisfeita na realidade. Assim, ao longo do texto, vamos supor que o aumento de ∈, uma depreciação real, provoca o incremento nas exportações líquidas, NX. Observação A condição recebeu o nome dos dois economistas, Alfred Marshall e Abba Lerner, que foram os primeiros a deduzi‑la. Após o exame dos efeitos diretos de uma depreciação sobre o balanço comercial, devemos ressaltar que os efeitos não terminam aqui. As mudanças nas exportações líquidas alteram o produto interno, o que ocasiona novamente impactos nas exportações líquidas. As variações das exportações líquidas alteram o produto interno, o que afeta ainda mais as exportações líquidas. Já que os efeitos de uma depreciação real se assemelham aos efeitos de um aumento do produto externo, podemos usar a figura 34 para ilustrar tal situação. Assim como no caso de uma expansão do produto externo, uma depreciação leva a um aumento das exportações líquidas, para qualquer nível de produto, sempre supondo que estamos sobre a vigência da condição de Marshall‑Lerner. Aqui, tanto a relação de demanda (reta ZZ na figura 34A) quanto a relação de exportações líquidas (reta NX na figura 34B) deslocam‑se para cima. O equilíbrio vai de A para A’; com reflexos no produto, que se eleva de Y para Y’. Acompanhando a mesma argumentação que usamos anteriormente, o balanço comercial melhora, já que o aumento das importações induzido pelo aumento do produto é menor do que a melhoria direta do balanço comercial induzida pela depreciação. De forma sucinta, vamos relembrar os passos que utilizamos para que fique claro as implicações de um processo de depreciação. Primeiro vimos que a depreciação leva a um deslocamento da demanda, tanto externa quanto interna, em direção aos bens internos. Esse deslocamento na demanda leva tanto a uma expansão do produto interno quanto à melhora do balanço comercial. Mesmo tendo um efeito positivo, em ambos os casos, devemos destacar o que ocorre de diferença ao fim desse processo. Com a depreciação, os bens externos tornam‑se mais caros aos consumidores num país, ou seja, dada sua renda, as pessoas precisam pagar mais para comprar os bens externos que consumiam, ficando prejudicadas por tal política. Essa situação torna‑se presente de forma latente em países que experimentam depreciações significativas. Como bem nos descreve Blanchard (2011, p. 366): 92 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II Os governos que tentam promover uma depreciação de grandes proporções frequentemente enfrentam greves e manifestações de rua como resposta das pessoas aos fortes aumentos de preços dos bens importados. Esse foi o caso do México em 1994‑1995, quando uma grande depreciação do peso – de 3,44 pesos por dólar em novembro de 1994 para 5,88 pesos por dólar em maio de 1995 – provocou um enorme declínio no padrão de vida dos trabalhadores. A depreciação ajudou a recuperação da economia mexicana, mas à custa de uma tensão social considerável. Nesse ponto da análise, ainda não agregamos aspectos que podem atuar sobre a intensidade desses efeitos, mas veremos mais adiante que mudanças nos preços internos e nos níveis salariais podem diminuir um pouco os efeitos por levar a uma situação de menor depreciação real. Mesmo assim, ficam válidas as condições que sustentam a condição de Marshall‑Lerner e seus efeitos quanto à trajetória do produto e do balanço comercial. Portanto, nos próximos pontos que discutiremos, tenha sempre em mente as implicações dessa condição quando trabalharmos com análises dinâmicas. 5.4 Combinações de políticas fiscal e cambial Agora investigaremos as situações nas quais teremos a combinação tanto da política fiscalcomo da política cambial. Partiremos de uma situação em que um governo tenha como meta a redução de um déficit comercial sem mudanças no nível de produto de sua economia. Como nos alerta Blanchard (2011, p. 366): Uma depreciação sozinha não funcionaria: ela reduziria o déficit comercial, mas também aumentaria o produto. Tampouco a contração fiscal funcionaria: ela reduziria o déficit comercial, mas diminuiria o produto. O que o governo deve fazer? A resposta: usar a combinação certa de depreciação e contração fiscal. Podemos visualizar essas combinações de políticas através da figura a seguir. A) De m an da , Z Demanda por bens internos Produto, Y ∆NX>0 ∆G < 0 Y Y’ ZZ ZZ’ A A’ 45º B) Ex po rt aç õe s l íq ui da s, N X 0 NX NX’ Produto, Y B C ∆NX>0 Figura 35 – Redução do déficit comercial sem alteração do produto Vemos que o equilíbrio inicial será dado pelo ponto A, que corresponde a certo nível de produto Y, na figura 35A. A representação do déficit comercial se dá pela distância entre os pontos B e C na figura 93 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA 35B. Assim, seguindo o que aponta Blanchard (2011), a eliminação do déficit comercial sem alteração do produto irá requerer duas coisas: Em primeiro lugar, deve‑se realizar uma depreciação cambial suficiente para eliminar o déficit comercial correspondente ao produto em seu nível inicial. Com isso, deverá ocorrer um deslocamento da relação das