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“Homem”, Cultura e Sociedade Texto Msc. Hauley S. Valim O CONTEXTO PARA O SURGIMENTO DA FILOSOFIA MODERNA Olá Gente, em mais uma aula de filosofia veremos o pensamento humano e a teoria do conhecimento (epistemologia) passeando por entre espaços, mentes e idéias que de forma efetiva fizeram o mundo vivido mudar. Poderia a descoberta de todo um Universo, cujo planeta Terra seria um ínfimo fragmento, mudar a estrutura do pensamento humano? Descobrir que a Terra não ocupa o centro do universo provocaria um mal-estar em seus habitantes? Pelo menos Pascal, ao se deparar com a magnitude da Via Láctea, ficou simplesmente “apavorado” (Aranha, 1993:148). O ambiente onde se constituiu a filosofia moderna foi marcado por debates, questionamentos, contradições na forma de pensar o mundo. Foi um deslocamento de centralidades, um verdadeiro questionar das verdades. Devemos pensar, partindo daqui, nas discussões que permitiram relativizar as verdades, as leis, experimentar ou apenas visualizar outros padrões morais e até novos padrões. Pois, a principal marca da modernidade foi a ruptura com a tradição teológica que marcou os longos séculos do período medieval, conforme vimos na aula anterior. A terra é dramaticamente retirada do centro do universo com as descobertas científicas, assim como Deus é dramaticamente retirado da centralidade da vivência humana. A organização da sociedade, logo, a forma de pensar o mundo neste contexto se transforma, muta com demasiada velocidade. Leitura preliminar obrigatória: GAARDER, Jostein. Capítulo XVI: O Renascimento. Em: “O Mundo de Sofia: Romance da História da Filosofia”. Disponível online em: http://br.geocities.com/mcrost08/o_mundo_de_sofia_16.htm A etimologia da palavra Moderno nos informa, através do advérbio latino “modo”, uma ruptura temporal, significa: “agora mesmo”, “neste instante”, “no momento”. Designa, neste sentido, “o que nos é contemporâneo, e é este o sentido de moderno que capta, opondo-se ao que é anterior, e traçando, por assim dizer, uma linha, ou divisão entre dois períodos” (Marcondes: 2001:140). A divisão Poe em pares opostos o atual e o antigo. Danilo Marcondes destaca que duas noções fundamentais não podem ser deixadas de lado quando se pretende pensar a modernidade: “a idéia de progresso, que faz com que o novo seja considerado melhor ou mais avançado do que o antigo; e a valorização do indivíduo, ou da subjetividade, como lugar da certeza e da verdade, e origem dos valores, em oposição à tradição, isto é, ao saber adquirido, às instituições, à autoridade externa” (Marcondes, 2001:140). No entanto, não importa perceber diante de uma balança o que pesou mais sobre a forma de pensar do ocidente, o antigo e tradicional ou a modernidade, pois já confirmamos a importância da tradição religiosa durante o período medieval, para o surgimento e para a sistematização das artes, da arquitetura e principalmente das universidades. Para o filosofo Danilo Marcondes deve-se a três fatores históricos o surgimento da filosofia moderna: o humanismo renascentista do século XV, a Reforma Protestante e a revolução científica no século XVIII. Apesar de não receber o reconhecimento de tudo, é no Renascimento que a idéia de humanismo ganha força, fornecendo um importante aspecto que exercerá influência definitivamente no pensamento moderno. Lembram-se da celebre afirmação de Pitágoras, resgatada pelos renascentistas, “o homem é a medida de todas as coisas”? Pois bem, assim como Deus esteve no centro do universo durante o período medieval, de igual modo ocupou o ser humano durante a renascença e em suas derivações modernas (MARCONDES, 2001:141). A Reforma Protestante também ocupa a centralidade na constituição do saber filosófico sobre a modernidade. Tira a centralidade de interpretação das escrituras bíblicas dos clérigos com sua reflexão sobre o sacerdócio universal, neste sentido, ele dá autonomia aos fiéis, pois em cada um agora está a dignidade para interpretar as escrituras sagradas, ainda mais com a tradução da bíblia do latim para o alemão viabiliza a individualização da fé, e conseqüentemente a individualização dos sujeitos. A Revolução Científica, por sua vez, rejeita muitas verdades teológicas como, por exemplo, o universo geocêntrico, pondo no lugar do Planeta Terra o Sol, tornando o modelo de organização do universo geocêntrico, além da quantitativização do tempo e do espaço. Ao longo das