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ARTEFATOS CULTURAIS DO POVO SURDO-Janaína Aguiar Peixoto e Maysa Ramos Vieira

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Sumário 
 
 
2 
Sumário 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Alessandra Almeida Lima 
Conceição de Maria Saúde 
Edneia de Oliveira Alves 
Elizete Olinto Ferreira 
Ezequiel Adney Lima da Paixão 
Fabrício Possebon 
Fernanda Gabriela Gadelha Romero 
Francisco Rádger Ramalho 
Gerson Ramalho Junior 
Gildete da Silva Amorim Mendes Francisco 
Josimere de Souza Araújo Ramalho 
Larissa Domingues da Silva 
Lígio Josias Gomes de Sousa 
Magno Prado Gama Prates 
Marie Gorett Dantas de Assis e M. Batista 
Maysa ramos Vieira 
Millena Seventh da Costa Ramalho 
Nemuel Gonçalves de Lima 
Robson de Lima Peixoto 
 
 
Sal da Terra Editora 
João Pessoa 
2018 
 
ARTEFATOS CULTURAIS DO POVO SURDO: 
DISCUSSÕES E REFLEXÕES 
 Organizadoras: 
Janaína Aguiar Peixoto e Maysa Ramos Vieira 
3 
Sumário 
©Copyright 2018 by Janaina Aguiar Peixoto, Maysa Ramos Vieira. 
 
 
 
 
CONSELHO EDITORIAL 
Hermano de França Rodrigues 
Jairo Rangel Targino – UNIPÊ 
Manoel Matusalém Sousa - FAEST/ FADIMAB-PE 
Marinalva Freire da Silva UFPB/FADIMAB-PE 
 
 
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) 
_______________________________________________________________________________________________ 
 
A786 Artefatos culturais do povo surdo: discussões e reflexões. 
 
 Janaína Aguiar Peixoto, Maysa Ramos Vieira (Organizadoras). – João Pessoa : Sal da Terra, 2018 
 
206 p. 
 
ISBN 978-85-8043-708-9 
 
1. Surdo - Cultura. 2. Estudos culturais. I. Título. 
 
 CDU 376.353.008 
___________________________________________________________________________________________________ 
 
Não é permitida a reprodução parcial ou integral desta publicação, 
por qualquer meio, sem a prévia autorização escrita dos organizadores. 
 
 
 
 
Sal da Terra 
CNPJ 02.240.413/0001-79 
(83) 999882337 (TIM) / 98870-1550 (OI - também whatSapp) 
E mail:graficasaldaterra@hotmail.com 
 
4 
Sumário 
 
Sumário 
PREFÁCIO .............................................................................................................................................................. 5 
1 - O OLHAR DOS SURDOS SOBRE A SUA PRÓPRIA CULTURA .............................................................. 8 
Maysa Ramos Vieira / Janaína Aguiar Peixoto 
2 - EVIDÊNCIAS DA CULTURA SURDA NA OBRA SWITCHED AT BIRTH .......................................... 19 
Lígio Josias Gomes de Sousa / Janaína Aguiar Peixoto 
3 - MERGULHANDO NA CULTURA SURDA, UMA VIVÊNCIA DE MUNDO BASEADA EM 
EXPERIÊNCIAS VISUAIS .................................................................................................................................. 32 
Janaína Aguiar Peixoto / Lígio Josias Gomes de Sousa / Maysa Ramos Vieira / Robson de Lima Peixoto 
4 - LIBRAS EM SUAS MODALIDADES: ARTEFATO LINGUÍSTICO DA COMUNIDADE SURDA .... 47 
Ezequiel Adney Lima da Paixão / Edneia de Oliveira Alves 
5 - UMA DINÂMICA FAMILIAR DIFERENCIADA ....................................................................................... 61 
Gildete da Silva Amorim Mendes Francisco 
6 - A HETEROGENEIDADE NAS PRODUÇÕES LITERÁRIAS DA COMUNIDADE SURDA 
BRASILEIRA ........................................................................................................................................................ 77 
Janaína Aguiar Peixoto / Fabrício Possebon 
7 - A PRODUÇÃO DE FÁBULAS EM LIBRAS ................................................................................................ 89 
Robson de Lima Peixoto / Fabrício Possebon 
8 - PRODUÇÕES CULTURAIS NOS ESPAÇOS SURDOS ........................................................................... 102 
Francisco Rádger Ramalho / Gerson Ramalho Júnior / Josimere de Souza Araújo Ramalho / Millena Seventh da 
Costa Ramalho 
9 - A BELEZA DE UM MUNDO VISUAL ....................................................................................................... 116 
Alessandra Almeida Lima / Janaína Aguiar Peixoto 
10 - A MOVIMENTAÇÃO POLÍTICA DA COMUNIDADE SURDA BRASILEIRA EM DEFESA DE 
ESCOLAS BILINGUES PARA SURDOS ........................................................................................................ 130 
Elizete Olinto Ferreira / Janaína Aguiar Peixoto 
11 - O DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICOS NA COMUNIDADE SURDA .......................................... 144 
Larissa Domingues da Silva / Janaína Aguiar Peixoto 
12 - A COMUNIDADE SURDA E A POLITICA: AVANÇOS NA BAHIA .................................................. 155 
Magno Prado Gama Prates / Janaína Aguiar Peixoto 
13 - O DESENVOLVIMENTO DE PRODUTOS QUE GERAM ACESSIBILIDADE PARA SURDOS: 
ARTEFATOS CULTURAIS MATERIAIS ...................................................................................................... 167 
Conceição de Maria Saúde / Marie Gorett Dantas de Assis e M. Batista 
14 -ATIVE LIBRAS: CRIAÇÃO DE ARTEFATO MATERIAL NA ERA DIGITAL ................................ 179 
Nemuel Gonçalves de Lima / Fernanda Gabriela Gadelha Romero 
15 - O 9º ARTEFATO CULTURAL: RELIGIOSO ......................................................................................... 190 
Janaína Aguiar Peixoto / Fabrício Possebon 
 
5 
Sumário 
PREFÁCIO 
 
É um prazer prefaciar o livro “Artefatos Culturais do Povo Surdo – Discussões e Reflexões”, 
lançado no momento propício, acompanhando os rumos em que as Políticas Surdas uniram suas 
forças para fortalecer a valorização da Língua de Sinais e da cultura surda nos diferentes espaços no 
Brasil e no mundo. 
A Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, signatária da 
Organização das Nações Unidas (ONU), nas recomendações da UNESCO, em 1984, no 
reconhecimento formal da Língua de Sinais e identidade cultural dos surdos, assegura aos surdos o 
direito de manterem a sua alteridade cultural: 
Art. 24 - Os Estados membros devem garantir que: “o aprendizado da língua de sinais e 
promoção da identidade linguística da comunidade surda” “a educação de pessoas, em particular 
crianças cegas, surdocegas e surdas, seja ministrada nas línguas e nos modos e meios de 
comunicação mais adequados ao indivíduo e em ambientes que favoreçam ao máximo seu 
desenvolvimento acadêmico e social”. 
Art. 30 – Determina “que sua [dos surdos] identidade cultural e linguística específica sejam 
reconhecida e apoiada, incluindo as línguas de sinais e a cultura surda”. 
De acordo com estas declarações da ONU, abriram-se, caminhos para o reconhecimento das 
políticas linguístico-culturais vivenciadas em nossas comunidades surdas, assim, empoderam-se, 
reconfiguram-se, reterritorializam-se, ganham novas e movediças fronteiras, tendo valorização da 
cultura surda e da língua de sinais como uma afirmação identitária. 
Nos campos de Estudos Culturais, entendemos que o sujeito surdo não mais é um sujeito 
puro, não possui mais uma essência, mas é um sujeito híbrido, entrecruzado por diversas culturas, 
diferentes discursos e formas de ser, que se constitui por meio das relações que estabelece com uma 
ou mais culturas, e por meio dos artefatos culturais os quais fazem parte dessa cultura. 
Mas, qual é o conceito de cultura? Há vários conceitos produzidos em diversos aspectos, 
dependendo do que cada um admite sobre o que é cultura. A Cultura, através da perspectiva dos 
Estudos Culturais, é entendida como “uma ferramenta de transmissão, de percepção da forma de ver 
6 
Sumário 
diferente, não mais de homogeneidade, mas de vida social constituída de modos de ser, de 
compreender e de explicar” (STROBEL, 2008, p.18). 
O livro écomposto por vários capítulos, escritos por diferentes autores, que procuram instigar 
a reflexão a respeito dos artefatos culturais do povo surdo. 
Quando se vai pensar em escrever um prefácio, vem um sentimento muito nobre pensando 
nos olhares dos leitores que aqui passarão para ler nas linhas bem traçadas do:   olhar dos surdos 
sobre a sua própria cultura – Maysa Ramos e seguir nas evidências da cultura surda na obra do 
seriado Switched at Birth– Lígio Josias. Cada palavra nova vai fazer você romper seus pensamentos 
com uma vivência de mundo baseada em experiências visuais – Janaína, Lígio, Maysa e Robson. 
São as entrelinhas que te levarão se apaixonar pela tão falada, a visualidade da língua de sinais na 
modalidade escrita – Edneia e Ezequiel. E, no passo a passo de sua leitura você vai se encontrar 
com   uma dinâmica familiar diferenciada – estudo de casos – Gildete Amorim e sobre a 
heterogeneidade na produção literária dos sujeitos surdos – Janaína Peixoto, a produção de fábulas 
em Libras – Robson Peixoto. Ninguém vai te deixar na mão quando você se deparar com as 
Produções culturais nos espaços surdos – Gerson, Millena, Francisco e Josimery e a beleza de um 
mundo visual – Alessandra e Janaína. Folheando mais um pouco você encontra sobre a luta da 
comunidade surda por escolas bilíngues – Elizete Olinto,  em desenvolvimento de políticos na 
comunidade surda brasileira – Larissa Domingues. Com a sua percepção aguçada você vai entrar 
nas letras sobre a comunidade surda e a política: avanços na Bahia – Magno Prates,  um jovem 
brilhante e atuante no que podemos dizer ser líder, ser jovem e ser surdo. No momento em que você 
pensa já estar no final, o livro te traz novos saberes com o desenvolvimento de produtos que geram 
acessibilidade para surdos – Marie Gorett e Conceição e o ATIV LIBRAS – Nemuel e Fernanda. E 
encerrando,  o leitor encontrará o 9º artefato cultural (religioso), proposto por Janaina Peixoto. 
A leitura dos capítulos que integram este livro levará o leitor a repensar o lugar do sujeito 
surdo na sociedade brasileira: a perceber na visão da pós-modernidade os diferentes artefatos 
culturais. Mais uma obra que recoloca os Surdos no curso da nossa história, mas que também 
mostra a atualidade destas sociedades e suas perspectivas de futuro. Recomendo que ele seja lido e 
discutido amplamente. 
 
