Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Fr an ci sc o C ar lo s Pi er in M en de s C la ud em ira V ie ira G us m ão L op es Je ff er so n de O liv ei ra S al le s Ed uc aç ão e M ei o A m bi en te Francisco Carlos Pierin Mendes Claudemira Vieira Gusmão Lopes Jefferson de Oliveira Salles Educacao e Meio Ambiente ç~ Curitiba 2014 Francisco Carlos Pierin Mendes Claudemira Vieira Gusmão Lopes Jefferson de Oliveira Salles Educacao e Meio Ambiente ç~ FAEL Direção Acadêmica Francisco Carlos Sardo Coordenação Editorial Raquel Andrade Lorenz Revisão Fernanda Calvetti Corrêa Projeto Gráfico Sandro Niemicz Imagem da Capa Shutterstock.com/iadams Arte-Final Evelyn Caroline dos Santos Betim Ficha Catalográfica elaborada pela Fael. Bibliotecária – Siderly Almeida CRB 9/1022 M538e Educação e meio ambiente / Francisco Carlos Pierin Mendes, Claudemira Vieira Gusmão Lopes, Jefferson de Oliveira Salles. – Curitiba: Fael, 2014. 272 p.: il. ISBN 978-85-60531-06-6 Nota: conforme Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. 1. Educação ambiental I. Lopes, Claudemira Vieira Gusmão II. Salles, Jefferson de Oliveira III. Título CDD 372.357 Direitos desta edição reservados à Fael. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael. Educação e Meio Ambiente A sensação de pertencimento ao universo não se inicia na vida adulta e nem por um ato de razão. Desde a infância sen- timo-nos ligados a algo que é muito maior do que nós. Desde criança nos sentimos profundamente ligados ao universo e nos colocamos diante dele, num misto de espanto e respeito. E, durante toda a vida, buscamos respostas ao que somos, de onde viemos, para onde vamos, enfim, qual o sentido da nossa existência. É uma busca incessante e que jamais termina. A educação pode ter um papel nesse processo se colocar questões filosóficas fundamentais, mas também se souber trabalhar, ao lado do conhecimento, essa nossa capacidade de nos encantar com o universo. Moacir Gadotti O pensamento racional da atualidade já se deu conta de que nossa existência não está separada do planeta e de que não existe uma interdependência entre ambos. Chegamos a uma encruzilhada, em que precisamos escolher entre uma vida de consumo e exploração – 4 – Educação e Meio Ambiente irresponsável do local de nossa existência ou uma relação saudável e amistosa com o planeta. Nossa escolha é essencial; porém, nem sempre temos clareza de qual decisão tomar. Nesse sendido, a educação – os processos educacionais –, por meio de sua capacidade de carregar de intencionalidade nossos atos, é o caminho de orientação para nossas opções, o que definirá o futuro que teremos. Partindo dessa concepção, estabelecemos a relação indissociável entre educação e meio ambiente, a qual aponta para a necessidade iminente de uma educação para uma vida sustentável. Moacir Gadotti, na página 63 de sua obra Educar para a sustentabilidade, publicada em 2009 pelo Instituto Paulo Freire, afirma que “precisamos de uma Pedagogia da Terra, justamente porque sem essa pedagogia para a reeducação do homem/ mulher, principalmente do homem ocidental, [...] não poderemos mais falar da Terra como um lar”. É nessa perspectiva que apresentamos a obra Educação e meio ambiente, que tem como objetivo a repercussão dos princípios de uma educação sustentável que, além da preocupação com a relação saudável com o meio ambiente, busca suscitar reflexões sobre o que fazemos com a nossa existência, a partir da vida cotidiana. O homem, na perspectiva de satisfazer suas necessidades de consumo, retira cada vez mais recursos do planeta de forma desordenada, em uma cadeia de exploração, sem perceber que está diante de um complexo sistema. Alexandre de Gusmão Pedrini, organizador da obra Educação ambiental: reflexões e práticas contemporâneas, publicada pela editora Vozes, em 1997, afirma que essa forma arrogante e prepotente de tratar o planeta tornou o ser humano cego ao óbvio, à percepção de que os recursos ambientais são finitos, limitados e estão intimamente relacionados. Na tentativa de reverter a situação, ele cria normas, leis e acordos globais, a fim de discutir o modelo de desenvolvimento econômico e social e sua implicações. Por meio da primeira parte da obra, intitulada “Projetos pedagógicos em educação ambiental”, do autor Francisco Carlos Pierin Mendes, o leitor terá a possibilidade de refletir sobre os processos ambientais e repensar o trabalho em sala de aula. Com ações inovadoras, pode contribuir para a compreensão – 5 – Educação e Meio Ambiente do meio ambiente como elemento fundamental para a vida no planeta, em um complexo emaranhado de relações. Nesse texto, discute-se a emergência do tema, a sua inclusão na escola básica e os novos desafios da sociedade do conhecimento, na qual as tecnolo- gias de comunicação e informação podem contribuir na busca de soluções e alternativas para os problemas enfrentados pelo planeta. A transversalidade na escola, proposta que rompe com a pedagogia tradi- cional e propõe um novo trabalho, dinâmico e contextualizado, possibilitan- do aprender na e sobre a realidade, pode promover uma compreensão mais abrangente acerca dos princípios da educação ambiental. Após o resgate dos diferentes aspectos legais e de pressupostos teó ricos relevantes para a compreensão da importância do trabalho com educação ambiental, essa primeira parte da obra resgata a possibilidade do trabalho com projetos, em uma perspectiva interdisciplinar, de construção coletiva, com ampla participação dos diferentes segmentos escolares na solução dos complexos problemas ambientais. Sugestões de práticas, ações e projetos são apresentadas, de forma a con- tribuir para um trabalho inovador e interdisciplinar, que leve os alunos a desenvolverem uma postura crítica e comprometida com a preservação do ambiente em uma perpectiva de sustentabilidade. Assim, fica o desafio de incorporar a educação ambiental ao cotidiano da escola, de cumprir as orientações prescritas na legislação e, principal- mente, levar ao conhecimento de todos que o planeta Terra é frágil, que responde a todas as interferências do homem e precisa ser preservado para as gerações futuras. Na sequência da obra, no texto “Políticas públicas e iniciativas da sociedade civil em educação ambiental”, escrito pelos autores Claudemira Vieira Gusmão Lopes e Jefferson de Oliveira Salles, a questão ambiental tem como pano de fundo as políticas públicas, contemplando temas como: o desenvolvimento e a necessidade de legislação ambiental; tratados, conferências e acordos internacionais; o papel das ONGs na luta pela preservação ambiental; o papel da sociedade civil na construção de sociedades sustentáveis; políticas de fomento e educação; meio ambiente e interdisciplinaridade. – 6 – Educação e Meio Ambiente Os graves problemas ambientais que afetam o planeta têm mobilizado governos e sociedade civil. Dessa forma, o movimento em prol do meio am- biente tem estado presente na legislação, nos programas de governo e nas diversas iniciativas de grupos e associações. Por outro lado, no âmbito da educação, a cada dia que passa, percebe-se a necessidade de se ampliar a dis- cussão sobre a legislação, até porque a interpretação de uma norma jurídica não deve ser privilégio apenas de juristas. A obra oferece essa possibilidade de discussão e problematização. Além da formação de professores e profissionais da educação em geral, “Políticas públicas e iniciativas da sociedade civil em educação ambiental” pre- tende contribuir, também, com a formação de outros profissionais e ativistas sociais que, mesmo não exercendo a função de professorou pedagogo, atuam no campo da educação não formal, como é o caso de biólogos, psicólogos, lide- ranças e agentes de desenvolvimento regional, extensionistas e ambientalistas. O fato dessa segunda parte da obra levar em consideração a complexi- dade inerente aos problemas ambientais, tomando por base o pensamento de Edgar Morin, nos dá mais uma evidência da necessidade de se mudar o paradigma que vem orientando as pesquisas acadêmicas nos mais diversos campos, incluindo a educação e a educação ambiental. O livro Educação e meio ambiente procura romper o paradigma da repro- dução de princípios e valores da economia insustentável na educação, buscan- do, para tanto, difundir conceitos que auxiliem na educação dos sistemas para e pela sustentabilidade, visando, por meio da educação ambiental, à difusão da educação cidadã, rica em valores de desenvolvimento e dignidade. Ana Cristina Gipiela Pienta1 Vívian de Camargo Bastos2 1 Especialista em Organização do Trabalho Pedagógico pela UFPR e Mestre em Educação pela Pon- tifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Desde 1995, trabalha como professora e pedagoga na Rede Municipal de Ensino de Curitiba e no ensino superior, orientando e acompanhando o estágio supervisionado em cursos de pedagogia. Além disso, é coordenadora do Curso de Pedagogia da Fael, na modalidade a distância. 