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Lesão e Morte Celular Luciano Sampaio Guimarães - Medicina UFPE 144 A célula em seu estado normal está na homeostasia. Contudo: ADAPTAÇÃO Maior demanda, estresse, pode gerar adaptação da célula (hipertrofia, hiperplasia, metaplasia). Fisiológica: estimulada pelos hormônios ou mediadores químicos endógenos (ex: aumento do útero induzido por hormônio durante gravidez) Patológica: resposta ao estresse para modular sua estrutura afim de escapar da lesão. LESÃO CELULAR Ocorre quando as células são estressadas tão excessivamente que não são mais capazes de se adaptar ou quando são expostas a agentes lesivos ou são prejudicadas por anomalias intrínsecas. Reversível: se o estímulo nocivo for retirado, volta ao normal. Apesar de haver anomalia estrutural, ainda não há dano severo à membrana e dissociação nuclear. Principais características: tumefação celular – alteração hidrópica/degeneração vacuolar observada na microscopia (+ difícil), causada pela falência das bombas de íons; É a primeira manifestação de quase toda lesão, se comprometer o órgão todo causa palidez, aumento do turgor e aumento do peso. degeneração gordurosa – ocorre na lesão hipóxica, metabólica ou tóxica, há surgimento de vacúolos lipídicos no citoplasma; EX: lesão aguda e autolimitada, surge rápido e acaba rápido, volta para um estado basal estável Alterações ultraestruturais nas organelas: alterações da membrana plasmática, da mitocôndria, dilatação do retículo endoplasmático e alterações nucleares. Irreversível: persistência do dano. A irreversibilidade é caracterizada por 2 coisas: Incapacidade de reverter disfunção mitocondrial Profundos distúrbios na função da membrana. (se, na retirada do estímulo nocivo, não houver essa lesão de membrana, é revertida a lesão) EX: lesão progressiva e severa, a célula atinge o “ponto de não retorno” EX: o que ocorre nos cardiomiócitos. Quando a demanda aumenta, há adaptação: hipertrofia para gerar força maior. Se esse aumento da demanda não for atenuado, as células sofrerão lesão, inicialmente reversível, mas se continuar, irreversível (morte celular - infarto). Necrose: danos às membranas é acentuado, extravasamento das enzimas lisossomais que entram no citoplasma e digerem a célula. Os conteúdos celulares extravasam pela membrana plasmática, levando a uma resposta inflamatória. (OBS: no morto o que ocorre é autólise). Sempre patológica. Apoptose: morte celular geneticamente programada (“suicídio”), dissolução nuclear sem a perda da integridade da membrana, não gera resposta inflamatória. Pode ser fisiológica ou patológica. Pode haver sobreposição entre apoptose e necrose. A função celular pode ser perdida antes da morte, e as alterações morfológicas surgem após a morte. Lesão moderadamente crônica é a intermediária, passa do agudo (7 dias) mas não é muito longa. Causas de Lesão Celular Privação de oxigênio: hipóxia – deficiência de oxigênio (diferente de isquemia, que é a principal causa de hipóxia e consiste na perda do suprimento sanguíneo) Agentes químicos: mesmo substâncias inócuas (ex: sal, glicose, oxigênio), mas em excesso, podem causar lesão. Outros exemplos são poluentes e venenos. Agentes infecciosos; Reações imunológicas: reações autoimunes e reações alérgicas. Fatores genéticos: alterações nos genes das mais variadas formas, da síndrome de Down à anemia falciforme Desequilíbrios nutricionais: exemplo – dietas gordurosas aumentam a incidência de aterosclerose. Agentes físicos Envelhecimento: diminui a capacidade de responder ao dano Mecanismos Bioquímicos Gerais Depleção de ATP: efeitos críticos pois muitos processos dependem dele Danos e disfunções mitocondriais: essas organelas são sensíveis a estímulos nocivos, que podem causar falha na sua fosforilação oxidativa (e, consequentemente, podem gerar ERO – espécies reativas de oxigênio). OBS: o extravasamento de proteínas mitocondriais induz apoptose. Estresse Oxidativo: acúmulo de radicais livres derivados de oxigênio, que por serem instáveis e reativos, atacam os ácidos nucleicos, proteínas, etc. Um tipo deles são as ERO. Cálcio intracelular e perda da homeostase do cálcio: cálcio no citosol ativa várias enzimas gerando efeitos prejudiciais, além de poderem induzir também as caspases, que induzirão apoptose. (ex: ATPases, fosfolipases, proteases – essas 2 últimas geram lesões da membrana). Defeitos na permeabilidade da membrana: tipicamente culmina em