exportações líquidas, de NX para NX’, como ilustra a figura 35B. Tal processo de depreciação, no entanto, leva a um crescimento das exportações líquidas, que resulta em um incremento da demanda e, por conseguinte, no deslocamento dessa relação, como representada na figura 35A, de ZZ para ZZ’. Sem a ocorrência de outras medidas, o ponto de equilíbrio se moveria de A para A’ e o produto aumentaria de Y para Y’ como reflexo do aumento da procura por bens internos. Em segundo lugar, para permanecer no mesmo nível de produto inicial, deverá ocorrer uma redução dos gastos do governo para possibilitar que ZZ’ volte para a posição ZZ. Logo, uma combinação de depreciação com contração fiscal leva a uma manutenção do nível do produto e propicia uma melhora no balanço comercial. Concluímos, portanto, que no horizonte de preocupações de um governo está o nível do produto e o comportamento do balanço comercial, e será inevitável a utilização conjunta da política fiscal e da cambial, como acabou de mostrar o exemplo descrito anteriormente. O quadro a seguir mostra as outras possíveis combinações de políticas, destacando cenários com diferentes níveis de produto e de comércio em uma economia. Quadro 8 – Combinações de políticas cambial e fiscal Combinações de políticas cambial e fiscal Condições iniciais Superávit comercial Déficit comercial Produto baixo ε? G↑ ε↑ G? Produto elevado ε↓ G? ε? G↓ Fonte: Blanchard (2011, p. 367). Podemos tomar como exemplo a fórmula no canto superior direito no quadro. Ela expressa uma situação na qual o produto da economia está num nível inicial baixo (em outras palavras, desemprego muito elevado), além de destacar um déficit comercial. Em tal situação, ao realizar uma depreciação cambial, teremos impactos tanto no comércio como no produto, ou seja, representará um benefício ao reduzir o déficit comercial e elevar o nível do produto. Esse movimento, entretanto, deve ser observado com ressalvas, como nos alerta Blanchard (2011, p. 368): Mas não há motivo para que a depreciação promova tanto o crescimento adequado para o produto quanto a eliminação do déficit comercial. Dependendo da situação inicial e dos efeitos relativos da depreciação sobre o produto e o balanço comercial, o governo pode precisar complementar a depreciação com um aumento ou com um corte de seus gastos. Essa ambiguidade é representada pelos pontos de interrogação no quadro. 94 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II Então, para o nosso entendimento das diferentes combinações, a lógica do raciocínio continua a mesma, ressaltando novamente que o desejo de alcançar duas metas – neste caso, o nível de produto e o balanço comercial – exige o emprego de dois instrumentos, ou seja, da política fiscal e da taxa de câmbio. No entanto, até o momento ficamos numa descrição estática dessas relações. Logo, devemos analisar tal pressuposto para avançar na descrição de uma economia aberta, o que faremos a seguir pela apresentação da curva J. Ademais, quando a taxa de juros interna (i) for igual à taxa de juros internacional (I*), então a taxa de câmbio presente será igual à taxa de câmbio futura esperada, de forma que a condição de paridade de juros fique garantida. 5.5 A curva J Para avançar na compreensão dos movimentos do produto e do câmbio em uma economia, é de grande importância a análise numa situação dinâmica, até agora ignorada por nós. Os processos dinâmicos por trás das principais variáveis macroeconômicas (consumo, investimento, vendas e produção) são relevantes para o entendimento de uma economia fechada, sendo mais imprescindíveis na análise de uma economia aberta. Ressaltamos isso porque nesta última temos as dinâmicas adicionais das exportações e importações. Para ficar mais claro, devemos voltar para a análise dos efeitos da taxa de câmbio sobre o balanço comercial. Já temos solidificado que uma depreciação cambial leva a um aumento das exportações e uma queda das importações. Tais ações, no entanto, levam certo período de tempo para ocorrerem. Vamos adotar como exemplo uma depreciação de 10% do real para verificar os efeitos dinâmicos que acarretam. Já nos primeiros meses, essa depreciação terá mais influência nos preços do que nas quantidades. Desse modo, o preço das importações no Brasil sobe, enquanto o preço das exportações brasileiras cai no exterior. Já no caso das quantidades, esse ajuste será realizado de forma mais gradual, em razão dos consumidores levarem algum tempo para perceberem a mudança dos preços relativos e buscarem a aquisição de itens mais baratos no mercado. De cara, uma depreciação acarreta uma deterioração no balanço comercial, porque as exportações e importações não se ajustam logo após a depreciação, mas com o passar do tempo os efeitos nos preços relativos atuarão de forma mais forte nas exportações e importações, em outras palavras, resultará em um aumento das exportações líquidas (X – IM). Com a depreciação, os produtos brasileiros ficam mais baratos que os estrangeiros e os consumidores e empresas diminuem suas demandas por bens externos, em outras palavras, as