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Conto (em fase de testes)

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Quando os opostos se atraem
01
Estava tudo correndo as mil maravilhas. O meu casamento iria ser o maior festejo de todos os tempos. 
Eu ia casar! Respira; não surta agora! - Me ordenei mentalmente. Eram tantos os preparativos... Estava tão absorta em meus pensamentos que não ouvi minha amiga me chamar.
- Amanda! Amaaaandaaa! - Carol gritou.
Virei-me subitamente para a porta do meu quarto onde ela estava parada na soleira, com as mãos nos quadris em gesto de impaciência.
- Fala Carolinaaaaa! - disse em um tom mais alto que o normal.
- Não grita. Você já se esqueceu da última prova do vestido? Só fica olhando para esses presentes! - falou minha amiga apontando para todos os pacotes que estavam que estavam em cima da minha cama.
Carolina era minha melhor amiga desde os tempos do colégio. Ela me ajudou em todas as horas difíceis da minha vida. Quando meus pais morreram em um acidente, ela estava lá, quando meu coração foi partido pela primeira vez, ela estava lá novamente, me apoiando. Me tirou de diversos apuros que já aprontei, se bem que… ela gostava de se meter em confusão, mas só se fosse comigo.
- Carol, eu estou de TPC! - falei olhando para todos os embrulhos.
- TPC? - ela perguntou franzindo o cenho.
- Tensão pré-casamento! Não me diga que não sabia? - perguntei em tom divertido.
- Tá bom, tá bom. - ela falou com as mãos para cima num gesto de rendição. 
- Você está nervosa - afirmou ela se sentando na cama bem do meu lado. - Mas eu em seu lugar estaria igual.
- Ai amiga, vou me casar com o homem dos meus sonhos! Isso não é incrível? - perguntei toda empolgada.
- Sim Amanda, é maravilhoso. - respondeu com sinceridade - mas precisamos fazer a última prova do vestido de noiva.
- E o seu já está pronto?
- Sim. Eu serei a madrinha mais bela que já viram no século XXI! - ela respondeu toda animada e se levantou. - Então vamos, vamos, vamos! - falou enquanto me puxava pelo braço para que eu saísse da cama.
Tranquei a porta do apartamento onde eu morava sozinha e saímos do prédio. Resolvemos caminhar já que a loja da Dona Graça ficava apenas a algumas quadras a frente.
Certo, minha vida estava muito monótona ultimamente, “Trabalho - casa - trabalho”. A única coisa boa no momento era que eu ia casar e me mudaria daquele prédio. Allan e eu tínhamos comprado uma ali perto, não era uma casa que se pudesse dizer “OH QUE CASA”, mas eu tinha gostado muito dela e viveria lá com meu grande amor.
Mas o que eu ainda não sabia era a surpresa que teria na próxima vez que fosse lá.
Quando chegamos a loja e passamos por aquela portinha ridícula - sério, quem é que tem uma loja de vestidos de noiva e tinha uma porta só com uma tranca além da principal? E ainda um sininho pendurado do lado de dentro dela? Ou aquela senhora era muito antiquada ou estava dando mole para os ladrões - o sino tocou e a Dona Graça se materializou bem ali na nossa frente. 
- Nossa noivinha favorita chegou! - disse Graça dando um sorriso.
- Viemos para a última prova do vestido Dona Graça. - falei
- Ah, é claro! Venham por aqui - e ela nos guiou para o provador.
Algum tempo depois, me vi refletida no espelho enquanto Graça ajustava a cintura e Carol, a cauda mega longa. O meu vestido era lindo, tomara que caia em seda e com pedras brilhantes que iam do corpete até o ao inicio da cauda.
Não me aguentava de tanta emoção, fiquei com os olhos marejados enquanto me olhava. Meu cabelo escuro estava preso em um coque no alto da cabeça e o vestido realçava minhas curvas, se é que eu tinha, pois me considerava uma mulher de 23 anos quase desnutrida.
- Oh Amália! Você está linda! - Dona Graça falou atrás de mim me vendo pelo reflexo do espelho.
