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1 2 AULA 6: A FASE DE FILTRAGEM CONSTITUCIONAL 3 INTRODUÇÃO 3 CONTEÚDO 4 A ÚLTIMA FASE DA EVOLUÇÃO DO FENÔMENO DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO 4 A PREDOMINÂNCIA CÊNTRICA DA CONSTITUIÇÃO E AS CARACTERÍSTICAS DA FILTRAGEM CONSTITUCIONAL 6 O ESTADO NEOCONSTITUCIONAL DE DIREITO E AS TENDÊNCIAS DO CONSTITUCIONALISMO DA PÓS-MODERNIDADE 17 ATIVIDADE PROPOSTA 23 REFERÊNCIAS 23 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 24 CHAVES DE RESPOSTA 27 ATIVIDADE PROPOSTA 27 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 28 3 Introdução O percurso do longo caminho do fenômeno da constitucionalização do direito transitou por três grandes fases, desde a fase hegemônica do Código Civil, passando pela da fragmentação do direito infraconstitucional, até, finalmente, atingir a atual fase denominada de constitucionalização do direito propriamente dita. Cada uma dessas fases se desenvolveu sobre um cenário hermenêutico- constitucional próprio, isto é, para que se tenha uma plena compreensão sobre o seu desenvolvimento, examine-se o contexto político-constitucional que as circunscreve respectivamente. Assim, nosso objetivo nesta aula é analisar o constitucionalismo da pós-modernidade, uma vez que nas aulas anteriores já estudamos o constitucionalismo garantista da fase de hegemonia do Código Civil, bem como o constitucionalismo dirigente ou welfarista da fase intermediária. Portanto, na presente aula, nosso objetivo acadêmico é investigar a última e atual, que trata da filtragem constitucional. É nesta fase que se desenvolve a reconfiguração da unidade do sistema jurídico como um todo, tendo-se a Constituição como centro de tal sistema. Com rigor, trata-se da releitura do direito infraconstitucional à luz dos princípios de dignidade constitucional. Na sequência dos estudos, o conteúdo programático desta aula está focado no exame do chamado Estado neoconstitucional de Direito, paradigma atrelado à dogmática pós-positivista que reaproxima o direito e a ética. 4 Sendo assim, esta aula tem como objetivo 1. Compreender o processo de constitucionalização do direito em sua última e atual etapa de filtragem constitucional, bem como analisar as características do Estado neoconstitucional de Direito. Conteúdo A Última Fase da Evolução do Fenômeno da Constitucionalização do Direito O grande objetivo acadêmico da aula que ora se inicia é compreender a última fase da evolução do fenômeno da constitucionalização do direito, bem como as características do assim chamado Estado neoconstitucional de Direito. 5 Como visto na aula anterior, a transição para o Welfare State gestou a fragmentação do direito infraconstitucional, deixando o sistema jurídico como um todo de contar com o papel unificador até então desempenhado pelo Código Civil na primeira fase da constitucionalização do direito. Urgia, pois, restaurar tal unidade do sistema, uma vez em que o Código Civil já não brilhava mais como centro hermenêutico do direito, valendo relembrar, mais uma vez, que sua aplicação passou a ser feita de modo residual, ancilar, secundário, somente sendo aplicado quando não houvesse a regulação específica de um dos subsistemas jurídicos autóctones das leis de emergência. Em face disso, o papel unificador do sistema jurídico privado deveria ser atribuído à Constituição da República, único documento com latitude normativa para reunificar o sistema fragmentado de então. Nesta perspectiva, as tensões e antinomias existentes entre os princípios jurídicos concebidos pelos diferentes microssistemas legislativos autônomos somente poderiam ser pacificadas à luz do texto constitucional. Através dele, chegar-se-ia à unicidade do direito, enquanto ciência jurídica, impondo-se, pois, à exegese de toda a legislação infraconstitucional o filtro axiológico da Constituição. É o que Gustavo Tepedino 1 denominou de "ocaso das codificações", querendo dizer com isso que a norma constitucional assume definitivamente "o papel de reunificação do sistema, temperando, com seus princípios e normas hierarquicamente superiores, as pressões setoriais manifestadas nas diversas leis infraconstitucionais”. Nesse repensar, tem-se então a intelecção de que a projeção do direito constitucional sobre todos os demais ramos da ciência jurídica é inexorável em tempos de reconstrução neoconstitucionalista do direito.2 1 TEPEDINO, Gustavo. “O velho Projeto de um revelho Código Civil”. In: Temas de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 438. 2 Nesse sentido, o magistério de Luiz Edson Fachin, in verbis: "estudar o Direito Civil significa estudar (os seus) princípios a partir da Constituição. O Direito Constitucional penetra, hoje, 6 Nasce dessarte um novo e inédito perfil da perspectiva civil-constitucional, que projeta a força normativa da Constituição, vislumbrada agora como norma jurídica capaz de gerar direitos subjetivos para o cidadão comum de per si, sem necessidade de intervenção legislativa superveniente e muito menos ainda dos subsistemas infraconstitucionais já postos pelo legislador democrático no âmbito da legislação de emergência. Dessa feita, na atual fase de filtragem constitucional, os dogmas do direito civil clássico desaparecem para dar lugar à releitura da lei civil à luz dos princípios da Carta Constitucional, notadamente a dignidade da pessoa humana, figura jurídica que se