importações do Brasil diminuem. Ao mesmo tempo, os produtos do Brasil, mais baratos no exterior, levam empresas e consumidores estrangeiros a aumentarem sua demanda por bens brasileiros, logo, as exportações brasileiras elevam‑se. Assim, de acordo com a condição de Marshall‑Lerner, o comportamento das exportações e das importações torna‑se mais forte, mesmo com o efeito adverso do preço, e o efeito final da depreciação será a melhoria do balanço comercial. Num primeiro momento: (X, IM) inalterados, ∈↑ => (X – ∈ IM)↓ 95 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA Finalmente: (X↑, IM↓, ∈↑) => (X – ∈IM)↑ Completando, assim, a ação dinâmica e impactando nas transações comerciais do país. Podemos visualizar graficamente esse movimento pela figura a seguir, que reflete o ajuste do balanço comercial ao longo de um período, em vista de uma depreciação real do câmbio. Tomaremos o déficit comercial antes da depreciação como correspondendoa OA. Com a depreciação, ocorre a elevação do déficit comercial para OB, que decorre por não haver mudanças, num primeiro momento, nem em IM nem em X. No entanto, com o passar do tempo, a quantidade de exportações aumenta e a das importações diminui, ocasionando uma redução do déficit comercial. Se a condição Marshall‑Lerner for satisfeita, o balanço comercial poderá apresentar uma melhora até mesmo em relação à posição inicial, o que fica ilustrado, no gráfico, do ponto C em diante. – + Depreciação Ex po rt aç õe s l íq ui da s, N X C 0 0 A B Tempo Figura 36 – Representação da curva J Para os economistas, esse processo de ajuste ficou consagrado como curva J pelo formato que a curva toma ao representar esse movimento, em que primeiro desloca‑se para baixo e depois para cima. Como forma de ratificar essa ação, nada melhor que visualizar as evidências empíricas sobre os efeitos dinâmicos da taxa real de câmbio, o que Blanchard (2011) evidencia ao analisar o que ocorreu nos Estados Unidos ao longo da década de 1980. A evolução do balanço comercial, aliada ao comportamento da taxa real de câmbio, está representada na figura a seguir: 96 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II 1980 0,6 0,8 1,0 0,5 0,0 –0,5 –1,0 –1,5 –2,0 –2,5 –3,0 –3,5 1,2 1982 1984 1986 1988 1990 Exportações líquidas/PIB (escala à direita) Taxa real de câmbio (escala à esquerda) Ta xa re al d e câ m bi o (1 98 7 = 1, 00 ) Ra zã o ex po rt aç õe s l íq ui da s/ PI B (e m p or ce nt ag em ) Figura 37 – Taxa real de câmbio e participação das exportações líquidas no PIB: Estados Unidos 1980‑1990 Ao longo dos anos 1980, a economia americana passou por dois períodos distintos: entre 1980 e 1985, apresentou uma pronunciada apreciação real; já entre 1985 e 1988 persistiu uma acentuada depreciação real. Assim, quando analisamos o balanço comercial, como proporção do PIB, duas características ficam evidentes, segundo Blanchard (2011, p. 369): 1. Mudanças da taxa real de câmbio refletiam‑se em deslocamentos paralelos das exportações líquidas. A apreciação esteve associada a uma extensa deterioração do balanço comercial, e a depreciação posterior esteve associada a uma grande melhora do balanço comercial. 2. Houve, porém, defasagens substanciais na resposta do balanço comercial às mudanças da taxa real de câmbio. Repare como, de 1981 a 1983, o déficit comercial permaneceu pequeno enquanto o dólar se apreciava. E note como a depreciação contínua do dólar a partir de 1985 não se refletiu na melhoria do balanço comercial antes de 1987: a dinâmica da curva estava em plena ação em ambos os episódios. No tocante ao horizonte temporal dessas defasagens, entre 1985 e 1988, elas se destacaram por um longo período, levando a uma série de questionamentos entre os economistas sobre a validade dessa relação entre o balanço comercial e a taxa real de câmbio, já que uma defasagem longa para o término do efeito apresentou‑se fora dos parâmetros de costume. No entanto, com o avanço das evidências econométricas, chegou‑se a uma explicação mais detalhada sobre tais efeitos dinâmicos. Tais evidências sugeriam que, para todos os países da OCDE que apresentem uma depreciação real, a relação dinâmica entre exportações, importações e taxa real de câmbio resulta em uma melhora do 97 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA balanço comercial. Quanto às defasagens, sugere‑se que tal processo leva algum tempo, num horizonte temporal entre seis e 12 meses. Também devemos ter em mente que as defasagens originadas por uma depreciação afetam o nível de produto da economia. Isso ocorre porque, em um primeiro momento, a depreciação leva a uma diminuição das exportações líquidas, portanto, exercendo um efeito contracionista sobre o produto, representando um efeito indesejado pela adoção de uma depreciação por um governo. Em resumo, se um governo utilizar a depreciação como instrumento para conseguir uma melhora do balanço comercial somado a uma expansão do produto interno, pelo menos por algum tempo, tais resultados não serão alcançados por tal política. Por fim, as mudanças nas políticas fiscais e cambiais terão impactos em outras variáveis importantes na economia, como o nível de poupança e dos investimentos, quando pensamos em uma economia aberta. Passaremos agora para uma breve descrição dos efeitos sobre tais variáveis macroeconômicas. 