7 
Sumário 
Assim leitores, sintam-se abraçados por mim e esses maravilhosos autores de ARTEFATOS 
CULTURAIS DO POVO SURDO – Discussões e Reflexões. 
 
 
Dra. Karin Strobel 
Docente da Universidade Federal de Santa Catarina 
Autora do livro: As Imagens do outro sobre a cultura surda 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
Sumário 
1 - O OLHAR DOS SURDOS SOBRE A SUA PRÓPRIA CULTURA 
Maysa Ramos Vieira
1
 
Janaína Aguiar Peixoto
2
 
 
INTRODUÇÃO 
 
Quando paramos para refletir historicamente sobre a vida social do homem, percebemos que 
nunca houve uma homogeneidade. Em todas as civilizações antigas existiam grupos minoritários, 
hierarquias, segregações impostas por diversos fatores que tornam as pessoas diferentes entre si. 
Diferenças geográficas, econômica, política, entre outras, fazem com que pequenos grupos de 
costumes e interesses semelhantes se unam. Assim, também foi para o povo surdo. 
O conhecimento do termo “cultura” e seu(s) significado(s) influenciam na visão de mundo 
que o sujeito tem. Citando Perlin (2004, p.75), 
 
Segundo Hall, (1997, p.20): “A cultura que temos determina uma forma de ver, de 
interpelar, de ser, de explicar, de compreender o mundo” Então a cultura é agora 
uma das ferramentas de mudança, de percepção de forma nova, não mais 
homogeneidade, mas de vida pessoal, constitutiva de jeitos de ser, de fazer, de 
compreender, de explicar. 
 
O termo "conceito" tem origem no Latim “conceptus” (do verbo "concipere") que significa 
"coisa concebida" ou "formada na mente". E o conceito de cultura é uma discussão de pelo menos 
100 anos e que aparentemente ainda não encerrou. 
Muitos teóricos veem nesse tema uma ampla gama de abordagens e discussões. Tendo como 
um dos teóricos mais abordados nesse tema e, por conseguinte, nesse trabalho, o Stuart Hall. O 
mesmo fez da sua vida acadêmica um campo de estudo sobre a cultura, citando Hall (2003, p.43): 
 
 
1
 Professora do Departamento de Línguas de Sinais – DLS/CCHLA/UFPB, Especialista em Libras, Licenciada em 
Química pelo IFPB. Atuou como Tradutora e Intérprete de Língua de Sinais do quadro efetivo da UFPB. 
2
 Professora do Departamento de Línguas de Sinais – DLS/CCHLA/UFPB e no Programa de Pós Graduação em Letras 
(PPGL/UFPB), Doutora em Letras (PPGL/UFPB), Mestre em Ciências das Religiões (PPGCR/UFPB), Fonoaudióloga 
(FRASCE-RJ), possui Formação de Tradutora e Intérprete de Libras (UFF). 
9 
Sumário 
A cultura é uma produção. Tem sua matéria-prima, seus recursos, seu 
“trabalho produtivo”. Depende de um conhecimento da tradição enquanto 
“o mesmo em mutação” e de um conjunto efetivo de genealogias. Mas o que 
esse “desvio através de seus passados” faz é nos capacitar, através da 
cultura, a nos produzir a nós mesmos de novo, como novos tipos de sujeitos. 
Portanto, não é uma questão do que as tradições fazem de nós, mas daquilo 
que nós fazemos das nossas tradições. Paradoxalmente, nossas identidades 
culturais, em qualquer forma acabada, estão à nossa frente. Estamos sempre 
em processo de formação cultural. A cultura não é uma questão de 
ontologia, de ser, mas de se tornar. 
 
“A cultura não é uma questão de ser, mas de se tornar”, essa frase citanda por Hall, nos faz 
perceber que o conceito que temos de cultura influencia na nossa própria identidade cultural, não de 
forma acabada, mas em construção, em formação. 
Uma vez que, a cultura se faz por um processo contínuo, resultado de uma interação entre os 
sujeitos, vemos que a cultura de um determinado povo parte de cada um para então ser de um todo, 
pois cada ser é peça fundamental para a sua construção. 
Os estudos na área da cultura têm mostrado sua importância na formação do indivíduo, e de 
acordo com Culler: 
 
“[...] o projeto dos Estudos Culturais é compreender o funcionamento da cultura, 
particularmente no mundo moderno: como as produções culturais operam e como 
as identidades culturais são construídas e organizadas, para indivíduos e grupos, 
num mundo de comunidades diversas e misturadas [...]” (1999, p.49). 
 
E para os surdos existe uma cultura diferenciada? O que na verdade significa a cultura 
surda? Termo este tão sinalizado
3
 e discutido nessa comunidade. O que sustenta essa teoria de que 
há uma cultura surda? 
 
3
 Sinalizado ou o ato de sinalizar: Termo usado em substituição a palavra “falar”, ou seja, fazendo referência a 
utilização da Língua de Sinais como meio de comunicação entre usuários da mesma língua e/ou conhecedores desta. 
 
10 
Sumário 
 Os surdos constituem um grupo minoritário e as culturas minoritárias convivem com os 
indicadores da cultura considerada dominante, seguindo um padrão normalizador que esta cultura 
almeja. 
 Em uma mesma sociedade há várias culturas, e não há uma maior ou menor, nem tão pouco 
uma melhor e outra pior, existe o multiculturalismo. E a cultura surda tem uma perspectiva 
multicultural. 
 Partilhamos com Hall do conceito de cultura, quando costumamos dizer que a cultura é do 
povo, os seus costumes, sua comida, seu modo de vestir e falar, suas crenças, ou seja, as suas 
práticas em sociedade. Traços da cultura surda são manifestos nolocal que habitam ou em locais de 
encontros com outros surdos, no seu convívio diário. Kotter e Heskett (1994, p. 4) diz que cultura é 
“a totalidade de padrões de comportamento, artes, crenças, instituições e todos os outros produtos 
do trabalho e do pensamento humano característicos de uma comunidade ou população, 
transmitidos socialmente”. 
Fundamentando-se no multiculturalismo é que a cultura surda se baseia, uma vez que, um 
surdo brasileiro irá conviver com a cultura brasileira, e visto que, o surdo faz parte deste povo, 
porém, vivencia o mundo na sua condição de cidadão bicultural e bilíngue como integrante também 
do povo surdo, compartilhando lutas e histórias. Wrigley diz algo que nos faz refletir: “Surdez é um 
país sem um ‘lugar’ próprio. É uma cidadania sem uma origem geográfica” (1996, p.11). 
 
Cultura surda é o jeito de o sujeito surdo entender o mundo e de modificá-lo a fim 
de se torná-lo acessível e habitável ajustando-os com as suas percepções visuais, 
que contribuem para a definição das identidades surdas e das ‘almas’ das 
comunidades surdas. Isto significa que abrange a língua, as idéias, as crenças, os 
costumes e os hábitos de povo surdo. (STROBEL, 2008, p.22) 
 
Cultura, segundo Padden e Humphries (2000, p.5): 
 
[...] uma cultura é um conjunto de comportamentos apreendidos de um grupo de 
pessoas que possuem sua própria língua, valores, regras de comportamento e 
tradições; uma comunidade é um sistema social geral, no qual um grupo de pessoas 
vivem juntas, compartilham metas comuns e partilham certas responsabilidades 
umas com as outras. 
11 
Sumário 
Isto nos conduz a reflexão de que há alguns anos, ao assistir palestras sobre a cultura surda, 
o público deparava-se com explicações vagas inconsistentes, simplistas e equivocadas. Havia quem 
reduzia a definição da cultura surda a apenas exemplos sobre produções materiais como TDD 
(telefone para surdos) e campainhas luminosas; e outros, que equivocadamente em apostilas de 
cursos de Libras ou oficinas, diziam que comer fazendo barulho, ou arrastar o pé ao caminhar fazia 
parte da cultura surda. 
Com base nesta realidade, consideramos o livro As imagens do outro sobre a cultura surda 
(2008) da autora surda Karin Strobel, um divisor de águas. Nele, as produções dos sujeitos surdos 
enquanto comunidade minoritária vai além de produções materiais e até mesmo de algo apenas 
físico. A autora apresenta de forma esclarecedora uma importante contribuição ao apresentar oito 
artefatos culturais do povo surdo de forma simples e exemplificada, sendo eles: Experiência Visual, 
Linguístico, Familiar, Literatura Surda, Vida Social e Esportiva, Artes Visuais, Política e Materiais. 
 Sendo assim, buscando entender a visão atual que os surdos têm da sua cultura, oito 
voluntários participaram da pesquisa em João Pessoa, em que entrevistas foram realizadas com cada 
um separadamente na primeira parte do estudo, e posteriormente, em um segundo momento, uma 
palestra sobre a Cultura Surda foi realizada como forma de estimular o pensamento dos 
participantes e promover discussões sobre a temática. 
 