transformou no novo centro axiológico- hermenêutico do Estado neoconstitucional de Direito, daí a importância do seu exame de modo mais detalhado que se fará em seguida. A Predominância Cêntrica da Constituição e as Características da Filtragem Constitucional Ora, nos termos da atual fase de constitucionalização do direito, a interpretação dos códigos infraconstitucionais deve ser feita a partir de uma perspectiva, na qual a Constituição ocupa o centro do sistema jurídico como um todo. Na verdade, o que se pretende agora é examinar os fundamentos teóricos que informam, por um lado, a ressignificação da leitura moral da Constituição tendo como pano de fundo o papel unificador do seu texto e, por outro, a reconfiguração de um novo modelo de Estado de Direito, denominado de neoconstitucional em virtude de sua reação ao positivismo liberal garantista. em todas as disciplinas e, via de consequência, também no Direito Civil...". Cf. Elementos críticos de Direito de Família, Rio: Renovar, s/d, p. 301. 7 Assim, de acordo com tal coordenada, a ideia é examinar a necessidade de interpretar o direito infraconstitucional como um todo à luz da Constituição, uma vez que, até então, se encontrava fragmentado, dividido, em desarmonia dogmática em virtude da existência de universos legislativos que se contradiziam materialmente. A força normativa do direito estava majoritariamente nas leis de emergência desprovidas de um norte normativo-axiológico superior. Nesse sentido, o pensamento de Maria Celina Bodin de Moraes Tepedino: Diante da nova Constituição e da proliferação dos chamados microssistemas, como, por exemplo, a Lei do Direito Autoral, e recentemente, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código de Defesa do Consumidor e a Lei das Locações, é forçoso reconhecer que o Código Civil não mais se encontra no centro das relações de direito privado. Tal polo foideslocado, a partir da consciência da unidade do sistema e do respeito à hierarquia das fontes normativas, para a Constituição, base única dos princípios fundamentais do ordenamento. A unidade do ordenamento é característica reconhecidamente essencial (rectius, lógica) da estrutura e da função do sistema jurídico. Ela decorre da existência (pressuposta) da norma fundamental (Grundnorn), fator determinador de validade de toda a ordem jurídica, e abrange a intolerabilidade de antinomias entre as múltiplas proposições normativas (constituindo-se, assim, em um sistema). (...) Os princípios e valores constitucionais devem se estender a todas as normas do ordenamento, sob pena de se admitir a concepção de um "mondo in frammenti"; logicamente incompatível com a ideia de sistema unitário.3 É bem de ver que a projeção do direito constitucional sobre todos os demais ramos da ciência jurídica, bem como a perspectiva sistemática de que a norma constitucional tem força normativa de per si caracterizam bem o 3 TEPEDINO, Maria Celina B. M. A caminho de um direito civil constitucional. In: Revista de direito civil, v. 65, p. 24. 8 avanço da constitucionalização do direito civil em seu horizonte maior, qual seja, a ressistematização de um direito civil fragmentado sob um invólucro de um polissistema de leis especiais extravagantes conflitantes. Muito embora seja tema da disciplina “direitos e garantias fundamentais”, é importante aqui destacar as teorias da força normativa da Constituição de Konrad Hesse, da argumentação jurídica de Ronald Dworkin e Robert Alexy e, no Brasil, a construção doutrinária de Meirelles Teixeira, Paulo Bonavides, José Afonso da Silva e Luís Roberto Barroso, entre outros, no que tange à eficácia positiva das normas constitucionais, isto é, a capacidade de gerar direito subjetivo para o cidadão comum de per si. Tais teorias tiveram grande influência no aperfeiçoamento da efetividade ou eficácia social da Constituição, e, em especial, dos direitos fundamentais. Nesse sentido, não se pode contestar que a recolocação da Constituição no centro do sistema jurídico resultou em grande parte da consolidação do princípio da máxima efetividade, tal qual formulado pelo professor Luís Roberto Barroso, inspirado na teoria da força normativa da Constituição de Konrad Hesse. Da mesma forma, as hodiernas teorias pós-positivistas da eficácia constitucional não poderiam ser desenvolvidas sem os estudos dos grandes doutrinadores que introduziram no direito brasileiro a sistematização da eficácia social das normas constitucionais, podendo-se citar, por dever de justiça, a obra de J.H. Meirelles Teixeira 4 (inspirado no direito americano estabeleceu a diferença entre normas autoexecutáveis e não autoexecutáveis), de José Afonso da Silva 5 (sistematizou os conceitos de normas constitucionais de eficácia plena, contida e limitada) e Paulo 4 TEIXEIRA, J.H. Meirelles. Curso de direito constitucional, 1991. 5 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo: Malheiros, 1998. 