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Irradiadores industriais e sua radioproteção Ary de Araújo Rodrigues Júnior Edição do autor IRRADIADORES INDUSTRIAIS E SUA RADIOPROTEÇÃO ARY DE ARAÚJO RODRIGUES JÚNIOR IRRADIADORES INDUSTRIAIS E SUA RADIOPROTEÇÃO 1ª Edição Maringá – PR Brasil Edição do Autor 2014 © 2014 Ary de Araújo Rodrigues Júnior Capa: Irradiador público do IPEN – Instituto de Pesquisas energéticas e Nucleares/ CNEN-SP: CALVO, W. A. P.; RELA, P. R.; SPRENGER, F. E.; COSTA, F. E.; OMI, N. M.; VIEIRA, J. M. A Small Size Continuos Industrial Gamma Irradiator. Radiat. Phys. Chem, v. 71, p. 563-565, 2004. Revisão de Texto: Marta Yumi Ando _______________________________________________ Rodrigues Júnior, Ary de Araújo Irradiadores industriais e sua radioproteção/ Ary de Araújo Rodrigues Júnior – Maringá-PR: edição do autor, 2014. ISBN 978-85-916385-1-2 1. Física Nuclear 2. Radioproteção 3. Irradiadores gama 4. Aceleradores de elétrons 5. Irradiação industrial I. Título. _______________________________________________ i Sumário Sobre o autor V Agradecimentos V Pequeno glossário VI Introdução IX 1. Um pouco de Física das radiações e de radioproteção 1 1.1. Grandezas e unidades da Física das radiações 1 1.1.1 O elétron volt (eV) 1 1.1.2 Exposição 1 1.1.3 Dose absorvida 2 1.1.4 Dose equivalente 3 1.1.5 Atividade 5 1.1.6 Meia-vida 5 1.1.7 Decaimento radioativo 7 1.2 Radioproteção 9 1.2.1 Irradiação e contaminação radioativa 9 1.2.1.1 Irradiação 9 1.2.1.2 Contaminação 10 1.2.2 Radiação de fundo 10 1.2.3 Limites de dose para Indivíduo Ocupacionalmente Exposto (IOE) e para indivíduos do público 12 2. Irradiadores 15 2.1 Irradiadores gama 17 2.1.1 Irradiador gama de categoria I (autoblindado) 17 2.1.2 Irradiador gama de categoria II (panorâmico e com armazenagem da fonte a seco) 20 2.1.3 Irradiador gama de categoria III (autoblindado com água) 24 2.1.4 Irradiador gama de categoria IV (panorâmico e de armazenagem da fonte em água) 26 2.1.4.1 Fonte de irradiadores gama de categoria IV 28 2.1.4.2 Mecanismos de transporte dos materiais a serem processados em irradiadores gama de categoria IV 33 2.1.4.3 Blindagem de irradiadores gama 39 2.2 Aceleradores 40 2.2.1. Aceleradores de categoria I (irradiador blindado) 41 2.2.2 Aceleradores de categoria II (irradiador dentro de uma sala blindada) 42 3. Segurança 47 3.1 Responsabilidades 48 3.2 Defesa em Profundidade 49 ii 3.3 Sistemas de segurança pela SSG-8 51 3.4 Conceito de Falha Segura (Fail Safe) 89 3.5 Como aprender estes conceitos 90 4 Manutenções 97 4.1 Semanalmente 97 4.2 Mensalmente 98 4.3 Semestralmente 100 4.4 Testes de vazamento das fontes radioativas 100 4.5 Modificações da instalação 100 4.6 Levantamento radiométrico (Shield survey) 101 4.7 Auditorias 102 5 Treinamento 103 5.1 Inicial 103 5.2 Periódico 104 5.2.1 Periódico para cargos abaixo do operador 105 5.2.2 Periódico para operadores 106 5.3 Formação de operadores 107 5.4 Registro dos treinamentos 109 5.5 Cultura de segurança 110 6 Acidentes 111 6.1 Stimos (Itália – maio de 1975) 113 6.1.1 O irradiador 113 6.1.2 Entrada no irradiador pelo procedimento regular 114 6.1.3 O acidente 115 6.1.4 Causas do acidente 115 6.1.5 Atualização do irradiador 116 6.2 San Salvador (El Salvador – 05 de fevereiro de 1989) 116 6.2.1 O irradiador 116 6.2.2 Situação em fevereiro de 1989 118 6.2.3 O acidente 122 6.2.4 Desdobramentos 126 6.2.5 Lições gerais aprendidas 128 6.3 Soreq (Israel – 21 de junho de 1990) 129 6.3.1 O irradiador 129 6.3.2 Operação supervisão e treinamento 133 6.3.3 O acidente 135 6.3.4 Lições e ações 138 6.3.4.1 Administração da planta 138 6.3.4.2 Fabricante 138 6.3.4.3 Autoridades competentes 139 6.3.4.4 Complementares 139 6.4 Nesvizh (Bielo Rússia – 26 de outubro de 1991) 139 iii 6.4.1 O irradiador 139 6.4.2 Sistema de transporte dos produtos 142 6.4.3 Sistema de segurança 145 6.4.4 Sequência de entrada no irradiador 146 6.4.5 Sequência para sair do irradiador 147 6.4.6 Operação e manutenção 148 6.4.7 Perfil do operador 149 6.4.8 O acidente 149 6.4.9. Lições aprendidas 151 6.5 Illinois (EUA – fevereiro de 1965) 152 6.5.1 O irradiador 152 6.5.2 O acidente 152 6.5.3 Causas do acidente 153 6.6 Maryland (EUA – 11 de dezembro de 1991) 153 6.6.1 O irradiador 153 6.6.2 Perfil do operador e do seu assistente 154 6.6.3 O acidente 154 6.6.4 Lições aprendidas ou causas do acidente 155 6.7 Hanói (Vietnam – 17 de novembro de 1992) 156 6.7.1 O irradiador 156 6.7.2 Sistemas de segurança e controle 157 6.7.3 O acidente 159 6.7.4 Lições aprendidas ou causas do acidente 162 6.8 Fleurus (Bélgica – 11 de março de 2006) 162 6.8.1 O irradiador 162 6.8.2 O acidente 163 6.8.3 Causas do acidente 164 6.8.4 Lições gerais 164 6.9 Considerações finais sobre acidentes 164 7. Transporte e carga do material radioativo 167 7.1 Licença de importação 167 7.2 Transporte 167 7.3 Carga 171 8. Reflexão final sobre segurança 181 9. Questões de exames específicos da CNEN 185 9.1 Questões 185 9.2 Sugestões de resposta 188 Referências 207 Seção de apêndices Interação da radiação gama e X com a matéria Exemplo de manual e de planilha da manutenção semanal Exemplo de manual e de planilha da manutenção mensal iv Exemplo de manual e de planilha da manutenção trimestral, semestral e anual 88888 Planilha para levantamento radiométrico de um irradiador JS 9600, fornecida pelo fabricante, a MDS Nordion (Canadá) Exemplo de planilha de acompanhamento da água Artigo: Adaptação de um jogo comercial de perguntas para o auxílio no ensino de radioproteção Artigo: Relembrando os conceitos de radioproteção por meio de um jogo comercial adaptado v Sobre o autor: Bacharel em Física pelo Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IFUSP, 1991), é mestre e doutor em Ciências na área de Tecnologia Nuclear- Aplicações, pela Universidade de São Paulo/ Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (USP/IPEN), títulos adquiridos, respectivamente, em 2000 e 2005. Trabalhou na iniciativa privada por 13 anos no setor de esterilização de materiais médicos por radiação e irradiação de alimentos. Foi professor na Universidade Estadual de Maringá – campus de Umuarama (2004-2005), na Universidade Estadual de Londrina (2005- 2006), na Unicentro – campus de Guarapuava (2009-2010) e desde 2010 é professor na Universidade Estadual de Maringá – campus sede. É consultor de empresas na área de irradiadores industriais, de dosimetria de alta dose e de radioproteção. Também é autor dos livros: Um pouco do cotidiano dos cientistas (divulgação científica) e Small ionization chamber for high dose measurements (técnico). Contatos para críticas, sugestões ou esclarecimentos: aryarj@ig.com.br. Agradecimentos A todos os colegas que aceitaram o trabalho de analisar esta obra e forneceram valiosos comentários, críticas e sugestões, em especial a: Adaugoberto Soares de Pinho _ Instituto de Radioproteção e Dosimetria (IRD)/ CNEN-RJ; Gilberto Ribeiro Furlan _ Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA)/ USP; Manoel Gomes _ REGAFFAssessoria em Vigilância Sanitária; Nelson Minoru Omi _ Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN)/ CNEN-SP. vi Pequeno glossário Área controlada: área sujeita a regras especiais de proteção e segurança, com a finalidade de controlar as exposições normais, prevenir a disseminação de contaminação radioativa e prevenir ou limitar a amplitude das exposições potenciais. Área livre: qualquer área que não seja classificada como área controlada ou área supervisionada. Área supervisionada: área para a qual as condições de exposição ocupacional são mantidas sob supervisão, mesmo que medidas de proteção e segurança específicas não sejam normalmente necessárias. Atividade (de uma quantidade de radionuclídeo em um determinado estado de energia em um instante de tempo): grandeza definida por A=dN/dt, onde dN é o valor esperado do número de transições nucleares espontâneas daquele estado de energia no intervalo de tempo dt. A unidade no sistema internacional é o recíproco do segundo (s- 1), denominada becquerel (Bq). CNEN: Comissão Nacional de Energia Nuclear. Dose: dose absorvida ou dose equivalente, dependendo do contexto. Dose absorvida: grandeza dosimétrica fundamental expressa por D = dε /dm, onde dε é a energia média depositada pela radiação em um volume elementar de matéria de massa dm. A unidade no sistema internacional é o joule por quilograma (J/kg), denominada gray (Gy). Dose equivalente: HT - grandeza expressa por HT = DTwR, onde DT é a dose absorvida média no órgão ou tecido e wR é o fator de ponderação da radiação. A unidade no sistema internacional é o joule por quilograma (J/kg), denominada sievert (Sv). Efeito Cherenkov: quando uma partícula carregada eletricamente (como o elétron) atravessa um meio isolante (como a água deionizada) a uma velocidade superior à da luz nesse meio, ela emite radiação eletromagnética que vai do visível ao ultravioleta, sendo que, no primeiro caso, será um brilho azulado porque a intensidade será maior nas altas frequências. Efeitos determinísticos: efeitos para os quais existe um limiar de dose absorvida, necessário para sua ocorrência e cuja gravidade aumenta com o aumento da dose. vii Efeitos estocásticos: efeitos para os quais não existe um limiar de dose para sua ocorrência e cuja probabilidade de ocorrência é uma função da dose. A gravidade desses efeitos é