SINALIZANDO SOBRE SUA PRÓPRIA CULTURA 
 
As questões iniciais da entrevista tratavam das causas de sua surdez, quando começou 
aprender libras e outros pontos introdutórios, a partir da quarta pergunta o tema cultura surda 
começou a ser discutida. Inicialmente queríamos saber se esse tema já tinha sido trabalhado em 
alguma fase da sua vida escolar. 
Apenas o surdo D alega ter aprendido um pouco, quando estudou em uma escola especial 
composta apenas por surdos, mas como teve que se mudar, esse aprendizado foi interrompido. Os 
demais nunca tiveram contato com essa temática nas escolas regulares. O surdo O relatou: 
12 
Sumário 
 “Na escola eu aprendi pouco, os professores me ensinaram pouco. Quando tinha 
intérprete, o mesmo não tinha fluência em LIBRAS e fui desenvolvendo num processo bem 
demorado e isso foi muito ruim para mim.” 
Na quinta questão, eles foram indagados quanto ao interesse em realizar pesquisas com o 
tema da cultura surda e se já de fato pesquisaram. E o único que relatou já ter pesquisado foi o 
surdo A, que disse: 
“Já estudei esse tema no curso de Licenciatura em Letras LIBRAS que atualmente faço 
parte, e também participei de congressos e debates que tratavam a cultura surda como tema 
principal e assim pude perceber a existência de uma cultura na qual faço parte, mas que antes 
desconhecia.” 
As duas últimas questões possui uma relação. A penúltima pergunta foi quanto ao 
conhecimento dos artefatos culturais do povo surdo. Os surdos O, L, S e D não souberam conceituar 
e nem tanto exemplificar os artefatos. Já os participantes N, G, A e E descreveram alguns exemplos 
de artefatos do povo surdo. 
De acordo com N e E, artefatos da cultura surda são: festas, a vibração do som nas boates, 
estar em comunidades, palestras de divulgação da LIBRAS, teatro e etc. Para o participante G, 
artefato cultural é apenas a Língua de Sinais mas não soube relacionar a LIBRAS com os demais 
componentes culturais. De acordo com A: 
“Quanto aos artefatos culturais do povo surdo há muito que falar. Por exemplo: a 
campainha luminosa, a percepção visual, o uso de mensagens de texto via celular (no modo 
vibratório), a preferência por organizar a sala de aula em formato de U para facilitar a 
visualização e etc”. 
De todos os participantes da entrevista, apenas três (A, D e N) estão cursando ou já se 
formaram em um curso de Ensino Superior. Desses três, apenas dois (A e N) souberam discorrer a 
respeito da cultura surda e seus artefatos. 
Porém, percebemos que o surdo A conseguiu desenvolver suas respostas de maneira 
coerente com a literatura apresentada, demonstrando conhecer bem o tema em estudo. E o mesmo 
relatou ter estudado essa temática durante o curso Letras LIBRAS. 
13 
Sumário 
Em um segundo momento, uma palestra sobre a cultura surda foi realizada como forma de 
estimular o pensamento dos participantes e iniciar as discussões que levariam ao tema da palestra, 
foram realizadas quatro perguntas inicialmente. Possibilitando aos alunos refletir e expressar 
opiniões em cada questão ali apresentada. Foram elas: 1. Por que existe uma cultura surda? 2. O que 
é cultura surda? 3. Qual a diferença entre povo surdo e comunidade surda? 4. Exemplifique algo 
que é próprio da cultura surda. 
 A palestra foi realizada para um grupo de alunos matriculados no curso de Licenciatura 
Plena em Letras LIBRAS oferecida pela UFPB Virtual, dos que estavam presentes, apenas um 
também participou da primeira etapa da pesquisa, a entrevista. Como forma de manter reservada a 
imagem desses discentes participantes, as respostas foram organizadas por números. 
 Em presença das questões feitas durante toda a palestra, os alunos iam um de cada vez à 
frente para expor suas opiniões e dúvidas, compartilhando assim com todos os presentes. Algumas 
das respostas foram: 
Palestrante: Existe cultura surda? 
 
Surdo 1: Sim. Existe em vários lugares e aqui no Brasil também. Existe uma cultura surda e 
identidade e isso faz a pessoa surda se desenvolver. 
 
Diferente do que foram percebidos na maior parte das respostas disponibilizadas na 
entrevista, os surdos que estão cursando Letras LIBRAS afirmam existir a cultura surda e associa à 
cultura a Língua de Sinais como podem ver nos relatos a seguir. 
Palestrante: Porque não é só uma cultura, a do Brasil? O que é cultura surda? 
 Surdo 2: Por que os surdos possuem outra língua, a Língua de Sinais, fazendo uso das 
expressões faciais e corporais; com costumes e interesses diferentes, como por exemplo: encontros 
nas associações de surdos. 
 Surdo 3:A cultura surda vem da luta pelos direitos da pessoa surda, as leis e suas 
propostas. A forma de comunicação diferente, as tecnologias adaptadas, os esportes. 
14 
Sumário 
Concordando com Padden e Humphires (2000, p. n5) “[...] uma cultura é um conjunto de 
comportamentos apreendidos de um grupo de pessoas que possuem sua própria língua, valores, 
regras de comportamento e tradições; [...]”. 
Palestrante: E qual a diferença entre comunidade e povo surdo? 
Surdo 3: Comunidades surdas são pequenos grupos com mesmos costumes que através da 
convivência formou-se uma cultura; 
Surdo 4: Povo surdo é o Brasil como um todo, mas as comunidades surdas estão nas 
associações, os encontros esportivos, atividades como as do evento Miss Surda, etc. 
A resposta do surdo 4, quanto ao povo surdo, tem uma certa incoerência, pois cita o Brasil 
como povo surdo, sendo este um exemplo de comunidade surda, porém, em sua sinalização, o 
mesmo faz o sinal de Brasil seguido do sinal de “mundo”, “o todo”, ou seja, fazendo referência 
corretamente aos surdos espalhados pelo Brasil a fora, e em todo o mundo. 
Até esse momento da palestra, os surdos discutiram bastante quanto ao significado de 
cultura e sempre fazendo referência a cultura surda como sendo algo que está atrelado a uma língua 
diferente que a do país em que são nativos e por isso possuem uma cultura diferente, a cultura 
surda. 
Durante a discussão do tema “comunidades surdas”, foram abordados também questões 
como a variação regional de cada comunidade local, levando em consideração a diferença que 
existe com alguns sinais e seus significados, da mesma forma que há nas línguas orais, mas o que 
não impossibilita a comunicação com pessoas do mesmo país, porém de regiões diferentes. 
 As comunidades surdas espalhadas por todo o país são bem quistas pelos seus pares. Como 
pode ser percebido pela resposta do surdo 2: “As comunidades surdas são bem desenvolvidas, 
possuem tecnologias, utilizam da língua de sinais, etc. tem a mente aberta”. 
E a última das quatro questões apresentadas inicialmente, gerou a discussão mais longa. Pois 
tratavam dos artefatos culturais presentes na cultura surda. 
Palestrante: Exemplifique algo que é específico da cultura surda. 
15 
Sumário 
Muitas das respostas que foram ditas pelos participantes se relacionam com mais de um 
grupo de artefatos, pois estão ligados entre si. Como o artefato “Linguístico”, que é fundamental 
para a cultura surda, a Língua de Sinais, que é a marca do povo surdo. E este artefato está 
diretamente ligado a “Experiência Visual”, uma vez que é a forma que o surdo tem de ver o mundo 
e se comunicar (artefato linguístico). E essa relação foi percebida nas respostas, por exemplo: 
“Namorados ou amigos quem em um restaurante sentam um de frente para o outro”. 
Vendo de maneira isolada e fora de um contexto, talvez essa frase não fosse entendida como 
um artefato cultural de um povo. Mas quando pensamos que os “namorados ou amigos” são pessoas 
surdas e precisam estar um de frente para outro para que a conversa seja possível, uma vez que, 
utilizam a língua de sinais (artefato linguístico) e sendo assim, está de frente facilita o entendimento 
do que está sendo dito, pois é através da visão (experiência visual) que se pode entender a 
mensagem. 
O que acontece também na fala de um surdo: “Namorados não andam de mãos dadas, pois 
precisam delas para conversar, bem como, andam um de frente para o outro e em certos momentos 
parando”. 
Outro artefato citado pelos discentes presentes na palestra, e que une o artefato da 
experiência visual e o linguístico é: “Ao invés de orar de mãos dadas, unem-se os pés. Pois, 
precisam das mãos para orar, sendo assim, juntas os pés para se sentirem próximos”. Além deste 
fato elencado nesse contexto religioso, em reuniões religiosas, quando todos fecham os olhos para 
um momento de oração, os surdos em sua maioria permanecem de olhos abertos, pois precisam 
olhar para o intérprete e assim entender o que está sendo dito. 
A experiência visual está muito presente na vida das pessoas com surdez, e outra situação 
vivenciada através deste artefato, listada pelos discentes foi: “Para chamar um surdo que esteja a 
certa distância deve-se acenar”, e “para chamar a atenção de um grupo de surdos reunidos em um 
mesmo local é preciso apagar e acender as luzes do ambiente rapidamente”. 
Outro artefato que os participantes demonstraram conhecer bem é “Materiais”, que tem por 
objetivo auxiliar a vida das pessoas com surdez, são instrumentos adaptados e/ou criados para este 
fim. Foram listados alguns desses materiais, como por exemplo: 
Campainhas luminosas, mensagens de texto através de celulares e estes utilizados no modo 
silencioso, aplicativos de mensagens como WhatsApp, que permitem conversas particulares e em 
16 
Sumário 
grupos que possuem o mesmo aplicativo em seus celulares, podendo compartilhar vídeos, fotos, 
etc., conversas através de recursos visuais como Web Cam, onde os surdos podem se comunicar 
através da Língua de Sinais, e-mail, legendas disponibilizadas na televisão, babá eletrônica que 
envia mensagens para os telefones dos pais informando que o bebê está chorando, e muitos outros 
materiais utilizados no cotidiano das pessoas surdas. 
Uma ferramenta tecnológica que se enquadra no grupo dos artefatos culturais Materiais é: 
Chamada de vídeo, porém o mesmo está relacionado com os artefatos Experiência Visual e 
Linguístico, pois com as chamadas em vídeos é possível conversar através da língua de sinais e os 
mesmos podem se ver. 
Mais um artefato cultural lembrado pelo grupo presente na palestra foi: Vida social e 
Esportiva sendo este associado a encontros nas associações de surdos, querer estar em comunidade 
com seus iguais, campeonatos de diversos esportes entre grupos de surdos, entre outros. 
Literatura Visual ou Literatura Surda é mais um artefato que os surdos demonstraram 
conhecer, como por exemplo: poesias, poemas, piadas, teatro, etc. 
 O artefato político foi citado através das leis, dos projetos e pela Federação Nacional de 
Educação de Surdos – FENEIS, que luta pelos direito da pessoa surda. 
Durante a apresentação dos artefatos e suas características, houve também uma pequena 
discussão levantada por um dos participantes presentes no Seminário, sobre ser algo da cultura 
surda que acontece pelo fato de não ouvir e assim fazer barulhos, ou ser considerado como falta de 
educação, por exemplo: Andar arrastando os pés e comer com a boca aberta (principalmente em 
famílias que são todos surdos). Porém os próprios colegas ali presentes responderam a esses 
questionamentos, com argumentos como: 
“É considerado artefato aquilo que está atrelado à cultura e a sua língua, bem como, seu 
modo ser e viver”. Sendo assim, todos entenderam que esses dois últimos exemplos não 
correspondem a características que se denominam artefatos culturais. 
Como relata STROBEL (2008, p.37): “[...] o conceito “artefatos” não se referem apenas a 
materialismos culturais, mas àquilo que na cultura constitui produções do sujeito que tem seu 
próprio modo de ser, ver, entender e transformar o mundo”. 
17 
Sumário 
 O que se pôde perceber no proceder do seminário é que aqueles alunos que estão 
matriculados em semestres mais a frente dos demais traziam o conceito de “cultura surda” bem 
formada. E diante das discussões geradas pelos discentes (o que demonstrou interesse por parte do 
grupo presente em esclarecer o que até então para alguns, era apenas um conhecimento oriundo do 
senso comum), os próprios alunos que já dominavam o tema eram quem respondiam as questões 
que iam surgindo, sendo apenas mediado pela ministrante. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAISDiante do que foi visto e relatado pelos participantes surdos no presente estudo, à cultura 
surda, seu conceito e as particularidades a ela associadas, ainda não é um tema de conhecimento 
compartilhado por todos, porém, já constatamos uma mudança diferenciada na atualidade 
decorrente ao desenvolvimento acadêmico evidente em uma parcela privilegiada da comunidade 
surda. 
Neste sentido, foi possível observar que na primeira parte do projeto (a entrevista) os surdos 
que possuem o nível de escolaridade do ensino médio ou ainda estão para concluir, ainda não 
possuem o domínio de conhecimento quanto à cultura surda, bem como os seus artefatos. Dos oito 
participantes, dois estão cursando o ensino superior e apenas um já possui uma graduação. Destes, 
apenas um é aluno do Letras LIBRAS e que por consequência, este é o que apresenta maior 
propriedade em falar do assunto que foi abordado. E de acordo com o mesmo, o tema “cultura 
surda” é ao longo do curso abordado em diversas disciplinas. 
E diante do exposto no segundo momento da pesquisa (a palestra), todos os presentes eram 
alunos do Letras LIBRAS, porém de semestres variados. Todavia, foi notório o interesse de todos 
por este tema, mesmo por parte daqueles que já o estudaram no transcorrer do curso. E estes alegam 
que, conhecer a cultura do seu povo, os seus costumes, o que os diferem dos ouvintes e os artefatos 
que comprovam e enriquecem a cultura surda, faz que se tenha uma visão de mundo diferenciada. 
Afastando cada vez mais a marca de um ser “deficiente”, “limitado", trazendo para si, e em 
consequência, para a sociedade a imagem de um povo com história e valor e que tem muito que 
acrescentar para a história do Brasil, um país naturalmente multicultural. 
18 
Sumário 
REFERÊNCIAS 
CULLER, Jonathan. Teoria Literária: uma introdução. Tradução de Sandra Vasconcellos. São 
Paulo: Beca Produções Culturais Ltda, 1999. 
HALL, Stuart. Da Diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2003; 
________. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais do nosso tempo. 
Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 22, nº 2, p.15-46, jul./dez. 1997. 
 