9 Bonavides 6 (introduziu no direito brasileiro estudo avançado sobre a diferença entre regras e princípios dentro da dogmática principialista pós- positivista). Assim sendo, é necessário destacar bem toda esta construção doutrinária que serve de pedra angular para o avanço constitucional na direção da plena eficácia positiva das normas constitucionais. Tais teorias formam a base de um projeto que caminhou na direção da superação do individualismo contratualista e do liberalismo garantista. Apesar de se originar na perspectiva de admitir que determinadas normas constitucionais têm apenas eficácia negativa (geram apenas os efeitos paralisantes sem gerar diretamente direito subjetivo), ou seja, tanto a obra pioneira de J.H. Meirelles Teixeira, quanto a célebre classificação de José Afonso da Silva não se ocuparam da chamada eficácia positiva ou simétrica das normas constitucionais programáticas e não autoexecutáveis, porém deram os primeiros passos na direção dos seus efeitos potenciais e sua vinculação que imporem aos poderes públicos. No âmbito do direito não saxônico, será a tese de doutoramento do autor português J. J. Gomes Canotilho, publicada em 1982, sob o título de Constituição dirigente e vinculação do legislador que difundirá as ideias de que a Constituição também é formada por normas fixadoras de fins e tarefas do Estado. Observe, portanto, que este é o primeiro passo dado no sentido de constitucionalizar a formulação da política interna do país, uma vez que as Constituições dirigentes têm a função emancipadora de moldar a realidade política do Estado, não se limitando apenas à regulação desta mesma realidade política. 6 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. 10 Em face disso, a formulação de políticas públicas feitas pelos representantes democráticos do povo fica vinculada aos programas e metas constitucionalmente estabelecidos previamente. Ou seja, o poder constituinte derivado em sua ação legiferante superveniente encontra-se vinculado às normas constitucionais programáticas. De acordo com essa visão, a reconstrução neoconstitucionalista do direito e, na sua esteira, a constitucionalização do direito, torna-se a grande pioneira no trato científico de um novo paradigma constitucional focado na busca da plena efetividade ou eficácia social das normas constitucionais. No plano jurídico-normativo, a Constituição deixa de ser vista desde um olhar meramente formalista vinculador do legislador democrático, porém sem nenhuma normatividade, para ganhar patamar dogmático mais elevado e capaz de garantir a plena sindicabilidade de seus enunciados normativos. Por plena sindicabilidade, entenda-se aqui a possibilidade de o cidadão comum recorrer ao poder judiciário toda vez que tiver um direito constitucional violado. Assim, na vigência da atual fase de constitucionalização do direito, a Carta Magna, agora no centro do sistema jurídico, tem aplicação direta, sem a necessidade de intermediação da lei posta pelo Estado-legislador. Supera-se, pois, a visão formalista do direito, na qual o juiz constitucional se limita a aplicar mecanicamente a lei posta previamente no ordenamento jurídico. Mais além, é forçoso reconhecer que, dada a nova postura ligada à filtragem constitucional, o juiz/exegeta não se vincula mais ao direito posto em abstrato, ao revés, liberto das amarras dogmáticas do positivismo jurídico, ele incorpora categorias éticas e filosóficas na aferição das escolhas valorativas do poder político e, com isso, passa a criar direito lado a lado com o legislador democrático. 11 Eis aqui o nó górdio da nova dogmática constitucional: traçar cientificamente os limites da criação jurisprudencial do direito (ativismo judicial), sem quebra ou violação dos princípios da separação de poderes e da segurança jurídica. Com rigor, esta temática será enfrentada na próxima aula, que trata do atual estado da arte da dogmática constitucional. Por ora, nos limitamos a reconhecer que o ativismo judicial vem também na esteira do fenômeno da filtragem constitucional, na qual impera a força normativa da Constituição e sua axiologia focada na distribuição da justiça social e na consciência jurídica dos intérpretes da Constituição. Em linhas gerais, a fase de filtragem constitucional é a grande portaepistemológica para a hodierna teoria da eficácia da Constituição, que não reconhece a mera dimensão formal das normas constitucionais. Face a toda a problemática desafiada pelo fenômeno da filtragem constitucional, a dogmática constitucional contemporânea revoluciona a teoria da eficácia jurídica, porque preconiza que toda e qualquer norma constitucional é norma jurídica e, nesta qualidade, deve ser capaz de gerar direitos subjetivos ao cidadão comum. Aqui, vale mais uma vez o alerta de que esta temática pertence ao estudo da doutrina brasileira da efetividade de Luís Roberto Barroso, porém não se pode deixar de destacar bem a conexão direta com o fenômeno da constitucionalização do direito em sua terceira e atual fase. Com efeito, é nesse contexto, dito neoconstitucionalista e pós-positivista, que a interpretação da legislação de emergência, esparsa, pontual, especializada, extravagante e positivada sob a forma de estatutos próprios de determinada matéria do direito privado (microssistemas legislativos) é feita sob a égide de uma Constituição com supremacia material e formal. São os princípios constantes do texto constitucional que configuram a ordem jurídica como um todo, valendo, mais uma vez destacar, a concepção progressista do direito 12 superador da lei de Karl Larenz, 7 na qual o discurso jurídico é, a um só tempo, extra legem, porém, intra jus, ou seja, um direito que até supera a letra da lei, mas permanece fiel aos princípios e ditames da ordem jurídica como um todo. Isto significa dizer que à supremacia formal da Constituição (advinda de uma constituição escrita e rígida) e que possibilita o