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1 MEDICINA NUCLEAR Alexandre Teles Garcez1 Almy Anacleto Rodrigues Da Silva2 Walter Siqueira Paes3 1 – PRINCÍPIOS GERAIS A Medicina Nuclear é uma modalidade da Medicina direcionada essencialmente ao estudo de anomalias metabólicas e funcionais. É uma modalidade que, embora possa envolver procedimentos terapêuticos, tem no diagnóstico de patologias funcionais sua principal ação. A Medicina Nuclear faz uso da radiação ionizante na forma de compostos radioativos, denominados radiofármacos. Considerando que a finalidade básica é a investigação funcional, utiliza-se destes compostos como traçadores radioativos. O mecanismo é bastante simples: é conhecido que diferentes compostos químicos possuem diferentes “caminhos” ou afinidades metabólicas, uma vez dentro do corpo humano. Desta forma, pode-se escolher e utilizar um determinado composto que possua afinidade metabólica com o órgão ou tecido de interesse. Este composto é usualmente denominado fármaco. A idéia é verificar se este fármaco terá um comportamento metabólico padrão ou se haverá uma anomalia neste comportamento, subsidiando desta forma o diagnóstico de patologias funcionais. Ocorre que este comportamento metabólico do fármaco no interior do corpo humano precisa ser identificado ou detectado de alguma maneira, sem ter que recorrer a uma intervenção cirúrgica. A solução para este problema se dá pela utilização de um isótopo radioativo que, por um processo denominado marcação, é “acoplado” ao 1 Física Médico do Centro de Medicina Nuclear do Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas, São Paulo,. 2 Físico de Proteção Radiológica do SESMT da Universidade de São Paulo. Doutor em Física (Instituto de Física da USP), Mestre em Ciências (Instituto de Física da USP),, Especialista em Vigilância Sanitária – área Radiações Ionizantes (Faculdade de Saúde Pública da USP) 3 Físico de Proteção Radiológica do SESMT da Universidade de São Paulo. Especialista em Radiologia Diagnóstica e Medicina Nuclear(Associação Brasileira de Física Médica) 2 fármaco. Desta associação nasce um novo composto, denominado radiofármaco. Como este radiofármaco emite radiação ionizante, sua distribuição no interior do corpo pode agora ser identificada através do uso de um sistema de detecção de radiação ionizante. Os procedimentos diagnósticos - em Medicina Nuclear - obedecem à seguinte sequência básica: • Ao paciente é administrado o radiofármaco específico para o estudo de interesse. Essa administração pode ser por ingestão, por injeção ou por inalação, conforme o estudo; • O paciente deve aguardar o tempo necessário até que o radiofármaco seja metabolizado. Este tempo varia conforme o estudo de interesse, podendo ser de algumas horas; • Decorrido o tempo de espera, o paciente é encaminhado à sala de exames onde as áreas de interesse do corpo serão “scaneadas” por um detector de radiação. O sistema mais utilizado é o de gamma câmaras, conforme pode ser visto no capítulo MN-4; • As informações obtidas pelo detector são transmitidas para um poderoso sistema computacional que transforma os sinais obtidos em imagens. Como o sistema de detecção faz uso de detectores de cintilação, as imagens obtidas são usualmente denominadas cintilografias. Apresentamos a seguir algumas imagens ilustrativas: Esta é uma imagem tomográfica de um estudo cerebral. 3 Figura 1: Imagens ilustrativas de exames em Medicina Nuclear Embora a grande maioria dos procedimentos em Medicina Nuclear tenha finalidade diagnóstica, há alguns procedimentos que possuem finalidade terapêutica. Nestes casos o objetivo não é mais a investigação de anomalias funcionais nas regiões metabolizadas pelo radiofármaco, mas sim a ação da própria radiação ionizante emitida pela radiofármaco em um órgão ou região de interesse. Como exemplos destes procedimentos podemos destacar o uso dos radioisótopos Iodo-131, em tratamentos de patologias da tireóide, e do Samário-153 em tratamentos de dores ósseas. Esta é uma imagem de um estudo de captação óssea de corpo inteiro Este é um esquema ilustrativo das imagens obtidas por um sistema PET/CT. As imagens indicadas são do estudo com o sistema CT, do estudo com o sistema PET e a terceira imagem compreende a fusão das duas primeiras. 4 Apresentamos a seguir uma ilustração que mostra alguns radiofármacos, seus respectivos órgãos ou tecidos de estudo e os isótopos radioativos associados. Figura 2: Radiofármacos e respectivos órgãos de estudo. 5 A Figura 3 apresenta alguns dos principais isótopos radioativos utilizados em Medicina Nuclear, com indicação do tipo de emissão (tipo de radiação emitida) e da meia vida física do radioisótopo. Figura 3: Principais radioisótopos utilizados em Medicina Nuclear Isótopo Emissão Meia vida Tc-99m Gama 6 horas I-131 Gama e beta 8 dias Ga-67 Gama 3,26 dias Tl-201 Gama 3,04 dias I-123 Gama 13,2 horas Sm-153 Gama e beta 1,95 dias F-18 Pósitron (gama) 109 minutos 6 2 – RADIOATIVIDADE 2.1. – HISTÓRICO Há mais de cem anos, mais precisamente no final do século XIX, uma brilhante cientista fazia uma importante descoberta, que viria impactar definitivamente a Medicina. Maria Sklodowska, nascida na Polônia, tornar-se-ia mundialmente conhecida após adotar o sobrenome do marido, o físico francês Pierre Curie. Marie Curie ou simplesmente Madame Curie, em parceria com seu marido, estudavam as emissões de um mineral chamado pechblenda. Este mineral, também conhecido como uraninita, tinha a propriedade de emitir os “raios de Becquerel”, assim denominados em referência ao cientista que os estudava à época, Henri Becquerel. O casal Curie isolou quimicamente dois dos elementos constituintes do mineral que emitiam estes raios. A um deles deram o nome de polônio, em homenagem à terra natal de Marie Curie e ao outro deram o nome de rádio. Madame Curie associou a atividade de emissão de raios do elemento químico rádio e cunhou o termo radioatividade. Hoje o termo radioatividade é utilizado para designar as emissões de isótopos radioativos. 2.2. – RADIOISÓTOPOS Para entender o que é um radioisótopo, antes é necessário entender o que é um isótopo e, para esse entendimento por sua vez, é necessário conhecer a estrutura dos átomos. Para efeito dos propósitos das discussões apresentadas aqui, podemos adotar uma versão bastante simplificada da estrutura atômica. Imaginemos o átomo como um sistema em que certos tipos de partículas são arranjadas. O átomo possui uma estrutura central, chamada núcleo, e uma estrutura orbital, chamada eletrosfera. 7Figura 4: Modelo simplificado do átomo O núcleo pode ser composto por dois tipos diferentes de partículas, o próton e o nêutron, que permanecem muito próximos uns dos outros, de tal forma que o núcleo é uma estrutura muito pequena em proporção às dimensões do átomo. Figura 5: Composição do átomo. 8 A eletrosfera é composta por um único tipo de partícula, o elétron. Os elétrons da eletrosfera orbitam o núcleo em estruturas denominadas orbitais ou camadas. De maneira muito similar ao que ocorre no nosso sistema solar, há elétrons que percorrem órbitas mais próximas do núcleo e elétrons que percorrem órbitas mais distantes do núcleo. Estas camadas recebem denominações diferentes, (camadas k, l, m, n, o, p) que indicam estarem mais próximas ou mais afastadas do núcleo. Conhecida a estrutura básica do átomo, é importante conhecer também algumas características que distinguem os diferentes tipos de partículas. Vamos considerar duas importantes características: a massa e a carga elétrica, ou simplesmente carga. A massa das partículas é representada por uma unidade denominada Unidade de Massa Atômica (u.m.a.). Os elétrons são considerados partículas leves e possuem massa igual a 0,000548 u.m.a.. Já os prótons e os nêutrons são considerados partículas pesadas e possuem massa muito próxima, sendo igual a 1,008 u.m.a. para o nêutron e 1,007 u.m.a. para o próton. É importante notar que a massa de um nêutron, ou de um próton é quase duas mil vezes maior do que a massa de um elétron. A carga das partículas é representada por unidades de carga e por um sinal que indica se a carga é negativa ou positiva. Os elétrons possuem uma carga negativa. Os prótons possuem uma carga positiva e os nêutrons possuem carga igual a zero. É importante notar que os átomos normalmente possuem carga total igual a zero. Isto ocorre porque os átomos possuem normalmente o mesmo número de prótons e de elétrons. Cada elemento químico é caracterizado por suas propriedades químicas. Assim, por exemplo, o oxigênio tem características químicas diferentes do carbono, do cálcio, do ouro, do urânio e de qualquer outro elemento químico. Mas os elementos químicos também diferem quanto à constituição atômica. Cada elemento químico é caracterizado pelo número de prótons dentro do núcleo de seus átomos, de tal forma 9 que, se dois átomos possuem um número diferente de prótons no núcleo, implica necessariamente que são elementos químicos diferentes. Tomando o exemplo anterior, temos: • Todo átomo de oxigênio possui 8 prótons no núcleo; • Todo