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AULA 6 INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE ECONÔMICA E SOCIAL Profª Ana Lizete Farias 2 CONVERSA INICIAL Vamos começar nossos estudos abordando um importante conceito dentro da inovação: ecossistema de inovação. Na sequência, agora que já de posse dos conceitos mais significativos dentro do amplo universo da inovação, iremos nos debruçar com mais detalhe sobre exemplos (alguns transformadores de realidades sociais, outros não), seja com base na abordagem do design thinking, seja naqueles considerados como inovações sociais e tecnológicas disruptivas. Ao final, iremos concluir com elementos que provoquem as nossas discussões com um assunto tão em voga no Brasil, a partir dos anos 2014: a ética. Em nosso caso, especificamente, a ética da inovação versus sustentabilidade social e ambiental. CONTEXTUALIZANDO Saiba mais Medellín, Colômbia: de cidade mais violenta à mais inovadora Nos anos 90, seus habitantes vivenciaram um ápice de violência urbana. Muito por conta dos conflitos com o narcotráfico, a média de homicídios chegava a quase 7 mil por ano. Para reverter a situação, junto com o combate armado chegavam também os educadores. Enquanto a segurança se restaurava nos bairros mais perigosos, o impulso de projetos tecnológicos, pedagógicos e culturais despertava uma mentalidade empreendedora. Apenas duas décadas depois, Medellín recebeu, em 2013, o título de “Cidade mais inovadora do planeta”, segundo o Wall Street Journal e o Urban Land Institute. Tudo graças a parcerias do governo com empresas e instituições que vêm fomentando a inovação e criando soluções para problemas clássicos da região. Você deve estar se perguntando que soluções foram essas, exatamente. Nós exemplificamos: imagine que você mora, literalmente, em uma montanha. Sua casa é tão distante do lugar em que você trabalha que, todos os dias, você perde pelo menos 4h dentro do transporte público. Agora imagine que, em vez de um ônibus, você possa descer a montanha de escada rolante. Foi exatamente assim que um distrito de Medellín, em 2010, reduziu o tempo desse percurso para apenas alguns minutos. 3 E as medidas não pararam por aí. A cidade construiu museus, bibliotecas e escolas nos bairros mais pobres, fazendo com que suas crianças tivessem acesso a uma educação de qualidade. Os resultados dessas ações foram tão positivos que toda a comunidade iniciou uma campanha massiva, nas mídias sociais, para que Medellín ganhasse o prêmio de cidade mais inovadora. Todo o progresso em infraestrutura foi fundamental para Medellín e seus habitantes, mas para elevar as melhorias em larga escala, era preciso fomentar o empreendedorismo de alto impacto. Em 2006, a Ruta N, nasceu como um complexo de inovação que faz justamente isso. A organização já ajudou milhares de pessoas, provendo capacitação, conexões relevantes e outros recursos para empreendedores de áreas como negócios digitais, indústria criativa e digital e biotecnologia, além de criar uma sinergia entre empresas e a academia. Para dar ainda mais força, o Tecnoparque, uma aceleradora de inovação que desenvolve e fortalece ideias com grande potencial de repetibilidade, começou uma parceria com a Ruta N e a Endeavor Colombia. Atualmente, o projeto está presente em 15 cidades da Colômbia, mas os idealizadores desejam crescer ainda mais, nos próximos anos. A aceleradora acredita que as melhores ideias são aquelas que surgem para atender às necessidades que o ambiente cria e, com isso, suas soluções ajudariam na formação de uma sociedade melhor e mais inovadora. Mas como ressaltar as melhores ideias? Como mantê-las frescas? O EmTechColombia é um bom exemplo de encontro, também incentivado pela prefeitura, que gera discussões em torno das últimas tendências tecnológicas do ecossistema e destaca as referências do país. Camilo, da Un Litro de Luz, é um deles. Ano passado, ele foi reconhecido, na EmTechColombia, como um dos 10 grandes inovadores com menos de 35 anos de idade. E se o que você precisa é de investimento para inovar mais ainda, há também algumas oportunidades de acesso a capital. A Innpulsa, por exemplo, é um banco destinado a scale-ups, criado em 2012, que também articula e fortalece personagens-chave para o desenvolvimento econômico da região. O impacto do ecossistema gerado foi gigantesco, sobre todos os setores de Medellín. A desigualdade econômica e social diminuiu, o índice de homicídios caiu em 80% e, além disso, empreendedores irão aumentar, já em 2016, o PIB do país em 2%. 