exercício do controle de constitucionalidade por parte do poder judiciário, acresce-se a supremacia material, que por sua vez possibilita a aplicação direta da Constituição, vislumbrada, agora, nesta terceira fase de constitucionalização, como norma jurídica e, nessa condição, capaz de gerar direitos diretamente, daí a ideia- força de Karl Larenz: extra legem (direito que supera a lei, que vai além da regra), porém intra jus (direito que se submete aos princípios constitucionais). Na verdade, a atual fase de constitucionalização do direito se caracteriza pela assim chamada sobreinterpretação, que Ricardo Guastini define como sendo a “interpretação extensiva que se realiza com a utilização de argumentos a simili, a analogia e princípios implícitos, evitando lacunas e firmando a Constituição omnicompreensiva”. Nesse sentido, Marco Aurélio Marrafon 8 destaca as sete condições de efetivação do processo de constitucionalização: Guastini define a constitucionalização como "um processo de transformação de um ordenamento ao fim do qual o ordenamento em questão resulta totalmente impregnado pelas normas constitucionais". Esse processo, para que se efetive, deve observar algumas condições. São elas: 7 LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 2. ed. Tradução de José Lamego. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1968. p. 520. 8 MARRAFON, Marco Aurélio. O caráter complexo da decisão em matéria constitucional: discursos sobre a verdade, radicalização hermenêutica e fundação ética na práxis jurisdicional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 133. 13 I. existência de uma Constituição rígida, escrita e hierarquicamente superior à legislação ordinária; II. garantia jurisdicional da Constituição através do controle de constitucionalidade; III. força vinculante, como construção ideológica que entende a Constituição como norma; IV. sobreinterpretação; V. aplicação direta; VI. interpretação conforme (ou adequadora) das leis e; VII. influência da Constituição sobre as relações políticas. Com rigor, praticamente já se tratou de quase todas essas condições apontadas por Guastini. Como vimos, a terceira fase da constitucionalização do direito civil caracteriza-se tanto pela leitura moral como pela força normativa da Constituição, com o objetivo de operar a ressistematização do direito civil, fragmentado que estava sob um sistema multipolar de Códigos. Assim sendo, os subsistemas jurídicos deixam de ser autônomos e sua interpretação passa a ficar subordinada à Constituição. Essa é a nova perspectiva civil-constitucional que restaura a unidade do sistema jurídico a partir da supremacia material e formal da Constituição (escrita, rígida e dirigente). Isto significa dizer, como amplamente analisado, que a exegese de toda a legislação infraconstitucional deverá ser consentânea com os princípios da Carta Ápice, agora, nesta terceira fase, posicionada no centro de gravidade do ordenamento jurídico. Disso tudo resulta que as normas constitucionais podem ser aplicadas diretamente e, mais importante ainda, qualquer juiz ou tribunal pode criar direito novo na garantia de eficácia positiva de um princípio constitucional a partir de um caso concreto. Tal eficácia, como examinado na aula 3, não se limita aos atos estatais (eficácia vertical), mas se aplica também nas relações entre particulares (eficácia horizontal). 14 Da mesma forma, é a supremacia da Constituição que viabiliza a ideia de interpretação conforme, ou seja, nas hipóteses de mais de uma interpretação possível para uma lei infraconstitucional, o juiz constitucional deve escolher aquela que não contradiga a Constituição, evitando desse modo sua declaração de inconstitucionalidade. Em suma, a fase de filtragem constitucional simboliza um ponto de ruptura paradigmática dentro do constitucionalismo democrático ocidental, seja pelo desenvolvimento da dogmática pós-positivista superadora da lei (extra legem et intra jus), seja perspectiva neoconstitucionalista de o direito constitucional realizar-se a si próprio por intermédio de sua aplicação direta e da criação jurisprudencial de direito no caso concreto. E assim é que a fase de filtragem constitucional projeta a juridicidade do direito constitucional sob os influxos de um discurso substantivo e comprometido com os valores constitucionalmente garantidos. Seu corolário maior é, sem nenhuma dúvida, a força normativa da Constituição, seja pela atribuição de status de norma jurídica que recebe, seja pela plena sindicabilidade perante o poder judiciário, que permite sua aplicação direta sem necessariamente obedecer à liberdade de conformação do legislador democrático. Em essência, trata-se de um momento histórico-dogmático no qual se desenvolveu e foi sistematizada a garantia da efetividade das normas constitucionais, e, em especial, dos direitos fundamentais capitaneados pela dignidade da pessoa humana. Tem como pano de fundo a conjuntura neoconstitucionalista e a dogmática pós-positivista, que afastam a estatalidade mínima e absenteísta do paradigma positivista, para se aproximar de um processo de democratização mais avançado que reaproxima o direito da ética. 