independente da dose. Empregador: pessoa física ou jurídica com responsabilidades e deveres reconhecidos com relação a seu empregado, estagiário, bolsista ou estudante, no seu trabalho ou treinamento, devido a um contrato ou outro acordo formal. Um autônomo é considerado empregador e empregado. Exposição: ato ou condição de estar submetido à radiação ionizante. Fonte: equipamento ou material que emite, ou é capaz de emitir, radiação ionizante ou de liberar substâncias ou materiais radioativos. Grade de fontes: contém módulos, que, por sua vez, contêm as fontes individuais. IAEA: Agência Internacional de Energia Atômica. Instalação: estabelecimento ou parte de um estabelecimento ou local destinado à realização de uma prática. A instalação pode ser classificada como instalação nuclear ou instalação radiativa. Instalação radiativa: estabelecimento ou instalação onde se produzem, utilizam, transportam ou armazenam fontes de radiação. Excetuam-se dessa definição: as instalações nucleares e os veículos transportadores de fontes de radiação, quando estas não são partes integrantes dos mesmos. IOE: Indivíduo Ocupacionalmente Exposto, ou seja, indivíduo sujeito à exposição ocupacional. Isótopo: elemento químico que possui o mesmo número de prótons e diferente número de nêutrons. Labirinto: corredor em formato tortuoso, que liga o meio externo à sala de irradiação; sua finalidade é absorver a radiação espalhada, de forma a atenuá-la a valores da radiação de fundo ou abaixo. Processamento: ato de irradiar materiais em série. Proteção radiológica ou Radioproteção: conjunto de medidas que visam a proteger o ser humano e seus descendentes contra possíveis efeitos indesejados causados pela radiação ionizante. Radiação ionizante ou Radiação: qualquer partícula ou radiação eletromagnética que, ao interagir com a matéria, ioniza seus átomos ou moléculas. Radionuclídeo: núcleo de átomo que emite radiação. viii Radisótopo: isótopo instável de um elemento químico. Shroud: placas de metal paralelas aos lados da fonte, quando ela se encontra na posição de exposição, formando uma capa protetora. Situação de Emergência: situação envolvendo exposição temporária de pessoas, em decorrência de acidente, terrorismo ou sabotagem, que implique intervenção. SS-107: Safety Series 107 – Radiation safety of gamma and electron irradiation facilities, publicação da IAEA de 1992; foi substituída pela SSG-8. SSG-8: Specific Safety Guide No. 8 – Radiation safety of gamma, electron and X ray irradiation facilities, publicação da IAEA de 2010, dentro da Safety Standards Series. Supervisor de proteção radiológica (SPR) ou supervisor de radioproteção (SR): indivíduo com habilitação de qualificação emitida pela CNEN, no âmbito de sua atuação, formalmente designado pelo titular da instalação para assumir a condução das tarefas relativas às ações de proteção radiológica na instalação relacionada àquela prática. Passivação: cinética eletroquímica, que resulta da formação de películas protetoras sobre a superfície de metais por imposição de correntes. A passivação presta- se para assegurar a resistência à corrosão do componente ou peça e, consequentemente, sua durabilidade. Supervisor de proteção radiológica ou supervisor de radioproteção: indivíduo com habilitação de qualificação emitida pela CNEN, no âmbito de sua atuação, formalmente designado pelo titular da instalação para assumir a condução das tarefas relativas às ações de proteção radiológica na instalação relacionada àquela prática. Switch (plural: switches): interruptor ou chave de energia elétrica, com formato e forma de acionamento específico, para a função para a qual foi projetado. Titular: responsável legal pela instituição, estabelecimento ou instalação para a qual foi outorgada, pela CNEN, uma licença, autorização ou qualquer outro ato administrativo de natureza semelhante. ix Introdução Apesar do foco deste livro ser irradiadores gama, 90% do exposto aqui também pode ser aplicado aos aceleradores de elétrons e aos de produção de raios X, pois todos seguem a mesma recomendação internacional emitida pela IAEA (Agência Internacional de Energia Atômica), órgão da Organização das Nações Unidas (ONU), ou seja, a SSG-8 (Specific Safety Guide – Radiation Safety of Gamma, Electron and X Ray Irradiation Facilities) emitida em 2010, em substituição à SS-107 (Safety Series 107 - Radiation Safety of Gamma and Electron and Irradiation Facilities) de 1992. Ambas estão disponíveis para serem copiadas gratuitamente no formato pdf no sítio da IAEA. As normas da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) também estão disponíveis gratuitamente no respectivo sítio (www.cnen.gov.br). Aqui você poderá saber como funcionam os irradiadores gama e aceleradores para fins industriais e de pesquisa e toda a parte de segurança radiológica que deve acompanhar o trabalho com eles. O texto foi pensado, principalmente para os que pretendem se tornar supervisores de radioproteção para irradiadores gama, mas também é útil aos empresários que pensam em enveredar por essa área e aos que são simplesmente curiosos. Aviso que este livro é apenas uma introdução ao assunto e está longe de ser exaustivo. Tanto faz o título: Supervisor de Radioproteção (SR) ou Supervisor de ProteçãoRadiológica (SPR), ambos têm o mesmo significado e adotarei a primeira denominação. O processo de certificação varia de país para país. No Brasil, a CNEN rege todo o processo e um candidato a SR deve preencher alguns requisitos (Resolução CNEN-No 111 de 24 de agosto de 2011; Certificação da Qualificação de Supervisores de Proteção Radiológica, publicada no Diário Oficial da União em 5 de setembro de 2011): � Possuir diploma de curso de nível superior de graduação (Bacharel, Tecnólogo ou Licenciado) reconhecido pelo Ministério da Educação, nas áreas biomédica, científica ou tecnológica; � A formação acadêmica do candidato deve ser compatível com a área de atuação pretendida; � O candidato deve possuir experiência operacional na área de atuação pretendida, abrangendo a familiaridade com atividades de proteção radiológica durante a operação da instalação por um tempo mínimo descrito na resolução; x � A experiência operacional deve ter sido adquirida nos últimos cinco anos anteriores à data de solicitação da certificação; � O tempo de experiência operacional deve ser comprovado mediante declaração do supervisor de proteção radiológica da instalação na qual a experiência operacional foi adquirida, do titular da instalação ou do chefe do serviço de proteção radiológica. Depois de preencher o requerimento de inscrição, de anexar os certificados exigidos e de pagar a taxa de inscrição (é claro), toda essa documentação deve ser enviada para a CNEN. Sendo a inscrição aceita, o candidato está apto a realizar os exames do processo de certificação. São em número de três e cada um deles corresponde a um exame de conhecimento. Em cada um, a nota mínima necessária para passar para o próximo exame é “7 (sete)”; portanto, o candidato estará automaticamente eliminado se não alcançar essa nota em um deles. O programa de cada exame é descrito no “Manual do Candidato”, assim como na bibliografia, que pode ser copiado do sítio da CNEN. Resumidamente, são: Primeiro exame: � Sobre tópicos básicos de energia nuclear (que, há muitos anos, é de múltipla escolha). Observação: Este livro não cobre esta parte, mas há boa bibliografia disponível nas livrarias, bibliotecas e na internet, além de cursos oferecidos por instituições particulares. Apenas o capítulo 1 é dedicado à parte básica de física das radiações, mas contém somente a informação necessária, para permitir uma melhor compreensão do funcionamento dos irradiadores. Importante: Quem já possui uma certificação de SR válida, não importa a área, pode ser dispensado desse primeiro exame*. Segundo exame (em minha opinião, o mais difícil): � Questões dissertativas sobre tópicos específicos da área, em que se deseja obter a certificação (neste caso, irradiadores gama de categoria I a IV e aceleradores de categoria I e II). xi Terceiro e último exame: � Prático. Em geral, ele é realizado em um irradiador industrial de grande porte. Atualmente, a CNEN não qualifica SR para cada uma das quatro categorias de irradiador gama, mas ela foca na IV (no caso de aceleradores ela foca na II), que é a mais completa (ver capítulo 2). Com essa certificação, a pessoa estará, automaticamente, qualificada para todas as categorias. O fato de uma empresa possuir outros tipos de irradiadores que não o gama de categoria IV não importa. Espera-se que, no futuro, a CNEN qualifique SR para as diferentes categorias de irradiadores; nesse meio tempo, o candidato deve ter conhecimento em todas elas e, principalmente, na IV. O número de supervisores de radioproteção exigido pela CNEN, para autorizar o funcionamento de uma instalação que possua um irradiador gama industrial, nunca é inferior a dois. Se houver mais de um irradiador no mesmo local, certamente, esse número será maior. Como a ideia já pode ter ocorrido a alguém, vale ressaltar que, pelo entendimento da CNEN, o titular da instalação (dono, acionista majoritário, presidente, etc.) não pode acumular a função de supervisor de radioproteção. Isso não significa que ele não possa obter a certificação, significa simplesmente que ele não pode exercê-la na própria empresa. Boa leitura! Fís. Ary de Araujo Rodrigues Junior, Dr. – SR: GP 0018 *Caso você seja um empresário que pretende montar uma empresa de irradiação, ao invés de treinar um funcionário da estaca zero, há a opção de procurar um supervisor de radioproteção ou ex-supervisor de outras áreas (medicina nuclear, radioterapia, medidores nucleares, perfilagem de poços de petróleo, radiografia industrial, traçadores radioativos, etc.) que possua certificação válida. Esse profissional tem o direito de pedir a dispensa do primeiro exame, o que é uma etapa a menos. Outra vantagem é que ele ou ela já terá familiaridade com as aplicações da radiação, o que facilitará em muito o treinamento específico. 