KOTTER, J. P.; HESKETT, J. L. A cultura corporativa e o desempenho empresarial. São Paulo: 
Makron Books, 1994. 
PADDEN, Carol; HUMPHRIES, Tom. Deaf in américa: voices from a culture. Cambridge: Harvard 
university Press, 2000. 
PERLIN, Gladis. Identidades Surdas, in Carlos Skliar (org). A surdez: um olhar sobre as diferenças. 
Porto Alegre: Mediação, 51 – 73. 2001 
STROBEL, Karin Lilian. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis: Editora UFSC, 
2008a. 
WRIGLEY, O. The Politics of Deafness. Gallaudet University Press. Washington, D.C., 1996. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
19 
Sumário 
2 - EVIDÊNCIAS DA CULTURA SURDA NA OBRA SWITCHED AT BIRTH 
 
Lígio Josias Gomes de Sousa
4
 
Janaina Aguiar Peixoto
5
 
INTRODUÇÃO 
 
 
O presente capítulo tem o intuito de apresentar uma pesquisa que consistiu em uma análise 
das produções (artefatos) culturais dos sujeitos surdos presentes no seriado americano chamado 
Switched at Birth, corroborando com os fundamentos teóricos apresentados pela pesquisadora surda 
Karin Strobel (2008), relacionando a ficção com a realidade. 
A primeira etapa do estudo constituiu em assistir todos os 93 episódios da série distribuídos 
em quatro temporadas para que um fosse eleito como objeto do estudo. Após a escolha do episódio 
09 da 2ª temporada de aproximadamente 42 minutos intitulado de "UPRISING", a pesquisa partiu 
para o desafio de identificar os oito artefatos culturais do povo surdo presentes nesta produção 
cinematográfica. À medida que sendo encontrados, as discussões foram traçadas fazendo um 
paralelo entre a ficção e o real. 
A pretensão deste estudo foi evidenciar como a cultura surda e os seus artefatos foram bem 
trabalhados durante o seriado, que através do entretenimento valorizou o povo surdo sua língua, 
crenças e valores. Para tanto, à obra como um todo é um artefato de Artes Visuais (produção 
fílmica) de grande relevância para as comunidades surdas espalhadas em diversos países, ou seja, o 
Povo Surdo que não possui demarcação territorial, porém baseiam sua construção de mundo em 
vivências visuais, possuindo assim, uma cultura surda compartilhada entre as gerações. 
Switched at Birth é um seriado americano criado por Lizzy Weiss e transmitido também no 
Brasil, teve início dia 06 de junho de 2011, já conta com 04 temporadas que somam 93 episódios e 
 
4
 Professor do Departamento de Línguas de Sinais – DLS/CCHLA/UFPB. Atualmente cursando Pós-Graduação em 
LIBRAS. Possui Licenciatura plena em Letras com habilitação em Libras pela UFPB e Técnico em Eletrotécnica pelo 
IFPB. 
5
 Professora do Departamento de Línguas de Sinais – DLS/CCHLA/UFPB e no Programa de Pós Graduação em Letras 
(PPGL/UFPB), Doutora em Letras (PPGL/UFPB) e no Programa de Pós Graduação em Letras (PPGL/UFPB), Mestre 
em Ciências das Religiões (PPGCR/UFPB), Fonoaudióloga (FRASCE-RJ), Tradutora e Intérprete de Libras (UFF). 
20 
Sumário 
tem como elenco principal: Katie Leclerc (surda), Vanessa Marano, Constance Marie, D.W. Moffet, 
Lea Thompson, Sean Berdy (surdo) e Lucas Grabeel
6
, dentre vários atores coadjuvantes surdos. 
 O enredo conta a história de duas meninas que foram trocadas ao nascer e viveram por 
muitos anos separados de suas famílias biológicas. E a partir do momento que descobriram o erro 
do hospital decidiram tentar recuperar o tempo perdido e assim, morar o mais próximo possível. A 
série conta com um pouco de drama, comédia e romance. A família Kennish é composta por: Bay 
Kennish (Vanessa Marano) uma artista que luta pelo reconhecimento dos seus pais de criação; 
Kathryn Kennish – a mãe (Lea Thompson) vive uma dona-de-casa que se preocupa com a sua boa 
fama entre os vizinhos e a alta sociedade na qual convive e John Kennish – o pai (D. W. Moffet) um 
jogador de beisebol aposentado. O irmão de criação, Toby (Lucas Grabeel) é músico. O sucesso na 
carreira esportiva de John é o que o faz ter muito dinheiro, deixando a família Kennish morando na 
vizinhança rica da cidade. Já a família Vasquez é composta por: Daphne Vasquez (Katie Leclerc) 
que é surda (devido à meningite, quando criança), e estuda em um colégio especial para surdos; sua 
mãe Regina (Constance Marie) que atua como cabeleireira e que teve um passado problemático por 
conta do vício em álcool; e a avó. A família Vasquez mora em uma vizinhança hispânica da cidade, 
até o momento que as meninas descobrem a troca e decidem morar juntas. Apesar de certas 
divergências, as famílias vão tentando se acertar e conviver, para que as mães conheçam as filhas 
biológicas.
7
 
Existem outras obras que retratam a temática surdez e que atores surdos atuam como nos 
longas-metragens: Adorável Professor; E Seu Nome é Jonas; Os Filhos do Silêncio (que rendeu um 
prêmio óscar de melhor atriz para Marlee Matlin que é surda); O Milagre de Anne Sullivan; e o 
mais recente, Família Bélier (2014). Alguns seriados também já fizeram uso do tema surdez em 
alguns episódios como, por exemplo: CSI, episódio 13 da temporada 11 no qual a atriz surda 
Phyllis Frelich contracena. Porém, nenhum desses relatou de modo tão abrangente o mundo dos 
surdos e os diversos temas a ele associados. Isto deve-se principalmente pelo seu formato de seriado 
 