5.6 Poupança, investimento e resultados externos Como já vimos, a condição de equilíbrio do mercado de bens pode derivar da identidade entre o investimento e a poupança – representada pela soma da poupança privada e pública –, como descrita no modelo de economia fechada. Com a introdução do setor externo, numa economia aberta, devemos deduzir a forma que tomará o equilíbrio para entender os efeitos econômicos que poderemos vislumbrar quanto ao comportamento da poupança e do investimento. Devemos começar por nossa condição de equilíbrio: Y = C + I + G – ∈IM + X Ao subtrairmos C + T de ambos os lados da equação e usarmos o fato de que a poupança privada é dada por S = Y – C – T, obtemos: S = T + G – T – ∈IM + X Utilizando a definição de exportações líquidas como NX = X – ∈IM e reorganizando os termos da equação, temos: NX = S + (T – G) – I Traduzindo essa relação, numa condição de equilíbrio, o balanço comercial, NX, deve corresponder à poupança – tanto a poupança privada (S) como a poupança pública (T – G) – menos o investimento. Assim, numa posição de superávit comercial, temos um excesso de poupança em relação ao investimento; já no caso de um déficit comercial, destaca um excesso de investimento no tocante à poupança. Tal raciocínio deriva‑se da discussão sobre o balanço de pagamentos e do comportamento da conta‑corrente e da conta financeira, que apresentamos anteriormente. 98 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II Em resumo, no caso de um superávit comercial, temos um empréstimo líquido de um país para o resto do mundo, logo, um déficit comercial corresponde à situação de empréstimo líquido que um país toma com o resto do mundo. Concluímos, dentro desse raciocínio, que, no caso de um país investir mais do que poupa, S + (T‑ G) – I terá um valor negativo. Por essa razão, o país em questão deverá emprestar a diferença com o resto do mundo e visualizaremos com isso um déficit comercial. Blanchard (2011, p. 370) nos aponta outras implicações que a equação nos diz: 1. Um aumento do investimento deve se refletir ou em um aumento da poupança privada ou da poupança pública, ou em uma deterioração do balanço comercial (um superávit comercial menor ou um déficit comercial maior). 2. Um aumento do déficit orçamentário deve se refletir ou em um aumento da poupança privada, ou na redução do investimento, ou na deterioração do balanço comercial. 3. Um país com uma alta taxa de poupança, privada e pública, deve ter ou uma alta taxa de investimento, ou um grande superávit comercial. No entanto, tudo tem seu outro lado da moeda. Há pontos que a equação das exportações líquidas não diz. Ela não nos responde se uma situação de déficit orçamentário pode levar a um déficit comercial, a um aumento da poupança privada ou a uma redução dos investimentos. Nesse caso, para entender as implicações de um déficit orçamentário, devemos recorrer ao exame do comportamento do produto e dos diferentes componentes da demanda agregada, ou seja, do consumo, investimento, exportaçõese importações. Para entendermos a complexidade da questão, Blanchard (2011, p. 370) dá como exemplo uma questão debatida de forma recorrente, nos jornais e revistas especializadas, com o seguinte argumento: Está claro que os Estados Unidos não podem reduzir seu grande déficit comercial (atualmente, cerca de 4% do PIB) por meio de uma depreciação [...]. Ela mostra que o déficit comercial é igual a investimento menos poupança. Por que uma depreciação afetaria a poupança ou o investimento? Portanto, como uma depreciação pode afetar o déficit comercial? E o autor apresenta sua interpretação: O argumento pode soar convincente, mas sabemos que está errado. Mostramos anteriormente que a depreciação leva a um aumento do produto e à melhoria da situação comercial. Então, o que há de errado com o argumento? Uma depreciação de fato afeta a poupança e o investimento: faz isso afetando a demanda por bens internos e, portanto, aumentando o produto. Um produto maior conduz ao aumento da poupança em relação ao investimento ou, de modo equivalente, à diminuição do déficit comercial. 99 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA Teremos total compreensão dessas implicações quando realizarmos o exame dos vários casos que foram apresentados, entre eles as variações nos gastos do governo, as oscilações no produto externo, os movimentos da taxa de câmbio e as consequências de uma contração fiscal. Ao tomar esses elementos em sua explicação, ressaltando o que ocorre com os componentes destacados – a poupança privada, a poupança pública, o investimento e o balanço comercial –, temos condições de compreender os diferentes efeitos e combinações existentes. Exemplo de aplicação Demonstre que um aumento da demanda externa causa: • um aumento da poupança privada; • um aumento do investimento (mas menor do que o da poupança privada); • nenhuma alteração do déficit orçamentário; • uma melhoria do balanço comercial. 