4 Todos têm muito a aprender com Medellín. Mas, apesar do sucesso, não há dúvidas: o trabalho está só começando. Por isso existem empreendedores como Camilo, preocupados em dar continuidade aos esforços coletivos de tantas pessoas responsáveis pela transformação da cidade. A cidade que tem escada rolante na montanha, hortas comunitárias sustentáveis, teleféricos intermunicipais, enormes bibliotecas informatizadas e até… postes de luz de garrafa d’água. Medellín ganhou um novo nome internacional. Adeus, capital da violência. Bem-vinda, capital da inovação! Fonte: Cestarolli, 2016. TEMA 1 – ECOSSISTEMA DE INOVAÇÃO Com base no exemplo de transformação de Medellín, de cidade dominada pelo tráfico para uma das mais inovadoras do mundo, é que vamos estudar um importante conceito dentro da inovação: ecossistema de inovação, termos que emergiu da preocupação com as atividades dentro e fora das empresas, como forma de abarcar a criação conjunta de valor em uma rede de atores responsável pelo fomento de inovações. Como vimos na cidade de Medellín, desde a descoberta até a comercialização de um novo produto ou serviço, inúmeros atores estão envolvidos: pesquisadores, pequenas empresas, investidores e a indústria. Atravessar esse ciclo requer uma interação complexa. Dessa forma, chegamos à definição conforme encontramos em Namba (2006): “Um ecossistema de inovação é definido como uma infraestrutura para fomentar inovação, onde ofertantes e demandantes interagem como público estratégico. O usuário é chamado a participar como cocriador da inovação.”. O autor, nessa definição, faz referência ao encontro realizado em 2004 em Washington, D.C., denominado National Innovation Summit, cujo conselho de competitividade, composto por mais de 400 líderes de todo o mundo, divulgou o relatório Innovate America: Thriving in a World of Challenge and Change (National, 2004). Segundo ainda encontramos em Sawatani et. al. (2007), um ecossistema de inovação é uma rede que engloba relações entre todos os participantes (consumidores, provedores de serviços e fornecedores), incluindo o ambiente. São essas relações que proporcionam um fluxo de valor no ecossistema de inovação, pois constituem espaços de aprendizagem coletiva, de intercâmbio de 5 conhecimentos e práticas produtivas, de geração de sinergia entre diversos agentes de inovação (Spinosa, 2010). A teoria de ecossistema de inovação, ao focar na cocriação de valor, volta- se para a inovação propriamente dita, suscitando horizontes de práticas e pesquisas no que concerne à gestão do conhecimento, à gestão da informação, a fluxos de informação e tipos de inovação (Ecossistema..., 2018). Notavelmente, os ecossistemas de inovação são baseados em exemplos bem-sucedidos de aglomeração, seja em termos geográficos, econômicos, industriais ou empresariais, tal como nosso exemplo da cidadã colombiana. Os ecossistemas de inovação são principalmente sobre as regiões inovadoras bem- sucedidas (Silicon Valley, Bangalore), plataformas de TIC bem-sucedidas (iPhone, Android) ou novas indústrias (computação em nuvem). Empreendedores e investidores de todo o mundo saltam no movimento desses sucessos (Ecossistema..., 2018). Dentre os atores institucionais possíveis do ecossistema, temos aqueles descritos por Jackson (2010), os quais, segundoo autor, são representados por universidades, centros de ensino e treinamento, centros de pesquisa e de apoio institucional, centros de negócios, empresas, centros de excelência, bem como organizações governamentais federais, estaduais e municipais de assistência, de planejamento e implementação de políticas públicas e regulação, agências financiadoras, entre outros (Jackson, 2010). Acerca das características dos participantes de um ecossistema de inovação, Seed (2016) define quatro principais aspectos. O primeiro está relacionado à valorização da diversidade, ou seja,a diversidade dos atores na rede possibilita a geração de inovações mais disruptivas. O conjunto de atores deve estar alinhado com processos de inovação. Se as organizações e os indivíduos são incapazes de envolver outros setores, eles limitarão drasticamente a escala de inovação. Um ecossistema de inovação deve garantir a valorização da diversidade. O segundo se trata do ambiente onde o potencial de inovação irá acontecer, o qual será aprimorado se houver suporte para a conexão entre pessoas e organizações. Em existindo muitas dificuldades para os indivíduos ou organizações encontrarem ajuda para alcançar seus objetivos, a chance de sucesso será reduzida, pois, em um ecossistema de inovação, a facilidade de acesso é extremamente importante. 