- É Amanda - disse quase sem esperanças, aquela mulher nunca acertava meu nome - meu nome é Amanda!
Carol deixou a cauda do vestido e levantou-se
- Você está deslumbrante, minha amiga! Nem acredito que depois de amanhã você será uma mulher casada! Não poderemos fazer mais certas coisas juntas, mas estou tão feliz por você!
- Ah Carol! - me virei e a abracei.
Ela estava falando das festas que sempre íamos juntas nos fins de semana e dançavamos até não podermos mais nos sustentar sobre nossos pés. Agora ela olhava pra mim com lágrimas contidas, conhecia muito Carol muito bem, ela estava emocionada, sempre ficava assim em relação á casamentos. Carolina era muito bonita, porém ainda estava ressentida pelo término recente do relacionamento dela. No entanto, Dona Graça começou a tagarelar, nos tirando daquele momento “emoções a flor da pele”.
- Vou mandar o vestido para o seu apartamento ou para sua casa nova? - ela me perguntou
- Pro meu apê, é claro.
*****
No meu trabalho, era tudo igual. O parque ecológico “Ecopark” era o maior da cidade. Adorava o que eu fazia, eu era recém formada em Turismo e ainda era uma estagiária como guia turística do local. Aquele parque maravilhoso só não era o maior do estado porque era praticamente uma filial. A “matriz” na cidade vizinha era cinco vezes (ou mais) maior. Não que eu tivesse ido até lá, mas alguns dos meus colegas de trabalho que vieram transferidos me falaram.
Depois que cheguei da prova do vestido, peguei meu carro e fui para o trabalho. Meu chefe, Paulo, era um saco, mas em compensação, a minha supervisora, Carla, era uma mulher muito flexível e havia me dado uma folga no trabalho pela manhã para que eu arrumasse tudo para o casamento.
Naquele dia tudo foi igual: Paulo fazendo exigências para os estagiários, Carla ficando irritada com ele e como sempre, os dois trocavam farpas na sala dele.
Alguns funcionários boatavam que talvez Paulo gostasse de Carla, porque “ Os opostos se atraem” e que aquilo um dia iria dar em casamento. Eu já não acreditava tanto assim. Por que duas pessoas que se detestavam tanto poderiam se apaixonar? Acredito que somente o entendimento pode levar ao amor, esse tipo de coisa de implicância, opostos, etc, era somente coisa de novela, onde existia tesão,era no máximo onde isso chegaria, isso se não se matassem antes.
Graças a Deus o meu turno havia acabado e fui até a sala onde eles estavam discutindo. Eu tinha que bater o ponto e pegar minha bolsa, estava abrindo a porta quando percebi que “eu” era o motivo da discussão.
- Você não tinha o direito de ar folga á Amanda! - vi Paulo esbravejar.
- Mas ela vai casar depois de amanhã, NO SÁBADO! Ela tem que resolver os detalhes da cerimônia… TUDO! E você não tem porquê exigir isso tudo dos estagiários, eles não são como os outros funcionários! - Carla falou apontando o indicador corajosamente para ele enquanto também mantinha o queixo erguido. Ela era a única que se atrevia a desafiar Paulo quando ele passava dos limites.
Paulo virou-se e notou minha presença na sala
- Vocês - ele falou com uma calma que eu sabia que não existia - estão sob minhas ordens e você Carla, deveria ter falado comigo primeiro para SÓ depois - ele enfatizou a palavra “só” - falar com o nosso chefe e patrão! - E se virando para mim continuou: - E você Amanda, está DEMITIDA!
Minha boca se abriu com o choque e antes que eu pudesse pensar em responder alguma coisa, ele completou: - Ou você sai, ou eu saio!
- Você não pode fazer isso Paulo! - Carla falou. - Não pode fazer isso se não falar com o che..
Ele interrompeu - Se vira Carla, peça um pedido de transferência pra ela, sei lá, inventa, eu só não quero vê-la aqui de novo, essa garota causa muitos problemas!
E batendo a porta com força, ele saiu da sala. E eu enlouqueci.