2 Graduada em Processamento de Dados pela UEPG e em Formação Pedagógica pela UTFPR. É, também, Especialista em Educação a Distância pela Fael. Atualmente, atua como coordenadora do Núcleo de Educação a Distância, na Fael. Sumário Projetos Pedagógicos em Educação Ambiental | 7 1 Educação ambiental: definição e emergência do tema | 15 2 Desafios da educação ambiental na sociedade do conhecimento | 25 3 A inclusão da educação ambiental na escola básica | 35 4 A transversalidade na educação ambiental | 49 5 A superação da dicotomia teoria e prática na educação ambiental | 59 6 A educação ambiental e a formação de professores | 69 7 Os desafios de uma educação ambiental crítica nas escolas | 81 8 Elaboração e análise de projetos em educação ambiental | 93 9 Práticas e ações na educação ambiental | 105 Referências | 12 1 Políticas Públicas e Iniciativas da Sociedade Civil em Educação Ambiental | 131 1 Visão unidimensional de desenvolvimento e necessidade de legislação ambiental | 139 2 Tratados, conferências, convenções e acordos internacionais | 161 3 ONGs e a luta pela preservação ambiental | 183 4 Sociedade civil: sociedades sustentáveis e responsabilidade global | 201 5 Carta das Responsabilidades Humanas | 213 6 Redes de educação ambiental | 229 7 Políticas de fomento: necessidades e compromissos | 241 8 Educação, meio ambiente e interdisciplinaridade | 251 Referências | 261 Projetos Pedagógicos em Educação Ambiental Francisco Carlos Pierin Mendes Prefácio “Nunca um acontecimento, um fato, um feito, um livro têm por trás de si uma única razão de ser.” Paulo Freire Recorri às palavras do mestre Paulo Freire, para iniciar a apresentação do texto de Francisco Carlos Pierin Mendes, com o objetivo de ressaltar a importância de uma obra como esta, que carrega inúmeros sentidos, várias razões de ser. Primeiro, por toda a dedicação e incansável espírito investigativo-científico do autor, depois, pela necessidade de referências sobre o tema, que é bastante atual e carente de discussões científicas e compromissadas. Sabemos que são muitos os desafios ambientais da atualidade, assunto abordado já nos primeiros capítulos, sabemos também que este tema é recorrente na mídia, pois a todo momento somos bom- bardeados com notícias e informações sobre os desastres ambien- tais, efeito estufa, aquecimento global, entre outros. Contudo, cabe ressaltar que conhecimento é diferente de informação. Recebemos – 12 – Educação e Meio Ambiente muitas informações da mídia, mas conhecimento requer estudo, investigação científica, compromisso ético, e somente um estudo sério como o texto “Pro- jetos pedagógicos em educação ambiental” pode apresentar esses elementos. O texto de Francisco vem preencher uma importante lacuna, ao discu- tir a inclusão da educação ambiental na escola básica, bem como destacar a necessária superação da dicotomia entre teoria e prática na educação ambien- tal. Essa é mais uma razão de ser desta obra, que não se serve de discursos fatalistas ou informações mirabolantes, como vemos muitas vezes preconi- zados pela mídia, ao destacar os temas afins, mas uma obra que propõe uma pedagogia ambiental em que teoria e prática se complementam num exercício libertador, que se conjuga com práticas socioculturais, com vínculos interati- vos entre os conteúdos escolares e a ação na sociedade. Outro importante sentido deste texto, que merece destaque, é quanto a apresentação de alternativas, projetos, práticas e ações fundamentadas para a formação pedagógica, necessária para a construção do conhecimento em sala de aula e para a união da teoria com a prática dos educadores em contextos educativos, tornando a educação ambiental, de fato, um processo educativo. Dessa forma, só posso desejar que todos, ao lerem esta obra, tirem o máximo proveito dela, incorporando as aprendizagens ao seu contexto, pois só assim teremos condições de contruir um outro mundo possível, no que diz respeito às questões ambientais. Ana Maria Soek* * É Mestre em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Dedica-se à educação a distância e de pessoas adultas. Trabalha com formação de professores, é autora e editora de livros didático-pedagógicos. Apresentação O texto “Projetos pedagógicos em educação ambiental” oferece ao leitor uma oportunidade de repensar o trabalho com a temática ambiental no ensino fundamental e na educação infantil. Busca-se, com esse material, a superação da dicotomia teo- ria e prática – presente em muitos materiais utilizados no trabalho escolar –, o que ocorrerá por meio de ações diferenciadas, em que os conceitos específicos articulam-se dentro de propostas de transver- salidade e interdisciplinaridade. A inclusão da discussão ambiental na escola básica e no seu entorno apresenta-se como elemento fundamental para a constru- ção de um novo paradigma, que contemple as aspirações popula- res de melhor qualidade de vida socioeconômica e de um mundo ambientalmente sadio. É necessário superar a visão arrogante e pre- potente que torna o homem cego ao óbvio, pois os recursos são finitos e limitados. – 14 – Educação e Meio Ambiente Esse trabalho de conscientização da necessidade de preservação e desen- volvimento sustentável deve começar na escola básica, com o tema educação ambiental sendo abordado em todos os níveis de ensino. Para que possamos atender a esses anseios, também será abordada a importância dos processos de formação dos professores, em que práticas metodológicas diferenciadas devem assegurar o conhecimento dos conteúdos específicos da temática. Os docentes devem ter atitude, reflexão e domínio de procedimentos que favoreçam a pesquisa sobre os complexos temas ambien- tais, o que ressalta a necessidade de uma formação continuada. Serão apresentados elementos que permitirão a elaboração de projetos na educação ambiental, atendendo os educadores numa perspectiva crítica, na qual a conexão entre as questões culturais, políticas, econômicas, sociais, religiosas, estéticas, entre outras, sejam contempladas. Esses projetos devem considerar propostas de ampliação do conheci- mento através de ações interdisciplinares e com a participação da comuni- dade, buscando, permanentemente, soluções para os problemas ambientais. Espera-se que, após a reflexão de todos os assuntos abordados, seja com- preendida a importância do trabalho com a educaçãoambiental nas escolas, valorizando os projetos como importantes ferramentas que podem contribuir para a melhoria da prática pedagógica. O autor.* * Francisco Carlos Pierin Mendes é Mestre em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Atua na rede pública de ensino e é professor do curso de Pedagogia da Fael, nas modalida- des presencial e a distância. 1 Educação ambiental: definição e emergência do tema Desde o início da civilização, o homem, nas diferentes épocas históricas, buscou acumular riquezas utilizando os recursos naturais à sua volta. Quando esses rareavam, empreendia luta na tentativa de encontrar mais e melhores recursos em outras regiões, assegurando as condições de sobrevivência de seu grupo. Assim, travou guer- ras hegemônicas, montou grandes expedições, submetendo povos e seus recursos naturais à sua ganância e exploração. A forma arrogante e prepotente com que tratava o seu meio tornava-o cego ao óbvio: “os recursos ambientais são finitos, limitados e estão dinamicamente inter-relacionados” (PEDRINI, 1997, p. 21). – 16 – Educação e Meio Ambiente Na tentativa de reverter essa situação, o homem percebe a necessidade de discutir seu modelo de desenvolvimento econômico e social e suas impli- cações ambientais. Cria leis, normas, acordos globais, e outros instrumentos que visam conscientizar a sociedade sobre a importância de se preservar o patrimônio natural do planeta. Nesse contexto, apresenta-se a educação ambiental como uma dimensão do processo educativo voltada para a participação de seus atores, educandos e educadores, na construção de um novo paradigma que contemple as as- pirações populares de melhor qualidade de vida socioeconômica e mundo ambientalmente sadio (GUIMARÃES, 1995). Para compreender esse processo, é fundamental recordar o surgimento da educação ambiental no Brasil e no mundo. 1.1 A emergência internacional da temática ambiental A educação ambiental, assim como outros assuntos referentes ao meio ambiente, não pode ser abordada apenas na dimensão local. O ambiente é compartilhado por diferentes povos e nações, por exemplo, um lençol freático contaminado em um bairro ou cidade pode originar um riacho em outra localidade, expandindo assim a contaminação, ou uma indústria que libere resíduos líquidos contaminados nos rios, pode contribuir para alterar as condições de solo, qualidade da água em regiões distantes, trazendo prejuízos à comunidade. A abrangência internacional da degradação do meio ambiente, em determinadas regiões, vem afetando grandes massas populacionais de dife- rentes setores da sociedade. As fronteiras não são fatores de contenção para a poluição atmosférica. No século XIX, quando as questões ambientais não eram preocupação da população e dos governos, alguns já denunciavam a devastação e a destrui- ção do planeta. Como exemplo clássico, podemos citar o cacique indígena norte-americano Seattle, que previu intuitivamente problemas ambientais que seriam enfrentados pela sociedade moderna, cuja causa principal seria a ação desordenada do homem sobre a Terra. – 17 – Educação ambiental: definição e emergência do tema Raquel Carson também denuncia a desatenção com o meio ambiente em sua obra Primavera silenciosa (1962), clássico da história do ambienta- lismo mundial, em que levanta a questão da prática de alguns países de cres- cer às custas dos recursos naturais de países subdesenvolvidos e pobres. No século XX, percebeu-se o início de uma preocupação maior da socie- dade com o equilíbrio ambiental, pois diferentes eventos marcaram passos relevantes na trajetória da EA1 contemporânea, como a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, em Estocolmo (1972), marco inicial de interesse pela educação ambiental. Ao mesmo tempo, o Clube de Roma publicava importante documento baseado no crescimento demográ- fico e na exploração dos recursos naturais, falando sobre um possível colapso da humanidade (PEDRINI, 2002). Na