15 Para alcançar o objetivo maior de realizar a Constituição, o novo paradigma atribuiu aplicabilidade direta e imediata às normas constitucionais, imprimindo ao direito constitucional conteúdo jurídico próprio, até então desconhecido pelo positivismo, bem como gestou a ascensão do poder judiciário, agora legitimado constitucionalmente para criar direito no caso concreto. E mais: é bem de ver que a Constituição somente pôde ser recolocada no centro do sistema jurídico exatamente pela consolidação de sua força normativa e pela sua aplicação direta e imediata. Ou seja, é forçoso reconhecer que existiria grande dificuldade de se operar a ressistematizaçãodo sistema multipolar de códigos se não existisse uma Constituição (escrita, rígida e supremacia material e formal), com capacidade de projetar a plena sindicabilidade dos direitos nela incorporados. Enfim, como bem destaca Luís Roberto Barroso no texto que contém os tópicos de sua conferência proferida na Universidade Católica de Lisboa, em 8 de novembro de 2004: 3a. fase: Constitucionalização do direito civil. “Ontem os códigos; hoje as Constituições. A revanche da Grécia contra Roma” (Paulo Bonavides; Eros Grau). Esta fase é marcada pela já referida passagem da Constituição para o centro do sistema jurídico, de onde passou a atuar como filtro axiológico pelo qual se lê o direito civil. 9 Normas jurídicas que conservaram, muitas vezes, o mesmo relato passam a ser interpretadas à luz de princípios e regras como: o fim da supremacia do marido no casamento, a plena igualdade entre os filhos, a função social da propriedade e do contrato, dentre outros. Dois desenvolvimentos doutrinários merecem destaque nessa fase em curso: 9 Nesta 3a. fase, o direito civil se atira apaixonadamente nos braços do direito constitucional, e é correspondido. Na vida, melhor que um grande amor, só um grande amor correspondido. Será para sempre Impossível responder. Mas ninguém deve deixar de se apaixonar, pelo risco de o amor não ser eterno. Vinícius de Moraes, no seu Soneto da Felicidade, escreveu: “E mais tarde, quando me procurequem sabe a morte, a angústia de quem vivequem sabe a solidão o fim de quem amaEu possa dizer do amor que tive: que não seja imortal, posto que é chamamas que seja infinito enquanto dure”. 16 I. a centralidade da dignidade da pessoa humana, que operou uma repersonalização e uma despatrimonialização do direito civil, por sua ênfase: em valores existenciais e do espírito, nas condições materiais mínimas de sobrevivência (mínimo existencial), nos direitos da personalidade, tanto na dimensão da integridade física quanto psíquica; II. a aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas. Aqui desenvolveram-se duas grandes teorias: a da aplicação indireta e mediata, por intermédio do legislador e das cláusulas abertas; e a aplicação direta e imediata, por via de uma ponderação caso a caso entre o princípio da autonomia da vontade e o direito fundamental em jogo.10 Em conclusão, a terceira fase do fenômeno da constitucionalização do direito, denominada filtragem constitucional, traz no seu âmago a ideia-força de que a Constituição é o centro do sistema jurídico, de onde passou a atuar como filtro axiológico pelo qual se lê todo o ordenamento infraconstitucional. Operou-se, como se viu, a passagem de um polissistema de universos legislativos autônomos e fragmentados para a um sistema hegemônico calcado na supremacia da Constituição. Trata-se de uma nova perspectiva civil-constitucional que vai encontrar sua unidade axiológico-normativa exatamente na força normativa da Constituição. Portanto, não se pode negar que nesta fase a projeção do direito constitucional sobre todos os demais ramos da ciência jurídica adquire uma perspectiva sistemática que passa a orientar o avanço da eficácia da Constituição. Nasce um novo tempo e uma nova dimensão da exegese infraconstitucional e, em especial, a civilística. Esse novo perfil da perspectiva civil-constitucional busca consolidar a aplicação direta de princípios constitucionais, sem a necessidade de intermediação legislativa, superando cientificamente sua vagueza semântica e sem violar os princípios da 10 BARROSO, Luís Roberto. O novo direito constitucional e a constitucionalização do direito. Roteiro de conferência proferida na Universidade Católica de Lisboa, em 8 de novembro de 2004. O texto contém os tópicos que foram desenvolvidos oralmente e guarda a informalidade da linguagem falada, inclusive quanto aos comentários amenos. 17 segurança jurídica e da separação de poderes. É a leitura moral da Constituição que vai respaldar sua força normativa e justificar a criação jurisprudencial do direito no caso concreto. Em suma, a Constituição torna-se, pois, a lente pela qual deve ser interpretado todo o conjunto de normas infraconstitucionais. Com isso, ocorre o encontro entre a publicização e a despatrimonialização do direito privado. A figura abaixo sintetiza as características da fase de filtragem constitucional. O Estado Neoconstitucional de Direito e as Tendências do Constitucionalismo da Pós-Modernidade Não se pode negar que o declínio do dirigismo constitucional entra em colapso a partir do fim da Guerra Fria e seu complexo quadro de imbricações Fase de Filtragem Constitucional Constituição é deslocada para o centro do sistema jurídico Passagem do sistema multipolar de códigos para o sistema hegemônico da Constituição (filtro axiológico) Aplicação direta e imediata das normas constitucionais sem intervenção legislativa superveniente. Consolidação da força normativa da Constituição e da plena sindicabilidade perante o poder judiciário. Criação jurisprudencial do direito no caso concreto (ativismo judicial) tem legitimidade democrática e não viola os princípios da segurança jurídica e separação de poderes. Expansão da jurisdição constitucional e consolidação do conceito de sobreinterpretação (Ricardo Guastini). 