- SEU IDIOTA! - berrei - Com quem pensa que está falando? Eu não sou sua escrava! ESTÁ OUVINDO? – Gritei a plenos pulmões – você pensa que é dono do parque? Eu mesma vou falar com ele e pedir a sua cabeça igualzinho AO SÃO JOÃO BATISTA!
Ele devia ter ouvido da outra sala, pois ouvi um “vá pro inferno” dele. Eu queria gritar ainda mais e colocar toda a raiva pra fora por todo o tempo em que me fez de escrava remunerada, mas ouvi Carla me suplicar enquanto ela colocava a mão em meu braço.
 - Por favor, Amanda! , não complique mais as coisas. Eu vou falar como o dono e ver o que posso fazer, se a transferênciafor a única solução, não é assim tão grave o outro parque fica na cidade vizinha e não são muitas horas de carro.
Não o que ela disse, mas como disse, fez com que me acalmasse.
- Muito bem – respirei fundo – Obrigada Carla.
*****
Depois do final horrível daquele dia de trabalho, eu tinha que conversar com alguém. A Carol não dava, ele nem tinha saído do trabalho. Allan, claro! Ele ia ser meu marido, não? Resolvi ligar pra ele. Chamou uma, duas três, cinco vezes e caía na caixa postal. O que será que ele estava fazendo que não atendia o celular?
Liguei para a casa da mãe dele para saber se ele estava lá, ela atendeu no primeiro toque.
- Não, ele não chegou ainda. – ela disse – ligue para o escritório dele, talvez ainda nem tenha saído.
Tentei o escritório de advocacia (sim, ele era advogado!) e moça da recepção atendeu e disse que ele havia saído há algum tempo.
Comecei a ficar preocupada. Onde ele estaria? Fazia quase uma semana que não nos víamos pessoalmente com toda essa pressa e arrumação para organizar o casamento, uma parte ficou para eu organizar e outra para ele.
Pensei um pouco e veio a lógica em minha cabeça, ele só podia estar no nosso futuro lar!
Dirigi até a casa enquanto pensava no que iria fazer se eu tivesse de ser transferida para o complexo ecológico na outra cidade. Eu não podia ser demitida agora, não antes de eu terminar de pagar alguns dos móveis que tinha comprado para minha nova vida.
Estacionei na frente da nossa pequena casa. Ele não veio me receber.
“Muito estranho” pensei enquanto descia do carro. Fui até o portão, que estava só encostado e também a porta da frente. Entrei na casa e nem sinal de Allan.
Será que ele também não está aqui?
- Será que ele vai me fazer alguma surpresa? – acabei perguntando em voz alta.
Eu realmente não sabia a surpresa que me aguardava e que mudaria o rumo da minha vida.
Caminhei pelo corredor e quase tropecei em um sapato feminino que por sinal não era meu. Era um sapato scarpin caro. Desconfiei, mas não queria acreditar na idéia que já tinha se formado na minha cabeça.
Ouvi vozes, sussurros e gemidos nada convencionais de dentro do “nosso” quarto. O sangue me ferveu nas veias, nem me dei ao trabalho de pensar, escancarei a porta do quarto com tanta força que ela bateu na parede. Vi Allan ali com outra mulher “na nossa cama!”
E se eu pensava que o dia não iria piorar, me enganei completamente. Naquele momento o meu mundo perfeito, com o cara que julgara perfeito, se desmoronou.
02
- Amanda, eu... eu posso explicar! – gaguejou o cretino do Allan enquanto pulava da cama enrolando um lençol na parte de baixo do corpo.
- QUE EXPLICAÇÃO! QUE ELA CAIU NA NOSSA CAMA POR ACIDENTE? – Berrei - NÃO QUERO NENHUMA EXPLICAÇÃO! ESPERO QUE ENGULA AS PALAVRAS Á CAMINHO DO INFERNO!
Me descontrolei totalmente e passando por ele, arrastei a mulher loira da cama pelos cabelos. Ela me olhava com os olhos arregalados.
- SUA DESGRAÇADA! VADIA! – eu batia nela enquanto gritava adjetivos nada editáveis. Ela mal conseguia se defender diante á minha fúria.
- Amanda, amor... – falou ele enquanto me tirava de cima da ordinária.