6 Informações colhidas do site: https://pt.wikipedia.org/wiki/Switched_at_Birth em conformidade com o website oficial 
da série: http://freeform.go.com/shows/switched-at-birth. 
7
 O enredo descritofoi um resumo feito pelo autor deste artigo baseado no conhecimento da série e pesquisas realizadas 
no Website oficial. A sinopse original em inglês tirado do site oficial da série diz que: Switched at Birth: Two teenage 
girls discover they were accidentally switched as newborns in the hospital. Bay grew up in a wealthy family with two 
parents and a brother. Meanwhile, Daphne, who became deaf at an early age, grew up with a single mother in a 
working-class neighborhood. Things come to a dramatic head when the families meet and struggle to learn how to live 
together for the sake of the girls. 
21 
Sumário 
que permitiu ao longo de todos os seus episódios a ampliação das temáticas abordadas, além do fato 
diferenciador da trama ser protagonizada por uma atriz surda. E por conta deste pioneirismo 
escolhemos este seriado para realizar a pesquisa. 
Partindo do pressuposto que a cultura surda “abrange a língua, as ideias, as crenças, os 
costumes e os hábitos do povo surdo (Strobel, 2008, p. 22)” apresentamos a seguir a diferença entre 
os termos usados neste trabalho: comunidade surda e povo surdo. Segundo Houaiss (2001) 
comunidade é o “conjunto de pessoas que convivem em comunidade num determinado território; 
nação, sociedade [...], povo é o conjunto de pessoas que não habitam o mesmo país, mas que estão 
ligadas por uma origem, sua religião ou qualquer outro laço”. 
Dessa forma, em concordância com a definição passado por Houaiss o povo surdo partilha 
de costumes, interesses, histórias que se assemelham, independentes da região que se encontram. Já 
a comunidade surda segundo Padden e Humphries (2000, p.5) difere em sua definição: 
 
Uma comunidade surda é um grupo de pessoas que vivem num determinado local, 
partilham os objetivos comuns dos seus membros, e que por diversos meios trabalham no 
sentido de alcançarem estes objetivos. Uma comunidade surda pode incluir pessoas que não 
são elas próprias Surdas, mas que apoiam ativamente os objetivos da comunidade e 
trabalham em conjunto com as pessoas Surdas para alcançar. 
 
 A comunidade surda é uma parte do povo surdo organizada em grupos e que vivem numa 
mesma região, com interesses em comum. Ou seja, existe a comunidade surda de João Pessoa, a 
comunidade surda de Campina Grande, a comunidade surda paraibana e assim por diante, diversas 
comunidades integrantes do todo denominado de povo surdo, um povo sem demarcação geográfica. 
As produções originadas da cultura surda também são chamadas de Artefatos Culturais do 
povo surdo, estes foram elencados em oito pela autora Karin Strobel (2008) em seu livro As 
Imagens do Outro Sobre a Cultura Surda, são eles: Experiência Visual; Linguístico; Familiar; 
Literatura Surda; Vida Social e Esportiva; Artes Visuais; Política e Materiais. 
Baseado nesse contexto cultural do povo surdo, e a sua importância, vamos refletir sobre o 
seriado partindo da seguinte questão: Será possível identificar em um único episódio da série 
Switched at Bith todos os artefatos culturais descritos por Strobel (2008)? 
 
 OS ARTEFATOS CULTURAIS DO POVO SURDO PRESENTES NO SERIADO 
22 
Sumário 
 
Após assistir todas as temporadas de Switched at Birth, foi selecionado um episódio a ser 
estudado, sendo este o episódio 09 da segunda temporada, denominado de “Uprising”. A escolha 
aconteceu por este episódio tratar questões muito fortes ao povo surdo e ter como foco a luta pelos 
seus direitos. Dessa forma, à medida que analisamos o episódio, os artefatos culturais foram sendo 
identificados seguindo a ordem apresentada por Strobel (2008), como expostos a seguir: 
1. Experiência Visual: Foi possível identificar este artefato nas seguintes cenas: o 
momento que é apresentada a disposição da sala em círculo favorecendo a visualização de uma 
língua visuo-espacial e o alarme dispara; quando o personagem surdo Travis chama a atenção de 
Daphne (protagonista surda) por meio de acenos e consequentemente ela olha em sua direção; por 
fim, em outra cena, mesmo sem ouvir o som das sirenes Daphne percebe que há algo errado 
acontecendo devido a expressão facial e corporal de Bay (protagonista ouvinte que foi trocada com 
Daphne na maternidade), quando questiona sobre o que está acontecendo é esclarecida a respeito da 
chegada dos policiais. Quanto a estas constatações Strobel (2008, p.38) afirma: “Os sujeitos surdos, 
com a sua ausência de audição e do som, percebem o mundo através de seus olhos, e tudo o que 
ocorre ao redor dele”. Desta maneira as informações sonoras são adaptadas para informações 
visuais. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 1: Trechos que exemplificam o artefato experiência visual 
23 
Sumário 
2. Linguístico: diferente dos demais episódios, este é especialmente todo em língua de 
sinais e sem o frequente áudio com a tradução para a língua oral, havendo apenas a tradução por 
meio de legenda, invertendo assim a situação, fazendo com que o telespectador se coloque no lugar 
dos surdos. Desta forma, o artefato linguístico é percebido em todo o episódio, mas destacamos os 
mais evidentes momentos: quando a professora também surda reúne os alunos, para um momento 
de discussão; também nos momentos das conversas em segredo usando a língua de sinais; na 
tentativa de tramar a invasão da escola e quando os alunos ouvintes se aproximam eles param; e na 
placa que faz referência a área de utilização da língua de sinais (Zona de Língua de Sinais 
Americana) em respeito aos surdos até mesmo ouvintes que entrarem naquele espaço devem 
dialogar nesta língua. Várias são as partes que se encaixam neste artefato, uma vez que, toda a série 
é voltada para a língua de sinais, sendo uma das principais marcas do seriado. Sendo assim, Strobel 
(2008, p.44) discorre sobre a importância da língua: 
 
A língua de sinais é uma das principais marcas da identidade do povo surdo, pois é uma das 
peculiaridades da cultura surda, é uma forma de comunicação que capta as experiências 
visuais dos sujeitos surdos, sendo que é esta língua que vai levar o surdo a transmitir e 
proporcionar-lhe a aquisição de conhecimento universal. 
 
Todos os artefatos culturais de forma direta ou indireta vão estar relacionados com os 
primordiais artefatos experiência-visual e linguístico, uma vez que a construção de mundo por meio 
de vivências visuais é expressada na língua visuo-espacial, sendo assim a base para todos os outros. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 2: Um dos trechos que exemplifica o artefato linguístico 
 
3. Família: O terceiro artefato também pode ser facilmente encontrado em quase todos 
os episódios, mas neste em questão: é evidenciado no trecho quando os personagens apresentam um 
24 
Sumário 
relato baseado em fatos reais sobre um protesto em 1988 organizado pela comunidade surda 
americana, e os personagens afirmam que seus pais, também surdos vivenciaram este momento 
histórico, inclusive a própria professora Melody (mãe do aluno Ement,); foi identificado também no 
momento de discussão entre mãe e filho (ambos surdos); e na compreensão por parte de Melody em 
relação ao protesto por também já ter vivido algo semelhante há alguns anos
8
, então, ao ver seus 
alunos surdos, incluindo seu filho, lutando por um ideal que ela também compartilha, sente-se 
orgulhosa. 
Essas características destacam a importância da relação familiar na educação, em servir 
como um modelo a ser seguido. Strobel (2008, p. 45) destaca que “os sujeitos surdos que têm 
acesso à língua de sinais e participação da comunidade surda têm maior segurança, auto-estima e 
identidade sadia.” E quando esse acesso a língua e o contato com a comunidade inicia em casa, os 
benefícios são ainda maispercebidos. Nesse sentido, a autora também diz que: “Nas outras famílias 
com todos os membros surdos, dos avós até os filhos, passando por tios, tias, primos, e outros, 
assim eles passam pelo processo natural de transmissão da cultura surda (STROBEL 2008, p. 52)”. 
Podemos perceber isso facilmente na relação entre Melody e Ement, na qual o filho se inspira na 
mãe para lutar pelos direitos dos surdos, outrora também realizado por ela. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 3: Trechos que exemplificam o artefato familiar 
 
 
8
 Em outro episódio anterior este protesto verídico foi citado com detalhes na conversa da professora com seus alunos e 
durante a discussão com seu filho. Este fato histórico ocorreu nos Estados Unidos na instituição que hoje conhecemos 
como Universidade Gallaudet. O movimento nas ruas conhecido como Deaf President Now (Reitor surdo já!) resultou 
em 1988 na eleição de uma pessoa surda para o cargo de reitor (Dr. I. King Jordan), iniciando assim um processo de 
reforma administrativa com 51% dos cargos de direção da universidade ocupados por surdos, fato inédito desde a sua 
fundação em 1856. 
25 
Sumário 
4. Literatura Surda: A literatura surda pode ser dividida em três categorias: tradução 
(obras de autores ouvintes traduzidas para a língua de sinais), adaptação (recriação de obras 
clássicas) e criação (produção de autores surdos). Dessa forma, identificamos a tradução para 
língua de sinais da obra de Shakespeare, Romeu e Julieta; e também foi verificada a foto de Helen 
Keller a autora surdacega de diversos livros. 
 