sequência, aconteceu o Encontro de Belgrado (ex-Iugoslávia), em 1975, que gerou A Carta de Belgrado (1994), com a participação de 65 países. Esse documento, dentro de uma nova ética planetária, buscou pro- mover a erradicação da pobreza, do analfabetismo, da fome, da poluição, da exploração e da dominação humana. Além disso, condenou o desenvol- vimento de uma nação às custas de outra e sugeriu a criação do Programa Mundial de Educação Ambiental. Assim, a Unesco criou o Programa Inter- nacional de Educação Ambiental (PIEA), com importantes publicações em diversos idiomas. A Unesco promoveu, então, uma segunda reunião, a mais marcante de todas, que revolucionou a EA: a Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, realizada em Tbilisi (Geórgia), de 14 a 26 de outubro de 1977. Nessa conferência, funções, princípios e recomendações para a educação ambiental foram apresentados (DIAS, 2000). Pedrini (2002, p. 28) ressalta alguns pontos fundamentais dessa conferência: Deveria a EA basear-se na ciência e na tecnologia para a consciência e adequada apreensão dos problemas ambien- tais, fomentando uma nova conduta quanto à utilização dos recursos ambientais. Deveria se dirigir tanto pela educação formal como informal a pessoas de todas as idades. E, tam- bém despertar o indivíduo a participar ativamente na solu- ção de problemas ambientais em seu cotidiano. Teria que ser 1 EA: educação ambiental. – 18 – Educação e Meio Ambiente permanente, global e sustentada numa base interdisciplinar, demonstrando a dependência entre as comunidades nacio- nais, estimulando a solidariedade entre os povos da Terra. Pode-se dizer que são recomendações, princípios, que primam pela união entre as nações, um esforço comum na busca por resolver as questões ambientais, tendo na EA um dos principais fatores que poderiam determinar um desenvolvimento igualitário entre os países. Em 1987, ocorreu em Moscou a terceira conferência, com trezentos educadores de cem países, que avaliaram o desenvolvimento da EA desde a Conferência de Tbilisi, reforçando seus princípios já consagrados e determinando uma reorientação do processo educacional. Nesse encontro, foram apontadas metas de ação para a década de 90 do século XX, que resumidamente seriam: desenvolvimento de um modelo curricular; intercâmbio de informações; desenvolvimento de recursos instrucionais; promoção de avaliações de currículos; capacitação de docentes e licenciados em EA; melhora nas mensagens ambientais veiculadas pela mídia ao grande público, entre outras. No Rio de Janeiro, em 1992, aconteceu a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, também denominada de Conferência de Cúpula da Terra, que reuniu 103 chefes de estado e 182 países. Essa conferência aprovou acordos internacionais oficiais, como a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Agenda 21 e os meios para sua implementação, Declaração de Florestas, Convenção-Quadro sobre Mudanças Climáticas e Convenção sobre Diversidade Biológica. Paralelamente, o governo brasileiro aprovou um documento denominado Carta Brasileira para a Educação Ambiental, que enfoca o estado, em particular as instâncias educacionais como Ministério da Educação (MEC) e Conselho de Reitores, determinando implementação imediata da educação ambiental em todos os níveis. Nessa conferência, participaram ONGs e a sociedade civil – todas as matizes ideológicas e credos –, debatendo questões ambientais e produzindo documentos importantes como o Tratado de Educação Ambiental para Socie- dades Sustentáveis e de Responsabilidade Global. Em Cape Town, África do Sul, em 2002, dez anos após a Conferência Mundial de Meio Ambiente (Rio 92), a Agenda 21 buscou sua chancela e tomou novos rumos, consagrando-se nos espaços político-governamentais.– 19 – Educação ambiental: definição e emergência do tema O mundo aguardava com grande expectativa a Conferência sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (COP 15), realizada em dezembro de 2009, em Copenhague, que contou com a participação de delegações dos 193 países e muitos chefes de estado. Porém, os resultados não confirmaram as expectativas. Acordos preliminares são assinados sem discussão e aprovação em plenária, determinando a implantação de metas modestas para emissão de gases responsáveis por prováveis mudanças climáticas no planeta. Pode- se dizer que ocorreu um pequeno avanço, no entanto, ficou em aberto o espaço para discussões futuras, reafirmando a necessidade de acordos mais consistentes com a participação de todos os países, principalmente os desenvolvidos. Saiba mais Nas discussões sobre a educação ambiental, um documento que merece uma atenção especial é a Carta da Terra, publi- cada em março de 2000, que nasce da colaboração do Con- selho da Terra – constituído a partir da Rio 92 – com a Cruz Verde Internacional, com representantes de vários países. Procure fazer a leitura desse documento, ele significa a ruptura cultural epistemológica com o antropocentrismo e alerta sobre a importância de todos os seres sobre a Terra (FERRERO; HOLLAND, 2004). Para Pedrini (2002), as conferências são importantes fontes de consulta para a prática da EA, não tanto pelas suas contradições e pressupostos políticos, alguns claramente neoliberais, mas pelos avanços técnicos apresentados nos pressupostos pedagógicos arrolados. Diferentes publicações disseminam experiências inovadoras do Terceiro Mundo, relatam resultados de eventos em várias partes do planeta, contribuindo para o avanço nas discussões. No Brasil, simultaneamente às conferências, discussões contribuem para o desenvolvimento de políticas com a perspectiva de melhorar as condições ambientais do País. – 20 – Educação e Meio Ambiente 1.2 Educação ambiental no Brasil No Brasil, a educação ambiental se fez tardiamente, teve início na década de 70 do século XX, coincidindo com o período de início das conferências a nível mundial. Conforme a opinião de muitos pesquisadores, a EA encontra- va-se em estágio embrionário, isto porque em um país periférico as inovações tendem a chegar com atraso em relação aos países centrais. O atraso no início da discussão ambiental também é justificado pela situação política vivenciada no País, pois nesse período o regime autoritário comandava as ações. Em um breve olhar para o passado, constata-se que o debate ambiental se instaurou no País sob a égide do regime militar, nos anos 70 do século XX, muito mais pela força de pressões internacionais do que por movimentos sociais de cunho ambiental nacionalmente consolidados (LOUREIRO, 2004). No entanto, com a abertura política, algumas ações, projetos e programas passam a ser desenvolvidos, garantindo a inclusão do tema na Constituição de 1988. O ambientalismo ganha caráter público e social efetivo no Brasil apenas no final da década de 80 do século passado, quando começam a surgir, mais intensamente, trabalhos acadêmicos abordando a temática, paralelos ao en- volvimento maior da sociedade nessa questão, tendo em vista um processo de abertura política. Com a Conferência para Desenvolvimento e Meio Ambiente do Rio de Janeiro, também conhecida como Eco 92, a EA se estabelece perante a sociedade brasileira como uma demanda institucional, determinando o desenvolvimento de muitos projetos. A expressão educação ambiental se massifica, porém, seu con- ceito ainda não é muito claro entre os educadores e a população em geral, sendo muitas vezes confundido com o ensino de ecologia (GUIMARÃES, 1995). Diferentes relatórios apontam como um dos principais problemas que determinaram a precariedade da educação ambiental como política pública, o fato de não ter sido tratada como parte da área de educação e sim como de meio ambiente. Essa falta de percepção da EA como processo educativo, reflexo de um movimento histórico, pro- duziu uma prática descontextualizada, voltada para a solução de problemas de ordem física do ambiente, incapaz de discutir ques- tões sociais e categorias teóricas centrais da educação (LOUREIRO, 2004, p. 81). – 21 – Educação ambiental: definição e emergência do tema Na década de 90 do século XX, pela mobilização social em decorrência da Rio 92 ou pelo alcance global das questões ambientais, o Governo Fede- ral, por meio do Ministério da Educação e do Ministério do Meio Ambiente, produziu importantes documentos, como o Programa Nacional de Educa- ção Ambiental (1994), que definiu algumas linhas de ação para a temática ambiental: inclusão da educação ambiental no ensino formal; educação no processo de gestão ambiental; realização de campanhas específicas de EA; busca de cooperação com os meios de comunicação e com os comunicadores sociais; articulação e integração das comunidades e articulação intra e inte- rinstitucional; criação de um rede de centros de educação ambiental, entre outras (BRASIL, 2003, p. 9). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN n. 9.394/96), no Artigo 36, inciso I, prevê a EA como conteúdo curricular da educação básica a ser ministrada de forma multidisciplinar e integrada em todos os níveis. Ela é o único dispositivo legal que prevê a inclusão da temática na área de educação, e isto pode ser considerado um avanço. Em 1997, com base na LDBEN, são produzidos e lançados os Parâ- metros Curriculares Nacionais. Esse documento definiu temas de relevância social, urgência e universalidade, tratados transversalmente e com eixos defi- nidos nas disciplinas, além disso, constituiu avanço significativo ao determi- nar que a temática ambiental seja inserida não como disciplina, e sim como elemento a ser abordado em diversas áreas do conhecimento. Em 27 de abril de 1999, a Lei n. 9.795 (BRASIL, 1999), que dispõe sobre a educação ambiental, foi sancionada, instituindo a Política Nacional de Educação Ambiental e outras providências. Entre elas podemos destacar a definição de EA como componente essencial e permanente da educação nacional, seus princípios – com enfoque humanista, holístico, democrático e participativo – e os objetivos, visando o desenvolvimento de uma compre- ensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações. Regulamentando a lei, temos o Decreto n. 4.281, de 25 de junho de 2002, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental e cria o órgão gestor da política, dirigido pelos Ministérios da Educação e do Meio Ambiente, com assessoramento de diferentes entidades ligadas à sociedade organizada (BRASIL, 2002). – 22 – Educação e Meio Ambiente Para Loureiro (2004), apesar da mobilização dos educadores ambientais e da aprovação da lei que define sua política nacional, a educação ambiental ainda não se consolidou como política pública de caráter democrático, universal e includente. No entanto, a construção de espaços de diálogo que envolvem redes, universidades e os Ministérios do Meio Ambiente e da Educação, constituem avanços nas políticas de EA. Esse breve relato do percurso da EA permite conhecer um pouco da sua história, construída, principalmente, com base nas conferências, marcadas pela contradição, visto os diferentes interesses econômicos e de mercado que permeiam a temática ambiental. 1.3 O que é a educação ambiental? Para que possamos compreender melhor como está sendo construída a temática educação ambiental no contexto atual e, principalmente, no Brasil, recorremos a alguns autores que abordam o tema em livros e artigos acadê- micos. Essa definição se apresenta como elemento fundamental para com- preender a inclusão da EA na escola e nas diferentes modalidades de ensino. Entre as muitas definições apresentadas,pode-se dizer que a de Tbilisi (1977) significa um marco no desenvolvimento da EA. Pois apresenta a EA como um processo de reconhecimento de valores e clarificação de conceitos, objetivando o desenvolvimento das habilidades e modificando atitudes em relação ao meio, para entender e apreciar as inter-relações entre humanos, suas culturas e seus meios biofísicos. A educação ambiental também está relacio- nada à prática das tomadas de decisão e a ética que condu- zem para a melhoria na qualidade de vida (CONFERÊNCIA INTERGOVERNAMENTAL DE TBILISI apud SATO, 2003, p. 23). Esses princípios, estratégias e objetivos são definidos em Tbilisi, conforme consta no Programa Parâmetros em Ação Meio Ambiente na Escola: [...] uma dimensão dada ao conteúdo e à prática da educa- ção, orientada para a resolução dos problemas concretos do meio ambiente, através de enfoques interdisciplinares e de uma participação ativa e responsável de cada indivíduo e da coletividade (BRASIL, 2001, p. 13). – 23 – Educação ambiental: definição e emergência do tema Essa conferência apresentou a educação ambiental como fator primor- dial para que a riqueza e o desenvolvimento dos países sejam atingidos igua- litariamente. Ainda, determinou que a EA deve ser abordada pela educação formal e informal, procurando atingir pessoas de todas as idades, despertando o indivíduo a participar ativamente da solução de problemas ambientais de seu cotidiano (PEDRINI, 1997). Outra definição importante está presente na Lei n. 9.795, que dispõe so- bre a educação ambiental e institui a Política Nacional de Educação Ambiental: Art. 1º. Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduos e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e com- petências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial a sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (BRASIL, 1999). Existem diferentes definições atribuídas à educação ambiental, porém, a sua inclusão na escola ainda se apresenta como um grande desafio aos educadores. A historicidade da educação ambiental no Brasil apresentada no texto nos diz que, apesar de ser considerada um assunto recente no meio educativo e na sociedade civil, já se consolidou como campo de estudo sistematizado e de grande importância nas discussões ambientais no país. Da teoria para a prática “Nós somos a Terra, gente, planta e animais; somos chuva e ocea nos. Honramos a Terra que é o lugar dos seres vivos. Apreciamos a beleza da Terra e sua diversidade de vida” (CARTA DA TERRA apud SATO, 2003, p. 57). O professor pode conversar com seus alunos sobre as ques- tões citadas acima, se o homem realmente vem respeitando a Terra. Na sequência, pode trabalhar alguns princípios da Carta da Terra, como: respeito e cuidado com a comunidade da vida e integridade ecológica. Isso pode ser feito por meio de dinâmicas que permitam a participação dos alunos, como dra- matizações, teatro, entre outras. – 24 – Educação e Meio Ambiente Síntese Neste capítulo refletimos sobre a degradação ambiental que ocorre em todos os continentes, sobre como os problemas ambientais criados por um país distante interferem diretamente em regiões próximas, determinando o caráter global das questões ambientais. Conhecemos aspectos que determinaram a emergência internacional do estudo da EA e também o surgimento da temática no Brasil, a partir da aber- tura democrática e da participação do país em importantes conferências sobre o tema, culminando com a organização da Rio 92. As conferências criadas pela comunidade internacional se apresentam como espaços importantes para a discussão dos problemas ambientais e para a tomada de decisões coletivas, visto a abrangência do assunto. Por meio dessas reflexões, procurou-se definir a educação ambiental no contexto brasileiro, como processos coletivos e individuais, ações, habilida- des, atitudes e conhecimentos voltados à conservação do meio ambiente e à melhoria nas condições de vida da população. Podemos dizer, ainda, que a educação ambiental se apresenta como um campo de estudo que jamais estará pronto, quanto à sua forma ou seu conte- údo. No entanto, pesquisadores estarão à procura de caminhos para atender às reais necessidades da temática, de forma a torná-la mais eficiente na sua missão de contribuir para a melhoria das questões ambientais do planeta. Glossário 2 Antropocentrismo: Relativo a antropocêntrico, concepção que considera que a humanidade deve permanecer no centro do enten- dimento dos humanos, isto é, o universo deve ser avaliado de acordo com a sua relação com o homem. É normal se pensar na ideia de “o homem no centro das atenções”. 2 Epistemológica: Relativo à epistemologia, que estuda a origem, a estrutura, os métodos e a validade do conhecimento. 2 Desafios da educação ambiental na sociedade do conhecimento Neste capítulo tem-se a intenção de discutir a educação ambiental no mundo contemporâneo, os seus desafios e a necessi- dade de respeitar às diversidades cultural, social e biológica. Tristão (2002) apresenta alguns desafios que podem con- tribuir para que a educação ambiental realmente tenha significado nessa sociedade que valoriza o conhecimento, as informações e as novas tecnologias. Aliado a isso, discutiremos a contribuição das novas tecnolo- gias e seus efeitos sobre a complexa estrutura ambiental do planeta. – 26 – Educação e Meio Ambiente 2.1 O desafio A educação ambiental, entendida como uma prática transformadora, comprometida com a formação de cidadãos críticos e corresponsáveis por um desenvolvimento que respeite o ambiente e as diferentes formas de vida, enfrenta muitos desafios neste início de século (TRISTÃO, 2002). O momento pede uma articulação de princípios teóricos que funda- mentam a educação ambiental com o pensamento contemporâneo. “O res- peito às diversidades cultural, social e biológica é o fio condutor das rela- ções estabelecidas com o contexto contemporâneo.” (TRISTÃO, 2002, p. 169). Vivenciamos uma nova fase, outra realidade, que o autor denomina de pós-modernidade ou modernidade tardia, em que uma ruptura com a racionalidade instrumental – levando a um saber pertinente e significativo, ou melhor, capaz de contextualizar a informação incluindo-a no contexto global – se faz necessária. Nesse contexto, vemos a possibilidade de articulação entre diferentes dimensões. Religar o que parece disjunto é o grande desafio da educação ambiental, sendo viável apenas com a desconstrução da lógica de uma única dimensão, não sendo possível uma única base conceitual para lidar com as diferenças e antagonismos. A complexidade ambiental vem ao encontro do que está sendo discu- tido, o seu entendimento só ocorre a partir do conceito de diversas discipli- nas, é tecido a partir da convivência, do diálogo inter, trans e pluridisciplinar (ARDOINO apud TRISTÃO, 2002). Percebe-se que os conceitos que contribuem para discutir os desafios da educação ambiental extrapolam o limite das disciplinas, são transversais, multirreferenciais. Com o objetivo de desvendar os desafios da educação ambiental na sociedade contemporânea, Tristão (2002) pontua brevemente alguns deles. 