- ME SOLTA! – gritei puxando meu braço me libertando do toque dele, tudo o que eu sentia era ódio. – NÃO ME CHAMA DE AMOR, DESCARADO!
Saí correndo do quarto com uma raiva tão grande que tudo o que via na frente, atirava no chão. Quebrei vasos, quadros, o porta retrato que uma foto de nos dois juntos, tudo, tudo o que eu encontrasse pela frente teria o mesmo destino. Acho que isso deve ter dado tempo á Allan, pois agora ele saíra do quarto vestido com uma camiseta branca e uma calça jeans.
- Amanda, eu posso explicar! – ele falou tentando se aproximar de mim, talvez para que eu não quebrasse mais nada.
- Não me toque Allan ou eu VOU QUEBRAR O ABAJUR NA SUA CABEÇA! – ameacei enquanto pegava o objeto nas mãos.
- Pelo amor de deus Amanda, você vai quebrar tudo!
- Eu não queria quebrar tudo, EU SÓ QUERIA QUEBRAR A SUA CABEÇA E TE MANDAR DE UMA VEZ POR TODAS PARA O INFERNO! – e quando ele tentou chegar mais perto, atirei o pequeno abajur de sala, que só não pegou na cabeça dele por que se abaixou.
Corri e abri a porta. Entrei no carro. Vi quando ele correu para me alcançar, engatei a marcha e saí cantando pneus.
Não sei como cheguei em casa, nem sequer vi a estrada. Todos os meus movimentos eram em piloto automático. Depois que entrei, joguei a bolsa na mesinha me afundei no sofá. Fiquei pensando em todas as juras de amor de Allan, os planos que tínhamos, no nosso casamento marcado para sábado. Quando o choque passou, chorei. Chorei por tudo, de raiva, desgosto, ele por acaso ia continuar a amante depois de casado? Chorei por causa do cinismo dele em levar a outra para dentro da casa a qual havíamos escolhido juntos para morar. Mas com certeza o motivo maior pelo meu pranto era eu não ter percebido o significado de ele estar distante, principalmente agora, na última semana antes do casamento acontecer. Ele sequer tinha me procurado, era sempre eu que ligava. Como pude ser tão burra, tão ingênua?
Escureceu, mas eu sequer percebi. Parei de chorar. Os meus olhos estavam perdidos no tempo. Não conseguia entender o porquê da traição dele. Se não me queria mais por que não chegou até mim e não falou? Sei que teria doído do mesmo jeito, mas pelo menos eu estaria sabendo e não sendo vítima de uma canalhice desse tamanho.
Meu celular tocou, mas não atendi. Não escutava, não via, não sentia. Era como um vazio sem tempo nem espaço, como se tivessem retirado meu coração com uma faca e não sentisse nada por que simplesmente não havia nada no lado esquerdo do peito. Deitei mecanicamente no sofá. Fechei os olhos e não pensei em mais nada antes de ser vencida pelo cansaço e mergulhar num sono sem sonhos.
*****
Acordei com as batidas desesperadas em minha porta, mas não tinha coragem para me levantar de onde estava, uma parte por estar num estado deplorável, tinha dormido no sofá, os olhos com certeza estaria inchados e vermelhos. Não precisou que eu levantasse, mal virei para colocar os pés no chão e Carol entrou dentro do apartamento. Nem lembrava que tinha uma chave reserva dentro do jarro de plantas.
- Amanda, você quer me enlouquecer? – perguntou Carol enquanto circulava o sofá – liguei para você um milhão de vezes mas você não me aten... O que aconteceu? – ele perguntou preocupada quando viu meu rosto.
Olhei para minha amiga e recomecei o choro, não sabia se ainda era possível, pensei que não teria mais lágrimas.
- O que foi amiga? – ela sentou ao meu lado e me abraçou. – o que fizeram com você? Eu juro que mato o desgraçado que fez você chorar!
Minha amiga lutava por mim com unhas e dentes, assim como eu por ela, e não sei se por ela ter acertado o que tinha acontecido comigo na sua pergunta ou por ser tão leal a mim, eu chorei mais ainda.