necrose. Sistema intracelulares vulneráveis à lesão (alvos) (4): membranas, respiração aeróbica, síntese de proteína e aparelho genético celular. Formas de Lesão Celular Lesão Isquêmica e Hipóxica Isquemia é a redução do fluxo sanguíneo, comprometendo mais gravemente a formação de energia (aeróbica ou anaeróbica) Hipóxia é uma ausência de oxigenação, ainda há geração de energia via anaeróbica (glicolítica, menos eficiente, mas há) Por isso, a isquemia lesa os tecidos mais rapidamente que a hipóxia. Lesão de Isquemia-Reperfusão Há restauração do fluxo sanguíneo para células que estavam lesadas reversivelmente. Contudo: Em algumas situações, é a própria reperfusão em tecidos isquêmicos que causam, paradoxalmente, a morte das células que estavam reversivelmente lesadas. Pode ocorrer por: uma nova lesão pode ser gerada na reperfusão devido ao aumento da produção de ERO; a inflamação existente na isquemia é aumentada com a reperfusão Lesão Química/Tóxica Combinação de uma molécula com uma organela induzindo a lesão Substâncias que, quando metabolizadas, geram metabólitos tóxicos reativos pela formação de radicais livres Lesão Induzida por Radicais Livres Necrose: morte celular associada à perda da integridade da membrana e extravasamento dos conteúdos celulares, incluindo DAMPs (padrões moleculares associados aos danos). Esses, iniciam uma inflamação, para eliminar as células mortas e iniciar o reparo. São alterações morfológicas que sucedem a morte celular. A digestão enzimática da célula ocorre tanto pelas enzimas lisossomais extravasadas das células mortas quanto das derivadas dos lisossomos dos leucócitos. Há também desnaturação proteica. No citoplasma, há figuras de mielina, além de no núcleo ocorrer cariólise, picnose (condensação, encolhimento da cromatina) e cariorrexe (fragmentação do núcleo picnótico). Padrões de Necrose Necrose de Coagulação/Isquêmica: é a mais comum, a arquitetura básica dos tecidos é preservada por alguns dias. Tecidos adquirem textura firme e células anucleadas persistem por dias ou semanas. Os leucócitos digerem as células mortas e seus restos são removidos por fagocitose. Característica de infarto em todos os órgãos sólidos, exceto cérebro. Tumefação intensa ou ruptura da célula Desnaturação e coagulação das proteínas citoplasmáticas Degradação das organelas celulares Histologicamente, há presença de neutrófilos, lipofuscina (pigmento castanho, de desgaste) e, caso o paciente sobreviva, há um reparo, uma cicatriz: a fibrose. Necrose liquefativa/coliquativa: infecções bacterianas (se for, haverá pus) ou fúngicas Micróbios estimulam acúmulo de células inflamatórias, que são digeridas pelas enzimas dos leucócitos, ocorrendo a “liquefação”. Transformação do tecido em massa viscosa líquida – consistência mole, semifluida ou liquefeita. A morte por hipóxia de células do SNC leva à necrose liquefativa. Numa região com falha de oxigenação no cérebro, os neurônios assumem morfologia triangular, tornam-se mais eosinofílicos e há vacuolização ao seu redor. Necrose Gangrenosa: ação de agentes externos sobre o tecido necrosado Em geral, ocorre quando uma perda de suprimento sanguíneo em determinada região gera uma necrose de coagulação, que será sobreposta por uma infecção bacteriana e sua ação liquefativa, resultando na gangrena úmida. Gangrena Seca: mumificação, desidratação, aspecto em pergaminho (ex: dedos dos pés, nariz) Gangrena Úmida: pútrida, invasão da área necrosada por organismos anaeróbicos, produzindo liquefaçãoe odor fétido Gangrena Gasosa: contaminação do tecido necrosado pela bactéria Clostridium, produtores de gás Necrose Caseosa: aparência friável branco-amarelada, aspecto macroscópico de queijo Células rompidas ou fragmentadas, aparência granular amorfa rosa (acidófila) e núcleos picnóticos Arquitetura do tecido completamente obliterada, contornos celulares não distinguíveis Comum em tuberculose Necrose Gordurosa (Esteatonecrose): necrose enzimática do tecido adiposo Tipicamente devido à liberação de lipases pancreáticas (ocorre na pancreatite aguda necro-hemorrágica) Lipases agem sobre os triglicerídeos, liberando ácidos graxos que sofrem saponificação Depósitos esbranquiçados em “pingo de vela” Evolução da Necrose (o que pode acontecer pós-necrose) Regeneração: as células ao seu redor se recuperam Cicatrização: resposta do tecido que produz fibroblastos Encistamento: formação de um cisto Eliminação: por ex, numa lesão, o material necrótico pode