Quarto artefato cultural é a literatura, ela traduz a memória das vivencias surdas através das 
várias gerações dos povos surdos. A literatura se multiplica em diferentes gêneros: poesia, 
história de surdos, piadas, literatura infantil, clássicos, fábulas, contos, romances, lendas e 
outras manifestações culturais. [...] Por muitas gerações os povos surdos transmitem muitas 
histórias através de língua de sinais, a maioria delas parte de experiências das comunidades 
surdas que transmitem seus valores e orgulho da cultura surda que reforça os vínculos que 
os unem com as gerações surdas mais jovens. STROBEL (2008, p.56 e 59). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 4: Trecho que exemplifica o artefato literatura surda 
 
5. Vida Social e Esportiva: Este artefato foi o mais subjetivo de todos no que tange o 
episódio nove especificamente, pois não foi totalmente explicitado como ocorreu durante toda a 
série (momentos claros de esporte, lazer, festas, encontros, dentre outros), como cita Strobel (2008, 
p. 61) quando conceitua este artefato: “o quinto artefato cultural é a vida social e esportiva do povo 
surdo, são acontecimentos culturais, tais como casamentos entre surdos, festas, lazeres e atividades 
nas associações de surdos, eventos esportivos e outros.”; Porém, como nesse artefato também se 
enquadra nos momentos compartilhados em grupo e locais de encontro, identificamos um trecho do 
episódio quando os surdos se reúnem para conversar, relembrar, descontrair e desabafar suas 
emoções em um determinado lugar informal, onde Travis conta sua história na escola regular e todo 
o sofrimento que passou, e diz não querer passar por isso novamente. 
26 
Sumário 
 
Figura 5: Trechos que exemplificam o artefato vida social e esportiva 
 
Strobel (2008, p. 61) faz uma referência a este artefato que corrobora com a cena elencada 
no seriado, que diz: “Há reações emocionais dos sujeitos surdos que trazem padrões de 
comportamentos habituais do povo surdo que pode constituir em contatos íntimos entre os membros 
da comunidade surda, tais como as amizades, lealdades e casamentos entre eles”. É através dessa 
amizade e lealdade que o personagem Travis sente-se à vontade para compartilhar sua história e 
seus medos, é o viver em comunidade, ou seja, vida social. 
 
6. Artes Visuais: Assim como o artefato linguístico é a base para todos os outros, a 
visualidade também norteia quase todos eles, uma vez o surdo percebe o mundo através da visão. E 
assim as artes visuais surgem. No episódio 09, temos o momento do ensaio para o teatro; quando 
reunidos e se lembram de um rap (“Rap do Zippo”) criado por um amigo surdo em um show de 
talentos da escola de surdos, e cantam em língua de sinais; em forma de protesto o personagem 
Ement cria o grito com determinado ritmo: “Devolvam Carlton!” e todos no local reproduziram 
como uma espécie de “hino do movimento de protesto” a favor da permanência da escola de surdos. 
São expressões artísticas, assim como dito por Strobel (2008, p. 66): 
 
No artefato cultural artes visuais, os povos surdos fazem muitas criações artísticas que 
sintetizam suas emoções, suas histórias, suas subjetividades e a sua cultura. O artista surdo 
cria a arte para que o mundo saiba o que pensa, para divulgar as crenças do povo surdo, 
para explorar novas formas de “olhar” e interpretar a cultura surda. 
 
 
 
27 
Sumário 
 
Figura 6: Trechos que exemplificam o artefato artes visuais 
 
7. Político: Este episódio gira em torno deste artefato, pois tudo envolve o protesto 
organizado pelos alunos surdos na luta pela continuidade da escola Carlton, sendo esta uma escola 
para surdos, que está sendo ameaçada de fechar por falta de recursos financeiros alegados pelo 
governo. Para isso, eles criam propostas que desejam alcançar com o ato político, passando a 
seriedade do protesto e com uma mensagem unificada entre os surdos. Nos momentos finais do 
episódio, dentre os diversos cartazes que cobrem a porta de vidro onde está o “quartel general do 
movimento”, Daphne surge por trás do significativo cartaz de Ferdinand Berthier (1803 – 1886), o 
educador surdo, conhecido como um dos primeiros a defender a identidade e cultura surda, muito 
envolvido com a política na luta pelos direitos dos surdos. 
 
 
 
28 
Sumário 
 
 
 
 
 
 
Figura 7: Trecho que exemplifica o artefato político 
 
Nesse sentido, Strobel (2008, p. 71) define: “Outro artefato cultural influente das 
comunidades surdas é a política, que consiste em diversos movimentos e lutas do povo surdo pelos 
seus direitos”. Em particular a este episódio, a luta é pela educação dos surdos, por uma escola que 
apresenta uma pedagogia adequada e a autora supracitada apoia esse pensamento quando defende 
que: 
 
O povo surdo luta pela pedagogia surda que parte de um “olhar” diferente direcionado em 
uma filosofia para educação cultural. Em que a educação dá-se no momento em que o surdo 
é colocado em contato com sua diferença para que aconteça a subjetivação e as trocas 
culturais. [...] As comunidades surdas improvisam movimentos para defender a pedagogia 
surda, literatura surda, currículo surdo, história cultural, aceitação da língua de sinais e de 
valores culturais. O povo surdo vê nos movimentos uma possibilidade de caminhada 
política na luta de reconhecimento da língua de sinais e de suas identidades surdas contra as 
práticas ouvintistas
9
. (STROBEL 2008, p. 72 e 75) 
 
 
8. Material: Por muito tempo se pensou que artefatos seriam apenas materiais criados 
e/ou adaptados, mas podemos perceber que não, além disso a cultura surda não resume-se a estas 
produções como verificamos nesta pesquisa. Porém este também faz parte dos artefatos culturais do 
povo surdo. E muitos deles foram encontrados nesse episódio, por exemplo: a campainha sonora 
(alarme) na escola; O aparelho auditivo – AASI; Aparelho celular com aplicativo de conversas em 
 
9
 Ouvintismoou práticas ouvintistas, segundo Skliar, “é um conjunto de representações dos ouvintes, a partir do qual o 
surdo está obrigado a olhar-se e narrar-se como se fosse ouvinte”. (1998, p. 15). 
29 
Sumário 
vídeo; Recurso de mensagens de texto no telefone móvel (celular); alarme de incêndio luminoso. 
Explicando sobre isso a autora que fundamentou este estudo fala desses materiais: 
 
Há artefatos culturais materiais resultantes da transformação da natureza pelo trabalho 
humano, e sua utilização é condicionada pelo enleio do comportamento cultural dos povos 
surdos, que auxilia nas acessibilidades nas vidas cotidianas de sujeitos surdos. [...] 
Instrumentos luminosos como a campainha em casas e escolas de surdos, despertadores 
com vibradores, legendas closed-caption, babá sinalizadores etc. (STROBEL 2008, p. 76). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 8: Trechos que exemplificam o artefato materiais 
 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
O presente estudo abordou a temática dos artefatos culturais do povo surdo. Tendo como 
principal objetivo identificar os artefatos e a relação destes no seriado Switched at Birth. O que 
podemos observar através deste estudo é a importância que o estudo da cultura surda tem para a sua 
comunidade, pois envolve a história, as lutas, conquistas e tudo a eles atrelado. 
O desafio proposto para esta pesquisa era encontrar todos (os oito) artefatos culturais 
apresentados em As Imagens do Outro Sobre a Cultura Surda da autora Strobel (2008) no seriado 
americano Switched at Birth. Isto posto, desde o início do episódio escolhido (episódio nove) da 
segunda temporada cumprimos o desafio lançado de identificar todos estes artefatos. 
Dentre os oito, o mais percebido ao longo do episódio é o linguístico, uma vez que, todo o 
episódio é em língua de sinais, sendo este, a base para todos os outros artefatos. O episódio 
“Uprising” que em português significa rebelião trata mais detalhadamente de uma luta política pela 
30 
Sumário 
continuidade da escola Carlton, fazendo com que este outro artefato também seja bastante 
evidenciado ao longo dos 42 minutos de exibição. 
Outro artefato que norteia os demais é a experiência visual, uma vez que, a forma que o 
surdo percebe o mundo é através da visão. E este artefato também foi identificado desde o início do 
episódio e mais de uma vez, assim como os outros anteriormente falados. A Literatura Surda foi 
abordada através da tradução para a língua de sinais de uma obra (Romeu e Julieta) de Shekespeare 
e na aparição da foto da autora surda Helen Keller, se referindo a uma autora de grande importância 
para os surdos e principalmente nas lutas pelos direitos. 
As artes visuais foi outro artefato muito explorado neste episódio, podendo ser encontrado 
três momentos que combinam a ficção com a realidade da comunidade surda. Assim como os 
Materiais, que identificamos cinco tipos diferentes de tecnologias criadas e/ou adaptadas. 
O artefato familiar, também foi de grande importância para este seriado, uma vez que, a 
temática gira em torno da família (troca de dois bebês na maternicdade), mas neste episódio 
percebemos a relação entre mãe e filho enquanto surdos, e como essa base familiar foi de 
fundamental importância para a formação cidadã e acadêmica do filho (Ement). Fazendo com que o 
protesto ganhasse mais força já que ele tinha como referencial de luta a própria mãe e ela por sua 
vez, expressando o sentimento de orgulho em ver seu filho atuando tão bravamente pelos seus 
direito e de toda a comunidade que faz parte. 
Por fim, o artefato vida social e esportiva foi o mais difícil de identificar, porém com mais 
atenção ao episódio foi possível verificar o momento em que o grupo de alunos surdos se juntaram 
para conversar, desabafar e expor suas emoções uns aos outros, além disso, nesse momento, 
relembraram momentos vividos como gincanas esportivas e shows de talentos. Essa relação vivida 
em “points de encontro”em momentos específicos entre os membros da comunidade surda, tais 
como as amizades, lealdade é considerada como evidência do artefato vida social. Dessa forma, 
todos os artefatos listados por Strobel (2008) foram encontrados no seriado Switched at Birth. 
Este estudo proporcionou ratificar a importância da cultura surda para a comunidade, mas 
também para o público em geral, uma vez que, um seriado tende a alcançar um grupo de pessoas 
ainda mais heterogêneo. Daí a importância de ter um conteúdo adequado, já que está servindo de 
difusor de um conteúdo outrora conhecido apenas por uma minoria. 
Este seriado, inédito em toda sua estrutura e enredo, foi de grande relevância para o povo 
surdo e a todos a quem abrange o interesse por esta área, ou apenas a curiosidade pelo seriado. 
Desde a escolha dos atores, em parte surda, e todo o estudo envolvido e o respeito diante do 
31 
Sumário 
conteúdo trabalhado, fez com que este seriado hoje seja considerado uma fonte de estudo. 
Permitindo que diversas pesquisas ainda possam surgir. 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
FREITAS, Wesley Ricardo de Souza; JABBOUR, Charbel José Chiappetta. Utilizando estudo de 
caso(s) como estratégia de pesquisa qualitativa: boas práticas e sugestões. Revista Estudo & 
Debate. Lajeado-RS, v. 18, n. 2, p. 07-22, 2011. 
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008. 
HALL, Stuart. Da Diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2003; 
HOUAISS, Antônio. VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 
Elaborado no Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia e Banco de Dados da Língua Portuguesa 
S/C Ltda. - Rio de Janeiro: Objetiva 2001. 
 