- Ele me traiu Carol! – disse ainda abraçada a ela – ele me traiu!
- Quem? – ela se desvencilhou do abraço e a medida que a compreensão lhe atingiu, arregalou os olhos em choque – não me diga... que... foi o... Allan...?
- Sim, o traidor, cretino, descarado! O peguei no flagra na nossa cama, na nossa casa Carol!
- O quê!?! – a incredulidade estava se transformando em fúria no rosto dela – Ele teve coragem de trair você a um dia do casamento na sua cama, na sua casa?
Contei tudo e quando chorava relembrando a cena, ela me abraçava, pegava minhas mãos me dando força e dizia todas as atrocidades que prendia fazer a ele por ter partido o coração da sua melhor amiga.
- Ele é um canalha! – Carol disse – E ele ainda prendia casar com você amanhã? Vamos Amanda – puxou-me pela mão – não pode ficar chorando por esse tipo de homem, que pelo que me contou, talvez esteja te traindo a tempos. Tome um banho e vamos para algum lugar, se divertir, sei lá... estou de folga mesmo! – ela se virou para alcançar minha bolsa em cima da mesinha, que tinha o celular dentro e o pegou – Vou ligar para o seu trabalho pedindo a Carla a tarde de folga também!
- Se é que ainda tenho um trabalho. – murmurei.
- Como assim?– ela perguntou com o celular ainda na mão.
- Paulo me deu um ultimato ontem, bem, na verdade ele me demitiu, mas Carla conseguiu que ele me desse a chance de escolher entre a rua ou pedir transferência.
- Transferência pra onde?
- Para a cidade vizinha, onde você trabalha.
- Como é?
- Sim, exatamente – suspirei – e eu não posso perder esse emprego agora. Ainda tenho que pagar tudo mesmo não tendo casamento.
- E como vamos resolver isso?
 Era por isso que ela era minha melhor amiga, não me deixaria na mão.
- Acho que realmente devo pedir transferência, não tenho outra opção.
Uma batida na porta nos assustou um pouco.
- Vou ver quem é – Carol falou já se levantando e quando a abriu já ouvi o que ela disse: - Não é permitida a entrada de canalhas nesse apê.
- Carol, eu preciso explicar!
- Que você é um imbecil? Desculpe-me, mas disso nós já sabemos.
Ele nem se deu ao trabalho de responder, invadiu sem pedir licença.
- Amanda, eu queria conversar com você. – ele começou.
Sério, como é que ele tinha tamanha cara de pau? E por que eu nunca tinha percebido o tratante que ele era? Não pude controlar a minha ira, me levantei do sofá e bati em seu rosto com tanta força, que virou. Ele me olhou colocando a mão no rosto, surpreso.
- Eu não quero conversar com você! – vociferei.
- Mas eu posso explicar...
- NÃO QUERO EXPLICAÇÃO! – gritei
- Aman...
- VÁ EMBORA!
- Mas eu...
- SUMA DA MINHA FRENTE! ACABOU! VOCÊ NÃO PASSA DE UM CANALHA!
Fui até a porta e abri. Carol continuava ainda chocada, com certeza pela cara de pau dele e também (possivelmente) pela minha reação explosiva.
- SAIA DAQUI!
 Como ele não fez menção de sair, eu ameacei:
- Se você não sair daqui – falei com a voz controlada e baixa, mais ainda com fúria – eu vou torcer o seu pescoço com as minhas próprias mãos! Por isso – continuei com uma calma assassina - se você tem amor a sua miserável vida, saia.
Ele não disse uma palavra, passou por mim e saiu.
- Você está bem? – Carol perguntou.
- Melhor impossível. Lavei minha alma e minha honra.
Naquele momento tomei uma decisão. Eu tinha que sair da cidade, ia pedir transferência, queria respirar ar novo e não queria ver a cara de Allan de novo. Não suportaria. Queria um tempo para pensar, recomeçar e era melhor que fosse em lugar em que não visse a cara daquele miserável. Já que fui intimada a pedir a tal transferência para o outro parque, eu iria. Quem sabe o que o destino havia me reservado por lá?