1 1. Um pouco de Física das radiações e de radioproteção Neste capítulo, serão apresentadas algumas grandezas e unidades, bem como conceitos básicos de radioproteção, necessários para o entendimento deste livro. Caso o leitor já esteja familiarizado com esses tópicos, pode pular este capítulo sem nenhum prejuízo. No sentido contrário, se houver necessidade de se aprofundar no tema, recomendo consultar as referências utilizadas. 1.1. Grandezas e unidades da Física das radiações 1.1.1 O elétron volt (eV) Trata-se de uma unidade de medida de energia, sendo definida como: a energia gasta pelo elétron para atravessar um campo de 1 V. Sua correspondência em joules (J) é: 1eV = 1,602 x 10-19 J A energia da radiação emitida por uma fonte é fornecida nessa unidade. Por exemplo, a luz visível tem energia da ordem de eV, o raio X diagnóstico da ordem de keV, o polônio- 214 emite partículas alfa da ordem de 7,8 MeV e o berílio-7 emite um fóton de 478 keV [Biral, 2002; Dimenstein e Hornos, 2001; Okuno, 1998; Okuno e Yoshimura, 2010]. 1.1.2 Exposição Foi a primeira grandeza da área da Física das Radiações. A primeira tentativa de sua definição ocorreu em 1928, mas somente em 1962 é que se chegou à atual. Ela é aplicada apenas para caracterizar as radiações ionizantes eletromagnéticas (raios X e gama) em termos da carga elétrica que estas produzem em uma massa de ar. É simbolizada pela letra "x" maiúscula (X): dQ X = C / kg dm A unidade da grandeza exposição no S.I (Sistema Internacional) é o coulomb por quilograma (C / kg). A unidade anterior ao S.I é o röentgen (R), nome dado em homenagem 2 ao descobridor dos raios X, Wilhelm Röentgen. A equivalência de röentgens em C/kg [McLaughlin et al., 1989; Okuno, 1998; Okuno e Yoshimura, 2010] é: 1 R = 2,58 x 10-4 C/kg. 1.1.3 Dose absorvida Sua definição data de 1950 e é a grandeza dosimétrica mais importante na área de processamento por radiação. A dose absorvida (D) é definida como a energia média cedida pela radiação ionizante (dĒ) a um elemento de volume com massa (dm): dĒ D = ——— dm Importante notar que, ao contrário da exposição, a dose absorvida é aplicável para qualquer tipo de radiação e para qualquer tipo de material, mas adotando-se a água como meio de calibração e de referência. No Sistema Internacional, a energia é dada em joules (J) e a massa em quilos (kg), portanto a sua unidade é o joule por quilograma (J/kg). Por questões práticas, adotou-se um nome para a unidade de dose absorvida, que é o gray (Gy), também pertencente ao Sistema Internacional. Essa unidade foi adotada em 1975 para homenagear Louis Harold Gray (1905 – 1965), um dos pioneiros da Medicina, da Biologia e da Física das Radiações. A equivalência do gray com a unidade anterior, o rad [McLaughlin et al., 1989 Okuno e Yoshimura,2010] é: 1 Gy = 100 rad A dose absorvida por unidade de tempo é expressa como a taxa de dose absorvida: . dD D = ——— dt 3 No Sistema Internacional, a unidade da taxa de dose absorvida é o gray por segundo (Gy/s), mas ela também pode ser expressa em gray por minuto ou hora, dependendo da conveniência. Em termos comparativos, caso o material envolvido seja o ar, a correspondência entre a exposição e a dose absorvida [Biral, 2002; Okuno e Yoshimura, 2010] é: 1R = 2,58 x 10-4 C/kg = 8,76 mGy = 0,876 rad 1.1.4 Dose equivalente Essa grandeza foi definida em 1962 e sua tradução correta deveria ter sido: equivalente de dose [Okuno, 1998]. Ela foi criada devido ao fato de que, para uma mesma dose absorvida, o dano biológico poderá ser maior ou menor, dependendo do tipo de radiação [Biral, 2002; Okuno, 1998; Okuno e Yoshimura, 2010]. Isto porque, quanto maior o número de ionizações produzidas por unidade de comprimento, maior é o dano. Para um material inanimado, isso pode não fazer muita diferença. Por exemplo, se um pedaço de plástico for irradiado por partícula beta por longo tempo, isso pode não trazer maiores consequências, além de uma possível fragilização do local irradiado, mas se for a pele humana, essa irradiação pode provocar a indução de um câncer de pele no local, apesar de a dose ser a mesma. Portanto, essa grandeza leva em conta o dano biológico e é utilizada para fins de proteção radiológica. A definição de dose equivalente é: a dose absorvida multiplicada por um coeficiente de peso, que dependerá do tipo da radiação incidente, pois o número de ionizações produzidas por unidade de comprimento durante o trajeto varia para cada tipo de radiação. As mais ionizantes e as menos penetrantes são as compostas por partículas com carga e as menos ionizantes e as mais penetrantes são as eletromagnéticas (raios X e gama), sendo estas últimas as utilizadas no processamento por radiação. Matematicamente: H = D.Wr H = dose equivalente D = dose absorvida Wr = coeficiente de peso, que dependerá do tipo de radiação incidente 4 A Tabela 1.1 apresenta os valores aceitos de Wr para vários tipos de radiação. Por meio dessa tabela, pode-se observar que a dose absorvida e a equivalente, no caso da radiação eletromagnética (fótons), são numericamente iguais. Tabela 1.1: Coeficientes de peso (Wr) para os vários tipos de radiação [CNEN, 2011] Feixe de radiação ionizante Coeficiente de peso da radiação incidente (Wr) Fótons, todas as energias 1 Elétrons e múons, de todas as energias 1 Nêutrons Energia abaixo de 10 keV 100 keV a 100 keV 100 keV a 2 MeV 2 MeV a 20 MeV Maior do que 20 MeV 5 10 20 10 5 Prótons com energia acima de 2 MeV (excetuando próton de recuo) 5 Partículas alfa, fragmentos de fissão, núcleos pesados 20 No Sistema Internacional, a unidade da dose equivalente é o sievert (Sv) e foi adotada em 1979, em homenagem ao físico Sueco Rolf Sievert (1896-1966). A unidade anterior se chamava rem (roentgen equivalent man ou equivalente em roentgen no homem) e a equivalência entre as duas é: 1 Sv = 100 rem A taxa de dose equivalente será expressa pela dose equivalente aplicada por unidade de tempo (segundo, hora etc.) [Biral, 2002; Okuno, 1998]: . Sv Sv H = ; ; Etc. S h Como cada órgão do corpo humano apresenta uma sensibilidade diferente à radiação, há outro fator que deve ser multiplicado à dose equivalente, cujo valor dependerá da parte do corpo sob irradiação. No caso da irradiação de humanos (por exemplo, na radioterapia), essa 5 informação é relevante, mas no caso da irradiação de materiais, ela é desnecessária e, portanto, não será abordada. 1.1.5 Atividade É definida como o número de desintegrações nucleares dos átomos de uma amostra radioativa, na unidade de tempo. Por sua vez a desintegração é definida como: o processo, espontâneo ou provocado, em que um núcleo atômico emite uma partícula (dicionário Aurélio, 1994). Cada vez que há uma desintegração, há emissão de radiação. No Sistema Internacional, a unidade de medida dessa grandeza é o bequerel (Bq), cujo plural é bequerels. A sua definição é: 1Bq = uma desintegração por segundo Portanto, se uma amostra tem 1000 Bq, ela apresenta 1000 desintegrações por segundo. A unidade anterior ao bequerel se chamava curie (Ci), em homenagem a Pierre e Maria Sklodowska Curie (Mme. Curie), que desenvolveram trabalhos pioneiros com materiais radioativos. Um curie é definido como o número de desintegrações por segundo presente em um grama de rádio-226, que perfaz 3,7 x 1010 desintegrações por segundo. Portanto, a correspondência entre a unidade antiga e a nova [Biral, 2002; Okuno, 1998; Okuno e Yoshimura, 2010] é: 1 Ci = 3,7 x 1010 Bq 1.1.6 Meia-vida Pelo princípio da conservação da energia, uma fonte de energia, seja ela qual for, não a emite indefinidamente com a mesma intensidade. No caso dos materiais radioativos, a emissão de energia, na forma de radiação, ocorre pela desintegração de átomos. Com o tempo, o número de radionuclídeos disponíveis diminui, assim como a atividade do material e, consequentemente, a emissão de energia1. Esse processo é totalmente aleatório, ou seja, há átomos que se desintegrarão em poucos segundos, enquanto outros só o farão depois de vários anos. Mas para uma amostra radioativa com um grande número de radionuclídeos (átomos que emitem radiação) essa diminuição de atividade com o tempo pode ser prevista. Esse parâmetro é característico para cada radionuclídeo e é chamado de meia-vida. Não há dois radionuclídeos com a mesma meia-vida e, medindo-a, o radionuclídeo pode ser 1 Por haver uma grande emissão de energia sem perda aparente de massa, a radioatividade parecia violar as leis da termodinâmica, mas isso não é verdade. Quando uma ligação nuclear é quebrada, a liberação de energia por unidade de massa é por volta de centenas de vezes maior do que a de uma ligação química. 