2.1.1 Enfrentar a multiplicidade de visões A educação é uma área de interseção de múltiplos saberes, sendo impos- sível pensar a educação ambiental através da metáfora da árvore do conheci- – 27 – Desafios da educação ambiental na sociedade do conhecimento mento, em que temos um tronco comum irradiando os galhos das diferentes “especializações” (GALLO, 1999). O pensamento e o conhecimento não podem ser pensados de maneira linear e hierarquizada como a metáfora propõe. Apesar da origem comum, vários campos devem se integrar visando à articulaçãodos saberes, a multi- plicidade de visões. Outra metáfora, chamada de rizoma, é apresentada pelo autor com base nos trabalhos de Deleuze e Guattari (1996), em que a dimensão ambiental está associada a todas as dimensões humanas, cujos conceitos estão entre- laçados, interligados, articulados, permitindo possíveis trânsitos de múlti- plos saberes. Assim, o professor deve estar preparado para trabalhar com a diversidade de visões, saber fazer a conexão entre as culturas. É importante que a educa- ção ambiental respeite a diversidade social, cultural e biológica e, através da escola, procure passar da simples transmissão do conhecimento para o estabe- lecimento de uma comunicação crítica, criadora de um sistema imaginativo e transformador da cultura e do ser humano. 2.1.2 Superar a visão do especialista A especialização contribuiu muito para o desenvolvimento das ciên- cias, inúmeros foram os benefícios com a fragmentação, o aprofunda- mento, a exploração e a experimentação do conhecimento. Como con- sequência, essa lógica se estendeu para a sociedade e para as relações humanas, determinando uma dificuldade em adotar uma abordagem multidisciplinar. Essa concepção que fraciona, separa os problemas em uma única dimen- são, impossibilita a reflexão multidimensional e a capacidade de compreensão a longo prazo, pois o especialista pensa apenas no imediato. Ao contrário dessa postura, professores que irão trabalhar com a edu- cação ambiental devem ousar e buscar romper as barreiras conceituais que existem entre as disciplinas, “visando a constituição de um conhecimento que compreenda a interação entre diferentes fenômenos da realidade, além – 28 – Educação e Meio Ambiente de buscar os exercícios de práticas coletivas mais flexíveis e vivenciais” (TRIS- TÃO, 2002, p. 175). Essa visão de especialista poderá ser superada também com uma abordagem interdisciplinar, muito falada na educação ambiental, com coo peração, interação e inter-relacionamento explícito entre as disciplinas. Porém, é difícil falar da interdisciplinaridade como proposta para supe- ração da visão do especialista, se considerarmos que a estrutura de currículo presente na maioria das escolas não apresenta articulação entre as discipli- nas. Ações ditas interdisciplinares não passam de projetos multidisciplinares (TRISTÃO, 2002). Disciplinas como as ciências naturais e a geografia têm afinidade de con- teúdos, pois abordam questões ambientais. No entanto, a inserção dos conte- údos ocorre por meio de exercícios multidisciplinares, acontecendo, às vezes, uma certa cooperação entre as disciplinas. Desmontar tudo que foi construído pelas disciplinas e acabar com todas as barreiras pressupõe uma mudança radical, que não acontece rapidamente. [...] a interdisciplinaridade pode propiciar uma organicidade, encarando as disciplinas como abertas ou fechadas, ao mesmo tempo rompendo aos poucos a concepção parcelada de conhecimento (TRISTÃO, 2002, p. 175). Destruir essas barreiras contribui para que a educação ambiental passe a ser abordada de forma interdisciplinar, superando assim a visão fragmentada e descontextualizada do especialista. 2.1.3 Superar a pedagogia das certezas A pedagogia foi marcada por um ideal de ciência objetivista, pelo estudo de um mundo-objeto, distante, externo do sujeito cognoscente1, que imprimiu à educação uma tecnificação sustentada por uma pseudoneutralidade da ciência, da certeza, que afasta os envolvidos da atitude reflexiva (TRISTÃO, 2002). Diante disso, a importância da educação ambiental, 1 Cognoscente: sujeito capaz de adquirir conhecimento. – 29 – Desafios da educação ambiental na sociedade do conhecimento que não se propõe apenas a ampliar o conteúdo do processo edu- cativo inserindo mais um objeto denominado meio ambiente, mas implica rever os pressupostos epistemológicos da pedagogia moder- na sustentada em uma razão instrumental, acrescentando a essa pe- dagogia a compreensão de uma sociedade diferente, múltipla, hete- rogênea, diversa e cheia de contradições (TRISTÃO, 2002, p. 177). Para o autor, assimilar as incertezas traz grandes contribuições para uma nova prática no trabalho com a educação ambiental, já que esta, muitas vezes, está dominada por “verdades ecológicas”, ou mesmo por concepções de que a natureza é harmônica, como encontramos em documentos oficiais. 2.1.4 Superar a lógica da exclusão A complexidade da sociedade moderna, aliada ao caráter integrador do tema meio ambiente, que permite por meio da teoria e da prática estudar as diferentes dimensões da sociedade, apresenta-se como grande desafio em um contexto muito mais amplo, a luta para superar a lógica da exclusão. Em uma abordagem que valorize a sustentabilidade, propõe-se superar a lógica da exclusão através da eliminação das desigualdades entre classes, po- vos e nações, abolindo a pobreza e procurando garantir um desenvolvimento satisfatório para todos. Tristão (2002) faz referência às consequências provocadas pela globalização – apoiada em tecnologias da informação, sistemas de pesquisa e de desenvolvimento – como responsáveis pela reprodução de desigualdades sociais no Brasil e em outros países periféricos. A valorização da concepção econômica em detrimento da socioambiental é determinante para o aumento dessas desigualdades. A sustentabilidade, enquanto concepção, deve superar a globalização, pois as necessidades de saúde, água de qualidade, ar puro e beleza natural são fundamentais para o bem-estar humano. Aqui entra a questão da ética socioambiental como um conjunto de comportamentos significativos, envolvendo a sociedade como um todo. Ao contrário dessa postura, a globalização promove uma polarização entre países pobres e ricos. [...] essa falta de solidarie- dade global exigida por este contexto exclui a maioria (TRISTÃO, 2002, p. 181). – 30 – Educação e Meio Ambiente Esse contexto global determina uma falta de solidariedade. Por um lado, ocorre uma pressão por uma padronização da economia, e por outro, a afir- mação de uma cultura homogenizadora dos padrões de consumo, ocasionan- do grandes problemas sociais, principalmente nos países mais pobres. Assim, nos países centrais, ricos, o risco maior está na deteriorização dos recursos naturais pelo consumismo exagerado, enquanto que os pobres enfren- tam outros tipos de riscos, como a exclusão dos serviços básicos de saúde, edu- cação, saneamento e pobreza, fatores esses que determinam um aumento da pressão sobre a natureza (TRISTÃO, 2002). A superação desse impasse não ocorrerá enquanto não sobrepujarmos essa visão dual de mundo e da vida, que sustenta todo o pensamento moder- no (ASSMANN, 1998). A lógica racional exclui alguns sentimentos impor- tantes, como a emoção e a intuição, fundamentais para estreitar os laços com a natureza e para se viver em solidariedade, determinando, assim, o compar- tilhamento da insensibilidade em relação à lógica excludente. Desse modo, faz-se necessária uma compreensão da correlação entre a pro- blemática ambiental e social. Os problemas ambientais surgiram na ecologia, com base disciplinar na biologia, portanto, somente as ciências naturais se in- teressaram pelo seu estudo, o que determina uma redução da sua abordagem. Com o aumento da complexidade dos problemas ambientais, percebeu- -se a necessidade de entrelaçar, de estabelecer uma relação de interdepen- dência entre vários fenômenos, relacionando os estudos da natureza com a sociedade (TRISTÃO, 2002). O trabalho dos educadores – buscando um ensino que inclua temas de significação social, como de uma educação ambiental que seja comprometida com a sustentabilidade socioambiental – é fundamental para superar a lógica da exclusão presente na sociedade moderna. 2.2 As novas tecnologias e a educação ambiental A humanidade é a responsávelpor muitos dos avanços científicos ocorri- dos nos últimos cinquenta anos. Nunca houve tantas alterações, modificações – 31 – Desafios da educação ambiental na sociedade do conhecimento e destruições na complexa estrutura ambiental do planeta, cujos reflexos po- dem ser percebidos em qualquer parte do globo. Para Leff (2002, p. 194), as transformações que determinaram a chamada crise ambiental foram produzidas pelo “desconhecimento do conhecimento”, quando produzem a falsa certeza de que todas as modificações e consequências desse processo sobre o ambiente podem ser resolvidas com a ajuda da tecnologia. Saiba mais Considerado o pai da filosofia moderna, Descartes (1999) desenvolveu o método dedutivo, com inúmeras contribuições para a matemática. Esse método pode ser dividido em quatro fases: evidência, análise, síntese e remuneração. Descartes tornou possível, assim, avanços significativos na ciência, porque possibilitou que os problemas fossem abordados a partir de suas partes. Nesse contexto, faz-se necessária uma reapropriação do conhecimento, ou a aprendizagem de uma nova forma de viver, superando as concepções do paradigma cartesiano e buscando a construção de novo saber ambiental que “perpassa pela compreensão de que mais do que aprender informações sobre o ambiente precisa-se aprender/compreender como o conhecimento atua sobre o mesmo” (GOUVÊA, 2006, p. 4). Assim, esse aprendizado, compreendendo como o conhecimento pode atuar sobre o ambiente, pode ser facilitado pelo uso de diferentes tecnologias da comunicação e da informação. Para Gouvêa (2006), a conscientização dos problemas ambientais ocorre pela divulgação das informações, e pela capacidade do indivíduo de transformar essas informações sobre as diferentes questões ambientais em conhecimentos. Segundo Gadotti, O desenvolvimento espetacular da informação, quer no que diz respeito às fontes, quer