átomo de carbono possui 6 prótons no núcleo; • Todo átomo de cálcio possui 20 prótons no núcleo; • Todo átomo de ouro possui 79 prótons no núcleo; • Todo átomo de urânio possui 92 prótons no núcleo. Esta característica dos elementos químicos é que permite ordená-los na tabela periódica. A este número de prótons dentro do núcleo atribui-se o nome de número atômico. Figura 6: Tabela periódica dos elementos Ocorre que os núcleos dos átomos não são constituídos apenas por prótons. Há também nêutrons dentro dos núcleos. E se os prótons determinam a idêntica química dos átomos, que papel têm os nêutrons? Vamos tomar o elemento químico carbono (C), como exemplo. O carbono é um elemento bastante abundante na natureza. Os átomos do carbono apresentam 6 prótons dentro do núcleo, por isso seu número atômico é 6. Eles também apresentam 6 nêutrons dentro do núcleo. Perceba que a presença de nêutrons dentro do núcleo não interfere na identidade 10 química do átomo, pois ele permanece sendo um átomo de carbono. Mas a presença dos nêutrons altera a massa do núcleo! A massa do núcleo de carbono é aproximadamente igual a 12 u.m.a. (massa de 6 prótons + massa de 6 nêutrons). Então a soma do número de prótons e do número de nêutrons de um núcleo dá uma ideia da massa do núcleo e a este número atribui-se o nome de número de massa. Assim, podemos representar um átomo de carbono pela simbologia 6C12 ou simplesmente C-12. Mas a natureza é misteriosa e nos reserva muitas surpresas!! Além dos átomos de C-12, há na natureza, em quantidade muito menor, átomos de C-14. São igualmente átomos de carbono, pois possuem 6 prótons dentro do núcleo, mas possuem um núcleo com massa maior do que a dos átomos de C-12, pois possuem 2 nêutrons a mais em seu interior. Assim, seus núcleos são constituídos por 6 prótons e 8 nêutrons. A estes átomos, que, embora sejam de um mesmo elemento químico, apresentam um núcleo com massa diferente, chamamos isótopos. Os átomos de C-12 e de C-14 são diferentes isótopos do elemento químico carbono! E as surpresas não param por aí: os átomos de C-14 são radioativos!! Assim como o carbono, os demais elementos químicos também possuem isótopos. Alguns elementos possuem mais de 30 isótopos diferentes, sendo que vários destes isótopos são radioativos. O termo radioisótopo, portanto, refere-se àqueles isótopos que são radioativos. Mas porque um mesmo elemento químico, que tem as mesmas propriedades químicas pode ter isótopos que são radioativos e isótopos não radioativos? 2.3. - INSTABILIDADE NUCLEAR O termo radioatividade pode perfeitamente ser substituído pelo termo instabilidade nuclear. Como o próprio nome indica, trata-se de um processo em que o núcleo está instável. Embora prótons e nêutrons possam ser arranjados de maneira a constituir 11 os núcleos dos átomos, não é qualquer arranjo que é permitido. Dentre os arranjos permitidos há aqueles que geram instabilidade no núcleo, ocasionando um “excesso” de energia no núcleo. Na tentativa de se livrar da energia excedente, o núcleo instável emite radiação, num processo conhecido como desintegração nuclear. Os núcleos instáveis podem emitir radiação de diferentes tipos, seja na forma de partículas, tais como a radiação alfa e a radiação beta, ou na forma de ondas eletromagnéticas, como a radiação gama. A radiação emitida transporta parte ou toda a energia excedente do núcleo, na tentativa de torná-lo estável, entretanto nem sempre o objetivo é alcançado e o núcleo resultante pode não alcançar a estabilidade, continuando radioativo. Os processos de desintegração nuclear alteram o número de prótons do núcleo, levando à transformação do elemento químico original em um novo elemento químico. Como mencionamos anteriormente, os elementos químicos possuem isótopos e uma grande quantidade destes isótopos é radioativa. Mas então isto significa que vivemos cercados por materiais radioativos? Sim e não. Primeiro é necessário saber que, apesar de haver uma infinidade de isótopos radioativos conhecidos, apenas alguns poucos são encontrados na natureza. Então como sabemos que existem os outros se não são encontrados na natureza? Bem... a maioria dos isótopos radioativos conhecidos é produzida artificialmente!! Sendo assim, é verdade que vivemos cercados por materiais radioativos, mas em quantidade muito pequena, pois apenas alguns isótopos radioativos ocorrem naturalmente. Apresentamos a seguir uma lista com alguns isótopos encontrados na natureza: 12 Urânio-238 Rádio-226 Polônio-214 Hidrogênio-3 Rádio228 Tório-234 Radônio-222 Polônio-210 Berílio-10 Tório-228 Urânio-235 Polônio-218 Bismuto-214 Potássio-40 Rádio-224 Urânio-234 Chumbo-214 Bismuto-210 Rubídio-87 Radônio-220 Tório-230 Chumbo-210 Carbono-14 Tório-232 Polônio-216 Figura 7: Isótopos radioativos naturais As doses de radiação recebidas pela população, devidas a estes materiaisradioativos encontrados na natureza, são muito baixas, pois a concentração deles no meio ambiente é muito pequena. Há algumas exceções, entretanto, como no caso de algumas praias em Guarapari, no estado do Espírito Santo. Nestas localidades há uma concentração anormal de isótopos radioativos do Tório nas areias e as doses de radiação das pessoas que habitam próximo a estas praias são superiores à média mundial. Embora os níveis de dose sejam superiores, ainda estão dentro de uma faixa considerada como baixo nível de dose. Há outras concentrações, como no caso do urânio. O U-238 é encontrado normalmente na natureza. Há diversas jazidas de urânio no mundo, algumas delas no Brasil, como as de Caldas em Minas gerais, Lagoa Real na Bahia e Itataia no Ceará. O Brasil possui a 6ª. maior reserva de urânio do mundo. A ilustração a seguir apresenta a série de decaimento do Urânio-238. É importante notar que o U-238, ao emitir radiação na tentativa de atingir a estabilidade nuclear, transforma-se em outro isótopo, o Tório-234, que também é radioativo. Se observarmos atentamente, veremos que no processo de tentativa de atingir a estabilidade, o núcleo instável do U-238 passa por várias transformações, até atingir 13 a estabilidade com o isótopo Chumbo-206. Todos os isótopos radioativos intermediários são radioativos e também são encontrados na natureza. Figura 8: Família de decaimento do U-238 Mas e quanto à maioria dos isótopos radioativos que não são encontrados na natureza? Como são produzidos? Devemos lembrar inicialmente que o que torna um átomo radioativo é a instabilidade em seu núcleo. Assim, para “fabricar” um material radioativo, temos que promover a instabilidade em um núcleo originalmente estável. Isso quer dizer que temos que tomar um material originalmente não radioativo e torná-lo radioativo. Esta é a essência da produção de radioisótopos. Há diferentes técnicas para conseguir induzir a instabilidade em núcleos originalmente estáveis, mas basicamente elas requerem que os átomos alvo (substância não radioativa) sejam “bombardeados” 14 por portadores de energia, que são partículas aceleradas. Os radioisótopos podem ser produzidos pelo bombardeamento com nêutrons em um reator nuclear ou pelo bombardeamento com partículas carregadas, tais como prótons, dêuterons ou partículas alfa, em um acelerador de partículas ou cíclotron. Os radioisótopos utilizados em Medicina Nuclear são produzidos artificialmente. 15 3 - INTERAÇÃO DA RADIAÇÃO IONIZANTE COM A MATÉRIA 3.1. – ENERGIA A radiação é basicamente um transportador de energia e quando se propaga em um meio, pode interagir com os átomos constituintes deste meio. A interação se dá por um processo de transferência de energia da radiação para o meio. Este processo de transferência, por sua vez, varia bastante, podendo ser afetado por inúmeros fatores, tais como o tipo de radiação, sua energia, o tipo e a densidade do meio, dentre outros. Há um fenômeno particularmente importante, que é a propriedade que alguns tipos de radiação têm de “arrancar” elétrons da estrutura dos átomos. Para que um elétron deixe a órbita que ocupa no átomo ele deve receber energia externa em quantidade suficiente. Assim, para que a radiação seja capaz de arrancar um elétron do átomo, deve carregar energia suficiente para que, ao interagir com o átomo, transfira energia em quantidade suficiente para o elétron. Mas não é todo tipo de radiação que transporta energia em quantidade suficiente para promover este fenômeno. Este fenômeno de arrancar elétrons de um átomo é conhecido como ionização. Daí, temos que todo tipo de radiação que transporta energia suficiente para promover ionizações é denominada radiação ionizante. Analogamente, aqueles tipos de radiação que não transportam energia suficiente para promover ionizações são “batizados” de radiações não ionizantes. 16 Figura 9: Esquema do processo de ionização 3.2. - TIPOS DE RADIAÇÃO IONIZANTE Em Medicina Nuclear o interesse está nas radiações ionizantes. Há diferentes tipos de radiação ionizante, cujas diferenças são determinantes na maneira como interagem com a matéria. Todas são capazes de transportar e depositar energia quando interagem. Apresentamos a seguir os principais tipos de radiação ionizante. 