próximas aulas veremos como pensaram alguns dos principais filósofos que fizeram de aspectos da modernidade não só seus temas de discussão filosófica, mas também o paradigma para se perceber o mundo que os rodeavam. A FILOSOFIA DE RENÉ DESCARTES “A crença no poder crítico da razão humana individual, a metáfora da luz e da clareza que se opõe à escuridão e ao obscurantismo, e a idéia de busca de progresso que orienta a própria tarefa da filosofia são alguns dos traços fundamentais da modernidade de Descartes” - Danilo Marcondes Gente, o pensador sobre o qual falaremos hoje nasceu na França de 1596. O fato de sua família pertencer à pequena nobreza viabilizou para nosso incipiente filósofo um ensino de qualidade. Aos dez anos entrou para o importante Colégio de La Flèche, jesuíta, onde desenvolveu profundo interesse pela matemática e posteriormente pela física. Freqüentou a alta sociedade francesa antes de mudar-se para a Holanda, procurando a tranqüilidade necessária para pensar e, é claro, desenvolver seu método. Homem de sua época, Descartes foi, ao mesmo tempo, viajante contumaz e homem retirado, soldado engajado em exércitos em guerra e homem em busca de tranqüilidade, aliado de católicos e de protestantes, homem da corte e habitante da província, pensador isolado e correspondente da intelectualidade européia, autor de um manual de esgrima e de uma das mais profundas obras de metafísica, racionalista, homem de ciência e interessado na magia e nos mistérios dos rosa-cruzes, a cuja ordem talvez tenha pertencido. É a diversidade dessas experiências que forma a matéria a partir da qual Descartes desenvolve seu pensamento, e é por insistência do próprio Descartes que devemos compreender o pensamento filosófico como resultado da reflexão sobre a experiência de vida (Marcondes, 2001:162). Leitura preliminar obrigatória: GAARDER, Jostein. Capítulo XVIII: Descartes. Em: “O Mundo de Sofia: Romance da História da Filosofia”. Disponível em anexo. Percebe-se nesta citação a dinâmica na qual viveu o filósofo francês, cuja dialética constituiu-se como um dos fundamentos do seu conhecido, já que circulou entre várias dimensões, entre várias visões de mundo, que, por certo, determinou o caminho trilhado até seu objetivo: o método. Descartes, neste sentido, é considerado por muitos não só o pai da filosofia moderna, mas também o mais importante filósofo deste contexto. Suas reflexões passam por duas questões fundamentais: o conhecimento do ser, isto é, a metafísica e o problema da teoria do conhecimento, leia-se epistemologia. Duas foram suas principais obras sobre o problema do conhecimento: O “Discurso do Método” e “Meditações Metafísicas”. O pressuposto de qualquer meditação cartesiana (como ficou conhecida as conseqüências das contribuições de Descartes) é a Dúvida. Segundo Aranha, O ponto de partida é a busca de uma verdade primeira que não possa ser posta em dúvida. Por isso, converte a duvida em método. Começa duvidando de tudo, das afirmações do senso comum, dos argumentos da autoridade, do testemunho dos sentidos, das informaçõesda consciência, das verdades deduzidas pelo raciocínio, da realidade do mundo exterior e da realidade de seu próprio corpo (1999:104) . Na 1° meditação, da obra “Meditações”, intitulada como “Das coisas que se podem colocar em dúvida”, Descartes introduz sua filosofia da desconfiança. Destaca a fragilidade da busca pelo conhecimento concreto naquele contexto. Critica a tradição que não oferece firmeza em suas verdades. Propõe começar a construir um conhecimento do princípio. Começar tudo de novo. Desconstruir todas as opiniões para viabilizar o novo. Fundamentar uma nova ciência. Fazer nascer a dúvida. Na próxima aula veremos quais são as três fontes da dúvida contra as quais Descartes construirá seus argumentos, tendo em vista uma nova forma de conhecimento. René Descartes (1596-1650) um dos filósofos que mais influenciaram a modernidade, retratado por Frans Hals. Esta conhecida imagem de Descartes está disponível junto ao verbete do pensador francês em http://pt.wikipedia.org/wiki/Descartes (verbete: leitura complementar). O MÉTODO CARTESIANO “A finalidade do método é precisamente pôr a razão no bom caminho, evitando o erro. O método, portanto, é um caminho, um procedimento que visa garantir o sucesso de uma tentativa de conhecimento, da elaboração de uma teoria científica. Um método se constitui basicamente de regras e princípios que são as diretrizes