6 O PRODUTO E AS TAXAS DE JUROS E DE CÂMBIO Até o momento, neste material, a taxa de câmbio foi tratada como um instrumento de políticas econômicas disponíveis para um governo. Porém, é possível verificar que ela é fruto das interações no mercado de câmbio também. Diante disso, duas questões podem ser levantadas: O que determina a taxa de câmbio? Como os formuladores de políticas econômicas – policy makers – podem alterá‑la? Partindo do modelo Mundell‑Fleming, abordaremos os equilíbrios no mercado de bens e financeiros e suas implicações, em especial sobre o mercado cambial. Para tanto, é importante destacar os movimentos do produto, da taxa de juros e da taxa de câmbio em uma economia aberta concomitantemente. 6.1 Equilíbrio no mercado de bens Em uma economia aberta, o equilíbrio no mercado de bens pode ser representado como a condição em que as poupanças pública e privada, menos o investimento, deve ser igual ao saldo da balança comercial. E a condição de equilíbrio pode ser dada por: Y C Y T I Y r G IM Y X Y= −( ) + ( ) + − ∈( ) ∈ + ∈( ), , *, 100 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II Sendo: Y = produto C = consumo T = tributação I = investimento r = taxa de juros real G = gasto do governo IM = importações ∈ = taxa de câmbio real X = exportações Y* = produto externo Para que o mercado de bens esteja em equilíbrio, isto é, o produto seja igual à demanda por bens domésticos, o lado esquerdo (produto) precisa ser igual ao lado direito (demanda por bens domésticos). A demanda por bens domésticos inclui o consumo (C), o investimento (I), o gasto do governo (G), as exportações (X) e deduz as importações (IM/∈). Para analisar a equação, é preciso estabelecer as relações entre as variáveis. O consumo varia diretamente de acordo com a renda disponível, isto é, a renda deduzida dos tributos (Y – T). O investimento (I) também varia positivamente com o produto (Y) e negativamente com a taxa de juros (r). O gasto do governo é dado. Já as importações variam diretamente com o produto (Y) e com a taxa de câmbio, assim, quando há um crescimento econômico ou uma valorização ou apreciação cambial, a tendência é que haja um déficit na balança comercial, coeteris paribus. E, por último, as exportações (X) variam diretamente com o produto externo (Y*) e com a taxa real de câmbio () Portanto, quando há um crescimento econômico externo ou uma desvalorização cambial, a tendência é que haja um aumento do volume das exportações e, mantendo tudo o mais constante, um superávit comercial. Observação Coeteris paribus é uma expressão em latim que significa “tudo o mais constante”, ou seja, em Ciência Econômica, quando se analisa o 101 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA efeito de uma determinada política econômica, considera‑se o efeito apenas dessa política, avaliando as outras variáveis determinadas. Isso é importante, pois no mundo real é possível, mas é complicado perceber o efeito dessa maneira. Resumidamente, na equação de equilíbrio do mercado de bens temos: Y C Y T I Y r G IM Y X Y= −( ) + ( ) + − ∈( ) ∈ + ∈( ), , *, (+) (+,‑) (+) (+,‑) (+,+) A relação entre importações e exportações pode ser analisada como exportações líquidas, definidas como exportações menos importações. Tem‑se: NX(Y, Y*,∈) ≡ X(Y*, ∈) – IM(Y,∈)/∈ Dessa maneira, as exportações líquidas dependem dos produtos doméstico e externo e da taxa real de câmbio. Quando há um aumento do produto doméstico ou uma queda do produto externo, ou ainda uma valorização cambial, há uma redução das exportações líquidas. Considerando o conceito de exportações líquidas, pode‑se reescrever a equação de equilíbrio do mercado de bens: Y = C(Y – T) + I(Y, r) + G + NX(Y, Y*, ∈) (+) (+,‑) (+) (‑,+,+) Dessa equação, é importante destacar as seguintes implicações: • Uma elevação da taxa de juros real (r) gera uma redução dos investimentos, o que, por sua vez, leva a uma redução da demanda por bens domésticos. Estudando o multiplicador de gastos, isso acarreta uma redução do produto. • Uma elevação da taxa real de câmbio gera um deslocamento da demanda de bens estrangeiros para a demanda de bens domésticos e, por conseguinte, gera uma ampliação das exportações líquidas. E, novamente considerando o multiplicador de gastos, isso promove uma elevação do produto. As cotações de câmbio podem ser dadas de duas maneiras: método indireto (certo) ou método direto (incerto). No método indireto, um país divulga o certo quando a taxa de câmbio é dada em termos de moeda estrangeira sobre moeda nacional. Já no método direto, um país divulga o incerto quando a taxa de câmbio é dada em termos de moeda local sobre moeda estrangeira. Por exemplo: 102 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II Supondo que o Brasil dê o incerto, ou pelo método direto, em relação aos Estados Unidos da América: US$ 1 = R$ 4 Supondo que o Brasil dê o certo, ou pelo método indireto, em relação aos Estados Unidos da América: R$ 1 = US$ 0,25, ou ainda R$ 4 = US$ 1 A maioria dos