à capacidade de difusão, está gerando uma verdadeira revolução, que afeta não apenas a produção e o trabalho, mas principalmente a educação e a formação (2000, p. 33). – 32 – Educação e Meio Ambiente Essas novas tecnologias, que estão sendo incorporadas aos pro cessos edu- cativos, permitem uma formação continuada, trocas de experiências bem-su- cedidas e também uma reflexão sobre o conhecimento no mundo real. Saiba mais Um texto importante para ampliar seu conhecimento em rela- ção às tecnologias e sua importância na sociedade do conhe- cimento é: “As novas tecnologias na educação ambiental: ins- trumentos para mudar o jeito de ensinar e aprender na escola”, de Paulo Blikstein (2007). Disponível no link: <http://portal. mec.gov.br/secad/CNIJMA/arquivos/educacao_ambiental/ novas_tecnologias.pdf>. Além da informação, a comunicação ganha espaço nesse novo cenário, as diferentes linguagens facilitam a discussão. O conhecimento, que antes ficava restrito ao meio acadêmico, técnico, agora é veiculado pela mídia. Como resultado dessa democratização, temos uma reflexão maior, principalmente em relação aos problemas ambientais (GOUVÊA, 2006). A internet se populariza, constituindo-se no grande canal de divulgação de informações textuais, músicas, filmes, mapas e outras informações varia- das. O seu uso acarretou uma verdadeira revolução no tratamento de diferentes informações, permitindo interatividade e, principalmente, facilitando o acesso a diferentes informações em tempo real. Assim, tratando-se da educação ambiental “o professor deve conseguir pro- blematizar o saber ambiental apresentado no suporte digital, colocando-o em uma perspectiva onde os alunos possam se apropriar e utilizá-lo para a construção de atitudes ecológicas” (GOUVÊA, 2006, p. 64). A tecnologia na escola não é só uma ferramenta. Alguns itens tecnológi- cos deixam de ser complementos e se tornam parte integrante da nossa vida, como o computador, que dá sustentação a todas as nossas atividades, na sala ou fora dela. O grande impacto da tecnologia não é permitir apenas a pro- cura de informações na internet ou a conversa com amigos pelas diferentes ferramentas de comunicação, mas, sim, usá-las para expressar seus interes- – 33 – Desafios da educação ambiental na sociedade do conhecimento ses intelectuais e científicos, sua indignação com os problemas do mundo, como o meio ambiente, criando alternativas e artefatos para contribuir com a mudança desta realidade (BLIKSTEIN, 2007). Pode-se dizer que o uso das novas tecnologias de comunicação com ênfase na educação ambiental representa um avanço, visto que, com a inte- gração da informática e de outros meios, pode haver uma sensibilização e conhecimento dos ambientes e de seus problemas. Esse mundo virtual pode contribuir para a incorporação de conhecimentos ambientais que irão emba- sar a discussão sobre o desenvolvimento de uma sociedade sustentável, respei- tando o ambiente (RODRIGUES; COLESANTI, 2008). Essas novas tecnologias de informação e comunicação (NTICs) desem- penham papel fundamental na construção de novas redes sociais e de ambien- tes educacionais interativos, armazenando e disponibilizando informações em tempo real. Nesse contexto, “o educador não pode estar à margem de todas as mudanças, uma vez que estas estão refletindo diretamente na escola” (GOU- VÊA, 2006, p. 4). Deve inserir e discutir diferentes instrumentos que possi- bilitem novas formas de trabalho, principalmente com a educação ambiental, dentro de princípios éticos, que contribuam para a solução de diferentes pro- blemas ambientais. Para Gouvêa (2006), essas tecnologias poderão contribuir para uma nova visão do mundo, respeitando as relações homem-natureza, suas interações, e visando a não destruição dos recursos naturais do planeta. Finalmente, a introdução das tecnologias pode contribuir interligando novos saberes na busca por uma compreensão maior desta complexa rela- ção entre homem-natureza-sociedade, dentro de um processo de autonomia, liberdade e respeito ao ambiente. Da teoria para a prática O professor deve pensar em ações que possam ser desenvolvidas junto aos alunos, na perspectiva de diminuir os efeitos da tecnologia sobre o ambiente. Como exemplo, podemos citar a importância – 34 – Educação e Meio Ambiente de reciclar as pilhas de celular, aparelhos eletrônicos que foram descartados, CDs, DVDs e outros materiais, diminuindo assim a contaminação do ambiente com perigosos resíduos. Síntese Neste capítulo, foi possível perceber alguns desafios enfrentados pela educação ambiental na busca por uma prática transformadora e comprome- tida com a formação de cidadãos críticos, responsáveis e que busquem um desenvolvimento que respeite o ambiente e as diferentes formas de vida. Como desafios a serem superados para que essa prática possa ser imple- mentada, temos: o enfrentamento da multiplicidade de visões, a superação da visão do especialista, da pedagogia das certezas e da lógica da exclusão, o que pode ocorrer por meio da eliminação das desigualdades. Observamos, também, a importância das novas tecnologias da informação e da comunicação como forma de conscientização acerca da busca de alternati- vas para os problemas ambientais enfrentados pelo planeta 3 A inclusão da educação ambiental na escola básica É consenso entre educadores que a temática meio ambiente deve estar presente na escola. Isso devido à gravidade da situação ambiental em todo o mundo e à necessidade de ações educacionais, que instrumentalizem as gerações futuras sobre o uso adequado dos recursos e sobre a preservação da natureza. Assim, neste capítulo, após a justificativa da inclusão da educação ambiental nas escolas, faremos uma explanação dos Parâmetros Curriculares Nacionais, volume específico sobre o meio ambiente, seus encaminhamentos e orientações quanto ao trabalho com a questãoambiental, além de uma reflexão sobre a Lei n. 9.795, que estabelece a Política Nacional de Educação Ambiental. – 36 – Educação e Meio Ambiente 3.1 O porquê da educação ambiental na escola Desde o início do processo de concepção da educação ambiental, o debate estava centrado na sua caracterização como disciplina no ensino for- mal. Porém, com o avanço nas discussões, a orientação é que ela faça parte de todas as outras disciplinas, como uma prática integrada. Essa questão é corroborada pela Lei n. 9.795 (BRASIL, 1999), que diz: Art. 10. A educação ambiental será desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal. § 1º. A educação ambiental não deve ser implantada como disciplina específica no currículo de ensino. As escolas, em geral, restringem sua prática ambiental a projetos temáticos, que são desarticulados do currículo e que não permitem o diálogo entre as áreas de conhecimento. Frequentemente, são ações ou campanhas isoladas e próximas a datas comemorativas (BRASIL, 2001, p. 17). As condições em que a prática em educação ambiental está sendo introduzida nas escolas podem ser resumidas em alguns itens (BRASIL, 2001, p. 18): 2 Não está institucionalizada nas secretarias de educação, percebe-se a ausência de articulação com as demais políticas educacionais. 2 O profissional que irá trabalhar a temática possui formação ini- cial deficitária, tradicional e fragmentada. Alimenta uma prática de ensino descontextualizada da realidade em que irá atuar e não contempla a educação ambiental. 2 Os projetos não estão articulados ao projeto político-pedagógico da escola. 2 Como área complexa que não se apresenta como disciplina espe- cífica, depende de discussão e acesso a informações atualizadas, visando à apropriação do repertório de conceitos específicos da temática. Podemos dizer que as lacunas apontadas necessitam ser preenchidas. Porém, é notório o crescente interesse pelas questões ambientais nas escolas – 37 – A inclusão da educação ambiental na escola básica brasileiras, mobilizando, muitas vezes, a comunidade escolar, que é um dos elementos que pode garantir o sucesso nas ações sobre o meio ambiente. As tendências percebidas na educação refletem o pensamento da socie- dade. Assim, podemos dizer que as transformações nos currículos e no sis- tema educacional, de uma forma geral, refletem a preocupação social com a natureza e com o meio ambiente (BRASIL, 2001). Referenciais empíricos abordam com muita propriedade a crise ambiental planetária da atualidade, seus sintomas figuram frequente- mente em jornais, periódicos especializados e na mídia de uma forma geral (SOFFIATI, 2002). Um exemplo claro dessa situação é a questão das altera- ções de ordem climática, que geram uma demanda de conhecimento sobre os efeitos que determinados gases emitidos em maior quantidade podem provocar sobre o planeta. Pela gravidade da situação ambiental em todo o mundo, assim como no Brasil, já se tornou categórica a necessidade de implementar a EA para as novas gerações em idade de forma- ção de valores e atitudes, como também para a população em geral, pela emergência da situação em que nos encontramos (GUIMARÃES, 1995, p. 15). Em função dessa necessidade, é importante o papel da educação ambien- tal alimentando a necessária integração do ser humano com o meio ambiente e possibilitando, por meio da aquisição de novos conhecimentos, atuarmos como cidadãos conscientes do processo de transformação ambiental que nosso planeta sofre, e as inúmeras consequências que isso acarreta. Vivemos um momento muito favorável à institucionalização da educação ambiental nas escolas, que pode favorecer também a conquista de um espaço maior no currículo da educação básica. Não esquecendo que há muito a fazer para consolidar o trabalho com a temática ambiental, no sentido de formar alunos capazes de compreender as diferentes relações com o meio ambiente. 