ser expelido pela tosse, pela pele Calcificação Apoptose: a célula é estimulada a acionar mecanismos que culminarão em sua morte Ocorre em estados fisiológicos e patológicos A membrana plasmática permanece intacta, mas é alterada para que ela e seus fragmentos sejam alvo de fagocitose A remoção desses fragmentos (corpos apoptóticos) ocorre rapidamente, logo, não há indução da resposta inflamatória Causas da Apoptose Desenvolvimento embrionário: exemplo da perda da membrana interdigital; Mecanismo homeostático: perda celular em populações proliferativas, mantendo um número constante (ex: células de cripta intestinal); Involução de tecidos hormônio-dependentes sob privação do hormônio: como a célula endometrial pós-ciclo menstrual; Condições patológicas: lesão de DNA, acúmulo de proteínas anormalmente dobradas, lesão em certas infecções; Morfologia da Apoptose Retração celular; Condensação da cromatina; Formação de bolhas e de vacúolos apoptóticos; Fagocitose de células ou dos corpúsculos apoptóticos. Mecanismos da Apoptose A apoptose é resultado da ativação das caspases, que são ativadas pela convergência de duas vias: Via Mitocondrial (Intrínseca) - maioria Mitocôndrias possuem proteínas capazes de induzir apoptose (ex: citocromo C e neutralizadoras dos inibidores endógenos da apoptose) A sobrevivência ou a morte é determinada pela permeabilidade da mitocôndria. Privação das células de fatores de crescimento ou exposição à lesão do DNA Sensores de lesão são ativados: p53, PUMA e NOXA → ativam, Bax e Bak (p53 ativa p21, que para o ciclo celular) e inibem Bcl-2 e Bcl-x (moléculas antiapoptóticas que estavam inibindo Bax e Bak) Bax e Bak se dimerizam, formando poros na membrana mitocondrial permitindo o extravasamento do citocromo C (além de outras proteínas mitocondriais que neutralizam as proteínas citoplasmáticas inibidoras de apoptose - IAPs) O citocromo c liberado se junta à APAF-1 e à CASP9 (caspase 9) formando o apoptossoma O apoptossoma ativa a CASP3 (caspase 3), levando à morte celular. Em estado normal: Bcl-2 e Bcl-x estão inibindo Bax e Bak, impedindo a apoptose. Via Receptor de Morte da Apoptose (Extrínseca) Os receptores contém um “domínio de morte" (receptores: TNF 1 e Fas ou CD95) O ligante do Fas é uma proteína de membrana expressa principalmente pelos linfócitos T (Fas-L) Reconhecimento dos alvos que possuem o Fas pelos linf. T que possuem o Fas-L Ligação de Fas e Fas-L por reação cruzada Proteínas adaptadoras se ligam ao domínio de morte do Fas ativado pelo Fas-L, tendo elas também um domínio de morte que se ativa (FADD) O domínio de morte das adaptadoras ativam a pró-caspase 8 em caspase 8 Caspase 8 ativa pró-caspase 3 em caspase 3, gerando a morte celular OBS: há interação entre as duas vias, porque a caspase 8 também pode clivar o Bid, pró-apoptótico da via mitocondrial. Ativação das Caspases: a CASP9, gerada na via intrínseca, e a CASP8, gerada na via extrínseca são caspases desencadeantes, porque vão ativar as caspases executoras. As executoras clivam vários alvos, culminando na ativação de enzimas responsáveis pela morte celular (EX: endonucleases). OBS – LUCAS: Não existe morte celular patológica, apenas regulada (RDC) ou acidental (ADC). OBS – HIV: a morte regulada da HIV é a piroptose. O PRR reconhece o PAMP (que no HIV, é o seu RNA), gerando produção de CASP1, que induzirá a célula a entrar em piroptose pela produção de IL-1β, IL-18 e IL-13. Degenerações: lesões reversíveis decorrentes de acúmulo de substâncias no interior da célula Degeneração Hidrópica: acúmulo de água e eletrólitos devido a transtornos no equilíbrio hidroeletrolítico Lesão não-letal mais comum Agressões podem diminuir o funcionamento da bomba eletrolítica; Degeneração Hialina: acúmulo de material proteico e acidófilo O material acumulado pode ser filamentos intermediários, proteínas, material de origem viral, proteínas endocitadas Ocorre porque radicais livres agem favorecendo a formação de aglomerados que se precipitam Corpúsculo de Mallory: hepatócitos de alcoólatras crônicos, hepatite não-alcoólica, carcinoma hepatocelular Corpúsculo de Councilman e Rocha Lima: hepatócitos em apoptose que ocorrem nas hepatites virais, febre amarela Corpúsculo de Russel: acúmulo excessivo de imunoglobulinas Degeneração Mucoide: “células em anel de sinete” – podem ser causadas por 2 condições Hiperprodução de muco pelas células do trato digestório ou do trato respiratório; Síntese exagerada de