países divulgam suas taxas de câmbio de modo incerto, exceto pela Inglaterra, onde as cotações cambiais são expressas representando a quantidade de moeda estrangeira necessária para comprar uma unidade de libra esterlina. No Brasil, a taxa de câmbio anunciada destaca a quantidade de reais da compra a venda de um dólar nos Estados Unidos.Assim, a fórmula da taxa de câmbio é dada por: E = P/P* É extremamente importante essa definição, pois a maior parte dos manuais de economia internacional, ou mesmo macroeconomia aberta, são de origem estadunidense, em que a moeda local é o dólar. Como a cotação da taxa de câmbio no Brasil é dada, sobretudo, em termos de dólares, é necessário precisar as fórmulas, pois aqui o dólar está no denominador e nos Estados Unidos, no numerador. Portanto, cuidado para não se equivocar ao estudar por manuais estrangeiros. 6.2 Equilíbrio nos mercados financeiros Dada a análise centrada no curto prazo no modelo IS‑LM, pode‑se considerar o preço doméstico como dado. Essa hipótese pode ser estendida ao modelo IS‑LM‑BP, numa economia aberta, para os preços estrangeiros. Dessa forma, a taxa real de câmbio (∈ ≡ EP*/P) varia juntamente com a taxa nominal de câmbio (E). Por exemplo, uma depreciação da taxa de câmbio nominal acarreta uma depreciação da taxa de câmbio real de mesma proporção. Essa hipótese de preços internos dados no curto prazo afeta também a taxa de juros. Como não há inflação, nem a esperada, nem a efetiva, a taxa nominal de juros (i) se iguala à taxa real de juros (r). Essas simplificações são essenciais para tratar das questões monetárias e financeiras a seguir. No modelo IS‑LM foi pressuposto que os agentes têm apenas dois ativos financeiros – moedas e títulos – para escolherem. Esse pressuposto também será adotado numa economia aberta, portanto, os agentes podem escolher apenas títulos domésticos ou estrangeiros, excluindo as opções de escolha entre títulos de curto prazo, longo prazo ou mesmo ações. Essa observação é importante, pois, na realidade, essas opções são bastante usadas. 6.2.1 Moeda versus títulos No modelo IS‑LM, o equilíbrio no mercado monetário e financeiro é dado por: 103 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA M P L iγ ( ) O lado esquerdo da equação, ou seja, a oferta monetária é dada pelas autoridades monetárias. Já o lado direito da equação, ou a demanda monetária, depende da quantidade de transações da economia, mensurado pelo produto real (γ), e do custo de oportunidade de reter moeda em vez de títulos, dado pela taxa de juros. Nesse sentido, quanto maior a taxa nominal de juros, maior a tendência de os agentes reterem títulos em detrimento de moeda, pois os títulos remuneram juros; já a moeda apresenta a característica de ser o ativo financeiro mais líquido, de forma que não remunera a juros. Isso é o que ocorre numa economia fechada. A questão é: Como funcionaria numa economia aberta? Numa economia aberta, a demanda por moeda interna continua dependendo da demanda por residentes domésticos. Exceto o dólar americano, que tem demanda mundial, sobretudo devido aos contratos do comércio internacional e transações financeiras; as moedas nacionais variam, basicamente, pelas transações econômicas internas, como o iene japonês, que apresenta circulação majoritariamente no Japão. Com relação à taxa de juros nominal, esta deve igualar a oferta de moeda e a demanda por ela. Dessa forma, uma elevação do estoque monetário leva a uma queda da taxa de juros e a uma elevação da demanda por moeda, a um aumento da taxa de juros. 6.2.2 Títulos domésticos versus títulos estrangeiros O outro determinante representativo na condição de equilíbrio nos mercados financeiros é a escolha dos agentes entre títulos domésticos ou títulos estrangeiros. Para essa questão, uma suposição real deve ser adotada, da mesma maneira como foi realizada na economia fechada, qual seja a preferência dos agentes por aplicações financeiras que melhor remuneram, ou seja, os agentes buscam títulos que apresentem maiores taxas de retorno esperadas. Isso significa que, em equilíbrio, as taxas de retorno esperadas dos títulos domésticos e dos estrangeiros devem ser iguais. Se algum título apresentar uma taxa de remuneração maior, a demanda por esse título será maior, saindo da condição de equilíbrio. Veja que essa simplificação ocorre para efeitos didáticos, pois a realidade é muito diferente, como veremos adiante. Essa condição de paridade de juros pode ser expressa pela seguinte relação de arbitragem: E E i it e t t t+ = +( ) +( )1 1 1/ * Onde: it = taxa de juros interna 104 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II it * = taxa de juros externa Et = taxa de câmbio atual no momento t Et e +1 = taxa de câmbio futura esperada no momento t+1 Nessa equação, o lado esquerdo representa o rendimento da manutenção de títulos domésticos na carteira do investidor e o lado direito, o retorno esperado dos títulos estrangeiros, ambos os lados em moeda nacional. Portanto, essa equação destaca a condição de equilíbrio entre os custos de oportunidade de manter os títulos