6 A terceira característica baseia-se na conexão entre líderes, ou seja, aqueles que criam situações em que os outros podem se encontrar e desenvolver relacionamentos são líderes capazes de financiar e aproveitar o capital social, quando as oportunidades para alcançar mudanças realmente significativas se apresentam. Por fim, o relacionamento, a base da confiança em um ecossistema de inovação, deve ser construída para os atores superarem as diferenças decorrentes dos conflitos de ideias. Os indivíduos podem evoluir nos processos de inovação pela parceria na busca por um objetivo comum, quando existe a colaboração e a confiança. É preciso lembrar que, no centro de um ecossistema de inovação, deve existir uma estratégia de inovação, ou seja, uma articulação detalhada dos objetivos financeiros, dos papéis estratégicos e dos meios para alcançar ambos. A peça final é a infraestrutura, incluindo estrutura organizacional, processos e sistemas, e as pessoas, sem as quais nada pode acontecer. TEMA 2 – DESIGN THINKING Na essência do design thinking, vamos encontrar uma abordagem que busca a solução de problemas de forma coletiva e colaborativa, com uma perspectiva de empatia máxima com o público de interesse, ou melhor dizendo, pessoas são colocadas no centro de desenvolvimento do produto – não somente o consumidor final, mas todos os envolvidos na ideia. Há uma tentativa de se mapear e mesclar a experiência cultural, a visão de mundo e os processos inseridos na vida dos indivíduos, a fim de ser obtida uma visão mais completa na solução de problemas, identificar as barreiras, gerando alternativas viáveis para transpô-las (Design...,, 2015). É nos problemas de aplicabilidade multidisciplinar e de natureza complexa que o design thinking se destaca e, portanto, vincula-se diretamente ao conceito de sustentabilidade num mundo que consome, em pouco tempo, muito mais recursos do que a natureza pode repor. Um exemplo de desafios complexos se refere ao lançamento de smartphones, pois, afinal, por quanto tempo esse modelo de um lançamento por ano poderá se manter em relação aos outros produtos que são feitos com base na extração dos recursos naturais, como petróleo, água, os mais diferentes tipos de minérios? 7 Nesse sentido, vamos olhar três projetos, com base no conceito de design thinking dentro dos desafios que a busca pela sustentabilidade nos apresenta. Em primeiro lugar, a reestruturação de uma organização de saúde; em segundo, o desenvolvimento de uma forma de abastecimento de água potável para uma comunidade sem acesso a esse bem; em terceiro, propiciar um negócio com produto totalmente sustentável. No primeiro exemplo, encontramos um projeto para redução da desnutrição infantil no Vietnã, desenvolvido por Jerry Sternin que trabalhou em Quong Xuong no Vietnã, com “estranhas soluções para problemas locais” (Brown, 2010). Com base na complexidade do desafio encontrado, buscou soluções entre famílias da comunidade e os indivíduos que estavam bem nutridos, observando pequenos detalhes nos comportamentos dessas famílias. Entre os hábitos dessa comunidade percebeu que havia dois deles que chamaram a atenção e que as demais famílias não faziam. Algumas famílias adicionavam camarões, caranguejos e cobras na alimentação, alimentos que estavam disponíveis no local, mas não eram consumidos por uma maioria por acharem não seguros às crianças. Dessa forma, podiam oferecer pequenas refeições várias vezes ao dia, permitindo aos pequenos estômagos conseguir digerir mais alimento a cada dia. Essas práticas foram levadas a toda a comunidade e, em um ano, 80% de 1000 crianças que faziam parte do programa estavam bem nutridas. Posteriormente essa prática foi replicada em 14 outras vilas pelo Vietnã. (Brown; Wyatt, 2010). O trabalho de Sternins é considerado, segundo Brown e Wyatt (2010), um