3.2 Educação ambiental na escola Apesar de a temática ambiental ser amplamente divulgada e estar pre- sente em um grande número de escolas, em que são desenvolvidos diferentes – 38 – Educação e Meio Ambiente projetos visando à conscientização da necessidade de preservação dos recursos naturais, podemos dizer que essa inclusão foi recente. Esse processo teve início com o Decreto Federal n. 73.030 (BRASIL, 1973), que criou a Secretaria Especial de Meio Ambiente. Essa secretaria, entre outras orientações, explicitava a necessidade de educação do povo brasileiro visando ao uso adequado dos recursos naturais, contribuindo, assim, para a conservação do meio ambiente. A Política Nacional de Meio Ambiente, instituída pela Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981, em seu Artigo 2º, inciso X, determinava a necessidade de promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino, procurando, também, incluir a comunidade neste processo, tendo como objetivo capacitá- la para participar ativamente na defesa do meio ambiente (BRASIL, 1981). Percebe-se uma superficialidade no trato com a educação ambiental pela legislação brasileira. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN n. 9.394/96), que organiza e orienta toda a questão educacional no país, faz poucas menções à questão ambiental. Apenas em seu Artigo 32, inciso II, diz que: Art. 32. O ensino fundamental, com duração mínima de oito anos, obrigatório e gratuito na escola pública, terá por obje- tivo a formação básica do cidadão, mediante: II – a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fun- damenta a sociedade (BRASIL, 1996). No artigo 26, parágrafo 1º, a Lei n. 9.394 fala que [...] tanto no ensino fundamental como médio os currículos devem abranger os conhecimentos do mundo físico e natural, da realidade social e política do Brasil, faltando uma orienta- ção específica para a abordagem ambiental (BRASIL, 1996). Na tentativa de orientar o desenvolvimento do trabalho relacionado à educação ambiental, o MEC apresentou, em 1997, os Parâmetros Curriculares Nacionais. Esse documento orienta o trabalho pedagógico e aponta metas de qualidade que deveriam ajudar o aluno a enfrentar o mundo atual como cida- dão participativo, reflexivo e autônomo. O volume 9 aborda especificamente as questões do meio ambiente. – 39 – A inclusão da educação ambiental na escola básica 3.3 Os Parâmetros Curriculares Nacionais e o meio ambiente No volume dos PCN em que são discutidas, as questões ambientais são consideradas urgentes e fundamentais para o futuro da humanidade, futuro esse que depende das relações do homem com a natureza e com os recursos naturais disponíveis. A intenção do documento é discutir questões relativas ao meio em que vivemos, considerando os elementos físicos e biológicos e os diferentes modos de interação. A primeira parte dos PCN aborda a questão ambiental a partir de um histórico dos modelos de desenvolvimento econômico e social em curso nas sociedades modernas. Também discorre sobre a importância da educação ambiental e apresenta os objetivos para o ensino fundamental. Além disso, discute o desenvolvimento das sociedades, em que o homem, pelo avanço tecnológico, aumenta sua capacidade de intervir na natureza, buscando cada vez mais satisfazer seus desejos e necessidades cres- centes, o que gera tensões e conflitos quanto ao uso dos recursos naturais. Nesse contexto, o processo de industrialização dos últimos séculos, por meio do seu modo de produção e organização do trabalho, mecanização da agricultura – incluindo o uso intenso de agrotóxicos –, urbanização e processo de concentração populacional nas cidades, trouxe consequências indesejáveis ao ambiente, que se agravam com igual velocidade ao desen-volvimento tecnológico. Para alguns, os problemas decorrentes do desenvolvimento tecnológico, econômico e social podem ser resolvidos pela comunidade científica, pois confiam “na capacidade da humanidade produzir novas soluções tecnológicas e econômicas a cada etapa, em resposta a cada problema que surge, perma- necendo basicamente no mesmo paradigma civilizatório dos últimos séculos” (BRASIL, 1997b, p. 20). Já para outros, a questão ambiental é como uma síntese dos impasses que o atual modelo de civilização acarreta, considerada como uma crise ambiental e não apenas como uma crise civilizatória, cuja superação exigirá mudanças profundas em concepções de mundo, de natureza, de poder e de bem-estar, determinando novos valores individuais e sociais, em que o homem não é mais o centro da natureza (BRASIL, 1997b). – 40 – Educação e Meio Ambiente Há, ainda, os que pensam que o homem deveria perceber-se como parte integrante da natureza, resgatando a noção de sacralidade desta, presente em muitas culturas tradicionais, antigas e contemporâneas. Percebe-se que tanto uns quanto outros reconhecem que a divisão, a fragmentação instituída pela ciência clássica ocidental para estudar essa reali- dade ambiental, não é suficiente para a compreensão dos diferentes fenôme- nos da natureza. Essa complexidade da natureza exige uma abordagem diferenciada, em que os diferentes componentes devem ser vistos como parte de um todo, de um sistema maior, com correlações e interações com os demais componentes em seus diferentes aspectos. Assim, a questão ambiental não deve ser vista apenas como um conjunto de temáticas relativas à proteção a vida, mas tam- bém como ações que busquem além da melhoria do meio ambiente, um aumento da qualidade de vida das comunida- des, se constituindo em tema de relevância mundial (BRA- SIL, 1997b, p. 22). No texto do documento, transparece a preocupação com os recursos na- turais e culturais brasileiros. A forma como esses recursos vêm sendo tratados pela sociedade reforça a ideia da educação como elemento indispensável para a transformação da consciência ambiental. Por meio da educação, segundo a orientação dos Parâmetros Curriculares Nacionais, o tema meio ambiente deverá contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos para decidirem e atu- arem na sociedade socioambiental de um modo comprome- tido com a vida, com o bem estar de cada um e da sociedade, local e global [...]. Devendo a escola trabalhar com atitudes, com formação de valores, com o ensino e aprendizagem de habilidades e procedimentos (BRASIL, 1997b, p. 25). Temas como proteção, preservação, conservação, recuperação e degrada- ção devem se discutidos levando-se em consideração os diferentes contextos econômicos, sociais e culturais envolvidos. Por outro lado, fatores físicos também devem ser valorizados, como as relações de trocas de energia, do uso dos recursos minerais e diversidade ani- mal e vegetal. – 41 – A inclusão da educação ambiental na escola básica Uma preocupação presente nas discussões sobre a educação ambiental diz respeito a alguns preconceitos e falsos dilemas, que visam desmobilizar e prejudicar propositalmente o trabalho com a temática. Muitas pessoas têm a visão de que a questão ambiental deve se restringir a discutir a preservação de ambientes intocados, o combate à poluição, entre outros exemplos, esque- cendo as questões que envolvem saúde, cultura, energia. Algumas pessoas pensam que os indivíduos que defendem o meio ambiente são pessoas radicais, privilegiadas que não necessitam trabalhar, po- dendo ocupar-se apenas da defesa de animais em extinção ou são românticos, ingênuos, que acreditam na natureza boa, não per- cebendo a dura realidade das necessidades econômicas (BRASIL, 1997b, p. 36). Essas posturas devem ser superadas pelo trabalho com o tema meio am- biente, buscando construir no aluno uma consciência global das questões relativas ao ambiente, compreender os problemas que afetam a sua comuni- dade e exercer sua participação nas diferentes instâncias que discutem o tema. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997b, p. 39) apresentam alguns objetivos para o trabalho com o tema meio ambiente no ensino fundamental: • conhecer e compreender, de modo integrado e sistêmico, as noções básicas relacionadas ao meio ambiente; • adotar posturas na escola, em casa e em sua comunidade que os levem a interações construtivas, justas e ambientalmente sustentáveis; • observar e analisar fatos e situações do ponto de vista ambiental, de modo crítico, reconhecendo a necessidade e as oportunidades de atuar de modo reativo e propositivo para garantir um meio ambiente saudável e a boa qualidade de vida; • perceber, em diversos fenômenos naturais, encadeamentos e relações de causa-efeito que condicionam a vida no espaço (geográfico) e no tempo (histórico), utilizando essa percepção para posicionar-se cri- ticamente diante das condições ambientais de seu meio; – 42 – Educação e Meio Ambiente • compreender a necessidade e dominar alguns procedimentos de conservação e manejo dos recursos naturais com os quais interagem, aplicando-os no dia a dia; • perceber, apreciar e valorizar a diversidade natural e sociocultural, adotando posturas de respeito aos diferentes aspectos e formas do patrimônio natural, étnico e cultural; • identificar-se como parte integrante da natureza, percebendo os processos pessoais como elementos fundamentais para uma atuação criativa, responsável e respeitosa em relação ao meio ambiente. A segunda parte dos Parâmetros Curriculares Nacionais é dirigida para os anos iniciais do ensino fundamental, com conteúdos, critérios de avaliação e orientações didáticas gerais. A questão ambiental nos anos iniciais do ensino fundamental deve enfa- tizar o desenvolvimento de valores, atitudes, posturas éticas e domínio de procedimentos, deixando os conceitos para as áreas disciplinares. O tema meio ambiente deve oferecer aos alunos instrumentos que lhes possibilitem posicionar-se em relação às questões ambientais. Assim, a seleção de conteúdos deve seguir os seguintes critérios (BRA- SIL, 1997b, p. 43): 2 Importância dos conteúdos para uma visão integrada da realidade, especialmente sob o ponto de vista socioambiental. 