18 geopolíticas, cuja dinâmica acelerada produziu em menos de uma década dois fenômenos transcendentes na História da humanidade: a queda do muro de Berlim e a queda das torres gêmeas. Independentemente da aceitação ou não do fim da bipolaridade ideológica como marco inicial de uma nova era histórica, denominada pós-modernidade, o fato é que o colapso da União Soviética gerou grandes transformações no âmbito do direito constitucional, notadamente, na periferia do sistema mundial. Assim sendo, podemos caracterizar o constitucionalismo da pós- modernidade como esta nova era, ainda indefinida, mas, que infelizmente tendeu num primeiro momento ao retorno do constitucionalismo pré- weimariano de inspiração neoliberal. Nesse sentido, a conjuntura do constitucionalismo pós-moderno começou a vivenciar a perspectiva de um cenário internacional focado no retorno ao paradigma do estado liberal (Estado legislativo de Direito) em contraposição ao Welfare State (Estado executivo de Direito). Ora o contexto pós-moderno já não mais hospedaria a Guerra Fria, e, portanto, já não mais existira a confrontação ideológica entre capitalismo e socialismo. É nesse contexto de globalização neoliberal e fim da bipolaridade geopolítica que desponta a famosa obra O fim da História de Francis Fukuyama. Em essência, O fim da História quer simbolizar a vitória do capitalismo e a repotencialização da doxa liberal. Em consequência, o constitucionalismo da pós-modernidade (aqui sendo por enquanto interpretado como o Estado neoliberal de Direito) caracteriza-se por ser um movimento político-hermenêutico de forte crítica ao dirigismo constitucional da era moderna. Com rigor, salienta a emergência de um novo paradigma constitucional, próximo do arquétipo liberal e afastado do welfarismo constitucional. 19 Apresenta-se com incredibilidade em relação às propostas sociais universalizantes do dirigismo constitucional, como aquela que justifica a intervenção estatal para a proteção dos hipossuficientes. A questão da intervenção estatal no domínio privado é tida agoracomo um jogo retórico de promessas inexequíveis que jamais atingirão a universalidade dos cidadãos. No plano da teoria constitucional, o movimento neoliberal apresenta forte crítica às concepções hermenêuticas de proteção de trabalhadores, que retiram a competitividade dos Estados nacionais no mercado internacional. Com efeito, na perspectiva do Estado neoliberal de Direito, a queda do muro de Berlim eliminou as fronteiras entre Estados nacionais, sepultando definitivamente o duelo de ideologias rivais que se defrontavam no mundo geopoliticamente bipolar. Em face do fracasso retumbante do constitucionalismo social welfarista, o capitalismo deveria agir de modo desregulamentado com o objetivo de promover a expansão do mercado global. Como já dito, o ‘fim da história’ selaria a vitória do constitucionalismo pré-weimariano, cuja dinâmica transita pela estatalidade mínima e absenteísta. É nesse sentido que o Estado neoliberal de Direito defende – de maneira sutil – o fenômeno da desconstitucionalização, da desregulamentação, da flexibilização dos direitos trabalhistas; tudo isso em contraposição à filtragem constitucional. E assim é que a matriz constitucional do diretivismo estatal é rechaçada pelo movimento político-hermenêutico neoliberal, que não tardou a esposar a tese de retorno ao constitucionalismo garantista do Estado legislativo de Direito, abrindo espaço para a consolidação da ordem política neoliberal de arquétipo pré-weimariano. Morte à Constituição-dirigente, é a fé que anima o constitucionalismo da pós- modernidade sob a ótica do neoliberalismo. Morte à intervenção estatal no domínio privado; eis que gerador de ineficiência e incompetência. Morte à proteção de hipossuficientes, notadamente da classe trabalhadora, bem como 20 morte aos direitos sociais, promessas utópicas diante da falta de recursos financeiros do Estado. Morte à busca da igualdade material ou real; eis que injusta com relação ao proprietário contratante que efetivamente paga tal conta. Há que se reconhecer que as tendências mais significativas do constitucionalismo da pós-modernidade infelizmente apontam para a consolidação do Estado neoliberal de Direito. Nesse sentido, preconiza o neoliberalismo que a modernização propiciada pelo fenômeno da globalização da economia não poder ser coarctada pela perspectiva welfarista de regulação do mercado. De suma importância, por conseguinte, o exame percuciente dessa tendência mundial e seus reflexos no constitucionalismo dos países de modernidade tardia, como é o caso do Brasil. É por tudo isso que se prefere optar pela construção de um constitucionalismo da pós-modernidade calcado no Estado neoconstitucional de Direito, cuja dinâmica repontencializa a segunda dimensão de direitos fundamentais e faz valer a força normativa da Constituição. Em consequência, é imperioso engendrar um modelo de Estado neoconstitucional de Direito que seja capaz de calcular a influência das grandes estratégias dos centros mundiais de poder e que tenha latitude científica suficiente para garantir o núcleo essencial da dignidade da