bom exemplo de como o design thinking depende da expertise local para descobrir soluções locais. Os autores apontam que pensadores de design procuram por soluções alternativas e improvisam soluções (como os camarões, caranguejos e caracóis) e encontram maneiras de incorporá-las às ofertas que criam. Eles consideram o que chamamos de zonas limítrofes, ou seja, os lugares em que as pessoas “extremas” vivem de maneira diferente, pensam diferente e consomem de forma diferente. Nesse caso, o design thinking, como uma abordagem centrada no ser humano, aponta para soluções relevantes para um contexto cultural único, mas não necessariamente funcionará fora dessa situação específica. O segundo caso também é relatado por Brown e Wyatt (2010), a respeito do desenvolvimento de uma solução para o acesso à água potável, em Hyderabad, India. O contexto aqui são mulheres Shanti que utilizam containers de plástico de aproximadamente 11 litros para transportar água para beber e lavar, 8 os quais são de tamanho adequado para elas, pois conseguem carregá-los facilmente sobre sua cabeça para pegar água todos os dias em um rio local e disponível durante 24h. A Naandi Foundation, buscando oferecer água de maior qualidade à comunidade local, instalou um centro de tratamento de água próximo também de sua casa, mas, apesar de o valor cobrado ser menor, a água era vendida apenas em containers de quase 19 litros por dia, ou seja, pesados demais para serem carregados, além de não terem sido desenhados para serem carregados sobre a cabeça. Outro aspecto importante é que as necessidades cotidianas eram de apenas 11 litros/dia diante dos 19 litros ofertados. A comunidade então entendeu que havia um desperdício de água e de dinheiro e continuou a buscar água no rio por dia. Por que não podiam ser vendidos em menores quantidades? Esse exemplo retrata que o projeto da Naandi Foundation falhou na aplicação do conceito de design thinking ao desconsiderar a cultura local e as necessidades de todas as pessoas que vivem na comunidade. O terceiro caso descreve uma empresa do Reino Unido, a Orangebox, que desenvolveu, em parceria com o Centro de EcoDesign (EDC), do País de Gales, a cadeira de trabalho ARA com certificado Cradle to Cradle (C2C) (Ara, 2018), o qual significa uma concepção em que os recursos são geridos com base em uma lógica circular de criação e reutilização, em que cada passagem de ciclo se torna um novo “berço” para determinado material. Dessa forma, o modelo linear é substituído por sistemas cíclicos, permitindo que recursos sejam reutilizados indefinidamente e circulem em fluxos seguros e saudáveis – para osseres humanos e para a natureza (O que é..., 2018). Nessa concepção, a cadeira ARA é a primeira cadeira C2C, 100% reciclável, projetada para ciclos fechados de uso, de modo que os materiais, mesmo desmontados, possam manter o seu valor para gerações vindouras. Além de muito ergonômica, leve, elegante e funcional, a cadeira redefine a perspectiva de sustentabilidade para as empresas. A equipe que projetou ainda melhorou os tempos de montagem juntamente com a melhor eficiência dos recursos em geral, e incorporou uma série de características para uma fácil desmontagem e reciclagem. (Emerald..., 2009). Pensando no contexto de inovação, a cadeira ARA é uma inovação total, considerando-se que atualmente cerca de 60% das cadeiras acabam em aterros sanitários, e o restante passa por tentativas difíceis de reciclagem, com perdas na 9 vida útil do material e seu valor agregado. Além disso, a renovação e a redistribuição são as primeiras opções consideradas para todos os produtos que são levados de volta à empresa. Vemos com esses exemplos que, por meio do design, é possível ajudar as comunidades, facilitando sua existência, com intervenções de suporte concebidas em diferentes escalas e envolvendo diversos grupos de atores. TEMA 3 – INOVAÇÃO SOCIAL DISRUPTIVA Ao longo de nossas aulas cada vez mais vemos as inovações disruptivas acontecendo nos mais diversos setores e percebemos a importância no âmbito social. Agora vamos olhar de perto mais alguns exemplos que causaram ou têm potencial para transformar setores produtivos inteiros, ocasionando saltos gigantes em muitas áreas. No relatório Inovações disruptivas, realizado pelo banco de investimento Citi, temos o exemplo de uma inovação