*****.
A tarde praticamente já tinha cancelado boa parte dos convidados do casamento, muitos queriam saber o motivo, mas eu dissimulei e disse apenas que não haveria mais casamento. Quando liguei para Carla, que ficou bastante chocada com o cancelamento do casório, ela me disse que tinha uma boa notícia para mim. Eu não iria ser demitida, ela havia conseguido a transferência falando com o dono do parque e ele tinha concordado, e se eu estivesse interessada, poderia me apresentar lá na segunda. Aceitei na mesma hora e ela me passou as “instruções”.
- Não vai mesmo ficar na cidade? – Carol me perguntou mais tarde enquanto me ajudava a fazer as malas.
- Não Carol. Preciso arejar minha cabeça e não correr o risco de ver aquele imprestável na minha frente. Não saberia exatamente qual seria a minha reação, só sei que não quero vê-lo de novo, pelo menos não tão cedo.
- Há uma vantagem pra mim no meio disso tudo. Não terei que ficar dirigindo de lá até aqui todo final de semana. – ela me sorriu.
Carolina praticamente morava na outra cidade. Ela conseguiu um estágio na reserva vizinha ao parque onde agora eu iria trabalhar e pouco tempo depois ela foi efetivada como bióloga. Ela praticamente se mudou para lá, mas vinha para minha casa todo fim de semana. Ela só estava vindo todo dia para me ajudar com os preparativos do casamento que não iria mais acontecer.
- Por acaso tem algum apartamento vago perto de onde você mora?
- Não sei, mas posso ver isso. E por que você vai hoje?
- Tenho de me apresentar no parque na segunda. Vou alugar um quarto em uma pousada por enquanto. – falei enquanto fechava o zíper da bolsa. – Carol, muito obrigada por ficar aqui hoje desmarcando tudo com o cartório e o bufê; eu não sei o que eu faria sem você.
- Eu sei que você não poderia viver sem mim. Sou insubstituível.
Descemos com as malas até a garagem do prédio, colocamos tudo dentro do porta-malas do carro.
- Se cuida amiga – Carol falou enquanto me abraçava.
- Eu prometo. – respondi
- Assim que chegar à pousada, me ligue.
Eu respondi positivamente com um meneio de cabeça me desvencilhando do abraço. Entrei no carro e dei a partida.
- Até logo! – A ouvi falar antes que eu saísse.
Dirigi pelo bairro despedindo-me mentalmente. Sabia que ficaria um longe dali por um grande período, mas ao mesmo tempo sentia que minha vida não teria as raízes fixadas naquele lugar, como se eu nunca mais tivesse motivos para voltar. Pensei um pouco: “Será que essa sensação teria a ver com a traição do meu ex noivo?” Meu coração ainda doía muito, mas algo me dizia que não era por causa dele que eu não teria mais motivos para voltar ali.
Não sabia eu o quanto estava certa.
03
Dirigi de manhã até quase meio dia de sábado, não por que a cidade em agora me encontrava fosse muito distante da minha, mas por causa da pousada onde ficaria hospedada até encontrar um lugar para morar. Ela ficava quase na divisa do estado, próxima ao parque, que por sua vez fazia fronteira com a reserva protegida pelo governo (onde a Carol trabalhava), sendo que a reserva (de acordo com o que eu sabia de geografia e também ao mapa que eu tinha do local) era encostada a mata, (Isso mesmo, uma floresta com direito a áreas para os indígenas, animais selvagens e tudo mais).
Estava virando uma esquina para chegar à pousada “Três Estrelas”, quando meu celular tocou. Era ele. Resolvi atender.
- O que você quer? – falei secamente.
- Onde você está? – Ele perguntou como se ele ainda fosse meu noivo para que eu desse alguma explicação de onde eu estava...
- Isso não é da sua conta!
- Amanda, você não vai me dar uma chance para dizer o que aconteceu? – Allan estava começando a me tirar do sério.
- Eu sei o que aconteceu seu INFELIZ! – esbravejei. 
- Não foi o que pensou amor.
- Há não? – ironizei – e o que seria então? Por acaso se enganou de país e achou que fosse um sultão?