3.2.1 – Partículas carregadas Este tipo de radiação ionizante, como o próprio nome sugere, possui massa e carga. Os principais exemplos deste tipo de radiação são a radiação alfa, a radiação beta negativa e a radiação beta positiva ou pósitron. 3.2.1.1 – Partículas alfa (α) A radiação alfa é uma partícula emitida pelo núcleo instável de alguns radioisótopos de número atômico alto. É formada por dois prótons e dois nêutrons. É considerada 17 uma partícula pesada e possui alto poder de provocar ionizações quando interage com o meio. Figura 10: Esquema da emissão de uma partícula alfa Neste processo de emissão, o átomo (X), cujo núcleo instável emite uma partícula alfa, transforma-se em um novo elemento químico (Y), com um número atômico (Z) duas unidades menor e um número de massa (A) quatro unidades menor. ZXA → Z-2YA-4 + α 3.2.1.2 – Partículas beta negativas ou négatrons (β-) A radiação beta negativa (β-) ou négatron é uma partícula emitida pelo núcleo instável de alguns radioisótopos. Possui a mesma carga e a mesma massa de um elétron. É originada a partir de uma reação nuclear em que um nêutron (n) do núcleo transforma-se em um próton (p) mais um elétron, sendo este último ejetado do interior do núcleo, carregando o excedente de energia (E). A equação a seguir ilustra o processo descrito. Este processo é acompanhado pela emissão de uma partícula denominada antineutrino (ν), sem importância para as discussões aqui apresentadas. n → p + β- + ν + E 18 Embora seja um elétron, recebe denominação diferente para designar que sua origem é diferente. Elétrons são originários da eletrosfera e a radiação beta é originada dentro do núcleo. É considerada uma partícula leve e possui pequeno poder de provocar ionizações quando interage com o meio. Figura 11: Esquema da emissão de uma partícula beta Neste processo de emissão, o átomo (X), cujo núcleo instável emite uma partícula beta negativa, transforma-se em um novo elemento químico (Y), com um número atômico (Z) uma unidade maior e um mesmo número de massa (A). ZXA → Z+1YA + β- 3.2.1.2 – Partículas beta positivas ou pósitrons (β+) A radiação beta positiva (β+) ou pósitron é uma partícula emitida pelo núcleo instável de alguns radioisótopos. Possui a mesma massa de um elétron e a mesma quantidade de carga, porém com sinal oposto. É basicamente um elétron positivo. É originada a partir de uma reação nuclear em que um próton (p) do núcleo transforma-se em um nêutron (n) mais um elétron positivo, sendo este último ejetado do interior do núcleo, carregando o excedente de energia (E). A equação a seguir ilustra o processo descrito. Este processo é acompanhado pela emissão de uma 19 partícula denominada neutrino (ν), sem importância para as discussões aqui apresentadas. p → n + β+ + ν + E Embora seja um elétron, recebe denominação diferente para designar que sua origem é diferente. Elétrons são originários da eletrosfera e a radiação beta positiva é originada dentro do núcleo. É considerada uma partícula leve e possui pequeno poder de provocar ionizações quando interage com o meio. Figura12: Esquema da emissão de um pósitron Neste processo de emissão, o átomo (X), cujo núcleo instável emite uma partícula beta positiva, transforma-se em um novo elemento químico (Y), com um número atômico (Z) uma unidade menor e um mesmo número de massa (A). ZXA → Z-1YA + β+ 20 3.2.2 – Partículas não carregadas Este tipo de radiação ionizante, como o próprio nome sugere, possui massa, porém não possui carga. O principal exemplo deste tipo de radiação é o nêutron. Os nêutrons são considerados partículas pesadas e possuem uma capacidade bastante variável de provocar ionizações, conforme a energia que transportam. Os nêutrons são frequentemente “batizados” conforme sua velocidade, podendo usualmente ser denominados nêutrons térmicos, epitérmicos ou rápidos, conforme aumenta o valor da sua energia. São comumente considerados partículas indiretamente ionizantes, visto que as ionizações devidas à interação com os nêutrons ocorrem pela ação de “subprodutos” da interação destes com os átomos do meio, tais como os núcleos de recuo. 3.2.3 – Ondas eletromagnéticas Este tipo de radiação ionizante não possui massa e nem carga. Os principais exemplos deste tipo de radiação são a radiação gama e os raios X. 3.2.3.1 – Radiação gama (γ) A radiação gama é basicamente uma onda eletromagnética emitida pelo núcleo instável de alguns radioisótopos. Não possui carga e nem massa, porém transporta energia e é capaz de provocar ionizações quando interage com os átomos do meio. Possui pequena probabilidade de interação e, consequentemente, um poder muito pequeno de produzir ionizações, razão pela qual é um tipo de radiação bastante penetrante. 21 Figura 13: Esquema da emissão de raios gama 3.2.3.2 – Radiação X Os raios X são basicamente uma onda eletromagnética resultante de processos relacionados à eletrosfera dos átomos. São produzidos por dois fenômenos básicos: pela “desaceleração” de partículas carregadas energéticas ou pela transição de elétrons de camadas eletrônicas mais externas para camadas eletrônicas mais internas. Os primeiros são chamados de raios X de fretamento ou Bremsstrahlung e os últimos de raios X característicos. As demais características dos raios X são idênticas às da radiação gama. Mais detalhes sobre os raios X podem ser obtidos no item sobre produção de raios X, da unidade temática Radiologia Convencional. 22 Figura 14: Esquema de um tubo de raios X Figura 15: Emissão de raios X característicos 23 4 – DETECTORES DE RADIAÇÃO 4.1 - PRINCÍPIOS DE DETECÇÃO Sabemos que o ser humano é incapaz de sentir a presença da radiação ionizante. Isso ocorre porque nosso organismo não possui nenhum sistema de detecção próprio, tais como os sensores de calor e pressão na pele. Para nós a radiação ionizante é invisível, não tem cheiro, não tem gosto, não é audível e nem perceptível ao tato. Como podemos então trabalhar com a radiação ionizante de maneira segura? Como podemos nos certificar que uma determinada fonte é segura ou que não está permitindo o “vazamento” de radiação? O fato de sermos incapazes de sentir a presença da radiação ionizante por conta própria não significa que não podemos fazê-lo de outra forma. Por isso a solução para estes problemas está na utilização de detectores de radiação. Mas como funcionam os detectores de radiação ionizante? Vamos nos lembrar, inicialmente, que a radiação ionizante interage com o meio transferindo energia para ele. Essa transferência de energia se dá, basicamente, por um processo chamado ionização, de onde deriva o nome deste tipo de radiação. E o que é uma ionização? A ionização é o processo pelo qual a radiação ionizante, ao interagir com um átomo do meio, consegue arrancar um elétron orbital deste átomo, produzindo um par de íons. E o que é um íon? 24 Um íon pode ser entendido como um portador de carga elétrica. Isto quer dizer então que a radiação ionizante, quando interage com um meio, produz pares de cargas elétricas. Mas que cargas são essas? Lembremos que um átomo possui carga total igual a zero, pois possui o mesmo número de prótons no núcleo (portadores de carga positiva) e elétrons na eletrosfera (portadores de carga negativa). Quando a radiação ionizante arranca um elétron do átomo, este átomo passa a ter um próton a mais do que o número total de elétrons. Sendo assim este átomo deixa, momentaneamente, de ter carga total igual a zero e passa a ter uma carga positiva. Assim, naquela região do átomo surge um par de portadores de carga elétrica ou um par de íons: o elétron arrancado e o “resto” do átomo. Figura 16: Processo de ionização Mas o que isso tem a ver com os detectores de radiação? Veremos que os sistemas de detecção da radiação ionizante estão justamente baseados no processo de ionização. 25 4.2 - TIPOS DE DETECTORES Embora os sistemas de detecção da radiação ionizante estejam baseados no mesmo processo de ionização, há diferenças entre eles. Estas diferenças estão relacionadas essencialmente com a finalidade da detecção, ou seja, com o que exatamente eu quero obter como resultado do meu processo de detecção da radiação ionizante. Essa finalidade pode variar bastante: posso desejar simplesmente saber se há radiação em um determinado lugar, sem me importar muito com a precisão da medida, posso querer detectar a radiação para “construir” uma imagem diagnóstica, posso querer saber se há contaminação radioativa em um determinado objeto, etc.. Vamos apresentar alguns diferentes tipos de detectores e sistemas de detecção da radiação ionizante, com ênfase àqueles tipos utilizados em Medicina Nuclear. 