em relação ao modo como tratamos as doenças oftalmológicas. O relatório apresenta um capítulo sobre a nova geração da aplicação de terapêuticas que reduz a frequência dos tratamentos e aumenta a disponibilidade das terapêutica (Arias et al., 2016). Atualmente, injeções e colírios são a base da maioria das terapêuticas oftalmológicas, intervenções episódicas que procuram curar ou controlar a doença em causa. Os medicamentos tópicos têm de ultrapassar as barreiras oculares e a drenagem pela via lacrimal, o que reduz significativamente a quantidade de princípio ativo que chega ao interior do olho. Por outro lado, as injeções intraoculares necessitam de administrações repetidas, por vezes, mensalmente, podendo estar associadas a complicações como infeções, descolamento da retina e hipertensão ocular. De forma concreta, a inovação nessa área possibilita formas de aplicar implantes (nanopartículas), que podem ser carregados com base em certo medicamento, aplicado de forma contínua e dosada no olho. Dessa forma, um mesmo implante pode estar tratando ativamente o olho, eventualmente por uma lente de contato, processo que dispensa a intervenção do doente ou do médico ao longo do tratamento. O relatório aponta que a utilização de nanopartículas, lipossomas ou lentes de contato como via de administração tópica e compostos como implantes ou enxertos como veículos de administração intraocular para patologia da retina e da coroide estão em desenvolvimento e marcarão o futuro. 10 A importância reside no fato de que patologias como a degenerescência macular da idade, o glaucoma e o olho seco, entre muitas outras, que atingem a população em larga escala, principalmente idosos, poderão ser tratadas de forma mais eficaz. Essa inovação irá contribuir para melhorar a qualidade da saúde ocular da população, reduzindo os custos. Outro caso importante que o relatório traz é sobre as descobertas epigenéticas, que estão silenciosamente criando uma caixa de ferramentas de medicamentos poderosos para tratar câncer e muitas outras possíveis doenças. Se, até então, a imunoterapia foi o mais novo tratamento disruptivo para o tratamento do câncer, agora a epigenética vem para aumentar a eficácia dos tratamentos. Para entendermos o que isso significa, vamos relembrar que se o genoma é o conjunto de genes de um organismo, o epigenoma é o conjunto de modificações químicas que ocorrem no próprio genoma e na cromatina. Esse código epigenético é quem dá instruções ao genoma de quando e onde os genes devem ser expressos. Dessa forma, segundo o que apresenta Arias et al. (2016), as drogas epigenéticas poderiam ligar e desligar genes, aumentar materialmente a porcentagem de sobrevida de pacientes e experimentar aumentos profundos na sobrevida em resposta à imunoterapia. A exploração do papel das drogas epigenéticas pode vir a ter utilidade no tratamento de múltiplos tipos de câncer, como câncer da mama, de próstata e leucemia. Esses são apenas dois casos, mas que estão espalhados e acontecendo pelo mundo todo como no Vale do Silício, Boston, Londres, Estocolmo e mesmo no Brasil, com todas as dificuldades que temos visto. Aquela frase “o futuro é agora” nunca teve conotação mais verdadeira do que em nossos tempos. TEMA 4 – INOVAÇÃO TECNOLÓGICA DISRUPTIVA Se as inovações disruptivas no campo social nos surpreendem, o que dizer das inovações tecnológicas? Vamos examinar alguns exemplos com base no conceito da biomimética, o qual estudamos anteriormente. Da observação sobre as baleias jubarte, foi criada uma empresa que projeta pás para turbinas eólicas e ventiladores de todos os tipos (incluindo coolers para computadores). Apesar de sua dimensão e peso, foi observado que, ao nadar, as baleias jubarte possuem uma excelente aerodinâmica, pois suas 11 nadadeiras são irregulares, possuindo o formato de uma hélice. No desenho do projeto, em um túnel de vento, o modelo de uma nadadeira foi testado, observando-se um arrasto 32% menor, um ganho de empuxo de 8% e um aumento no ângulo de ataque de 40%, resultados surpreendentes que uma empresa passou a utilizar para desenvolver o sistema de pás (Whalepower, 2018). Figura 1 – Teste da Whalepower Fonte: Testing..., S.d. Outro caso está relacionado à medicina (Biomimicry, 2018): por meio de pesquisadores e engenheiros de materiais da Universidade de Kansai, no