6 identificado [Biral, 2002; Okuno, 1998; Okuno e Yoshimura, 2010]. A meia-vida é definida como: O tempo necessário para que a atividade de uma fonte radioativa diminua para a metade do valor anterior. Isso leva a um decaimento exponencial da atividade, como pode ser observado na Figura 1.1 Figura 1.1: Curva característica da diminuição da atividade de uma fonte radioativa em termos de meias-vidas. Também são mostradas as meias-vidas de alguns radionuclídeos. A Tabela 1.1 resume todas as grandezas e unidades vistas neste capítulo. Tabela 1.1: Grandezas da física de radiações, suas unidades antigas e no Sistema Internacional. Grandeza Unidade antiga Unidade nova no Sistema Internacional Exposição “roentgen” (R) “coulomb/quilograma” (C/kg) 1R = 2,58 x 10-4 C/kg Dose absorvida “rad” “gray” (Gy) 1 rad = 0,01 Gy Dose equivalente “rem” “siervet” (Sv) 1 rem = 0,01 Sv Atividade “curie” (Ci) “bequerel” (Bq) 1 Ci = 3,7 x 1010 s-1 T 3T 2T Tempo T = tempo de meia vida Para o: Césio –137: 30 anos Cobalto – 60: 5,27 anos Iodo – 131: 8,05 dias Tecnécio – 99: 6,01 horas 3T 2T T A / 2 A A / 4 A / 8 Atividade 7 1.1.7 Decaimento radioativo Quando o núcleo de um átomo se encontra em uma situação de excesso de energia, ele está em um estado instável. Para chegar a um estado estável, o núcleo emite energia sob a forma de radiação, resultando na sua desintegração, também chamada decaimento, em que o átomo original deixa de existir e dá origem a outro em um estado mais estável. As Figuras1.2 e 1.3 mostram, respectivamente, as curvas de decaimento dos elementos césio-137 e cobalto- 60, bem como os radionuclídeos mais utilizados em irradiadores gama, sendo o último elemento o mais comum. Figura 1.2: Curva de decaimento do césio-137 [Johns and Cunnigham, 1974] Figura 1.3: Curva de decaimento do cobalto-60 [Johns and Cunnigham, 1974] O motivo da utilização preferencial desses radionuclídeos em irradiadores é devido aos seguintes fatores [Diehl, 1995; IAEA, após 2004]: 60Ni28 ____ β- (0,12%) 1,49 MeV ____ 60Co27 β- (99,8%) 0,31 MeV _____ γ (99,8%) 1,17 MeV γ (100%) 1,33 MeV T1/2 = 5,27 anos β- (5,4%) 1,18 MeV ____ 137Cs55 137Ba56 β- (94,6%) 0,51 MeV _____ γ (85%) 0,66 MeV T1/2 = 30 anos 8 • Energia da radiação gama emitida está na faixa do efeito Compton (para que a dose dependa apenas da densidade do material e não de sua composição, ver a seção de apêndices para entender em detalhes o que isso significa); • Meia-vida relativamente longa (cobalto-60: 5,27 anos e césio-137: 30 anos); • Ambos decaem para elementos estáveis: o césio-137 para o bário-137 (Figura 1.2) e o cobalto-60 para o níquel-60 (Figura 1.3). A preferência pelo cobalto-60 não é só porque ele emite mais radiação gama por desintegração, o motivo principal é por questão de segurança. O césio não possui existência livre na natureza, isso quer dizer que ele está sempre ligado a outros elementos, ou seja, ele é reativo. Ele reage facilmente com água, sendo que, na sua forma pura, essa reação é muito violenta, reagindo explosivamente até com gelo a temperaturas extremamente baixas. Na área de irradiação, é utilizado o cloreto de césio (CsCl), que por se apresentar na forma de pó, deve ser misturado a um aglutinante [http://www.e-escola.pt/topico.asp?id=481&ordem=1; http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%A9sio; Okuno, 1998]. Por sua vez, o cobalto não é reativo e a exemplo do ferro e do níquel, pode formar ligas metálicas, o que torna a sua utilização mais fácil e segura [http://pt.wikipedia.org/wiki/Cobalto; http://www.cdcc.sc.usp.br/elementos/cobalto.html]. Muitos radionuclídeos decaem para outros radionuclídeos, como ocorre com as séries naturais do urânio-238, do urânio-235 e do tório-232, mostradas na Figura 1.4, até atingirem um elemento estável. 9 Figura 1.4: Séries do urânio-238, do urânio-235 e do tório-232, mostradas na apostila educativa da CNEN, intitulada radioatividade, página: 13. 1.2 Radioproteção 1.2.1 Irradiação e contaminação radioativa [Biral, 2002; Okuno, 1998; Rodrigues Júnior, 2007] 1.2.1.1 Irradiação Quando um objeto ou um ser vivo está sendo irradiado, ele está recebendo radiação de uma fonte emissora e sofrendo os efeitos que a radiação causa. À medida que ele se afasta da fonte, a intensidade da irradiação vai diminuindo. Esse efeito pode ser melhor visualizado pela analogia com uma fonte de luz, que é uma forma de radiação eletromagnética visível. Suponhamos que estamos à noite em um descampado no qual existe apenas um único poste de iluminação. Enquanto estivermos 10 próximos ao poste, conseguiremos ver tudo o que está ao nosso redor, mas à medida que nos afastamos, a dificuldade em ver os objetos próximos vai aumentando até que a intensidade da luz seja insuficiente para permitir a nossa visão. É importante frisar que um objeto ou ser vivo não fica radioativo ou acumula radiação por ter sido irradiado. Utilizando novamente a analogia com uma fonte luminosa, isso é tão absurdo quanto dizer que, após a exposição a uma fonte de luz, um objeto ou ser vivo sairia emitindo luminosidade ou que é possível guardar luz dentro de um recipiente qualquer, por exemplo, um saco de papel. 1.2.1.2 Contaminação Quando um objeto ou ser vivo está contaminado, ele contém material radioativo na sua estrutura. Nesse caso, ele estará sendo continuamente irradiado, não importando o lugar para onde ele se desloque, pois a fonte estará indo junto com ele. Para a remoção desse material, é necessário um processo de descontaminação, ou seja, de retirada do contaminante radioativo. 1.2.2 Radiação de fundo A radiação não foi inventada e sim descoberta, ou seja, ela já existia (e existe) na natureza. Essa radiação natural tem várias componentes e origens: ela vem do espaço (raios cósmicos), está presente, sob a forma de átomos radioativos (os radionuclídeos), no ar que respiramos (por exemplo, o carbono-14), na nossa comida (do potássio presente nos alimentos, como o leite, o feijão, a batata e a banana, pois 0,0118% é de potássio-40, que é radioativo), na água (gás radônio), na crosta terrestre e nos materiais que usamos para construir nossas moradias (gás radônio, urânio e tório) [Okuno, 1998]. Portanto, independente da profissão ou da localização, todo ser humano recebe certa quantidade de radiação natural, que compõe a chamada “radiação de fundo”, e ela varia de acordo com a localização geográfica e com a altitude. A média mundial anual por habitante é de 2,4 mSv, variando de 1 a 13 mSv/ano, e grupos populacionais consideráveis recebem entre 10 e 20mSv/ano [UNSCEAR, 2010]. A radiação artificial, isto é, aquela que é produzida pelo homem, também contribui para a radiação de fundo, sendo a sua principal componente a exposição médica, que abrange, na maioria dos casos, o diagnóstico de doenças ou lesões e, em uma parcela significativa, os tratamentos para eliminar células cancerosas. 11 Como exemplos do primeiro caso, temos os raios X, a tomografia computadorizada, a introdução em pacientes de materiais radioativos de meia-vida curta e emissores de radiação gama de baixa energia, visando à obtenção de imagens específicas de órgãos do interior do corpo. O exemplo para o segundo caso são as técnicas de radioterapia, que consistem no uso de fontes intensas de radiação para matar tecidos doentes, irradiando-os externamente ou internamente (por meio de implantes de fontes). Outras fontes de radiação artificial são o material radioativo liberado no ambiente pelos testes nucleares, pelo acidente de Chernobyl e pelas usinas nucleares. A média mundial anual por habitante da contribuição da radiação artificial varia de essencialmente zero a algumas dezenas de mSv, dependendo basicamente da qualidade do sistema de saúde vigente no país ou de estar próximo de locais de testes ou de acidentes nucleares. De acordo com o Comitê Científico das Nações Unidas sobre os Efeitos da Radiação Atômica (UNSCEAR), a contribuição dos vários fatores pode ser visualizada na Tabela 1.2. Tabela 1.2: Contribuição das fontes naturais e artificiais de radiação para a dose média anual por habitante no ano de 2008 [UNSCEAR, 2010]. Radiação natural Dose média (mSv/ano) Exposição externa: Radiação cósmica Radiação gama externa (materiais radioativos presentes na crosta da Terra) 0,39 0,48 Exposição interna: Inalação (principalmente radônio) Ingestão (principalmente potássio-40) 1,26 0,29 Total radiação natural: 2,4 Radiação artificial Dose (mSv/ano) Radiação diagnóstica 0,6 Poeira radioativa (testes nucleares) 0,005 Acidente de Chernobyl 0,002 Usinas nucleares 0,0002 Total radiação artificial: 0,61 Total radiação artificial e natural: 3,01 Como já foi dito, esse é o número médio; há lugares onde a dose anual é menor e lugares onde ela é maior, como na cidade litorânea de Guaraparí, no estado do Espírito Santo, 12 onde a presença da areia monazítica, rica em urânio e tório, provoca níveis de radiação que variam de 8 a 15 mSv/ano [Okuno, 1998]. Mesmo assim, os índices de incidência de câncer e outros problemas de saúde que podem ser decorrentes de exposição à radiação estãodentro da média de incidência de regiões onde o nível da radiação de fundo é considerado normal, como as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. 