4.2.1 – CÂMARA DE IONIZAÇÃO Princípio de detecção As câmaras de ionização são sistemas que utilizam meios gasosos como detectores. O sistema consiste basicamente de um recipiente (câmara), construída com material condutor e preenchida por ar, com um eletrodo coletor em seu interior. Quando a radiação ionizante atravessa as paredes da câmara e ioniza os átomos do ar em seu interior, produz pares de cargas. Ao aplicarmos uma diferença de potencial entre as paredes da câmara e o eletrodo coletor, criamos um campo elétrico dentro do volume da câmara. As cargas criadas pelas ionizações ocorridas dentro do volume de ar sofrem a ação deste campo e deslocam-se conforme a polaridade, originando uma corrente elétrica, que pode ser medida. Desta forma, a intensidade da corrente elétrica medida está associada à quantidade de ionizações dentro do volume de ar da câmara, que por sua vez está associada à quantidade de radiação que incidiu naquele volume. 26 Características básicas do sistema de detecção As câmaras de ionização são instrumentos que permitem boa precisão de medidas, entretanto são instrumentos menos sensíveis do que outros tipos de detectores, tais como os diodos ou os contadores Geiger-Muller. São instrumentos destinados principalmente a medidas de feixes de radiação gama ou X e a medidas relacionadas à irradiação. Outras características básicas são: • Detector do tipo gasoso, tipicamente ar. Pode ou não ser pressurizado; • Geometria e dimensões variadas, conforme a aplicação e o tipo de radiação a ser medido. Quanto maior o volume de ar, mais sensível é o sistema; • Tensão típica de operação: de 100 a 300 Volts; Finalidade As câmaras de ionização são bastante utilizadasna área de radiodiagnóstico, para execução de levantamentos radiométricos e na execução de alguns testes de controle de qualidade e de desempenho de equipamentos emissores de raios X. São bastante utilizadas, numa configuração específica denominada detector de poço, em instalações de medicina nuclear, para medir o valor da atividade dos radiofármacos que serão administrados aos pacientes. Estes sistemas de detecção são comumente conhecidos como Curiômetros. 27 Figura 17: Detector de poço. Figura 18: Curiômetro 28 4.2.2 – CONTADORES GEIGER Princípio de detecção Os contadores do tipo Geiger-Muller, mais comumente conhecidos como contadores Geiger são um tipo de câmara de ionização e seu princípio de detecção é o mesmo. São sistemas que utilizam meios gasosos como detectores e consistem basicamente de um recipiente (câmara), construída com material condutor e preenchida por um gás, com um eletrodo coletor em seu interior. Quando a radiação ionizante atravessa as paredes da câmara e ioniza os átomos do gás em seu interior, produz pares de cargas. O gás é pressurizado no interior da câmara, aumentando sua densidade e consequentemente aumentando a probabilidade de ionizações em seu interior. Esta característica torna o contador Geiger significativamente mais sensível do que uma câmara de ionização padrão. Ao aplicarmos uma diferença de potencial suficientemente alta entre as paredes da câmara e o eletrodo coletor, criamos um intenso campo elétrico dentro do volume da câmara. As cargas criadas pelas ionizações ocorridas dentro do volume de gás sofrem a ação deste campo e deslocam-se conforme a polaridade, adquirindo grande energia cinética neste trajeto. A energia adquirida é suficiente para que estes elétrons ionizem outros átomos do gás durante seu percurso. Da mesma forma, os elétrons originados destas novas ionizações também adquirem energia suficiente para ionizar outros átomos do gás. O resultado é o que chamamos de “avalanche” de ionizações, originando uma corrente elétrica relativamente alta, que pode ser facilmente medida. Desta forma, a eletrônica necessária para medir estas correntes mais altas é bastante simples, tornando o contador Geiger um instrumento de menor custo do que a câmara de ionização. Como contrapartida, a intensidade da corrente medida perde sua relação com a quantidade de ionizações originais, ocorridas dentro da câmara, tornando o contador Geiger um instrumento menos preciso do que a câmara de ionização. 29 Características básicas do sistema de detecção Os contadores do tipo Geiger-Muller são instrumentos bastante sensíveis, porém pouco precisos quando comparados com as câmaras de ionização. São instrumentos portáteis, de eletrônica simples e são versáteis. Podem ser confeccionados para medição de vários tipos de radiação, inclusive radiação alfa, com sondas internas ou externas, e para medidas tanto de irradiação quanto de contaminação de superfícies. São instrumentos bastante eficientes para obtenção de informações rápidas e de caráter mais qualitativo, tais como se há ou não radiação em determinado lugar e se há “muita” ou “pouca” radiação. Outras características básicas são: • Detector do tipo gasoso. Utiliza uma mistura de gases pressurizados que aumentam a eficiência de detecção; • Geometria e dimensões variadas, conforme a aplicação e o tipo de radiação a ser medido. Quanto maior o volume de gás, mais sensível é o sistema; • Tensão típica de operação: de 600 a 900 Volts; Finalidade Os contadores do tipo Geiger-Muller são bastante utilizados na área de medicina nuclear, para monitoração de áreas e para investigação de contaminação em superfícies. Também são utilizados em quaisquer instalações que fazem uso de materiais radioativos, tais como instalações de gamagrafia, instalações que utilizam irradiadores, instalações de pesquisa que utilizam radioisótopos, radioterapia, etc.. A utilização deste tipo de detetor não é recomendada para levantamentos radiométricos em radiodiagnóstico ou outras situações em que o tempo de duração do feixe de radiação seja muito curto, pois o sistema pode requerer vários segundos antes de conseguir estabilizar sua leitura. 30 Figura 19: Contadores Geiger-Müller 4.2.3 – DETECTORES DE CINTILAÇÃO Princípio de detecção Os detectores de cintilação, como o próprio nome sugere, estão baseados na propriedade que certas substâncias possuem, de produzir uma cintilação, como resultado da interação com a radiação ionizante. Há certos materiais cuja estrutura se apresenta na forma de uma rede cristalina e que são comumente chamados de cristais. A radiação ionizante, quando interage com estes materiais, pode ceder energia para seus elétrons, promovendo o deslocamento destes dentro da estrutura cristalina. Este processo é denominado excitação. Entretanto, estes elétrons naturalmente tendem a retornar para sua posição original e, neste processo de desexcitação, emitem o excedente de energia adquirido, na forma de luz. Este processo de emissão de luz é denominado cintilação ou luminescência. Desta forma, a quantidade de cintilações emitidas está associada com a quantidade de interações da radiação ionizante com o cristal. Sistemas que permitam medir estas cintilações podem então ser utilizados como sistemas detectores de radiação ionizante. 31 Para medir as cintilações, os sistemas devem fazer uso de dispositivos capazes de detectar essa luz. Estes dispositivos são denominados tubos fotomultiplicadores e são acoplados aos cristais nos sistemas de detecção. A luz detectada pelos fotomultiplicadores é transformada numa corrente elétrica que é amplificada e enviada para o sistema de leitura. Conforme a finalidade do sistema, o resultado pode ser a medida do nível de radiação em um determinado ponto ou mesmo uma imagem de captação de um radiofármaco utilizado em medicina nuclear. As imagens geradas em medicina nuclear, a partir da detecção de cintilações, são comumente chamadas de cintilografias. Características básicas do sistema de detecção Os detectores de cintilação são instrumentos sensíveis e versáteis, utilizados principalmente nos sistemas de obtenção de imagens em medicina nuclear. Outras características básicas são: • Detector do tipo sólido (cristal dopado com impurezas). Os cristais mais utilizados são o Iodeto de Sódio dopado com Tálio (NaI:Tl), o Iodeto de Césio dopado com Tálio (CsI:Tl) e o Germanato de Bismuto (BGO); • Geometria e dimensões variadas, conforme a aplicação e o tipo de radiação a ser medido. Quanto maior a área do cristal, mais sensível é o sistema; • Requerem dispositivos fotomultiplicadores acoplados ao cristal; Finalidade Os cristais podem variar muito quanto à sua composição e tamanho e isso permite criar uma grande variedade de sistemas de detecção, para aplicações e finalidades diferentes. Sistemas de detecção com pequenos cristais podem ser utilizados em instrumentos portáteis, que se assemelham a um contador Geiger, podendo ser utilizados para 32 medidas de levantamento radiométrico ou investigação de contaminações em superfícies, em instalações que fazem uso de materiais radioativos. Os detectores de cintilação são largamente utilizados em medicina nuclear, sendo indispensáveis nos sistemas utilizados para obtenção de imagens. As gamma câmaras são sistemas que empregam grandes cristais e permitem efetuar uma “varredura” sobrea região de interesse do corpo do paciente. São sistemas muito eficientes e precisos, porém requerem uma instrumentação sofisticada e um sistema computacional poderoso para efetuar a reconstrução das imagens, o que torna seu custo bastante elevado. São utilizados também em uma versão mais simples e de custo menos elevado, como instrumentos semiportáteis, para exames de captação de tireóide, por exemplo. Figura 20: Sistema portátil para exames de tireóide 4.2.4 – DETECTORES TERMOLUMINESCENTES Princípio de detecção O princípio básico de detecção dos detectores termoluminescentes é similar àquele dos detectores de cintilação. 