pessoa humana. Convém não embarcar na onda da desconstrução do Estado nacional e, em especial, do Welfare State. Esta temática será retomada com maiores detalhes na aula 8, por ocasião da análise do constitucionalismo estratégico. Por ora, o que interessa destacar bem é a intelecção de que o modelo ideal de Estado Pós-Moderno (no caso o Estado neoconstitucional de Direito) deve partir da reconfiguração do Estado social de Direito, sem, entretanto, renegar as virtudes do Estado liberal de Direito. Eis aqui a pedra angular do constitucionalismo da pós-modernidade: uma proposta de Estado 21 Democrático de Direito que mantenha algum controle sobre a economia privada, mas, que, no entanto, seja podado em seus excessos intervencionistas. Nesse sentido, precisa a visão do Professor Guilherme Sandoval Góes: Nesse diapasão, o geodireito brasileiro tem a missão de idealizar um novo paradigma constitucional de estatalidade positiva atenuada que harmonize de um lado o binômio livre iniciativa – expansão mundial do comércio e, do outro, o trinômio dignidade da pessoa humana – desenvolvimento nacional – justiça social. E mais: a confluência dos valores liberais (livre iniciativa e estatalidade mínima) com os valores sociais (justiça social com intervenção estatal) deve ser feita a partir da garantia do núcleo essencial da dignidade humana que fixa as condições materiais mínimas para o exercício pleno da cidadania e dos direitos civis e políticos.11 A figura abaixo sintetiza tais ideias. 11 GÒES, Guilherme Sandoval. O geodireito e os centros mundiais de poder. Anais do VII Encontro Nacional de Estudos Estratégicos. Realizado de 06 a 08 de novembro de 2007 – Brasília/DF sob o patrocínio do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Disponível em: <https://sistema.planalto.gov.br/siseventos/viienee/exec/arquivos/ANAISVIIENEE_INTERNET/02RELAC OESINTERNACIONAIS/MESA26NOVASAGENDAS/MESA26PAPERS/GuilhermeGeodireitoPaper.pdf>. Acesso em: 6 set. 2012. 22 Estado neoliberal de Direito Individualismo, igualdade formal e valorização da livre concorrência. Crise da modernidade: Globalização e fim da Guerra Fria O Estado neoconstitucional de Direito e o constitucionalismo da pós-modernidade Ideal pós-positivista: Núcleo essencial da dignidade da pessoa humana Reconstrução do Welfare State Solidariedade, igualdade material e valorização da justiça social. Em suma, defende-se, aqui, a instauração de uma ordem constitucional pós- moderna que não coincide plenamente com o Estado neoliberal de Direito, muito embora não o rejeite totalmente, mas, que, entretanto, se afaste da redução jurídica do Estado e da Constituição, com estruturas meramente negativas e procedimentais de limitação do poder do Estado, retirando-lhe a força normativa de sua Constituição tão arduamente conquistada ao longo do tempo. O Estado neoconstitucional de Direito não admite a nulificação do papel transformador e emancipatório da Constituição-dirigente, que fixa tarefas, programas e fins para o Estado e para a sociedade. Nesse sentido, observe, com atenção, que o Estado neoconstitucional de Direito se afasta da geopolítica neoliberal projeta sobre as Constituições do mundo em desenvolvimento a neutralização da concepção dos direitos econômico-sociais (segunda dimensão de direitos) através de um fenômeno capital que estamos aqui a designar como sendo a constitucionalização da geopolítica neoliberal. Esta temática será retomada na aula 8, por ocasião do estudo do fenômeno da judicialização da (geo)política e da dimensão estratégica da Constituição. 23 Atividade Proposta Leia o trecho abaixo de uma Reportagem publicada na Revista Veja: Os pais do analista de sistemas A. F, mineiro de 26 anos, separaram-se quando ele tinha 3 anos. No início, o pai o visitava, mas cortou as visitas ao se casar novamente. "Ele continuou a pagar pensão alimentícia, mas nunca mais veio me ver, nem quis me receber", diz Fortes. Em 2000, o rapaz decidiu processar o pai por abandono afetivo. Esse argumento não existe nas leis, mas se tornou comum nos tribunais e os juízes frequentemente o acatam. A partir da leitura acima, responda, justificadamente, se a solução do caso acima será encontrada com a aplicação axiomático-dedutiva da lei. Referências BONAVIDES, Paulo. Cursode direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. GÓES, Guilherme Sandoval. O geodireito e os centros mundiais de poder. Anais do VII Encontro Nacional de Estudos Estratégicos. Realizado de 06 a 08 de novembro de 2007 – Brasília/DF - Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do Direito. 2. ed. Tradução de José Lamego. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1968. MARRAFON, Marco Aurélio. O caráter complexo da decisão em matéria constitucional: discursos sobre a verdade, radicalização hermenêutica e fundação ética na práxis jurisdicional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. 