2 Capacidade de apreensão e necessidade de introdução de hábitos e atitudes, já no estágio de desenvolvimento em que se encontram. 2 Possibilidade de desenvolvimento de procedimentos e valores bási- cos para o exercício pleno da cidadania. Os conteúdos foram reunidos em blocos, cuja função é permitir que o aluno compreenda que os diferentes processos da natureza não são estanques, possuem um fluxo que permite movimentos e transformações dentro de uma rede de interdependência. Blocos de conteúdos: – 43 – A inclusão da educação ambiental na escola básica 2 os ciclos da natureza; 2 sociedade e meio ambiente; 2 manejo e conservação ambiental. Os conteúdos destacados referem-se aos dois primeiros ciclos do ensino fundamental, já contemplados em outras áreas, porém, são relacionados novamente com o objetivo de favorecer a reflexão e o planejamento do trabalho com as questões ambientais e garantir a compreensão do tema de forma integral. O processo avaliativo em educação ambiental deve respeitar as diferenças, contribuindo para o desenvolvimento da capacidade de observação, fundamental na compreensão dos problemas ambientais. O documento apresenta alguns critérios de avaliação (BRASIL, 1997b): 2 Observar as características do meio ambiente e identificar a existên- cia de ciclos e fluxos na natureza. 2 Identificar as intervenções com as quais a sociedade local vem rea- lizando transformações no ambiente, na paisagem, nos espaços em que habita ou cultiva. 2 Contribuir para a conservaçãoe a manutenção do ambiente mais imediato em que vive. 2 Identificar as substâncias de que são feitos os objetos ou materiais utilizados pelos alunos, bem como alguns dos processos de trans- formação por que passaram. 2 Participar, pessoal e coletivamente, de atividades que envolvam toma- das de posição diante de situações relacionadas ao meio ambiente. 2 Reconhecer alguns processos de construção de um ambiente, tanto urbano quanto rural, com a respectiva intervenção na paisagem, bem como sua importância para o homem. 2 Perceber a relação entre a qualidade de vida e um ambiente saudável. 2 Valorizar o uso adequado dos recursos disponíveis. Na questão pedagógica, o tema meio ambiente deve ser desenvolvido visando proporcionar aos alunos uma grande diversidade de experiências e – 44 – Educação e Meio Ambiente ensinar-lhes formas de participação, para que “possam ampliar a consciên- cia sobre as questões relativas ao meio ambiente e assumir de forma inde- pendente e autônoma atitudes e valores voltados à sua proteção e melhoria” (BRASIL, 1997b, p. 51). Os conteúdos relacionados ao meio ambiente serão integrados ao currí- culo através da transversalidade, pois serão tratados nas diversas áreas do conhe- cimento, impregnando toda a prática educativa e, ao mesmo tempo, criando uma visão global e abrangente da questão ambiental. A questão da transversali- dade será abordada no próximo capítulo. Uma pergunta a ser feita: como fazer? Os parâmetros nos mostram quais realidades diferentes, com suas especificidades, devem ser respeitadas em cada escola, comunidade, cidade, estado. O professor deve selecionar os conteúdos e a melhor forma de traba- lhar a questão ambiental de forma permanente e constante, com a participa- ção efetiva da comunidade escolar. Após relacionar os principais pontos dos Parâmetros Curriculares Nacio- nais – meio ambiente, não podemos deixar de questionar algumas orientações contidas no documento. Algumas dúvidas são geradas, por exemplo, no contexto do primeiro ciclo do ensino fundamental. O documento deveria esclarecer se eles são apenas uma referência de conteúdos ou se devem ser adotados obrigatoria- mente pelas escolas. Para Castro, Spazziani e Santos (2008), o que se tem visto são poucas mudanças de prática em sala de aula, e sim uma adequa- ção de planos e programas curriculares pelos professores, procurando aten- der ao que está disposto nos parâmetros curriculares, não determinando mudanças significativas. O processo de construção do documento é apontado por Castro, Spa- zziani e Santos (2008) como baseado na centralização, sem a participação de órgãos e entidades representativas da área educacional, o que pode ser consi- derado um fator determinante na dificuldade de trabalho com o direciona- mento oferecido pelos PCN. Apesar das dúvidas geradas quanto à forma de encaminhamento, os Pa- râmetros Curriculares Nacionais representam um avanço quando colocam a questão ambiental como relevante para o trabalho escolar. – 45 – A inclusão da educação ambiental na escola básica 3.4 Política Nacional de Educação Ambiental: o que diz a lei Com a Lei n. 9.795, de 27 de abril de 1999, e através do Decreto n. 4.281, de 26 de junho de 2002, que estabelece a Política Nacional de Edu- cação Ambiental (PNEA), professores, ambientalistas e demais educadores ficaram esperançosos com as possibilidades de avanços que estes documentos poderiam permitir. Percebeu-se, a partir desse momento, a necessidade de universalização da prática educativa por toda a sociedade, ampliando a necessidade do desenvolvi- mento da educação ambiental junto às comunidades, acreditando que somente com a participação ativa de todos os sujeitos teríamos avanços na solução de problemas ambientais. A PNEA reforça a questão da educação ambiental como um direito de todos, como um componente essencial e permanente da educação nacional. Assim, pode-se dizer que a Lei n. 9.795/99 veio “qualificar a educação ambien- tal indicando seus princípios e objetivos, os atores responsáveis por sua imple- mentação, seus âmbitos de atuação e suas principais linhas de ação” (LAYRAR- GUES; LIPAI; PEDRO, 2007, p. 25). Saiba mais A PNEA e a educação formal e não formal - A Lei n. 9.795/99 reforça a necessidade da presença da educação ambiental nos diferentes níveis e modalidades da educação formal, devendo ser aplicada na educação de jovens e adultos, na educação a dis- tância, na educação especial e na educação indígena. Enfatiza o caráter interdisciplinar da educação ambiental, reforçando a ideia de que não deve ser implantada como disciplina específica. Na Lei n. 9.795, princípios e objetivos são apresentados como referência para a prática pedagógica em educação ambiental, como: Art. 4o. São princípios básicos da educação ambiental: I – o enfoque humanista, holístico, democrático e participativo; – 46 – Educação e Meio Ambiente II – a concepção do meio ambiente em sua totalidade, con- siderando a interdependência entre o meio natural, o socio- econômico e o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade; III – o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, na perspectiva da inter, multi e transdisciplinaridade; IV – a vinculação entre a ética, a educação, o trabalho e as práticas sociais; V – a garantia de continuidade e permanência do proces- so educativo; VI – a permanente avaliação crítica do processo educativo; VII – a abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais, nacionais e globais; VIII – o reconhecimento e o respeito à pluralidade e à diver- sidade individual e cultural. Art. 5o. São objetivos fundamentais da educação ambiental: I – o desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políti- cos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos; II – a garantia de democratização das informações ambientais; III – o estímulo e o fortalecimento de uma consciência crítica sobre a problemática ambiental e social; IV – o incentivo à participação individual e coletiva, perma- nente e responsável, na preservação do equilíbrio do meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparável do exercício da cidadania; V – o estímulo à cooperação entre as diversas regiões do País, em níveis micro e macrorregionais, com vistas à construção de uma sociedade ambientalmente equilibrada, fundada nos princípios da liberdade, igualdade, solidariedade, democra- cia, justiça social, responsabilidade e sustentabilidade; VI – o fomento e o fortalecimento da integração com a ciên- cia e a tecnologia; VII – o fortalecimento da cidadania, autodeterminação dos povos e solidariedade como fundamentos para o futuro da humanidade (BRASIL, 1999). – 47 – A inclusão da educação ambiental na escola básica Constata-se, por meio dos objetivos e princípios que, no trabalho escolar, a educação ambiental deve desenvolver atitudes e posturas éticas em relação à questão ambiental, despertando a necessidade de participação, corresponsa- bilidade, solidariedade e negociação na busca de um consenso em relação ao uso, ocupação e exploração da natureza, com respeito ao bem-estar de todos (BRASIL, 2001). Essa proposta se posiciona contra o modelo formal de ensino, encon- trado em muitas escolas, que se fundamenta na transmissão de conteúdos sem articulação, fragmentados, e que não valoriza as diferentes vivências dos alunos. Valoriza, sim, a participação social e política do cidadão, posicio- nando-se sempre de maneira crítica, responsável e construtiva na busca por soluções dos diferentes problemas ambientais. Reflita A educação a distância no Brasil tem atingido altos níveis de desen- volvimento nos últimos anos. Pensando
Compartilhar