Japão, foi visto o incrível potencial na estrutura da boca de um mosquito. Com base em sofisticadas técnicas de engenharia que podem esculpir estruturas em escala nanométrica, os pesquisadores desenharam uma agulha que penetra através de uma depressão para estabilizar e deslizar sem dor para a pele. A broca eficiente do ovipositor da vespa na perfuração de madeira funciona na mesma base: duas lâminas dentadas encaixam uma broca central cada vez mais fundo na madeira. Por causa da eficiência desse projeto, nenhum motor é necessário, mas apenas a força delicada, similar à que a vespa exerce. Essa penetração suave e guiada é exatamente o que os neurocirurgiões precisam em suas ferramentas. Na área de transporte, trazemos como exemplo o Shinkansen Bullet Train, da rede ferroviária de alta velocidade do Japão, que é considerado o trem mais rápido do mundo, viajando a 200 quilômetros/hora, mas que fazia enorme barulho. Cada vez que saía de um túnel, as mudanças de pressão de ar produziam grandes trovões, fazendo com que os usuários se queixassem. Eiji Nakatsu, o engenheiro- chefe do trem Shinkansen, ávido observador de pássaros, perguntou a si mesmo: 12 na natureza quem viaja rápida e suavemente entre dois meios muito diferentes? A solução encontrada foi modelar o front-end do trem como o bico dos pássaros maçaricos, que mergulham do ar para pescar em corpos de água, produzindo muito pouco respingo. Essa modelagem resultou não apenas em um trem mais silencioso, mas com 15% de menor uso de eletricidade e 10% mais rápido (Biomimicry, 2018). Outros estudos também estão ocorrendo no campo da medicina, o que faz com que a biomimética venha se tornando realidade no campo da inovação pela inteligência humana e pela genialidadedemonstrada da natureza. Os esforços que fizermos nesse campo podem nos dar cada vez mais respostas a muitos dos nossos problemas, solucionados por baleias, aranhas, cupins, pássaros e chimpanzés. TEMA 5 – ÉTICA PARA INOVAR Ao longo de todo o nosso curso, atravessamos conceitos, observamos exemplos nos mais diversos campos e setores, habilitando-nos a compreender como a inovação é dos maiores paradigmas de nosso tempo. Temos, com base em nossa própria vivência, a visão de um mundo atual onde tudo precisa ser mais rápido, mais eficiente, mais produtivo, mais fácil e, de preferência, mais barato. Há uma transformação em curso no mundo, e os exemplos estão por toda parte, tanto no setor de transportes, como é o exemplo do UBER, quanto na telefonia versus o whatsapp, ou o novo universo trazido pela Netflix, ou seja, mudanças que nos deixam atônitos diante de tantas inovações disruptivas. Mas, se, por um lado, o desenvolvimento tecnológico possibilitou à indústria alcançar resultados impressionantes por meio de conceitos novos e melhores, por outro lado, essa mesma tecnologia e a sua velocidade trouxeram consequências ambientais devastadoras. Aí surge uma grande questão: como inovar de uma maneira ética e sustentável? A realidade no mundo dos novos negócios se estrutura ao redor do planeta nas mãos de empreendedores, na sua grande maioria jovens que apostam seus sonhos na forma de startups e spin-offs, em que é possível observar um forte apelo disruptivo à sustentabilidade. Há na mão desses transformadores um cansaço do mesmo discurso do apelo sustentável, da propaganda sobre ser ambientalmente/ecologicamente correto. 13 Apesar de um crescente número de empresas alegarem que possuem consciência ambiental e que adotam práticas ecologicamente corretas, precisamos ir além: é necessário fornecer produtos de cadeias transparentes e rastreáveis, em conformidade com padrões internacionais socioambientais. Nesse momento é que vislumbramos oportunidades de mercado inexploradas ainda pelas grandes empresas, seja por falta de senso de inovação, seja mesmo por falta de percepção daquilo que a sociedade realmente necessita e busca. O primeiro passo para falarmos em ética é pensarmos em uma produção sustentável com base em nossa responsabilidade na manutenção dos recursos naturais. Também a ética se refere aos benefícios para a qualidade de vida das populações locais. O melhor modo de alcançá-las é por meio de tecnologias novas, que respeitem a identidade e o estilo de vida das comunidades, com preços justos e política de compensação para os usos ambientais, como água