deste procedimento”. Danilo Marcondes (2001:162) sobre o método de René Descartes Gente, quando falamos em método falamos na descrição da forma encontrada para a realização de alguma coisa; usar um método é como consultar um mapa que orienta precisamente o encontro com algo escondido; um projeto cuja rigorosidade faz com que o desejado seja realizado com maestria. Em Descartes, neste sentido, o método pretende orientar a busca por um conhecimento verdadeiro, livre do erro. Pode até parecer preocupação demasiadamente ou rigorosidade metodológica desnecessária, mas todos verão, ao longo do trajeto intelectual e acadêmico de vocês, que sem um método claro e bem demonstrado a validade de suas pesquisas e do trabalho jurídico exercido pouco valor terá diante dos acadêmicos e dos juristas mais experientes. Para René Descartes a auto-responsabilidade, o autodomínio e a autodeterminação são aspectos fundamentais do método, pois só com esta rigorosidade proposta é possível chegar ao conhecimento exato. Aspecto, que de alguma forma, o aproxima de Santo Agostinho, no entanto, para o clérigo todo esforço de controle pelas auto-atribuições pretendem chegar ao conhecimento de Deus (TAYLOR, 1989). Descartes pretende conhecer o mundo de forma, no entanto, segundo ele, isso só é possível através de faculdades que estão dentro daquele que anseia chegar ao conhecimento da Leitura preliminar: FERNANDES, Doris. A divisão cartesiana entre corpo - máquina e a alma e seu efeito sobre o pensamento ocidental. Disponível em: http://www.cientefico.frb.br/anoiiivoliipsi.htm Sabem o que significa a célebre afirmação de Descartes “Cogito ergo sum”? Se não, pesquisem para a próxima aula! Sugestão: vede http://pt.wikipedia.org/ wiki/Cogito_ergo_sum verdade. Isto é, conhecer o mundo das formas e dos objetos que estão fora só é possível com as idéias que estão dentro dele próprio. O método cartesiano, neste sentido, acredita que o conhecimento sobre o mundo de fora só é possível ser construído através de idéias que estão dentro de mim, através da racionalidade procedimental. Metodologicamente deve-se buscar a fragilidade dos argumentos sobre os objetos, por tempos cristalizados, e invalidá-los substituindo-os por um conhecimento EXATO, FIRME e CONCRETO, construído através de um método mecânico e funcional (MARCONDES, 2002:159-164). PENSANDO NO MÉTODO DE RENÉ DESCARTES Pergunta Cartesiana: Mas como conhecer o mundo e a verdade sobre ele se minhas paixões e sensações me impedem de percebê-lo com clareza? Respostas 1. Esta situação exige abandonar a primeira (1ª) pessoa e assumir a posição de um observador externo. 2. Levantar sistematicamente dúvidas sobre o objeto do conhecimento. 3. Buscar a fragilidade dos argumentos cristalizados sobre o objeto e trilhar em direção ao concreto e objetivo. 3. Subtrair a ação e a influência do mundo e do corpo sobre a reflexão da mente. 4. Desprender-se de si próprio para conhecer o mundo lá fora. 5. No entanto, com categorias essencialmente interiores, isto é, compreender o mundo através do exercício da razão. Exercício para fixação O que faz do método desenvolvido por René Descartes uma marca na constituição da concepção filosófica da modernidade? BIBLIOGRAFIA AGOSTINHO, Santo. Confissões de Magistro, Vida e Obra. Coleção os Pensadores. Ed. Victor Civita, São Paulo 1984. AGOSTINHO, Santo. Confissões. Ed. Paulus, São Paulo 1984. ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 1993. CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: ed. Ártica, 1999. DESCARTES, René. Meditações. Em: Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1991. DESCARTES, René. O Discurso do Método. Em: Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1991. FERREIRA Franklin. Apostila da Disciplina História da Igreja do Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil. Rio de Janeiro, 2002. GAARDER, Jostein. “O Mundo de Sofia: Romance da História da Filosofia”. São Paulo: Cia. das Letras, 1998. MARCONDES, Danilo. Iniciação à História da Filosofia: dos Pré-Socráticos a Wittgenstein. Jorge Zahar Ed. Rio de Janeiro 2001. NIETZSCHE, Friedrich. Crepúsculo dos Ídolos ou Como Filosofar Com o Martelo. Em: Coleção os Pensadores: obras incompletas. São Paulo: Abril Cultural: 1996. REALE, Giovanni/ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. Ed. Paulinas, São Paulo 1990. TAYLOR, Charles. As Fontes do Self. São Paulo: Loyola, 1997.
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