1.2.3 Limites de dose para Indivíduo Ocupacionalmente Exposto (IOE) e para indivíduos do público [CNEN, 2011] Podemos definir o IOE como pessoas sujeitas à exposição à radiação ionizante em decorrência do seu trabalho, que (supõe-se) receberam instruções e orientações adequadas com relação aos riscos oferecidos pela exposição à radiação ionizante. E Indivíduos do público incluem qualquer membro da população quando não submetido à exposição ocupacional ou exposição médica. Na Tabela 1.3, são mostrados os limites de doses para essas duas categorias. Tabela 1.3: Limites de dose anuais (a) para Indivíduos Ocupacionalmente Expostos (IOEs) e para indivíduos do público* [CNEN, 2011]. Grandeza Órgão IOE Público Dose efetiva Corpo inteiro** 20 mSv (b) 1 msv (c) Dose equivalente Cristalino 20 mSv (b) 15 mSv Pele (d) 500 mSv 50 mSv Mãos e pés 500 mSv --- (a) Para fins de controle administrativo efetuado pela CNEN, o termo dose anual deve ser considerado como dose no ano calendário, isto é, no período vigente de janeiro a dezembro de cada ano. (b) Média aritmética em 5 anos consecutivos, desde que não exceda 50 mSv em qualquer ano. 13 (c) Em circunstâncias especiais, a CNEN poderá autorizar um valor de dose efetiva de até 5 mSv em um ano, desde que a dose efetiva média em um período de 5 anos consecutivos, não exceda 1 mSv por ano. (d) Valor médio em 1 cm2 de área, na região mais irradiada. * Esses limites devem ser aplicados sem incluir a radiação de fundo, ou seja, somente deve ser levado em conta o acréscimo de dose, devido às atividades que utilizam radiação, e ele não pode ser superior aos valores mostrados nesta tabela. ** Para irradiação uniforme no corpo todo, que é o caso em irradiadores de grande porte. Para medir a dose recebida pelos IOEs durante o trabalho, eles portam dosímetros pessoais, que, em geral, são lidos mensalmente. Em caso de acidente radiológico, o dosímetro do respectivo IOE deve ser enviado para o fornecedor o quanto antes para leitura. Se o dosímetro pessoal de um IOE acusar uma dose, o seu histórico dosimétrico dos últimos 12 meses, incluindo-se o atual, deve ser analisado, para verificar se a soma não ultrapassa o limite de dose aplicável ao seu caso. Os valores de dose efetiva se aplicam à soma das doses efetivas, causadas por exposições externas, com as doses efetivas comprometidas (integradas em 50 anos para adultos e até a idade de 70 anos para crianças), causadas por incorporações ocorridas no mesmo ano. Para mulheres grávidas ocupacionalmente expostas, suas tarefas devem ser controladas, de maneira que seja improvável que, a partir da notificação da gravidez, o feto receba dose efetiva superior a 1 mSv durante o resto do período de gestação. Indivíduos com idade inferior a 18 anos não podem estar sujeitos a exposições ocupacionais. IMPORTANTE: Esses limites de dose NÃO devem ser tomados como “limites” a serem tolerados. Quanto menor a dose recebida, melhor. 15 2. Irradiadores O objetivo dos irradiadores é análogo ao fazer um churrasco (os colegas mais ortodoxos que me desculpem). Você coloca uma fatia de carne na grelha para ser exposta a uma fonte de energia, neste caso, o calor vindo do carvão em brasa logo abaixo. Devido à espessura da carne, de vez em quando, há a necessidade de virá-la para assar o lado que não estava voltado para o calor; desse modo, os dois lados assarão aproximadamente por igual. Claro que, devido à propagação do calor, o meio da carne também estará assando, mas mesmo que se chegue a deixá-la bem passada, sempre as partes externas estarão mais assadas do que o meio. Pode-se chegar muito perto de deixá-la assada por igual, por exemplo, utilizando-se fatias de carne bem finas, mas um exame minucioso mostrará que existe diferença, apesar de pequena e, em termos práticos, pode ser desprezada. Todas as configurações de irradiadores que vamos estudar foram projetadas para expor os materiais à radiação, de modo que a dose absorvida seja a mais homogênea possível e todos eles podem ser divididos em três partes principais: 1ª) Blindagem: Absorve a maior parte da radiação emitida, diminuindo o seu nível na parte externa para níveis abaixo da radiação de fundo local. 2ª) Mecanismo de transporte: Conduz o material a ser irradiado para dentro do irradiador, onde será exposto à radiação durante o tempo necessário para acumular a dose desejada, e o retira sem a intervenção humana. 3ª) Fonte de radiação: No caso de irradiadores gama, trata-se de um material radioativo (em geral, cobalto-60) e, no caso de aceleradores, um feixe de elétrons. Alguns modelos realizam a conversão do feixe de elétrons em raios X (como ocorre nos equipamentos de raios X hospitalares e de tomografia), mas devido à baixa eficiência dessa conversão (o que implica alto custo), são pouco utilizados na área industrial. Em irradiadores de batch (lote), a segunda parte está ausente. Nesse tipo de equipamento, que é destinado à pesquisa ou ao processamento em pequena escala, a fonte de radiação é recolhida ou desligada para que o material seja levado ou retirado pela ação de pessoas. 16 A CNEN classifica as instalações radiativas em sua norma de licenciamento [CNEN, 2011a] pela finalidade desta e se a fonte é selada ou não selada. Para as fontes seladas, a classificação em grupos e subgrupos é: I - GRUPO 1: Instalações de grande porte que utilizam fontes seladas em processos industriais induzidos por radiação, incluindo os irradiadores de grande porte utilizados para esterilização de materiais, para preservação de alimentos ou para outras aplicações da irradiação. II - GRUPO 2: Instalações que utilizam fontes seladas em equipamentos, subdividindo-se em: a) SUBGRUPO 2A - Instalações que utilizam fontes seladas em equipamentos de grande porte autoblindados, que não permitem acesso às fontes nem à câmara de irradiação, e nos quais não há o deslocamento das fontes em operação rotineira; b) SUBGRUPO 2B - Instalações que utilizam fontes seladas em equipamentos para fins de radioterapia, nas modalidades de teleterapia e braquiterapia com altas taxas de dose, radiografia industrial e de outras práticas que requeiram blindagem externa para a utilização das fontes. III - GRUPO 3 - Instalações, incluindo aquelas para fins de comércio e prestação de serviços, nas quais se manipulam, utilizam ou armazenam fontes seladas que não se enquadram nos GRUPOS 1 e 2. As instalações radiativas que utilizam equipamentos geradores de radiação ionizante estão classificadas no GRUPO 7, compreendendo as instalações que utilizam aceleradores de partículas ou quaisquer outros aparelhos geradores de raios-X e são classificadas em um dos seguintes subgrupos, conforme o nível de energia de feixe gerado: I - SUBGRUPO 7A - Equipamentos geradores de radiação ionizante que produzem feixe com energia menor ou igual a 0,10 MeV; II - SUBGRUPO 7B - Equipamentos geradores de radiação ionizante que produzem feixe com energia maior que 0,10 MeV e menor ou igual a 0,60 MeV; III - SUBGRUPO 7C - Equipamentos geradores de radiação ionizante que produzem feixe com energia maior que 0,60 MeV e menor ou igual a 50 MeV; ou IV - SUBGRUPO 7D - Equipamentos geradores de radiação ionizante que produzem feixe com energia maior que 50 MeV. No caso de irradiadores industriais, as instalações seriam classificadas como: do grupo 1 ou do subgrupo 2A ou do subgrupo 7C. Por outro lado, a IAEA, por meio da Safety 17 Series 107 [IAEA, 1992] e da sua substituta, a Specific Safety Guide [IAEA, 2010], classificaos irradiadores pelas suas características, independentemente de sua finalidade. Os que utilizam radiação gama são divididos nas categorias I (autoblindado), II (panorâmico e com armazenagem da fonte a seco), III (autoblindado com água) e IV (panorâmico e de armazenagem da fonte em água) e os aceleradores nas categorias I (irradiador blindado) e II (irradiador dentro de uma sala blindada). Como o objetivo deste capítulo é apresentar os diversos tipos de irradiadores, será adotada a classificação da IAEA. 2.1 Irradiadores gama 2.1.1 Irradiador gama de categoria I (autoblindado) Trata-se de um irradiador em que a fonte está completamente encerrada em um contêiner seco, feito de material sólido, que a blinda e a encerra permanentemente, de tal modo que o acesso humano às fontes seladas e ao volume durante a irradiação não é fisicamente possível. O material a ser irradiado deve ser conduzido até a fonte [IAEA, 1992; 1996a; 2010]. Alguns exemplos desse tipo de irradiador podem ser vistos nas Figuras 2.1, 2.2, 2.4 e 2.5. Figura 2.1: Irradiador gama de categoria I: um irradiador autoblindado, com armazenamento da fonte a seco [IAEA, 1992]. Sample loading tube: Câmara de irradiação, onde o material a ser irradiado deve ser colocado para descer até a fonte. Shielding colar: Sistema de segurança e blindagem, que somente é liberado para abertura quando o sample loading tube está totalmente para cima. Shielding source container: Blindagem do conjunto de fontes. Sample loading drive: Painel de controle do irradiador. 