limpa e solo, créditos de carbono e reflorestamento. Além disso, cada produto proveniente da biodiversidade possui, em toda a sua magnitude, características ecológicas, sócias e etnobotânicas distintas e requerem atenção especial com relação à absorção de trabalho, conhecimento da produção, manutenção de estoque, desenvolvimento de mercado, estabelecimento de validade e organização socioeconômica. Concluindo, não há uma ética na inovação, em qualquer campo, que não esteja ligada à conservação ambiental e à valorização social por meio de parcerias estabelecidas entre empresas, comunidades locais e consumidores. Em nossos projetos, devemos analisar cautelosamente a realidade de nosso planeta e identificar vulnerabilidades potenciais a respeito da demanda crescente por produtos e serviços. Acima de tudo, uma inovação só é legítima se contribuir para um desenvolvimento sustentável em escala global. FINALIZANDO Partimos do exemplo de transformação de Medellín, de cidade dominada pelo tráfico para uma das mais inovadoras do mundo para estudar um importante conceito dentro da inovação: ecossistema de inovação, conceito que surgiu da preocupação com as atividades dentro e fora das empresas, como forma de abarcar a criação conjunta de valor em uma rede de atores responsáveis pelo fomento de inovações. 14 Na sequência, estudamos projetos transformadores de realidades sociais, tanto com base na abordagem do design thinking quanto aqueles considerados como inovações sociais e tecnológicas disruptivas. No âmbito das tecnologias disruptivas, vimos os impressionantes modelos desenvolvidos com base na biomimética. Por fim, concluímos o nosso caminho com considerações a respeito de um assunto delicado e importante, ou seja, a ética, sem a qual não podemos avançar enquanto civilização. LEITURA OBRIGATÓRIA Texto de abordagem teórica BARKI, E. et al. Negócios com impacto social no Brasil. São Paulo: Peiropólis, 2013. Negócios com impacto social são aqueles criados com a finalidade de gerar produtos e serviços mais eficazes no combate à pobreza, ou aqueles que fazem uso das leis mercadológicas para lidar com demandas que surgem no ambiente social. Mas, dentro dessa ampla abordagem, os autores desse livro discutem sobre os aspectos particulares do empreendedorismo na base da pirâmide, mostrando caminhos possíveis e reflexões. É resultante de uma atuação de sucesso em negócios com impacto social, provando que o Brasil pode incubar grandes transformações tecnológicas em direção a um mundo verde e sustentável. Texto de abordagem prática CORTELLA, M. S. Qual é a tua obra?: inquietações propositivas sobre ética, liderança e gestão. Petrópolis: Vozes, 2017. Este é um livro de fácil leitura e grande valor. O autor – sem dúvida, um dos maiores pensadores brasileiros da atualidade – traz discussões e questionamentos sobre os pilares para a construção de uma sociedade sustentável. Saiba mais 15 IKENAMI, R. K.; GARNICA, L. A.; RINGER, N. J. Ecossistemas de inovação: abordagem analítica da perspectiva empresarial para formulação de estratégias de interação. Revista de Admininstração, Contabilidade e Economia da Fundace, v. 7, n. 1, 2016. Disponível em: <https://www.fundace.org.br/revistaracef/index.php/racef/article/view/232>. Acesso em: 2 jul. 2018. 16 REFERÊNCIAS ARA: Europe’s first cradle to cradle task chair. Orangebox, 2018. Disponível em: <https://www.orangebox.com/products/ARA>. Acesso em: 2 jul. 2018. ARIAS, D. et al. Disruptive innovations: ten more things to stop and think about. GPS: Global Perspectives & Solutions, 2016. Disponível em: <https://www.citivelocity.com/citigps/>. Acesso em: 2 jul. 2018. BIOMIMICRY, 2018. Disponível em: <https://biomimicry.org/biomimicry- examples/>. Acesso em: 2 jul. 2018. BROWN. T.; WYATT, J. Design thinking for social innovation. Stanford Social Innovation Review, Stanford, CA, 2010. Disponível em: <https://ssir.org/articles/entry/design_thinking_for_social_innovation#>. Acesso em: 2 jul. 2018. CESTAROLLI, P. Medellín: de cidade mais violenta do mundo à mais inovadora. Endeavor Brasil, 15 mar. 2016. Disponível em: <https://endeavor.org.br/ambiente/medellin-violenta-para-mais-inovadora/>. Acesso em: 2 jul. 2018. DESIGN thinking: ferramenta de inovação para empreendedores. Endeavor, 27 jul. 2015. 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