domésticos e estrangeiros. A equação anterior expressa uma tendência. Imagine que em um determinado momento E E i it e t t t + > +( ) +( )1 1 1/ * . Partindo da estabilidade no funcionamento dos mercados, ou seja, havendo facilidade de acesso a empréstimos internacionais a baixo custo de transação, há a possibilidade de ganho fácil e garantido via arbitragem de taxa de juros. Um investidor pode contrair um empréstimo com juros i, converter esse crédito em dólares à taxa Et, no mercado de câmbio à vista, e aplicar no exterior a uma taxa i*. Dada a expectativa de desvalorização cambial, conforme a equação anterior, o investidor pode vender no mercado futuro (onde se negocia dólares no período futuro) à taxa Et e +1 . Coeteris paribus, isso garantirá um montante final de reais maior que o inicial. De acordo com Baumann, Canuto e Gonçalves (2004, p. 269), [...] a chamada paridade coberta de taxa de juros (PCJ), na qual o diferencial de taxa de juros corresponde aproximadamente a um prêmio (ou desconto) entre as taxas de câmbio à vista e a prazo. Quando i > i* e, portanto, ef > e ou E Et e t + >( )1 , tem‑se um prêmio que o banco cobra para comprar ou vender dólares aprazo, para compensar o custo de oportunidade da operação de hedge em dólares a ser feita com seus correspondentes no exterior. Um desconto se aplica quando as taxas de juros internas são menores que no exterior. Multiplicando os dois lados por Et e +1 e reorganizando, tem‑se: E i i Et t t t e = + + + 1 1 1 * Por ora, considera‑se que a taxa de câmbio esperada seja dada e é representada por E e . Dessa forma, abandonam‑se os índices temporais e a condição de paridade de juros torna‑se: E i i Et t e = + + 1 1 * 105 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA Essa equação diz que a taxa de câmbio atual varia conforme a taxa de juros interna, a taxa de juros externa e a taxa de câmbio futura esperada. E as relações estabelecidas são: • uma diminuição da taxa de juros interna leva a uma elevação da taxa de câmbio; • uma diminuição da taxa de juros externa reduz a taxa de câmbio; • uma contração da taxa de câmbio futura esperada causa uma retração da taxa de câmbio atual. Para exemplificar essa relação, suponha um investidor financeiro que tem dois títulos à sua disposição: títulos do Brasil e títulos dos Estados Unidos. Suponha que as taxas de juros anuais de ambos os títulos sejam iguais a 10% e que as taxas de câmbio atual e esperada para daqui um ano sejam 4, ou seja, um dólar vale 4 reais (R$ 4/US$). Dadas essas hipóteses, esses títulos apresentam o mesmo retorno esperado em reais e a condição de paridade de juros é satisfeita. Lembrando que os investidores, de acordo com essa condição de paridadede juros, buscam a maior rentabilidade frente a mudanças cambiais futuras. Como a taxa de câmbio esperada é igual à atual, mantém‑se a condição de paridade com a mesma taxa de juros para os títulos. Para efeito de reflexão, conceba que haja uma mudança quanto ao cenário futuro, de forma que os investidores mudem suas expectativas com relação à taxa de câmbio. E agora esperem uma valorização do real frente ao dólar de 15% (ou uma desvalorização do dólar frente ao real), ou seja, a taxa de câmbio esperada seria de R$ 3,4/US$. Considerando que a taxa de câmbio atual fique mantida, os títulos brasileiros são mais atrativos que os estadunidenses, pois os primeiros oferecem 10% de juros em reais e os títulos estadunidenses, apesar de remunerarem também 10% de juros, são calculados em dólares. Como os dólares apresentam uma expectativa de desvalorização de 15%, então os títulos estadunidenses, em reais, possuem um retorno de 10% menos 15% (depreciação esperada dos dólares frente aos reais), ou seja, um retorno negativo de 5%. Diante dessa situação, os investidores desejarão trocar os títulos estadunidenses por títulos brasileiros. Para executar essa operação, inicialmente eles precisarão vender os títulos estadunidenses por dólares e depois efetuar o câmbio dos dólares para os reais. Na posse dos reais, eles compram títulos brasileiros. Como há a venda de dólares e a compra de reais, ocorre uma depreciação do dólar. A dúvida é qual a magnitude dessa depreciação? De acordo com os pressupostos do modelo, será exatamente igual ao montante da depreciação esperada, ou seja, E = (1,10/1,10) * 3,4 = 3,4, considerando que as taxas de juros no Brasil e nos Estados Unidos se manterão constantes, o mercado de câmbio também se equilibra a essa nova taxa de câmbio. Pode‑se fazer outro exercício em que, ao invés de uma valorização cambial, possa ocorrer uma contração monetária brasileira, de forma que haja um aumento da taxa de juros brasileira de 10% para 12%. Julgando que a taxa de juros estadunidense se mantenha inalterada nos 10% e a taxa de câmbio futura permaneça em R$ 4/US$. Dada a taxa de câmbio atual constante de R$ 4/US$, os títulos brasileiros remuneram melhor e, portanto, são mais atrativos que os estadunidenses. Nessa conjuntura, quais são as consequências? Os investidores preferirão trocar títulos estadunidenses por brasileiros, lembrando que