33 Alguns materiais cerâmicos apresentam a propriedade de emitir luz após serem expostos à radiação ionizante. A radiação ionizante, quando interage com estes materiais, pode ceder energia para seus elétrons, promovendo o deslocamento destes dentro da estrutura cristalina. Este processo é denominado excitação. Entretanto, estes elétrons naturalmente tendem a retornar para sua posição original e, neste processo de desexcitação, emitem o excedente de energia adquirido, na forma de luz. Este processo de emissão de luz é denominado cintilação ou luminescência. Quando impurezas são introduzidas neste material, estados intermediários de energia são criados, permitindo que os elétrons fiquem “armazenados” neste nível após receberem energia da radiação incidente. Somente após o aquecimento do cristal a certa temperatura, os elétrons “armazenados” adquirem energia suficiente para se libertar do nível intermediário de energia e retornar para o nível original, emitindo luz. Como este é um processo de emissão de luz ou luminescência, que ocorre após o aquecimento, denominamos estes materiais de termoluminescentes (link para filme com demonstração da TL). Desta forma, a quantidade de luminescência emitida está associada com a quantidade de interações da radiação ionizante com o material cerâmico. Sistemas que permitam medir esta luminescência podem então ser utilizados como sistemas detectores de radiação ionizante. Para medir as cintilações, os sistemas devem fazer uso de dispositivos capazes de detectar essa luz. Estes dispositivos são denominados tubos fotomultiplicadores. A luz detectada pelos fotomultiplicadores é transformada numa corrente elétrica que é amplificada e enviada para o sistema de leitura. Características básicas do sistema de detecção Os detectores termoluminescentes são dispositivos sensíveis e têm como principal característica a capacidade de armazenar a informação, até que seja efetuada sua leitura. Outras características básicas são: • Detector do tipo sólido (cristal dopado com impurezas). Os cristais mais utilizados são o Fluoreto de Lítio dopado com Magnésio e Titânio (LiF:Mg,Ti), 34 o Sulfato de Cálcio dopado com Disprósio (CaSO4:Dy) e o Fluoreto de Cálcio (CaF2); • São dispositivos que permitem a reutilização, após efetuada sua leitura e tratamento térmico adequado; • Requerem dispositivos fotomultiplicadores acoplados ao sistema de leitura; Finalidade Os cristais podem variar quanto à sua composição e tamanho e isso permite criar uma grande variedade de sistemas de detecção, para aplicações e finalidades diferentes. A principal finalidade destes detectores é sua utilização como dosímetros pessoais. Os dosímetros TLD (do inglês thermoluminescent dosimeter) têm o formato de pequenas pastilhas e, geralmente, são utilizados num suporte que acomoda várias pastilhas. São utilizados para registrar as doses recebidas por profissionais expostos à radiação ionizante. Outras aplicações dos TLDs são como um meio de datação geológica e arqueológica, no controle de doses derivadas de práticas médicas e na dosimetria de doses altas derivadas de processos industriais. 35 Figura 21: Detectores termoluminescentes de CaSO4:Dy Figura 22: Dosímetro para Monitoração Individual 36 5 – FORMAÇÃO DE IMAGENS Em medicina nuclear utiliza-se radiação gama emitida por radiofármacos que são injetados ou ingeridos para obter imagens fisiológicas de diversos sistemas do organismo. Por ter energia muito mais elevada se comparada à luz visível, torna-se difícil de detectar e mais difícil ainda localizar o ponto de origem da radiação espacialmente. Esta proeza é feita nos dispositivos chamados de câmaras cintilográficas, gama câmaras ou câmaras de cintilação. Consistem de detectores constituídos por cristais especiais que emitem luz visível ou ultravioleta ao serem expostos à radiação ionizante, como os raios gama e raios X. Outros dispositivos como válvulas fotomultiplicadoras ou fotodiodos devem ser acoplados aos cristais para capturar esta luz e convertê-la em eletricidade que será utilizada por sistemas eletrônicos que finalmente produzirão imagens em uma tela de computador. No entanto, uma dificuldade adicional é conhecer a origem do raio gama que foi emitido de uma fonte radioativa, um paciente, por exemplo. Nas gama câmaras, este problema é resolvido utilizando colimadores para escolher a direção dos fótons que poderão atingir o detector. Dessa forma esses equipamentos podem produzir imagens que são projeções planas (bidimensionais) da fonte radioativa. Por outro lado, as projeções planas não contêm todas as informações disponíveis na fonte radioativa assim como um mapa geográfico traduz imperfeitamente a esfera terrestre em um papel plano. Por isso foi inventada a tomografia, que é capaz de descrever a fonte radioativa em três dimensões. Na cintilografia, o método de obtenção da imagem tomográfica chama-se SPECT (do inglês single photon emission computed tomography – tomografia computadorizada de emissão de fóton único), assim como o equipamento capaz desse procedimento também pode ser chamado de SPECT (single photon emission computed tomograph – tomógrafo computadorizado de emissão de fóton único). Diz-se fóton único em SPECT em contraste com tomografia de emissão de pósitrons (PET – positron emission tomography) que utiliza dois fótons para posicionamento 37 do evento radioativo. Esses dois fótons são resultados da aniquilação do pósitron com o elétron nas proximidades da região onde ocorreu a emissão do pósitron. Esses dois fótons são emitidos em direções opostas (aproximadamente 180 graus) de modo que algum ponto de uma linha reta ligando esses fótons encontra-se, com pequena margem de erro, o local de emissão do pósitron. Em PET não é possível a realização de imagens planas devido a esse modo de construção das imagens diretamente tomográfico. CÂMARA DE CINTILAÇÃO A câmara de cintilação, também chamada de gama câmara ou como preferem alguns, câmara à cintilação, consiste principalmente de: 1. Colimador 2. Cristal cintilador 3. Válvulas fotomultiplicadoras 4. Sistema de integração ou soma 5. Analisador multicanal de altura de pulso 6. Sistema posicionamento 7. Computador de aquisição de imagem com monitor de vídeo. Figura 23 - Esquema em corte de uma gama-câmara de campo de visão circular com colimador paralelo. 38 O colimador É a estrutura mais simples da gama câmara e consiste de uma trama metálica, geralmente chumbo ou tungstênio que tem a propriedade de absorver parte da radiação incidente. É definido também por sua altura, tamanho ou abertura dos furos ou septos, largura das paredes dos septos e forma de construção. Esses parâmetros irão determinar a utilização dos colimadores para as várias energias, desdeas baixas como o Tc-99m ou o Tl-201, passando pelo Ga-67 e In-111 até o I-131, entre outros. Também são construídos colimadores para baixa e alta resolução e geometria complexa como os colimadores convergentes, divergentes, monodivergentes, pinhole (orifício único), fanbeam (mono convergente), etc. Figura 24 - Imagem da estrutura de colimadores. À esquerda, estrutura de septo quadrado de paredes espessas (medidas típicas: 2 mm de espessura, 5 cm de profundidade e 3,4 mm de largura), para alta energia. À direta, estrutura hexagonal de paredes muito finas (medidas típicas: 0,16 mm de espessura, 24 mm de profundidade e 1 mm de largura), para energias baixas. Os colimadores são responsáveis por definir o campo de visão da gama câmara e também a sensibilidade à radiação da fonte em estudo. 39 Figura 25 - Ilustração mostrando o campo de visão de alguns tipos de colimadores. Figura 26 - A figura mostra o papel fundamental da colimação na visualização correta de 3 fontes pontuais distintas. À esquerda, a imagem formada sem colimador. À direita, a imagem correta formada após a instalação de um colimador de furos paralelos. 40 Figura 27 - diagrama mostrando a perda de resolução espacial devido ao afastamento de fontes pontuais idênticas em relação à gama-câmara com colimador paralelo. De cima para baixo são mostrados as imagens da fonte, os perfis de contagem (point spread function ou função de dispersão de ponto), corte transversal do cristal com colimador e as linhas de fluxo de radiação proveniente das fontes pontuais. 