muco nos adenomas (benigno) e nos adenocarcinomas (maligno), que geralmente extravasam para o interstício Esteatose: acúmulo de gorduras neutras no citoplasma de células que normalmente não as armazenam Comum no fígado, epitélio tubular renal e miocárdio. Disfunção no metabolismo dos ácidos graxos: ↑ síntese ou ↓ utilização/transporte/excreção Pode evoluir para morte celular, formação de cistos gordurosos, embolia gordurosa (se os cistos se romperem) ou cirrose. Morfologia MACRO: fígado aumenta de peso, consistência diminuída, bordas arredondadas, coloração amarelada; coração tigróide, faixas amareladas vistas no endocárdio MICRO: vesículas revestidas por lipossomos que deslocam o núcleo para periferia Lipidoses: acúmulo de quaisquer lipídeos que não os triglicerídeos (como na esteatose) Geralmente, acúmulo de colesterol e seus ésteres Aterosclerose: depósito de colesterol e peq. qtd. de fosfolipídeos e glicerídeos na t. íntima das artérias médias e grandes Causa principal dislipidemia, mas também hipertensão arterial, sedentarismo, tabagismo, genética Patogênese: doença inflamatória Lesão endotelial Penetração e acúmulo de lipídeos na túnica íntima Adesão de monócitos e plaquetas ao endotélio Migração de células musculares lisas da média para a íntima, onde passam a se multiplicar Síntese e depósito de MEC (colágeno e proteoglicano) Arteriolosclerose: depósito de colesterol, proteínas plasmáticas e outros lipídeos na t. íntima de pequenas artérias e arteríolas Xantomas: nódulos/placas amarelados na pele Surgem em pessoas com aumento do colesterol sérico; Formados por acúmulos de macrófagos carregados de colesterol. Esfingolipidoses: defeitos/falhas de enzimas lisossômicas gerando acúmulo de esfingolipídeos e seus produtos EX: Doença de Fabry, de Niemann-Pick, de Tay-Sachs – acúmulo nos neurônios do SNC Doença de Gaucher – nos macrófagos do fígado e baço Glicogenoses: acúmulo (intralisossômico ou citosólico) de glicogênio devido à deficiência de enzimas que causam sua degradação Mucopolissacaridoses: depósitos intralisossômicos de poliglicanos/proteoglicanos por defeitos enzimáticos Amiloidose: doenças que têm depósito intersticial de substância amiloide Amiloide: material proteico fibrilar, amorfo e acidófilo, comprime e atrofia as células No SNC, é característico da Doença de Alzheimer Morfologia: não há padrões constantes MACRO: órgãos aumentados e firmes Pigmentos: substâncias com cor própria, podem ser: OBS: pigmentação é a formaçãoe/ou acúmulo normal ou patológico de pigmentos no organismo Endógenos Derivados da hemoglobina: bilirrubina, hemossiderina, hematoidina, hematina, hemozoína; Melanina: castanho ao negro, função cutânea de proteção contra UV, absorção de calor, camuflagem Eumelanina: insolúvel, cor negra a acastanhada Feomelanina: solúvel em solução alcalina, cor amarela a avermelhada Ácido homogentísico: grânulos castanho-avermelhados ou amarelos, ocre, acúmulo no plasma e às vezes em cartilagens, pele, tecido conjuntivo. Pode haver seu excesso na urina, na alcaptonúria. Lipofuscina: pardo-amarelados, pigmento de desgaste, marcador biológico do envelhecimento celular Exógenos: penetram pelo ar inspirado, alimento ingerido ou via parenteral Antracose: pigmento de carvão Argiria: pigmento de sais de prata Argirose: quando depositado nos olhos Crisíase: causada pelo uso terapêutico prolongado por sais de ouro Tatuagem: corantes orgânicos, metais e solúveis Calcificação: mineralização patológica, depósito de sais de cálcio enrijecendo os tecidos Calcificação Distrófica: afeta tecidos lesados, não tem a ver com os níveis plasmáticos de cálcio e fósforo. Traz repercussões quando atingem valvas cardíacas. Calcificação Metástica: deposição em tecidos normais devido à hipercalcemia. Pode causar insuficiência pulmonar ou nefrocalcinose (rins). Cálculos: massas de consistência pétrea, ocorrem: No interior de órgãos ocos – bexiga, vesícula biliar; Cavidades naturais – peritoneal, vaginal do testículo; Condutos naturais – ureter, colédoco, ducto pancreático/salivar Interior de vasos Podem gerar traumatismos mecânicos na mucosa (hipotrofia ou necrose dela ou favorecer infecções e inflamações), além de contração da m. lisa e dor (cólica renal, biliar). Nomenclatura Colelitíase/colélitos: cálculos biliares Urolitíase/urólitos: cálculos renais Sialolitíase/sialólitos: cálculos salivares Flebólitos e arteriólitos: vasculares
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