OLIVEIRA, Nádia Fátima de. Metodologia da pesquisa científica. São Paulo: Know How, 2010. 
PADDEN, Carol; HUMPHRIES, Tom. Deaf in américa: voices from a culture. Cambridge: 
Harvard university Press, 2000. 
SKLIAR, Carlos. A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Medição, 1998. 
STROBEL, Karin Lilian. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis: Editora 
UFSC, 2008a. 
WRIGLEY, O. The Politics of Deafness. Gallaudet University Press. Washington, D.C., 1996. 
 
 
 
 
 
32 
Sumário 
3 - MERGULHANDO NA CULTURA SURDA, UMA VIVÊNCIA DE 
MUNDO BASEADA EM EXPERIÊNCIAS VISUAIS 
 
Janaína Aguiar Peixoto
10
 
Lígio Josias Gomes de Sousa
11
 
Maysa Ramos Vieira
12
 
Robson de Lima Peixoto
13
 
Introdução 
O primeiro artefato cultural denominado experiência visual, apresentado por Strobel (2008) é a 
base da vivência de mundo das pessoas surdas. Significa ter a capacidade de transformar o mundo 
ao seu favor através da substituição de informações sonoras, para as informações visuais. Com isto, 
surgem os elementos do cotidiano da pessoa surda que não são muito comuns a uma pessoa ouvinte. 
Muitas vezes o ouvinte não percebe o quanto depende da audição em situações cotidianas, 
porém quando passa a viver em um “novo mundo”, conhecendo o povo surdo e vivenciando 
algumas experiências em que essa dependência não existe, ocorre o choque cultural. 
Partindo desta realidade, este capítulo apresenta exemplos práticos deste artefato cultural 
presentes na literatura, além disso, contribui com outros exemplos coletados por meio de relatos de 
surdos e ouvintes integrantes da comunidade surda. 
 
1. Uma breve revisão da literatura 
 Em seu livro, As Imagens do Outro Sobre a Cultura Surda, Strobel (2008, p.38) afirma: “Os 
sujeitos surdos, com a sua ausência de audição e do som, percebem o mundo através de seus olhos, 
e tudo o que ocorre ao redor dele”. É através dessa vivência de mundo que o surdo percebe tudo ao 
seu redor, através de experiências visuais.10
 Professora do Departamento de Línguas de Sinais – DLS/CCHLA/UFPB, Doutora em Letras (PPGL/UFPB), Mestre 
em Ciências das Religiões (PPGCR/UFPB), Fonoaudióloga (FRASCE-RJ), possui Formação de Tradutora e Intérprete 
de Libras (UFF). 
11
 Professor do Departamento de Línguas de Sinais – DLS/CCHLA/UFPB. Atualmente cursando Pós-Graduação em 
LIBRAS. Possui Licenciatura plena em Letras com habilitação em Libras pela UFPB e Técnico em Eletrotécnica pelo 
IFPB. 
12
 Professora do Departamento de Línguas de Sinais – DLS/CCHLA/UFPB, Especialista em Libras, Licenciada em 
Química pelo IFPB. Atuou como Tradutora e Intérprete de Língua de Sinais do quadro efetivo da UFPB. 
13
 Professor do DCFS/CCA/UFPB, Mestre em Letras pelo PPGL/UFPB, Especialista em Libras pela SOCIESC, 
Licenciado em Letras Libras pela UFSC. 
33 
Sumário 
Á medida que aprofundamos as nossas reflexões a respeito do povo surdo e suas experiências 
visuais, a cultura é evidenciada. Segundo Hall, (1997, p.20): “A cultura que temos determina uma 
forma de ver, de interpelar, de ser, de explicar, de compreender o mundo.” Sendo assim, a cultura é 
uma espécie de óculos do indivíduo. Nesta perspectiva não podemos olhar o “outro” de maneira 
homogenia, como elucida Salles (2004, p. 39): 
 
Se considerarmos que os surdos não são “ouvintes com defeito”, mas pessoas 
diferentes, estaremos aptos a entender que a diferença física entre pessoas surdas e 
pessoas ouvintes gera uma visão não-limitada, não determinística de uma pessoa ou 
de outra, mas uma visão diferente de mundo, um “jeito Ouvinte de ser” e um “jeito 
Surdo de ser”, que nos permite falar em uma cultura da visão e outra da audição. 
 
 Esta cultura da visão apresenta situações e costumes peculiares já apresentados em estudos 
por alguns autores, como o famoso exemplo de Strobel (2008, p.38): 
 
Uma vez meu namorado ouvinte me disse que iria fazer uma surpresa para mim 
pelo meu aniversário; falou que iria me levar a um restaurante bem romântico. 
Fomos a um restaurante escolhido por ele, era um ambiente escuro com velas e 
flores no meio da mesa, fiquei meio constrangida porque não conseguia 
acompanhar a leitura labial do que ele me falava por causa da falta de iluminação, 
pela fumaça da vela que desfocava a imagem do rosto dele, que era negro; e para 
piorar, havia um homem no canto do restaurante tocando música, que sem poder 
escutar, me irritava e me fazia perder a concentração por causa dos movimentos 
dos dedos repetidos de vai-e-vem com seu violino. O meu namorado percebeu o 
equívoco e resolvemos ir a uma pizzaria! 
 
É notório neste exemplo o choque entre uma cultura baseada em uma vivência sonora de 
mundo e uma vivência visual de mundo. Para o namorado ouvinte, todos os elementos descritos 
pela namorada surda como importunos causadores de uma experiência desagradável (ambiente a luz 
de velas, arranjo de flores na mesa e uma música ao vivo tocada ao violino) são costumes 
considerados confortáveis, e refletem uma experiência agradável e muito romântica. 
Ao apresentar alguns exemplos de experiências visuais uma perspectiva de contraposição 
interessante é ressaltada por Salles (2004, p. 38): 
34 
Sumário 
 
Quebrar o paradigma da deficiência é enxergar as restrições de ambos: surdos e 
ouvintes. Por exemplo, enquanto um surdo não conversa no escuro, o ouvinte não 
conversa debaixo d´água; em local barulhento, o ouvinte não consegue se 
comunicar, a menos que grite e, nesse caso, o surdo se comunica sem problemas. 
Além disso, o ouvinte não consegue comer e falar ao mesmo tempo, 
educadamente, e sem engasgar, enquanto o surdo não sofre essa restrição. 
 
Dando continuidade a este resgate de exemplos práticos presente na literatura para a 
compreensão sobre a experiência visual, um exemplo de elemento do cotidiano diferente para 
pessoas surdas e ouvintes é encontrado no texto de Peixoto (2016, p.47) que diz: 
Uma herança cultural perpetuada a cada geração de surdos espalhados no mundo é 
a forma de aplaudir alguém. Os barulhos dos aplausos que satisfazem a pessoa 
ouvinte homenageada são substituídos por balanços das mãos que produzem uma 
beleza visual, que de igual modo, lisonjeia o surdo homenageado ao ver uma 
plateia de mãos levantadas aplaudindo-o desta forma. 
 
Imagem1: Aplausos em Libras 
 
 
 
 
 
Fonte: silvanalves.com.br 
 Outra característica marcante na comunidade surda baseada na experiência visual é citada 
pela autora: 
 
Outro comportamento muito tradicional e peculiar desta cultura é a criação do sinal 
de uma pessoa que está iniciando o contato com a comunidade surda ou de uma 
pessoa pública. O sinal equivale a um nome na cultura ouvinte e pode expressar em 
língua de sinais uma característica física, uma característica da personalidade ou 
uma característica profissional. Nesta prática costumeira de criar um sinal para 
35 
Sumário 
determinada pessoa, os surdos procuram ressaltar uma característica que o grupo 
rapidamente identifique de quem se trata. Por exemplo, ao fazer referência do 
apresentador Sílvio Santos, os surdos não soletram o alfabeto manual escrevendo 
assim o seu nome, como normalmente se pensa. Ele faz o léxico (sinal) de 
“Microfone pregado na roupa”, que identifica por uma descrição visual o homem 
da televisão chamado Sílvio Santos. Da mesma forma acontece com o ex-
presidente Lula que é identificado pelo sinal que representa sua característica 
física, visualmente identificada que é a omissão de um dedo (PEIXOTO, 2016, 
p.47-48). 
 