41 Cristal Cintilador O cristal cintilador tem o papel de converter a energia da radiação gama proveniente da fonte radioativa em luz capaz de ser detectada por um sistema fotossensível. Esse cristal deve ser um bom absorvedor da radiação o que implica em ter alta densidade e também alto número atômico. Essas propriedades garantem uma melhor eficiência de absorção de energia da radiação gama, isto é, conversão completa da energia na maioria dos eventos de interação da radiação com a matéria do cristal. O cristal mais utilizado em câmaras cintilográficas é o Iodeto de Sódio dopado com tálio. Este cristal possui as características descritas acima e também pode ser construído em grandes tamanhos e pequenas espessuras, o que incrementa a capacidade da gama câmara de produzir imagens precisas. Válvulas Fotomultiplicadoras Os tubos ou válvulas fotomultiplicadoras (conhecidas como PMT do inglês photomultiplier tubes) são os dispositivos que irão captar a luz das cintilações provenientes da interação da radiação gama com o cristal cintilador. Esses tubos são fotossensíveis, ou seja, são capazes de detectar luz. A luz penetra pela entrada óptica das PMTs onde está o fotocatodo que é uma camada de material sensível à luz. Esse fotocatodo emite os chamados fotoelétrons proporcionalmente à quantidade de luz que recebe. Esses elétrons são então atraídos para o interior da PMT por campos elétricos da ordem de várias centenas de volts e se chocam com uma sequencia de vários dinodos, dispositivos que também emitem vários elétrons quando são bombardeados por elétrons. No final do percurso por dentro da PMT o resultado é uma pequena corrente elétrica que é proporcional à quantidade de fótons de luz que penetraram a PMT. Essa corrente chega a um circuito elétrico que amplifica a corrente elétrica que poderá então ser utilizada nos circuitos eletrônicos que irão tratar a informação contida 42 nesse processo, ou seja, a detecção da radiação gama cuja energia é proporcional a corrente elétrica que sai da PMT. Figura 28 - esquema de uma fotomultiplicadora absorvendo a luz do cristal, emitindo fotoelétron e multiplicando esses elétrons nos dinodos criando um pulso elétrico na saída (anodo). Figura 29 - imagem real de uma PMT de uma gama-câmara. (HCFMUSP) 43 Circuito De Soma Este circuito se encarrega de integrar todos os sinais provindos das PMTs para obter o valor total Z da cintilação ocorrida. Este valor é proporcional à energia do fóton gama que causou a cintilação. Este dado é utilizado para corrigir os valores de X e Y do circuito de posicionamento de modo que estes dados sejam independentes da energia. O Z é enviado também ao analisador de altura de pulso. Analisador De Altura De Pulso O analisador de altura de pulso é um sistema de circuitos elétricos que irão tratar os pulsos Z provenientes do circuito soma e selecionar cada um de acordo com sua intensidade, ou seja, sua voltagem que é proporcional à energia da radiação gama que está sendo detectada. O resultado é o espectro da radiação que é constituído por picos fotoelétricos (fotopicos), espalhamento Compton e outros efeitos. Outra capacidade importante do analisador de altura de pulsos é discriminar as diversas energias comparando-as com uma ou mais faixas de valores chamadas janelas de energia que podem ser estabelecidas para se escolher quais serão utilizados na formação da imagem final. 44 Figura 30 – Gráfico de contagem por canal, com duas janelas de energia. Circuito De Posicionamento O circuito de posicionamento é um sistema que utiliza as informações de posição das PMTs juntamente com os pulsos elétricos de cada uma para localizar espacialmente quais PMTs foram “iluminadas” pelo evento de cintilação. Como cada cintilação é capaz de iluminar várias ou até todas as PMTs, o circuito é capaz de estimar com bastante precisão o local da cintilação baseando-se na intensidade que cada PMT entrega ao circuito, ou seja, PMTs mais próximas do evento dão pulsos maiores e PMTs mais distantes dão pulsos menores. Utilizando uma aritmética relativamente simples o circuito é capaz de localizar a cintilação com um erro de poucos milímetros. Essa técnica é devida ao cientista Hal Anger, que desenvolveu a primeira câmara de cintilação e ainda é a base dos equipamentos que conhecemos hoje. Janelas de energia 45 Figura 31 - Esquema do circuito elétrico de um sistema de formação de imagem e uma gama-câmara convencional. Sistema De Gravação De Imagens Os sistemas atuais de aquisição de imagens são os computadores que utilizam sinais digitais para processar as informações. No entanto, alguns sistemas mais 46 antigos ainda trabalham com telas fluorescentes para visualizar ou gravar filmes da distribuição da radiação fornecida pela câmara cintilográfica. Os sinais enviados pela gama câmara podem ser analógicos ou digitais. Para que um computador trabalhe com equipamentos analógicos é preciso acoplar um dispositivo chamado de conversor analógico-digital. Como o próprio nome diz esse dispositivo converte os sinais analógicos, como voltagens variadas provenientes dos sinais X, Y e Z em sinais digitais, ou seja, sequencias de códigos binários, zeros e uns, que representam os mesmos sinais X, Y e Z. Os equipamentos mais modernos convertem o sinal analógico (corrente elétrica) em sinal digital já na saída das PMTs, durante a fase de pré-amplificação e, portanto, daí para frente, todos dos circuitos podem ser digitais. Isto significa miniaturização, menor gasto de energia além de maior precisão e controle dos diversos sistemas que compõe a câmara de cintilação. Imagens Planas As câmaras de cintilação são dispositivos capazes de obter imagens planas de um objeto ou paciente radioativo o que significa projetar uma imagem realtridimensional (3D) em um plano (2D), algo como os mapas geográficos (2D) que representam o globo (3D) terrestre. Existem diversos tipos de estudos planos em medicina nuclear. Estes estudos podem ser classificados em estáticos, dinâmicos, dinâmicos sincronizados com ECG, varreduras de corpo inteiro. Estáticos São estudos realizados com aquisição de imagens de uma ou mais regiões durante certo período de tempo ou quantidade de contagem até obter uma imagem com informação suficiente para se analisada. Representam aqueles instantes da distribuição do material radiativo naquelas regiões. Exemplos desta técnica: cintilografia renal com DMSA, cintilografia da tireoide, cintilografia do fígado e baço, cintilografia óssea, cintilografia testicular, cintilografia mamária. 47 Figura 32 - Imagens de projeções planas de um estudo de cintilografia óssea. Dinâmicos São estudos da distribuição radioativa ao longo de certo tempo. Além da informação espacial (posição) também é levado em conta o momento em que foram obtidas. São basicamente filmes animados da região em estudo que avaliam a dinâmica da distribuição do material radioativo. É basicamente uma sequência de imagens estáticas, cada uma delas obtidas na sequencia da anterior e com um tempo definido e por um intervalo de tempo. Exemplos desta técnica: cintilografia renal dinâmica com DTPA, esvaziamento gástrico, fluxo ósseo, fluxo cerebral, cintilografia hepática com DISIDA. Dinâmicos sincronizados com ECG São estudos do ciclo cardíaco cujos sinais eletrocardiográficos são sincronizados com a gama-câmara de modo a obter uma certa quantidade definida de imagens do ciclo, cada uma sempre na mesma fase. O resultado é um filme animado dos batimentos cardíacos. Exemplo desta técnica é o exame de ventriculografia. 48 Figura 33 - Esquema do pulso elétrico cardíaco, imagens de cintilografia do ventrículo com ECG na diástole e na sístole e gráfico da variação de volume do ventrículo esquerdo. Varreduras de corpo inteiro Apesar dos campos de visão das gama-câmaras serem menores que o corpo humano como um todo, é possível obter imagens do corpo inteiro através de algumas técnicas. Uma delas é realizar imagens estáticas de cada parte do corpo em sequencia e depois juntá-las em uma matriz maior formando uma imagem única do corpo inteiro. Outra técnica consiste em movimentar o detector ou a mesa de exame em velocidade constante de modo a obter a imagem do corpo inteiro ao final do comprimento do paciente. Exemplos: cintilografia óssea, pesquisa de corpo inteiro com Gálio-67, pesquisa de corpo inteiro com Iodo-131, Linfocintilografia de membros inferiores. Parâmetros De Aquisição De Imagem Existem diversos parâmetros de controle da aquisição da imagem em cintilografia. Os mais comuns são: • Tempo de aquisição da projeção • Quantidade de contagem 49 • Ângulo de projeção • Tamanho de matriz • Profundidade de pixel (Byte VS Word) • Campo de visão (magnificação da imagem ou zoom – tamanho do pixel) • Tipo de colimador (baixa, média ou alta energia; alta resolução, alta sensibilidade, propósito geral, monodivergentes, monoconvergentes (fanbeam) entre outros). • Quantidade de imagens por ciclo cardíaco • Quantidade de imagens (dinâmico) • Velocidade de varredura • Modo de gravação da imagem (Frame mode VS list mode) A escolha dos parâmetros varia de acordo com o órgão ou sistema a ser estudado, do radiofármaco e radioisótopo utilizado, da fisiopatologia estudada. Imagem Tomográfica Para obter-se uma representação mais verossímil da distribuição da radiação em um corpo ou objeto, é possível, a partir das distribuições projetadas nos planos cintilográficos em diversos ângulos, construir imagens 3D chamadas imagens tomográficas. Em medicina nuclear chamamos esta técnica de SPECT do inglês single photon emission computed tomography ou tomografia computadorizada por emissão de fóton único. O termo “fóton único” é utilizado em oposição à técnica tomográfica por emissão de pósitrons que veremos mais à frente, que utiliza dois fótons para descrever o local da emissão. O termo “emissão” é usado em oposição à técnica utilizada na tomografia por raios-x chamada de transmissão, pois os fótons de raios-x são transmitidos - ou atravessam o objeto ou o corpo - provindos de uma fonte externa, e atingem um detector, do outro lado do corpo, enquanto no SPECT a fonte de emissão da radiação é o próprio objeto ou corpo em estudo. 