18 Figura 2.2 Irradiador gama de categoria I adequado para irradiações de pesquisa e de pequena escala. Um suporte com amostra está sendo colocado na câmara de irradiação, quando ela está na posição de carga. Dependendo da taxa de dose do dia, o marcador de tempo no painel de controle (embaixo à direita) é ajustado para fornecer a dose desejada [IAEA, 2004]. Nos modelos mostrados nas Figuras 2.1 e 2.2, as fontes estão distribuídas na forma de anel e a câmara de irradiação com o material a ser exposto desce no meio dele, como mostra a Figura 2.3, o que fará com que tal material receba radiação de todas as direções, garantindo uma boa homogeneidade de dose. Esse tipo de disposição das fontes impõe restrições sobre o volume limite da amostra para algo em torno de 1 a 5 litros. Entretanto, esse volume é muito adequado para pesquisa de irradiações em pequena escala [IAEA, 2004]. Figura 2.3: Esquema do arranjo de fontes dentro dos irradiadores mostrados nas Figuras 2.1 e 2.2 Embora esse modelo de irradiador compacto seja muito popular, a sua produção foi descontinuada. Em seu lugar, foram introduzidos modelos cuja câmara de irradiação possui uma única fonte e o material é girado em torno do próprio eixo em frente a ela, com o objetivo de homogeneizar a dose [MacLaughlin et al., 1989]. Um esquema desse sistema é mostrado na Figura 2.4. Como o custo do material radioativo é significativo no preço final Fontes Câmara de irradiação com a amostra 19 desses irradiadores, a grande vantagem é a diminuição do seu valor, com a obtenção do mesmo efeito, embora haja um aumento do tempo de aplicação da dose. Figura 2.4: Vista superior em corte do esquema de funcionamento de irradiador gama de categoria I, com uma fonte e mesa giratória [baseado em MacLaughlin et al., 1989, p. 40 ]. Muitos pensam que irradiadores gama de categoria I são pequenos, mas isso não é verdade. Assim como qualquer equipamento, eles podem ser do tamanho necessário para atender aos requisitos do processamento. Um exemplo disso pode ser visto na Figura 2.5. Trata-se de um irradiador gama de categoria I de 17 toneladas e com 1,11 PBq (30 kCi) instalado em um navio para a irradiação de pescado no ano de 1968. Nessa época havia três navios pertencentes ao governo americano com esse tipo de irradiador instalado: o Delaware, mostrado na Figura 2.5, o Oregon e o Miller Freeman [AEC, 1968]. Fonte Blindagens de chumbo Blindagem giratória de chumbo Nicho para colocação da amostra Mesa giratória Posição de recebimento Posição de Irradiação 20 a b c Figura 2.5: 1968: Navio de pesquisa Delaware com um irradiador gama de categoria I de grandes dimensões, para o processamento de pescado; a) desenho do irradiador; b) foto do irradiador; c) navio Delaware, um dos três navios do governo americano, em que esse tipo de irradiador foi instalado [AEC, 1968]. 2.1.2 Irradiador gama de categoria II (panorâmico e com armazenagem da fonte a seco) Trata-se de um irradiador em que o acesso humano à câmara de irradiação é possível e, por isso, deve ser controlado. Quando a fonte não está sendo utilizada ela é recolhida para um contêiner de armazenamento seco feito de material sólido, para blindá-la, o que permite a entrada para fins de manutenção, inspeção ou para a colocação ou a retirada de materiais a serem expostos ou que já foram expostos à radiação. Quando se deseja irradiar algo, a fonte deverá ser içada de sua blindagem, mas antes disso, há sistemas de segurança e procedimentos que visam à retirada de pessoas de dentro da câmara de irradiação e que a mantém inacessível durante o processamento. Para que as pessoas na parte externa do irradiador não sejam irradiadas, há uma blindagem externa de concreto para reduzir os níveis de radiação provenientes da fonte, quando esta estiver fora do contêiner de armazenamento, abaixo dos níveis da radiação de fundo local. [IAEA, 1992; 1996b; 2010]. 21 A Figura 2.6 mostra um irradiador gama de fluxo contínuo para a desinfestação de grãos (embora, o emprego de um acelerador de elétrons fosse mais apropriado). Os grãos são transportados por meio de dutos pneumáticos até a entrada do irradiador, onde eles são despejados em dutos, que envolvem uma fonte de cobalto-60, quando ela está na posição de exposição. Durante a queda, os grãos são irradiados. Entrance: Entrada do irradiador. Annular cylinders: dutos que envolvem a fonte. Radiation source: fonte de radiação (neste caso, cobalto-60). Interior, middle e exterior Field: Campo de irradiação interno, do meio e externo. Flow rate control valves: válvulas de controle da taxa de fluxo. Pneumatic transfer exit tube: Tubo pneumático de saída Figura 2.6: Irradiador gama de categoria II para grãos, que são despejados por cima do equipamento, descem por gravidade, passam por dutos que envolvem a fonte de cobalto-60 e, durante essa passagem, recebem a dose necessária para a eliminação de insetos [IAEA, 2002]. A figura 2.7 mostra um irradiador de um instituto na Hungria. O objetivo desse processamento é a inibição de brotamento de cebolas [MaClaughlin et al., 1989]. O método é similar ao do irradiador de grãos, mostrado na Figura 2.6. 22 Figura 2.7: Irradiador de cobalto-60 na Hungria, que opera por fluxo gravitacional, para a inibição do brotamento de cebolas [MaClaughlin et al., 1989]. 1. Fonte de cobalto-60 na posição de irradiação. 2. Fonte de cobalto-60 recolhida na sua blindagem seca. 3. Blindagem do irradiador. 4. Blindagem de chumbo. 5. Blindagem da fonte. 6. Esteira de carga. 7. Mesa giratória. 8. Esteira de saída. Um irradiador gama para exposições de materiais em geral é mostrado na Figura 2.8. Nesse equipamento, os materiais devem ser transportados manualmente até a sala de irradiação, onde são colocados em mesas giratórias, que estão distribuídas em torno da posição em que a fonte será exposta. Na sua posição de repouso, ela é alojada em uma blindagem abaixo do nível do piso.Após a acomodação do material, o operador e demais funcionários se retiram, fecham a porta de acesso e é dado o comando para erguer a fonte de sua blindagem. Quando a fonte chega à sua posição de exposição, as mesas começam a girar em torno de seus eixos. Durante todo o processamento, uma série de sistemas de segurança mantém a porta de acesso travada e qualquer tentativa de abri-la por meios escusos acarretará o imediato recolhimento da fonte. 23 Figura 2.8: Desenho do irradiador gama de categoria II GammaBeam-127, fabricado pela MDS Nordion. O Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN) em Belo Horizonte possui um [catálogo MDS Nordion] Um da mesma categoria, mas com mecanismo automático de transporte, existente na Bielorrússia [IAEA, 1996c], pode ser visto na Figura 2.9. A B C Figura 2.9: Irradiador gama de categoria II existente na Bielorrússia [IAEA, 1996c]: A) Desenho com vista em corte do irradiador, sendo possível notar a fonte (source rack) em sua posição de repouso abaixo do nível do solo e sob a sua blindagem (shielding plug). B) Foto do interior da sala de irradiação, com a fonte na posição de repouso. C) Mecanismo automático de transporte Pistão para elevar a fonte Sala de controle Blindagem do irradiador Sala de irradiação Cabo de elevação da fonte Fonte na posição de exposição Blindagem da fonte Corredor de acesso à sala de irradiação Porta de acesso Fonte na posição de repouso 24 2.1.3 Irradiador gama de categoria III (autoblindado com água) Trata-se de um irradiador em que a fonte é fixada no fundo de um tanque preenchido com água. Isso implica que o material a ser irradiado deve ir até a fonte. A função dessa coluna de água é tripla: a primeira e a mais importante é a de blindagem da radiação emitida; a segunda é a de restringir o acesso humano à fonte e ao volume sob irradiação; a terceira é a de funcionar como dissipadora do calor gerado pela fonte (por meio de correntes de convecção naturalmente formadas), permitindo que essa categoria de irradiador gama possa operar com atividades maiores do que os de categoria I e II cujas fontes são armazenadas a seco [IAEA, 2004]. Para se ter uma ideia do aquecimento gerado, a potência emitida por uma fonte de cobalto-60, que emite dois fótons com energia média de 1,25 Mev por desintegração, com atividade de 18,5 PBq (500 kCi), é dada por: 2 x 1,25 x 106 x 1,602 x 10-19 J x 18,5 x 1015/s ≈ 7,4 kw Como parâmetro de comparação, um chuveiro elétrico comum tem entre 6 e 7 kw. Para fontes com atividades maiores, as correntes de convecção formadas não são suficientes para evitar perdas significativas de água por evaporação em curto espaço de tempo e o tanque assemelhar-se-á mais com um caldeirão de água quente. A blindagem não será comprometida, pois é exigido um sistema automático de reposição de água cujo acionamento deve ser pouco requisitado, pois, por questões de segurança, qualquer barreira deve exigir pouca manutenção. Caso contrário, é como manter um pedreiro de plantão para reparar o muro de barro da sua casa a cada intempérie; é melhor construir um de alvenaria. A solução é adicionar um sistema de resfriamento ao circuito da água. Ao redor da fonte, a radiação emitida por ela ao interagir com a água, produzirá o efeito Cherenkov, que é uma luz azul brilhante e inócua. Para retirar os íons e cátions formados pela irradiação das impurezas presentes na água e, dessa forma, minimizar o potencial de corrosão do tanque, da grade de fontes e das próprias fontes, a água é continuamente passada por um circuito fechado, que possui um sistema de deionização. Um benefício adicional é deixar a água translúcida, o que permite a inspeção visual da grade de fontes. Como se pode notar, esse tipo de irradiador opera da mesma maneira que os de categoria I, mas, neste caso, a blindagem é feita pela água [IAEA,1992; 1996a; 2010]. 