24 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo: Malheiros, 1998. TAVARES, André Ramos. Paradigmas do judicialismo constitucional. São Paulo: Saraiva, 2012. Exercícios de Fixação Questão 1 Analise as assertivas abaixo e assinale a resposta CORRETA: I. Nas últimas décadas, o Código Civil foi perdendo sua posição de preeminência, mesmo no âmbito das relações privadas, onde se formaram diversos microssistemas (consumidor, criança e adolescente, locações, direito de família). Progressivamente, foi se consumando no Brasil um fenômeno anteriormente verificado na Alemanha, após a Segunda Guerra: a passagem da Lei Fundamental para o centro do sistema. II. A fase da constitucionalização do direito civil propriamente dita se relaciona com a leitura moral da Constituição, na medida em que ocorre uma nova interpretação dos códigos à luz dos valores da Constituição. Com isso, supera-se a fragmentação do direito privado, dividido que estava em subsistemas jurídicos autônomos, trazendo-se para o centro de gravidade do sistema jurídico a Lei Maior. a) As duas assertivas são falsas; b) A assertiva I é verdadeira e a assertiva II é falsa; c) Ambas as assertivas são verdadeiras; d) A assertiva I é falsa e a assertiva II é verdadeira. Questão 2 Analise as assertivas abaixo: 25 I. O fenômeno da constitucionalização do Direito infraconstitucional é o processo pelo qual se interpreta os Códigos à luz dos princípios constitucionais; II. No mundo romano-germânico o Direito Civil ocupou status destacado como norma direcionada à coletividade e também à solidariedade e não ao indivíduo como singularidade; III. O constitucionalismo clássico do Estado Liberal caracteriza-se pela existência de dois mundos apartados: um que impõe limites ao poder estatal, através de Constituições escritas, outro que visa proteger a autonomia da vontade, por meio dos Códigos Civis. Somente é CORRETO o que se afirma em: a) II b) I e II c) III d) I e III Questão 3 Analise as assertivas abaixo: 26 I. O Código Civil de 1916 era eminentemente patrimonialista, fundado no princípio da dignidade humana; II. O Código Civil de 1916 é produto do liberalismo dominante ao seu tempo, o que se caracteriza pela predominância da autonomia da vontade em face da intervenção estatal na vida privada; III. No Código de 1916, a visão que predominava na área de família era baseada na ideia de igualdade de direitos e deveres dos cônjuges entre si. Somente é CORRETO o que se afirma em: a) II b) I e II c) III d) II e III Questão 4 Analise as assertivas abaixo e assinale a resposta CORRETA: 27 I. Na atual fase, podemos afirmar que o reencontro entre o direito e a ética mediante a proteção da dignidade da pessoa humana faz com que o novo direito constitucional determine – ainda que sob determinados limites – a despatrimonialização do direito civil. II. Diante da nova Constituição e da proliferação dos chamados microssistemas, como, por exemplo, a Lei do Direito Autoral, e recentemente, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código de Defesa do Consumidor e a Lei das Locações, é forçoso reconhecer que o novo Código Civil ainda se encontra no centro das relações de direito privado. a) As duas assertivas são falsas; b) A assertiva I é verdadeira e a assertiva II é falsa; c) Ambas as assertivas são verdadeiras; d) A assertiva I é falsa e a assertiva II é verdadeira. Questão 5 São características da fase de constitucionalização propriamente dita, EXCETO: a) Leitura moral da Constituição; b) Filtragem constitucional; c) Força normativa da Constituição; d) Coexistência de universos legislativos autônomos. Atividade Proposta A resposta é negativa, pois, a solução não será encontrada na previsão abstrata de uma norma posta pelo legislador democrático. Ao revés, somente a aplicação axiológico-indutiva será capaz de resolver tal problema jurídico. 28 Em linhas gerais, a chamada filtragem constitucional busca a um só tempo efetuar a aplicação direta e imediata das normas constitucionais sem intervenção legislativa superveniente, consolidar a força normativa da Constituição e da plena sindicabilidade perante o poder judiciário e garantir a efetividade da Constituição a partir da criação jurisprudencial do direito no caso concreto (ativismo judicial). Exercícios de fixação Questão 1 - C Justificativa: Ambas as assertivas são verdadeiras. A perda de hegemonia do Código Civil ocorre a partir da formação de microssistemas autóctones (consumidor, criança e adolescente, locações, direito de família), cuja origem é o grande avanço na área social. Da mesma forma, a segunda assertiva não apresenta nenhum erro, pois todas as características citadas fazem parte dessa fase. Questão 2 - D Justificativa: A assertiva II é incorreta, porque no mundo romano-germânico, o Direito Civil ocupou status destacado como norma direcionada à proteção do indivíduo como singularidade contra o poder do Estado. Trata-se do paradigma protetor do individualismo jurídico. Questão 3 - A Justificativa: As assertivas I e III estão erradas. Em primeiro lugar, porque o Código Civil de 1916 não era fundado no princípio da dignidade humana, muito embora fosse eminentemente patrimonialista. Em segundo lugar, porque predominava no Código de 1916 a visão que reconhecia a superioridade do marido sobre a mulher, bem como não havia igualdade entre os filhos, como é o exemplo clássico dos filhos adulterinos. Questão 4 - B 29 Justificativa: A assertiva II está errada, porque o novo Código Civil não se encontra mais no centro das relações de direito privado como era a situação na fase de mundos apartados. Agora, é a Constituição o centro do sistema jurídico; a lente pela qual deve ser interpretado todo o direito infraconstitucional. Questão 5 - D Justificativa: A alternativa D é a única que não se coaduna com a fase de filtragem constitucional. Atualizado em: 22 jun. 2014
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