50 A imagem tomográfica é obtida por reconstrução das imagens planas utilizando métodos como a retroprojeção filtrada (FBP) ou os métodos iterativos como o OSEM ou MLEM. A FBP é um método muito utilizado pela facilidade e velocidade de processamento, mas produz ruído na imagem. Os métodos iterativos são mais lentos e de difícil processamento, mas produzem imagens melhores e podem conter informações de correção baseados nas características físicas, por exemplo, do colimador e do detector. Com o advento de computadores mais rápidos, os métodos iterativos estão mais difundidos atualmente. Os principais parâmetros para aquisição de SPECT são: • Número de projeções ou ângulo entre projeções • Tempo por projeção ou quantidade de contagem da primeira projeção • Ângulo inicial • Ângulo entre detectores (para equipamento multidetectores) • Tamanho de matriz • Profundidade de pixel (Byte VS Word) • Campo de visão (magnificação da imagem ou zoom – tamanho do pixel) • Tipo de colimador (baixa, média ou alta energia; alta resolução, alta sensibilidade, propósito geral, monodivergentes, monoconvergentes (fanbeam) entre outros). • Quantidade de imagens por ciclo cardíaco • Modo de amostragem angular: contínuo ou por passo (step and shoot) • Modo de gravação da imagem (frame mode VS list mode) • Quantidade de passos da maca (para SPECT de corpo inteiro) 51 Figura 34 - Imagens tomográficas nos três planos: transversal ou axial (duas linha de cima), sagital (duas linhas no centro) e coronal (duas linhas de baixo). 52 A TOMOGRAFIA POR EMISSÃO DE PÓSITRONS - PET A tomografia por emissão de pósitrons é uma técnica de imagem que utiliza dois fótons originários do fenômeno físico da aniquilação pósitron-elétron ocorrida nas proximidades do radiofármaco marcado com um nuclídeo emissor de pósitrons, como o Flúor-18, o Carbono-11 ou o Germânio-68. Esses dois fótons são emitidos em direções opostas, praticamente a 180° entre eles. Portanto, é necessário um par de detectores posicionados em oposição para que possam detectar esses dois fótons e um sistema muito especial para avaliar se dois fótons detectados são originários de um mesmo ponto. Esse sistema é chamado de detector de coincidência, ou seja, registra um evento de aniquilação quando dois detectores são atingidos pelos fótons de aniquilação ao mesmo tempo. Na prática, a coincidência significa verificar que a diferença de tempo que os dois fótons chegam aos detectores é de alguns nanosegundos. Os princípios de funcionamento desses detectores são basicamente os mesmos da câmara de cintilação. São usados cristais cintiladores e PMTs. No entanto, a energia dos fótons de aniquilação é muito mais elevada do que a energia dos fótons emitidos pelos isótopos utilizados na medicina convencional. Todas as aniquilações pósitron- elétron emitem dois fótons com energias iguais a 511 keV. Para ser eficiente na detecção dessa energia é preciso utilizar cristais mais densose com maior número atômico se comparado com o tradicional NaI(Tl). Os cristais mais utilizados atualmente são o BGO, o LSO ou LYSO e outros. 53 Figura 35 - Esquema que mostra e emissão de um pósitron (beta+) por um núcleo que encontra um elétron (beta-) após alguns milímetros com energia suficiente para sofrerem aniquilação, desaparecendo e formando dois fótons com energias 511 keV cada um emitidos em direções opostas, cerca de 180°. Parâmetro / cristal NaI(Tl) BGO LSO Número atômico efetivo 51 74 66 Densidade (g/cm3) 3,67 7,13 7,4 Tempo de decaimento (ns) 230 300 40 Eficiência luminosa relativa ao NaI(Tl) 1 0,15 0,75 Figura 36 - Tabela com características físicas importantes para cristais cintiladores para PET comparados com o NaI(Tl). 54 Bloco Detector Ao contrário da maioria da gama-câmaras, os cristais para PET são pixelados, isto é, são pequenos cristais cortados em um cristal maior que formam blocos detectores com 10x10, 9x16, 8x8, etc. cristais acoplados a 2 ou 4 PMTs. Cada bloco possui seu próprio sistema eletrônico de posicionamento dos eventos de detecção. Os equipamentos para imagem médica de PET consistem basicamente de vários desses blocos detectores formando anéis cujo interior gera o campo de visão radial do equipamento. Vários desses anéis acoplados formam um cilindro que então geram o campo de visão axial. Figura 37 - Esquema do bloco detector com o cristal cortado em pequenos pedaços e quatro PMTs acopladas (à direita) e de quatro anéis de blocos detectores formando o conjunto detector de um tomógrafo PET. Circuito De Coincidência O componente eletrônico mais importante do PET é o circuito de coincidência que avalia se dois pósitrons detectados por dois detectores em oposição no anel de detectores são originários do mesmo fenômeno de aniquilação. Isto é necessário porque podem ocorrer coincidências devido a eventos ocorridos em outras regiões 55 do objeto ou corpo emissor da radiação. O circuito dispõe de temporizadores que criam uma janela temporal, de cerca de alguns nanosegundos entre dois fótons subsequentes, na qual se admite que houve coincidência de eventos e então é criada a chamada linha de resposta na qual está, em algum ponto não conhecido, o local onde ocorreu o decaimento radioativo. Podem ocorrer três tipos de coincidências nas duplas de detectores do PET: • Verdadeiras, cujos fótons foram emitidos por um único evento de aniquilação. • Espalhadas, cujos fótons foram emitidos pelo mesmo evento, mas chegaram aos detectores após ter sido espalhado e, portanto em uma direção diferente, induzindo ao erro de localização. • Aleatórias, cujos dois fótons em coincidência são provenientes de dois locais diferentes de aniquilação. Figura 38 - Formas de detecção em coincidência que ocorrem em um tomógrafo PET. Da esquerda para a direita, a coincidência verdadeira, a espalhada e a aleatória. Nas duas últimas, a detecção em coincidência é representada pela linha pontilhada. 56 MODOS DE AQUISIÇÃO: 2D x 3D Os primeiros equipamentos PET foram projetados para aquisição com certa colimação axial para o fim de reduzir a radiação espalhada e eventos aleatórios produzidos nas regiões do corpo que estavam fora do campo de visão. No entanto, isso também reduz muito as possibilidades de coincidências verdadeiras que são então barradas em parte pelos septos que são em geral feitos de tungstênio. Figura 39 - esquema em corte dos modos de aquisição PET. À esquerda, com a presença de septos, a aquisição em modo 2D reduz as possibilidades de coincidência fora de certo angulo restrito. À direita, aquisição em modo 3D, sem septos, que então aumenta as chances de ocorrer coincidências em outros ângulos, inclusive originárias de regiões fora do campo de visão, o que pode prejudicar a imagem final. Retirando-se esses septos o sistema pode aproveitar um maior número de coincidências que ocorrem em toda a extensão campo de visão aumentando a quantidade de informação útil disponível. No entanto, aumenta muito a ocorrência de coincidências aleatórias e espalhadas, informação que prejudica a imagem final. Torna-se então necessário realizar correções na imagem para retirar a contribuição desses eventos espalhados e aleatórios para que o aumento de informação devido ao modo 3D não seja anulado pelo ruído na imagem produzido por esses eventos. CORREÇÃO NAS IMAGENS Além das correções que foram mencionadas acima, de espalhamento e de aleatórios, é preciso corrigir também a atenuação dos fótons no corpo, o decaimento do isótopo utilizado, o tempo-morto e realizar a normalização dos detectores. Essas 57 correções podem ser feitas automaticamente ou podem ser desligadas ou selecionadas uma a uma, dependendo do fabricante. A correção de atenuação é, em geral, feita utilizando-se um mapa de transmissão que pode ser feito com uma fonte externa de radiação, como uma vareta de Ge-68 (emissor de pósitrons) que gira em torno do paciente ou por raios-x de um tomógrafo acoplado se tratando de um sistema PET-CT. A correção de decaimento é muito importante no caso do uso de radioisótopos de meia-vida muito curta que é o caso do FDG F-18 e da maioria dos radiofármacos utilizados para PET. É a correção mais fácil de ser implementada, pois a meia-vida é bem conhecida e o tempo de aquisição também fica registrado no sistema. A correção de tempo-morto é, também, muito importante, devido à alta taxa de contagem a que ficam expostos os detectores de PET, principalmente em modo 3D. Esse valor é proporcional à taxa de contagem e ao tipo de detector e geometria do equipamento. QUANTIFICAÇÃO Com as correções descritas acima podemos calibrar o PET para nos dar uma boa aproximação da quantidade de