- Amanda, eu...
- Me deixe em paz! Fique com aquela desgraçada e fique longe de mim!
- Eu amo você! Ela foi... foi só um erro, uma aventura, ela se jogou em cima de mim! Não podemos destruir tudo por causa de uma besteira dessas, vamos recomeçar queri...
Aquilo foi à gota d’água.
- COMO VOCÊ TEM A AUDÁCIA DE FALAR DE AMOR? – gritei ao telefone – e quantas aventuras achou que poderia ter sem que eu descobrisse? Quantas vezes viria com a mesma conversa quando estivéssemos casados? E ainda fala “UMA BESTEIRA DESSAS?” Agradeço a Deus por descobrir o canalha que você é antes que eu cometesse a loucura de me casar contigo!
- Amor, eu sei que...
- JÁ DISSE PRA NÃO ME CHAMAR DE AMOR! VOCÊ NEM SABE O QUE É ISSO!
- Mas eu...
- NÃO ME LIGUE MAIS! VÁ PRO INFERNO! – gritei e desliguei na cara dele.
Não vi mais o que estava na minha frente, tudo virou um borrão, só percebi o porquê quando senti as lágrimas quentes caindo no meu colo e na blusa. Não podia chorar, não por uma pessoa que não merecia. Levantei o braço para secá-las na manga da blusa. Foi então que meu carro deu um tranco. Praticamente morreu. Estava em uma subida íngreme, então não é muito difícil imaginar o que aconteceria, isso mesmo, ele começou a descer e antes que eu tivesse tempo de frear, tirar a marcha e puxar o freio de mão, a traseira dele bateu em alguma coisa que o fez parar totalmente.
Olhei para trás e vi muita fumaça subindo, e... a traseira dele tinha batido na frente de um carro, e a fumaça vinha do motor deste.
Sabia que estava com uma zica danada desde ontem, mais azar total era o termo mais adequado agora. Tudo de ruim já tinha acontecido, menos pagar o concerto do carro de outra pessoa. E ainda tinha o meu, que morreu no meioda rua e ainda bem que não era movimentada e já estava vendo a frente da pousada. Pelo menos não precisaria de um guincho até lá se bem que...
- Por acaso você é doida? – ouvi alguém falar.
Virei-me para a janela e vi um homem falando comigo por ela.
- Me desculpe, não tive a intenção de...
- De praticamente destruir a frente do meu carro? – ele perguntou com uma carranca. - Como conseguiu a habilitação estancando o carro no meio da estrada?
- Eu não estanquei! – bufei.
- E o que foi isso então?
- Se quer que eu pague pelo seu maldito concerto, eu pago, só não pode ser exatamente agora, pois estou... mais ou menos... desempregada, se me der o número do seu telefone talvez eu pudesse...
- Não quero.
- Como assim?
- Só quero que você preste mais atenção enquanto dirige isso daí. – e apontou para o meu carro como se ele fosse uma espécie de lixo. 
- O que quer dizer com isso daí?
- Sorte sua ter sido praticamente em frente à pousada, senão...
Abri a porta do carro e saí. Encarei aquele homem á minha frente. Ele era alto, moreno, cabelos pretos e lisos, o corpo lembrava um índio guerreiro, estava com uma calça jeans desbotada e camisa branca, com tênis da mesma cor. Tinha que admitir, ele não era feio, mas era uma pena que fosse tão estressado.
- Se não o quê? – cruzei os braços.
- Eu teria que pagar o reboque também. Para os dois carros!
- Eu não quero que ninguém pague nada pra mim!
- Está bem, não vou ficar discutindo com uma menina como você! – e ao dizer isso, simplesmente seguiu para a pousada como se nada tivesse acontecido.
Que sujeitinho mais imbecil! Tudo bem, ele tinha todo o direito de ficar chateado já que, sem querer bati no carro dele, mas me tratar como se eu fosse uma idiota incapaz era demais para mim. Afinal de contas, quem era ele?
Peguei minhas malas no porta-malas do carro, e fui direto para a pousada, depois resolveria aquele problema no meu carro.

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