25 Referências mostrando irradiadores gama de categoria III não são comuns na literatura; a própria IAEA mostra sempre o mesmo desenho [IAEA, 1992, 1996a, 2003 e 2010], que pode ser visto na Figura 2.10a. A Figura 2.10b [McLaughlin et al. 1989] mostra o mesmo modelo de irradiador, mas com uma vista em corte. Nesse modelo, as amostras podem ser irradiadas tanto no centro dessa disposição anular, como podem ser colocadas em outras posições a certas distâncias das fontes. Nessa disposição anular, a taxa de dose é constante dentro do volume cilíndrico, desde que todas as fontes tenham atividades semelhantes [McLaughlin et al. 1982]. a b Figura 2.10: a) Irradiador gama de categoria III: Um irradiador autoblindado, com armazenamento da fonte no fundo de um tanque com água. O material a ser irradiado deve ir até a fonte em um recipiente hermético ou não (depende do material) [IAEA, 1992]. b) Vista em corte do recipiente na posição de irradiação cercado pelo anel de fontes. No detalhe, é possível observar o material a ser irradiado: um pequeno dosímetro colocado bem no meio do recipiente [McLaughlin et al. 1989]. Outro modelo encontrado é o GENESIS™, fabricado pela Gray*Star, mostrado na Figura 2.11. Trata-se de um equipamento destinado ao processamento em escala industrial de alimentos. O material a ser irradiado é colocado dentro de grandes campânulas de aço inoxidável, que são fechadas no topo, mas não são vedadas no fundo. A água é mantida do lado de fora pela injeção de ar comprimido durante o trajeto até o fundo do tanque. A dose 26 absorvida é determinada pelo tempo de permanência das campânulas, que são colocadas primeiramente de um lado e, então, do outro da grade de fontes [Sommers e Fan, 2006]. Figura 2.11: Desenho de um irradiador gama de cobalto-60 modelo GENESIS, fabricado pela Gray*Star (cortesia da Gray*Star) [Sommers e Fan, 2006]. 2.1.4 Irradiador gama de categoria IV (panorâmico e de armazenagem da fonte em água) Trata-se de um irradiador em que o acesso humano à câmara de irradiação é possível e, por isso, deve ser controlado. A grade de fontes possui duas posições: a de repouso e a de exposição. Na posição de repouso, ela está no fundo de um tanque com vários metros de profundidade cheio de água cuja função é a de blindar a radiação, no caso de haver a necessidade de entrar na câmara de irradiação, por exemplo, para efetuar algum reparo no sistema de transporte ou uma inspeção de rotina. Na posição de exposição, a grade de fontes está fora do tanque para irradiar os produtos dentro da câmara. Neste último caso, a câmara de irradiação é mantida inacessível durante o uso por um conjunto de sistemas de segurança [IAEA, 1992, 1996b, 2010]. A Figura 2.12 mostra um exemplo dessa categoria de irradiador e de seus componentes principais. 27 Figura 2.12: Irradiador gama de categoria IV: um irradiador panorâmico, com armazenamento da fonte em tanque com água [IAEA, 1992, 2010]. Hoist cable: cabo do guincho (ver observação para o Source hoist cylinder). 2 m concrete shielding: blindagem de concreto de 2 metros de espessura (essa espessura pode ser maior ou menor, dependendo da atividade máxima licenciada para o irradiador). Source hoist cylinder: guincho da grade de fontes (alguns modelos possuem grades de fontes independentes e, por isso, possuem mais de um guincho, um para cada grade). Acess for source transport container: tampas de concreto para a entrada do contêiner de transporte de fontes (na maioria dos irradiadores dessa categoria, a entrada do contêiner blindado contendo as fontes individuais, para serem colocadas na grade de fontes, é feita por uma abertura no teto, que possui tampas de concreto, asquais devem ser removidas antes da operação e recolocadas após). Product conveyor: esteira de produtos (transporta o material para a câmara de irradiação, faz o mesmo percorrer um trajeto em torno da fonte e o retira). Personnel access door: Porta de acesso ou do labirinto. Control panel: painel de controle. Source transport container: contêiner blindado para o transporte de fontes individuais (não permanece dentro do irradiador durante a operação normal). Source array (safe position): grade de fontes (posição de repouso). Guide cable: cabos guias (para evitar que a grade de fontes gire em torno do próprio eixo). Shielding pool: tanque com água para a blindagem da fonte. 28 O tanque e a sua água seguem os mesmos cuidados destinados a um irradiador gama de categoria III (ver item 2.1.3) e, como no caso dos de categoria II (ver item 2.1.2), é necessária uma blindagem externa de concreto, para reduzir os níveis de radiação provenientes da grade de fontes a níveis inferiores aos da radiação de fundo local, quando ela estiver fora do tanque. Vamos analisar em maiores detalhes os componentes para essa categoria de irradiador, ou seja, a fonte de radiação, o mecanismo de transporte dos materiais a serem irradiados e a blindagem. O objetivo é facilitar a compreensão do porquê dos seus sistemas de segurança, que serão analisados no próximo capítulo. 2.1.4.1 Fonte de irradiadores gama de categoria IV O radionuclídeo cobalto-60 (Co-60 ou 60Co27) é a fonte de radiação gama majoritariamente utilizada na tecnologia da radiação, tanto na indústria quanto na medicina. A produção de cobalto radioativo começa com o cobalto natural (metal) cuja predominância do isótopo estável cobalto-59 é de 100 %. Veios ricos em cobalto são raros e esse metal corresponde a somente 0,001% da crosta terrestre. Tarugos (pequenos cilindros) ou peletes feitos de 99,9 % de puro pó de cobalto sinterizado (unidos por alta temperatura, mas sem atingir a de fusão/derretimento) e, geralmente, soldados dentro de cápsulas de ZircaloyTM (Ligas de Zircônio) são colocados em reatores nucleares, onde eles permanecem por um determinado período de tempo (por volta de 18 a 24 meses), o que irá depender da intensidade do fluxo de neutros [IAEA, 2004]. Enquanto estão dentro do reator, os átomos de cobalto-59 absorvem um nêutron e se convertem em cobalto-60: Co-59 + n → Co-60 Durante o tempo de permanência dentro do reator, uma pequena percentagem dos átomos nos peletes se converte em cobalto-60. A atividade específica é, geralmente, limitada a, aproximadamente, 4,44 TBq/g de cobalto (por volta de 120 Ci/g). Depois da irradiação, as cápsulas contendo os peletes de cobalto são acondicionados em tubos de aço inoxidável resistentes à corrosão cujas pontas são seladas com solda, para finalizar a produção de uma fonte em formato cilíndrico, que é chamada lápis. Cada lápis possui um número de identificação gravado em suas pontas. Desse modo, a radiação gama pode atravessar as 29 paredes do lápis, mas o material radioativo (cobalto-60) não pode sair, ele está aprisionado dentro da fonte. Em outras palavras: o material radioativo não tem como entrar em contato direto com o produto que está sendo irradiado. O cobalto-60 é duplamente selado, para maximizar a segurança. A Figura 2.13 mostra uma maquete de um lápis de cobalto-60 com corte, para a visualização da parte interna, e com alguns peletes ao lado, que estaria pronto para ser colocado em uma instalação [IAEA, 2004; MaCLaughlin et al., 1989]. A maioria das fontes de cobalto-60 para irradiadores gama industriais é na forma de lápis, com um comprimento de 452 mm (17.8 polegadas) e com um diâmetro de 11,1 mm (0,44 polegadas). A atividade de um lápis pode chegar a 527 Tbq (14,25 kCi) [Sommers and Fan, 2006]. Figura 2.13 Fotografia de uma maquete de um lápis de cobalto-60 e de seus peletes fabricado pela MDS Nordion (Canadá). Notar as duas camadas de aço inoxidável que envolvem os peletes de cobalto-60 [Sommers e Fan, 2006]. As cápsulas de césio-137 atualmente em uso são fabricadas de modo similar. Elas têm um diâmetro maior, levando a uma maior autoabsorção da radiação e a uma menor eficiência em relação às fontes de cobalto-60, para uma mesma atividade [MaCLaughlin et al., 1989]. Fontes de césio-137 não devem ser utilizadas em irradiadores de armazenamento de fontes em água, por causa da alta solubilidade do cloreto de césio nela presente [IAEA, 2010, p. 51, 8.52]. 30 A geometria adequada da fonte é obtida colocando os lápis, em posições pré- determinadas, dentro de módulos e distribuindo esses módulos na grade de fontes do irradiador (Fig. 2.14). O número de módulos na grade de fontes e o de lápis em cada módulo varia de acordo com o modelo e o fabricante do irradiador. Figura 2.14: Esquema fornecido pela MDS Nordion (Canadá), mostrando uma montagem típica de uma grade de fontes (source rack) de um irradiador industrial. Desde os peletes (slugs), passando pelos lápis (pencils), módulos (module) até chegar à montagem final [IAEA, 2004]. 31 O formato da grade de fontes e, consequentemente, dos módulos também pode variar, dependendo da geometria de irradiação adotada. Por exemplo, há grade de fontes no formato cilíndrico, como o irradiador de batatas da cooperativa de Shihoro (Japão), mostrado na Figura 2.15, que visa estender o período de armazenamento desse tubérculo [IAEA, 2002]. Mas o formato mais adotado é o plano. Há irradiadores que possuem grade de fontes independentes, como mostra a Figura 2.16, cujo objetivo é reduzir a taxa de dose aplicada em produtos sensíveis a um limite de dose. Observação: No Japão, é viável a irradiação de batatas porque lá esse alimento é caro (assim como vários outros). Figura 2.15: Irradiador de batatas da Cooperativa de Shihoro (Japão). A fonte circular pode ser vista no centro da foto [IAEA, 2002]. A grade de fontes é composta de módulos e cada módulo é composto de tubos vazios e/ou lápis de cobalto-60, ou seja, nem todos estão preenchidos com material radioativo. Estes tubos estão servindo apenas de calço para manter o posicionamento dos lápis com cobalto-60. Esse tubo vazio é chamado simulador ou “dummy”. O motivo disso é que, com o decaimento do material radioativo, são necessárias novas recargas para manter ou ampliar a capacidade de irradiação do equipamento, então se retiram esses simuladores e se colocam os novos lápis de cobalto-60. Em geral, as fontes novas são colocadas próximas à região central da grade de fontes, os simuladores nas extremidades e as fontes mais antigas entre essas duas regiões. 