radiação, em MBq ou mCi por unidade de volume. Essa calibração fornece um fator definido como Contagens por pixel /Bq/cm3 Obtida em um cilindro de dimensões conhecidas e preenchido homogeneamente com uma atividade conhecida de F-18 ou Ge-68. Essa calibração funciona bem para estruturas maiores que 1 mm ou cerca de 2 vezes a resolução espacial do PET. Abaixo desses valores ocorre um efeito chamado de volume parcial que produz uma diluição da atividade contida nas pequenas regiões dando uma informação de contagens por pixel menores que o real. 58 Figura 40 - Quantificação de uma região de interesse (ROI, do inglês Region Of Interest) - círculo vermelho – em um corte do plano tomográfico coronal, mostrando valores médios e máximos em Bq/mL (mL=cm3) e número de pixels da ROI. Outro valor atualmente muito utilizado é o Valor Padronizado de Captação ou SUV (do inglês Standardized uptake value) que faz uma correlação dos valores vistos no parágrafo anterior com a massa em quilogramas do paciente ou objeto em estudo. Este valor ainda é objeto de muita discussão quanto à sua reprodutibilidade, mas é amplamente utilizado para acompanhamento da captação do radiofármaco em regiões bem definidas, como metástases, ao longo do tempo de acompanhamento dos pacientes oncológicos. pacientes oncológicos. Figura 41 - Quantificação do SUV de uma lesão circular captante de FDG F-18 no mediastino de um paciente medido com ROIs nos três planos tomográficos, mostrando valores de SUV médios, mínimos e máximos, desvio padrão e área da ROI. 59 O PET/CT O PET/CT é um equipamento híbrido que é constituído de dois equipamentos distintos eindependentes, mas conectados entre si e com apenas uma maca de exame capaz de ser posicionada nos dois pórticos. Um programa de computador fornece a possibilidade de visualizar as duas imagens separadamente e também em superposição chamada de fusão, utilizando escalas de cores diferentes e com algum nível de transparência. Desse modo podem-se avaliar as imagens da distribuição fisiológica do radiofármaco de PET nos órgãos visualizados nas imagens de CT. Isso ajuda o médico a interpretar as imagens e permite que o tempo de exame de PET seja diminuído, mesmo com alguma perda de qualidade da imagem. Figura 42 - Imagens de PET (acima à esquerda), CT (acima à direita) e da fusão (abaixo, com escala de cores modificada para a PET) mostrando a superposição da imagem de concentração de radiofármaco na bexiga alinhando-se perfeitamente na imagem de bexiga da CT. (FMUSP HC ICESP) 60 Figura 43 - Gráficos mostrando tempos médios de aquisição para uma extensão de aproximadamente 70 cm do corpo para equipamentos PET com três cristais diferentes e também do PET/CT com cristal LSO. As barras vermelhas representam a variação de mínimo e máximo. (SIEMENS HEALTH CARE) 6 – CONTROLE DE QUALIDADE O programa de controle de qualidade dos equipamentos de medição e de formação de imagens faz parte de um programa maior chamado de Programa de Garantia de Qualidade. Este programa envolve todos os esforços possíveis para garantir os melhores resultados para o processo de detecção da radiação que resultará na melhor imagem possível. Se pensarmos que a qualidade final também depende dos processos do agendamento de exames, da marcação de radiofármacos, da proteção radiológica, da manutenção dos equipamentos, etc. estamos falando de um Sistema de Qualidade que deve ser estabelecido nos serviços de Medicina Nuclear. A Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu da seguinte forma os objetivos de um programa de garantia da qualidade na Medicina Nuclear: 1. Melhorar a qualidade do diagnóstico. 2. Utilização da mínima quantidade de radiofármaco para produção do diagnóstico desejado. 61 3. Uso efetivo dos recursos disponíveis. Nesta seção trataremos apenas dos procedimentos de controle de qualidade dos instrumentos comumente encontrados nos serviços de Medicina Nuclear. O controle de qualidade tem como objetivo manter uma vigilância sobre o comportamento desses instrumentos para que forneçam dados e imagens sempre confiáveis. Esse programa inclui diversos processos como: • As especificações de compra e instalação do equipamento. • Testes de aceitação e referência. • Testes rotineiros. • Verificações diárias ou operacionais. • Ajustes e calibrações • Manutenção preventiva. • Registros. Alguns desses procedimentos podem ser realizados pelos operadores desses equipamentos que devem ser qualificados para manipulação de materiais radioativos e procedimentos em medicina nuclear. Boa parte desses procedimentos, aqueles de frequência diária, semanal ou até mensal, podem ou devem ser realizados pelo técnico ou técnica em radiologia que opera o equipamento. Alguns testes ou calibrações de menor frequência, mensais, trimestrais, semestrais ou anuais devem ser realizados por pessoas qualificadas em física médica aplicada à medicina nuclear e por pessoal técnico do fabricante. Nos parágrafos que se seguem serão descritos alguns dos testes de rotina recomendados para os principais equipamentos dos serviços de medicina nuclear e aqueles obrigatórios por força da legislação federal (ANVISA – Agencia Nacional de Vigilância Sanitária e CNEN – Comissão Nacional de Energia Nuclear). Em geral, alguns desses testes ou calibrações são recomendados pelo próprio fabricante do equipamento e a realização de tais procedimentos pode ficar a cargo do operador, que é orientado pelos manuais, por treinamento fornecido pelo fabricante e pelos responsáveis pelo controle de qualidade. Os operadores devem 62 ser habilitados a realizar os testes operacionais e procedimentos mais rotineiros e avaliar o resultado para tomada de ações quanto à rotina subsequente. No entanto, a responsabilidade pela adequação, organização, treinamento e análise de resultados deve ficar a cargo do supervisor de radioproteção ou outro profissional treinado em física médica que também poderá ser responsável pela realização dos procedimentos de maior complexidade. Manuais em língua portuguesa e procedimentos de trabalho devem estar disponíveis em local de fácil acesso, próximo ao instrumento ou equipamento. Em algumas organizações que dispõe de sistemas de gestão da qualidade, o gestor da qualidade também deve ser envolvido na avaliação dos procedimentos e resultados do programa de controle de qualidade. Fluxogramas parecidos com o mostrado na figura seguinte devem ser criados para cada procedimento de avaliação dos instrumentos e equipamentos de trabalho e as ações em caso de não conformidade devem ser claras. Os operadores dos equipamentos devem ser treinados para responder à questão “OK?” da caixa de decisão (losango) do fluxograma assim como à questão “A CORREÇÃO PODE SER FEITA LOCALMENTE?”, para corrigir o problema ou encaminhar para a pessoa ou setor responsável. 63 Figura 44 - Fluxograma de decisão para os resultados do controle de qualidade de um equipamento. Critérios para avaliação dos resultados dos testes Os valores obtidos nos testes devem ser melhores ou superiores ao valor definido pelo fabricante ou pelos resultados dos testes de referência. Os testes de referência são realizados no mesmo momento dos testes de aceitação e visam - como o próprio termo indica - obter valores iniciais para comparação com os testes periódicos de controle de qualidade. Em geral, valores discrepantes até 5% podem ser tolerados, mas devem ser confirmados, ou seja, repetidos. Cada teste pode ter sua tolerância própria ou 64 podem-se aplicar fatores de correção baseados na discrepância encontrada e então seguir com a rotina. Uma boa prática é disponibilizar os valores ou faixa de valores aceitáveis na ficha de preenchimento dos procedimentos para que o executante possa avaliar, no momento da realização dos testes, se os resultados são aceitáveis. A conduta a ser seguida em caso de não conformidades deve ser bem conhecida pelos operadores dos equipamentos e disponibilizada em manual de procedimentos localizado próximo ao equipamento em questão. Registros Todos os esforços feitos para garantir a qualidade do nosso sistema podem ser perdidos se não houver um livro ou outro sistema de registro dos dados e procedimentos para cada equipamento ou processo de controle de qualidade. Nesses documentos devem constar tudo o que for relevante para que se possa conhecer a história do equipamento deste sua instalação até sua eventual desativação. Isto inclui os testes de aceitação, calibrações, testes de rotina, ajustes, manutenção preventiva, defeitos, etc. Esses documentos precisam ser preenchidos, datados e assinados por todos que utilizam o equipamento e, dentro de um período determinado, seus dados e informações devem ser avaliados por um responsável. CALIBRADORES DE DOSE OU MEDIDORES DE ATIVIDADE TESTES DIÁRIOS (VERIFICAÇÕES DE ROTINA) Resposta de radiação de fundo (background) Conceito Avaliar a contribuição da radiação de fundo ou eventual contaminação radioativa no instrumento, na medida da atividade de uma fonte. Esse valor deve ser subtraído das
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