Imagem2: Costume de criação do sinal-nome 
 
Fonte: https://librasdiaria.wordpress.com 
 
 Ainda encontramos outros exemplos do artefato cultural experiência visual nos autores 
estudados, porém para o momento destacamos os seguintes exemplos: 
a) O relato de crianças surdas sem contato com a sua comunidade, com base naquilo que via 
(apenas adultos ouvintes), acreditavam que morreriam antes de sua fase adulta (STROBEL, 
2008, p. 40); 
b) Surdos que foram prejudicados por falta de painéis visuais com as informações escritas em 
bancos/aeroportos/rodoviárias e esquecidos na espera perdendo sua vez, mesmo depois de 
avisar aos atendentes que precisavam ser informados pessoalmente e não chamados pelo 
microfone ou aos gritos, sem nenhum retorno (STROBEL, 2008, p. 41-42). 
c) A maneira peculiar de fazer uma oração/reza de olhos abertos para acompanhar o sinalizante 
que dirige a prece de olhos fechados. Além disso, ao invés de unirem as mãos, eles unem os 
pés, para que assim as mãos fiquem livres para sinalizarem a oração ou concordarem com o 
costumeiro “amém” (PEIXOTO, 2015, p. 44). 
36 
Sumário 
d) “Cantar a música” substituindo informações sonoras por características visuais que 
expressam o ritmo, o estilo musical, a emoção e a estética através da expressão corporal e 
facial, para que os surdos “escutem” e apreciem visualmente a música sem som (PEIXOTO, 
2015, p. 44). 
 
Por conseguinte, embasado nas evidências apresentadas nessa breve revisão da literatura, 
apresentaremos agora alguns relatos coletados entre surdos e ouvintes integrantes da comunidade 
surda pessoense que corroboram e acrescentam exemplos das manifestações desse artefato. 
 
2. Relatos de vivências de mundo baseadas em experiências visuais 
Nessa viagem pelo mundo dos surdos, iniciaremos os relatos de ocorrências do artefato 
experiência visual em restaurantes, por ser um excelente espaço de interação social, onde 
detectamos peculiaridades importantes. 
 
“Ao ir num rodízio de pizza com vários surdos e intérpretes, um grupo de quase 20 pessoas, notei 
que todas as garrafas de refrigerantes de dois litros estavam deitadas na horizontalna mesa, e 
todos que queriam, levantavam a garrafa na vertical, se serviam, e posteriormente abaixavam 
novamente a garrafa. Somente depois eu entendi o porquê disso: isto ocorria para que as garrafas 
não fossem empecilhos visuais na hora da comunicação entre todos que estavam conversando ao 
mesmo tempo desde a ponta daquele corredor de mesas até a outra ponta da última mesa. Com as 
garrafas deitadas sobre a mesa a conversa fluía livremente, mas a cena foi diferente e engraçada, 
embora eu seja surdo, lá no Rio de Janeiro eu ainda não tinha visto isto. E sempre que vou a algum 
restaurante com vários surdos sou o primeiro a tirar tudo o que está na frente impedindo a 
conversa, seja uma taça grande, um arranjo de flor, um cardápio grande, não interessa, abaixo 
tudo. Já aconteceu uma vez inclusive, em um casamento que fomos, um dos surdos sentados na 
nossa mesa pegou o arranjo, que era enorme, e colocou debaixo da mesa durante a festa para 
conversarmos, daí a noiva quando veio nos cumprimentar ficou preocupada porque nossa mesa 
faltava a lembrança, daí explicamos que estava embaixo da mesa, porque com ela tampando nossa 
visão, ficaríamos calados a festa inteira. Então ela riu e entendeu.” (Relato 1- Surdo) 
37 
Sumário 
“A primeira vez que fui com surdos num rodizio de carne, demorei a entender que eu precisava 
colocar a comida na boca, deixar o garfo e a faca no prato para ficar com as mãos livres e 
conversar. Percebi que “falar de boca cheia” nesta cultura não significava necessariamente falta 
de educação, pois diferente dos ouvintes que ao articular os fonemas comidas podem sair da boca, 
os surdos articulam os sinais nas mãos.” (Relato 2- Ouvinte) 
“No nosso aniversário de casamento fomos a um restaurante que tinha uma mesa bem grande e 
tentamos tirar foto (selfie), mas não conseguimos, porque com a mesa grande entre a gente, não 
era possível enquadrar nós dois na câmera do celular, então sentamos um do lado do outro, apenas 
para tirar a foto de lembrança desta data especial. Logo depois voltamos à posição inicial um de 
frente para o outro. Só notei que isto era um traço da cultura surda quando fui com minha esposa 
para um jantar de confraternização de final de ano com colegas de trabalho ouvintes. Como 
chegamos depois, então todos os colegas já estavam posicionados com suas esposas ao lado, então 
eu e minha esposa também sentamos assim, mas saímos do jantar com dor no pescoço porque para 
conversar com ela, a única pessoa que sabia Libras na mesa, eu precisava ficar olhando de lado, 
todo torto.” (Relato 3 – Surdo) 
 
Como vimos, um casal formado por dois surdos ou por um surdo e um intérprete, ou melhor, 
um casal que precisa se comunicar através das mãos, por uma língua de sinais, vive uma dinâmica 
diferente do restante dos casais. E vivendo entre esses dois mundos (o sonoro e o visual), situações 
diferentes surgem, como estas: 
 
“É comum os casais de ouvintes ao andar passeando, conversarem de mãos dadas, no caso dos 
casais surdos, na hora da conversa as mãos precisam estar livres, portanto não ficam o tempo todo 
de mãos dadas. Percebi isto, porque sempre namorei ouvintes, como eu, e quando comecei a 
namorar um surdo, logo no início do namoro, saímos com mais dois casais de amigos ouvintes que 
ficavam de mãos dadas o tempo todo, e a gente quando tentava fazer isto, limitava a nossa 
comunicação com o uso de apenas uma mão, por isso optamos por andarmos juntinhos (abraçados 
ou de mãos dadas), mas na hora de conversarmos ao caminhar nos “desgrudamos” um pouco para 
a comunicação fluir com qualidade, e o olho no olho acontecer. Às vezes até paramos no meio do 
caminho para nos expressarmos melhor, e depois continuamos a caminhar.” (Relato 4- Ouvinte) 
38 
Sumário 
“Certa vez, decidimos assistir um seriado médico, em que tudo acontece muito rápido, toda a 
história é narrada dentro de um hospital, onde tudo pode acontecer nos momentos de atendimento 
emergencial e em cirurgias. Muitos aparelhos são ligados, existe toda uma tensão em cada 
episódio, e então meu marido (surdo) começou a perceber que eu tinha reações antes dele, como 
susto, tristeza, entre outros, e ele me perguntou como eu sabia que algo iria acontecer, sendo que 
tinha um intervalo entre a minha reação e a atitude dos médicos? Diante desse questionamento, 
percebi que era o som das máquinas que nos informavam que algo de ruim estava acontecendo, 
como quando um paciente vinha a óbito e antes dos médicos anunciarem, eu já tinha percebido 
pela ausência de batimentos cardíacos que a máquina monitorava, e entre outros tipos de som. No 
caso, ele só percebia o que estava acontecendo quando aparecia na legenda a fala dos 
personagens, por não escutar os sons que estão no seriado. Pensando nisso, passamos a assistir o 
seriado de mãos dadas, para que ao tempo de algo acontecer e gerar em mim o susto, o nervosismo 
ou outro sentimento causado pelos sons, ele também pudesse sentir ao mesmo tempo e assim 
acompanhar o ritmo que o seriado exige, trazendo as minhas experiências sonoras ao tato dele, 
através de um aperto de mão”. (Relato 5 – Ouvinte) 
 
 Considera-se o núcleo familiar como primeiro espaço de produção cultural, portanto, de 
notória identificação da presença (Relato 6) ou da ausência (Relato 7) do artefato experiência visual 
como podemos constatar nos dois relatos abaixo: 
 
“O meu cachorro entende que eu sou Surdo, diferente da minha esposa e do meu filho que são 
ouvintes. Quando alguém me chama no portão da casa, ele vem e olha no meu olho e começa a 
latir muito alto e fica me chamando na direção do portão. Ele se comunica comigo mostrando que 
eu esqueci de colocar a ração no prato dele. Sabe como? Empurrando o prato de alumínio com o 
focinho na parede, quando eu estou sentado perto, assim eu sinto a vibração do barulho e vejo a 
expressão corporal e facial dele. Outra coisa, ele entende LIBRAS e reage diferente quando falo 
três sinais: 1- TOMAR BANHO, ele rosna e late zangado para mim; 2- COMIDA, ele fica andando 
em círculos, rodando todo feliz e abanando o rabo; 3- PASSEAR, ele pula muito e vai na direção 
do lugar que fica pendurada a coleira. Ah esqueci de falar, assim como outros cachorros de meus 
39 
Sumário 
amigos surdos, o Juninho além do nome em português, também possui o seu sinal: “sobrancelhas 
franzidas, como se estivesse zangado”. (Relato 6 – Surdo) 
 “Minha família, quando em contato pela primeira vez com meu namorado surdo, ao convidá-lo 
para entrar em casa, automaticamente, abaixou o volume da televisão para que pudéssemos 
conversar (como se o som da TV influenciasse e fosse atrapalhar), ou quando pediam para falar 
baixo para não acordá-lo. São costumes considerados confortáveis para a comunidade ouvinte mas 
que não são vivenciados pela comunidade surda” (Relato 7 – Ouvinte) 
 Como reflexo da vivência no núcleo familiar, a sociedade majoritária formada por 
ouvintes não foi instruída a conhecer uma vivência de mundo baseada em experiências visuais, 
portanto, pela ausência de conhecimento, situações inesperadas acontecem como constatamos no 
seguinte relato: 
“Fui para academia com meu marido (que é surdo), chegando lá encontramos a porta fechada e 
pedi para ele ir bater, pois a luz de dentro estava acesa, enquanto isso, fiquei no carro calçando o 
tênis, e vi que ninguém abria, e ele insistindo em bater na porta, quando me aproximei ouvi que as 
educadoras físicas estavam gritando do lado de dentro da academia dizendo: “quem é?”, “se não 
responder eu não vou abrir”, “se continuar batendo e não falar vou chamar a polícia”, e então eu 
respondi que éramos eu e meu marido e a situação ficou cômica, levando todos a gargalhar.” 
(Relato 8- Ouvinte) 
Porém, este é

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