32 Figura 2.16: Irradiador com três grades de fontes independentes, sendo erguidas para a posição de exposição (na época dessa foto, o irradiador ainda estava sendo montado e os módulos só possuíam simuladores). O transporte das fontes do fornecedor até o irradiador é feito por meio de contêineres de transporte (de chumbo ou de urânio exaurido), como mostram as figuras 2.17 a e b. 33 a b Figura 2.17: a) Fontes sendo colocadas no contêiner de transporte, por meio de mãos mecânicas. b) Contêiner de transporte carregado, sendo checado antes do embarque. 2.1.4.2 Mecanismos de transporte dos materiais a serem processados em irradiadores gama de categoria IV Eventualmente, os mecanismos de irradiação descritos podem ser aplicados às demais categorias de irradiadores gama. O material a ser irradiado é acondicionado dentro de contêineres (em geral, feitos de alumínio; devido a vários aspectos, tais como: sua resistência à radiação, o preço e a densidade relativamente baixos e o fato de não enferrujar) cujas dimensões dependerão do projeto doirradiador. Dentro desses contêineres o material é levado à câmara de irradiação, onde percorre um trajeto em torno da grade de fontes de cobalto-60, e é trazido para fora. Esse trajeto em torno da grade de fontes é composto por certo número de posições e a dose recebida pelo material é diretamente proporcional ao tempo em que o contêiner permanece em cada uma dessas posições. Esse tempo é ajustado por meio do painel de controle e é chamado ciclo ou passo da máquina. Em todo o trajeto percorrido pelo contêiner dentro do irradiador, este não sofre qualquer movimento de rotação, ocorre somente translação. Obviamente, com o decaimento do material radioativo, o tempo de ciclo deverá ser corrigido periodicamente (no caso do cobalto-60, essa correção é de cerca de 1% ao mês) [IAEA, 2004]. Existem vários tipos de sistemas de transporte, sendo os dois mais comuns: o tipo “Tote” ou “Product Overlap” e o tipo “Carrier” ou “Source Overlap”. Aqui “Tote” assume o significado de um contêiner que é colocado em esteiras e “Carrier”, o de um contêiner que 34 viaja pendurado. No primeiro caso, o sistema de irradiação faz com que o posicionamento do contêiner seja acima ou abaixo do meio da grade de fontes. Isso exige que o produto passe duas ou mais vezes em torno da grade em diferentes níveis, para atingir uma melhor uniformidade de dose. No segundo caso, o tamanho da grade é maior do que o do contêiner, então, normalmente, o produto necessita passar somente uma vez em torno da fonte e em apenas um nível para atingir uma melhor uniformidade de dose [IAEA, 2004; Fairband, 2002]. A Figura 2.18 mostra o detalhe desses dois sistemas. “Tote” ou “Product Overlap” “Carrier” ou “Source Overlap” Figura 2.18: Dois sistemas de geometria de irradiação: “Product Overlap” e “Source Overlap”. Notar que, para o primeiro sistema, o tamanho combinado de dois contêineres é maior do que o da grade de fontes e que cada contêiner passa por dois níveis. Para o segundo sistema, o tamanho da grade de fontes é maior do que o do contêiner e o trajeto é em um único nível [IAEA, 2004]. No sistema “Source Overlap”, como a grade de fontes é maior do que o carrier, a uniformidade de dose no produto na direção vertical será obtida por meio de uma grade cuja 35 distribuição de material radioativo seja gradual. Isso é obtido, colocando-se mais radioisótopos no topo e na base do que na região próxima ao centro. Para que seja alcançada uma eficiência razoavelmente boa, a distância entre os carrieres e a fonte é, geralmente, muito menor do que a distância encontrada nos irradiadores tipo “Tote” (“Product Overlap”) (Fairband, 2002). Dentre as principais diferenças entre um irradiador que opera no sistema “Tote” e um que opera no sistema “Carrier”, é possível observar que o primeiro aproveita mais a radiação emitida pela fonte, mas apresenta uma distribuição de dose mais inomogênea em relação ao segundo sistema, considerando que os dois tipos de irradiadores apresentam os contêineres com as mesmas dimensões e irradiam materiais de mesma densidade. Para um melhor aproveitamento da radiação emitida, os projetos costumam ser de várias fileiras de contêineres em torno da grade de fontes, como mostra a Figura 2.19. Entretanto, se a densidade do material dentro dos contêineres não for uniforme, a dose aplicada também não será uniforme. Se o produto a ser irradiado for sensível a variações de dose (como é o caso de frutas), deve-se optar por um trajeto de apenas duas fileiras e poucas posições. Figura 2.19: Exemplo de um trajeto de irradiação com quatro fileiras em um único nível e 40 posições. Notar que o ponto “A”, marcado arbitrariamente em uma das faces do contêiner não sofre rotação, ele somente translada [IAEA, 2002]. As Figuras 2.12 e 2.20 mostram exemplos de irradiadores tipo Tote. A última figura mostra um irradiador projetado e produzido no Brasil pelo IPEN/CNEN-SP, com 36 características inovadoras em relação aos estrangeiros (como o sistema de movimentação dos contêineres estar do lado externo e a porta giratória permitir que ele seja compacto, pois elimina o corredor). A Figura 2.21 mostra um irradiador tipo Carrier. Figura 2.20: Irradiador gama de categoria IV tipo Tote, projetado e produzido no Brasil pelo IPEN/CNEN-SP [Calvo et al., 2004]. Figura 2.21: Irradiador gama de categoria IV tipo Carrier. Devido às suas dimensões, esta máquina irradia paletes inteiros [IAEA, 2002]. 37 Há irradiadores em que o sistema de transporte para levar e trazer os contêineres da sala de irradiação é manual; assim, o mecanismo de movimentação em torno da fonte pode ser automático ou manual. Esse tipo é conhecido como de lote ou de batch, adequado para a produção em pequena escala. Durante a operação de posicionamento dos contêineres na sala de irradiação, a grade de fontes permanece recolhida no fundo do tanque [IAEA, 2004; MaClaughlin et al., 1989]. As Figuras 2.22 e 2.23 mostram exemplos desse tipo de irradiador. Figura 2.22: Irradiador gama de categoria IV operando no modo de batch ou de lote, em que os contêineres são posicionados dentro da sala de irradiação por meio de uma empilhadeira. Após a saída do operador e a sala ter sido fechada, a fonte é erguida de sua posição de repouso e um mecanismo automático faz os contêineres percorrerem um trajeto em torno da mesma. Após uma volta ter sido completada a fonte é recolhida para o fundo do tanque e os contêineres são trocados [IAEA, 2004]. 38 Figura 2.23: Irradiador gama de categoria IV tipo Carrier, operando no modo de batch ou de lote. O transporte dos contêineres entre os armazéns e a sala de irradiação é feito manualmente [IAEA, 2004]. Os trajetos percorridos pelos contêineres em torno da fonte tem o objetivo de otimizar a dose aplicada a eles, por meio da exposição das suas faces à fonte de radiação (similar ao assar um bife em uma churrasqueira, para deixá-lo bem passado). A Figura 2.24 mostra a distribuição de dose resultante dessa técnica. 39 Figura 2.24 Distribuição de dose em função da espessura em um produto dentro de um contêiner cujos dois lados foram expostos a uma fonte de cobalto-60. A curva “a” representa a distribuição de dose quando um lado do contêiner é exposto (fonte na posição “a”) e a curva “b” quando o outro lado é exposto (fonte na posição “b”). A dose total, devido à exposição dos dois lados, é mostrada pela curva “a+b”. Notar que esta última curva apresenta uma distribuição de dose mais uniforme do que as devidas à exposição de um único lado (“a” ou “b”) [IAEA, 2002 e 2004]. 2.1.4.3 Blindagem de irradiadores gama Irradiadores que utilizam radionuclídeos como fonte são construídos de maneira similar, não importando se são de cobalto-60 ou de césio-137. Para uma mesma atividade, as fontes de césio exigem uma espessura de blindagem menor em relação às de cobalto-60, por causa da menor energia do raio gama emitido, implicando maior atenuação relativa, mas a planta da instalação é similar em ambos os casos (MacLaughlin et al., 1989). É preciso lembrar que fontes de césio-137 não devem ser utilizadas em irradiadores de armazenamento de fontes em água, por causa da alta solubilidade do cloreto de césio nessa substância [IAEA, 2010, p. 51, 8.52]. 40 Envolvendo a sala de irradiação, há uma blindagem para a radiação, também chamada blindagem biológica ou simplesmente blindagem. Ela deve ser projetada para que o nível de radiação na sua superfície externa, considerando a grade de fontes carregada em sua atividade máxima (a licenciada perante a CNEN), esteja em conformidade com níveis de
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