a suposição neste modelo é que os agentes buscam rentabilidade apenas, 106 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II sem se preocupar com risco e liquidez. O procedimento para efetuar essa operação deve ser trocar inicialmente os dólares por reais, gerando uma apreciação do real. A questão é: Em quanto deprecia o câmbio? Voltando à equação, tem‑se: 4 = (1,10/1,12)Ee Ee = ≈ 4 0 9821 4 073 , , A taxa de câmbio aumentou aproximadamente 1,82%, o que corresponde a uma apreciação do real frente ao dólar. E o que isso significa? Conforme foi deduzido, os investidores não alteraram suas expectativas com relação à taxa de câmbio futura, portanto, diante de uma depreciação cambial, os investidores apostarão numa apreciação cambial de forma que a taxa de câmbio futura não se altere. E por que isso ocorre? Uma depreciação de 1,82% do real equivale a uma apreciação dos mesmos 1,82% do dólar. Em termos de remuneração, a taxa de retorno esperada em reais dos títulos estadunidenses é 10% (taxa de juros estadunidense) mais 1,82% (montante da depreciação do real), ou seja, 11,82% de juros anuais ou aproximadamente 12%. Essa taxa de retorno esperada é igual à taxa de retorno dos títulos brasileiros – 12%, garantindo que o mercado cambial se mantenha equilibrado. Logo, nesse modelo, considerando os pressupostos de que, quando há uma alteração na taxa de juros, a taxa de câmbio esperada se mantém, uma depreciação cambial hoje será ajustada por uma apreciação de mesma magnitude no futuro de maneira a garantir o equilíbrio no mercado cambial. Desse exercício, é importante memorizar a seguinte conclusão: uma elevação da taxa de juros doméstica em relação à taxa de juros internacional gera uma apreciação cambial. Avaliando a paridade de juros, o gráfico a seguir mostra a relação de equilíbrio entre a taxa de juros doméstica, i, e a taxa de câmbio atual ou corrente ou à vista, E, supondo dadas a taxa de juros internacionais (i*) e a taxa de câmbio esperada futura Ee( ) . A i* Ta xa d e ju ro s i nt er na , i Relação da paridade de juros (dados i*, E e ) Taxa de câmbio atual, E Ee Figura 38 – Relação entre a taxa de juros e a taxa de câmbio corrente derivada da paridade de juros 107 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 MACROECONOMIA ABERTA Já o gráfico a seguir, considerando a paridade de juros, mostra a relação de equilíbrio entre a taxa de juros doméstica, i, e a taxa de câmbio esperada futura, Ee , supondo dadas a taxa de juros internacional (i*) e a taxa de câmbio corrente (E). C i* Ta xa d e ju ro s i nt er na , i Relação da paridade de juros (dados i*, E) Taxa de câmbio futura, E e Ee Figura 39 – Relação entre a taxa de juros e a taxa de câmbio futura decorrente da paridade de juros Esse gráfico mostra que quanto maior for a taxa de juros interna, maior será a taxa de câmbio e, portanto, a reta é positivamente inclinada. Ademais, quando a taxa de juros interna (i) for igual à taxa de juros internacional (i*), então a taxa de câmbio presente será igual à taxa de câmbio futura esperada, de forma que a condição de paridade de juros fique garantida. Esse ponto é o C no gráfico. Exemplo de aplicação Considere que a taxa de juros na Inglaterra seja de 2% a.a. e no Brasil, de 14% a.a. Além disso, que a taxa de câmbio atual seja de R$ 5/£. O exercício é determinar a taxa de câmbio esperada que torna o investidor indiferente em relação a aplicar seus recursos, pelo prazo de um ano, na Inglaterra ou no Brasil. Tem‑se: i* = 0,02 i = 0,14 E = R$5/£ E i i Et t t t e = + + + 1 1 1 * 5 1 0 02 1 0 14 1 = + + + , , Et e 108 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 03 /0 7/ 20 16 Unidade II Et e + = ≈1 5 0 8947 5 60 , , Se o investidor apostar que a taxa de câmbio futura superará a taxa R$ 5,6/£, então ele preferirá aplicar na Inglaterra. Caso contrário, aplicará seus recursos no Brasil. Repare que a diferença entre as taxas de câmbio corrente e futura – 12% – representa exatamente a diferença entre as taxas dos dois países. 6.2.3 Mercados de bens e financeiros juntos Após analisar os equilíbrios nos mercados de bens e financeiros separadamente, expressam‑se os elementos necessários para análise conjunta. Apenas para resgatar as principais equações, tem‑se o equilíbrio no mercado de bens dado por: Y = C(Y – T) + I(Y, i) + G + NX(Y, Y*, ∈) Essa equação depende da taxa de juros e da taxa de câmbio e outros fatores. A taxa de juros é determinada no mercado monetário e é dada por: M P L i= ( )γ A condição de paridade de juros garante que há uma relação inversa entre a taxa de juros doméstica e a taxa de câmbio. Isso é expresso por: E i i Et t e = + + 1 1 * Quando se relaciona essas três equações, pode‑se resumir as três equações em duas: a que representa o equilíbrio no mercado de bens (IS) e a que destaca o equilíbrio no mercado monetário e financeiro (LM). IS: Y C Y T I Y i G NX Y Y i i Et t e = −( ) + ( ) + + + + , , , * *1 1 LM: M P L i= ( )γ Veja que os efeitos de um aumento da taxa de juros sobre o produto, tomando a curva IS, podem
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